Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
08B856
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: PEREIRA DA SILVA
Descritores: REGISTO PREDIAL
PRESUNÇÃO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Nº do Documento: SJ200805150008562
Data do Acordão: 05/15/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: ORDENADA A BAIXA DO PROCESSO.
Sumário : I - A presunção resultante do registo predial (artº 7º do C.R. Predial) não abrange os factores descritivos do prédio, como as áreas, limites ou confrontações.
II - A ampliação a que alude o artº 729º nº3 do CPC só é consentida no tocante a factos de que ao tribunal seja lícito conhecer ou articulados pelas partes (artº 264º do CPC) que se perfilem revelantes para o consignado no primeiro dos normativos neste número invocados.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


I. 1. "AA" e mulher, BB, intentaram, a 02-10-03, com distribuição ao 3º Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz, acção declarativa, com processo comum, ordinário, contra o Município da Figueira da Foz e CC e marido, DD, nos termos e com os fundamentos seguintes, em síntese:
" 1º. Por si e anteproprietários que legalmente representam, os A. são legítimos e exclusivos proprietários e possuidores pública, pacífica, continuamente, de boa fé, com justo título, em nome próprio e há mais de 20 anos do seguinte prédio:
"Prédio rústico composto de terra de cultura, sito no Quintais da Costa, com a área de 9.058 m2, freguesia de Lavos, desta Comarca, a confrontar do norte CC, EE (hoje os segundos RR.), do Sul com FF, do nascente com GG e do poente com estrada, inscrito na matriz urbana sob o art. 3485º e parte do art. 3486º, ambos da freguesia de Lavos" - cfr. doc,. 1 que se junta.

2º . Com efeito, sempre os AA., por si e antes, os seus legítimos anteproprietário no referido prédio, à vista de quem quer que fosse, sem oposição de pessoa alguma, ininterruptamente, há mais de 20 anos e na convicção de usufruírem "coisa" exclusivamente sua, têm utilizado e fruído o dito prédio, ocupando-o, nele permanecendo, tirando areias e, de uma forma geral, colhendo-lhe todos os normais frutos e produtos.

3º . PORTANTO: - Quando, por outro título o não fossem - e são-no ... -, sempre os ora AA. seriam legítimos e exclusivos proprietários do prédio referido no art. 1º do presente requerimento inicial por "USUCAPIÃO", que, em todo o caso, invocam para os devidos e legais efeitos.

4º . O referido prédio encontra-se descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial da Figueira da Foz sob a ficha nº 04609/050695 e,

5º . definitivamente inscrito a favor dos AA., pela inscrição G-1, desde 9 de Outubro de 1964, ou seja, há mais de 30 anos, - cfr. ainda doc. 1.

6º. O referido prédio veio à posse e propriedade dos AA. por o haverem adquirido através da compra de dois prédios em duas escrituras diferentes.

7º . Assim, em 6 de Fevereiro de 1964, por escritura pública lavrada a fls. 8 vº. a 10 do Livro de notas para Escrituras Diversas B - 13, do 1º Cartório Notarial da Figueira da Foz, o ora A. declarou comprar e HH, por si e em representação de sua mulher II, declarou vender uma terra de cultura, com a área de 5.900 m2, no "quintal grande", a confrontar do norte com JJ ( o prédio a que se refere o artigo seguinte), do nascente com GG, do sul com FF e do poente com estrada, prédio esse que tinha ao tempo na matriz o art. 3485º.- Cfr. doc.2.

8º . Por sua vez, por escritura de 12 de Março de 1964, lavrada a fls. 42 a 44 do Livro de notas para Escrituras Diversas C-14 do 1º Cartório Notarial da Figueira da Foz, o A. marido declarou comprar a D. JJ, que por sua vez declarou vender, uma parcela de terreno com a área de 1850 m2 destinada a arredondamento do prédio rústico inscrito matriz sob o art. 3485, ou seja, o prédio que o A. marido adquirira pela escritura referida no artigo anterior,

9º . Parcela essa que confronta do norte com herdeiros de KK (hoje em parte com os RR.), do sul com o comprador (o prédio referido no art. 7º da presente petição), do nascente com a vendedora e do poente com a estrada florestal (hoje, rua pública) - Cfr. docs. 2 e 3.

27º . Consequentemente seja declarada nula, por se tratar de uma venda de bens alheios essa mencionada parcela,

28º . revertendo a mesma para propriedade dos ora AA."

