Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1435/20.8YRLSB.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: VIEIRA E CUNHA
Descritores: DECISÃO ARBITRAL
ANULAÇÃO DE SENTENÇA
CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM
INTERPRETAÇÃO DE SENTENÇA
QUESTÃO PREJUDICIAL
PODERES DE COGNIÇÃO
TRIBUNAL ARBITRAL
Data do Acordão: 11/30/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA
Sumário :
I – A anulação da sentença arbitral pode ser pedida quando a mesma sentença não observar os limites subjectivo ou objectivo da convenção de arbitragem – artº 46.º n.º3 al.a)iii) LAV, nos termos dos arts.º 18.º n.º 9 LAV.

II – A interpretação dos actos de terceiros decisores, em direito português, sentenças de tribunais estaduais ou arbitrais, dispositivos de formações técnicas, v.g., contratualmente previstas, constituem actos jurídicos, aos quais se aplicam as regras regulamentadoras dos negócios jurídicos (arts.º 295.º e 236.º n.º1 CCiv), pelo que cabem ser interpretados com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, pudesse deduzir do seu contexto.

III – A decisão de um Painel Financeiro, integrado por técnicos e não por juristas, não tem por força que possuir a estrutura de uma decisão judicial no ordenamento português – mas é necessário que tal decisão exprima explícita, claramente, qual o seu sentido, qual o seu dispositivo, independentemente de o mesmo se revelar a final da decisão, ou integrando quaisquer fundamentos, de forma não contraditória.

IV – Concebe-se que o Painel pudesse conhecer de uma questão prejudicial, relativamente ao objecto directo de conhecimento, questão que, mesmo em processo civil, pode caber ao “tribunal competente para a acção” (art.ºs 91.º n.º1 e 92.º CPCiv).

V – Se a intervenção do tribunal arbitral se convencionou que apenas ocorreria na inexistência de unanimidade na decisão do Painel Técnico ou Financeiro, teria por força de considerar-se como abrangendo dois segmentos ou premissas dessa ausência de unanimidade do Painel, ainda por solucionar, e que tinham tido relevância directa na apreciação do pedido formulado ao Painel.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

As Partes, o Pedido e o Objecto do Processo

REN – Rede Eléctrica Nacional, S.A., e REN Trading, S.A., instauraram, nos termos dos art.ºs 18.º n.º 9, 46.º n.º 3 al. a) iii) e 59.º n.º 1 al. f), da Lei de Arbitragem Voluntária (Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro), a presente acção de anulação de decisão arbitral interlocutória sobre competência, contra Tejo Energia – Produção e Distribuição de Energia Eléctrica, S.A.

Pediram a anulação da sentença do tribunal arbitral que, aos 10.06.2020, se declarou “parcialmente competente, designadamente, para conhecer as questões identificadas no parágrafo 186 da sentença, designadamente nas alíneas b), c), d), f), g) e h), na medida em que se pronunciou sobre questões que ultrapassam o âmbito da convenção de arbitragem contida na Cláusula 26 e no Anexo 9 do CAE e/ou que não se encontram abrangidos pela convenção de arbitragem”.

A Ré, para além de concluir que a acção deve ser julgada improcedente, à cautela, requereu também, ao abrigo do disposto no artigo 46.º n.º 8 da Lei da Arbitragem Voluntária que, caso o Tribunal entenda existir algum fundamento para anulação, seja determinada a suspensão dos autos e se conceda ao Tribunal Arbitral a possibilidade de tomar medidas susceptíveis de eliminar algum fundamento para anulação.

   Tese das Autoras

Os litígios emergentes da interpretação e execução do Contrato de Aquisição de Energia (CAE) de que Autoras e Ré são Partes só podem ser submetidos a arbitragem nos termos nele previstos.

O CAE prevê dois mecanismos de resolução de litígios distintos: um primeiro, genérico, referido na Cláusula 26 e regulado no Apêndice 9, e um outro, específico, previsto na Cláusula 20.4.1, regulado no Apêndice 11.

Este último tem um âmbito mais específico, aplicando-se a situações das chamadas Alterações de Imposto Relevante e cingindo-se o seu escopo à modificação da fórmula de cálculo de preço da eletricidade produzida na ....

Trata-se, ainda, de procedimento que não é automático nem garantido, estando sempre dependente da verificação de um duplo limite (possibilidade e proporcionalidade): qualquer alteração apenas é admissível “(...) na medida necessária para garantir, tanto quanto possível, que o Produtor esteja na mesma posição financeira sob o presente Contrato que estaria se a Alteração ao Imposto Relevante não tivesse ocorrido (...)”.

O litígio surgido diz respeito à chamada Tarifa Social da Eletricidade, criada pelo Decreto-Lei nº 138-A/2010, de 28 de Dezembro, considerada pelo Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República como uma “obrigação de serviço público de natureza social” e cujo financiamento foi imposto aos centros electroprodutores.

A Requerida pretendia ser reembolsada do montante que despendeu a título de Tarifa Social, exigindo que a REN Trading lho pague, e, no limite, onerando os consumidores.

Para tanto, iniciou um procedimento de resolução de litígios em que peticionou o reembolso dos referidos montantes, procedimento esse que foi iniciado não ao abrigo do mecanismo específico previsto no Apêndice 11 mas sim ao abrigo da Cláusula 26 e do procedimento previsto no Apêndice 9 do CAE.

Este mecanismo genérico de resolução de litígios prevê um procedimento escalonado, que começa perante um Painel Financeiro, cuja decisão, quando unânime, é final e vinculativa para as Partes; caso contrário, é permitido à Parte que deseje contestar a decisão do Painel Financeiro desencadear, num primeiro momento, uma fase de negociação e, falhando esta, submeter o litígio a arbitragem.

No âmbito do procedimento que correu termos perante o Painel Financeiro foi-lhe exclusivamente solicitado que se pronunciasse sobre se a Ré tinha direito contratual a ser reembolsada dos montantes em que havia incorrido com o financiamento da Tarifa Social.

Na medida em que à Ré não fosse reconhecido o direito ao reembolso referido no ponto anterior, deveria esta devolver à REN Trading os montantes que esta lhe pagara, relativos à Tarifa Social.

O Painel Financeiro, a final, decidiu, por unanimidade, indeferir todos os pedidos da ali Demandante, por considerar inexistir qualquer direito contratual ao reembolso peticionado, mencionando que o único meio disponível para fazer face a uma eventual situação de Alteração de Imposto Relevante seria, não o reembolso, mas o recurso a um procedimento específico de resolução de litígios previsto no Apêndice 11.

Nos termos do Apêndice 9, o litígio considera-se definitivamente decidido quando o Painel Financeiro decide por unanimidade. As Partes só podem submeter uma questão que as opõe a um Tribunal Arbitral se, previamente e como condição, existir sobre ela uma decisão não unânime do Painel Financeiro.

Assim, nos termos do CAE e aplicando a cláusula compromissória dele constante, não estando verificada a condição, a Requerida não podia submeter o litígio à arbitragem e o tribunal arbitral que eventualmente entretanto constituído não tinha competência para a julgar.

Confrontada com este erro, a Ré – que poderia ter optado por iniciar novo procedimento ao abrigo do Anexo 11 – optou por invocar que a decisão do Painel Financeiro, na sua fundamentação, continha várias “decisões” que lhe permitiriam:

a) prosseguir o procedimento como se o mesmo tivesse sido, desde início, conduzido nos termos do Apêndice 11; e

b) consequentemente alterar o pedido deduzido que passou a ser a alteração do preço da eletricidade vendida, mediante a alteração dos componentes da fórmula de cálculo de preço: o Encargo de Potência Instalada (Capacity Charge) e/ou do Encargo de Energia Produzida (Energy Charge),

vícios esses que foram invocados pelas Autoras perante o Tribunal Arbitral, questionando a sua competência, tendo sido acordado nas Regras Processuais a observar que haveria um julgamento prévio relativamente à sua competência para conhecer do mérito (que constituiria a primeira fase do julgamento) seguido de uma segunda fase em que, se o processo devesse prosseguir, seria julgado o mérito da pretensão que lhe foi submetida.

O Tribunal Arbitral, por maioria (com um voto de vencido), declarou-se parcialmente competente para conhecer o mérito da causa.

A opinião vencedora acolheu a tese de que as considerações tecidas pelo Painel Financeiro quanto aos vários argumentos submetidos pelas Partes para sustentarem as suas pretensões podem ser consideradas decisões.

Mas a expressão ‘decisão’ contida no Anexo 9 do CAE tem, necessariamente de ser interpretada à luz e nos termos da lei portuguesa.

Para efeitos do art.º 236.º n.º 2 do Código Civil, a vontade real das Partes quanto ao significado e alcance da expressão ‘decisão’ contida no Apêndice 9 do CAE (e bem assim das regras Processuais especificamente acordadas) é de que a mesma corresponde unicamente à determinação final do Painel Financeiro formulada em resposta ao litígio que lhe foi submetido, i.e. às concretas pretensões formuladas, e, no caso concreto, a decisão do Painel Financeiro apenas podia versar sobre a matéria do reembolso à Ré dos montantes incorridos com a Tarifa Social, pois foi apenas isso que lhe foi pedido.

A expressão ‘decisão’, contida no Apêndice 9 do CAE, só pode ser entendida como sendo a determinação final do Painel Financeiro formulada em resposta ao litígio que lhe foi submetido, balizado pelos pedidos formulados. De acordo com a lei portuguesa uma sentença é composta por diversos segmentos, sendo que a decisão é incluída no segmento final – parte dispositiva – de forma autónoma e tendo em consideração a fundamentação e outra informação relevante contida nos segmentos precedentes.

No ordenamento jurídico português, uma decisão apenas pode ser proferida em relação a um pedido que foi formulado pelas partes, sendo certo que o objeto de um litígio é determinado pela pretensão da parte que o submeteu para decisão.

A expressão ‘decisão’ não pode ser interpretada como correspondendo a qualquer determinação a que se chegue após consideração dos factos e da lei como o voto maioritário do Tribunal Arbitral entendeu, limitando-se a citar uma definição de “decisão” dada por um dicionário inglês de termos legais e afastando a lei portuguesa, aplicável à interpretação do CAE.

O entendimento segundo o qual a decisão do litígio deve, na decisão/sentença, apresentar-se segregada, no final, e após a correspondente fundamentação, é pacífico na jurisprudência e na doutrina internacionais, assim como em regulamentos, diretrizes e softlaw aplicáveis a procedimentos alternativos de resolução de litígios.

Ao ter submetido às Autoras, após a Decisão do Painel Financeiro, uma proposta relativa à alteração do Encargo de Potência Instalada a Ré já não estava a seguir o procedimento de resolução de litígios submetido ao Painel Financeiro, até porque a proposta apresentada jamais foi submetida à apreciação deste, configurando, quando muito, um novo procedimento (específico) ao abrigo do Apêndice 11 de CAE.

Na Decisão do Painel Financeiro não foi proferida qualquer decisão para além da decisão unânime – e portanto final e definitiva – de rejeitar a pretensão da Ré de reembolso dos montantes incorridos com a Tarifa Social (e consequente a decisão de ordenar à Ré a devolução dos montantes a esse título já pagos pela REN Trading, conforme pedido reconvencional por esta REN formulado).

Daí que não pudesse ter iniciado a arbitragem sub judice.

Todas as decisões proferidas pelo Painel Financeiro, contidas no segmento dispositivo da sua Decisão, foram-no por unanimidade, sendo finais e definitivas para as Partes, estando a competência do Tribunal Arbitral contratualmente balizada pelo objeto do procedimento que correu perante o Painel Financeiro, concretizado pelos pedidos expressamente formulados pelas partes, em obediência ao princípio do dispositivo.

Assim, o Tribunal Arbitral não tinha competência para conhecer e decidir quaisquer questões relacionadas com o litígio que foi, de forma final, definitiva e vinculativa para as Partes, decidido pelo Painel Financeiro.

Nos termos e para os efeitos do disposto nos art.ºs 18.º n.º 9, 46.º n.º 3, al. a), subalínea iii) e 59.º n.º 1 al. f), da LAV, o Tribunal Arbitral, ao proferir a sentença ora impugnada declarando-se parcialmente competente, designadamente, para conhecer as questões identificadas no parágrafo 186 da sentença, designadamente nas alíneas b). c), d), f), g) e h), pronunciou-se sobre questões que ultrapassam o âmbito da convenção de arbitragem contida na Cláusula 26 e no Anexo 9 do CAE e/ou que não se encontram abrangidos pela convenção de arbitragem.

O STJ (Ac. de 5.12.2016, no processo 710/14.5TVLSB-A.L1.S1) notou que, “tratando-se de questão relacionada com a indagação, interpretação e aplicação de regras de direito – no caso, a competência do tribunal arbitral voluntário (art.- 5º nº 1 da LVAV) –, não existe impedimento legal a que o tribunal conheça da matéria (nº 3 do artigo 5º do CPC (2013)”.

Constitui princípio da arbitragem internacional a aceitação de que os tribunais estaduais, podem, de facto e de novo, apreciar questões relativas à competência do tribunal arbitral, a menos que tal faculdade lhes seja, em concreto, vedada pela lei ou pelo regulamento de arbitragem in casu aplicáveis.

Quanto ao pedido de suspensão dos autos, o artigo 46º nº 8 da LAV é inaplicável à decisão interlocutória do tribunal arbitral considerando-se competente, pois que se ocorresse tal suspensão apenas visaria que o tribunal arbitral se declarasse afinal incompetente. A norma em causa tem como propósito a salvação de decisão arbitral final.

Tese da Requerida

As Autoras pretendem que o Tribunal reaprecie o mérito da Sentença Parcial, o que é vedado, em sede de acção de anulação ao tribunal estadual, ao qual apenas cumpre verificar se decorre dos termos da decisão impugnada e do processo arbitral o cumprimento da Convenção de Arbitragem.

O Contrato de Abastecimento de Energia contém, “na cláusula 26ª e nos parágrafos 12 e 14 do seu Anexo 9 uma cláusula compromissória ao abrigo da qual todas as Disputas com ele relacionadas devem ser resolvidas mediante recurso a arbitragem, regida pelas Regras de Arbitragem da Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional, porém com previsão de “mecanismos de resolução alternativa dos potenciais litígios prévios à arbitragem”, a saber, dois mecanismos, sendo o Painel Financeiro ou Técnico (conforme a natureza do litígio) e a composição amigável.

No primeiro caso, os membros do Painel funcionam como peritos independentes, não como árbitros, tendo poderes “para conhecer de disputas emergentes ou relacionadas, inter alia, com interpretação, legislação ou fiscalidade e com os Anexos 1 (Capacity Charge) e 2 (Energy Charge) e cláusulas relacionadas.

As suas decisões tomadas por unanimidade são vinculativas. As tomadas por maioria também são vinculativas se não forem “contestadas e até que a disputa tenha sido resolvida mediante composição amigável ou remetida para arbitragem”.

Porém, os “poderes do Painel Financeiro não estão previstos, unicamente, no Anexo 9 do CAE” sendo que o Anexo 11 do CAE – que trata das Changes in Circumstances – dispõe que, sendo necessário em face de uma Change in Circumstances proceder à alteração da fórmula de cálculo da Capacity Charge e/ou da Energy Charge e caso já tenham decorrido mais de 3 meses desde o momento em que as Partes apresentaram as suas propostas sem que tenha sido possível chegar a um consenso, mediante notificação dirigida à outra para o efeito, a Parte interessada pode remeter essa disputa para o procedimento de resolução de disputas (i.e., para um Painel), por forma a que seja tomada uma decisão ao abrigo do disposto no parágrafo 10.4 deste Anexo.

Assim, perante a falta de acordo entre as Partes, esse Anexo confere ao Painel (Financeiro ou Técnico) o poder de determinar a alteração da Capacity Charge e/ou da Energy Charge de acordo com a proposta das Partes que, na sua perspetiva, melhor reflita a letra e propósito do CAE.

Esse poder não é irrestrito, uma vez que o referido Anexo estabelece que não pode o “Painel [constituído] ao abrigo do Procedimento de Resolução de Disputas propor ou selecionar qualquer proposta que não seja uma das propostas submetidas pelas partes”.

A decisão tomada pelo Painel (Financeiro ou Técnico) ao abrigo dos poderes que lhe são conferidos pelo Anexo 11 do CAE, contrariamente ao que sucede no âmbito do Anexo 9, é vinculativa mesmo que tenha sido tomada apenas por maioria”.

Vê-se assim que não há mecanismos de resolução apartados entre o previsto no Anexo 9 e o previsto no Anexo 11, que não há dois Painéis “que funcionem e se constituam ao abrigo de regras distintas” ao contrário do que, por erro de interpretação do CAE, pretendem as Autoras.

Embora da leitura da Petição Inicial possa parecer resultar que o Tribunal Arbitral declarou ter competência para determinar, ao abrigo do Anexo 11 do CAE, a alteração das fórmulas referidas, a verdade é que tal não corresponde à decisão constante da Sentença Parcial. O Tribunal Arbitral, contrariamente ao que tinha sido solicitado pela Requerida, declarou-se incompetente para tal.

Por outro lado, se o Painel Financeiro tomar decisões por maioria, as partes podem contestá-las, submetendo-as, de acordo com o CAE, a composição amigável, o que também podem fazer se o Painel não tiver tomado qualquer decisão no prazo estabelecido no CAE (cfr. parágrafo 11 da Parte I do Anexo 9 do CAE).

Assim, o segundo mecanismo de resolução alternativa de disputas (prévio ao recurso à arbitragem) previsto no CAE é a composição amigável. Caso as partes não cheguem a acordo, qualquer delas pode submeter a disputa a arbitragem.

As Partes quiseram expressamente afastar-se do esquema gizado na lei processual civil portuguesa e quiseram igualmente, na fase do Painel, prever um mecanismo alternativo de resolução de disputas que se afastasse do processo arbitral. Foi esta a vontade real das Partes que resulta clara do contrato e é também este o único sentido que o declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, pode deduzir do CAE.

A Ré recorreu ao Painel Financeiro, ao abrigo do disposto no CAE, e, em especial do disposto na cláusula 26 e Anexo 9) em 17 de fevereiro de 2017, mas, em conjunto com o Painel Financeiro, as Partes acordaram ainda nas regras processuais que regeriam a disputa, derrogando algumas das regras constantes do Anexo 9 do CAE e prevendo um procedimento mais demorado.

Em momento algum as regras processuais acordadas alteraram o regime do CAE quanto à decisão (ou decisões) do Painel Financeiro, nem tal foi pretendido pelas Partes. Igualmente, nunca foi pretendido pelas Partes equiparar o procedimento perante o Painel Financeiro a um processo jurisdicional.

As referidas regras processuais estabeleceram claramente que o objeto da disputa e, consequentemente, o mandato conferido pelas Partes ao Painel Financeiro, era “determinar quem deve, em última instância, suportar os custos incorridos pela Tejo Energia, enquanto produtor, com a Tarifa Social”.

Composto o Painel Financeiro e acordadas as regras que regeriam o procedimento, a Requerida apresentou o seu statement of claim, no qual, expondo o seu direito a ser colocada na posição em que estaria se o mecanismo de financiamento da tarifa social não a afectasse (ao abrigo do disposto na cláusula 20. do CAE), pedia que em consequência do reconhecimento desse direito, fosse a Requerente REN Trading, sob pena de venire contra factum proprium, condenada a retomar os reembolsos, através do procedimento aplicado entre 2010 e 2014.

A Ré não nega, por isso, que não tenha pedido ao Painel Financeiro que, ao abrigo do disposto no parágrafo 10. do Anexo 11 do CAE, procedesse à alteração da fórmula de cálculo da Capacity Charge e/ou da Energy Charge por forma a colocar a Requerida na posição em que estaria caso o mecanismo de financiamento da tarifa social. Fê-lo porque entendia que, à luz da prática reiterada aplicada pelas Partes entre 2011 e 2014, fazia sentido que o reembolso determinado em função do reconhecimento, pelo Painel Financeiro, do direito invocado pela Requerida se deveria processar do modo que vinha sendo utilizado pelas Partes.

A Requerida entendia que o comportamento das Partes entre 2010 e 2014 – (re)faturação direta dos custos e reembolso – deveria ser mantido, motivo pelo qual não fez qualquer pedido ao abrigo do disposto no parágrafo 10. do Anexo 11 do CAE.

Passando a analisar o teor da decisão do Painel Financeiro, proferida em 27.9.2018, a Ré sustentou que “c. A Decisão do Painel Financeiro contém várias decisões”.

As Autoras erram ao considerar que a decisão é apenas a que consta do capítulo denominado “Holding”, ou na tradução das AA., “Dispositivo”, pois que a colagem à lei processual civil portuguesa, aos termos lógico-processuais de uma sentença e aos efeitos da sua prolação, não foi querida pelas partes no mecanismo de resolução de litígios estabelecido no CAE, nem tem sequer, mesmo para efeitos de aplicação do artigo 236.º do Código Civil, qualquer apoio no texto da Decisão do Painel Financeiro.

Pelo contrário, ela está dividida em vários capítulos, sendo especialmente relevantes aquele em que se sumaria liminarmente o objecto da disputa (capítulo V) e onde se refere que o ponto controverso é “a Tejo Energia pode exigir à REN Trading o reembolso dos custos com a Tarifa Social financiados por aquela durante 2015, 2016 e 2017 ou se, pelo contrário, a Tejo Energia deve, em última análise, suportar esses custos e, se assim for, devolver os montantes anteriormente cobrados à REN Trading, entre julho de 2011 e janeiro de 2015 (relativos ao período de janeiro de 2011 a dezembro de 2014” e aquele em que o Painel Financeiro analisou o mérito (subcapítulo 2 do capítulo VI – intitulado aliás, na tradução que oferecem as AA., “Do mérito do caso”.

Neste mérito, o Painel Financeiro discorreu (Parágrafos 110 e 111) que, na opinião da maioria dos membros do Painel, a Tarifa Social, sendo um desconto às tarifas de eletricidade reguladas, que tem de ser financiada pelos produtores de eletricidade em regime ordinário – como a Tejo Energia – se enquadra na definição de Imposto Relevante prevista na Cláusula 1.1 do CAE e que, nos termos do último ponto da Cláusula 20.1 do CAE, a imposição da Tarifa Social deve ser entendida como uma Change in a Relevant Tax para efeitos da Cláusula 20 e do Anexo 11 do CAE.

Concluiu também que, na opinião da maioria dos seus membros, embora a imposição da Tarifa Social consubstancie uma Change in a Relevant Tax, a Tejo Energia não pode acionar, por agora, os mecanismos previstos nas Cláusulas 20.2 a 20.5 do CAE para garantir, na medida do possível, que ficará na mesma posição financeira ao abrigo do CAE em que estaria se a Tarifa Social não tivesse sido criada porque não provou que tal Change in a Relevant Tax é material, em conformidade com as disposições da Cláusula 20.1 e o Anexo 11 do CAE.

Todavia, “tal não deve impedir a Tejo Energia de provar a materialidade dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social durante 2015, 2016 e 2017 no futuro, a fim de accionar o procedimento aplicável ao abrigo do CAE.”

E, §§ 131, 133 e 148, caso a Tejo Energia consiga provar futuramente o efeito material da Tarifa Social, a Tejo Energia terá direito a recorrer à Cláusula 20.4 do CAE, isto é, procurar uma alteração do cálculo do Capacity Charge e/ou da Energy Charge em conformidade com os procedimentos e os princípios relevantes estabelecidos no parágrafo 10 do Anexo 11.

O remédio previsto na Cláusula 20.4.1 do CAE (isto é, a alteração do Capacity Charge e/ou da Energy Charge Produzida) nunca foi accionado pela Tejo Energia a respeito da Tarifa Social.

Considerou o Painel Financeiro que não existia qualquer impedimento legal para a REN Trading internalizar os custos incorridos com o reembolso da Tarifa Social.

Parágrafos 165 e 188: Nada sugere que os produtores de eletricidade no sistema ordinário – como a Tejo Energia – não possam ser compensados por esses custos por outra entidade privada, se assim for acordado entre as partes. Logo, deve considerar-se Cláusula 20 do CAE válida e executável.

Parágrafo 191: “(...) essa circunstância não implicaria o envolvimento de recursos estatais para efeitos do n.º 1 do artigo 107.º do TFUE porque, conforme analisado acima, os custos daí decorrentes seriam internalizados pela REN Trading –que é uma empresa integralmente detida por privados – e não seriam refletidos nas tarifas pagas pelos consumidores – tal como foi estabelecido pela ERSE”; e

Parágrafos 202 e 203: “(...) este Painel Financeiro entende que a Tejo Energia deve devolver os montantes previamente recebidos da REN Trading entre 2011 e 2014 nessa condição, acrescidos de juros desde a data da respetiva Contestação até ao pagamento integral à taxa legal aplicável(...) Todavia (...) na opinião da maioria do Painel Financeiro – que considera que a Tarifa Social é um Relevant Tax – o acima exposto não deve impedir a Tejo Energia de, subsequentemente, provar a materialidade dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social entre 2015 e 2017, a fim de acionar o procedimento ao abrigo da Cláusula 20.4 para cada um desses anos. Pelos mesmos motivos, a nossa decisão não impede a Tejo Energia de provar a materialidade para o período entre 2011 e 2014 e invocar o procedimento previsto na Cláusula 20.4 do CAE para cada um desses anos.”

Em suma, a Tejo Energia foi vencida neste processo porque não é possível dar provimento ao peticionado pela Requerente à luz dos termos do CAE celebrado entre as Partes. Mas as pretensões da Tejo Energia não são desprovidas de mérito.

No capítulo denominado “Holding”, o Painel Financeiro indeferiu os pedidos da Requerida e deferiu o pedido reconvencional da Requerente REN Trading”, mas o Painel Financeiro tomou várias decisões, umas por maioria e outras por unanimidade.

O facto de o Painel Financeiro ter procedido desta forma e de a sua Decisão ter o teor assinalado demonstra que decidiu e foi sua intenção decidir precisamente quem deve, em última instância, suportar os custos incorridos pela Requerida com o mecanismo de financiamento da tarifa social. Proceder do modo descrito era a única forma que o Painel Financeiro tinha de, cumprindo o seu mandato, decidir a disputa.

Ao estipular o procedimento de resolução de disputas, e em especial o mecanismo de resolução alternativa do Painel (Financeiro ou Técnico), as Partes quiseram apartar-se do sistema judicial português e das regras constantes da lei processual civil portuguesa e previram um mecanismo de resolução alternativa prévio à composição amigável e à arbitragem que não tem apoio legislativo subjacente (apenas contratual), que não serve uma função jurisdicional (apenas contratual) perante um órgão que não é tido como de administração da justiça: o Painel (Financeiro ou Técnico).

Por isso, quanto às decisões do Painel (Financeiro ou Técnico), nenhum cabimento tem aplicar (ou considerar elemento essencial da interpretação do CAE) as regras constantes da lei processual civil portuguesa quanto às sentenças e seus efeitos.

O Painel Financeiro decidiu:

(a) por maioria que o mecanismo de financiamento da tarifa social é um Relevant Tax para efeitos do CAE;

(b) por unanimidade que a aplicação da cláusula 20. do CAE não depende da capacidade da Requerente REN Trading repercutir os custos suportados a esse título nas tarifas cobradas aos consumidores;

(c) por unanimidade que a aplicação da cláusula 20. do CAE não é vedada pela legislação relevante; e

(d) que a Requerida tem direito reaver os custos suportados com o mecanismo de financiamento da tarifa social se recorrer aos mecanismos previstos nas cláusulas 20.2 a 20.5 do CAE e conquanto demonstre o efeito material da imposição do referido mecanismo.

A Ré, na sequência da Decisão do Painel Financeiro, em 7 de novembro de 2018, deu cumprimento ao procedimento previsto no parágrafo 10. do Anexo 11 do CAE, tendo apresentado a sua proposta de alteração da fórmula de cálculo da Capacity Charge, ao que a REN Trading disse não poder aceitar a proposta apresentada pela Requerida por, entre outros motivos, considerar que a proposta levaria à repercussão do custo incorrido pela Requerida com o mecanismo de financiamento da tarifa social nas tarifas cobradas aos consumidores, motivo pelo qual era necessária a intervenção prévia da ERSE e a REN Eléctrica e respondeu que o referido mecanismo de financiamento não se enquadrava no conceito de Relevant Tax previsto no CAE.

Transpostos diversos trâmites, as Requerentes mantiveram o seu entendimento de que não estavam reunidas as condições para que se realizasse a composição amigável.

Como as “Partes não reuniram e não foi possível compor amigavelmente a disputa” a Requerida remeteu para arbitragem, tendo nomeado como árbitro AA (que já havia sido membro do Painel Financeiro), tendo esclarecido que podia recorrer à arbitragem porque as Requerentes haviam contestado as decisões não unânimes do Painel Financeiro elencadas.

Constituído o Tribunal Arbitral e em conjunto com ele, as Partes acordaram as regras processuais e cada Parte fez constar a sua posição quer quanto à competência do Tribunal quer quanto ao mérito da disputa. A simples leitura da Acta de Missão – de onde resulta a definição da disputa – permite concluir que é precisamente a mesma que foi apresentada perante o Painel Financeiro.

O Tribunal Arbitral proferiu, no dia 10 de maio de 2020, a Sentença Parcial, onde notou que: “Para determinar se uma decisão é unanime, o Tribunal, a fortiori, tem poderes para decidir o que constitui uma decisão no âmbito da Decisão do Painel Financeiro”. Notando ainda que “o CAE não contém uma definição quanto ao que se deve entender como decisão, entendeu que era necessário recorrer às regras de interpretação das declarações negociais: “Na ausência de qualquer definição ao abrigo do CAE, o significado de “decisão” será interpretado de acordo com as regras de interpretação de contratos. Nomeadamente, nos termos do artigo 236 do Código Civil Português, um contrato deve ser interpretado objetivamente”, e “Por aplicação dessas regras, o Tribunal Arbitral concluiu “que o facto de uma determinação não se encontrar no capítulo “holding” da Decisão não é determinante” porque: “Primeiro, com o CAE, as Partes pretenderam afastar-se do sistema judicial dos tribunais Portugueses. Ao contrário, as Partes optaram pela determinação da sua disputa em primeiro lugar, proferida por um painel financeiro (ou técnico). Em consequência, não pode ser automaticamente assumido que as Partes pretenderam apesar disso que o significado de “decisão” ao abrigo da lei Portuguesa fosse adotado com referência à(s) decisão(ões) do Painel Financeiro”.

