Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 5.ª SECÇÃO | ||
Relator: | LEONOR FURTADO | ||
Descritores: | RECUSA JUIZ CONSELHEIRO DECISÃO SINGULAR TEMPESTIVIDADE RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA NULIDADE TRASLADO DEMORAS ABUSIVAS EXPEDIENTE DILATÓRIO TRÂNSITO EM JULGADO | ||
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Data do Acordão: | 04/27/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | ESCUSA / RECUSA | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
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Sumário : | I - Ao incidente de recusa ou escusa não são aplicáveis as regras do recurso, não sendo admissível a reclamação da decisão singular que rejeitou liminarmente o requerimento de recusa, ao abrigo do disposto no art.º 45.º, n.º 4, posto que o despacho “reclamado” se mostra proferido nos termos da lei, por tribunal imediatamente superior – art.º 45.º, n.º 1, al. a), do CPP. II - Conforme o artigo 205.º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi art.º 4.º, do CPP, a irregularidade da distribuição não produz a nulidade processual da distribuição dos processos nos tribunais superiores e muito menos do despacho que já havia rejeitado o requerimento de recusa por intempestividade, e já apreciara e decidira não conhecer das nulidades processuais arguidas pelo requerente, deixando claro que o incidente de recusa não constitui o meio processual adequado ao conhecimento das mesmas, existindo regime próprio para o efeito e que não foi utilizado pelo arguido – art.º 118.º e segs. do CPP. III - Toda a laboriosa argumentação do Requerente, emergindo da alegada inobservância das regras da distribuição, ignorando o facto de já ter sido proferida decisão sobre o requerimento de recusa que o próprio efectuou, remete para uma manifesta intenção de, a qualquer custo, inviabilizar o cumprimento do julgado ou a baixa do processo ou a sua remessa para o tribunal competente. IV - Tal comportamento processual consubstancia um expediente dilatório, inaceitável na relação entre partes processuais, comprometendo a boa administração da Justiça, pelo que, tendo em consideração o que dispõem os art.ºs 613.º, n.º 3, 618.º e 670.º, n.º 2, todos do CPC, aplicáveis ao caso por força do art.º 4.º, do CPP, se impõe determinar a imediata extração de traslado e ordenar que os autos prossigam os seus termos no tribunal precedente. | ||
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Decisão Texto Integral: | INCIDENTE RECLAMAÇÃO RECUSA Processo n.º 101/12.2TAVRM.G2-B.S1
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
I – RELATÓRIO O ora reclamante havia dirigido um requerimento ao Exmo. Senhor Presidente do STJ, solicitando a remessa à distribuição do requerimento de recusa com vista a que o mesmo mandasse “(…) distribuir às Secções Criminais o Requerimento de Recusa anexo - nos termos e para os efeitos do artigo 45.º do Código de Processo Penal e em conformidade com o estabelecido nas normas dos artigos 122° n.º 1 e 204.º, 213.º, 215.º, 216.º e 217.º do Código de Processo Civil, aqui aplicáveis por força do artigo 4.º do primeiro código citado”, formulando o pedido de recusa do Senhor Juiz Desembargador Doutor BB. Por violação do devido processo legal de Distribuição de Processos aos Senhores Juízes nos Tribunais Superiores; E por incompetência do Coletivo constituído pela Senhora Juíza Conselheira Relatora e pelos Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos – decorrente da violação das normas dos artigos 204.º e 213.º do Código de Processo Civil (CPC).”, porquanto, “(…) o Tribunal Coletivo foi constituído em violação do que é exigido pelos citados artigos 204.º e 213.º do CPC para a realização da distribuição nos tribunais superiores – aplicáveis por força do artigo 4.º do CPP, de harmonia com o processo penal”, e que isso determinaria “(…) a nulidade insanável da “Distribuição” e obrigam à realização de nova distribuição nos termos legais – o que, de resto, também se verifica em processos cíveis (cf. artigo 213.º, n.º 4 do CPC) – e à anulação dos atos posteriores, nomeadamente o despacho aqui, por isso, sob reclamação.”. Do mesmo passo suscitou diversas inconstitucionalidades “(…) designadamente nos termos dos artigos 70.º, n.º 1, alínea b) e 72.º, n.º 2 da Lei do Tribunal Constitucional – a inconstitucionalidade dos artigos 3.º e 4.º da Lei n.º 55/2021 e do artigo 137.º, n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo na interpretação normativa em que tal entendimento se traduz, no sentido de que as alterações determinadas pela referida Lei aos artigos 204.º e 213.º do CPC não teriam entrado em vigor por falta de regulamentação pelo Governo”, considerando que “(…) a violação do devido processo legal de distribuição de processos nos Tribunais Superiores – em resultado de todas as violações de lei antes detalhadas e, muito especialmente, da ausência de sorteio eletrónico e aleatório para designação de dois dos respetivos membros é “motivo sério e grave adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade” de todo o Coletivo e de todos os Senhores Juízes que o constituem, e razão, por isso, para a intervenção de Vossas Excelência neste processo correr o risco de ser considerada suspeita…”. E, ainda, considera que se verificou “(…) também erro na forma de processo e, por mais essa razão, a incompetência do Coletivo constituído pela Senhora Juíza Conselheira Relatora e pelos Senhores Juízes Adjuntos, uma vez que a tramitação e decisão do incidente não respeitou, sequer minimamente, o processo e decisão previstos no artigo 45.º do CPP, desde logo quanto à designação do Coletivo que para tanto seria o competente. O que igualmente é causa de nulidade insanável do Processo e da própria decisão reclamada.”, pois, no seu entendimento “(…) O Juiz natural que está em causa neste processo, como em todos os processos criminais, é o Juiz Legal garantido no artigo 32.º n.º 9 da Constituição – norma diretamente aplicável nos termos e por força do artigo 18.º da Constituição, por consagrar um dos direitos e uma das garantias fundamentais dos processos criminais: A primeira e fundamental garantia é o cumprimento escrupuloso pelos Tribunais e pelos Senhores Juízes do devido processo legal de atribuição dos processos judiciais.”, requerendo, a final, que “(…)VOSSAS EXCELÊNCIAS SE DIGNEM APRESENTAR OS DEVIDOS PEDIDOS DE ESCUSA; E QUE ESTE PROCESSO SEJA REMETIDO À DISTRIBUIÇÃO PARA SER JULGADO PELOS JUIZES NATURAIS E, A FINAL, REVOGADA A DECISÃO RECLAMADA E PROCEDENTE O PEDIDO DE RECUSA”.