Concluíram impetrando:
a) Que se declarem "os AA. legítimos e exclusivos proprietários e possuidores do prédio descrito no art. 1º da petição inicial, com a área, natureza e limites aí referidos, com todas as legais consequências, condenando-se todos os RR. a tal reconhecer,
b) Declarar-se, consequentemente, "nula a cedência feita pelos segundos RR. ao primeiro R. da faixa de terreno descrita e confrontada no art. 11º da presente petição inicial, com a restituição ao património dos AA. da referida parcela de terreno".

2. Contestou o Município da Figueira da Foz, como flui de fls. 52 e 53, pugnando pela improcedência da acção.

3. Os demais réus, esses, contestaram como decorre de fls. 59 a 62, concluindo no sentido do acerto de decreto de naufrágio da acção.

4. Foi apresentada réplica, como mostram fls. 78 e 79, tendo-se passado a dar ao pedido citado em 1. b) a seguinte redacção:
" Consequentemente, declarar-se nula a escritura de doação de 20 de Julho de 1994, celebrada pelo Director do Departamento Administrativo e Financeiro da Câmara Municipal da Figueira da Foz feita pelos segundos RR. ao primeiro R. de duas parcelas de terreno que correspondem à faixa de terreno descrita e confrontada no art. 11º da presente petição inicial, com a restituição ao património dos AA. da referida parcela de terreno."

5. Treplicaram os réus CC e marido, aduzindo dever considerar-se como não escrita toda a matéria factual inserta na réplica (cfr. fls. 86 e 87).

6. Por despacho de 24-01-03, foi decidido:
a) Não admitir a réplica, "considerando-se todo o seu teor como não escrito."
b) Admitir "como válida a requerida alteração do pedido formulado na al. b) da petição inicial."

7. Agravaram os demandantes da decisão a que se alude em 6. a).

8. Elaborado despacho saneador tabelar, ocorreu a selecção da factualidade assente e organizou-se a base instrutória, da primeira, sem êxito, tendo a 21-10-03, reclamado os autores (vide fls. 153 e 165).

9. No decurso da audiência de discussão e julgamento, os autores alteraram "o pedido inicial" nos termos seguintes:
"1º - Desenvolvem o pedido da al. a), no sentido de ser declarado que o limite norte do seu prédio é dado por uma linha recta que se inicia a poente na Rua Mestre Cardoso, passa pela face exterior sul do muro que delimita o prédio de LL e se projecta em linha recta para nascente até ao limite do prédio dos autores, com a condenação dos réus a tal reconhecer".
"2º - Reduzem o pedido da al. b) - anulação da escritura de doação - à área que foi doada pelos segundos réus ao Município da Figueira da Foz, na parte que se situa a sul da linha referida e que constitui o limite norte do prédio dos autores".
"3º - Desenvolvem o pedido primitivo, de modo a nele incluir uma al. c) em que pedem a condenação do réu Município a indemnizar os autores pelos prejuízos que lhe causaram, com o indeferimento do seu loteamento, em montante, cuja liquidação deve ser remetida para liquidação de sentença."

10. Foram admitidos, "quer a redução do pedido, quer os desenvolvimentos dele feitos" na audiência.
11. Agravou o Município da Figueira da Foz da decisão que admitiu os "desenvolvimentos" do pedido efectivados na audiência de discussão e julgamento, recurso esse que veio a ser julgado deserto por falta de alegações.
12. Ampliada a base instrutória, prosseguiu a audiência de discussão e julgamento, sentenciada tendo vindo a ser a improcedência da acção, com consequente absolvição dos réus dos pedidos.
13. Com a sentença se não tendo conformado, apelaram os demandantes.
14. O TRC, por acórdão de 07-09-18, negou provimento ao agravo instalado pelos autores e julgou a apelação improcedente.
15. É do predito acórdão que trazem revista os autores, os quais, nas alegações oferecidas, tiraram as seguintes conclusões:

A) Toda a argumentação do acórdão recorrido assenta no facto de haver um acordo de demarcação consubstanciado na colocação - aparentemente consensual - de estacas ou vigotas como delimitadoras da propriedade dos AA., acordo esse que, seria sempre nulo por falta de forma, dado que todos os actos relativos a direitos de imóveis, têm de ser celebrados por escritura pública, nos termos do art. 80º, nº 1 do Código do Notariado.
B) Mas o Tribunal da Relação alterou a resposta ao quesito 5º - pág. 19 do acórdão - onde se determinou "a alteração parcial do quesito 5º na medida em que a colocação de marcos foi efectuada na presença apenas do Autor que a tanto deu a sua anuência", pelo que é irrelevante essa colocação de marcos, pois sendo os AA. casados em regime de comunhão geral de bens, a A. BB, sendo também proprietária, tem de ser vista e ouvida sobre a demarcação.
C) Conforme se alcança dos autos - e nem a 1ª., nem a 2ª. instâncias atentaram no facto -, a doação inicial feita pelos RR. ao co-R. Município e por eles junta cópia em 16 de Fevereiro de 2004, que tinha a data de 20/7/194, acabou por de nada valer, atenta a DOAÇÃO FINAL de 16 de Novembro 1994, feita então pelos reais proprietários, em que, conforme as plantas juntas a ambas as escrituras, as parcelas cedidas são rigorosamente as mesmas - Cfr. fls. 369.
D) Não pode, por isso, ser considerado provado o facto que consta da resposta ao quesito 12., pois essa escritura está contrariada pela escritura posterior de cedência dessas mesmas parcelas por pessoas diversas.
E) Neste particular, devia o tribunal ter esclarecido a situação concreta, como a determinação da razão de ser de tais escrituras sobre o mesmo objecto, esclarecimento esse que devia ser prévio relativamente à decisão da matéria de facto e não aconteceu e os pedidos formulados na al. B) do petitório inicial e no ponto 2 do desenvolvimento do pedido poderão estar prejudicados, se afinal não houver qualquer negócio válido entre os RR. demandados.
F) Do facto constante da al. C) dos factos assentes e do documento de fls. 645, que é um contrato promessa, em que MM, EE e GG, herdeiros da referida JJ prometem vender ao ora R. DD "a passagem por uma parcela de terreno com o comprimento aproximado de sessenta e nova metros e com a largura de quatro metros, que faz parte do seu prédio rústico sito na Costa de Lavos, inscrito na matriz sob o artigo 3.486 da freguesia de Lavos", resulta que os RR. são detentores apenas de uma promessa de cessão da passagem que estava assente na al. C) dos factos assentes.

G) Resulta ainda da escritura de fls. 369, que essa passagem - aí referida sob as letras A e B - não foi objecto da escritura de cedência celebrada com o R. Município da Figueira da Foz.
H) Por isso, os AA. são proprietários do prédio descrito e confrontado na al. A) dos Factos assentes, incluindo o terreno da referida passagem a favor do prédio dos herdeiros de JJ, pois a referida cedência é nula por falta de forma - cfr. mesmo art. 80º., nº 1 do Cód. do Notariado -, sendo certo que a mesma abrange apenas o direito de passagem e não a propriedade do terreno, onde a mesma se exerce.
I) Tendo o Tribunal da Relação alterado a resposta ao quesito 5º - pág. 19 do acórdão - onde se determinou "a alteração parcial do quesito 5º na medida em que a colocação de marcos foi efectuada na presença apenas do Autor que a tanto deu a sua anuência", nenhum relevo tem esse acordo, pois sendo os AA. casados em regime de comunhão geral de bens, a A. BB, sendo também proprietária, teria de manifestar a sua vontade sobre essa eventual demarcação extrajudicial e isso não está provado.
J) Porém, na parte decisória, no mesmo acórdão, escreve-se "os limites dos prédios, de harmonia com os factos provados, foram definidos através de marcos colocados pelos RR., sendo certo que TAL ACTO TEVE A AQUIESCÊNCIA DOS AA.", o que não corresponde à matéria dada como provada, pelo que o acórdão recorrido incoerentemente considerou como assente o que antes havia considerado não provado e não teve em conta as especificidades que daí resultavam.
K) Dos factos provados resulta que o prédio dos AA. tem a área de 9.085 m2 e que confronta do norte, pelo menos, com CC ( os ora 2º.s RR.).
L) Por isso, face aos factos provados e aos documentos juntos terá de proceder o primeiro pedido formulado pelos AA., pois estão assentes todos os elementos de facto que permitem essa procedência, sendo certo que o prédio em causa se encontra definitivamente inscrito a favor dos AA. no registo predial e NÃO FOI PEDIDO O CANCELAMENTO DO RESPECTIVO REGISTO POR NENHUM DOS RR..
M) Em 9/10/1995 a ré DD assinou, com reconhecimento notarial, na qualidade de confinante, uma planta com a indicação dos limites e a área do prédio referido em A), tal como consta actualmente do registo predial, documento esse que configura uma declaração confessória que, nos termos das disposições dos artigos 358º, nº 2, 375º, nº 1 e 376º, nº 1, todos do Cód. Civil, tem força probatória plena.
N) Não tendo sido arguida a respectiva falsidade, não retira a qualidade de confissão o facto dado como provado no quesito 14º., nem o fim a que se destinava, conforme o que foi dado como provado no quesito 15º., pelo que tem de proceder o pedido formulado na al. A) do petitório inicial.
O) Quanto ao desenvolvimento do pedido e face à irrelevância do pretenso acordo demarcatório - colocação de estacas ou vigotas -, deve ser ordenada a ampliação da matéria de facto para determinar qual é a linha divisória norte do prédio dos AA., bem como se essa definição atinge ou não a área de cedência feita pelos Réus CC e marido - ou outros - ao co-réu Município da Figueira da Foz.
P) Embora resulte dos documentos juntos aos autos, em especial da escritura de fls. 369 que o R. Município da Figueira da Foz não tem qualquer título de cedência da parcela de terreno da passagem, o Município da Figueira da Foz incluiu no despacho de indeferimento do pedido de loteamento dos AA. uma conclusão que sabia não ser correcta, pois não tem qualquer escritura de cedência do terreno da servidão a favor do prédio que era de JJ.

