Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
059377
Nº Convencional: JSTJ00004109
Relator: LOPES CARDOSO
Descritores: PROMESSA DE COMPRA E VENDA
SINAL
RECIBO
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ196311150593771
Data do Acordão: 11/15/1963
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DG IªS 02-12-1963 ; BMJ 131, 245
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: UNIFORMIZADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 9/1963
Área Temática: DIR CIV - DIR CONTRAT.
Legislação Nacional: CCIV867 ARTIGO 1434 ARTIGO 1534 ARTIGO 1548 PARUNICO ARTIGO 1590 PARUNICO.
D 19126 DE 1930/12/16.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1960/05/24 IN BMJ N97 PAG392.
ACÓRDÃO STJ DE 1962/05/25 IN BMJ N117 PAG486.
Sumário : Para documentar a promessa de compra e venda de bens imobiliarios e escrito suficiente o assinado so pelo promitente vendedor, em que este declara ter recebido a titulo de sinal da prometida venda, com designação da pessoa a quem prometeu vender, determinação do preço e especificação da coisa.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

A recorre para o Tribunal Pleno do acordão de 25 de Maio de 1962, publicado no Boletim do Ministerio da Justiça, n. 117, pagina 486, e que lhe negou a revista em que era recorrida "B, Limitada".
Alegou que esse acordão se fundou em uma solução radicalmente oposta a adoptada pelo acordão de 24 de Maio de 1960, publicado no Boletim do Ministerio da Justiça, n. 97, pagina 392, sobre o problema de saber se o simples recibo do sinal, assinado apenas pelo promitente vendedor, satisfaz a exigencia do paragrafo unico do artigo 1548 do Codigo Civil, para validade formal da promessa de compra e venda de bens imobiliarios.
Disse ainda que os dois acordãos foram proferidos sob o dominio da mesma lei.
A Secção considerou verificados esses pressupostos para seguimento do recurso.
Com razão.
E fora de toda a duvida que os dois acordãos foram lavrados a sombra da mesma legislação. O preceito que ambos interpretaram e aplicaram, para resolver o problema apontado, foi o mesmo: o do citado paragrafo unico do artigo 1548 do Codigo Civil.
Em ambos os casos se tratava de acção proposta pelo promitente comprador, com o fim de obter a condenação do promitente vendedor a pagar-lhe o dobro do sinal, por falta do cumprimento de promessa de compra e venda de bens imobiliarios.
Em ambos os casos, o unico escrito da promessa era o recibo de sinal, com indicação do preço e especificação da coisa, mas assinado apenas, como e natural, pelo promitente vendedor.
O acordão de 1960 decidiu que esse escrito era insuficiente para constituição e prova do contrato-promessa e so seria formalmente valido quando tivesse sido assinado tambem pelo promitente comprador.
O acordão ora recorrido decidiu, ao contrario, que a exigencia do paragrafo unico do artigo 1548 do Codigo Civil estava preenchida e o recibo do sinal titulava perfeitamente a promessa reciproca de compra e venda.
A oposição entre as duas soluções e nitida e indiscutivel.
Pretende a recorrente que o conflito de jurisprudencia se resolva assentando na solução que ao problema foi dada pelo acordão de 1960.
Alega que, sendo elemento dos contratos o mutuo consenso, este ha-de resultar do escrito que os titula, quando escrito seja exigido.
Assim, o escrito do contrato-promessa não pode deixar de conter a assinatura de ambos os contraentes.
Tanto a recorrida como o Ministerio Publico sustentam o contrario.
Vejamos.
Convem definir os limites do problema contraditoriamente resolvido pelos dois acordãos em oposição.
Ele e tão-somente o de saber se um recibo, com declaração de que a importancia recebida representa sinal da prometida venda de especificada coisa imobiliaria, a determinada pessoa e por certo preço, e titulo bastante da obrigação de prestar o facto da venda ou restituir o sinal em dobro.
Ora, ao regular a forma externa da promessa reciproca de compra e venda, dispõe o falado paragrafo unico do artigo 1548 do Codigo Civil:
"Tratando-se de bens imobiliarios, o contrato deve ser reduzido a escrito".
A disposição foi introduzida pelo Decreto n. 19126, de 16 de Dezembro de 1930, e tem vindo a ser interpretada pelo Supremo, dominantemente, no sentido que lhe atribuiu o acordão ora recorrido. So esporadicamente o tribunal tomou posição contraria.
No sentido do acordão recorrido, e tambem dominante a doutrina.
Não se veem razões validas para enveredar agora por caminho diferente, sem risco de ferir situações criadas a sombra dum entendimento quase geral.
Pelo contrario, uma revisão meticulosa do problema leva a seguir esse atendimento.
A disposição em causa deve ter sido inspirada pelo corpo do artigo 1590 do Codigo Civil, que determina:
"O contrato de compra e venda de bens imobiliarios sera sempre reduzido a escrito".
Esta frase, perfeitamente semelhante a do actual paragrafo unico do artigo 1548, não impunha que o escrito fosse assinado pelas duas partes, pois logo o paragrafo 1 do mesmo artigo 1590 se contentava com a assinatura do vendedor, ao menos no caso de o escrito ser particular.
Nada indica que o legislador de 1930 quisesse dar um alcance mais rigoroso a formula que se limitou a copiar.
Havendo sinal passado, que e a hipotese de que se trata, a falta de cumprimento da promessa tem como unica sanção:
Para o promitente vendedor, a restituição do sinal em dobro;
Para o promitente comprador, a perda do sinal entregue.
Por conseguinte, o escrito so e indispensavel para reclamar do promitente comprador ou a prestação do facto prometido, ou o dobro do sinal.
Ao promitente comprador, que ja entregou o sinal, nada mais pode ser exigido. De nada serviria, a outra parte, um escrito assinado por ele.
Por identica razão, outros preceitos do Codigo Civil so exigem assinatura uma das partes no escrito particular de certos contratos; a assinatura do contraente contra o qual o escrito pode ser praticamente utilizado.
Assim:
O artigo 1434 so exige a assinatura do depositario no escrito particular do contrato de deposito ate certo montante.
O artigo 1534 so exige a assinatiura do mutuario no escrito particular do contrato de mutuo não excedente a certa importancia.
De toda a maneira, não pode deixar-se de reconhecer que o signatario dum recibo, no qual se declara que a importancia recebida representa sinal de prometida venda de certa coisa, por determinado preço, assume a obrigação de prestar facto prometido ou indemnizar.
Mesmo que a obrigação assim constituida se considerasse unilateral, o regime da indemnização pelo não cumprimento teria de ser o do dito artigo 1548.
A verdade, porem, e que um tal recibo, em mão da pessoa a quem se disse feita a promessa, revela um negocio juridico bilateral e um acordo de vontades.
No recibo esta expressa a vontade do promitente vendedor e implicito que o promitente comprador com ela concordou, ao entregar o sinal.
Por tudo o exposto, nega-se provimento ao recurso, com custas pela recorrente e assenta-se em que "para documentar a promessa reciproca de compra e venda de bens imobiliarios, e escrito suficiente o assinado so pelo promitente vendedor, em que este declara ter recebido certa importancia a titulo de sinal da prometida venda, com designação da pessoa a quem prometeu vender, determinação do preço e especificação da coisa".


Lisboa, 15 de Novembro de 1963

Lopes Cardos (Relator) - F. Toscano Pessoa - Barbosa Viana
- Bravo Serra - Gonçalves Pereira - Cura Mariano - Alberto Toscano - Jose Meneses - Ricardo Lopes - Fragoso de Almeida - Abreu Lobo - Albuquerque Rocha.