Segundo, “o efeito res judicata da decisão, no qual se baseia a Primeira Demandada, é alheio a qualquer decisão do painel financeiro. O princípio res judicata liga-se apenas às decisões dos tribunais domésticos e tribunais arbitrais. Conforme especificado no CAE, os membros do painel deveriam agir como peritos independentes, mas não como árbitros”. Reveladoramente, o CAE não menciona o efeito res judicata da(s) decisão(ões) do painel financeiro. Alternativamente, o CAE refere a natureza “vinculativa e final” da(s) decisão(ões) do painel financeiro.

Terceiro, no mesmo sentido, o CAE faz distinção entre decisões unânimes, que são “finais e vinculativas,” e decisões não unânimes, que são “finais e vinculativas para as partes a menos e até que a disputa tenha sido resolvida amigavelmente ou remetida para arbitragem [...] e tenha sido proferida uma decisão arbitral.”

Quarto, algumas determinações do Painel Financeiro estão diretamente relacionadas com os pedidos apresentados pela Primeira Demandada, porém, não incluídas no capítulo “Holding” da Decisão do Painel Financeiro.

Assim, a Sentença Arbitral interpretou a Decisão do Painel Financeiro, ao abrigo da lei portuguesa, tendo fundamentado – quer com base na letra do CAE, quer na postura das Partes – o seu entendimento.

Prosseguiu: “A maioria do Tribunal é da opinião que a questão de saber se um assunto é ou não uma decisão é um exercício que deve ser feito caso a caso, à luz da definição do dicionário B..., que refere que uma decisão é uma “determinação após consideração dos factos e da lei.”

Este é o significado, de acordo com o artigo 236.º do Código Civil Português que “um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele”, motivo pelo qual decidiu que “a) As matérias contidas no Capítulo VI (Decisão do Painel Financeiro), Parte 2 (O Mérito do Caso) da Decisão são “decisões” para os efeitos do Procedimento de Resolução de Disputas do CAE, na medida em que constituem determinações após a consideração dos factos e da lei”.

Procedendo à interpretação da Decisão do Painel Financeiro, o tribunal arbitral concluiu que o Painel Financeiro havia tomado várias decisões não unânimes fora do capítulo “Holding” e que as Requerentes as haviam contestado, nomeadamente: “f) As Demandadas contestaram: (i) a decisão não unânime do Painel Financeiro de que a Tarifa Social constituía uma Relevant Change; e (ii) a decisão não unânime do Painel de que a Demandante tem direito a utilizar os mecanismos estabelecidos nas Cláusulas 20.2 a 20.5 do CAE, se for capaz de demonstrar o efeito material da imposição da Tarifa Social”. Consequentemente, a Demandante tinha direito a remeter o litígio para arbitragem nos temos do Anexo 9 do CAE.

Em consequência do que antecede, em cumprimento da Convenção de Arbitragem, o Tribunal Arbitral veio a declarar-se competente:

“g) O Tribunal tem competência, mas a sua competência é limitada a decisões não unânimes do Painel Financeiro que foram contestadas pelas Demandadas;

h) O Tribunal tem poderes para condenar as Demandadas ao cumprimento do procedimento nos termos da Cláusula 20.ª e do Anexo 11 do CAE, caso venha a decidir que a Tarifa Social é um Relevant Tax nos termos do CAE”.

Quanto à decisão sobre a existência de decisões do Painel Financeiro fora do capítulo “Holding”, prevalece o princípio da competência da competência, consagrado no artigo 18.º n.º 1 da LAV.

Ao considerar-se competente para condenar as Requerentes a seguir o procedimento previsto no Anexo 11 do CAE, o Tribunal Arbitral mais não fez do que considerar-se competente para extrair as consequências devidas da sua competência para decidir se o mecanismo de financiamento da tarifa social é um Relevant Tax e se a Requerida tem direito a seguir o disposto na cláusula 20. e no Anexo 11 do CAE (conquanto seja demonstrado o efeito material do referido mecanismo).

Ao considerar-se competente para tal, o Tribunal Arbitral não se arroga qualquer poder que caiba no âmbito do Anexo 11 do CAE.

Finalmente, uma acção de anulação não visa a revisão de mérito de decisões de tribunais arbitrais, mas meramente exercer um controlo ou supervisão (tendencialmente) formais das mesmas, das convenções de arbitragem e dos processos arbitrais ou, no caso do fundamento invocado ser a violação da ordem pública internacional, um controlo substantivo da tolerabilidade dos resultados da manutenção da decisão arbitral (mas nunca do seu teor). A função cometida aos tribunais judiciais é a de supervisão/controlo.

O tribunal estadual, chamado a apreciar uma pretensão anulatória que tem como fundamento a ultrapassagem do âmbito da Convenção de Arbitragem, deve cingir-se à apreciação de um erro in procedendo, não entrando na análise do mérito.

Tal solução sempre seria decorrência da observância do princípio da competência da competência (cf. artigo 18.º, n.º 1, da LAV).

A Decisão Judicial Recorrida

Conhecendo do mérito da acção, o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa decidiu julgar procedente a acção, anulando a sentença arbitral parcial nas f) e h) do seu dispositivo, sob o parágrafo 187, sumariando assim o relator a respectiva fundamentação:

I.Estando a causa a anulação da sentença arbitral interlocutória parcial que apenas se debruça sobre a competência do tribunal arbitral, se o tribunal estadual concluir pela anulação, não tem aplicação, por desprovida de utilidade, a possibilidade de suspensão nos termos do artigo 46º nº 8 da LAV.

II. O tribunal estadual tem competência para apreciar a decisão do tribunal arbitral quanto à sua própria competência.

III. A previsão contratual dum mecanismo de resolução de litígios escalonado, com intervenção, em primeira linha, de peritos cujas decisões, se tomadas por unanimidade, ou mesmo por maioria sem oposição das partes, se tornam finais e vinculativas, convoca em termos interpretativos, mesmo além da previsão de aplicação da lei portuguesa à integralidade do contrato em que o mecanismo é previsto, a noção de decisão enquanto resposta clara (e neste sentido eficiente) a um pedido.

IV. Mesmo a defender-se que os peritos podem não concentrar todas as decisões sob um dispositivo final, não poderiam as decisões espalhadas ao longo da apreciação do litígio deixar de responder a um pedido. Para o que é alegado mas não constitui fundamento de nenhum pedido, a análise dessa alegação não constitui uma decisão, mas uma fundamentação.

Inconformada com o decidido, recorre de revista a Requerida, formulando as seguintes conclusões de recurso:

A. O presente recurso incide sobre o Acórdão proferido no âmbito da ação de anulação de uma Sentença Parcial relativa à competência de um Tribunal Arbitral, constituído para dirimir uma disputa relativa ao mecanismo de financiamento da tarifa social de fornecimento de energia elétrica, em observância da cláusula compromissória inserta no CAE.

B. Tal cláusula compromissória está inserida no Dispute Resolution Procedure, consagrado na cláusula 26. do CAE, que recorre a conceitos não definidos contratualmente – com especial relevância para o conceito de ‘decisão’, obrigando as Partes, os membros dos órgãos contratuais relevantes, e os Tribunais Arbitrais, a proceder à sua interpretação tendo em vista a sua correta aplicação e cumprimento.

C. Essa cláusula compromissória, por ser escalonada, impõe às partes o dever de, antes de recorrer à arbitragem, prosseguir outros mecanismos de resolução de disputas, através de um Painel Financeiro/Técnico e da composição amigável. Ainda ao abrigo desta cláusula só as questões que não tenham sido resolvidas amigavelmente ou quanto às quais existam decisões não unânimes contestadas (ou quando não existam decisões), poderão ser levadas a arbitragem.

D. Em sede anulatória, a lei obriga os Tribunais Estaduais a exercerem um controlo estrito e formal do cumprimento de cláusulas compromissórias, sem se dedicarem a matérias de âmbito reservado aos órgãos contratuais e aos Tribunais Arbitrais nos termos do Dispute Resolution Procedure e, em concreto, da cláusula compromissória, do CAE.

E. Infelizmente, e apesar de o Acórdão Recorrendo denotar claramente o seu labor, não foi isso que o Tribunal da Relação de Lisboa fez. E não o fez, extravasando os seus poderes de controlo ao abrigo da lei e incorrendo em erros de apreciação e julgamento patentes, socorrendo-se de raciocínios circulares, cujas conclusões foram enviesadas pelas premissas consideradas corretas sem qualquer demonstração.

F. Quanto à primeira questão, relativa ao extravasamento dos poderes de controlo das decisões arbitrais pelos Tribunais Estaduais, o Tribunal a quo, para fundamentar os seus poderes de cognição quanto à causa que lhe foi apresentada, sustenta que ao proceder à análise do cumprimento da Convenção de Arbitragem, tal como o Tribunal Arbitral não procede a uma análise de mérito, também não o faz um Tribunal Estadual em sede anulatória.

G. Assim, segundo esse Tribunal, sendo a existência de decisões não unânimes contestadas (ou a inexistência de decisões) um pressuposto do direito a recorrer a arbitragem, nos termos do artigo 46.º, n.º 3, alínea iii), da LAV, o Tribunal Estadual pode e deve proceder ao controlo material do preenchimento desses pressupostos. Pelo que o Tribunal a quo teria competência para apreciar a causa.

H. Sucede que, nesta instância, as Recorridas prevalecem-se do regime da sindicância judicial das decisões arbitrais quanto à competência, apresentando, contudo, fundamentos relativos ao mérito da Disputa. Assim, o exercício da sindicância pretendida pelas Recorridas consubstancia um controlo do mérito que a lei não permite, a que o Tribunal a quo não podia proceder. E foi isso que o Acórdão Recorrido fez, à margem da lei.

I. Na verdade, o controlo anulatório das decisões de Tribunais Arbitrais visa salvaguardar um binómio: (i) por um lado, que os Tribunais Arbitrais não se arrogam competência que não lhes foi cometida pelas Partes, i.e., que não agem apesar da inexistência de acordo em arbitrar a disputa e (ii) por outro, que os Tribunais Arbitrais, apesar da existência de acordo em arbitrar a disputa, não conduzem o processo arbitral sem observar as garantias fundamentais do processo jurisdicional, não proferem uma decisão que ofenda os princípios basilares do ordenamento jurídico nacional ou relativa a matéria não arbitrável.

J. Ora, no presente caso, nenhuma das Partes nem o Tribunal a quo sustentam que a Disputa – quanto à sua matéria – não está coberta pela Convenção de Arbitragem. Ou seja, nenhuma das Partes nem o Tribunal a quo entende ou defende que a Disputa não é, em si mesma, arbitrável nos termos da Convenção de Arbitragem.

K. A divergência entre as Partes é apenas a de saber se, a respeito de uma disputa que é materialmente arbitrável e coberta pela Convenção de Arbitragem, o Tribunal Arbitral pode, perante as circunstâncias concretas, no momento concreto, proceder à sua apreciação. Ou seja, a questão não contende, com a competência do Tribunal Arbitral, mas antes com a admissibilidade (material, substantiva, de mérito) das pretensões deduzidas pela Recorrente perante o Tribunal Arbitral.

L. Por esse motivo, e estando o controlo anulatório dos Tribunais Estaduais (no que releva nestes autos), ao abrigo da lei portuguesa, limitado à aferição da existência de um acordo em arbitrar e à subsunção da disputa ao âmbito material desse acordo (pressupostos da competência do Tribunal Arbitral), não podia o Tribunal a quo ter sindicado a Sentença Parcial, através da interpretação material do CAE, sindicando a interpretação do Tribunal Arbitral quanto ao preenchimento das condições para que as pretensões de uma das Partes sejam atendidas em arbitragem.

M. Esta conclusão tem apoio tanto no artigo 46.º, n.º 3 alínea iii) da LAV como na jurisprudência e doutrina internacionais, com especial relevo para a jurisprudência daqueles países que, à semelhança de Portugal, adotaram uma lei de arbitragem inspirada na Lei Modelo da UNCITRAL.

N. É evidente que o presente caso não se subsume ao disposto no artigo 46.º, n.º 3, alínea iii), da LAV uma vez que não está em causa uma disputa não coberta pela Convenção de Arbitragem nem a prolação de uma decisão que extravase o âmbito das pretensões das Partes.

O. Se assim fosse, e se concluísse (erradamente) que as condições prévias constantes da Convenção de Arbitragem não estavam cumpridas, a conclusão nunca seria a de que a Disputa não seria arbitrável, e que deveria ser submetida perante os Tribunais Estaduais mas sim que o Tribunal Arbitral, apesar de competente para dirimir a disputa, não poderia, naquele momento e perante aquelas circunstâncias, admitir os pedidos da parte que iniciou a arbitragem.

P. Tudo sopesado, constata-se que está em causa a admissibilidade das pretensões da Recorrente no processo arbitral (compreendida pelo mérito da Disputa) e não a competência do Tribunal Arbitral – matéria que se encontra subtraída à competência dos Tribunais Estaduais por força do princípio da intervenção mínima (artigo 19.º da LAV) – pelo que, o Tribunal a quo excedeu manifestamente os seus poderes.

Q. Sem prejuízo do que antecede, mesmo que se entendesse ser a situação subsumível ao disposto no artigo 46.º, n.º 3, alínea iii), da LAV (o que apenas se concebe), nunca poderia ter sido tomada a decisão constante do Acórdão Recorrendo.

R. Isto porque, o Tribunal a quo, interpretou erradamente o Dispute Resolution Procedure do CAE, desconsiderando a vontade das Partes, tal como identificável por um declaratário normal, extraindo um sentido do clausulado relevante que não pode ser extraído.

S. Tal resultou do facto de o Tribunal a quo ter colado o Dispute Resolution Procedure (e a Decisão do Painel Financeiro) ao formalismo judicial português desconsiderando que, pela instituição daquele mecanismo, as Partes pretenderam, sem qualquer margem de dúvida, afastar-se precisamente do sistema judicial português.

T. Essa interpretação levou a que toda a análise subsequente do Tribunal a quo resultasse enviesada porque, apesar de ter entendido que o Dispute Resolution Procedure deve de ser interpretado à luz de imperativos de eficiência e clareza, procedeu à sua densificação, no caso concreto, através da colagem do CAE e do seu regime ao regime processual civil Português – precisamente o que as partes pretenderam evitar. Tal colagem resulta evidente:

(i) Do facto de o Tribunal a quo ter alicerçado parte relevante da sua argumentação no princípio do pedido, sustentando que o Painel financeiro apenas poderia tomar decisões sobre as quais incidissem pedidos de condenação das Partes;

(ii) Pelo facto de ter entendido que apenas as questões mencionadas no capítulo Holding (que diz corresponder ao Dispositivo) poderiam ser entendidas como “decisões” do Painel Financeiro; e

(iii) Da circunstância de o mesmo Tribunal ter interpretado o ‘object of the dispute’ como o tradicional objeto do processo e não como a fixação de um objetivo, que orientaria a análise quanto ao sentido útil da decisão do Painel Financeiro, delimitando o seu mandato na Disputa, que é o que decorre das Regras Processuais acordadas pelas Partes.

U. O que levou necessariamente a que o Tribunal a quo entendesse que apenas as questões mencionadas no capítulo Holding (que tivessem resultado de pedidos de condenação das partes) poderiam ser entendidas como decisões ao invés de procurar deslindar – como fez o Tribunal Arbitral – o sentido útil do teor da Decisão do Painel Financeiro em toda a sua plenitude.

V. Por esta razão a interpretação do Tribunal a quo quanto ao Dispute Resolution Procedure e à Decisão do Painel Financeiro – e a sua consequente decisão – é errada, carecendo de qualquer suporte legal ou lógico e sendo vedada pela correta aplicação da lei e dos cânones interpretativos relevantes.

W. É, igualmente, uma interpretação que inutiliza totalmente todo o labor das Partes, do Painel Financeiro e do Tribunal Arbitral no sentido de ser composta a final a Disputa, pelo que a sua decisão é errada, promovendo a absoluta ineficiência da Disputa e tornando nebulosa a posição das Partes perante o CAE.

X. Em suma, a decisão do Tribunal a quo, é viciada pela prática judiciária e pelo regime processual civil nacionais, sobrelevando o formalismo, e considerando erradamente quer a vontade das Partes, quer a materialidade da questão, sendo, em si mesma, contraditória.

Y. Ao invés, estando devida e corretamente fundamentada, a Sentença Parcial, corresponde à única decisão que interpreta corretamente a vontade das Partes, a Decisão do Painel Financeiro e, a essa luz, fixa o seu conteúdo, não havendo motivos para a anular.

Z. O Acórdão Recorrendo é contraditório.

AA. Em primeiro lugar porque, apesar do cânone interpretativo que adota como sendo o referencial do declaratáro normal colocado na posição do real declaratário –imperativos de eficiência e–, acaba por tomar uma decisão ineficiente, conforme exposto acima.

BB. Mas, tal Acórdão é também contraditório noutros pontos:

(i)Em primeiro lugar porque, apesar de afirmar que a vontade concreta dos membros do Painel é irrelevante para a determinação do que se deve entender por decisões para efeitos do Dispute Resolution Procedure do CAE, acaba por dar-lhe relevância ao considerar a estrutura da Decisão do Painel Financeiro – determinada exclusivamente pelos membros do Painel Financeiro – como elemento relevante para a determinação do conceito de ‘decisão’ para efeitos do CAE.

(ii) Em segundo lugar porque, depois de dar relevância à estrutura da Decisão do Painel Financeiro e ao seu teor literal, desconsidera-os, de seguida, quando desse mesmo teor literal decorre, cristalinamente, que o Painel Financeiro concluiu que a Recorrente (ainda que vendo os seus pedidos indeferidos) tinha tido algum sucesso na disputa, o que claramente suporta o teor da Sentença Parcial.

CC. Isto demonstra, mais uma vez, que o Tribunal a quo profere uma decisão viciada pelos quadros mentais do processo civil português, que tem por efeito desfazer todo o labor de quatro anos e colocar as Partes na estaca zero da resolução da Disputa.

DD. Por tudo isto deve-se concluir que o Painel Financeiro tomou várias decisões em cumprimento da missão que lhe foi cometida pelas Partes de resolver a Disputa, que se encontram contidas ao longo da sua Decisão e que, respeitando a Convenção de Arbitragem, o Tribunal Arbitral procedeu à sua identificação tendo-se considerado admissíveis tão somente as divergências subjacentes às decisões não unânimes que foram contestadas não existindo, por isso, qualquer motivo para que seja anulada a Sentença Parcial.

EE. Por outro lado, deve-se ainda concluir que, o inverso – defendido no Acórdão Recorrendo – além de enviesado por quadros mentais que não podem ser relevados perante a vontade das Partes, carece de qualquer suporte probatório, lógico ou legal, consubstanciando um julgamento errado da causa que fomenta a insegurança jurídica que visa evitar e deve, como tal, ser revogado e revertido.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deve o Acórdão Recorrendo ser revogado e substituído por outro que reverta a decisão do Tribunal a quo, confirmando a inexistência de motivo para anular a Sentença Parcial.

As contra-alegações sustentam a improcedência do recurso e a confirmação da decisão recorrida.

Foram os Seguintes os Factos Fixados na Relação:

A - Dá-se por reproduzido o Contrato de Abastecimento de Energia e seus anexos, celebrado entre as partes ou suas antecessoras, na exacta correspondência dos documentos juntos pelas Autoras (com a ressalva já mencionada quanto às divergências de tradução serem consideradas) e na coincidência dos mesmos documentos com o relato factual constante da própria sentença parcial ora sindicada, conforme historial feito pelos árbitros na alínea C infra, número 3 (15 e seguintes), abrangendo portanto as cláusulas relevantes do próprio contrato e dos anexos 9 e 11.

B – É o seguinte o teor integral do voto de vencido produzido pelo árbitro Dr. BB:

“I. Introdução

1. Embora reconheça o mérito da Sentença e especialmente o trabalho completo realizado pelo Presidente e pelo meu colega do Painel de Arbitragem, penso que existem questões importantes que deveriam ter sido abordadas de forma diferente e, por este motivo, não pude partilhar da opinião maioritária e votar a favor da Sentença.

2. As razões que fundamentam o meu parecer divergente são as seguintes:

(i) A definição lata de “decisão” adotada não respeita a lei portuguesa à qual estamos vinculados pelo Contrato de Aquisição de Energia (CAE);

(ii) Os assuntos considerados pela Sentença como “decisões” do Painel Financeiro não podem ser consideradas como tal, uma vez que não estão relacionados com qualquer pedido /pedido reconvencional (Litígio) que as Partes tenham submetido ao Painel e não existe nenhuma decisão que não se reporte a um pedido /pedido reconvencional;

(iii) Os assuntos relacionados com a Cláusula 20 considerados na Sentença como “decisões” do Painel Financeiro não podem ser analisados pelo Painel de Arbitragem porque o Sistema de Resolução de Litígios do CAE não atribui competências ao Painel de Arbitragem para tal.

Permitam-me expressar as minhas razões mais aprofundadamente.

II. O conceito de Decisão

3. Como a Cláusula 25 do CAE exige a aplicabilidade da lei Portuguesa, não posso aceitar a definição lata de “decisão” adotada na Sentença. Considerar apenas a definição de um dicionário inglês, como é feito na Sentença, não é adequado quando existe uma regra aplicável na lei Portuguesa. E eu sei que existem outras jurisdições com o mesmo conceito da lei Portuguesa.

A definição aceite pela Sentença não é a definição de “decisão” da lei Portuguesa como se impõe num Estado de Direito e tal como interpretada por académicos e tribunais.

4. Com todo o respeito pela opinião maioritária da Sentença, penso que os quatro argumentos que apresenta a favor de considerar a “decisão” como algo não abrangido pelo Segmento Dispositivo não tem o meu apoio.

Quando as Partes do CAE concordaram que o mesmo apenas deveria considerar a lei Portuguesa (Cláusula 25), isso significou que as leis de Portugal devem ser aplicadas na interpretação e implementação do CAE, incluindo o procedimento de resolução de litígios. Significou também que os Árbitros não podem decidir ex aequo et bono. Devem seguir a lei Portuguesa.

Temos de estar conscientes que o CAE não contempla apenas a Arbitragem como mecanismo de Resolução de Litígios, também considera que os Painéis Financeiro e Técnico e a Resolução Amigável constituem, em conjunto, parte do Sistema de Resolução de Litígios do CAE (Apêndice 9 – Parte I). Assim, todos devem aplicar as mesmas regras e as mesmas regras são aplicáveis a todos eles.

Portanto, os mesmos conceitos devem ser aplicados às decisões do Painel Financeiro assim como às decisões do Painel de Arbitragem. Afirmar que o Painel Financeiro não é uma instância de resolução de litígios não é uma visão correta. É verdade que no parágrafo1, Parte I do Apêndice 9, pode ler-se que os Painéis Financeiro e Técnico atuam como peritos independentes e não como árbitros, mas tal não significa que não façam parte do Sistema de Resolução de Litígios estabelecido pelo CAE. Como é dito, as Partes submetem o Litígio em primeiro lugar à decisão dos Painéis. Segue-se então a Solução Amigável (Parágrafo 11, Parte I do Apêndice 9) e a arbitragem vem – por vezes - como o último recurso disponibilizado por este sistema (Parágrafo 12, Parte I do Apêndice 9). Todos estes mecanismos fazem parte do Sistema de Resolução de Litígios do CAE.

Não podem subsistir quaisquer dúvidas que o conceito de “decisão” da lei portuguesa, nomeadamente num procedimento de resolução de litígios, deve ser o de uma decisão que resolve um pedido que foi formulado para resolução (Apêndice 9, Parte II, 1.2.2.).

E sendo o conceito presente no Código de Processo Português (artigo 619.º ss.) não o torna apenas aplicável a questões processuais ou decisões judiciais. Algumas regras do Código de Processo são regras materiais. A doutrina do caso julgado não é apenas aplicável em Portugal nos tribunais estaduais, mas aplica-se igualmente por exemplo, nos processos administrativos ou tributários. Por conseguinte, a sua utilização não se restringe apenas aos tribunais, tratando-se de uma definição geral utilizável na medida necessária para decidir um pedido.

O Painel Financeiro faz parte do sistema de Resolução de Litígios adotado no CAE, como um tribunal de primeira de instância (e, em alguns casos, de última instância), e, por conseguinte, o conceito Português não é estranho (não pode ser) ao Painel Financeiro. Tal como não pode ser estranho para uma sentença Arbitral, uma vez que não subsistem dúvidas de que se trata de uma sentença jurisdicional. Em Portugal, segundo a Constituição Portuguesa, a decisão arbitral tem força e valor idênticos ao de uma decisão judicial, tais como todas as decisões no âmbito de um procedimento de resolução de litígios voluntário e todas são suscetíveis de execução por um tribunal Português.

Por outro lado, não tenho dúvidas que as Partes do CAE tinham conhecimento do significado do conceito de decisão da lei Portuguesa, visto que o conceito não sofreu alterações desde 1993, e agiram em conformidade ao adotar o Sistema de Resolução de Litígios específico do CAE, por conseguinte, não podemos alterá-lo agora.

É ainda de salientar que, ao abrigo da lei Portuguesa, mesmo a doutrina do caso julgado considera se as decisões foram tomadas ou não por unanimidade (se a decisão de um recurso confirmar a decisão objeto de análise, não será passível de recurso, mas se for divergente, é possível voltar a recorrer para o Supremo Tribunal), tal como no CAE.

Por conseguinte, a “decisão” do Painel Financeiro tem de ser interpretada da mesma forma que uma “decisão” do Painel de Arbitragem ou de um tribunal judicial, pois fazem parte do Sistema de Resolução de Litígios do CAE e ambos são instâncias contratuais jurisdicionais ou quási jurisdicionais, todas governadas pela lei Portuguesa.

5. Considerando o acima exposto, não posso adotar a definição lata de “decisão” apresentada na Sentença. Por outro lado, penso que continuar a defender uma definição tão lata significa que estaríamos a decidir contra os poderes que o CAE nos conferiu, ou seja, decidir apenas ao abrigo da lei Portuguesa (Cláusula 25).

III. Os Pedidos que o Painel Financeiro tinha de decidir

6. Considero que o que a Sentença aceitou como “decisões” nunca poderia ser considerado como tal, uma vez que as mesmas não pretendiam decidir qualquer pedido /pedido reconvencional submetido ao Painel Financeiro.

Uma decisão apenas pode ser o que o Painel afirma decidir os pedidos e pedidos reconvencionais em litígio, mesmo que, algumas vezes, tenhamos de recuperar a fundamentação para melhor interpretar a decisão. Porém, tal não altera a natureza distinta da fundamentação e da decisão. Penso que a razão para o Painel Financeiro apresentar um Dispositivo que trata algumas questões e outras não, nomeadamente as questões discutidas relacionadas com o imposto relevante e a respetiva materialidade (rejeitando a defesa da primeira Demandada), é precisamente porque tinha a noção exata de quais os pedidos e pedidos reconvencionais e dos temas que eram meros argumentos de defesa.

O Painel Financeiro viu bem a questão (sem a emissão de qualquer voto de vencido) e apesar de ter discutido várias questões, incluiu no Dispositivo apenas as decisões sobre os pedidos e pedidos reconvencionais formulados pelas Partes (o reembolso dos pagamentos efetuados).

7. Existe alguma confusão sobre o que constitui exatamente um pedido indemnização ou pedido reconvencional e um mero argumento de defesa (mediante exceção) – consultar os poderes concedidos pelo CAE aos Painéis e a diferenciação que é claramente feita entre pedidos, pedidos reconvencionais, defesas e outros argumentos e ainda entre a rejeição de tais argumentos e a decisão que tem de ser consequente com os mesmos (Apêndice 9, Parte II, 5.1.(c)). O CAE faz a distinção entre pedido / pedido reconvencional e defesa/ outros argumentos. O Painel de Arbitragem deve proceder exatamente da mesma forma.

Um Pedido e um pedido reconvencional estão limitados ao que as Partes solicitam ao Painel para determinar. O Painel não pode ultrapassar aquilo que as Partes lhe pediram para resolver pois estariam a exceder as suas competências, uma vez que os pedidos determinam a competência do Painel de Arbitragem.

8. Os pedidos da Demandante consistiram essencialmente no pedido de reembolso dos custos incorridos e que continuará a incorrer com o pagamento da tarifa social.

O pedido reconvencional da segunda Demandada consistiu igualmente no reembolso dos pagamentos efetuados à Demandante relacionados com a tarifa social.

Por conseguinte, o Painel Financeiro decidiu tudo o que havia para decidir ao abrigo dos pedidos submetidos pela Demandante e pelas Demandadas, nada tendo ficado por decidir.

Consideramos que o objeto geral do litígio referido nas Regras Processuais não representa os concretos pedidos das Partes. Tiveram a oportunidade de especificar o teor dos pedidos durante o procedimento como as questões que solicitaram ao Painel para decidir. A Decisão é clara – e não foi emitido nenhum voto de vencido – que os pedidos a decidir consistiam no reembolso dos custos que a Demandante incorreu e continuar a incorrer com o pagamento da tarifa social e o reembolso dos pagamentos solicitado pela segunda Demandada à Demandante relacionados com a tarifa social (cf. os pontos 25-29 da Decisão do Painel Financeiro datada de setembro de 2018).

9. Tal não pode ser confundido com a defesa da primeira Demandada que não formulou qualquer pedido reconvencional. Apenas se defendeu argumentando que a Demandante estava a fazer uso abusivo de processo e que, em último recurso, a Cláusula 20 não era aplicável, uma vez que as respetivas condições de aplicação não estavam reunidas e o CAE tem um procedimento especial para o efeito que não foi solicitado. Estes não constituem pedidos e não foram tratados como tal pelo Painel Financeiro. São meros argumentos de defesa por exceção, destinados a impedir o reconhecimento de um alegado direito.

Os referidos argumentos de defesa foram discutidos pelo Painel Financeiro, mas não foram sequer considerados como motivação para negar a ação. O que é de facto bastante significativo.

O Painel Financeiro não decidiu a favor das Demandadas e contra a Demandante devido às discussões relacionadas com a Cláusula 20.

A fundamentação da decisão prende-se com o simples facto de o CAE não permitir o reembolso de 5 custos tributários, mas apenas o pedido de alteração do Encargo de Potência ou Encargo de Energia nos termos da cláusula 20.4.1. e se os requisitos da mesma forem cumpridos.

Analogamente em relação ao pedido reconvencional. O Painel considerou que a Demandante tinha que devolver à segunda Demandada os montantes pagos pela mesma, uma vez que a Demandada não deveria ter efetuado o reembolso. Também porque o CAE não permitia o pagamento de reembolsos, mas apenas a alteração do CAE ao abrigo da cláusula 20.4.1.

10. Considerando esta perspetiva, todas as discussões do Painel Financeiro relacionadas com a Cláusula 20 jamais podem ser consideradas como “decisões” também pela natureza das mesmas, uma vez que não se destinavam a resolver quaisquer pedidos/pedidos reconvencionais.

IV. O Sistema de Resolução de Litígios no âmbito do CAE

11. Finalmente, as discussões sobre a Cláusula 20 jamais podem ser consideradas como a “decisão” neste caso específico, uma vez que os referidos assuntos estão relacionados com uma cláusula de resolução de litígios específica que o Painel Financeiro se recusou expressamente a utilizar.  Permitam-me o esclarecimento.

12. O CAE institui um Sistema de Resolução de Litígios que obriga as partes a passar por diversos mecanismos, um após outro: primeiro, um Painel Financeiro ou Técnico; em seguida, uma Solução Amigável; e, finalmente, quando permitido, a Arbitragem.

No entanto, o CAE não permite o recurso a todos estes mecanismos em todas as situações. Em alguns casos, é negada a possibilidade de recorrer à Arbitragem (e Solução Amigável). As decisões dos Painéis Financeiro/Técnico podem ser definitivas e vinculativas: (i) ou por motivo da natureza da maioria obtida (unanimidade) (ii) ou por motivo da natureza dos assuntos decididos (assuntos ao abrigo da Cláusula 20).

Em resumo, só podem ser contestadas em Arbitragem decisões não unanimes proferidas pelo Painel ao abrigo da Cláusula n.º 26/Apêndice 9 (Apêndice 9, Parte I, 2.). As decisões do Painel relacionadas com assuntos sob a Cláusula /Apêndice 11 não são passíveis de contestação perante arbitragem, e, por conseguinte, são vinculativas e definitivas, sendo obtidas por unanimidade ou maioria simples (Apêndice 11, 10.6). Deste modo, a decisão do Painel para escolher uma das propostas das Partes (a respeito das alterações exigidas pela Alteração das Circunstâncias), de acordo com o parágrafo 10.4. do Apêndice 11, não é contestável mediante Arbitragem, independentemente da natureza da maioria por detrás da decisão.

13. E as Regras Processuais definidas para o Painel Financeiro não modificaram nenhuma das Cláusulas de Litígio do CAE, como afirma o painel Financeiro. Não era intenção do painel proceder de tal forma e claramente não o fez.

As Regras Processuais reiteram exatamente o que é dito nos pontos 11 e 12 do Apêndice 9 do CAE.

Devemos estar conscientes que as Partes submeteram o litígio ao Painel Financeiro apenas ao abrigo da Cláusula 26 do Apêndice 9 e não ao abrigo da Cláusula 20 do Apêndice 11. E o Painel Financeiro estabeleceu esse facto nos pontos 92-95 da Decisão do Painel Financeiro datada de Setembro de 2018, sem voto de vencido. Por conseguinte, temos de interpretar as Regras Processuais conferindo-lhes o mesmo sentido: que as Partes estão a lidar apenas com a Cláusula 26/Apêndice 9 e não com a Cláusula 20/Apêndice 11; consequentemente, não podem modificar algo que não estava a ser tratado.

14. Considerando o acima exposto, penso que temos de fazer a distinção clara entre os assuntos discutidos pelo Painel Financeiro ao abrigo da Cláusula 26/Apêndice 9 e as discussões dos assuntos relacionados com a Cláusula 20/Apêndice 11, visto terem consequências diferentes em termos da competência do Painel de Arbitragem.

Ainda que seja apenas uma decisão do Painel Financeiro, pode ter assuntos relacionados com diferentes regimes ao abrigo do CAE, e, portanto, devemos discuti-los.

A Demandante invocou apenas a Cláusula geral de resolução de litígios 26/Apêndice 9, e assim, o Painel Financeiro afirmou expressamente estar apenas a decidir com base na Cláusula 26/Apêndice 9. Não com base na Cláusula 20/Apêndice 11.

Portanto, quaisquer assuntos que exigiam a resolução especial de litígios introduzida pela Cláusula 20/Apêndice 11, não poderiam constar da secção de deliberações da decisão do Painel Financeiro, porque não só não constituíam pedidos, mas também por este motivo.

15. O que quero dizer é que mesmo que todas as questões discutidas pelo Painel Financeiro fossem “decisões” - que a meu ver não são – então algumas estavam relacionadas com assuntos referentes à Cláusula 20/Apêndice 11 e, por conseguinte, não são passíveis de contestação perante a Arbitragem. O CAE proíbe a sua análise, independentemente de serem “decisões” e de não terem sido obtidas por unanimidade.

Um painel de arbitragem apenas tem os poderes que as Partes entendem conceder-lhe e no CAE as Partes limitaram o acesso à arbitragem não incluindo assuntos relacionados com a Cláusula 20/Apêndice 11 (a respeito das alterações exigidas pela Alteração das Circunstâncias).

16. Na minha opinião, todas as discussões que o Painel Financeiro efetuou sobre as alterações exigidas pela Alteração das Circunstâncias ao abrigo da Cláusula 20 são assuntos que as Partes não pretendem que o Painel de Arbitragem analise. Proíbem a análise por parte da arbitragem. Por conseguinte, sou da opinião que não temos competência para tais assuntos.

V. Competência do Painel de Arbitragem

17. Gostaria de terminar esclarecendo o que, a meu ver, nos foi pedido para resolver.

A Sentença considerou os pedidos da Demandante nas sua Resposta sobre Competência. Porém, vejamos a evolução dos pedidos das Demandantes na presente Arbitragem.

18. Os pedidos efetuados pela Demandante no Requerimento de Arbitragem são os seguintes:

A Demandante procura obter através do presente processo de arbitragem o reembolso dos custos de financiamento da tarifa social desde a sua promulgação até à data de expiração do CAE ou outras medidas consideradas adequadas pelo Tribunal Arbitral.

Nos comentários que redigiu em Termos de Referência, a Demandante desenvolveu o pedido anterior e introduziu o seguinte:

(i)o reconhecimento da natureza vinculativa de quaisquer decisões obtidas por unanimidade tomadas pelo Painel Financeiro a 27 de setembro de 2018 e da existência de competência para finalmente resolver o presente litígio e pronunciar-se e conceder todas as medidas solicitados pela Demandante;

(ii) o reconhecimento da Tarifa Social como uma Alteração nos Impostos Relevantes ao abrigo do CAE;

(iii) confirmação de que a Tarifa Social é uma Alteração nos Impostos Relevantes que excede o Montante Limiar Aplicável de acordo com os cálculos propostos pela Demandante ou em conformidade com quaisquer cálculos determinados pelo Tribunal ao abrigo dos termos e condições do CAE;

(iv) confirmação do direito da Demandante ao reembolso por parte das Demandadas dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social desde a sua promulgação e a serem incorridos até à data de expiração do CAE ou até à revogação da Tarifa Social (consoante o que o ocorrer primeiro);

(v) A alteração do Encargo de Potência em conformidade com a fórmula proposta pela Demandante ou qualquer fórmula que mantenha a Demandante, tanto quanto possível, na mesma posição financeira conforme o que for mais adequado; e

(vi) O reembolso por parte das Demandadas dos custos suportados com o financiamento da Tarifa Social desde a sua promulgação e a serem incorridos até à expiração do CAE ou a revogação da Tarifa Social (consoante o que ocorrer primeiro) ao abrigo dos termos e condições do CAE (incluindo juros à taxa em vigor) e em conformidade com as decisões do presente Tribunal.

Os pedidos da Demandante que constam de Resposta sobre Competência constituem uma variação dos pedidos anteriores:

(i)DECLARE que os assuntos presentes na Secção VI (Decisão do Painel Financeiro), Parte 2 (O Mérito da Causa) da Decisão do Painel Financeiro são 8 “decisões” para efeitos do Procedimento de Resolução de Litígios do CAE;

(ii) DECLARE que os assuntos decididos por unanimidade pelo Painel Financeiro são finais e vinculativos para as Partes ao abrigo do CAE, designadamente com relevância para a presente arbitragem:

1. que a aplicação da Cláusula 20 do CAE não depende da capacidade da segunda Demandada para refletir o custo da Tarifa Social nas tarifas do consumidor;

2. que a aplicação da Cláusula 20 do CAE não se encontra impedida pela lei Portuguesa relevante; e

3. que a aplicação da Cláusula 20 do CAE não constitui um Auxílio Estatal.

(iii) DECLARE que os assuntos decididos de forma não unânime pelo Painel Financeiro são finais e vinculativos para as Partes ao abrigo do CAE, salvo quando contestados.

(iv) DECLARE que as Demandadas contestaram decisões não-unânimes do Painel Financeiro, assim permitindo recurso à arbitragem ao abrigo dos parágrafos 11 e 12, Parte I, Apêndice 9 do CAE.

(v) Em alternativa a (i) a (iv) precedentes, DECLARE que o Painel Financeiro não tomou uma decisão relativamente ao Litígio, ao não ter decidido quem deverá suportar os custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social ao abrigo do CAE, e que, consequentemente, não tem competência para resolver o Litígio de acordo com o Parágrafo 12, Parte I, Apêndice 9 do CAE e para decidir todas as questões relevantes para o efeito.  Cumulativamente,

(vi) DECLARE que tem competência ao abrigo da Cláusula 20 e do Apêndice 11 do CAE para (entre outras medidas consideradas apropriadas e conforme vier a ser mais bem especificado nas Alegações da Demandante sobre o mérito do Litígio):

1.determine se os custos incorridos pela Demandante com o financiamento da Tarifa Social são materiais;

2. altere o Encargo de Potência; e

3. condene as Demandadas ao reembolso dos montantes incorridos pela Demandante com o financiamento da Tarifa Social de acordo com a alteração do Encargo de Potência.

(vii) Em alternativa a (vi) precedente, DECLARE que tem competência para (entre outras medidas consideradas apropriadas e de acordo com o que vier a ser desenvolvido nas Alegações da Demandante sobre o mérito do Litígio) ordenar às Demandadas que:

1. cumpram com o procedimento contratual para a alteração do Encargo de Potência ao abrigo da Cláusula n 20 e o Apêndice 11 do CAE; e

2. reembolse a Demandante dos montantes incorridos com o financiamento da Tarifa Social de acordo com a fatura enviada à segunda Demandada em conformidade com a alteração do Encargo de Potência decorrente da correção do Painel Financeiro ao abrigo do Parágrafo 10.4 do Apêndice 11 do CAE.

A Sentença considerou apenas estes últimos pedidos efetuados em sede de Resposta sobre Competência.

19. Face ao exposto, concluo que o Painel de Arbitragem não tem competência para nenhum dos referidos pedidos, salvo talvez com exceção do pedido (iii), que se trata de um simples pedido para interpretação dos parágrafos 2, 11 e 12 da Parte I do Apêndice 9 do CAE.

A minha resposta decorre da minha visão com referência ao significado de decisão do Painel Financeiro e da competência que o CAE atribui ao Painel de Arbitragem”. (fim de citação).

C – Da sentença parcial arbitral ora em causa, consta, antes do dispositivo que acima transcrevemos, o seguinte parcial teor, sem reprodução da maioria das notas de rodapé:

2. VISÃO GERAL DO LITÍGIO

11. O presente litígio surge da execução de um contrato de aquisição de energia celebrado a 24 de novembro de 1993 (o “CAE”) referente a uma central elétrica alimentada a carvão situada em Abrantes (Portugal) (a “Central Elétrica”). A TEJO Energia adquiriu a dita Central Elétrica à Electricidade de Portugal S.A., atualmente designada por Energias de Portugal S.A. (“EDP”). Conforme incontestado entre as Partes, o CAE vincula as sociedades TEJO Energia, REN Trading e REN Eléctrica.

12. Em concreto, o litígio subjacente respeita a montantes alegadamente devidos pelas Demandadas em resultado da decisão proferida por um painel financeiro (o “Painel Financeiro” e a “Decisão do Painel Financeiro”) a 27 de setembro de 2018 referente ao reembolso da tarifa social criada pelo Decreto-Lei N.º. 138-A/2010 (“Tarifa Social”), um desconto nas tarifas reguladas de eletricidade a conceder aos consumidores economicamente vulneráveis.

13. Nas suas Respostas ao Requerimento de Arbitragem, as Demandadas contestaram a competência do Tribunal. Mais especificamente, alegaram que os requisitos obrigatórios estabelecidos no Anexo 9 do CAE permitindo a arbitragem (nomeadamente, que o litígio deve ser submetido em primeiro lugar, a um painel financeiro) não foram respeitados e que o procedimento previsto na Cláusula n.º 20.4.1 e no Anexo 11 do CAE, que não prevê arbitragem, deveria ter sido seguido.

14. A presente Sentença Arbitral Parcial versa sobre a competência do Tribunal. As disposições da presente Sentença Arbitral Parcial deverão ser interpretadas como uma apreciação prévia das questões factuais e jurídicas subjacentes ao mérito do presente litígio. As características especiais do presente litígio não podem ser entendidas, e as questões a determinar não podem ser abordadas (Secção 5) e decididas (Secção 6), sem primeiramente se resumir o contexto factual do presente processo (Secção 3), e os passos dados no processo arbitral (Secção 4).

3. CONTEXTO FACTUAL

15. Para efeitos da presente Sentença Arbitral Parcial, o Tribunal não necessita de fornecer um registo pormenorizado do contexto factual do caso que conduziu ao presente litígio. É suficiente apresentar um sumário dos factos relevantes para esta etapa jurisdicional, baseados na informação limitada recebida até à data.

16. No dia 24 de novembro de 1993, a EDP e a TEJO Energia celebraram o Contrato de Aquisição de Energia (CAE). De acordo com o CAE, a TEJO Energia “concordou explorar e manter as Unidades 1 e 2 e as Partes Comuns da Central Elétrica nas condições previstas no presente Contrato.”1 No CAE, a TEJO Energia é designada por “o Produtor” (“Produtor”).

17. No âmbito do CAE, a Cláusula 20.ª refere-se a “Alterações Fiscais.” A Cláusula 20.1 refere-se a “Alterações Relevantes,” estabelecendo que “Se, após a data do presente Contrato: (a) o Produtor, Operador ou Empresa Fornecedora de Combustível (1) ficar obrigado a pagar ou a deduzir quaisquer Impostos Relevantes, que em 27 de novembro de 1992 não existiam ou não afetavam o Produtor […] e desde que (no caso das alíneas (a) ou (b) acima mencionadas) o efeito de tal alteração seja material (conforme definido para os fins da presente Cláusula no Anexo 11) então, sujeito às disposições das Cláusulas 20.2.2. e 20.3, aplicar-se-ão as Cláusulas 20.2 a 20.5.” 2 As disposições nas Cláusulas 20.2 a 20.5 versam sobre as potenciais consequências da entrada em vigor de uma Alteração de Impostos Relevante.

18. A Cláusula 26.ª do CAE prevê:

26. LITÍGIOS E ARBITRAGEM

Resolução de litígios

Salvo disposição em contrário expressa no presente Contrato, todos os litígios serão resolvidos de acordo com as disposições previstas no Anexo 9.

19. O Anexo 9 do CAE estabelece um procedimento geral de resolução de litígios (“Procedimento Geral de Resolução de Litígios”), como se segue:

Geral

1. Submissão de Litígios ao Painel

Se um Litígio (expressão que, na aceção do presente Anexo 9, deve incluir um Litígio conforme definido pelo presente Contrato, o Contrato de Aquisição e de Construção, o Acordo Adicional de Unidades e o Contrato de Locação) surgir, seja antes ou depois da rejeição ou de outra forma de cessação do presente Contrato, do Contrato de Aquisição e de Construção, do Acordo Adicional de Unidades e do Contrato de Locação, ao abrigo dos quais o Litígio tenha surgido (no qual o contrato para os fins do presente Anexo 9 se refere como o “Contrato Relevante”) então qualquer uma das partes pode submeter o Litígio em primeiro lugar à decisão do Painel que atuará como peritos independentes e não como árbitros.

2. Decisões do Painel que são vinculativas

Qualquer decisão unânime do Painel será final e vinculativa para as partes mas de outra forma uma decisão do Painel será final e vinculativa para as partes se e até quando o Litígio tenha sido objeto de transação ou submetido a arbitragem como disposto a seguir e uma decisão arbitral tenha sido proferida. Será uma condição suspensiva ao início de qualquer ação judicial que, em relação ao objeto da referida ação, tenha havido:

2.1 uma decisão unânime do Painel; ou

2.2 uma decisão do tribunal arbitral; ou

2.3 um acordo de transação entre as partes.

3. Representações sem prejuízo

A menos que ambas as partes decidam em contrário por escrito, quaisquer representações ou concessões feitas quer por uma das partes, no âmbito ou em conexão com o procedimento submetido perante o Painel ou quaisquer representações, concessões ou acordos (que não o acordo de transação ) feitos por qualquer uma das partes no decurso das discussões nos termos do Anexo 9, parte 1, parágrafo 11 entre o diretor executivo do Produtor e o representante oficial nomeado para esses fins pela EDP, serão feitas sem prejuízo e não serão por isso questionadas por qualquer parte em qualquer arbitragem subsequente ou em quaisquer outros processos judiciais.

11. Procedimento para resolução amigável

No caso de qualquer uma das partes desejar contestar uma decisão não unânime do Painel ou no caso de o Painel não ter chegado a uma decisão de acordo com o Regra do Painel 6.1, o Litígio será submetido por notificação escrita para o diretor executivo do Produtor e para o representante oficial da EDP, nomeado para o referido fim pela EDP, os quais reunirão e envidarão esforços para resolver as questões que existam entre as partes. A decisão conjunta e unânime dos referidos diretor executivo e representante oficial será vinculativa para as partes, mas caso não cheguem a acordo no prazo de 28 dias contados a partir da data em que o assunto lhes foi remetido, qualquer das partes pode submeter o Litígio a arbitragem.

12. Arbitragem

Sujeito sempre ao disposto no parágrafo 11, qualquer uma das partes pode requerer que um Litígio seja submetido a arbitragem no caso de o Painel não conseguir chegar a uma decisão unânime ou de acordo com o previsto na Regra do Painel 6.1.

13. Arbitragem de Litígios relacionados com Obras

No caso de Litígios que envolvam ou que estejam relacionados com Obras, a submissão a arbitragem pode prosseguir antes da Data da Exploração da Unidade 1 ou na data em que a mesma deveria ter sido emitida, desde que as obrigações da EDP e do Produtor não sejam alteradas pela arbitragem ser conduzida durante a realização das Obras. Salvo o acima exposto, nenhuma medida deve ser tomada na submissão de qualquer Litígio para a arbitragem até à emissão da Data da Exploração da Unidade 1, a menos que as partes acordem, por escrito, o contrário.

14. Regras de Arbitragem

Os Litígios que venham a ser objeto de arbitragem deverão ser submetidos a dois árbitros e um árbitro de desempate, de acordo com o Regulamento de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional ou qualquer alteração ou modificação vigente. O lugar da arbitragem será em Lisboa. Sem prejuízo do referido regulamento, cada requerimento de arbitragem deve ser enviado por escrito, especificando o assunto ou a questão em litígio, e deve afirmar que é apresentado nos termos da Cláusula, Anexo ou Anexo do Contrato Relevante.

15. Poder dos Árbitros

Salvo disposição expressa em contrário, os árbitros terão plenos poderes para abrir e rever qualquer decisão, opinião, instrução, notificação, contestação, determinação ou certificado relacionado com o Litígio e qualquer decisão não unânime do Painel e de ordenar a retificação do Contrato Relevante e de qualquer acordo feito entre as partes ao abrigo do mesmo, sujeitos a qualquer regra jurídica que possa restringir o referido poder.

16. Inelegibilidade dos membros do Painel para serem árbitros

Um antigo ou atual membro do Painel não deve ser elegível para nomeação como árbitro, exceto se as partes acordarem por escrito em contrário.

20. O Anexo 11 do CAE contém disposições sobre “Alterações nas Circunstâncias,” tais como, inter alia, “Alterações nos Impostos Relevantes,” e o Parágrafo 10 estabelece os princípios e os procedimentos aplicáveis em relação a tais alterações (o “Procedimento Específico de Resolução de Litígios”):

10. Princípios e Procedimentos para Alterações nas Circunstâncias

10.1 O presente parágrafo é aplicável relativamente à aplicação das disposições referentes a uma Alteração nos Impostos Relevantes, uma Alteração Relevante na Lei que dê lugar a uma Modificação do Produtor, a uma Modificação da EDP (ou Modificação do Produtor ao invés da mesma e conforme o previsto no parágrafo 4.6), Alteração nos Custos ou Alteração Relevante de Emissões (cada uma considerando-se “Alteração nas Circunstâncias”).

10.2 Se este parágrafo 10 for aplicável, cada Parte deverá (sujeito a quaisquer restrições de confidencialidade vinculativas para essa parte), assim que possível, e sem prejuízo de quaisquer requisitos específicos de notificação deste Contrato, providenciar à outra parte a informação escrita que esta possa razoavelmente solicitar de modo a aferir a natureza das circunstâncias em causa e o seu efeito na primeira parte.

10.3 Se as partes não conseguirem acordar nas alterações exigidas pela Alteração das Circunstâncias tendo trocado e comentado as suas respetivas propostas de alteração por escrito (se apropriado), no prazo de 3 meses a contar da data em que qualquer das partes notifique a outra por escrito sobre a necessidade de acordar alterações ao abrigo das disposições relevantes do presente Contrato, qualquer das partes, mediante o envio de notificação à outra pode requerer que o assunto seja remetido para o Procedimento de Resolução de Litígios para determinação ao abrigo do parágrafo 10.4.

10.4 Quando um assunto seja remetido para determinação ao abrigo do parágrafo 10.3 tal determinação será para estabelecer qual das propostas de ambas as partes reflete mais de perto a letra e a intenção deste Contrato tendo em conta este Contrato na presente data e a natureza das circunstâncias em causa e não caberá ao Painel ao abrigo do Procedimento de Resolução de Litígios propor ou selecionar qualquer proposta que não seja uma das propostas submetidas pelas partes.

10.6 Não obstante as disposições da Cláusula 26 e do Anexo 9, qualquer referência neste Anexo 11 ao Procedimento de Resolução de Litígios será para o Painel Técnico ou para o Painel Financeiro, consoante o caso, cuja decisão (seja por unanimidade ou por maioria) será final e vinculativa para as partes.

21. A Cláusula 25.ª do CAE estabelece que o presente Contrato “será interpretado e aplicado de acordo com as leis de Portugal.”

22. REN Eléctrica sucedeu à EDP enquanto parte do CAE através de uma alteração ao CAE datada de 27 de junho de 1997:

1.2 A Cláusula 2.2 será alterada pela renumeração da existente Cláusula 2.2 do CAE como Cláusula 2.2.1 e introduzindo o seguinte como a nova Cláusula 2.2.2:

“2.2.2 Todos os direitos a exercer pela REN ao abrigo do presente Contrato com referência ao PCC [Contrato de Aquisição e Construção] ou ao Contrato de Locação e que possam vir a ser exercidos pela EDP podem ser exercidos por EDP e, se quaisquer obrigações a executar pela REN ou qualquer reconhecimento a prestar pela REN com referência ao PCC ou ao Contrato de Locação apenas puder ser efetuada ou (conforme o caso) reconhecida pela EDP, a REN providenciará a execução das referidas obrigações ou prestará os referidos reconhecimentos pela EDP como se a obrigação relevante ao abrigo do presente Contrato fosse diretamente devida pela EDP ou como se o reconhecimento relevante fosse prestado diretamente pela EDP de acordo com as disposições relevantes do presente Contrato”

23. REN Trading aderiu ao CAE no dia 29 de janeiro de 2010:

(b) Em resultado de um acordo entre o Ministro Português da Economia e da Inovação e o Ministro Espanhol da Indústria, Comércio e Turismo datado de 7 de maio de 2007, e em cumprimento do Decreto Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto, uma nova subsidiária controlada a 100% pela REN (REN Trading) foi criada para os efeitos de gestão dos interesses da REN (inter alia) no CAE.

(c) Neste contexto, a REN Trading irá agora aderir ao CAE e assumirá solidariamente com a REN todos os direitos e obrigações decorrentes do mesmo; 

24. No dia 28 de dezembro de 2010, o Decreto-Lei N.º 138-A/2010 criou a Tarifa Social: “O presente decreto-lei tem como objeto a criação da tarifa social de fornecimento de energia elétrica a aplicar a clientes finais economicamente vulneráveis.”

25. Segundo a Demandante, a mesma “executou atempadamente a sua obrigação legal de financiar a sua parte da Tarifa Social.”

26. Até dezembro de 2014, a REN Trading reembolsou a Demandante por todos os custos incorridos em relação ao financiamento da Tarifa Social conforme o seguinte procedimento: “A Demandante pagaria as faturas enviadas pela REN Eléctrica referentes à Tarifa Social e voltaria a faturar exatamente os mesmos valores à REN Trading.”

27. Desde janeiro de 2015 em diante, a REN Trading cessou o pagamento das referidas faturas.

28. A Demandante solicitou a um painel financeiro a resolução do litígio entre as Partes.

29. Num documento datado de 11 de dezembro de 2017 designado por “Regras Processuais o Painel Financeiro”, assinado pelas três Partes e pelos três membros do Painel Financeiro, as Partes:

a. Identificaram o “Litígio” e concordaram que o “objeto do litígio é determinar quem deve, em última instância, suportar os custos incorridos pela Tejo Energia, enquanto produtor, com a Tarifa Social” (página 3/19);

b. Acordaram que, se “o Painel Financeiro não decidir por unanimidade ou não proferir uma decisão dentro dos prazos estabelecidos no Calendário Processual definido pelas presentes Regras, então o litígio será submetido a um procedimento de resolução amigável e posteriormente aos procedimentos de arbitragem estabelecidos na Parte 1 do Anexo 9 do CAE” (ponto 1.1, parágrafo III, página 6/19);

c. Acordaram que, com exceção do Presidente, “os membros do Painel Financeiro serão elegíveis para serem nomeados como árbitros numa arbitragem relativa ao presente Litígio” (ponto 1.3, Parágrafo III, página 7/19); e

d. Definir um prazo de 60 dias a contar das alegações finais submetidas após audiência para o Painel Financeiro proferir a decisão.

30. Perante o Painel Financeiro, a Demandante apresentou as suas pretensões e as Demandadas estabeleceram as suas pretensões em resposta às da Demandante. Segundo o referido Painel Financeiro, “a controvérsia que originou o presente litígio é saber se a Tejo Energia pode solicitar o reembolso à REN Trading dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social por aquela durante 2015, 2016 e 2017 ou se, pelo contrário, a Tejo Energia deverá suportar tais custos e, em caso afirmativo, devolver os montantes cobrados anteriormente a REN Trading.”

31. No dia 27 de setembro de 2018, o Painel Financeiro proferiu a sua Decisão. Ao abrigo da Secção 2.1 da Decisão, o Painel Financeiro considerou “as condições para a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE.” Nomeadamente, no parágrafo 104, o Painel considerou que as Partes tinham previsto mecanismos para preservar a carga fiscal da Demandante no momento da celebração do CAE. No parágrafo 105, o Painel determinou que as Cláusulas “20.2 a 20.5 do CAE são aplicáveis apenas se (i) um dos cenários descritos nas alíneas (a) ou (b) da Cláusula 20.1 do CAE se verificar e (ii) o efeito da Alteração nos Impostos Relevantes descrita nas referidas alíneas for material em conformidade com o disposto no Anexo 11 do CAE.”

32. Ao abrigo da Secção 2.1(i) da Decisão, a maioria do Painel Financeiro determinou que “a promulgação da Tarifa Social originou uma alteração nos Impostos Relevantes.” Nomeadamente, no parágrafo 111, considerou-se que a Tarifa Social “é abrangida pelo âmbito da Cláusula 20.1(a)(i) do CAE e que […] a imposição da Tarifa Social será vista como uma Alteração nos Impostos Relevantes para efeitos da Cláusula 20.ª e do Anexo 11 do CAE.”

33. Ao abrigo da Secção 2.1(ii) da Decisão, o Painel Financeiro determinou que “a Tejo Energia não evidenciou que tal alteração nos Impostos Relevantes era material.” Nomeadamente, no parágrafo 122, decidiu que, “na opinião da maioria dos membros do Painel Financeiro, embora a imposição da Tarifa Social consubstancie uma Alteração a um Imposto Relevante, a Tejo Energia não pode acionar, por agora, os mecanismos previstos nas Cláusulas 20.2 a 20.5 do CAE para garantir, na medida do possível, que ficará na mesma posição financeira ao abrigo do CAE em que estaria se a Tarifa Social não tivesse sido criada, porque não provou que tal Alteração no Imposto Relevante é material.” No parágrafo 123, o Painel Financeiro acrescentou que a referida determinação “não deve impedir a Tejo Energia de provar a materialidade dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social durante 2015, 2016 e 2017 no futuro, a fim de acionar o procedimento aplicável ao abrigo do CAE.”

34. Nos termos da Secção 2.2 da Decisão, o Painel Financeiro examinou a questão do “reembolso dos custos com a tarifa social à luz dos termos do CAE.” No parágrafo 130, o Painel Financeiro considerou que a Tarifa Social “não se enquadra no âmbito da Cláusula 20.3 do CAE, mesmo que a Tejo Energia provasse o seu efeito material, porque tem uma natureza diferente dos encargos especificados nessa cláusula. Por conseguinte, este Painel Financeiro considerou que, ao abrigo do CAE, a Tejo Energia não pode solicitar à REN Trading o reembolso dos custos que incorreu com o financiamento da Tarifa Social.” No parágrafo 131, o Painel Financeiro acrescentou que, “caso a Tejo Energia consiga provar futuramente o efeito material da Tarifa Social, a Tejo Energia terá direito a recorrer à Cláusula 20.4 do CAE, isto é, procurar uma alteração do cálculo do Encargo de Potência Instalada e/ou Encargo de Energia Produzida […].” No parágrafo 133, o Painel Financeiro acrescentou que “até agora, o mecanismo previsto na Cláusula 20.4.1 da CAE não foi acionado.” Como sintetizado pelo parágrafo 135: ao abrigo dos termos do CAE celebrado entre as Partes, a Tejo Energia não pode solicitar à REN Trading o reembolso dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social, mesmo que estivessem reunidos os pressupostos previstos na Cláusula 20.1 do CAE, na medida em que a Tarifa Social não se enquadra no âmbito da Cláusula 20.3 do CAE ("Exceções e Repassagem de Custos"). Ao invés, se a Tejo Energia conseguir demonstrar futuramente o efeito material da Tarifa Social, tal facto apenas constituiria motivo para a Tejo Energia solicitar uma alteração do cálculo do Encargo de Potência Instalada e/ou Encargo de Energia Produzida em conformidade com os procedimentos e princípios relevantes estabelecidos no parágrafo 10 do Anexo 11 do CAE na medida do necessário para garantir, tanto quanto possível, que seria colocada na mesma situação financeira em que estaria caso não tivesse ocorrido a criação da Tarifa Social.

35. No parágrafo 137 da Decisão, o painel Financeiro determinou que o CAE não foi “alterado por meio da prática das Partes […].”

36. Ainda na Secção 2.2, no parágrafo 148, o Painel Financeiro concluiu que “(i) o procedimento previsto no CAE não foi alterado ou substituído em resultado das práticas das Partes e que (ii) as Demandadas não violaram as respetivas obrigações contratuais ao recusarem-se a reembolsar os custos com a Tarifa Social até que seja invocada a reparação ao abrigo da Cláusula 20. 4”.

37. Nos termos da Secção 2.3 da Decisão, o Painel Financeiro determinou que “a aplicação da cláusula 20.ª do CAE não depende da capacidade da REN TRADING de repercutir o custo da tarifa social nas tarifas pagas pelos consumidores.” Nos termos da Secção 2.4 da Decisão, o Painel Financeiro determinou que a Cláusula 20.ª não violou quaisquer disposições da Lei Portuguesa e, consequentemente, “deve considerar-se válida e aplicável.” Nos termos da Secção 2.5 da Decisão, o Painel Financeiro determinou que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE não constituiria um Auxílio de Estado.

38. Nos termos da Secção 2.6 da Decisão, o painel Financeiro decidiu que a Tejo Energia deve reembolsar os montantes recebidos da REN Trading entre 2011 e 2014. No parágrafo 203, o Painel Financeiro acrescentou o seguinte:

203. Todavia, conforme referido no parágrafo § 123 da presente Decisão, na opinião da maioria do Painel Financeiro – que considera que a Tarifa Social é um Imposto Relevante – o acima exposto não deve impedir a Tejo Energia de, subsequentemente, provar a materialidade dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social entre 2015 e 2017, a fim de acionar o procedimento ao abrigo da Cláusula 20.4 para cada um desses anos. Pelos mesmos motivos, a nossa decisão não impede a Tejo Energia de provar a materialidade para o período entre 2011 e 2014 e invocar o procedimento previsto na Cláusula 20.4 do CAE para cada um desses anos. Se a Tejo Energia for bem-sucedida a este respeito, é possível que a totalidade ou quase totalidade dos montantes devolvidos à REN Trading (vide ponto 202 desta Decisão) terá de ser novamente restituída. Por este motivo, se a REN Trading pretender executar a Decisão do Painel Financeiro relativa ao Pedido Reconvencional, primeiro terá de aceitar por escrito que será responsável por devolver os reembolsos à Tejo Energia se e na medida em que a Tejo Energia consiga invocar o procedimento previsto na Cláusula 20.4 para os anos de 2011 a 2014.

39. Nos termos da Secção 2.7 da Decisão, a “Conclusão” da Secção 2, o Painel Financeiro indicou o seguinte: este Painel Financeiro considera que o pedido da Tejo Energia relativo ao reembolso dos custos com a Tarifa Social é improcedente porque não se provou que os custos incorridos sejam materiais e, além disso, esses custos apenas constituiriam motivo para solicitar a alteração do Encargo de Potência e/ou Encargo de Energia ao abrigo da Cláusula 20.4.1 do CAE, que este Painel Financeiro considera válida e aplicável. Mais, ao considerar o pedido reconvencional da REN Trading devidamente fundamentado, a Tejo Energia deve devolver os montantes previamente reembolsados pela REN Trading entre 2011 e 2014.

40. Na secção “Dispositivo”, o Painel Financeiro decidiu o seguinte: (cf. supra).

41. No dia 5 de Novembro de 2018, após a Decisão do Painel Financeiro, a Demandante devolveu os montantes pagos pela REN Trading entre 2011 e 2014.13

42. No dia 7 de Novembro de 2018, a Demandante notificou as Demandadas que:

A Cláusula 20.4.1 do CAE (que o Painel Financeiro considera válida e aplicável conforme o parágrafo §204 da Decisão), que a Tejo Energia elege para alterar o cálculo do Encargo de Potência Instalada de modo a refletir o custo suportado pela Tejo Energia com o financiamento da Tarifa Social, que, conforme estabelecido pelo Painel Financeiro no parágrafo §111 da Decisão, deverá ser vista com uma Alteração nos Impostos Relevantes para os efeitos da Cláusula 20.ª e do Anexo 11 do CAE. Em conformidade, juntamos ao presente como Anexo 3 os relatórios elaborados pela empresa M... com os cálculos que evidenciam a materialidade da Tarifa Social enquanto Alteração nos Impostos Relevantes nos termos do CAE.

43. Nos dias 21 de novembro e 5 de dezembro de 2018, respetivamente, a Segunda Demandada e a Primeira Demandada manifestaram a sua discordância.

44. No dia 11 de janeiro de 2019, a Demandante expressou a sua intenção de “iniciar um procedimento de Resolução Amigável” nos termos das Regras Processuais do Painel Financeiro e do Anexo 9 do CAE.

45. Nos dias 17 e 18 de janeiro de 2019, as Demandadas contestaram a aplicabilidade do procedimento de Resolução Amigável.

46. No dia 28 de fevereiro de 2019, a Demandante informou que as Demandadas são consideradas representadas no procedimento de Resolução Amigável pelos respetivos Dirigentes Executivos, e remeteu o litígio entre as Partes aos referidos Dirigentes.

47. As Demandadas, nas cartas enviadas a 6 e 8 de Março de 2019, mantiveram as respetivas posições, reafirmando que tal procedimento de Resolução Amigável não era aplicável.

48. No dia 13 de março de 2019, a Demandante insistiu no procedimento de Resolução Amigável e propôs novas datas para a reunião com os Dirigentes Executivos.

49. As Demandadas reiteraram as respetivas posições reafirmando que tal procedimento de Resolução Amigável não era aplicável nas cartas enviadas a 20 e 22 de Março de 2019.

4. PROCESSO CONDUCENTE À PRESENTE SENTENÇA ARBITRAL PARCIAL

50. No dia 1 de abril de 2019, o Secretário Geral Adjunto da Corte de Arbitragem (a “Corte”) da CCI Câmara do Comércio Internacional acusou o recebimento do Requerimento de Arbitragem da Demandante, datado de e recebido no dia 29 de março de 2019. No seu Requerimento de Arbitragem, a Demandante nomeou AA como co-árbitro, e sugeriu que o Presidente do Tribunal fosse nomeado pelos co-árbitros, em consulta com as Partes. A Demandante propôs ainda que o Inglês fosse a língua do processo. Nos termos do n.º 2 do artigo 4º do Regulamento de Arbitragem da CCI em vigor a partir de 1 de março de 2017 (o “Regulamento CCI”), a arbitragem começou na referida data.

51. No dia 4 de abril de 2019, a pedido do Secretário Geral, a Demandante forneceu ao Secretariado da Corte (o “Secretariado”) a morada das Demandadas para efeitos de notificação.

52. No dia 11 de abril de 2019, o Secretariado notificou às Demandadas Requerimento de Arbitragem da Demandante.

53. No dia 16 de abril de 2019, AA, aceitando agir na qualidade de co-árbitro, divulgou, inter alia, o seguinte: “Fui anteriormente membro de um Painel Financeiro referente ao litígio. Os termos do meu envolvimento acordado por ambas as partes no âmbito das Regras Processuais anexas incluíam uma disposição expressa (ponto 1.3/parágrafo III) segundo a qual ao integrar o Painel Financeiro eu não ficaria excluído de atuar como árbitro em qualquer arbitragem relacionada com o mesmo litígio.”

54. Na carta datada de 16 de abril de 2019, a Demandante indicou que “o montante atualmente em litígio é de 15.794.802,00 (quinze milhões setecentos e noventa e quatro mil e oitocentos e dois euros). A Demandante informa[ou] ainda a Corte que tal montante irá sofrer incrementos mensais até à data de cessação do CAE ou a revogação da legislação que promulgou a Tarifa Social, consoante o que ocorrer primeiro.”

55. No dia 24 de abril de 2019, a Primeira Demandada informou que “naquela data não tinha comentários relativamente à confirmação do Sr. AA.” No mesmo dia, a Segunda Demanda informou que “não tinha considerações ou comentários a fazer relacionados com a confirmação e divulgação [do Sr. AA].”

56. No dia 15 de maio de 2019, as Demandadas submeteram as respetivas Respostas, que foram recebidas pelo Secretariado no dia 16 de maio de 2019. Nas suas Respostas, as Demandadas (i) nomearam em conjunto BB como co-árbitro, (ii) sugeriram que os co-árbitros nomeassem o Presidente do Tribunal em consulta com as Partes, e (iii) suscitaram objeções nos termos do n.º 3 do artigo 6º do Regulamento CCI e solicitaram ao Secretário Geral que submetesse o assunto à Corte. Além disso, a Segunda Demandada concordou que o Inglês seria a língua usada na arbitragem, e a Primeira Demandada não se opôs. Por último, a Primeira Demandada “não contestou expressamente a nomeação do Sr. AA […]” embora notando que o Sr. AA foi “um dos membros do Painel Financeiro que proferiu a Decisão do Painel Financeiro.”

57. No dia 22 de maio de 2019, o Secretariado informou as Partes de que o Secretário Geral decidiu não submeter as objeções das Demandadas nos termos do n.º 3 do artigo 6º das Regras CCI à Corte.

58. No dia 28 de Maio de 2019, a Demandante concordou com as Demandadas que os co-árbitros nomeassem o Presidente do Tribunal em consulta com as Partes.

59. No dia 11 de julho de 2019, a Corte confirmou AA como co-árbitro sob proposta da Demandante e confirmou BB como co-árbitro sob proposta conjunta das Demandadas. A Demandante rejeitou a proposta das Demandadas que exigia que o Presidente observasse condições suplementares, mas acrescentou que esperava que fosse fluente na língua inglesa.

60. No dia 6 de Setembro de 2019, o Secretário Geral da Corte confirmou o nome de CC como Presidente do Tribunal sob proposta conjunta dos co-árbitros.

61. No dia 9 de Setembro de 2019, o Secretariado entregou o processo da arbitragem aos membros do Tribunal.

62. No dia 17 de outubro de 2019, o Tribunal e as Partes realizaram uma Conferência Telefónica para Gestão do Processo. Na mesma data, o Tribunal emitiu a Ordem Processual n.º 1.

63. No dia 17 de Outubro de 2019, o Tribunal prolongou o prazo para estabelecer a Ata de Missão até 29 de Novembro de 2019, de acordo com o n.º 2 do artigo 31º do Regulamento.

64. No dia 31 de Outubro de 2019, foi assinada a Ata de Missão.

65. No dia 18 de Novembro de 2019, as Demandadas submeteram as respetivas Petições sobre Competência.

66. No dia 18 de dezembro de 2019, a Demandante submeteu a sua Contestação sobre Competência.

67. Embora a opção de efetuar uma audiência sobre a competência estivesse prevista no calendário processual proposto pelas Partes, nenhuma exerceu a dita opção. No dia 2 de janeiro de 2020, o Tribunal notou que as Partes não haviam solicitado uma audiência sobre competência. Consequentemente, não foi realizada nenhuma audiência sobre competência.

5. QUESTÕES A DECIDIR

68. As questões a decidir pelo Tribunal na presente Sentença Arbitral Parcial referem-se às objeções das Demandadas sobre competência.

69. Adicionalmente, se o Tribunal estabelecer que não tem competência relativamente ao litígio, a Demandante solicita ao Tribunal a prestação de um conjunto de declarações com referência à respetiva competência (conforme descrito infra).

5.1 Pedidos das Partes

5.1.1 Pedido da Primeira Demanda

70. Na sua Resposta ao Requerimento de Arbitragem, a Primeira Demandada requer ao Tribunal o seguinte:

(i) Indefira todos os pedidos da Demandante com base na falta de competência do Tribunal Arbitral relativamente ao litígio entre a Demandante e a Primeira Demandada sobre o reembolso dos custos de financiamento da Tarifa Social;

(ii) Indefira totalmente os pedidos da Demandante;

(iii) Condene a Demandante a pagar todos os custos da arbitragem, incluindo os custos e as despesas incorridos pela Primeira Demandada com advogados;

(iv) Condene a Demandante a pagar juros à taxa em vigor ao abrigo da lei Portuguesa sobre todos os montantes precedentes a partir da data em que estes montantes se venceram, até à data do seu pagamento efetivo; e

(v) Determine qualquer outra medida, nova ou suplementar, considerada apropriada.

71. Na Ata de Missão, a Primeira Demandada solicita ao Tribunal o seguinte:

Em primeiro lugar, declare que não tem competência relativamente ao presente litígio, relacionado com o reembolso dos custos com o financiamento da Tarifa Social, desta forma indeferindo todos os pedidos da Demandante;

Caso o Tribunal Arbitral considere que tem competência para conhecer o presente litígio, então a primeira Demandada requer ao Tribunal Arbitral o seguinte:

a. Indefira totalmente os pedidos da Demandante;

b. Condene a Demandante a pagar todos os custos de arbitragem, incluindo os custos e as despesas incorridos pela Primeira Demandada com advogados;

c. Condene a Demandante a pagar juros à taxa em vigor ao abrigo da lei Portuguesa sobre todos os montantes precedentes a partir da data em que estes montantes venceram, até à data do seu pagamento efetivo; e

d. Determine qualquer outra medida, nova ou suplementar, considerada apropriada.

72. Na Petição sobre Competência, a Primeira Demandada solicita ao Tribunal o seguinte:

(i) DECLARE que não tem competência para conhecer o presente litígio, nomeadamente quanto aos pedidos da Demandante, i.e., “o reembolso dos custos de financiamento da Tarifa Social desde a respetiva criação até à data de cessação do CAE em aditamento a qualquer medida nova ou suplementar”;

(ii) CONDENE a Demandante a pagar todos os custos de arbitragem, incluindo os custos e as despesas incorridos pela Primeira Demandada com advogados;

(iii) CONDENE a Demandante a pagar juros à taxa em vigor ao abrigo da lei Portuguesa sobre todos os montantes precedentes a partir da data em estes montantes venceram, até à data do seu pagamento efetivo; e

(iv) DETERMINE qualquer outra medida nova ou suplementar considerada apropriada.

73. A Primeira Demandada reserva-se “o direito de desenvolver os seus argumentos e pedidos.”

5.1.2 Pedido da Segunda Demandada

74. Na sua Resposta ao Requerimento de Arbitragem, a Segunda Demandada afirma que, “considerando o âmbito da convenção de arbitragem, a REN Trading opõe-se firmemente à arbitragem solicitada, nos termos do n.º 3 do artigo 6º do Regulamento de Arbitragem de 2017 da Câmara de Comércio Internacional.”

Declara ainda o seguinte:

Sem prejuízo da objeção apresentada, considerando o disposto anteriormente relativamente à fundamentação da pretensão, pode concluir-se que os pedidos submetidos pela Tejo Energia na presente arbitragem não podem proceder, e, como tal, devem ser totalmente indeferidos. A Tejo Energia deve ser condenada a pagar todos os custos de arbitragem, incluindo os custos e as despesas incorridos pela REN Trading com advogados;

75. Na Ata de Missão, a Segunda Demandada solicita ao Tribunal o seguinte:

Os pedidos da Tejo Energia na presente arbitragem não podem proceder, e, como tal, devem ser totalmente indeferidos. A Tejo Energia deve ser condenada a pagar todos os custos de arbitragem, incluindo os custos e as despesas incorridos pela REN Trading com advogados;

76. Na sua Petição sobre Competência, a Segunda Demandada solicita ao Tribunal o seguinte:

(i) DECLARE a sua falta de competência para conhecer o presente litígio e para analisar os pedidos apresentados pela Demandante e indefira liminarmente a presente arbitragem;

(ii) CONDENE a Demandante a pagar a REN Trading todos os custos e despesas incorridas com esta arbitragem, incluindo, mas sem caráter exclusivo, honorários e despesas com os árbitros e as despesas administrativas da CCI fixadas pelo Tribunal, honorários e despesas com advogados e despesas internas de gestão e custos com pessoal.

77. A Segunda Demandada reserva-se “o direito de tecer outros comentários sobre os pedidos apresentados, caso a Demandante altere ou complemente os pedidos submetidos.”

5.1.3 Pedido da Demandante

78. No seu Requerimento de Arbitragem, a Demandante procura obter “o reembolso dos custos de financiamento da tarifa social desde a sua promulgação até à data de cessação do CAE ou outras medidas novas ou adicionais consideradas adequadas pelo Tribunal Arbitral.”

79. Na Ata de Missão, a Demandante solicita ao Tribunal que emita uma decisão “através da qual se considerem procedentes os seguintes pedidos:”

a. o reconhecimento da natureza vinculativa de quaisquer decisões obtidas por unanimidade tomadas pelo Painel Financeiro a 27 de setembro de 2018 e da competência para resolver de forma final o presente litígio e pronunciar-se e declarar procedentes todos os pedidos da Demandante;

b. o reconhecimento da Tarifa Social como uma Alteração aos Impostos Relevantes ao abrigo do CAE;

c. confirmação de que a Tarifa Social é uma Alteração aos Impostos Relevantes que excede o Montante Limiar Aplicável de acordo com os cálculos propostos pela Demandante ou em conformidade com quaisquer cálculos determinados pelo Tribunal ao abrigo dos termos e condições do CAE;

d. confirmação do direito da Demandante ao reembolso por parte das Demandadas dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social desde a sua criação e a serem incorridos até à data de cessação do CAE ou até à revogação da Tarifa Social (consoante o que o ocorrer primeiro);

e. a alteração do Encargo de Potência Instalada em conformidade com a fórmula proposta pela Demandante ou qualquer outra fórmula que mantenha a Demandante, tanto quanto possível, na mesma situação financeira conforme o que for considerado mais adequado; e

f. O reembolso pelas Demandadas dos custos suportados com o financiamento da Tarifa Social desde a sua criação e a serem incorridos até à cessação do CAE ou a revogação da Tarifa Social (consoante o que ocorrer primeiro) ao abrigo dos termos e condições do CAE (incluindo juros à taxa em vigor) e em conformidade com as decisões do presente Tribunal.

80. Na sua Contestação sobre Competência, a Demandante solicita ao Tribunal o seguinte:

(i) DECLARE que as questões referidas na Secção VI (Decisão do Painel Financeiro), Parte 2 (O Mérito da Causa) da Decisão são “decisões” para efeitos do Procedimento de Resolução de Litígios do CAE;

(ii) DECLARE que as questões decididas por unanimidade pelo Painel Financeiro são definitivas e vinculativas para as Partes ao abrigo do CAE, designadamente, com relevância para a presente arbitragem:

1. que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE não depende da capacidade da Segunda Demandada de repercutir o custo da Tarifa Social nas tarifas pagas pelo consumidor;

2. que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE não se encontra vedada pela legislação Portuguesa relevante; e

3. que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE não configura um Auxílio de Estado.

(iii) DECLARE que as questões decididas de forma não unânime pelo Painel Financeiro são definitivas e vinculativas para as Partes ao abrigo do CAE, salvo se contestadas.

(iv) DECLARE que as Demandadas contestaram decisões não-unanimes do Painel Financeiro, o que confere direito ao recurso à arbitragem ao abrigo dos parágrafos 11 e 12, Parte I, Anexo 9 do CAE.

(v) Em alternativa a (i) a (iv) supra, DECLARE que o Painel Financeiro não decidiu o Litígio, na medida em que não decidiu quem deverá suportar os custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social ao abrigo do CAE, e que, consequentemente, tem competência para resolver o Litígio de acordo com o Parágrafo 12, Parte I, Anexo 9 do CAE e para decidir todas as questões relevantes para o efeito.

Adicionalmente ao requerido supra,

(vi) DECLARE que tem competência ao abrigo da Cláusula 20.ª e do Anexo 11 do CAE para (entre outras medidas consideradas apropriadas e conforme venha a ser detalhado nos Articulados da Demandante sobre o mérito do Litígio):

1. determinar se os custos incorridos pela Demandante com o financiamento da Tarifa Social são materiais;

2. Alterar o Encargo de Potência Instalada; e

3. Condenar as Demandadas ao reembolso dos montantes incorridos pela Demandante com o financiamento da Tarifa Social de acordo com a alteração do Encargo de Potência Instalada.

(vii) Em alternativa a (vi) supra, DECLARE que tem competência para (entre outras medidas consideradas apropriadas e conforme venha a ser detalhado nos Articulados da Demandante sobre o mérito do Litígio) ordenar às Demandadas que:

1. cumpram com o procedimento contratual para a alteração do Encargo de Potência Instalada ao abrigo da Cláusula 20.ª e o Anexo 11 do CAE; e

2. reembolsem a Demandante dos montantes incorridos com o financiamento da Tarifa Social de acordo com a fatura enviada à Segunda Demandada em conformidade com a alteração do Encargo de Potência Instalada conforme alteração do Painel Financeiro ao abrigo do Parágrafo 10.4 do Anexo 11 do CAE.

81. A Demandante reserva-se o direito “de alterar ou complementar os pedidos apresentados sobre o mérito do litígio.”

82. Resulta dos pedidos formulados pelas Partes que as questões a serem resolvidas na presente Sentença Arbitral Parcial versam sobre a competência do Tribunal (Secção 5.2). O Tribunal descreverá as posições das Partes (Secção 5.2.1, incluindo a posição da Primeira Demandada na Subsecção 5.2.1.1, a posição da Segunda Demandada na Subsecção 5.2.1.2 e a posição da Demandante na Subseção 5.2.1.3), e decidirá sobre a respetiva competência neste processo (Secção 5.2.2).

83. As Partes apresentaram vários argumentos em defesa das respetivas posições. O Tribunal considerou-os e efetuou a análise de todos. Contudo, para efeitos da explicação das suas conclusões, o Tribunal irá focar os argumentos subjacentes ao seu raciocínio ou que exigem resposta para fundamentar esse raciocínio.

5.2 A competência do Tribunal

5.2.1 As posições das Partes

5.2.1.1 A posição da Primeira Demandada

84. A Primeira Demandada alega que o Tribunal não tem competência porque a convenção de arbitragem exige a observância de etapas pré-arbitrais que não foram cumpridas pela Demandante.

85. Em concreto, a Primeira Demandada contesta o entendimento da Demandante segundo o qual (i) a Decisão do Painel Financeiro deve ser considerada como uma sequência de decisões independentes e vinculativas; (ii) as Demandadas teriam contestado algumas decisões do Painel Financeiro; e (iii), como tal, a Demandante pode retomar o Procedimento Geral de Resolução de Litígios iniciado com a Decisão do Painel Financeiro.

86. Primeiro, a Primeira Demandada alega que apenas a secção “Dispositivo” da Decisão do Painel Financeiro é final e vinculativa. O resto da Decisão não é. Do mesmo modo, a Primeira Demandada opõe-se ao argumento da Demandante segundo o qual existem decisões não unanimes vinculativas no âmbito da Decisão do Painel Financeiro, uma vez que existe apenas uma decisão final e vinculativa, unânime, do Painel Financeiro que consta da secção “dispositivo” da Decisão do Painel de Financeiro.

87. Como o CAE não fornece uma definição do termo “decisão,” a primeira Demandada baseia-se na lei Portuguesa. Refere que o CAE deve ser interpretado de acordo com os artigos 236º et seq. do Código Civil Português, que estabelece que a declaração deve ser interpretada de acordo com a perceção de um cidadão comum diligente e informado. Nomeadamente, tendo por base do artigo 607º do Código de Processo Civil Português, a Primeira Demandada alega que o fundamento e as partes operativas de uma sentença são secções separadas e distintas. A Primeira Demandada acrescenta que uma vez que a força do princípio res judicata apenas se atribui ao dispositivo ou à parte operativa, apenas esta secção da decisão pode ser considerada vinculativa e que esta abordagem tem sido adotada pelos tribunais arbitrais. A Primeira Demandada conclui que os parágrafos 103 a 205 da Decisão do Painel Financeiro contêm o seu ratio decidendi e que apenas o parágrafo 211 (sob o cabeçalho “dispositivo”) contém a decisão final e vinculativa do Painel Financeiro.

88. A Primeira Demandada também se baseia na redação usada pelo Painel Financeiro, que favoreceu expressões tais como “na opinião maioritária do Painel Financeiro” ou “o Painel Financeiro entende” na secção designada por “O Mérito do Caso”, enquanto, em contrapartida, usou “o Painel Financeiro decide” na secção “dispositivo” da Decisão. A Primeira Demandada refere-se ainda à audiência conduzida perante o Painel Financeiro durante a qual o referido Painel expressou a sua intenção de envidar todos os esforços para obter uma decisão unânime para poupar as Partes a subsequentes processos de resolução de litígios. Segundo a Primeira Demandada, tal indica que o Painel Financeiro entendeu que uma decisão unânime impedia o recurso à arbitragem.

89. Segundo, a Primeira Demandada alega que as etapas pré-arbitrais definidas na convenção de arbitragem não foram cumpridas pela Demandante. As Partes acordaram a arbitragem como uma medida de último recurso para a resolução de litígios ao determinar que deve ser precedida de decisão por peritos proferida por um painel financeiro. Uma decisão unânime do referido painel é final e vinculativa de acordo com o Parágrafo 2, Parte 1 do Anexo 9 do CAE. Por outro lado, a arbitragem só é possível em caso de uma decisão não unânime (Parágrafos 11 e 12, Parte I do Anexo 9) e somente após as Partes terem avançado para um procedimento de resolução amigável e não terem chegado a acordo.

90. No presente caso, segundo a Primeira Demandada, o Painel Financeiro proferiu uma Decisão unânime com referência ao litígio, consequentemente, esta é uma Decisão final e vinculativa, e, como tal, o Tribunal não tem competência relativamente ao litígio.

91. Terceiro, a Primeira Demandada nega ter contestado a Decisão do Painel Financeiro:

o facto de as Demandadas terem manifestado dúvidas relativamente à legalidade da proposta apresentada pela Demandante para alterar o Encargo de Potência Instalada nos termos do procedimento específico de resolução de litígios acionado após a Decisão, considerando que a Tarifa Social não é uma Alteração nos Impostos Relevantes nos termos do CAE e que as alterações ao CAE teriam de ser aprovadas pelas autoridades competentes também não constitui uma contestação da Decisão do Painel Financeiro ou uma recusa para participar no mecanismo específico de resolução de litígios iniciado pela Demandante […]

92. A Primeira Demandada alega que a classificação efetuada pelo Painel Financeiro da Tarifa Social como uma “Alteração nos Impostos Relevantes” não consta da secção “dispositivo” da Decisão.

93. A Primeira Demandada alega ainda que a redação da Cláusula 20.4.1 do CAE permite alterações ao Encargo de Potência Instalada e ao Encargo de Energia Produzida na medida necessária para garantir, “tanto quanto possível,” que o Produtor fique na mesma situação que estaria se não tivesse ocorrido a “Alteração nos Impostos Relevantes”. Como a Demandante pretendia o reembolso dos custos totais suportados em relação à Tarifa Social, um pedido que foi rejeitado pelo Painel Financeiro, a Primeira Demandada alega que teria de confirmar junto das autoridades competentes se a proposta da Demandante era possível. A Primeira Demandada nega ter-se recusado a cumprir o Procedimento Específico de Resolução de Litígios.

94. A Primeira Demandada acrescenta que, mesmo que tivesse contestado a Decisão do Painel Financeiro (quod non), a Demandante não teria o direito de recomeçar o Procedimento Geral de Resolução de Litígios que foi iniciado aquando da submissão do litígio ao Painel Financeiro. Ao invés, a Demandante devia ter acionado um novo procedimento de resolução de litígios para tratar o novo litígio ocorrido. A Primeira Demandada alega ainda que a conduta da Demandante constitui um abuso de direito nos termos do artigo 334º do Código Civil Português, uma vez que procura enquadrar o novo litígio como sendo o mesmo litígio resolvido pelo Painel Financeiro para forçar a continuação do Procedimento Geral de Resolução de Litígios, violando os termos do CAE.

5.2.1.2 A posição da Segunda Demandada

95. A Segunda Demandada alega que o Tribunal não tem competência para conhecer o presente litígio por dois motivos independentes: (i) a pretensão da Demandante já foi conhecida e decidida pelo Painel Financeiro e a Decisão deste é res judicata; e (ii) o pedido da Demandante concerne a uma alegada “Alteração nas Circunstâncias” nos termos do CAE, que não se encontra abrangida pela convenção de arbitragem do Anexo 9, e deve assim ser resolvida através do Procedimento Específico de Resolução de Litígios referido no Anexo 11.

96. Primeiro, a Segunda Demandada assegura que o Painel Financeiro decidiu por unanimidade rejeitar todos os pedidos submetidos pela Demandante e ordenou a Demandante a devolver à Segunda Demandada todos os montantes pagos referentes à Tarifa Social. De acordo com a Segunda Demandada, a Demandante iniciou esta arbitragem “com o propósito último de obter uma decisão arbitral que ultrapasse a Decisão do Painel Financeiro […] e distorcer as comunicações e a conduta [da Segunda Demandada], claramente coerentes com o CAE e a Decisão do Painel Financeiro.”

97. Na perspetiva da segunda Demandada, a Decisão do Painel Financeiro está totalmente contida na secção “dispositivo” da Decisão. A Segunda Demandada realça a redação da Decisão do Painel Financeiro, enfatizando que a palavra “decisão” é apenas usada na “dispositivo,” enquanto as outras conclusões do Painel são marcadas pelo uso de expressões como, “deve concluir-se,” “o Painel Financeiro entende,” e “na perspetiva da maioria do Painel Financeiro.” Estas conclusões, de acordo com a Segunda Demandada, correspondem à ponderação feita pelo Painel Financeiro dos argumentos factuais e jurídicos que as Partes apresentaram a discussão, mas não podem ser consideradas decisões isoladas. A Segunda Demandada insiste que a Decisão do Painel Financeiro não pode ser interpretada como uma série de decisões, uma vez que as Regras Processuais do Painel Financeiro e do CAE refere-se a uma decisão única, e não a várias.

98. A Segunda Demandada assegura que a doutrina e a jurisprudência Portuguesas consideram que apenas a “parte deliberativa/dispositiva/ injuntiva de uma decisão judicial (ou arbitral) forma o princípio res judicata”; o remanescente da Decisão seria obiter dicta. De acordo com a Segunda Demandada, o efeito res judicata, estaria, assim, limitado a dois aspetos:

(i) A Demandante não tinha direito ao reembolso dos custos incorridos com a Tarifa Social, porque o Painel considerou que a materialidade de tais custos não foi demonstrada e o procedimento contratual acordado para obter a compensação financeira prevista não foi adotado, ergo, as Demandadas não estavam a violar o contrato;

(ii) A REN Trading não tinha a obrigação de reembolsar os custos com a Tarifa Social até 2014 e consequentemente, à luz do CAE e do pedido reconvencional efetuado, tinha direito ao reembolso dos referidos montantes.

99. Ao apresentar um requerimento de arbitragem, a Demandante estaria assim a contestar e a procurar a revisão da Decisão unanime do Painel Financeiro, que é final e vinculativa para as Partes. De acordo com a Segunda Demandada, uma vez que o Painel Financeiro proferiu atempadamente uma Decisão unânime, a Demandante só podia requerer arbitragem se as Demandadas tivessem contestado decisões não unânimes do mesmo Painel Financeiro (conforme Parágrafos 11 e 12, Parte I do Anexo 9 do CAE). Uma vez que a Segunda Demandada alega que as “chamadas decisões não unânimes não podem ser consideradas decisões separadas do Painel Financeiro,” e que existe apenas uma única Decisão unânime, a Demandante não pode recorrer à arbitragem.

100. Em segundo lugar, a Segunda Demandada alega de forma independente que o procedimento contratual adequado para o reembolso da Tarifa Social, que corresponde ao pedido da Demandante, é o previsto no Anexo 11 – o Procedimento Específico de Resolução de Litígios – e que a Demandante iniciou o referido procedimento, mas não obteve o efeito jurídico pretendido por sua própria culpa. A Segunda Demandada reconhece que a Demandante forneceu os cálculos para provar a materialidade dos custos com a Tarifa Social e apresentou a proposta para alteração do Encargo de Potência Instalada, conforme o Anexo 11 do CAE, mas nega que se recusou a participar no processo. De acordo com a Segunda Demandada, a mesma “simplesmente respondeu que tal compensação carecia do parecer prévio e favorável da ERSE [a Entidade Reguladora para o Sector Energético(“ERSE”)] sobre o impacto eventual nas tarifas gerais a pagar pelos consumidores finais de energia e […] que os cálculos apresentados não demonstraram a materialidade dos custos da tarifa social.”

101. Em resposta ao argumento invocado pela Demandante de que a conduta da Segunda Demandada deve ser considerada com uma recusa ao cumprimento da Decisão do Painel Financeiro, a Segunda Demandada insiste ainda que “tentou avisar a Tejo Energia para não seguir o procedimento de resolução de litígios previsto no Anexo 9 ao notar que as condições nos termos do CAE para o procedimento de resolução amigável não estavam reunidas.”

5.2.1.3 A posição da Demandante

102. A Demandante alega que o Tribunal tem competência relativamente ao presente litígio justificando que as Demandadas contestaram decisões não unânimes do Painel Financeiro.

103. A Demandante alega que a Decisão do Painel Financeiro contém, fora da secção “dispositivo”, várias decisões, incluindo as decisões que tratam de questões preliminares suscitadas pelas Partes na primeira subsecção da Secção VI da Decisão (designada “A Decisão do Painel Financeiro”) e decisões relacionadas com várias questões discutidas pelas Partes na secção sobre o mérito. De acordo com a Demandante, algumas destas decisões foram tomadas por unanimidade e, outras, por maioria.

104. A Demandante acrescenta que o Painel Financeiro considerou “o sucesso relativo das Partes” e que os pedidos da Demandante “não foram desprovidos de mérito” ao decidir sobre os custos.

105. A Demandante acrescenta ainda que o CAE conferiu poderes ao Painel Financeiro para decidir litígios relativos à interpretação, legislação, impostos e que, neste âmbito, o Painel Financeiro decidiu que a Demandante tem direito a procurar o reembolso dos custos associados à Tarifa Social, caso conseguisse estabelecer a materialidade dos mesmos e o fosse adotado o Procedimento Especial de Resolução de Litígios.

106. Mais precisamente, segundo a Demandante, o Painel Financeiro decidiu que (i) a aplicabilidade da Cláusula 20.ª do CAE independentemente da capacidade da Segunda Demandada para repercutir os custos nas tarifas do consumidor; (ii) não existem impedimentos legais para a aplicação da Cláusula n.º 20 à Tarifa Social; e (iii) a referida aplicação não constituiria um Auxílio de Estado. A Demandante acrescenta que o Painel Financeiro “não teria referido expressamente quando estava a tomar as referidas decisões por maioria, se tivesse considerando que o seu mandato era apenas decidir sobre os pedidos submetidos pelas Partes, como defendem as Demandadas.”

107. A Demandante afirma ter (i) demonstrado a materialidade da Tarifa Social; (ii) submetido uma proposta de alteração ao Encargo de Potência Instalada para responder aos custos de financiamento da Tarifa Social; e, consequentemente (iii) cumpriu a Decisão do Painel ao iniciar o Procedimento Específico de Resolução de Litígios previsto no Anexo 11 do CAE.

108. De acordo com a Demandante, as Demandadas rejeitaram a sua proposta ao manifestar dúvidas sobre a legalidade do procedimento com base em questões que foram resolvidas na Decisão do Painel Financeiro.

109. A Demandante sublinha que a posição das Demandadas, à data, era que os custos de uma alteração do Encargo de Potência Instalada teriam de ser repercutidos nas tarifas do consumidor; tal alteração teria de ser autorizada pela ERSE; e que a Tarifa Social não é um “Imposto Relevante” nos termos do CAE, classificando-a como uma obrigação do serviço público. A Demandante enfatiza ainda que as Demandadas insistiram que a Decisão do Painel Financeiro não estabelecia a Tarifa Social com uma “Alteração aos Impostos Relevantes.”

110. De acordo com a Demandante, a postura das Demandadas deve ser equiparada a uma contestação da Decisão do Painel Financeiro, que permite a Demandante recorrer à arbitragem, e confere poder ao Tribunal para resolver o litígio entre as Partes.

111. A Demandante baseia-se no Parágrafo 15, Parte I do Anexo 9 do CAE, que define o poder do Tribunal nos termos seguintes: “os árbitros terão plenos poderes para abrir e rever qualquer decisão, opinião, instrução, notificação, objeção, determinação ou certificado relacionado com o Litígio e qualquer decisão não unânime do Painel e de ordenar a retificação do [CAE] e de qualquer acordo feito entre as partes ao abrigo do mesmo, sujeito a qualquer regra jurídica que possa restringir o referido poder.” Nesta base, a Demandante sugere que o Tribunal dispõe dos poderes necessários para (i) reconhecer que a Tarifa Social é material nos termos do Anexo 11 do CAE; (ii) alterar o Encargo de Potência Instalada em conformidade; e (iii) determinar que as Demandadas devem reembolsar a Demandante por todos os custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social.

112. De acordo com a Demandante, uma decisão que leve a Demandante a recorrer a um painel financeiro para reconhecer a materialidade dos custos associados à Tarifa Social só podia ser baseada numa leitura não razoável do CAE e seria “um absurdo considerando a conduta das Demandadas e o seu comportamento intencionalmente dilatório.”

5.2.2 A Decisão da maioria do Tribunal

113. No presente processo, as Demandadas opõem-se à competência do Tribunal sobre o litígio. O Tribunal considerou cuidadosamente todos os argumentos apresentados pelas Partes. Para efeitos da sua argumentação, contudo, a maioria do Tribunal irá endereçar comentários sobre os argumentos que fundamentam as suas conclusões.

114. In limine, conforme é incontestado pelas Partes e como referido pelo Painel Financeiro (independentemente se se considerar ou não, por agora, que se trata de uma decisão vinculativa ou simplesmente uma parte não vinculativa da Decisão), o CAE estabelece dois procedimentos de resolução de litígios distintos: (i) o Procedimento Geral de Resolução de Litígios, na Cláusula 26.ª e Anexo 9, e (ii) o Procedimento Específico de Resolução de Litígios, na Cláusula 20.ª e o Parágrafo 10 do Anexo 11. Mais precisamente:

115. Por um lado, ao abrigo do Procedimento Geral de Resolução de Litígios do Anexo 9, qualquer litígio (salvo se estabelecido de outra forma no CAE) será em primeiro lugar remetido a um painel (financeiro ou técnico) “atuando como peritos independentes e não como árbitros”, que fornecerá às partes uma decisão vinculativa conforme o Parágrafo 1 do Anexo 9. Ao abrigo do Parágrafo 2, Parte I do Anexo 9 as decisões unanimes do Painel serão vinculativas e finais, enquanto as decisões não unanimes são apenas finais e vinculativas até que o litígio tenha sido resolvido ou remetido para arbitragem. Se uma das partes contestar uma decisão não unanime do painel, as partes devem remeter o litígio para um procedimento de resolução amigável de acordo com o parágrafo 11, Parte I do Anexo 9. Se não houver acordo, qualquer das partes pode remeter o litígio para arbitragem tal como previsto nos Parágrafos 11 e 12, Parte I do Anexo 9. Em tal caso, nos termos do Parágrafo 15, Parte I do Anexo 9 “salvo disposição expressa em contrário, os árbitros terão plenos poderes para abrir, analisar e rever qualquer decisão, opinião, instrução, notificação, contestação, determinação ou certificado relacionado com o Litígio e qualquer decisão não unânime do Painel e de ordenar a retificação do Contrato Relevante e de qualquer acordo feito entre as partes ao abrigo do mesmo, e de qualquer acordo feito entre as partes ao abrigo do mesmo, sujeito a qualquer regra jurídica que possa restringir o referido poder .” Por outras palavras, os poderes dos árbitros são limitados, e, em particular, os árbitros não podem “abrir, analisar e rever” uma decisão ou decisões unânimes do Painel, independentemente do respetivo mérito.

116. Por outro lado, o Procedimento Específico de Resolução de Litígios é aplicável a casos em que existe controvérsia concernente a uma alteração do Encargo de Potência Instalada e/ou Encargo de Energia Produzida no contexto de uma Alteração nos Impostos Relevantes. O Parágrafo 10 do Anexo 11 estabelece que, em caso de um litígio relacionado com as alterações propostas ao Encargo de Potência Instalada ou Encargo de Energia Produzida, as partes devem trocar propostas de alteração e tentar chegar a acordo. Se tal acordo não for possível, o litígio deverá ser remetido a um painel, que adotará uma das propostas apresentadas pelas partes. A decisão do painel será final e vinculativa, e não há recurso à arbitragem.

117. No presente processo, o Tribunal determinará se os pedidos da Demandante estão no âmbito da competência e dos poderes do Tribunal nos termos do Anexo 9. Para o efeito, o Tribunal escrutinará, um a um, todos os pedidos da Demandante:

118. O primeiro pedido da Demandante é para que o Tribunal “DECLARE que as questões constantes da Secção VI (Decisão do Painel Financeiro), Parte 2 (O Mérito da Causa) da Decisão são “decisões” para os efeitos do Procedimento de Resolução de Litígios do CAE.”

119. Ao abrigo dos Parágrafo 11 e 12, Parte I do Anexo 9, o Tribunal tem competência na medida em que foi contestada uma decisão não unanime e não existiu resolução amigável, e, nos termos do Parágrafo 15, Parte I do Anexo 9 o Tribunal tem poder para “abrir, analisar e[/ou] rever” Decisões não unanimes do Painel Financeiro.

120. Para determinar se uma decisão é unânime, o Tribunal, a fortiori, tem poderes para decidir o que constitui uma decisão no âmbito da Decisão do Painel Financeiro.

121. A pergunta seguinte é saber se todos os assuntos que constam da Parte 2 da Secção VI da Decisão do Painel Financeiro são decisões, como argumenta a Demandante, ou se apenas a decisão que integra a Parte 4 da Secção, a secção “dispositivo” da Decisão, é uma decisão nos termos do Anexo 9, como afirmam as Demandadas.

122. O CAE é regido pela Lei Portuguesa. Na ausência de qualquer definição ao abrigo do CAE, o significado de “decisão” será interpretado de acordo com as regras de interpretação de contratos. Nomeadamente, nos termos do artigo 236º do Código Civil Português, um contrato deve ser interpretado objetivamente. Segundo o artigo 236 º do Código Civil Português: “1. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele. 2. Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida.”

123. Nesta perspetiva, o Tribunal conclui que o facto de uma determinação não se encontrar na secção “dispositivo” da Decisão não é determinante pelas seguintes razões:

124. Primeiro, com o CAE, as Partes pretenderam afastar-se do sistema judicial dos tribunais Portugueses. Ao contrário, as Partes optaram por uma decisão do respetivo litígio em primeiro lugar, proferida por um painel financeiro (ou técnico). Em consequência, não pode ser automaticamente assumido que as Partes pretenderam apesar disso que o significado de “decisão” ao abrigo da lei Portuguesa fosse adotado com referência à(s) decisão(ões)do Painel Financeiro.

125. Segundo, o efeito res judicata da decisão, no qual se baseia a Primeira Demandada, é alheio a qualquer decisão do painel financeiro. O princípio res judicata liga-se apenas às decisões dos tribunais domésticos e tribunais arbitrais. Conforme especificado no CAE, os membros do painel deviam “agir como peritos independentes, mas não como árbitros.” Forçosamente, o CAE não menciona o efeito res judicata da(s) decisão(ões) do painel financeiro. Alternativamente, o CAE refere a natureza “vinculativa e final” da(s) decisão(ões) do painel financeiro.

126. Terceiro, na mesma linha, o CAE faz distinção entre decisões unânimes, que são “finais e vinculativas,” e decisões não unânimes, que são “finais e vinculativas para as partes a menos e até que o Litígio tenha sido resolvido ou remetido para arbitragem […] e tenha sido proferida uma decisão arbitral.” Em contrapartida, o princípio res judicata não diferencia decisões unânimes e não unânimes, e, em alternativa, impede simplesmente o encaminhamento para outros fóruns assim que se constitui res judicata.

127. Quarto, algumas determinações do Painel Financeiro estão diretamente relacionadas com os pedidos apresentados pela Primeira Demandada, porém, não incluídas na secção “dispositivo” da Decisão do Painel Financeiro.

128. Por exemplo, as pretensões deduzidas pela Primeira Demandada na fase subjacente do Painel Financeiro incluíram um pedido para o Tribunal declarar que, “se, todavia, a Cláusula 20.ª for considerada aplicável contra as Demandadas, os requisitos para recorrer à mesma não estão, contudo, satisfeitos, antes demais porque a Tarifa Social não é um Imposto Relevante para efeitos do CAE […].” Por outras palavras, para se opor ao pedido de reembolso da Demandante, a primeira Demandada solicitou, inter alia, que o Painel Financeiro declare que a Tarifa Social não é um Imposto Relevante nos termos do CAE.

129. Tal reforça a conclusão da maioria do Tribunal de que o formalismo que se aplica às decisões judiciais é imaterial na presente situação. Independentemente da decisão de quaisquer pedidos submetidos pelas Partes estar na secção “dispositivo” da Decisão do Painel Financeiro não é determinante.

130. Tendo determinado que a decisão não tem de constar da secção “deliberação”, a próxima pergunta é saber se todos os assuntos presentes na Parte 2 da Secção VI, do Painel Financeiro são decisões, como formulado pela Demandante. A maioria do Tribunal é da opinião que a questão de saber se um assunto é ou não uma decisão é um exercício que deve ser feito caso a caso, à luz da definição do dicionário B..., que refere que uma decisão é uma “determinação após consideração dos fatos e da lei.” Este é o significado, de acordo com o artigo 236º do Código Civil Português que “um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.”

131. O primeiro pedido da Demandante é parcialmente procedente. Podem encontrar-se decisões noutras secções da Decisão, na medida em que constituam determinações após a consideração dos factos e da lei.

132. O segundo pedido da Demandante é que o Tribunal “DECLARE que as questões decididas por unanimidade pelo Painel Financeiro são definitivas e vinculativas para as Partes ao abrigo do CAE, designadamente com relevância para a presente arbitragem: 1. que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE não depende da capacidade da Segunda Demandada para repercutir o custo da Tarifa Social nas tarifas do consumidor; 2. que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE não está vedada pela lei Portuguesa relevante; e 3. que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE não é considerada um Auxílio de Estado.”

133. O pedido da Demandante, em sentido estrito, não diz respeito a uma decisão não unânime do Painel Financeiro. O Painel não decidiu (nem podia) sobre o caráter vinculativo das suas decisões. Dito isto, de forma a determinar a sua competência e âmbito dos próprios poderes, o Tribunal tem ipso facto poder para interpretar a convenção de arbitragem do CAE.

134. Se a decisão é unânime e se o efeito de decisões não unânimes ou unânimes é expressamente regido pela convenção de arbitragem do CAE é alheio ao mérito do litígio subjacente. O Parágrafo 2 da Parte I do Anexo 9 estabelece o seguinte: “Qualquer decisão unânime do Painel será final e vinculativa para as partes mas de outra forma uma decisão do Painel será final e vinculativa para as partes se e até quando o Litígio tenha sido objeto de transação ou submetido a arbitragem como disposto a seguir e uma decisão arbitral tenha sido proferida. Será uma condição suspensiva ao início de qualquer ação judicial que, em relação ao objeto da referida ação, tenha havido: 2.1 uma decisão unânime do Painel de Decisão; ou 2.2 uma decisão do tribunal arbitral; ou 2.3 um acordo homologado entre as partes.”

135. Consequentemente, a maioria do Tribunal conclui que qualquer decisão unânime do Painel Financeiro é final e vinculativa.

136. Nesta perspetiva, os sub-pedidos da Demandante serão então escrutinados, um por um:

137. Primeiro, a Demandante pede que o Tribunal “DECLARE que as questões decididas por unanimidade pelo Painel Financeiro são definitivas e vinculativas para as Partes ao abrigo do CAE, designadamente com relevância para a presente arbitragem: 1. que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE não depende da capacidade da Segunda Demandada para repercutir o custo da Tarifa Social nas tarifas do consumidor.”

138. Perante o Painel Financeiro, as Demandadas solicitaram inter alia a declaração que a Cláusula 20.ª não pode ser aplicada porque a Tarifa Social deve ser imperativamente suportada pelos produtores de eletricidade.

139. Nos parágrafos 149 a 161, o Painel Financeiro examinou se “a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE [depende] da capacidade da Ren Trading repercutir o custo da tarifa social nas tarifas dos consumidores.” No parágrafo 161, o Painel concluiu que “não existe impedimento legal à internalização pela Ren Trading dos custos incorridos com o reembolso da Tarifa Social.”

140. Na aplicação do teste referido anteriormente no parágrafo 131, o presente Tribunal considera que tal conclusão constitui uma decisão, e, na ausência de qualquer indicação em contrário, uma decisão unanime. Por conseguinte, o Tribunal declara que a conclusão do Painel Financeiro que indica que a Cláusula 20.ª do CAE podia ser aplicada, mesmo quando o custo decorrente da mesma não fosse repercutido nas tarifas dos consumidores é uma decisão unanime, e, como tal, final e vinculativa.

141. Segundo, a Demandante pede que o Tribunal “DECLARE que as questões decididas por unanimidade pelo Painel Financeiro são definitivas e vinculativas para as Partes ao abrigo do CAE, designadamente com relevância para a presente arbitragem: […] 2. que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE não seja vedada pela lei Portuguesa relevante.”

142. Perante o Painel Financeiro, as Demandadas alegaram inter alia que a Cláusula 20.ª do CAE era contrária à lei portuguesa.

143. Nos parágrafos 162 a 188, o Painel Financeiro examinou se a Cláusula 20.ª do CAE era ilegal nos termos da lei Portuguesa. No parágrafo 188, o Painel Financeiro concluiu que “a única finalidade do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro, alterado em março de 2016, é estabelecer quem é responsável perante o organismo competente pelo pagamento da Tarifa Social, sem que seja possível aderir à conclusão de que a redação daquela disposição ou do Parecer da PGR emitido em 21 de março de 2013 (Elemento de prova CL-2), os comentários a respeito do mesmo realizados pelo Conselho de Administração da ERSE (Elemento de prova CL-3) ou o Parecer da ERSE datado de março de 2017 (Elemento de prova RTL-3), impedem que a Tejo Energia seja compensada pela REN Trading por meio dos mecanismos previstos no CAE, conforme interpretado na Secção 2.2. da presente Decisão. Logo, deve considerar-se Cláusula 20.ª do CAE válida e aplicável.”

144. Na aplicação do teste referido anteriormente no parágrafo 131, a maioria do presente Tribunal considera que tal conclusão constitui uma decisão, e, na ausência de qualquer indicação em contrário, uma decisão unânime. Por conseguinte, o Tribunal declara que a conclusão do Painel Financeiro que indica que a Cláusula 20.ª do CAE não é ilegal nos termos da lei Portuguesa é uma decisão unânime, e, como tal, final e vinculativa.

145. Terceiro, a Demandante pede que o Tribunal “DECLARE que as questões decididas por unanimidade pelo Painel Financeiro são definitivas e vinculativas para as Partes ao abrigo do CAE, designadamente com relevância para a presente arbitragem: […] 3. que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE não configura um Auxílio de Estado.”

146. Perante o Painel Financeiro, a segunda Demandada argumentou que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE constituiria um Auxílio de Estado.

147. Nos parágrafos 188 a 192 da Decisão, o Painel Financeiro examinou se a Cláusula 20.ª do CAE configuraria um Auxílio de Estado. No parágrafo 192 da Decisão do Painel Financeiro, o Painel concluiu que “a compensação dos custos com a Tarifa Social incorridos pela Tejo Energia por meio dos mecanismos contratuais previstos no CAE – como interpretado na secção 2.2 desta Decisão – não constituiriam um Auxílio de Estado ao abrigo do n.º 1 do artigo 107.º do TFUE.”

148. Na aplicação do teste referido anteriormente no parágrafo 131, a maioria do presente Tribunal considera que tal conclusão constitui uma decisão, e, na ausência de qualquer indicação em contrário, uma decisão unanime. Por conseguinte, a maioria do Tribunal declara que a conclusão do Painel Financeiro que indica que a aplicação da Cláusula nº 20 do CAE não configura um Auxílio Estatal é uma decisão unanime, e, como tal, final e vinculativa.

149. O segundo pedido da Demandante é procedente.

150. O terceiro pedido da Demandante é para que o Tribunal “DECLARE que as questões decididas de forma não unânime pelo Painel Financeiro são definitivas e vinculativas para as Partes ao abrigo do CAE, salvo quando contestados.”

151. Como referido anteriormente, o Parágrafo 2 da Parte I do Anexo 9 estabelece o seguinte: “Qualquer decisão unânime do Painel será final e vinculativa para as partes mas de outra forma uma decisão do Painel será final e vinculativa para as partes se e até quando o Litígio tenha sido objeto de transação ou submetido a arbitragem como disposto a seguir e uma decisão arbitral tenha sido proferida. Será uma condição suspensiva ao início de qualquer ação judicial que, em relação ao objeto da referida ação, tenha havido: 2.1 uma decisão unânime do Painel de Decisão; ou 2.2 uma decisão do tribunal arbitral; ou 2.3 um acordo homologado entre as partes.”

152. Tal como referido anteriormente, nos termos dos Parágrafos 11 e 12, Parte I do Anexo 9, quando há lugar à contestação de uma decisão não unânime proferida por um painel financeiro, as Partes procurarão resolver o litígio de forma amigável. Se não for possível, “qualquer das partes pode requerer que o Litígio seja remetido a arbitragem.”

153. Resulta das disposições anteriores que uma decisão não unânime é, na verdade, final e vinculativa nos termos do CAE, salvo quando contestada.

154. O terceiro pedido da Demandante é procedente.

155. O quarto pedido da Demandante é para que o Tribunal “DECLARE que as Demandadas contestaram decisões não-unânimes do Painel Financeiro, assim permitindo o recurso à arbitragem ao abrigo dos parágrafos 11 e 12, Parte I, Anexo 9 do CAE.”

156. Antes de determinar se as Demandadas contestaram uma Decisão não unânime, o Tribunal irá determinar primeiro se uma ou mais decisões do Painel Financeiro foram não unânimes.

157. De acordo com a Demandante, existem três decisões não unânimes.

158. Primeira, a Demandante considera que o Painel Financeiro decidiu, por maioria, que a Tarifa Social constituía uma Alteração nos Impostos Relevantes nos termos do CAE.

159. Tendo analisado cuidadosamente a Decisão do Painel Financeiro, a maioria do Tribunal realça o uso recorrente da expressão “por maioria” com referência à conclusão do Painel Financeiro de que a Tarifa Social era um Imposto relevante, como se pode ler nos parágrafos 110, 122, 146, 203 e 209 da Decisão. A maioria do Tribunal conclui em conformidade que a decisão de considerar a Tarifa Social um Imposto Relevante nos termos do CAE foi uma decisão não unanime.

160. Segunda, a Demandante considera que o Painel Financeiro decidiu, por maioria, que a Demandante foi incapaz de demonstrar que a Tarifa Social era material (exceto em 2012).

161. Para sustentar a sua alegação, a Demandante baseia-se especificamente nos parágrafos 118, 122 e 123 da Decisão do Painel Financeiro. Os referidos parágrafos estabelecem:

“118. No presente caso, a Tejo Energia provou, por meio de correspondência apresentada como Prova C-37 (i) o Montante Limiar Aplicável para 2012 e (ii) o valor atual líquido dos custos associados com os Impostos Relevantes incorridos pela Tejo Energia em 2012 em conformidade com a fórmula estabelecida no ponto 1.3 do Apêndice 11 do CAE, porém não demonstrou o cálculo do Montante Limiar Aplicável e do montante resultante da fórmula prevista no ponto 1.3 do Apêndice 11 no que concerne aos anos de 2015, 2016 e 2017, cujos custos estão a ser reclamados no âmbito deste processo.”

“122. Resulta do que precede que, na opinião da maioria dos membros do Painel Financeiro, embora a imposição da Tarifa Social consubstancie uma Alteração a um Imposto Relevante, a Tejo Energia não pode acionar, por agora, os mecanismos previstos nas Cláusulas 20.2 a 20.5 do CAE para garantir, na medida do possível, que ficará na mesma posição financeira ao abrigo do CAE em que estaria se a Tarifa Social não tivesse sido criada porque não provou que tal Alteração no Imposto Relevante é material, em conformidade com as disposições da Cláusula 20.1 e o Apêndice 11 do CAE.”

“123. Salienta-se, porém, que tal não deve impedir a Tejo Energia de provar a materialidade dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social durante 2015, 2016 e 2017 no futuro, a fim de acionar o procedimento aplicável ao abrigo do CAE.”

162. Não é claro se o Painel Financeiro decidiu por unanimidade ou por maioria que a Demandante foi incapaz de demonstrar que a Tarifa Social era material (exceto em 2012), uma vez que a redação “por maioria” é apenas usada no parágrafo 122. Em qualquer caso, mesmo que, arguendo, fosse uma decisão não unânime, tal decisão, incontestada pelas Partes, não foi contestada por qualquer das Demandadas. Para ser mais claro, o Painel Financeiro não decidiu que o efeito da imposição da Tarifa Social era imaterial. O Painel Financeiro decidiu que, para estabelecer tal materialidade, a Demandante tinha de fornecer provas para cada ano relevante, o que a Demandante não fez, mas, de acordo com o Painel Financeiro podia fazer no futuro. Quando as Demandadas se opuseram aos procedimentos do Anexo 11 após a Decisão do Painel Financeiro, as Demandadas não contestaram que a Demandante foi incapaz de demonstrar a materialidade da imposição da Tarifa Social perante o Painel Financeiro.

163. Terceira, a Demandante considera que o Painel Financeiro decidiu, por maioria, que “a Demandante tem o direito a reaver estes custos da Segunda Demandada se for capaz de demonstrar o efeito material da Tarifa Social e for adotado o procedimento nos termos da Cláusula 20.4.”

164. Se o Painel Financeiro decidiu por unanimidade ou por maioria que a Demandante “tem o direito a reaver tais custos da segunda Demandada se for capaz de demonstrar o efeito material da Tarifa Social e for adotado o procedimento nos termos da Cláusula 20.4.” não pode ser determinado através da simples leitura da Decisão. A lógica da Decisão dita, contudo, que tal decisão foi tomada em parte por maioria e por unanimidade no que concerne ao resto. Na verdade, uma vez que um dos membros do Painel Financeiro manifestou a sua discordância com referência à classificação da Tarifa Social enquanto Imposto, significa que tal membro iria exigir o cumprimento de ambos os requisitos da Cláusula 20.1 (a Tarifa Social é uma alteração relevante e o seu efeito é material). Contudo, todos os membros do Painel decidiram que, se se verificassem as duas condições da Cláusula 20.1, o mecanismo disponível seria aquele que é fornecido nos termos da Cláusula 20.4.

165. A próxima questão para o Tribunal consiste em determinar se alguma das decisões não unânimes do Painel Financeiro foi contestada pelas Demandadas.

166. As Demandadas negam ter contestado a Decisão do Painel Financeiro. Contudo, a posição das Demandadas fundamenta-se principalmente na premissa de que as decisões do Painel Financeiro estavam restringidas às decisões contidas na secção “dispositivo” da decisão do Painel Financeiro.

167. Nem a Primeira nem a Segunda Demandada negam ter-se oposto à tentativa da Demandante para resolver o litígio nos termos do Anexo 11. As Demandadas resistiram ao procedimento de resolução amigável e rejeitaram a aplicação do mesmo nas cartas seguintes. A Demandante iniciou esta arbitragem após o insucesso das negociações de resolução amigável, seguindo novamente o Procedimento Geral de Resolução de Litígios estabelecido no Anexo 9 do CAE. Acima de tudo, a Primeira Demandada respondeu à tentativa da Demandante para iniciar o Procedimento Específico de Resolução de Litígios afirmando que “a sugestão da Demandante parece considerar a obrigação da Tejo Energia de pagar a tarifa Social como uma realidade subordinada ao conceito de Imposto Relevante – tal como definido no CAE – e não como uma obrigação de serviço público de natureza social.”

168. Como tal, a decisão não unânime do Painel Financeiro de que a Tarifa Social constituía uma Alteração Relevante e a decisão não unânime do Painel Financeiro de que a Demandante apenas tinha que demonstrar a materialidade do efeito da imposição da Tarifa Social foram contestadas pelas Demandadas.

169. Nesta medida, o quarto pedido da Demandante é parcialmente procedente e a Demandante tem direito a remeter o Litígio para Arbitragem.

170. O quinto pedido da Demandante é para que o Tribunal em “alternativa aos [primeiro a quarto pedidos] da Demandante, DECLARE que o Painel Financeiro não tomou uma decisão relativamente ao Litígio, não tendo decidido quem deverá suportar os custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social ao abrigo do CAE, e que, consequentemente, tem competência para resolver o Litígio de acordo com o Parágrafo 12, Parte I, Anexo 9 do CAE e para decidir todas as questões relevantes para o efeito.”

171. Conforme estabelecido anteriormente, o Anexo 9 do CAE não confere competência ao Tribunal para analisar e/ou corrigir qualquer decisão do Painel Financeiro. Nomeadamente, o Anexo 9 do CAE não confere competência ao presente Tribunal para conhecer qualquer questão que não foi resolvida pelo Painel.

172. O quinto pedido da Demandante é improcedente.

173. O sexto pedido da Demandante é para que o Tribunal “DECLARE que tem competência ao abrigo da Cláusula 20.ª e do Anexo 11 do CAE para (entre outras medidas consideradas apropriadas e conforme especificado nos articulados da Demandante sobre o mérito do Litígio) para: 1. Determinar se os custos incorridos pela Demandante com o financiamento da Tarifa Social são materiais;2. alterar o Encargo de Potência Instalada; e 3. Condenar as Demandadas ao reembolso dos montantes incorridos pela Demandante com o financiamento da Tarifa Social de acordo com a alteração do Encargo de Potência Instalada.”

174. Nenhum destes três pedidos se refere a uma decisão não unanime do Painel. Como tal, o Tribunal não tem poder, conforme o Parágrafo 15, Parte I do Anexo 9, para decidir sobre tais pedidos.

175. O sexto pedido da Demandante é improcedente.

176. O sétimo pedido da Demandante é para que o Tribunal “Em alternativa ao [sexto pedido da Demandante] DECLARE que tem poderes para (entre outras medidas consideradas apropriadas e conforme venha a ser detalhado nos articulados da Demandante sobre o mérito do Litígio) condenar as Demandadas a: 1. Cumprir o procedimento contratual para alteração do Encargo de Potência instalada nos termos da Cláusula 20.ª e do Anexo 11 do CAE; e 2. Reembolsar a Demandante dos montantes incorridos com o financiamento da Tarifa Social de acordo com a fatura enviada à Segunda Demandada em conformidade com a alteração do Encargo de Potência Instalada conforme corrigida pelo Painel Financeiro ao abrigo do Parágrafo 10.4 do Anexo 11 do CAE.”

177. Resulta do que precede, que o Tribunal não tem poder para condenar as Demandadas a reembolsar a Demandante “dos montantes incorridos com o financiamento da Tarifa Social de acordo com a fatura enviada à segunda Demandada em conformidade com a alteração do Encargo de Potência Instalada conforme corrigida pelo Painel Financeiro ao abrigo do Parágrafo 10.4 do Anexo 11 do CAE.” Tal não é uma decisão não unanime do Painel Financeiro que o Tribunal possa voltar a abordar ou uma decisão unanime do Painel Financeiro que o Tribunal possa declarar como “final e vinculativa.”

178. Em contrapartida, o Tribunal tem poder para revisitar a decisão não unânime do Painel Financeiro de acordo com a qual a imposição da Tarifa Social foi considerada uma Alteração Relevante. Se esta decisão se confirmar, então o Tribunal teria poder para condenar as Demandadas a cumprir o procedimento nos termos da Cláusula 20.ª e do Anexo 11. O Painel Financeiro constituído em conformidade teria poder para determinar se o efeito da imposição da Tarifa Social era de facto material, e, em caso afirmativo, teria poder para escolher entre as propostas de alteração sugeridas pelas Partes.

Se, em contrapartida, a decisão for revertida, então o mecanismo nos termos da Cláusula 20.4 e do Anexo 11 deixaria de estar disponível.

179. Nesta medida, o sétimo pedido da Demandante é parcialmente procedente.

180. A maioria do Tribunal leu e considerou atentamente o Voto de Vencido do nosso colega, BB. As nossas razões para discordar com o referido Voto serão de forma geral aparentes, na sequência do que precede.

181. Ex abundanti cautela, a maioria do Tribunal acrescenta o seguinte:

182. Primeiro, as Regras Processuais do Painel Financeiro (citado anteriormente no parágrafo 29) operaram por derrogação acordada do CAE. Nomeadamente, as Partes acordaram que uma decisão não unânime do Painel Financeiro deve ser encaminhada para resolução amigável e (na ausência de acordo) para procedimento de arbitragem na Parte I do Anexo 9 do CAE: ponto 1.1 do parágrafo III das Regras Processuais. Tal resultou da derrogação do parágrafo 10.6 do Anexo 11 do CAE. As Partes também acordaram, no ponto 1.3 do parágrafo III das Regras Processuais, que um membro do Painel Financeiro (diferente do Presidente) pode ser nomeado árbitro “numa arbitragem referente a um Litígio”. Tal resultou da derrogação da disposição por defeito, prevista no parágrafo 16 do Anexo 9 do CAE. É devido a esta derrogação que o Sr. AA foi nomeado para esta arbitragem.

183. Como tal, o parágrafo 10.6 do Anexo 11 do CAE não continua a ser aplicado no presente litígio.

184. Segundo, as Regras Processuais acordadas definiram o objeto do Litígio como a decisão de quem deve, em última análise, suportar os custos incorridos pela Tejo Energia enquanto produtor, com a Tarifa Social (página 3/19).

185. Terceiro, e em qualquer circunstância, se, na perspetiva da lei Portuguesa, a única coisa que o Painel Financeiro decidiu foi indeferir a pretensão (e considerar procedente o pedido reconvencional) então, resultaria do ponto 1.1 do parágrafo III das Regras Processuais que o Painel Financeiro não decidiu o litígio no prazo estabelecido no Calendário Processual, e o poder para solucionar o litígio seria devolvido à resolução amigável e (na ausência de acordo) para este painel de arbitragem. Este argumento foi apresentado pela Demandante no parágrafo 56 do seu Requerimento de Arbitragem. Não foi desenvolvido em escritos posteriores, mas não foi formalmente abandonado. Se a maioria do Tribunal tivesse chegado a uma perspetiva diferente sobre o que foi decidido pelo Painel Financeiro, então a justiça processual teria exigido (a) que a Demandante estabelecesse a sua posição de forma clara com referência aos termos explícitos do ponto 1.1. do parágrafo III das Regras Processuais e (b) as Demandadas teriam de ter abordado esse sub-parágrafo. Neste caso, não foi necessário porque a maioria do Tribunal concluiu que o Painel Financeiro decidiu o Litígio (conforme definição na página 3/19 das Regras Processuais), mas a decisão do Painel não foi unânime em relação a, pelo menos, um subtema”.

D - As regras processuais acordadas entre as Partes e o Painel Financeiro, em 11.12.2017, subordinadas ao índice de matérias - I. As Partes e os seus Representantes Legais - II. O Painel Financeiro - III. Regras Processuais do Apêndice 9 do CAE - IV. Calendário Processual - V. Petição inicial, Contestação, Réplica e Tréplica - VI. Organização da Audiência - VII. Regras sobre a prova - VIII. Produção da prova - IX. Língua das Alegações e Documentos - X. Notificações - XI. Língua do Processo - XII. Direito Substantivo Aplicável ao Litígio - XIII. Valor em litígio - XIV. Custos do Painel Financeiro -XV. Confidencialidade - XVI. Reconhecimento das Partes - XVII. Alterações às Regras Processuais - foram do seguinte teor:

“Considerando que:

• As Partes têm um litígio resultante do Contrato de Aquisição de Energia celebrado a 24 de novembro de 1993 (o "CAE") com referência à criação em 2010 de uma tarifa social em Portugal (a Tarifa Social criada pelo Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro - "Tarifa Social") (o “Litígio");

• O objeto do litígio é determinar quem deve, em última análise, suportar os custos incorridos pela Tejo Energia, enquanto produtor, com a Tarifa Social;

• as Partes nomearam em conjunto os membros do Painel Financeiro no dia 18 de setembro de 2017, tendo afirmado que pretendiam discutir e acordar com o Painel Financeiro o Regulamento Processual e o calendário do Litígio;

• no dia 26 de Setembro de 2017, o Painel Financeiro devidamente nomeado convidou as Partes a apresentarem o seu acordo quanto às regras processuais e ao calendário do Litígio;

• no dia 28 de Novembro de 2017, as partes apresentaram ao Painel Financeiro a sua proposta conjunta de regras processuais e de calendário para o Litígio;

• no dia 4 de Dezembro de 2017, as Partes e os membros do Painel Financeiro realizaram uma conferência sobre a condução do processo para discutir a proposta conjunta de regras processuais e de calendário para o Litígio; O Painel Financeiro e as Partes acordam nas seguintes regras processuais e calendário para ser seguido na audição e decisão do Litígio:

III. REGRAS PROCESSUAIS DO APÊNDICE 9 DO CAE

1.Para efeitos do presente Litígio, as Partes acordam nas seguintes regras com referência ao Procedimento de Resolução de Litígios do Apêndice 9 do CAE:

1.1 Caso o Painel Financeiro não tome uma decisão por unanimidade ou não tome uma decisão dentro dos prazos estabelecidos no Calendário Processual definido nas presentes Regras, o litígio será submetido ao procedimento de resolução amigável e posteriormente ao procedimento de arbitragem estabelecido na Parte I do Apêndice 9 do CAE.

Qualquer uma das partes apenas poderá submeter o Litígio à arbitragem no prazo de 10 dias contados da data em que se frustre uma resolução amigável nos termos da Cláusula 11 da Parte I do Apêndice 9 do CAE. Se nenhuma das Partes requerer a arbitragem, a decisão do Painel Financeiro tornar-se-á final e vinculativa.

1.2 O Painel Financeiro apenas terá poderes para resolver o Litígio e considerar-se-á destituído após a resolução do mesmo.

1.3 À exceção do Presidente, os membros do Painel Financeiro poderão ser nomeados como árbitros numa arbitragem com referência ao Litígio e as Partes acordam ainda que todos os membros do Painel Financeiro podem ser nomeados como membros de um painel ou árbitros noutros litígios.

1.4 O pagamento dos Custos com o Painel será efetuado de acordo com estas Regras Processuais.

1.5 A inquirição de testemunhas será efetuada de acordo com estas Regras Processuais.

1.6 O Painel Financeiro proferirá a sua decisão de acordo com o Calendário Processual estabelecido nestas Regras Processuais.

1.7 As notificações no presente Litígio serão efetuadas de acordo com estas Regras Processuais.

IV. CALENDÁRIO PROCESSUAL

1.O Litígio decorrerá de acordo com o Calendário Processual anexo a estas Regras Processuais.

2. O prazo para o Painel Financeiro proferir a Decisão de acordo com o parágrafo 1 precedente pode ser livremente prorrogado por decisão do Painel Financeiro, após consulta das Partes, por um período suplementar de 60 dias.

V. PETIÇÃO INICIAL, CONTESTAÇÃO, RÉPLICA E TRÉPLICA

1 As Partes devem apresentar as suas alegações escritas (i.e. Petição Inicial, Contestação, Réplica e Tréplica) nos termos destas Regras Processuais.

2 Após o recebimento da Defesa das Requeridas, a Demandante terá o direito a uma Réplica, após a submissão da qual as Requeridas terão direito a uma Tréplica, as quais devem ser submetidas de acordo com o Calendário Processual definido na Secção IV.1 acima.

3 Cada Parte apresentará as suas alegações escritas indicando os factos, a argumentação jurídica e o pedido, bem como uma lista dos documentos que as acompanham, depoimentos de testemunhas e relatórios periciais, de acordo com o seguinte formato: (i) cada alegação incluirá um índice; (ii) as páginas e os parágrafos serão numerados consecutivamente; e (iii) o tamanho da letra não excederá os 11 pt, com espaçamento entre linhas de 1,5 e, no mínimo, 6 pt entre parágrafos.

4 As alegações de cada Parte deverão (i) incluir como anexos todos os documentos na posse, custódia ou controlo da Parte, nos quais aquela pretende fundamentar a sua posição; (ii) identificar as testemunhas factuais que cada Parte pretende apresentar e anexar um depoimento escrito, datado e assinado, da testemunha, contendo o seu nome completo e morada, a sua relação com qualquer uma das Partes (passada e presente, se existir), a sua situação profissional atual e anterior, uma declaração de veracidade do depoimento, e o texto completo do testemunho; e (iii) identificar as testemunhas periciais em cuja opinião a parte pretende suportar a sua posição e anexar um parecer datado e assinado contendo o nome completo e a morada do perito, uma descrição dos seus antecedentes, qualificações, formação e experiência, a sua relação com qualquer uma das Partes, os seus consultores jurídicos ou os membros do Painel Financeiro (atual e anterior, se existir), uma declaração de independência relativamente às Partes, dos seus consultores jurídicos e dos membros do Painel Financeiro, uma descrição das instruções ao abrigo das quais apresentará o seu parecer e conclusões, e o texto integral do parecer do perito, incluindo uma descrição dos métodos, provas e informações usadas para chegar às conclusões, quando apropriado.

5 Nenhuma outra alegação ou prova relativa ao mérito da causa será apresentada para além da Petição Inicial, Contestação, Réplica e Tréplica.

6 Sem prejuízo da responsabilidade solidária nos termos do CAE, para que não subsistam quaisquer dúvidas, as Requeridas são consideradas Partes independentes, cada qual com direito a apresentar alegações autónomas.

VI. ORGANIZAÇÃO DA AUDIÊNCIA

1 Poderá ser realizada por telefone uma conferência pré-audiência entre o Painel Financeiro e as Partes para abordar qualquer questão pendente em relação à organização da audiência, incluindo questões processuais.

2 Salvo se determinado de outra forma pelo Painel Financeiro, a audiência realizar-se-á com a seguinte ordem: (i)apresentação inicial do caso pelas Partes; (ii) inquirição das testemunhas factuais; (iii) inquirição das testemunhas periciais; e (iv) alegações finais (se existirem).

3 As Partes poderão fazer apresentações com slides ou outros meios semelhantes durante a audiência, desde que não seja feita referência a provas que não tenham sido submetidas à data e que seja indicada a(s) fontes(s) primária(s). Uma cópia física e digital de tal apresentação deve ser entregue à contraparte e ao Painel Financeiro antes de ser usada na audiência.

4 As Partes podem reunir, entrevistar e preparar as potenciais testemunhas para a audiência (incluindo para auxiliar na redação do depoimento escrito da testemunha), desde que tal interação não resulte em influência indevida do seu depoimento.

5 Cada Parte deverá informar a(s) testemunha(s) e/ou o(s) perito(s) que pretende contrainterrogar na audiência. O Painel Financeiro é livre de inquirir qualquer uma das testemunhas ou peritos.

6 Cada Parte será responsável por apresentar as respetivas testemunhas que sejam convocadas para a audiência.

7 Em princípio, a inquirição das testemunhas seguirá o seguinte procedimento: (i) cada testemunha será brevemente inquirida pela Parte que apresentou o seu depoimento escrito, mantendo-se dentro dos rigorosos limites do depoimento escrito; posteriormente (ii)cada testemunha será inquirida por cada uma das outras Partes sobre as questões abordadas nos depoimentos escritos (contrainterrogatório); posteriormente (iii) cada testemunha pode ser interrogada pela Parte que apresentou o seu depoimento escrito, limitando-se às questões abordadas durante o contra interrogatório (contra-contrainterrogatório).

8 Se uma testemunha convocada para a audiência não comparecer, o seu depoimento escrito será desconsiderado, a menos que (i)a contraparte renuncie ao seu direito de a contrainterrogar; ou (ii) o Painel Financeiro decida de outro modo, ao abrigo de circunstâncias excecionais e após consulta das partes.

9 Se uma testemunha não puder comparecer fisicamente na audiência por motivo válido, o Painel Financeiro pode permitir que o seu depoimento seja tomado através de videoconferência. Neste caso, o Painel Financeiro pode emitir uma Ordem Processual específica para abordar todas as questões logísticas e os procedimentos envolvidos.

10 Se uma testemunha prestar o seu depoimento numa língua diferente do Inglês, as Partes deverão providenciar o serviço de interpretação simultânea.

11 Em princípio, as testemunhas serão ouvidas separadamente, pela ordem definida pelas Partes. Todavia, o Painel Financeiro pode decidir ouvir duas ou mais testemunhas em simultâneo, a pedido das Partes ou oficiosamente.

12 As testemunhas factuais não estarão presentes na sala da audiência durante a apresentação inicial do caso nem durante o depoimento de outras testemunhas, salvo se já tiverem prestado o seu depoimento. Em princípio, as testemunhas que são representantes das Partes serão ouvidas em primeiro lugar, especialmente se desejarem permanecer na sala de audiências após o seu depoimento. As testemunhas periciais podem estar presentes na sala de audiências em qualquer momento da audiência.

13 As Partes chegarão a acordo sobre detalhes de organização necessários e encarregar-se-ão elas próprias de providenciar os serviços adequados (incluindo a transcrição da audiência), informando prontamente o Painel Financeiro. As Partes podem solicitar ao Painel Financeiro qualquer apoio que seja necessário à organização da audiência.

14 Sem prejuízo da decisão do Painel Financeiro em relação à Parte que será responsável pelos custos com a audiência, os referidos custos serão pagos diretamente pela Requerente e pelas Requeridas em partes iguais (ou seja, 1/2 para a Requerente e 1/2para as Requeridas).

15 No fim da audiência, o Painel Financeiro, em consulta com as Partes, determinará (i) se é necessária mais alguma produção de prova; e (ii) se são necessárias quaisquer Alegações Pós-Audiência.

16 Na respetiva nota de custas, cada Parte deverá quantificar os custos incorridos em duas declarações separadas: uma para os custos incorridos em relação ao Pedido e outra em relação aos custos incorridos com o Pedido Reconvencional, caso exista.

VII. REGRAS SOBRE PROVA

1 O Painel Financeiro, no uso da sua discricionariedade, determinará a admissibilidade, relevância, materialidade e suficiência de qualquer prova apresentada pelas Partes.

2 As Regras da IBA sobre Obtenção da Prova em Arbitragem Internacional (2010) (as "Regras IBA") poderão ser usadas pelo Painel Financeiro e pelas Partes como um guia em matéria de prova.

VIII. PRODUÇÃO DE PROVA

1 Se uma das Partes fizer referência a elementos jurídicos (tais como, leis, artigos, livros ou decisões, entre outros), tais elementos deverão ser entregues de forma a permitir que o Painel Financeiro possa ler e compreender as passagens a que são feitas referências no contexto indicado.

2 Os depoimentos das testemunhas devem respeitar as seguintes normas: (i) os depoimentos devem ser suficientemente pormenorizados – sendo considerados como tal se puderem substituir o interrogatório direto; (ii) os depoimentos devem evitar citações extensas de documentos; (iii) os depoimentos não devem conter argumentos jurídicos, a menos que a testemunha seja responsável por emitir um parecer jurídico; (iv) os depoimentos devem indicar se a testemunha tem ou não conhecimento direto da informação ou se se trata de um depoimento indireto ou de uma opinião, indicando no último caso a fonte da informação ou a razão para a opinião; e (v) os depoimentos podem fazer referência a documentos, sendo os mesmos submetidos de acordo com as regras gerais aplicáveis aos documentos de acordo com estas Regras Processuais.

3 Os documentos submetidos como cópias de documentos originais terão o mesmo valor probatório que os originais, a menos que uma Parte conteste a sua autenticidade. Nesse caso, o Painel Financeiro avaliará, no uso da sua discricionariedade, a admissibilidade e suficiência probatória dos referidos documentos.

4 Visando a melhor organização do dossiê do litígio, todos os documentos submetidos pelas Partes deverão ser numerados consecutivamente. Os documentos apresentados pela Requerente deverão ser identificados como "C-1, C-2,...", enquanto a segunda Requerida REN Trading, S.A. identificará os seus documentos como "RT-1, RT-2,..." e a primeira Requerida REN - Rede Elétrica Nacional, S.A. identificará os seus documentos como "RE-1, RE-2,...". A numeração começará após a emissão destas Regras Processuais. As cópias eletrónicas serão designadas de acordo com a numeração, em conjunto com o título do documento.

5 Todas as provas documentais submetidas ao Painel Financeiro, incluindo provas submetidas sob a forma de cópias, serão consideradas autênticas e completas, salvo se uma Parte contestar a sua autenticidade e integridade. O Painel Financeiro decidirá sobre qualquer objeção à autenticidade ou integridade das provas apresentadas.

6 Os depoimentos das testemunhas factuais da Requerente serão numerados como "CWS-1, CWS-2...", enquanto os depoimentos das testemunhas da Segunda Requerida, REN Trading S.A., como "RTWS-1, RTWS-2..." e da Primeira Requerida REN - Rede Elétrica Nacional, S.A. como "REWS-1, REWS-2..." A numeração começará após a prolação destas Regras Processuais. As Partes devem preparar para a audiência uma cópia em papel de todos os depoimentos das testemunhas, separados por pastas e separadores para facilitar a identificação. As cópias eletrónicas serão designadas de acordo com a numeração, em conjunto com o nome da testemunha.

7 Os relatórios das testemunhas periciais da Requerente serão numerados como "CER-1, CER-2...”, enquanto os relatórios dos peritos da Segunda Requerida, REN Trading S.A., como "RTER-1, RTER-2...” e da Primeira Requerida REN - Rede Elétrica Nacional, S.A., como "REER-1, REER-2...". A numeração começará após a prolação destas Regras Processuais. As Partes prepararão para a audiência uma cópia em papel de todos os relatórios de peritos, separada por pastas e separadores para facilitar a identificação. As cópias eletrónicas serão designadas de acordo com a numeração, em conjunto com o nome do perito.

8 O Painel Financeiro pode, por sua iniciativa ou a pedido de uma das Partes, organizar a acareação de dois ou mais peritos se considerar apropriado, e diante do Painel Financeiro e das Partes.

9 As provas referentes a elementos jurídicos da Requerente serão designadas e numeradas como "CL-1, CL-2...”, enquanto as provas referentes a questões jurídicas da Segunda Requerida, REN Trading, S.A., como "RTL-1, RTL-2...” e da Primeira Requerida REN - Rede Elétrica Nacional, S.A., como "REL-1, REL-2...". A numeração começará após a prolação destas Regras Processuais. As partes devem preparar para a audiência uma cópia em papel de todos os elementos de prova jurídica, separados por pastas e separadores para facilitar a identificação. As cópias eletrónicas serão designadas de acordo com a numeração, em conjunto com o nome do perito.

10 Quando for necessário fazer referência a um documento, depoimento ou prova referente a elementos jurídicos, as Partes e os membros do Painel Financeiro devem indicar o seu número.

IX. LÍNGUA DAS ALEGAÇÕES E DOCUMENTOS

1 Todas as alegações, depoimentos escritos e relatórios de peritos devem ser redigidos em Inglês.

2 Qualquer prova documental que não esteja redigida em Inglês deverá ser acompanhada de uma tradução livre em Inglês. No caso de documentos extensos, apenas é necessária a tradução para Inglês das passagens relevantes. Não obstante, qualquer citação ou referência constante das alegações escritas numa língua diferente da língua inglesa deve ser acompanhada da sua tradução para Inglês, que não necessita de ser oficial a menos que a referida tradução seja contestada, de forma razoável, pela outra Parte. No caso de a tradução ser contestada pela outra Parte, a Parte que elaborou o documento submeterá uma tradução certificada. A Parte que elaborou o documento adiantará os custos da tradução, sem prejuízo da decisão do Painel Financeiro em relação à Parte ou Partes que, em última análise, suportará esses custos.

3 Quaisquer questões sobre o âmbito da tradução serão resolvidas entre as Partes. Na ausência de acordo, o Painel Financeiro decidirá.

X. NOTIFICAÇÕES

1 Todas as notificações, comunicações e alegações escritas das Partes no presente processo serão consideradas validamente efetuadas quando enviadas por e-mail, formatos pdf e docx para todos os endereços indicados na Secção I.

2 Todas a documentação de suporte de quaisquer notificações, comunicações e alegações escritas das Partes, nomeadamente documentos, depoimentos de testemunhas e relatórios de peritos, serão enviados para o Painel Financeiro com cópia para as outras Partes, em formato electrónico pesquisável (se possível), em anexo aos e-mails enviados pelas Partes ou de forma acessível através de uma plataforma eletrónica cujo link seja disponibilizado nos referidos e-mails.

3 Em prazos simultâneos será observado o mesmo limite temporal; contudo, as Partes enviarão o e-mail apenas ao Painel Financeiro; e cada Parte reencaminhará tal e-mail para as outras Partes no dia útil seguinte.

4 Todas as comunicações e ordens processuais do Painel Financeiro serão transmitidas às Partes por e-mail. Todos os prazos estabelecidos ao abrigo dessas comunicações terão início no dia útil seguinte ao envio do e-mail, a menos que o dia útil seguinte corresponda a um feriado oficial, ou a um dia não útil em Lisboa, caso em que o prazo terá início no primeiro dia útil seguinte. Os feriados oficiais e os dias não úteis são incluídos no cômputo do prazo. Se o último dia do prazo concedido coincidir com um feriado oficial ou um dia não útil no país onde a notificação ou a comunicação se considerou como recebida, o prazo expirará no final do primeiro dia útil seguinte. Estas comunicações podem ser assinadas apenas pelo Presidente, tendo sido ouvidos os outros dois membros do Painel Financeiro.

5 Qualquer alteração ao nome, descrição, endereço ou outra informação de contacto de qualquer Parte ou representante de Parte, e membro do Painel Financeiro será imediatamente notificada ao Painel Financeiro e às outras Partes. Caso a notificação sobre a alteração não seja efetuada, as notificações e comunicações enviadas para o nome, descrição, morada ou outra informação de contacto indicados na última notificação da Parte, de acordo com a presente secção, serão válidas.

XI. LÍNGUA DO PROCESSO

O processo será conduzido em Inglês e o Painel Financeiro deliberará e proferirá a sua Decisão nessa língua.

XII. DIREITO SUBSTANTIVO APLICÁVEL AO LITÍGIO

A lei aplicável ao mérito da causa será a lei Portuguesa.

XIII. VALOR EM LITÍGIO

O valor atual em litígio é de € 5.807.581,20 (cinco milhões, oitocentos e sete mil, quinhentos e oitenta e um euros e vinte cêntimos) (à data de 31 de outubro de 2017).

XIV. CUSTOS DO PAINEL FINANCEIRO

1. Os custos do Painel Financeiro compreendem os honorários e as despesas dos membros do Painel Financeiro.

2. O Painel Financeiro determina o valor do Litígio por referência aos pedidos apresentados por cada Parte.

3. O Painel Financeiro determinará os honorários e os custos administrativos do Litígio tendo por referência os honorários por árbitro estabelecidos no Regulamento de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional atualmente em vigor. Assim, em conformidade com a secção XIII (“Valor em Litígio”) destas Regras Processuais, o montante estimado de honorários e custos administrativos é de € 300.000 (trezentos mil euros) (à data de 31 de outubro de 2017). O Painel pode modificar este montante caso o valor em litígio se altere durante a condução do processo. As Partes devem informar prontamente o Painel de quaisquer alterações ao valor atualmente em discussão.

4. As despesas dos membros do Painel Financeiro devem ser pagas em conformidade com o custo efetivamente incorrido.

5. Os honorários e as despesas dos membros do Painel Financeiro devem ser suportados, sem prejuízo da decisão final do Painel Financeiro quanto à imputação dos custos, em partes iguais pela Requerente e as Requeridas (ou seja, 1/2 para a Requerente e 1/2 para as Requeridas).

6. A Requerente e as Requeridas devem depositar até 31 de dezembro de 2017 o montante de € 100.000 (cem mil euros) pelas Partes (50% pela Requerente, 25% pela REN Elétrica e 25% pela REN Trading).

7. Se o Litígio terminar antes da Decisão final, o Painel Financeiro poderá, após consultar as Partes e considerar as circunstâncias do caso em apreço e, em especial, a celeridade e eficiência do Painel Financeiro na condução do processo, bem como a complexidade do processo e o tempo despendido pelo Painel Financeiro, e a fase em que o processo foi concluído ou qualquer outra circunstância considerada relevante, reduzir os honorários do Painel Financeiro para: (i) 30% do valor inicialmente determinado em conformidade com o ponto 3 da presente Secção, se o Litígio terminar antes de as Partes trocarem algumas das suas alegações; (ii) 50% se o Litígio terminar antes do início da audiência final; e (iii) 70% se o Litígio terminar 20 (ou mais) dias antes da data em que o Painel Financeiro deveria proferir a sua decisão.

8. O Painel Financeiro deve incluir na Decisão a imputação desses custos e despesas a qualquer parte, incluindo honorários e despesas de advogados, e despesas de peritos e testemunhas, que o Painel Financeiro considere razoáveis. Ao realizar esta alocação, o Painel Financeiro deve considerar o sucesso relativo das Partes nos seus pedidos, pedidos reconvencionais e defesas, assim como outras circunstâncias tidas como relevantes.

9. Os pagamentos referidos anteriormente serão efetuados através de transferência bancária para a seguinte conta bancária: Nome da conta: (…) Banco: (…) BANCO SABADELL ATLANTICO IBAN: (…) Descrição: Tejo Energia vs REN Elétrica e REN Trading.

XV. CONFIDENCIALIDADE

1 Sem prejuízo de qualquer direito ou obrigação legal, as Partes, os seus agentes ou representantes e qualquer membro do Painel Financeiro manterá privada e confidencial a existência do presente Litígio, em particular quanto ao procedimento seguido, os documentos trocados, a prova produzida e todas as formalidades processuais, incluindo a Decisão Final. As Partes procurarão assegurar que quaisquer testemunhas factuais ou periciais do processo estarão igualmente vinculadas ao mesmo dever de confidencialidade. As Partes divulgarão a presente cláusula a quaisquer terceiros que participem neste processo, qualquer que seja a qualidade em que o façam.

2 As Partes apenas podem divulgar, parcial ou integralmente, a informação identificada no parágrafo anterior nos termos da Cláusula 21.2 do CAE e na medida do estritamente necessário para o cumprimento de quaisquer disposições legais ou regulamentares obrigatórias perante qualquer autoridade administrativa competente.

XVI. RECONHECIMENTO DAS PARTES

1 As autoridades internas competentes de cada uma das Partes aprovaram devidamente a elaboração destas Regras Processuais. As Partes declaram que não é necessária mais nenhuma autorização suplementar, pública ou privada, para os referidos efeitos.

2 Os representantes que assinam estas Regras Processuais em nome de cada Parte estão devidamente habilitados para o efeito.

XVII. MODIFICAÇÕES AO REGULAMENTO PROCESSUAL

O Painel Financeiro pode modificar estas Regras Processuais (com exceção das regras contidas na secção III), de forma a garantir que o Litígio é resolvido de forma célere e financeiramente eficiente, após consulta prévia das Partes, as quais não podem negar injustificadamente o seu consentimento a tais modificações.

E - Consta da (tradução da) decisão do Painel Financeiro, datada de 27.9.2018 e assinada por AA, DD e EE, e do seu original na língua inglesa, o seguinte:

“4. DISPOSITIVO

211. Com base nas considerações acima expostas, este Painel Financeiro DECIDE unanimemente:

1. Rejeitar todos os pedidos da Tejo Energia.

2. Condenar a Tejo Energia a pagar o valor de € 145.198,00 (…) à REN Trading, correspondentes ao montante pago à Tejo Energia relativamente aos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social desde janeiro de 2011 a dezembro de 2014 (inclusive).

3. Condenar a Tejo Energia a pagar à REN Trading os juros acrescidos sobre o valor de € 145.198,00 (cento e quarenta e cinco mil, cento e noventa e oito euros) à taxa legal aplicável desde a data da sua Contestação até ao integral pagamento.

4. Condenar a Tejo Energia a suportar os seus próprios custos e despesas neste processo, que se cifram em € 631.503,47 (…) e metade dos custos e despesas das Requeridas. Assim, a Tejo Energia deve pagar à REN Elétrica o valor de € 129.749,15 (…) e à REN Trading o valor de € 119.080,77 (…).

5. Condenar a REN Eléctrica e a REN Trading a suportarem metade dos seus próprios custos e despesas neste processo, isto é, € 129.749,15 (…) e € 119.080,77 (…), respetivamente.

4. HOLDING

211.

In view of the foregoing considerations, this Financial Panel hereby DECIDES unanimously:

1. To reject all of the claims submitted by Tejo Energia.

2. To order Tejo Energia to pay REN Trading the amount of €145.198,00 (…), corresponding to the amount paid to Tejo Energia in respect of the costs incurred with the financing of the Social Tariff from January 2011 to December 2014 (including);

3. To order Tejo Energia to pay REN Trading the accrued interests on the amount of €145.198,00 (…) at the legal applicable rates in ce the date of its Statement of Defense until full payment.

4. To order Tejo Energia to bear its own costs and expenses in these proceedings, which amount to €631.503,47 (…), and half of the costs and expenses of the Respondents. Accordingly, Tejo Energia shall pay REN Electrica the amount of €129.749,16 (…) and REN Trading the amount of €119.080,77 (…). 5. To order the REN Electrica and REN Trading to bear half of its own costs and expenses in these proceedings, that is, €129.749,16 (…) and €119.080,77(…), respectively”.

F - O Painel Financeiro estruturou a sua apreciação nos termos do seguinte índice, que aqui indicamos como lista de matérias (isto é, sem nos interessar a concreta localização em termos de páginas da decisão):

“ÍNDICE: I. AS PARTES (…) II. O PAINEL FINANCEIRO (…)

III. DO HISTÓRICO PROCESSUAL

IV. DOS PEDIDOS - 1. Pedido da Tejo Energia, 2. Pedido da REN Eléctrica, 3. Pedido da REN Trading,

V. DO LITÍGIO REMETIDO AO PAINEL FINANCEIRO E DAS EXPOSIÇÕES DAS PARTES - 1. Da aplicabilidade da Cláusula 20 do CAE (…) 2. Do papel da REN Trading ao abrigo do CAE e as suas repercussões (…) 3. Das condições para a aplicação da Cláusula 20 do CAE (…) 4. Do procedimento aplicável: Cláusulas 20.3 e 20.4 do CAE (…) 5. Da mudança de comportamento da REN Trading desde fevereiro de 2015 (…) 6. Da natureza da repercussão dos custos com a Tarifa Social como uma medida de auxílio de Estado (…) 7. Outras alegações apresentadas pelas Partes (…)

VI. DECISÃO DO PAINEL FINANCEIRO (…) 1. QUESTÕES PRELIMINARES (…) 1.1. DA COMPETÊNCIA DO PAINEL FINANCEIRO AO ABRIGO DO CAE (…) 1.2. DA TEMPESTIVIDADE DA RÉPLICA DA TEJO ENERGIA (…) 1.3. DO SUPOSTO USO ABUSIVO DO PROCESSO (…)

2. DO MÉRITO DO CASO (…)

2.1. DAS CONDIÇÕES DE APLICAÇÃO DA CLÁUSULA 20 DO CAE (…)

2.2. O REEMBOLSO DOS CUSTOS COM A TARIFA SOCIAL À LUZ DOS TERMOS DO CAE (…)

2.3. A APLICAÇÃO DA CLÁUSULA 20 DO CAE NÃO DEPENDE DA CAPACIDADE DA REN TRADING DE REPERCUTIR O CUSTO DA TARIFA SOCIAL NAS TARIFAS PAGAS PELOS CONSUMIDORES (…)

2.4. O DECRETO-LEI N.º 138-A/2010, DE 28 DE DEZEMBRO DE 2010, ALTERADO EM MARÇO DE 2016, NÃO IMPEDE A APLICAÇÃO DA CLÁUSULA 20 DO CAE (…)

2.5. A APLICAÇÃO DA CLÁUSULA 20 DO CAE NÃO CONFIGURA UM AUXÍLIO DE ESTADO (…)

2.6. PEDIDO RECONVENCIONAL DA REN TRADING (…)

2.7. CONCLUSÃO (…)

3. CUSTOS (…)

4. DISPOSITIVO (…)”.

G - No original em inglês deste índice, as palavras usadas são:

I - THE PARTIES;

II – THE FINANCIAL PANEL;

III – FORMS OF ORDER SOUGHT - 1. Relief sought by Tejo Energia; 2 Relief sought by REN Eléctrica; 3 Relief sought by REN Trading.

III – PROCEDURAL HISTORY;

IV - FORMS OF ORDER SOUGHT;

V – THE DISPUTE REFERRED TO THE FINANCIAL PANEL AND SUBMISSIONS OF THE PARTIES; 1 Enforceability of Clause 20 of the PPA; 2 REN Trading’s role under the PPA and its repercussions; 3 The conditions for application of Clause 20 of the PPA; 4 Applicable procedure. Clauses 20.3 and 20.4 of the PPA; 5 The change of REN Trading’s behaviour since February 2015; 6 The nature of the pass-trough of the Social Tariff as a State aid measure; 7 Other submissions put forward by the Parties.

VI. DECISION OF THE FINANCIAL PANEL. 1. PRELIMINARY ISSUES; 1.1 The jurisdiction of the Financial Panel under the ppa: 1.2 Timeliness of Tejo Energia’s Statement of Reply; 1.3 The purported abusive use of the procedure.

2 - THE MERITS OF THE CASE.

2.1 The conditions for application of Clause 20 of the PPA;

2.2 The reimbursement of the Social Tariff costs in light of the terms of the PPA;

2.3 The application of Clause 20 of the PPA does not depend on REN Trading’s ability to reflect the Social Tariff cost in the consumers tariffs.

2.4 The Decree-Law no. 138-A/2010 of 28 December 2010, as amended in March 2016, does not prevent the application of Clause 20 of the PPA;

2.5 The application of Clause 20 of the PPA would not amount to a State aid.

2.6. REN Trading’s counterclaim.

2.7 Conclusion.

3 – COSTS

4 - HOLDING”.

H - E, seguidamente, o PAINEL FINANCEIRO, a partir do ponto III - Histórico Processual - discorreu:

“III. DO HISTÓRICO PROCESSUAL

6. As Partes encontram-se em litígio ao abrigo do Contrato de Aquisição de Energia (doravante, o “CAE”) celebrado em 24 de novembro de 1993 entre a Tejo Energia, a REN Eléctrica e a REN Trading e decidiram submeter o litígio à apreciação de um Painel Financeiro para decisão.

7. Em 18 de setembro de 2017, as Partes acordaram na nomeação do Sr. EE, do Sr. AA e do Sr. DD como membros dos Painel Financeiro, e escolheram o Sr. EE como Presidente do Painel Financeiro, os quais aceitaram as respetivas nomeações, tendo referido que pretendiam discutir e acordar com o Painel Financeiro as regras de funcionamento do mesmo e o respetivo calendário processual.

8. Em 26 de setembro de 2017, o Painel Financeiro devidamente nomeado convidou as Partes a apresentarem um acordo relativamente às regras processuais e ao calendário processual. A este respeito, as Partes apresentaram uma proposta conjunta ao Painel Financeiro, em 28 de novembro de 2017, que foi discutida na Conferência sobre a Condução do Processo, em 4 de dezembro de 2017.

9. Em 11 de dezembro de 2017, as Partes e o Painel Financeiro acordaram as Regras Processuais e o Calendário Processual do Painel Financeiro para a resolução do litígio.

10. A Requerente apresentou a Petição Inicial, juntamente com provas factuais e legais em 24 de janeiro de 2018.

11. A REN Trading e REN Eléctrica apresentaram as respetivas Contestações, juntamente com provas factuais e legais, nos dias 8 e 9 de março de 2018, respetivamente.

12. Em 29 de março de 2018, a Requerente apresentou a respetiva Réplica, juntamente com provas factuais e legais.

13. A REN Trading e REN Eléctrica apresentaram as respetivas Tréplicas, juntamente com provas factuais e legais, em 18 de abril de 2018.

14. Em 9 de maio de 2018, o Presidente, em nome dos membros do Painel Financeiro, contactou as Partes referindo que (i) a Requerente e a Primeira Requerida tinham informado que não pretendiam convocar testemunhas ou peritos para interrogatório ou contrainterrogatório durante a audiência, e solicitaram que a Segunda Requerida manifestasse a sua posição, assim que possível; em caso de ausência de resposta até 10 de maio, presumia-se que a Segunda Requerida não queria convocar nenhuma testemunha ou perito; (ii) o Painel Financeiro propôs que a Conferência Preparatória da Audiência tivesse lugar em 15 de maio, às 11h00 (hora de Lisboa); (iii) o Painel Financeiro propôs que a Audiência tivesse lugar em 29 e 30 de maio (se necessário), em Lisboa.

15. Em 15 de maio de 2018, realizou-se a Conferência Preparatória da Audiência por teleconferência às 11h00 (hora de Lisboa). Os representantes das Partes foram contactados em 14 de maio de 2018 para que lhes fosse transmitido o número de acesso à teleconferência.

16. Em 16 de maio de 2018, o Presidente contactou as Partes com o intuito de lhes transmitir o que o Painel Financeiro tinha acordado no seguimento dos comentários e das sugestões aludidas durante a Conferência Preparatória da Audiência. Mais especificamente, o Painel Financeiro transmitiu (i) que a Audiência teria lugar, conforme previsto nas Regras Processuais e no Calendário Processual, mas seria limitada a um único dia. Considerando que as Partes recusaram interrogar e/ou contrainterrogar todas as testemunhas factuais e periciais e que não tinham prescindido da realização de alegações iniciais ou finais, o único objetivo da Audiência seria responder às questões levantadas pelo Painel Financeiro; (ii) que o Presidente do Painel Financeiro enviaria às Partes, até 23 de maio de 2018, uma lista de questões que os membros do Painel Financeiro gostariam de colocar aos representantes legais das Partes, limitadas aos factos e questões jurídicas levantadas pelas Partes nas suas exposições; não obstante, o Presidente salientou que os membros do Painel Financeiro poderiam colocar outras questões durante a Audiência; (iii) que as perguntas deviam ser respondidas oralmente, dispensando respostas escritas; (iv) que a Audiência teria lugar em Lisboa, no dia 30 de maio, no local acordado pelas Partes; (v) que, em conformidade com as disposições das Regras Processuais e Calendário Processual, as Partes deviam enviar as suas Alegações Finais no prazo de 20 dias após a Audiência.

17. Em 18 de maio de 2018, as Partes informaram os membros do Painel Financeiro que tinham acordado realizar a Audiência no Centro de Arbitragem da Câmara do Comércio e Indústria Portuguesa, sito na Rua das Portas de Santo Antão, 89, em Lisboa.

18. Em 23 de maio de 2018, o Presidente encaminhou as perguntas do Painel Financeiro para as Partes.

19. Em 25 de maio de 2018, o Painel Financeiro solicitou às Partes que procedessem à gravação da Audiência, conforme acordado na Conferência de Audiência Prévia.

20. A Audiência realizou-se em 30 de maio de 2018, no local acordado pelas Partes.

21. Em 1 de junho de 2018, o Presidente, em nome do Painel Financeiro, contactou as Partes com o intuito de lhes transmitir que (i) o prazo para o envio das Alegações Finais começaria a correr assim que o Painel Financeiro recebesse as transcrições da Audiência e (ii) conforme acordado entre as Partes durante a Audiência, o Painel Financeiro proferiria a sua decisão em 30 de setembro de 2018.

22. Em 4 de julho de 2018, o Presidente, em nome do Painel Financeiro e no seguimento do pedido da Requerente, confirmou que o prazo para as Partes enviarem as Alegações Finais era segunda-feira, 9 de julho de 2018.

23. Assim, as Partes enviaram as suas Alegações Finais em 9 de julho de 2018.

24. Em 16 de julho de 2018, as Partes apresentaram as suas exposições sobre os custos.

IV. DOS PEDIDOS

1. Pedido da Tejo Energia:

25. Na sua Petição Inicial, a Tejo Energia solicitou que o Painel Financeiro:

“(i). DECLARE que a REN Trading violou o CAE e que as Requeridas são solidariamente responsáveis pelo reembolso dos custos incorridos pela Tejo Energia com a Tarifa Social desde a data efetiva a partir da qual esses montantes deveriam ter sido reembolsados pelas Requerida;

(ii). DECLARE que as Requeridas estão obrigadas, até ao termo de vigência do CAE, a reembolsar os custos suportados pela Tejo Energia com o financiamento da Tarifa Social;

(iiii). ATRIBUA à Tejo Energia o montante de 6.957.683,16 € (…) correspondente ao montante devido resultante da violação do CAE, atinente ao reembolso dos custos incorridos pela Tejo Energia com o financiamento da Tarifa Social desde janeiro de 2015 até dezembro de 2017 (inclusive) e de todos os montantes a incorrer com esse financiamento até ao momento em que for proferida decisão pelo Painel Financeiro;

(iv). ATRIBUA à Tejo Energia juros desde a data da notificação de cada fatura pendente emitida pela Tejo Energia à REN Trading relativamente ao financiamento da Tarifa Social até pagamento integral desses montantes, à taxa aplicável;

(vi) CONDENE as Requeridas no pagamento de todos os encargos do processo, nomeadamente os honorários e despesas do Painel Financeiro e todos os custos incorridos pela Tejo Energia, incluindo os honorários devidos aos seus advogados e honorários e despesas periciais; e

(vii). CONCEDA à Tejo Energia qualquer outra medida considerada adequada.”

26. Na sua Réplica e Alegações Finais, a Tejo Energia reproduz os pedidos supracitados e solicita ainda que o Painel Financeiro:

“(i). INDEFIRA o pedido reconvencional da REN Trading, (...)”.

2. Pedido da REN Eléctrica:

27. Nas suas Contestação e Tréplica, a REN Eléctrica pede o seguinte:

“Com base nos factos e na lei contidos nesta Contestação, a Primeira Requerida solicita que o Painel Financeiro considere improcedentes todos os pedidos, julgando e decretando que:

(a). A Requerente incorreu em abuso de processo, sendo o seu pedido inadmissível.

(b). Caso o pedido seja considerado admissível, a Cláusula 20 do CAE é uma cláusula de estabilidade que, por conseguinte, não pode ser oponível às Requeridas;

(c). Caso a Cláusula 20 – enquanto cláusula de estabilidade – seja considerada oponível, a natureza jurídica da Tarifa Social – enquanto obrigação de serviço público com um fim social – estipula que esta seja obrigatoriamente suportada pelos produtores de eletricidade em regime ordinário, pelo que, por este motivo, a Cláusula 20 não é oponível às Requeridas;

(d). Mesmo que a Cláusula 20 seja considerada oponível às Requeridas, não foram demonstrados os requisitos para recurso à mesma, na medida em que a Tarifa Social não é um Imposto Relevante para efeitos do CAE e não foi alegado qualquer efeito material de Imposto Relevante;

(e). Ainda que tais requisitos fossem cumpridos, uma eventual violação nunca conduziria a um reembolso dos custos suportados com a Tarifa Social, mas meramente, em teoria e na medida do possível, a uma renegociação dos termos do CAE, o que nunca foi solicitado; Daqui decorre que as Requeridas não são responsáveis pelo reembolso de quaisquer custos suportados com a Tarifa Social;

(g). Ainda que a REN Trading fosse responsável pelo reembolso de quaisquer custos suportados com a Tarifa Social, a REN Eléctrica jamais poderia ser responsabilizada por quaisquer juros a partir da data de notificação de cada uma das faturas pendentes emitidas pela Requerente à REN Trading;

(h). A Requerente deve suportar todos os custos incorridos no âmbito deste processo, incluindo: i. os custos do Painel Financeiro (designadamente honorários e despesas, bem como os custos administrativos); e ii. os honorários e as despesas incorridos pela REN Eléctrica atinentes à assistência e representação legais; iii. os honorários e as despesas incorridos pela REN Eléctrica atinentes aos honorários e despesas de peritos.”

28. Nas suas Alegações Finais, a REN Eléctrica pede o seguinte:

“Com base nas presentes Alegações Finais e na Contestação e Tréplica da Primeira Requerida, vem esta solicitar que o Painel Financeiro considere improcedentes todos os pedidos, com base na Secção 9 das Contestações, Secção 7 da Tréplica e presente Secção destas Alegações Finais, julgando e decretando que:

(a). A Requerente incorreu em abuso de processo, sendo o seu pedido inadmissível.

(b). Caso o pedido seja considerado admissível, a Cláusula 20 do CAE é uma cláusula de estabilidade que, por conseguinte, não pode ser oponível às Requeridas;

(c). Caso, ainda assim, a Cláusula 20 seja considerada oponível às Requeridas, não foram cumpridos os requisitos para recurso à mesma, sobretudo porque a Tarifa Social não é um Imposto Relevante para efeitos do CAE; além disso, a neutralidade financeira obrigatória da REN Trading e a natureza jurídica da Tarifa Social – na qualidade de obrigação de serviço público com um fim social – estipulam que a Tarifa Social seja obrigatoriamente suportada pelos produtores de eletricidade em regime ordinário, tornando, por este motivo, a Cláusula 20 nula e sem qualquer efeito e, por conseguinte, não oponível às Requeridas;

(d). Mesmo que a Cláusula 20 seja considerada oponível às Requeridas, não foi de forma alguma violada: a. Em primeiro lugar, porque a Requerente não recorreu à Cláusula 20, mais especificamente à Cláusula 20.4.1 e, por conseguinte, não poderia ter havido violação da mesma; b. Em segundo lugar, porque não foi celebrado qualquer alegado acordo alternativo prevendo o reembolso dos custos;

(e). Daqui decorre que as Requeridas não são contratualmente responsáveis pelo reembolso de quaisquer custos decorrentes da Tarifa Social;

(f). Ainda que a REN Trading fosse responsável pelo reembolso de quaisquer custos decorrentes da Tarifa Social, a REN Eléctrica jamais poderia ser responsabilizada por quaisquer juros a partir da data de notificação de cada uma das faturas em dívida emitidas pela Requerente para a REN Trading;

g). A Requerente deve suportar todos os custos incorridos no quadro do presente processo, evidenciados na Exposição de Custos da Primeira Requerida, incluindo: c. Os custos do Painel Financeiro (designadamente honorários e despesas, bem como os custos administrativos); e d. Os honorários e as despesas incorridas pela REN Eléctrica atinentes à assistência e representação legais; e. Os honorários e as despesas incorridas pela REN Eléctrica atinentes aos honorários e despesas de peritos.”

3. Pedido da REN Trading:

29. Nas suas Contestação, Tréplica e Alegações Finais, a REN Trading pede ao Painel Financeiro que:

“a) Considere totalmente improcedente os pedidos da Tejo Energia;

b) Atribua à REN Trading o valor de 145.198,00€ (…), correspondente ao valor pago à Tejo Energia relativamente aos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social desde janeiro de 2011 a dezembro de 2014 (inclusive);

c) Atribua à REN Trading o valor de 145.198,00€ (…, desde a condenação até integral pagamento ou compensação;

d) Condene a Tejo Energia no pagamento dos encargos incorridos pela REN Trading com o Painel Financeiro, incluindo, entre outros, honorários e custos administrativos, os honorários e despesas do Painel Financeiro, honorários e despesas de advogados, peritos e consultores, e custos administrativos e de pessoal internos.”

V. DO LITÍGIO REMETIDO AO PAINEL FINANCEIRO E DAS EXPOSIÇÕES DAS PARTES

30. As Partes têm um litígio ao abrigo do Contrato de Aquisição de Energia celebrado em 24 de novembro de 1993 relacionado com a entrada em vigor de uma Tarifa Social em Portugal por virtude do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro de 2010, alterado pelo Decreto-Lei n.º 172/2014, de 14 de novembro de 2014, e pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março de 2016 (doravante, o “DL da Tarifa Social”). O ponto controverso que suscitou o presente litígio é se a Tejo Energia pode exigir à REN Trading o reembolso dos custos com a Tarifa Social financiados por aquela durante 2015, 2016 e 2017 ou se, pelo contrário, a Tejo Energia deve, em última análise, suportar esses custos e, se assim for, devolver os montantes anteriormente cobrados à REN Trading, entre julho de 2011 e janeiro de 2015 (relativos ao período de janeiro de 2011 a dezembro de 2014).

31. Os membros do Painel Financeiro tiveram em conta todas as observações e argumentos aduzidos pelas Partes nas respetivas Petição Inicial, Contestações, Réplica, Tréplicas e Conclusões e irão abordar aqueles considerados relevantes para decidir sobre o litígio na próxima secção da presente Decisão. Sem prejuízo, é apresentado seguidamente um sumário destas observações e argumentos, que dizem respeito às seguintes questões fundamentais.

1. Da aplicabilidade da Cláusula 20 do CAE

i. Da aplicabilidade da Cláusula 20 do CAE à luz da legislação portuguesa:

32. De acordo com a Tejo Energia, o DL da Tarifa Social não invalida as obrigações contratuais preexistentes das Partes e, por conseguinte, não impede o reembolso dos custos com a Tarifa Social ao abrigo da Cláusula 20 do CAE (§ 5 da Réplica e § 56 das Alegações Finais). A Tejo Energia alega que não se pode deduzir que o supramencionado Decreto-Lei, que estabelece a obrigação de financiar os custos com a Tarifa Social, impede as Partes de imputar esses custos de outro modo ao abrigo do CAE (§ 77-82 das Alegações Iniciais e § 50-51 das Alegações Finais). Assim, (i) à margem do CAE, a Tejo Energia reconhece que tem de pagar as faturas da Tarifa Social emitidas pela REN Eléctrica, mas afirma que, (ii) no âmbito do CAE, a REN Trading tem de proceder ao reembolso destes custos (§ 57 das Alegações Finais). Acrescenta que quem suporta os custos financiados pela mesma é uma questão puramente contratual entre duas entidades privadas e não uma questão de interesse público (§ 46 da Réplica). A redação do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto de 2006 – que estabelece que as cláusulas dos CAE existentes continuam válidas – e o facto de que a aplicabilidade da Cláusula 20 não frustra a proteção dos consumidores economicamente vulneráveis – que são os únicos que estão isentos de suportar estes custos por força da legislação relativa à Tarifa Social – mais sustentam a sua posição (§ 44, 49-50 da Réplica e § 61 das Alegações Finais).

33. Mais, a Tejo Energia alega que (i) a promulgação do DL da Tarifa Social não pode tornar a Cláusula 20 do CAE nula ou não oponível, na medida em que foi introduzida no CAE precisamente para estas circunstâncias (isto é, sempre que a Tejo Energia for obrigada a contabilizar quaisquer Impostos Relevantes recentemente introduzidos) (§ 52 da Réplica e § 52-53 das Alegações Finais) e que o (ii) DL da Tarifa Social é equivalente a outras alterações legislativas que impõem Impostos Relevantes sobre a mesma e que foram reembolsadas pela REN Trading ao abrigo da Cláusula 20 do CAE (designadamente, a Taxa de Gestão de Resíduos e a Taxa de Uso das Redes) (§ 54 das Alegações Finais).

34. A REN Eléctrica alega que a imputação dos custos prevista na lei é vinculativa para as Partes e prevalece sobre quaisquer disposições contratuais em contrário (§ 118 das Contestações, § 72 da Tréplica e § 69 das Alegações Finais). Este argumento baseia-se, principalmente, nos termos usados pelo legislador – especificamente financiamento e incide no – (§ 119-120 da Contestação e § 61-64 da Tréplica), no parecer jurídico do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, emitido a 21 de março de 2013 (Prova CL-2, doravante o “Parecer da PGR”), no comentário que lhe foi endereçado pelo Conselho de Administração da Entidade Reguladora do Sector da Energia (doravante, a “ERSE”) (Prova CL-3) e no Parecer da ERSE de março de 2017 (Prova REL-27). De acordo com a REN Eléctrica, o Parecer da PGR estabelece que os custos com a Tarifa Social devem ser suportados por todos os centros eletroprodutores em regime ordinário e não apenas por alguns dos mesmos e, muito menos, pelos consumidores de eletricidade, o que ocorreria em caso de recálculo da compensação devida aos produtores de eletricidade com CAE para compensá-los pelo custo da Tarifa Social (§ 130-135 da Contestação, § 77 da Tréplica e § 78-79 das Alegações Finais). Realça que (i) o Conselho de Administração da ERSE acrescentou que os custos com a Tarifa Social não estão incluídos nos custos do CAE e que (ii) segundo o Parecer da ERSE emitido em março de 2017, a lei estabelece que as centrais com CAE suportem os custos com a Tarifa Social, sem que haja necessidade de ajustar o respetivo equilíbrio (§ 135 da Contestação e § 81-84 das Alegações Finais).

