Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | URBANO DIAS | ||
Descritores: | PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA MATÉRIA DE FACTO PROVA PERICIAL LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA | ||
Nº do Documento: | SJ200611210039911 | ||
Data do Acordão: | 11/21/2006 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | AGRAVO. | ||
Decisão: | PROVIDO. | ||
Sumário : | Tem do sido posta em crise no recurso interposto para o Tribunal da Relação o julgamento da matéria de facto, não é lícito que este Tribunal julgue improcedente o recurso sem previamente se pronunciar sobre a validada da argumentação aduzida sobre aquela concreta questão. Ao proceder desta forma, a Relação cometeu nulidade por omissão de pronúncia que obriga a anulação de tal decisão, com baixa do processo com vista ao seu suprimento. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - "AA" intentou, no Tribunal Cível da comarca do Porto, acção ordinária contra Empresa-A, pedindo que fosse condenada a pagar-lhe a quantia de 20.985,96 € e juros até integral pagamento. Em suma, alegou que emprestou à R., por diversas vezes, várias importâncias em dinheiro, as quais totalizam 20.015 € e que ela se recusa ao seu pagamento. A R. contestou, impugnado a factualidade vertida na petição e pedindo a condenação do A. como litigante de má fé. "A A". replicou. Após saneamento de selecção dos factos, assentes e controvertidos, a acção seguiu para julgamento, tendo, na sequência do mesmo, sido julgada improcedente e a R. absolvida do pedido. Não conformada com tal decisão, o A. apelou para o Tribunal da Relação do Porto, mas sem êxito. Foi, então, que recorreu de agravo para este Supremo Tribunal. A recorrida contra-alegou, defendendo a manutenção do acórdão. II - Nas suas conclusões, o recorrente insurge-se, por um lado, contra o facto de o Tribunal da Relação do Porto ter cometido nulidade por omissão de pronúncia e, por outro lado, indo ao mérito da acção, defende a condenação da R. na restituição das importâncias descriminadas na conclusão 13ª Ora bem. O recorrente fez notar, perante o Tribunal da Relação do Porto, no requerimento de interposição dirigido ao Exº Relator, que o recurso que pretendia interpor era de agravo e, tanto assim, que, disse-o de forma bem clara, no início da sua alegação, "apenas quer impugnar o acórdão com fundamento na nulidade assinalada" e isto "para mais tarde poder discutir o direito". Salta à vista que, na economia do recurso de agravo apenas cabe a apreciação da arguida nulidade, com base nos arts. 722º, nº 3 e 755º, nº 1, al. a) do CPC. Ou seja, fica automaticamente de fora da nossa apreciação tudo o que o recorrente disse na sua alegação relativamente ao mérito da acção. Centremos, pois, a nossa atenção na apreciação da questão processual, a qual se resume a saber se o acórdão impugnado omitiu pronúncia sobre a impugnação da matéria de facto. Com vista a dar solução ao problema que nos é colocado, necessário se torna recuarmos na tramitação processual e analisar o que foi posto à consideração do Tribunal da Relação do Porto pelo recorrente para, só depois, podermos dizer se houve ou não a pretendida omissão de pronúncia. No recurso de apelação defendeu o recorrente, na parte que ora nos interessa, que as respostas dadas aos quesitos 2º 7º, 8º, 10º e 11º deveriam ter sido outras atento o teor dos documentos juntos a fls. 149 (extracto de conta) e 110 (cheques). Ora, é um facto que a Relação passou ao lado da apreciação do mérito da crítica que o recorrente dirigiu à sentença da 1ª instância no que aos ditos documentos diz respeito. Com efeito, limitou-se a dizer que "mesmo que o A. tivesse razão, e talvez a tenha, quanto a deverem ser alteradas as respostas aos quesitos, no sentido de ficar consignado na matéria assente o trânsito financeiro da conta bancária dele para a conta bancária da R., nem assim obteria vencimento de causa". Quer dizer, a Relação deu a solução à questão de direito sem saber se a matéria de facto deveria ser alterada, sendo certo que esta questão lhe foi concretamente colocada. Competia-lhe, pois, tomar posição sobre a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, nos termos do nº 1 e 2 do art. 712º do CPC. Não o tendo feito, como não o fez, omitiu pronúncia sobre a questão concreta que lhe foi colocada. O que a Relação poderia ter feito era outra coisa: dizer pura e simplesmente que a documentação aludida pelo recorrente em nada alterava as respostas aos quesitos referidos, atenta a regra da livre apreciação das provas consagrada no art. 655º do CPC. Se assim tivesse procedido, teria feito a apreciação aos documentos aludidos, retirando daí todas as consequências. Mas não. A Relação disse que, independentemente da eventual alteração das respostas, a solução de direito era outra. Os quesitos, todos eles, foram formulados a partir da alegação das partes e tendo em conta as várias soluções plausíveis da questão de direito (cfr. art. 511º do CPC). Não foi posta em crise a elaboração da base instrutória (e podia tê-lo sido), de forma que ao Tribunal da Relação incumbia a obrigação de emitir pronúncia em relação à questão concreta que lhe foi colocada, por força do disposto no art. 660º, nº 2 ex vi art. 716º, ambos do CPC. Transgredindo estas normas, a Relação cometeu, sem dúvida alguma, nulidade por omissão de pronúncia, tal como está prevista na 1ª parte da al. d) do nº 1 do art. 668º do Código Adjectivo. Impõe-se, pois, que a Relação supra tal nulidade conhecendo da questão concreta referida e, só depois, estará em condições de, definitivamente, decidir do mérito. Estando, em princípio, a apreciação da matéria de facto, fora do âmbito do STJ, importa que a Relação, nos limites da sua competência específica, fixe definitivamente os factos, sendo que a questão de direito pode ser sempre apreciada em recurso de revista. III - Em conformidade, dando provimento ao agravo do A., ordena-se que a Relação, pelos mesmos Senhores Juízes Desembargadores, se pronuncie sobre os supra referidos pontos que foram colocados à sua consideração pelo recorrente, Custas pela agravada. Lisboa, 21 de Novembro de 2006 Urbano Dias Paulo Sá Borges Soeiro |