Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
591/05.0TCGMR.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: SANTOS BERNARDINO
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
CULPA
INFRACÇÃO ESTRADAL
MATÉRIA DE DIREITO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ENTRONCAMENTO
EXCESSO DE VELOCIDADE
SINAL DE STOP
CONCORRÊNCIA DE CULPAS
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 01/20/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE
Sumário :
I - Constitui matéria de direito, sindicável pelo STJ, a determinação da culpa do condutor de um veículo automóvel baseada na violação de um preceito estradal.
II - Como fenómeno dinâmico que é um qualquer acidente de viação, o seu processo causal não é, muitas vezes, de fácil apreensão e compreensão, impondo-se ao julgador uma tarefa mental de recreação ou de reconstituição a partir de todos os elementos disponíveis, carreados ao processo, não já para atingir a evidência ou a certeza integral, mas para chegar àquele grau de probabilidade bastante para fundar uma convicção, para consentir a crença quanto às causas do evento.
III - Nesta tarefa, os dados objectivos disponíveis têm de ser analisados e valorados à luz das regras do direito estradal vigentes ao tempo do acidente, que condicionam e disciplinam a actuação dos intervenientes.
IV - O art. 24.º, n.º 1, do CEst encerra um princípio geral em matéria de velocidade: o condutor deve regulá-la de modo a poder executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente, ou seja, na secção de estrada isenta de obstáculos que fica abrangida pelas possibilidades visuais do condutor.
V - O advérbio “especialmente”, contido no art. 25.º do CEst (o qual estatui os casos, locais ou situações em que, sem prejuízo dos limites máximos de velocidade fixados, o condutor deve moderar especialmente a sua velocidade, tal devendo acontecer, designadamente, nos entroncamentos) tem o significado de “significativamente”, “de modo especial”, visando-se, com a significativa moderação ou redução da velocidade que, qualquer manobra a que o condutor tenha de proceder em determinados locais (mais propícios à ocorrência de acidentes) se possa levar a cabo em condições de segurança, evitando qualquer sinistro.
VI - O dever de moderação da velocidade respeita a todos os condutores de veículos, tenham ou não prioridade de passagem.
VII - Demonstrando os factos provados que: o condutor do ciclomotor, ao chegar (na Rua X) junto ao limite da Rua Y, onde existiam um sinal de trânsito B2 (sinal STOP) e uma marca rodoviária transversal M8a (de paragem obrigatória) verificou que naquela artéria, do lado de Abação, vinha o veículo automóvel QH; quem estiver de pé, na Rua X, parado na marca transversal branca pintada no asfalto desta rua (a aludida marca M8a) tem uma visibilidade para o seu lado direito, até à curva, de 45 metros; o condutor do ciclomotor iniciou a manobra de mudança de direcção à esquerda, entrou na Rua Y, percorreu longitudinalmente a faixa direita (sentido Abação - Guimarães) e deu entrada na faixa esquerda, para rumar na direcção de Guimarães - Abação, sendo colhido a cerca de 1,5 metros do eixo da via, sensivelmente a meio da hemi-faixa em que acabava de entrar; o rasto de travagem do QH foi de 11 metros, teve início na faixa direita, atento o sentido de marcha, e terminava, em direcção oblíqua para a esquerda, como rasto do rodado esquerdo para além do eixo médio da via; o QH imobilizou-se defronte da parte central do entroncamento formado pelas Ruas X e Y; após avistar o ciclomotor a atravessar a via, a condutora do QH iniciou imediatamente a travagem do seu veículo; o QH imobilizou-se um a dois metros depois da colisão; tem de concluir-se que, na génese do acidente, encontram-se duas distintas e concorrentes circunstâncias de facto e de direito: por um lado, não ter o condutor do ciclomotor, atenta a distância a que pôde ver o QH cedido a passagem a este veículo, como lho impunham a prudência, o sinal de trânsito B2 e a marca rodoviária transversal M8a, a que devia obediência; por outro, não ter a condutora do QH logrado deter a marcha do seu veículo no espaço livre visível à sua frente, de modo a evitar a colisão, apesar da travagem que fez, o que inculca que seguia com excesso – se não absoluto, pelo menos relativo - de velocidade, e que não teve em contra a aproximação ao entroncamento, afrontando o disposto nos arts. 24.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, do CEst.
VIII - Perante este quadro, a culpa efectiva dos dois condutores na eclosão do acidente é de igual gravidade, repartindo-se em partes idênticas.
Decisão Texto Integral: