Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
| Relator: | VÍTOR MESQUITA | ||
| Descritores: | RECURSO PARA O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO DE AGRAVO DECISÃO INTERLOCUTÓRIA DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO GRAVAÇÃO DA PROVA RETRIBUIÇÃO COMPLEMENTO DE VENCIMENTO LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ CONDENAÇÃO EM MULTA | ||
| Nº do Documento: | SJ200410190036864 | ||
| Data do Acordão: | 10/19/2004 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
| Processo no Tribunal Recurso: | 1799/03 | ||
| Data: | 05/21/2003 | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA. | ||
| Decisão: | CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA. | ||
| Sumário : | 1. Ressalvadas as excepções previstas nos ns. 2 e 3 do art. 754º do CPC não cabe recurso de agravo para o STJ se a decisão da Relação for de natureza interlocutória, proferida sobre matéria processual, e se tiver já sido exercido um duplo grau de jurisdição. 2. Tendo o acórdão de Relação confirmado a decisão da 1ª instância que indefere, por extemporâneo, o requerimento de uma das partes em que solicita a gravação da audiência, é legalmente inadmissível recurso de agravo, daquele acórdão, para o STJ, que dele não pode conhecer. 3. Embora nos artigos 4º e 20º da contestação a R. admita a existência de "complementos", referindo neste último "prestações essas que o próprio A. qualifica, e bem como complementos...", já no artigo 5º daquele para processual nega pura e simplesmente a existência de "qualquer figura retributiva correspondente a uma quantia de 130.000$00, devido a título de complemento não especificado e pago sem inclusão no recibo", quando no documento que ela própria junta com a contestação, sob a denominação de "Comunicação Interna", dirigida à A., penaliza esta "em 25% do seu complemento, em virtude de não cumprir com o horário de trabalho para com a empresa. 4. Assim, a R. não ignorava que havia uma retribuição devido a título de complemento (não especificado) sem inclusão no recibo de vencimento. 5. Deste modo, a conduta por si assumida, mais concretamente no artigo 5º da contestação, consubstancia uma litigância de má fé, à luz do disposto no nº 2, do art. 456º do CPC. 6. Não se vislumbra, todavia, do quadro factual delineado que a conduta da R. se revista da "gravidade" e "intensidade do dolo", que lhe são imputadas na sentença da 1ª instância e implicitamente aceites no acórdão recorrido. 7. Neste contexto, atenta à situação configurada nos autos e a moldura constante do art. 102º do CCJ (de 2 UC a 100 UC) apresenta-se como bastante exagerada e pesada a multa de € 3.500 aplicada à R., reduzindo-se a mesma para 15 UC, por se considerar mais ajustada ao caso dos autos. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: "A", veio intentar acção emergente de contrato individual de trabalho contra a B, pedindo seja "declarada a justa causa de despedimento invocada pela A. e a R. condenada a pagar à A. a quantia de 5.227.321$00, acrescida de juros de mora à taxa legal de 7% ao ano desde a citação e até integral pagamento". Alegou, para tanto, em síntese, que a R. é uma empresa que se dedica à prestação de serviços de limpeza, que ela A. trabalhou sob as ordens, direcção e fiscalização da R. desde 1 de Janeiro de 2000 até 24 de Novembro de 2000, por transferência da empresa B, onde fora admitida em 1 de Novembro de 1998, mantendo a antiguidade existente ao serviço, conforme acordos de transferência juntos; possuía a categoria profissional de Secretária de Administração; em 13/11/2000, verificada que estava desde 1 de Agosto de 2000 numa situação de salários em atraso, enviou uma carta à R. rescindindo com justa causa o contrato de trabalho com fundamento na falta de pagamento da sua retribuição e ao abrigo do disposto na Lei 17/86. A R. contestou, pedindo a improcedência da acção e na absolvição do pedido, e deduziu reconvenção, requerendo