Q) Por isso, tem de proceder o pedido da al. C) tal como ele emerge da ampliação do pedido formulada em audiência de julgamento.
R) São fundamentos do presente recurso de revista, a violação do art.220º do Cód. Civil, com referência ao art. 80º., nº 1 do Cód. do Notariado, aceitando como válida uma demarcação, que não consta de escritura pública, nem resulta de decisão judicial; a errónea interpretação e qualificação dos factos dados como provados, que demonstram o direito do A., como acontece com o art. 7º do Cód.Reg.Predial, sendo certo que não foi usada da faculdade conferida pelo art. 8º, do mesmo diploma legal e o tribunal aceitou essa impugnação; a violação do disposto nos artigos 375º, nº 1 e 376º, nº 1, ambos do Cód. Civil, porquanto o R. marido aceitou que passagem foi feita pela servidão constante da al. C) dos factos assentes, tendo subscrito o contrato de fls. 645 e a R. mulher assinou a declaração referida no quesito 14º.
S) Acessoriamente, nos termos do art. 722º, nº 1, do CPC, e face à contradição entre a decisão e os fundamentos no acórdão recorrido, que em sede de decisão considera que ambos os AA. acordaram na dita demarcação, quando havia alterado a resposta ao quesito 5º., considerando que no cravamento da vigotas apenas participara o A., o que constitui NULIDADE DO ACÓRDÃO, nos temos do art. 668º, mº 1, al. c) do Cod. Proc. Civil, aplicável por força do disposto no art.716º, do mesmo diploma.
T) Na procedência do presente recurso, deve ser revogado o acórdão recorrido e deve ser proferida decisão que julgue acção procedente e provada,de harmonia com as conclusões que se deixam formuladas, como é de lei e de JUSTIÇA!

16. Contra-alegaram os réus CC e DD, em defesa da confirmação do julgado.
17. Colhidos que foram os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. Eis como se perfila a materialidade fáctica dada como assente no acórdão impugnado, doravante como "decisão" denominado.
1. "Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial da Figueira da Foz, freguesia de Lavos, sob o nº 04609/050695 o seguinte prédio rústico: terra de cultura, sito no Quintais da Costa, com a área de 9.058 m2, a confrontar do norte com CC, EE e MM, do sul com NN, do nascente com GG e do poente com estrada pública, inscrito na matriz sob o artigo 3.485, incluindo parte do artigo 3.486."
2. "Na descrição referida no ponto anterior consta inscrição de aquisição, por compra, a favor do Autor, casado com a Autora."
3. "Por escritura pública outorgada em 28 de Setembro de 1964, lavrada de fls. 44 vº a fls. 47 do Livro C-17 das Notas do 1º Cartório Notarial da Figueira da Foz, os Autores, enquanto proprietários do prédio inscrito na matriz sob o artigo 3.486, declararam vender a JJ, que aceitou, o direito de servidão de passagem de pé, gado e carro, através de uma faixa de terreno com a largura de 4 metros e com o comprimento de 69 metros, junto à estrema norte do prédio daqueles e a favor do prédio confinante dela, como consta de fls. 19 e seguintes."
4. "O direito de servidão referido no ponto anterior encontra-se inscrito na descrição referida em A)."
5. "Por escritura de doação, outorgada em 20 de Julho de 1994 pelo Notário Privativo da Câmara Municipal da Figueira da Foz, CC e marido, DD, declararam doar ao Município da Figueira da Foz, que declarou aceitar, duas parcelas de terreno sitas no lugar de Costa de Lavos, destinadas a arruamento, como consta de fls. 71 e seguintes."
6. "O arruamento construído na sequência da doação referida em E), foi-o em 1994 ou 1995, a expensas dos Réus CC e marido."
7. "Tendo a sua delimitação - de cerca de 4 metros de largura e cerca de 70 de comprimento - com colocação de marcos (por meio de pontas de vigotas), sido efectuada na presença do Autor, que deu a sua anuência."
8. "Em 27 de Junho de 1995, os AA. pretenderam lotear o seu prédio, tendo apresentado o competente requerimento na Câmara Municipal da Figueira da Foz".
9. "O referido loteamento deveria ser executado por fases."
10. "Tendo o referido requerimento dado origem ao processo 15/95".
11. "Além de problemas relativos à aplicação do PDM, foi referido que o "limite norte do prédio a lotear, não se encontra correctamente indicado .... Na parcela a lotear foi incluído terreno que já foi cedido para arruamento público, por outro proprietário."
12. "Foram os segundos Réus quem cedeu a referida parcela de terreno ao Município da figueira da Foz."
13. Mas não foi dada ao A. qualquer cópia da escritura de cedência para que pudesse apresentá-la em Tribunal."
14. "A Ré CC havia a 9 de Outubro assinado, sendo reconhecida notarialmente a sua assinatura, um documento em que se indicavam os confrontantes e a área do prédio dos AA.."
15. "Documento esse que serviu para a rectificação da área do prédio dos AA. no registo predial."
16. "Apesar de o A. ter respondido, a Câmara Municipal da Figueira da Foz manteve a sua decisão e arquivou o processo."
17. "O loteamento pedido pelo ora Autor foi arquivado também porque o Autor não esclareceu devidamente perante o Réu Município a área do prédio, nem satisfez outros condicionamentos administrativos, designadamente um estudo do conjunto do prédio e da área limítrofe."

