Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
059468
Nº Convencional: JSTJ00004108
Relator: GONÇALVES PEREIRA
Descritores: MULTA FISCAL
RECURSO
ALÇADA
FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ196311220594681
Data do Acordão: 11/22/1963
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DR IªS 12-12-1963 ; BMJ 131,249
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: FIXADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 10/1963
Área Temática: DIR PROC PENAL - RECURSOS.
Legislação Nacional: CPC61 ARTIGO 678 ARTIGO 764.
CADM40 ARTIGO 748 ARTIGO 749.
DL 39393 DE 1953/10/20 ARTIGO 1.
D 16733 DE 1929/04/13.
D DE 1910/10/14 ARTIGO 6.
EJ62 ARTIGO 25 ARTIGO 54 ARTIGO 66.
CPP29 ARTIGO 1.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO RP DE 1962/04/25.
ACÓRDÃO RC DE 1959/03/17.
Sumário :
Não estão sujeitos a alçadas os recursos previstos no artigo 748 do Codigo Administrativo.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferencia, os Juizes do Supremo Tribunal de Justiça, em Tribunal Pleno:

O Procurador da Republica junto da Relação do Porto recorre do acordão da mesma Relação, de 25 de Abril de 1962, por estar em oposição com o da Relação de Coimbra, de 17 de Março de 1959.


Estão juntas aos autos as copias dos citados acordãos e da sua leitura verifica-se que existe a oposição exigida pelo artigo 764 do Codigo de Processo Civil.


O problema, que se pretende resolver, pode resumir-se nestes termos:
O artigo 748 do Codigo Administrativo dispõe que, nos processos de transgressão do contencioso dos impostos e outros rendimentos municipais, da decisão proferida pelo chefe de secretaria cabe recurso para o juiz de Direito da comarca e da decisão deste para o Tribunal da Relação, interposto, um e outro, dentro do prazo de oito dias a contar da notificação da sentença recorrida.


E no artigo 749 preceitua-se que, nos casos omissos, observar-se-a o disposto nas leis reguladoras do contencioso das Contribuições e Impostos do Estado.


Quanto a este, dispõe o artigo 1 do Decreto-Lei n. 39393, de 20 de Outubro de 1953, que e fixada em 20000 escudos do valor de multa para os processos de transgressão e em 5000 escudos do valor da causa para todos os restantes, a alçada do Tribunal de segunda instancia do Contencioso das Contribuições e Impostos.


Na interpretação e aplicação destes preceitos surgiram duas correntes jurisprudenciais.
A primeira, seguida no acordão da Relação de Coimbra, de
17 de Março de 1959, sustenta que o citado artigo 748 do Codigo Administrativo encerra uma norma clara e completa, facultando o direito de interposição de recurso a todos os casos de transgressões fiscais a que se refere, independentemente de quaisquer alçadas.


A segunda corrente, adoptada pela Relação do Porto no acordão de 25 de Abril de 1962 defende que, visando apenas indicar para quem recorre, constitui preceito omisso em materia de alçada, devendo tal omissão ser integrada pelo referido artigo 1 do Decreto-Lei n. 39393, por força do mencionado artigo 749 do Codigo Administrativo.


Estabelecido o constraste nas aludidas decisões e porque, segundo jurisprudencia corrente, não e admissivel, do acordão da Relação, recurso de revista ou de agravo por motivo estranho a alçada do Tribunal, verifica-se a existencia de um conflito de jurisprudencia que cumpre resolver.
A infracção fiscal, tem, predominantemente, a natureza de ilicito administrativo, desde que não esteja tipificada no Codigo Penal (Mouteira Guerreiro, Em torno da Infracção Fiscal no Boletim da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, serie A, Janeiro-Fevereiro de 1962, pagina 129).
O artigo 748 do Codigo Administrativo esta incluido na Secção V da Parte III do mesmo Codigo, decalcada sobre o regime geral das contribuições e impostos, regulado no Decreto n. 16733, de 13 de Abril de 1929, que não se refere a alçadas no sentido processual do termo.


A materia de transgressão fiscal esta subordinada ao Direito Penal Fiscal.
O artigo 1 do Codigo de Processo Penal determina que a todo o crime ou contravenção corresponde uma acção penal exercida nos termos do mesmo Codigo. E o principio vigente sobre alçadas em materia penal e o da não existencia das alçadas - abolidas pelo artigo 6 do Decreto de 14 de Outubro de 1910 e fixadas, em leis posteriores, somente em materia civel (artigo 678 do Codigo de Processo Civil e artigos 25, 54 e 66 do Estatuto Judiciario).
E certo que no artigo 1 do Decreto n. 39393, de 20 de Outubro de 1953, fixaram-se as alçadas para o Tribunal de segunda instancia do Contencioso das Contribuições e Impostos, mas, como se acentua no relatorio do mesmo diploma, este regime so foi instituido para se obter o descongestionamento anomalo dos serviços do aludido Tribunal e por se ter reconhecido que a aglomeração dos processos e consequente demora no Tribunal, causando flagrantes prejuizos ao Estado e aos contribuintes, denunciam que a sua organização não lhe permitia acompanhar o desenvolvimento dos respectivos serviços nas ultimas decadas.
Este regime entrou a vigorar em 1953 em nas revisões ao Codigo Administrativo posteriores a 1940, não se modificou o sistema do Codigo em materia de recursos, certamente porque, em relação ao contencioso fiscal municipal, não se verificaram as circunstancias que levaram a substituição do regime de recorribilidade plena pelo das alçadas.
De resto, e diferente a organica do contencioso fiscal do Estado e do contencioso fiscal municipal, subordinando-se aquele a uma hierarquia jurisdicional especializada, tendo no ultimo grau o Supremo Tribunal Administrativo. As questões do contencioso municipal, julgadas em tribunais comuns, finalizam, como e jurisprudencia corrente, nos tribunais da Relação.


O artigo 748 do Codigo Administrativo estabelece o regime de plena admissibilidade do recurso, não sendo omisso quanto a fixação das alçadas.
Esta interpretação esta de harmonia com o principio geral de facilitar os recursos, permitindo o exame das decisões por juizes de mais alta categoria, fornecendo o acerto dos julgados, aumentando o seu prestigio e fazendo surgir - no dizer do Professor Manuel de Andrade (Noções Elementares de Processo Civil, pagina 193, Coimbra 1950) com maior segurança do Direito, a confiança do povo na Justiça.


Pelo exposto, dão provimento ao recurso e formulam o seguinte assento:


Não estão sujeitos a alçadas os recursos previstos no artigo 748 do Codigo Administrativo.


Lisboa, 22 de Novembro de 1963

Gonçalves Pereira (Relator) (Com a declaração de que, em meu entender, e pelas razões consignadas no meu voto no assento de 10 de Maio ultimo, os acordãos da Relação nesta materia são susceptiveis de recurso de revista ou de agravo, por motivo estranho a alçada do Tribunal. Vencido nesta parte, votei o assento). - Cura Mariano - Alberto Toscano - Jose Meneses - Ricardo Lopes - Fragoso de Almeida - Abreu Lobo - Lopes Cardoso - F. Toscano Pessoa - Barbosa Viana - Bravo Serra - Albuquerque Rocha.