que a A. seja condenada a pagar-lhe a importância de 424.145$00, acrescida de juros vincendos à taxa legal. Respondendo, a A. pugna pela improcedência do pedido reconvencional, concluído como na p.i.. Foi proferido despacho saneador e admitido o pedido reconvencional (fls. 72). Mediante requerimento de fls. 73 a R. veio solicitar a gravação da audiência final. Tal requerimento foi indeferido, por despacho de fls.77, ao abrigo do art. 68º, nº 4, do CPT, já que se considerou o mesmo extemporâneo. Inconformada com este despacho dele interpôs a R. recurso de agravo para o TR Lisboa (fls. 92), logo tendo apresentado alegações e formulado as seguintes conclusões: A) Nos casos, como o vertente, em que, findos os articulados, seja dispensada a audiência preliminar, é admissível a qualquer das partes requerer a gravação da prova, se ainda o não tiverem feito anteriormente, à luz da 1ª parte, do nº 4, do art. 68º do CPT, por interpretação extensiva da parte final do mesmo normativo. B) O que tem por efeito necessário a consideração como tempestivo do requerimento de fls. 73 da agravante e, consequentemente, revogado o douto despacho de indeferimento. Realizada a audiência de julgamento, foram considerados provados os factos constantes da acta de fls. 127 a 133. E veio ser proferida sentença (fls. 134 a 155) que, julgando a acção parcialmente procedente: "A) Condeno a R. a pagar à A. a quantia de 24.563,05 € (4.924.450$00), acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, sobre as quantias parcelares, à taxa anual de 7%, desde as datas dos respectivos vencimentos até integral pagamento. b) Absolvo a R. do demais peticionado na acção: c) Absolvo a A. do pedido reconvencional e, condeno ainda a R., como litigante de má-fé, numa multa de 3.500 €. Não se conformando com esta sentença dela interpôs a R. recurso de apelação para o TR Lisboa, que, por acórdão de fls. 212 a 229, negou provimento ao agravo e à apelação. Ainda inconformada com este acórdão dele interpõe o R. o presente recurso de revista. Tendo apresentado alegações formula as seguintes Conclusões. A) O Tribunal recorrido no Despacho que julgou a matéria de facto como provada e não provada, não logrou em efectuar um exame crítico das provas, limitando-se a enunciar os meios de prova produzidos, o que constitui violação do nº 2 do artigo 659º do CPC (aplicável por força dos artigos 158º, 666º, nº 3 e 668º, nº 1, alínea b), todos do CPC), sendo o erro de interpretação da norma em apreço fundamento de recurso de Revista, não obstante ter sido requerida nova decisão sobre a matéria de facto à luz do artigo 712º do CPC; B) O dever de exame crítico das provas com a menção especificada dos meios de prova geradores da convicção do julgador, surge reforçado quando não haja sido requerida ou indeferida a gravação da prova, sendo exigível ao tribunal de 1ª instância a realização de uma crítica mais detalhada dos meios de prova do que no caso de julgamento com gravação da prova. C) Nos termos do nº 2 do artigo 722º do CPC, o tribunal recorrido não teve em consideração, quer a confissão efectuada pela Recorrida nos artigos 13º a 15º da Petição Inicial, expressa e especificadamente aceite pela Recorrente (cf. artigos 6º e 7º da Contestação) nos termos do artigo 567º, nº 2 do CPC, quer o seu correspectivo valor probatório, tendo sido violados 352º, 355º, nº 1, 356º e 358º, nº 1 do Código Civil e o artigo 567º, nº 2 do CPC; D) A Recorrida nos artigos da Petição Inicial aludidos inequivocamente apenas qualificou como atribuições patrimoniais regulares e periódicas para efeitos de retribuição a sua remuneração base e no valor de 150.000$00; E) Para a Lei dos Salários em Atraso (Lei nº 17/86, de 14 de Junho) e do artigo 29º da LFFF (e por remissão para o artigo 7º do Decreto-Lei nº 421/83, de 2 de Dezembro) o conceito de retribuição é o mesmo: todas as atribuições patrimoniais do empregador que assumam cariz regular e periódico nos termos dos artigos 82º e ss. da LCT; F) Não terá aplicação o princípio da indivisibilidade da confissão (artigo 360º do Código Civil) pois a mesma não é uma confissão complexa ou qualificada, porquanto não existe qualquer conexão ou compatibilidade substancial entre os factos favoráveis e desfavoráveis, em concreto, entre alegar que as atribuições patrimoniais têm cariz de retribuição e confessar que os mesmos não assumem tal natureza; G) Por estarem reunidos requisitos legais da confissão judicial espontânea patente nos artigos 13º a 15º da Petição Inicial, especificadamente aceite pela Recorrente em sede de Contestação, encontra-se demonstrado, e com força probatória plena (artigo 358º, nº 1 do Código Civil) que as demais atribuições patrimoniais que a Recorrida entendia serem devidas, não tinham as características de retribuição para todos os efeitos legais; H) Não o tendo considerado, O tribunal recorrido violou os normativos patentes nos artigos 357º, nº 1, 358º, nº 1, do Código Civil e 567º, nº 2 do CPC, não tendo atribuído a tal meio de prova o seu devido valor probatório, de força superior a qualquer prova testemunhal, o valor probatório pleno, e, por inerência, deu como demonstrado que as atribuições patrimoniais em questão assumiam cariz regular e periódico, i.e., constituíam a retribuição da Recorrida, em contradição com o demonstrado com a declaração confessória, a qual não foi ilidida por nenhum outro meio de prova. I) Tal facto, a par da demonstração de que o valor das atribuições patrimoniais era definido em função de critérios objectivos, sobrelevando a apreciação efectuada do desempenho da autora, demonstra que as importâncias em questão não se encontravam sujeitas ao princípio da irredutibilidade (cf. alínea c) do nº 1 do artigo 21º da LCT), podendo a Apelante, caso a Apelada não reunisse as condições objectivas para a sua atribuição, não proceder ao seu pagamento, inexistindo assim qualquer situação material de salários em atraso para efeitos do artigo 3º da LSA; J) A Apelada, dado o elevado grau de absentismo no seu cômputo, vinte e sete faltas injustificadas e quatro horas e vinte e sete minutos), não preenchia a condição para a atribuição da gratificação nos termos do artigo 88º da LCT; K) A rescisão com fundamento em salários em atraso, não dispensa os demais requisitos de verificação da justa causa, designadamente, a verificação do facto material da situação de salários em atraso, e a impossibilidade prática de subsistência da relação de trabalho, ou seja, que a conduta da entidade empregadora, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho (cf. Acórdão do Supremo tribunal de Justiça, de 27 de Setembro de 1995 - processo nº 004082). L) Interpretação essa que é reforçada pelo facto de ambas as faculdades legais do trabalhador à luz do artigo 3º da LSA (rescisão e suspensão do contrato) dependerem do mesmo facto: mora por mais de 30 dias do pagamento de uma retribuição mensal não cumprida atempadamente (artigo 3º da LSA), o factor de distinção encontra-se na alegação e prova que, enquanto no caso de suspensão o trabalhador considera ainda não se ter quebrado o nexo psicológico de manutenção prática da relação laboral e opta por paralisá-lo, no caso de rescisão o mesmo considera não ser mais exigível a manutenção do vínculo. M) A Apelada não logrou, conforme lhe seria exigível, em cumprir os ónus de alegação e de prova de factos demonstrativos da impossibilidade de manutenção prática da relação de trabalho; N) A confissão efectuada pela Apelada nos artigos 13º a 15º da Petição Inicial, expressa e especificadamente aceite pela Apelante nos artigos 6º e 7º da Contestação nos termos do artigo 567º do CPC, e não relevada pelo Tribunal recorrido como meio probatório, permite - como já se afirmou anteriormente - só por si, considerar como demonstrada a base de presunção do artigo 88º da LCT, pois a própria qualifica as importâncias que auferia a título de prémios de produtividade ou complementos como gratificações extraordinárias, uma vez que as considerou como não integrantes da sua retribuição mensal para efeitos da sua retribuição horária em termos de trabalho suplementar. O) A inexistência de uma situação material de salários em atraso e a não alegação e demonstração da impossibilidade prática de subsistência da relação de trabalho, torna ilegítima a rescisão nos termos e para os efeitos da LSA, e, por inerência, deverá ser julgado procedente o pedido reconvencional deduzido; P) A Recorrida não colocou em causa que as fotocópias juntas aos autos não correspondessem a reproduções mecânicas das fichas ponto métricas, nem impugnou a sua exactidão, pelo que, não se entende como o Tribunal ora recorrido não qualificou tais documentos como reproduções mecânicas, dotadas de força probatória plena à luz do artigo 368º do Código Civil, de onde se extrai que a Recorrida teve a conduta absentista oportunamente descrita, o que deveria ser atendido e dado como provado à luz da norma referida, sendo um dos fundamentos de recurso à luz do nº 2 do artigo 722º do CPC. Q) Atento o teor dos artigos 3º a 5º da Contestação, a par da manifesta insuficiência de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, e da não ponderação da confissão efectuada pela Recorrida, especificadamente aceite pela Recorrente, não habilitava o Tribunal recorrido a condenar aquela como litigante de má fé; R) Se findos os articulados for dispensada a audiência preliminar, é admissível a qualquer das partes requerer a gravação da prova, se ainda não o tiverem feito anteriormente à luz da primeira parte do nº 4 do artigo 68º do C.P.T., por interpretação extensiva da parte final do mesmo normativo; S) O que tem por efeito necessário, a consideração como tempestivo do requerimento de fls. 73 do Agravante, e, consequentemente, revogado o douto Despacho de indeferimento, por violação do citado nº 4 do artigo 68º do C.P.T.. Pede seja dado provimento ao recurso, revogando-se o acórdão recorrido. Contra-alegando, a A. "defende seja negado provimento ao recurso no qual é acompanhada pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto no douto "parecer" junto. As instâncias deram como aprovada a seguinte factualidade, que este STJ aceita, por não se vislumbrar fundamento ilegal para sua alteração: 1. A ré é uma empresa, que se dedica à prestação de serviços de limpeza; 2. A A. trabalhou sob as ordens, direcção e fiscalização da ré desde 1/1/2000 até 24/11/00, por transferência da empresa B, Ld.ª, onde fora admitida em 1/11/98, mantendo a autora a antiguidade existente ao serviço (conforme docs. cujas cópias constam de fls. 16 e 17); 3. A A. possuía a categoria profissional de Secretária de Administração; 4. Ao serviço da ré e da B, Ldª., a A. estava sujeita aos seguintes horários de trabalho: - De 1/11/88 a 30/9/96: das 9:00 horas às 12:30 horas e das 14:00 horas às 18:30 horas; - De 1/10/96 a 30/9/00: das 9:00 horas às 13:00 horas e das 14:00 horas às 18:00; A partir de 1/10/00: das 9:00 horas às 12:30 horas e das 13:30 horas às 18:00 horas; 5. Pelo trabalho prestado, a autora auferia da ré: - Uma quantia sob a designação de "retribuição base", uma quantia a título de diuturnidades; Uma quantia a título de subsídio de alimentação; - Uma quantia sob a designação, umas vezes de "prémio de produtividade" e, outras, de "prémio de assiduidade", paga 14 vezes por ano; - Uma quantia sob a designação de "complemento", paga 14 vezes por ano, umas vezes através de cheque e de "Tickets" e outras somente através de cheque, sem inclusão no recibo de vencimento; 6. Desde Fevereiro de 2000, a A. auferia mensalmente a "retribuição base" ilíquida de 150.000$00, bem como as seguintes quantias: - 5.520$00 a título de diuturnidades; - 18.852$00 a título de subsídio de alimentação, pago também durante as férias; - 47.320$00 sob a designação, umas vezes de "prémio de produtividade" e, outras, de "prémio de assiduidade"; - 67.000$00 sob a designação de "complemento", pagos, 14 vezes por ano, umas vezes através de cheque e de "Tickets" outras somente através de cheque, sem inclusão no recibo de vencimento; 7. A autora enviou à ré, a 13/11/00, a carta cuja cópia consta de fls. 18 a 19; 8. A autora enviou ao IDICT a carta cuja cópia consta de fls. 20, 21 e 22; 9. A ré, relativamente à retribuição do mês de Agosto de 2000, entregou unicamente à autora a quantia de 221.692$00 que fez constar do recibo cuja cópia consta de fls. 30, e a quantia de 34.500$00 sem inclusão no recibo de vencimento; 10. A ré, relativamente à retribuição do mês de Setembro de 2000, entregou unicamente à autora a quantia de 221.692$00 que fez constar do recibo cuja cópia consta de fls. 31, e a quantia de 2.000$00 sem inclusão no recibo de vencimento; 11. A ré, relativamente à retribuição do mês de Outubro de 2000, entregou unicamente à autora a quantia de 158.688$00 que fez constar do recibo cuja cópia consta de fls. 32; 12. A ré, relativamente ao subsídio de Natal de 2000, entregou à autora a quantia de 158.692$00; 13. A autora, entre Janeiro de 2000 e Outubro de 2000, prestou trabalho à ré dentro das horas de entrada e saída que constam dos docs. de fls. 52 a 60; 14. Entre Janeiro de 2000 e Outubro de 2000, a ré não pagou à autora qualquer quantia a título de trabalho suplementar; 15. A ré não pagou a autora quaisquer quantias a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal, relativo ao ano de 2000; 16. A ré emitiu as comunicações internas cujas cópias constam de fls. 62 a 64; 17. A ré enviou à autora a carta cuja cópia consta de fls. 65: 18. O valor global obtido pela soma do conjunto das parcelas "prémio de produtividade"/"prémio de assiduidade" e do "complemento" referidas em 5) e 6) era definido anual e unilateralmente pelo Gerente da ré em função da apreciação do desempenho da autora, sendo que a alteração do seu montante, quando ocorria, era sempre no sentido do seu aumento. À luz das conclusões das alegações da recorrente, que delimitam o objecto do recurso - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do CPC, "ex vi" art.1º, nº 2, a), do CPT - são as seguintes as questões que no mesmo se colocam: - Insuficiência de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto; - Erro na apreciação da prova, nomeadamente do valor probatório da confissão; - Inexistência de justa causa de rescisão do contrato de trabalho, efectuada pelo A., ao abrigo da Lei 17/86, de 14 de Junho (LSA); - Da pretensa litigância de má fé; - Da extemporaneidade do requerimento de gravação da audiência. Começando pela última questão - saber se o requerimento de gravação da audiência foi, ou não apresentado tempestivamente pela Ré - dir-se-à que este STJ dela não pode conhecer, o mesmo é dizer do agravo interposto, que tem por objecto a mesma questão, pois a decisão da Relação que dela conheceu é insusceptível de recurso. Estabelece o nº 1 do art. 722º do CPC que sendo o recurso de revista o próprio, pode o recorrente alegar, além de violação da lei substantiva, a violação da lei do processo, quanto desta for admissível recurso, nos termos do nº2 do art. 754, de modo a interpor do mesmo acórdão um único recurso. Dispõe, por sua vez, o nº 2 do art. 754º do CPC (decisões de que cabe agravo na 2ª instância), na redacção dada pelo D.L. 375-A/99, de 20 de Setembro, que não é admitido recurso do acórdão da Relação sobre decisão da 1ª instância, salvo se o acórdão estiver em oposição com outro proferido no domínio da mesma legislação pelo STJ ou por qualquer relação, e não houver sido fixada pelo Supremo, nos termos dos artigos 732-A e 732-B, jurisprudência com ele conforme. Acrescenta-se no seu nº 3 que o disposto na primeira parte do número anterior não é aplicável aos agravos referidos nos números 2 e 3 do artigo 678º e na alínea a), do n. 1, do artigo 734º. Resulta destes normativos