III. a) Ponderada a arquitectura da acção (art. 467º nº 1 d) e e) do CPC, diploma legal a que pertencem os normativos que, sem indicação de outra fonte, à colocação se vierem a chamar), não olvidando que a presunção resultante do registo predial (art. 7º do CRP) não abrange os factores descritos do prédio, como as áreas, limites ou confrontações (cfr., neste sentido, entre muitos outros arestos, acórdãos do STJ, de 9-2-99 e 29-6-99, proferidos nos autos de revista nºs 1186/98-1ª e 224/99-1ª, respectivamente), razão pela qual, é vítreo, no atinente ao "reivindicado", os demandantes também invocaram o modo de aquisição da propriedade que a usucapião consubstancia (art.s 303º, 1287º, 1288º, 1292º, 1296º, 1316º e 1317º c), todos do CC), sopesado que como controvertida se deve ter (art. 490º nºs 2 e 3) a factualidade vazada, "maxime", nos art.s 2º e 26º da p.i., relevante para o expresso no art. 511º nº 1, presente tendo, como importa, a redução do pedido noticiada em I. 9., materialidade fáctica essa à base instrutória não levada, como seguro se tem que urge, oficiosamente, anular a "decisão", em ordem à ampliação a que se reporta o art. 729º nº 3, aquela só consentida, frise-se, consoante jurisprudência firme (vide, v.g., acórdão deste Tribunal, de 05-11-23, in revista nº 2618/04-2ª), outrossim no atinente a factos de que ao tribunal seja lícito conhecer ou articulados pelas partes (art. 264º).
b) Destarte, à base instrutória devia ter sido levado o seguinte:

1. Os autores, por si, e, antes, os seus anteproprietários, no prédio com a área e confrontações a que se alude no art. 1º da p.i., desde há mais de vinte anos antes de 02-10-03, ininterruptamente, à vista de quem quer que fosse, sem oposição de pessoa alguma, na convicção de usufruírem "coisa" exclusivamente sua, têm utilizado e fruído o supracitado prédio, ocupando-o, nele permanecendo, tirando areias e, de uma forma geral, colhendo-lhe todos os normais frutos e produtos?
2. Parte do terreno a que se alude em E) dos "factos assentes", sito consoante referido no pedido, reduzido, sob a al. b), a 05-06-29 (cfr. 626), faz parte do prédio com a área de 9.058 m2 a que se reporta o art. 1º da p.i. ?

c) CONCLUSÃO:
Tudo visto, em conformidade com o exarado nos art.s 729º nº 3 e 730º, ordena-se a remessa do processo ao TRC, para aí ser de novo julgado, se possível pelos mesmos Exmºs Juízes Desembargadores que intervieram no anterior julgamento, considerando o explanado em III. a) e b) 1. e 2.
Custas pelo vencido a final.

Lisboa, 15 de Maio de 2008

Pereira da Silva (relator)
Rodrigues dos Santos
João Bernardo