II. FUNDAMENTAÇÃO Estes requerimentos inserem-se na mesma linha de todo o processo de obstrução que o requerente tem utilizado, usando sempre de idêntica argumentação, sendo certo que vem repristinar questões já levantadas e decididas, numa nova tentativa de obstrução do prosseguimento dos autos.
A conferência prosseguirá, pois, já que os juízes visados consideram inexistirem quaisquer motivos de facto e de direito que justifiquem qualquer declaração de impedimento ou de escusa. Parte inferior do formulário Todavia, mesmo admitindo que é admissível a reclamação do despacho singular proferido nos termos referidos, no caso, a reclamação seria sempre de não admitir porquanto incide sobre despacho que já havia rejeitado o requerimento de recusa por intempestividade, e já apreciara e decidira não conhecer das nulidades processuais arguidas pelo requerente, deixando claro que o incidente de recusa não constitui o meio processual adequado ao conhecimento de nulidades processuais, existindo regime próprio para o efeito e que não foi utilizado pelo arguido – art.º 118.º e segs. do CPP.
Com efeito, ali se disse que o requerimento de recusa se reconduz, em substância, à arguição de uma pretensa nulidade, a da distribuição do processo, geradora de motivo de recusa. Porém, dispõe expressamente o artigo 205.º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi art.º 4.º, do CPC, “a falta ou irregularidade da distribuição não produz nulidade de nenhum ato do processo, mas pode ser reclamada por qualquer interessado ou suprida oficiosamente até à decisão final”. O que o arguido não fez. Ora, a irregularidade da distribuição, não produz a nulidade processual pretendida pelo arguido (a da distribuição dos processos nos tribunais superiores) e muito menos do despacho proferido em 15/02/2023, nestes autos.
Tanto basta para não haver lugar a nova pronúncia sobre as invocadas nulidades. Aliás, toda a laboriosa argumentação do Requerente, emergindo da alegada inobservância das regras da distribuição, ignorando o facto de já ter sido proferida decisão sobre o requerimento de recusa que o próprio efectuou, remete para uma manifesta intenção de, a qualquer custo, inviabilizar o cumprimento do julgado ou a baixa do processo ou a sua remessa para o tribunal competente.
Com efeito, o facto de o arguido ignorar o teor do despacho de 15/02/2023, voltando a repetir argumentos e a invocar nulidades, acrescentando que a decisão de que reclama também é nula, não invalida, nem inutiliza o que ali se decidiu, nem equivale a qualquer nulidade e, muito menos quanto à forma do processo.
A decisão de recusa liminar do requerimento de recusa assentou na verificada intempestividade do requerimento e na ineptidão do próprio pedido de recusa e que, o que o arguido arguira fora a nulidade de actos processuais que nada tinham a ver com a regularidade do acórdão do TR... de 23/01/2023, nos autos n.º 101/12.2TAVRM.G2, de que este incidente é apenso, relativamente ao qual não assacara quaisquer nulidades das previstas no art.º 379.º, do CPP, sendo certo que, o requerimento de recusa do Senhor Juiz Desembargador em causa não tinha de ser apreciado em conferência – art.º 45.º n.º 4, CPP. Em consequência, não pode haver nova pronúncia sobre a mesma matéria, pelo que, por manifesta falta de fundamento, a presente reclamação terá de improceder. Nestes termos, tendo em consideração o que dispõem os art.ºs 613.º, n.º 3, 618.º e 670.º, n.º 2, todos do CPC, aplicáveis ao caso por força do art.º 4.º, do CPP, por parecer ser manifesto que o arguido pretende, com mais este requerimento obstar ao trânsito em julgado das decisões já proferidas, através da suscitação de novos incidentes, em espiral crescente, manifestamente infundados e a elas posteriores, se impõe determinar a imediata extração de traslado e ordenar que os autos prossigam os seus termos no tribunal precedente.
Termos em que, acordando, se decide: Lisboa, 27 de Abril de 2023 (processado e revisto pelo relator) Leonor Furtado (Relator) Agostinho Torres (Adjunto) António João Latas (Adjunto) |