que, ressalvadas as excepções neles previstas, não cabe recurso de agravo para o STJ se a decisão da Relação for de natureza interlocutória, proferida sobre matéria processual, e se tiver já sido exercido um duplo grau de jurisdição (vide Lopes Rego, Comentários ao CPC, 1999, 513). É o que acontece no caso "sub Judice", em que o acórdão da Relação confirma a decisão do Juiz da 1ª instância que indefere, por extemporâneo, o requerimento da Ré em que solicita a gravação da audiência. Quanto à condenação com litigância de má fé. A este respeito deixou-se exarado na sentença da 1ª instância o seguinte: " A Ré, nos presentes autos, veio negar a existência de uma parcela retributiva paga à A. e sem inclusão no recibo de vencimento (arts. 3º, 4º e 5º da contestação). No entanto, ficou exuberantemente demonstrado em audiência de julgamento que tal parcela existia, sob a designação de "complemento", paga 14 x por ano, umas vezes através de cheque e de "tickets" e outras somente através de cheque, sem inclusão no recibo de vencimento, sendo que o seu valor era de 67.000$00 desde Fevereiro de 2000 (factos nºs 5 e 6). A Ré, para além de evidenciar prática que consubstancia incumprimento de obrigações fiscais e para com a Segurança Social, litigou, desta forma, de má fé, com dolo muito intenso, nos termos do art. 456º, nºs 21 (e 2 a), b) e d), do CPC, deduzindo oposição cuja falta de fundamento, nesta parte, não ignorava, e alterando conscientemente a verdade dos factos. Ficou assim sujeita a uma multa nos termos do art. 456º, nº 1, do CPC, e do art. 102º, a), do CCJ, cujo montante se entende dever ser de 3.500,00 euros, atenta a gravidade da conduta e a intensidade do dolo". Por sua vez, o acórdão recorrido teceu, a propósito as seguintes considerações: "Considerou-se que a apelante na contestação negou a existência de uma parcela retributiva, mas que em julgamento se provou exuberantemente. Na verdade, no artigo 5º da contestação a Ré, de modo expresso e claro, disse que o complemento retributivo não incluído no recibo, não existia. O que é certo é que se provou (nº5-4 da matéria de facto) que o A. auferia da R. uma quantia sob a designação de "complemento", paga 14 vezes por ano, umas vezes através de cheque e de "tickets" e outras somente através de cheque, sem inclusão no recibo de vencimento. Resulta, assim, que a R. ora apelante, de forma dolosa (sabendo que a respectiva prova se apresentava difícil, tendo em conta que o dito complemento não era incluído no recibo de vencimento) negou um facto relevante para a decisão da causa, sendo certo que a A. o tinha articulado, pelo que existe fundamento para a sua condenação por litigância de má fé, nos termos do disposto no artigo 456º, nº 1, e nº 2, e sua alínea b), do CPC". Sustenta a recorrente que "em momento algum negou a existência de retribuições complementares à remuneração de base da apelada; a mesma, pura e simplesmente, refutou é que as mesmas não fossem especificadas e não incluídas nos recibos de vencimento, dando-lhes a sua qualificação jurídica real, impugnando que as mesmas não fossem incluídas nos recibos", acrescentando desconhecer a forma pela qual o tribunal recorrido apurou o valor do complemento em 67.000$00". Importa, pois, evidenciar o que a tal respeito é alegado pelas partes. No artigo 5º da p. i., a A. alega que "auferia ultimamente por mês a retribuição ilíquida de 150.000$00, acrescida de 5.520$00, pagos a título de diuturnidades, de 3.168$00 pagos a título de subsídio de alimentação, no valor total de 158.688$00, sendo tudo acrescido de 130.000$00 a título de complemento não especificado e pago sem inclusão no recibo". Na contestação, a R. alega que a A. auferia como remuneração de base a quantia mensal ilíquida de 150.000$00, acrescida de 5.520$00 a título de diuturnidades, e de 18.168$00 a título de subsídio de refeição (artigo 3º), "a título de acréscimos retributivos eventuais a A. poderia auferir ainda um prémio de assiduidade no montante máximo de 47.320$00, e um prémio de produtividade também no montante máximo de 47.320$00" (artigo 4º), "pelo que, desta forma, inexiste qualquer figura retributiva correspondente a uma quantia de 130.000$00 devida a título de complemento não especificado e pago sem inclusão no recibo (artigo 5º). E depois de no artigo 19º alude que não se encontram em dívida quaisquer prestações retributivas da R. para com ela (A.), refere no artigo 20º "prestações essas que a própria A. qualifica, e bem, como complementos, uma vez que, nos termos do artigo 88º do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho (aprovado pelo Dec-Lei nº 49408, de 24/11/69, abreviadamente LCT), tais importâncias são expressamente consideradas como valores não retributivos." Como se vê, neste artigo 20º, a R. admite a existência de complementos, parecendo estar em consonância com o que alega no artigo 4º . Já no artigo 5º nega pura e simplesmente, a existência de qualquer figura retributiva correspondente a uma quantia de 130.000$00 devida a título de complemento não especificado e pago sem inclusão no recibo". Contudo, no documento que ela própria junta com a contestação, a constituir fls. 62, sob a denominação de "Comunicação Interna", dirigida à A., penaliza esta "em 25% do seu complemento, em virtude de não cumprir com o horário de trabalho para com a empresa". E resulta dos pontos 5 e 6. da matéria de facto apurada que a A. auferia mensalmente a "retribuição base" ilíquida de 150.000$00, bem como as seguintes quantias: 5.520$00 a título de diuturnidades; 18.852$00 a título de subsídio de alimentação, pago também durante as férias; 47.320$00 sob a designação, umas vezes de prémio de produtividade, e outras de prémio de assiduidade; 67.000$00 sob a designação de "complemento", pagos 14 vezes por ano, umas vezes através de cheque e de tickets; outras somente através de cheque, sem inclusão no recibo de vencimento. Consta ainda do ponto 18. que o valor global obtido pela soma do conjunto das parcelas "prémio de produtividade / prémio de assiduidade e do complemento" referidos em 5 e 6 era definido anual e unilateralmente pelo gerente da ré em função da apreciação do desempenho da A., sendo que a alteração do seu montante, quando ocorria, era sempre no sentido do seu aumento. Decorre de todo este circunstancialismo fáctico que a R. não ignorava que havia uma retribuição devida a título de complemento (não especificados), sem inclusão no recibo de vencimento. Daí que a conduta por si assumida, mais concretamente no artigo 5º da contestação, consubstancie uma litigância de má fé, à luz do disposto no n. 2 do art. 456º do CPC. Todavia, não se vislumbra do quadro factual delineado que a conduta da R. se revista da "gravidade" e "intensidade do dolo que lhe são imputadas na sentença da 1ª instância, e implicitamente aceites no acórdão recorrido. Neste contexto, atenta a situação configurada nos autos e a moldura constante do art. 102º do CCJ (de 2 UC a 100 UC) apresenta-se como bastante exagerada e pesada a multa de € 3.500,00 aplicada à R., reduzindo-se a mesma, por se considerar mais ajustada, ao caso dos autos, para 15 UC. No concernente às restantes questões, foram elas devidamente apreciadas pelo acórdão recorrido, de forma correcta e ponderada, cujos fundamentos se sufragam e para os quais se remete, sendo certo que a alegação constante da conclusão M) não pode proceder, pois a tese nela defendida se mostra afastada pelo regime especial previsto na LSA. Termos em que se decide não conhecer do recurso de agravo, e conceder parcial provimento à revista condenando-se a R., como litigante de má fé, na multa de 15 (quinze) UC, mantendo-se no mais o decidido. Custas do agravo pela recorrente, e da revista por recorrente e recorrida, na proporção, respectivamente de nove décimos e um décimo. Lisboa, 19 de Outubro de 2004 Vítor Mesquita, Fernandes Cadilha, Mário Pereira. |