35. A REN Eléctrica defende que o efeito vinculativo de tal imputação de custos também deriva da natureza da Tarifa Social como uma obrigação de serviço público (§ 98 da Contestação e § 70 da Tréplica) e do facto de que foi concebida para preservar o equilíbrio entre os titulares dos centros eletroprodutores em regime ordinário apesar da promulgação da Tarifa Social, sendo, por conseguinte, uma escolha de natureza regulatória (§ 125- 129 da Contestação e § 68-69 da Tréplica).

Por estes motivos, considera que qualquer interpretação do CAE que permita que a Requerente não internalize os custos com a Tarifa Social (i) traduzir-se-ia numa violação das disposições legais imperativas que tornaria a Cláusula 20 do CAE nula nos termos dos artigos n.º 280 e 294.º do Código Civil de Portugal e (ii) colocaria a Requerida numa posição de benefício face aos seus concorrentes (§ 127, 144 da Contestação e § 70, 86 das Alegações Finais).

36. Pela sua parte, a REN Trading alega que o dito reembolso não é compatível com o DL da Tarifa Social – que descreve uma regra imperativa de natureza eminentemente pública – dado que, nos termos do n.º 1 do artigo 4.º, tais custos devem ser suportados pelos centros eletroprodutores (§ 135 e 139 da Contestação e § 32, 40 das Alegações Finais). Por conseguinte, é da opinião que, após a entrada em vigor do DL da Tarifa Social e por virtude do princípio de aplicação imediata das leis, o mecanismo de imputação previsto na Cláusula 20 se tornou inaplicável a respeito da Tarifa Social (§ 146-152 das Contestação). Mais alega que tal mecanismo não pode ser considerado compatível com o artigo 4.º do DL da Tarifa Social, uma vez que comprometeria a finalidade da Diretiva 2009/72/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, (que estabelece a concorrência e liberalização no mercado da eletricidade), nos termos da qual se deve interpretar o DL da Tarifa Social (§ 143 e 177-179 da Contestação).

37. Doutro passo, a REN Trading alega que a ERSE reconheceu que (i) os custos com a Tarifa Social devem ser financiados pelos produtores; (ii) tais custos não estão incluídos no CAE e nos custos do regime CMEC; e (iii) não admitiria a repercussão dos custos com a Tarifa Social imputados à Tejo Energia (§ 71-72 e 99 da Contestação e §33-34 das Alegações Finais).

38. A REN Trading argumenta ainda que o CAE não está imune a quaisquer alterações legislativas supervenientes - porque está sujeito à lei portuguesa ex Cláusula 25 e porque a alínea g) da Cláusula 1.2 estabelece que todas as referências à legislação incluem substituições e alterações da mesma (§ 127 da Contestação e § 11-16 das Alegações Finais). Também alega que o entendimento da Requerente de que o CAE é um contrato com teor intangível, baseado no Código Civil português e no Decreto-Lei n.º 172/2006 de 23 de agosto de 2006, é contraditório, reflete um uso oportunista do sistema jurídico português e ignora que o dito Decreto-Lei pode ser alterado por outros textos legislativos (§ 32-47 da Tréplica e § 27-31 das Alegações Finais). Salienta que, se a Tejo Energia considera que a regulamentação aplicável é ilícita, deve interpor os recursos legais adequados contra os organismos políticos que aprovaram essa mesma legislação (§ 50 da Tréplica).

39. A Tejo Energia alega na sua Réplica que, contrariamente ao que a REN Eléctrica alude, a repercussão dos custos não criaria um desequilíbrio entre os centros eletroprodutores em regime ordinário porque (i) aqueles que são explorados ao abrigo de um CAE podem passar tais custos para a REN Trading e (ii) aqueles que são explorados ao abrigo do regime CMEC já receberam uma compensação – que teve em conta os direitos perdidos devido ao termo dos respetivos CAE – e podem refletir todos os seus custos no preço de venda (§ 52). Relativamente aos pareceres invocados pelas Requeridas (designadamente, Provas CL-2, CL-3 e RTL-3), defende que nem a PGR nem a ERSE (i) são competentes para intervir na execução do CAE (§ 10 das Alegações Finais) nem (ii) excluíram a possibilidade da REN Trading reembolsar, às suas próprias expensas, a Tejo Energia pelos custos com a Tarifa Social (§ 62-64 da Réplica e § 76, 85-86 das Alegações Finais). Mais ainda alega que (i) o Parecer da PGR, a sua homologação pelo Secretário de Estado da Energia e os comentários da ERSE relativamente ao mesmo Parecer da PGR são infundados – relativamente ao impacto da Tarifa Social sobre o mecanismo de repercussão dos custos estabelecido no CAE e as especificidades do regime jurídico aplicável a estes contratos – e não são vinculativos para as Partes do CAE (§ 76, 90-92 da Petição Inicial e § 80, 87-90 das Alegações Finais) e que (ii) as diretrizes da ERSE a respeito dos custos – já incorridos pela REN Trading – que podem ou não ser refletidos nas tarifas de eletricidade não produzem qualquer efeito no CAE (§ 54- 55, 60 da Réplica).

40. Pelo contrário, a REN Eléctrica argumenta que, como o CAE é um contrato celebrado num setor altamente regulado, há entidades que não são parte do mesmo (isto é, o Estado e a ERSE) que desempenham um papel crucial na determinação dos termos da relação contratual entre as Partes (§ 24 e 33 da Tréplica). Acrescenta que o Painel Financeiro deve considerar os referidos pareceres devido (i) à posição institucional da ERSE e da PGR relativamente ao setor da eletricidade e ao governo; e (ii) ao seu mérito (§ 78 da Tréplica). Por seu turno, a REN Trading observa que (i) a sua atividade é escrupulosamente regulada pela ERSE, que é responsável pelo estabelecimento das regras em matéria de repercussão dos custos nas tarifas (§ 35 da Contestação) e que (ii) a posição da ERSE na matéria é vinculativa para todas as partes na atividade regulada, não apenas para a REN Trading, mas também para as restantes partes do CAE (§ 76 da Contestação).

ii. Da aplicabilidade da Cláusula 20 do CAE a entidades privadas

41. A REN Eléctrica afirma que a interpretação do contrato deve ter em consideração a evolução do setor da eletricidade em Portugal desde a data de celebração do CAE. Considera que a Cláusula 20 é uma cláusula de estabilidade que, como tal, apenas pode ser validamente concedida pelo Estado e aplicada contra o mesmo – e não contrapartes privadas, que não controlam o risco de soberania (§ 81 da Contestação, § 88 da Tréplica e § 22 das Alegações Finais). Afirma que a cláusula de estabilidade em apreço não foi concedida pelas Requeridas, mas sim pelo Estado – por meio da EDP, uma empresa detida a 100% pelo Estado – e foi acordada partindo do princípio de que a EDP e, subsequentemente, as Requeridas estariam numa posição de controlar o risco de soberania (o que já não é o caso). Por conseguinte, sustenta que qualquer tentativa de interpretar o CAE no sentido de que a Cláusula 20 pode ser aplicada contra as Requeridas se traduz numa violação da intenção das partes que negociaram e celebraram o CAE, assim como do princípio da boa-fé contratual, e conduziria a uma situação de total desequilíbrio da posição das Requeridas (§ 9-11 e § 89-90 da Contestação, § 94 da Tréplica e § 24-29, 33 das Alegações Finais). Por conseguinte, a REN Eléctrica argumenta que, devido à natureza da Cláusula 20, quaisquer responsabilidades relativas à mesma apenas podem ser reclamadas junto do Estado (§ 96 da Contestação).

42. A Tejo Energia alega que a natureza dos acionistas das Requeridas não afeta a aplicabilidade da Cláusula 20, uma vez que (i) também se verifica a existência de Cláusulas sobre Alterações Legislativas em contratos estritamente privados, como mecanismos de imputação do risco e (ii) as Requeridas nunca antes contestaram a sua validade ou aplicabilidade e continuam a respeitar a mesma no que concerne outras Alterações nos Impostos Relevantes (§ 101, 104 da Réplica e § 110, 112 das Observações Posteriores à Audiência). Também estriba esta alegação (i) no artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto de 2006, (ii) no facto de que a Cláusula 20 nunca foi alterada ou revogada por meio de qualquer alteração ao CAE – designadamente aquelas nos termos das quais as Requeridas se tornaram partes do CAE – e (iii) nas Cláusulas 2.1 e 2.3 da alteração de janeiro de 2010, que estabelecem que nenhum dos direitos ou deveres previstos no CAE são alterados e que as Partes reconhecem a sua existência (§ 95-97 da Réplica). Mais argumenta que não se pode negar a sua aplicabilidade porque tal mecanismo de imputação do risco era e é um elemento contratual, sem o qual a Tejo Energia não teria celebrado o CAE (§ 111 das Alegações Finais).

43. Sem prejuízo do acima exposto, a REN Eléctrica acrescenta que (i) o artigo 70.º, n.º 1, do Decreto-Lei que a Requerente invoca esclarece meramente que os CAE pertencentes a produtores que não aderem ao regime CMEC não estariam estritamente sujeitos à nova lei (§ 84-85 da Tréplica), (ii) que, em qualquer caso, a validade e aplicabilidade de uma cláusula contratual não pode ser declarada por uma disposição legal, dependendo antes da análise e interpretação, caso a caso, de todos os aspetos factuais e legais relevantes (§ 86 da Tréplica) e que (iii) as cláusulas de estabilidade são de uma natureza diferente das cláusulas de imputação do risco previstas nos contratos privados (§ 92 da Tréplica e § 25 das Alegações Finais). Nas suas Alegações Finais, a REN Eléctrica sublinha que a inaplicabilidade da Cláusula 20 decorre diretamente de disposições jurídicas imperativas – designadamente as disposições relativas à interpretação de contratos previstas no Código Civil – e da doutrina jurídica sobre interpretação de contratos (§ 35).

44. A REN Trading também sublinha a importância da evolução das Partes do CAE para a interpretação e execução do mesmo. Afirma que o CAE foi inicialmente celebrado entre partes de natureza pública e privada, o que significa que, inicialmente a EDP e, mais tarde a REN, (ambas detidas pelo Estado) gozaram de uma vantagem clara sobre a Tejo Energia que teria estado sujeita a alterações legislativas, se não existisse o mecanismo de equilíbrio previsto na Cláusula 20 do CAE (§ 110 da Tréplica). Considera que, como a contraparte da Tejo Energia deixou de ser detida pelo Estado – e, por conseguinte, as posições contratuais das Partes se equilibraram – não se pode interpretar este mecanismo como se o contexto inicial não tivesse mudado. Ao invés, a intangibilidade da Cláusula 20 tornou-se mais flexível e permeável a alterações legislativas (§ 130-131 das Contestações e § 108-111 da Tréplica). De acordo com a REN Trading, isto significa que não se pode aplicar a Cláusula 20 ao caso em apreço, porque esse é o entendimento da ERSE, do legislador português e do legislador europeu (§ 112 da Tréplica).

2. Do papel da REN Trading ao abrigo do CAE e as suas repercussões

44. (Lapso de numeração constante do original). De acordo com a REN Eléctrica, a REN Trading foi criada exclusivamente para possibilitar a manutenção dos CAE celebrados com a Requerente e a Turbogás, S.A. – que se recusaram a transitar para o regime CMEC – de uma forma coerente com as regras de separação de atividades decorrentes do direito comunitário, que proíbem a REN Eléctrica de participar na comercialização e produção de eletricidade. Para esse feito, a REN Trading destinava-se a ser um mero veículo de pass-through entre a Requerente e os consumidores de eletricidade, que, em última análise, não pode suportar custos nem obter lucros, para além daqueles que a ERSE define como uma remuneração justa pelo serviço prestado o que significa que, na prática, tanto os custos como os lucros são repercutidos nas tarifas cobradas aos consumidores de eletricidade (§ 51-56 da Contestação e § 47-52 da Tréplica). Por conseguinte, alega que, devido à neutralidade financeira da REN Trading, esta apenas pode incorrer nos custos que a ERSE aceite refletir na tarifa cobrada aos consumidores de eletricidade (§ 53 da Tréplica). A REN Eléctrica assinala que a constituição da REN Trading derivou de um acordo entre o Estado e a Tejo Energia e, assim, esta última esteve sempre ciente desta natureza e do impacto potencial na execução do CAE (§ 51-52 da Tréplica).

45. A esta luz, a REN Eléctrica afirma que a REN Trading não pode, em última análise, suportar os custos associados à Tarifa Social; ao invés, mesmo se a Cláusula 20 do CAE fosse aplicável ao caso em apreço, só poderia suportar esses custos se a ERSE reconhecesse que os mesmos poderiam ser refletidos na tarifa cobrada aos consumidores de eletricidade (§ 55-57 da Tréplica).

46. Por estes motivos, a REN Eléctrica sustenta que (i) permitir que a REN Trading suporte esses custos ao abrigo da Cláusula 20 do CAE seria o mesmo que aceitar que a REN Trading se tornasse inviável economicamente, assim comprometendo a estrutura organizacional do setor da eletricidade e a solução encontrada pelo Estado, no interesse da Requerente, para manter o CAE em vigor (§ 139-141 da Contestação) e (ii) se, hipoteticamente, a REN Eléctrica tivesse de ressarcir a Requerente, a REN Eléctrica estaria a violar as referidas regras de separação de atividades (§ 142 da Contestação).

47. Nas suas Alegações Finais, a REN Eléctrica realça que a neutralidade financeira da REN Trading decorre diretamente de uma disposição jurídica imperativa (designadamente o n.º 3 do artigo 70.º do Decreto-Lei 172/2006, que determina que a ERSE é responsável por estabelecer as regras necessárias para repercutir nas tarifas cobradas aos consumidores de eletricidade a diferença entre os custos totais a pagar pela REN Trading e as receitas provenientes da venda da eletricidade adquirida no contexto dos CAE em vigor) (§ 57). Sustenta que a referida neutralidade financeira é oponível à Tejo Energia porque (i) decorre diretamente de uma disposição jurídica imperativa (§ 60) e (ii) foi sempre do conhecimento da Tejo Energia (§ 62-63). A este respeito, afirma que se fosse permitido que os custos com a Tarifa Social fossem suportados pela REN Trading ao abrigo da Cláusula 20, apesar de não poderem ser repercutidos nas tarifas cobradas aos consumidores de eletricidade, tal seria contrário à referida disposição jurídica imperativa e, por conseguinte, a Cláusula 20 deve ser considerada nula e inválida nos termos dos artigos 280.º e 294.º do Código Civil português (§ 56, 64).

48. A REN Trading afirma ainda que a sua constituição apenas foi necessária para evitar a cessação do CAE e a substituição do mesmo por um CMEC (§ 63 da Contestação e § 56 da Tréplica) e argumenta que possui uma natureza temporária, opera sob condições muito reguladas impostas pela ERSE e goza de uma posição neutra em relação aos fluxos financeiros resultantes do CAE, passando os custos elegíveis devidos às obrigações do CAE para a Tarifa de Uso Geral em conformidade com o quadro regulatório imposto pela ERSE (§ 32-33 da Contestação e § 177 da Tréplica). Por outras palavras, a REN Trading sustenta que, no âmbito do CAE, desempenha o papel de uma simples back-to-back, não suportando qualquer custo, não obtendo qualquer receita, além dos incentivos recebidos da ERSE (§ 56 da Contestação). Acrescenta que tal estatuto de neutralidade financeira está previsto no n.º 1 do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006 e no n.º 1 do artigo 4.º do DL da Tarifa Social e foi reconhecido pela Comissão Europeia e pela ERSE na sua decisão relativa à certificação da REN (§ 60-64 e 177 da Tréplica e § 88 das Alegações Finais). A esta luz, defende que, quando anuiu ao pedido da Tejo Energia para se apropriar dos custos com a Tarifa Social entre 2011 e 2014, a sua intenção era cooperar em boa-fé com a Tejo Energia, admitindo, numa fase preliminar, que a Tarifa Social poderia ser tratada de uma forma que permitisse que a Tejo Energia recuperasse o valor pago, mas também possibilitasse que a REN Trading repassasse esses custos. Realça que apenas foi possível acomodar esses custos até à clarificação das disposições aplicáveis porque o valor em causa à altura não era significativo e não comprometia a sua sustentabilidade económica e financeira mas, em qualquer caso, não tem e não é suposto ter a capacidade financeira para suportar esses custos considerando o seu papel contratual ao abrigo da lei e do CAE (§ 57-62 da Contestação).

49. Por conseguinte, a REN Trading sustenta que se o presente pedido da Tejo Energia for diferido e a REN Trading tiver de pagar os custos com a Tarifa Social reclamados, esses custos terão de ser repercutidos na tarifa de uso geral (§180 da Contestação).

50. A Tejo Energia afirma que tais alegações carecem de fundamentos jurídicos ou contratuais, uma vez que não existe nenhuma disposição legal que impeça a REN Trading de internalizar os custos com a Tarifa Social (§ 94 das Alegações Iniciais) e que o CAE não prevê a neutralidade que as Requeridas invocam (§ 34 da Réplica). Mais sustenta que os argumentos das Requeridas assentam numa premissa falsa na medida em que procuram fundir dois domínios independentes: (i) o CAE e os direitos e deveres das Partes ao abrigo do mesmo; e (ii) as relações da REN Trading com a ERSE nos termos das quais a ERSE decide quais os custos que podem ser repercutidos nas tarifas de eletricidade (§ 27 e 35 da Réplica). Considera que (i) a passagem contratual desses custos da Tejo Energia para a REN Trading não depende da repercussão dos mesmos nas tarifas de eletricidade; e, assim, (ii) se a lei impedir a recuperação desses custos por parte da REN Trading, esse facto afeta exclusivamente a REN Trading e não pode afetar os direitos da Tejo Energia (§ 95 da Petição Inicial, § 10-11 da Réplica e § 78 das Alegações Finais).

51. Doutro passo, a Tejo Energia afirma que, ao invés de ser uma imposição da Tejo Energia (i) a constituição da REN Trading serviu para permitir a certificação da REN Eléctrica como um Operador da Rede de Transporte (ORT), sendo o resultado de uma opção legislativa e política; e que (ii) a manutenção do CAE foi uma decisão voluntária tanto da REN Eléctrica como da Tejo Energia (§ 16-18 da Réplica). Nas suas Alegações Finais, realça que a alegada neutralidade financeira da REN Trading (i) não é absoluta e (ii) não pode ser invocada para justificar a violação do CAE, dado que seria contrária à regra geral prevista no artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006, nos termos da qual o CAE deve ser executado de acordo com o estabelecido no contrato celebrado pelas Partes (§ 61-67).

3. Das condições para a aplicação da Cláusula 20 do CAE

52. A Tejo Energia afirma que estão cumpridas as condições para a aplicação da Cláusula 20 do CAE (isto é, a Tarifa Social é um Imposto Relevante que teve e tem um efeito material) (§ 69 da Réplica e § 116 das Alegações Finais). Em primeiro lugar, a Tejo Energia – que defende que esta análise se deve centrar meramente na definição contratual de Impostos Relevantes estabelecida no CAE, independentemente das categorias de tributação previstas no direito fiscal português (§ 73-75 da Réplica e § 121 das Alegações Finais) – considera que a imposição da obrigação de financiamento dos custos com a Tarifa Social configura uma Alteração nos Impostos Relevantes. Em segundo lugar, afirma que a Tarifa Social tem sido material na medida em que excede o Montante Limiar Aplicável quando considerada juntamente com outros custos não contabilizados, e que a REN Trading reconheceu este facto em 2013 (§ 82-83 da Réplica e § 126, 130-133 das Alegações Finais).

53. A REN Eléctrica sustenta que esses requisitos não estão cumpridos. A este respeito, afirma que a Tarifa Social não é um Imposto Relevante, isto é, não cumpre as condições para ser considerada uma forma de tributação ao abrigo da legislação portuguesa, que é a legislação que governa o CAE, mas foi antes concebida como uma obrigação de serviço público com um fim social, com vista a proteger os consumidores economicamente vulneráveis na linha das orientações enunciadas na Diretiva n.º 2003/54/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2003, e a Diretiva n.º 2009/72/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009 (§ 151-163 da Contestação e § 40, 43 e 54 das Alegações Finais). Outrossim, alega que a Requerente não provou a materialidade do efeito da alegada Alteração nos Impostos Relevantes, primeiro porque não expôs esse requisito nas suas Alegações Iniciais (§ 168-169 da Contestação) e, em segundo lugar, porque não evidenciou na sua Réplica o Montante Limiar Aplicável para cada ano e o montante relevante da Tarifa Social (§ 121-122 da Tréplica).

54. Sem prejuízo do acima exposto, a REN Eléctrica clarifica nas suas Alegações Finais que existem diferenças entre os custos com a Tarifa Social e outros custos que foram reembolsados à Requerente uma vez que, nestes últimos, estavam em causa formas de tributação (§ 45-49).

55. A REN Trading considera que os custos com a Tarifa Social não podem ser considerados custos do CAE e, por conseguinte, estão excluídos de qualquer mecanismo de imputação de custos previsto no CAE, designadamente aquele estabelecido na Cláusula 20 (§ 100 da Contestação). Todavia, defende que, mesmo que pudessem ser considerados custos do CAE, a Requerente não cumpriu os requisitos do dito mecanismo, que apenas pode ser acionado (i) mediante notificação escrita à contraparte, (ii) relativamente a uma Alteração Relevante num Imposto Relevante (iii) se tiver causado um efeito material (§ 101 e 105 das Contestações e §42-43 das Alegações Finais).

56. Na sua Tréplica, a REN Trading também realça que uma contribuição, como a Tarifa Social, não pode ser considerada um Imposto Relevante, se não couber no conceito de imposto ao abrigo do direito português – que é a lei que governa o CAE – (§ 84 da Tréplica) e defende que não é possível apurar o efeito material da Tarifa Social, uma vez que a Tejo Energia não identificou o Montante Limiar Aplicável de cada ano (§ 95 da Tréplica e § 45 das Alegações Finais). De qualquer das formas, a REN Trading afirma que nunca aceitou o efeito material dos custos que estão a ser reclamados perante o Painel Financeiro (§ 84 e 96-98 da Tréplica e § 47 das Alegações Finais).

57. Na sua Réplica, a Tejo Energia contesta a descrição da Tarifa Social como uma obrigação de serviço público justificando que, embora as Diretivas supracitadas exijam aos Estados-Membros que protejam os consumidores economicamente vulneráveis, (i) estes podem definir livremente as medidas que entenderem necessárias e (ii) essa finalidade é irrelevante para apurar a natureza fiscal da Tarifa Social (§ 72 da Réplica). Além disso, realça que apenas teria sido necessário realizar os cálculos da materialidade da Tarifa Social uma única vez, e não anualmente, dado que é uma Alteração no Imposto Relevante que é incorrida periodicamente ou continuamente durante um período de tempo indefinido para efeitos do ponto 1.3 do Apêndice 11 (§ 127-129 das Alegações Finais).

58. Pelo contrário, a REN Trading realça nas suas Alegações Finais que o cálculo para efeitos do Montante Limiar Aplicável tem de ser realizado anualmente porque tem em conta os valores relevantes de cada ano. Por conseguinte considera que a referência da Tejo Energia ao Montante Limiar Aplicável de 2012 é obsoleta e irrelevante (§ 48-49).

59. Relativamente ao IVA que a Tejo Energia reclama, esta última sustenta que esse valor é devido porque, nos termos do artigo 4.º do Código do IVA português, as faturas que refaturam custos têm de incluir IVA. Como esse IVA já foi entregue ao Estado, defende que o não pagamento causaria um prejuízo financeiro à Tejo Energia (§ 131-133 da Réplica). Pelo contrário, a REN Trading defende que (i) o IVA está expressamente excluído da definição contratual de Impostos Relevantes estabelecidos no CAE (§ 107 e 114 das Contestações), (ii) as faturas emitidas pela Tejo Energia não correspondem a nenhuma refaturação de custos para efeitos do artigo 4.º do Código do IVA português (§ 88-91 da Tréplica) e (iii) a inclusão de IVA no montante reclamado constitui enriquecimento sem causa porque a Tejo Energia poderá já ter deduzido esses montantes nas transações sujeitas a IVA (§ 113 da Contestação).

4. Do procedimento aplicável: Cláusulas 20.3 e 20.4 do CAE

60. De acordo com a Tejo Energia, a adoção da Tarifa Social permite que a Tejo Energia solicite o reembolso dos respetivos custos ao abrigo do mecanismo de repercussão dos custos previsto na Cláusula 20 do CAE, a fim de manter a mesma situação financeira em que estaria caso não tivesse ocorrido a criação da Tarifa Social (§ 43 da Petição Inicial). Sustenta que, na maioria das situações (e no contexto da Tarifa Social) as Partes seguiram esta regra contratual por meio da faturação direta dos custos (§ 31 da Petição Inicial). A este respeito, alega que a REN Trading aceitou esse reembolso desde a adoção do DL da Tarifa Social, sem qualquer objeção ou reserva – salvo a solicitação para saber qual a disposição contratual que servia de base à imputação dos custos à REN Trading, à qual a Tejo Energia respondeu indicando a Cláusula 20 (§ 45-51 das Alegações Iniciais e § 164-166 das Alegações Finais).

61. A REN Eléctrica afirma que, ainda que os dois requisitos supracitados tivessem sido satisfeitos, a Tejo Energia não teria direito ao reembolso dos custos com a Tarifa Social, na medida em que a recuperação dos custos apenas está disponível nos termos da Cláusula 20.3 do CAE, que é considerada inaplicável ao caso em apreço. Ao invés, considera que a alegada Alteração nos Impostos Relevantes atinente à Tarifa Social iria, quando muito, constituir fundamento para solicitar a alteração do CAE em conformidade com o procedimento de alteração previsto na Cláusula 20.4 e no ponto 10 do Apêndice 11 (§ 175-177 da Contestação). Salienta ainda que a Requerente não notificou por escrito as Requeridas de acordo com a Cláusula 20.2.1 da CAE (§ 173-174 das Contestações).

62. De acordo com a REN Trading, a Tarifa Social não consubstancia nenhuma das circunstâncias estabelecidas na Cláusula 20 da CAE que prevê mecanismos de ajustamentos especiais, designadamente nas Cláusulas 20.2.2 e 20.3 (§ 115 das Contestações). Alternativamente, acrescenta que, com base em qualquer aumento dos custos, o Produtor pode acionar o procedimento previsto na Cláusula 20.4 e no Apêndice 11 do CAE (a modificação do contrato na medida do necessário para garantir, na medida do possível, que o Produtor ficará na mesma posição financeira em que se encontrava ao abrigo do CAE não tivesse ocorrido uma Alteração nos Impostos Relevantes). Por conseguinte, alega que do CAE não consta qualquer disposição que estabeleça um mecanismo de reembolso simples para os custos reclamados pela Tejo Energia e que, por conseguinte, esse pedido carece de qualquer fundamento (§ 121-124 das Contestações).

63. Relativamente ao procedimento previsto na Cláusula 20.4 e no ponto 10 do Apêndice 11 do CAE, invocado pelas Requeridas, a Tejo Energia defende na sua Réplica que a prática de longa data e aplicada constantemente pelas Partes tem sido a adoção de um procedimento simplificado de repercussão dos custos, por exemplo, no que concerne a Taxa de Uso das Redes, a Taxa de Gestão de Resíduos, as Taxas Portuárias, as Taxas de Licenças CO2 e a própria Tarifa Social (§ 89 da Réplica e § 134, 157 das Alegações Finais). Defende que tal prática deve ser considerada um comportamento concludente com o mesmo efeito jurídico do que uma alteração expressa e formal do CAE atinente à adoção de um procedimento alternativo e simplificado (§ 91-92 da Réplica). Além disso, a Tejo Energia nota que as alegações das Requeridas relativas à violação do procedimento contratual foram efetuadas em má-fé, uma vez que essas acusações nunca tinham sido aludidas anteriormente (§ 93-94 da Réplica).

64. A REN Eléctrica alega que o Painel Financeiro não pode aderir ao procedimento alternativo invocado pela Teja Energia porque tal implicaria (i) uma desconsideração da intenção das Partes – que separaram especificamente os casos em que se verificaria uma repercussão dos custos (Cláusula 20.3) dos casos conducentes a uma alteração do CAE (Cláusula 20.4) (ii) comprometeria o âmbito das Cláusulas 20.3 e 20.4 e (iii) seria a aceitação de uma situação de manifesta injustiça que colide com o princípio de boa-fé. Mais ainda, acrescenta que apenas é possível alterar o CAE desde que estejam reunidos os devidos pressupostos referidos na Cláusula 27 (isto é, se for feito por escrito e em inglês por documento complementar ao CAE e assinado por todas as Partes) (§ 131-132 da Tréplica).

65. A REN Trading assinala que a Requerente, ao invocar na sua Réplica um procedimento alternativo e simplificado, modificou os fundamentos do seu pedido (§ 2-3 e 102 da Tréplica). A este respeito, a REN Trading nega que as Partes tenham agido de acordo com um procedimento alternativo. Ao invés, em regra, qualquer reembolso dos custos atinente aos impostos indicados pela Requerente na sua Réplica apenas foi aceite, se estivesse abrangido pelo CAE ou se as Partes tivessem acordado por escrito um procedimento específico para acomodar esse reembolso (§ 4, 103-104 da Tréplica e § 58-59, 62-68 das Alegações Finais). Acrescenta que, ainda assim, tal procedimento mais simples não seria vinculativo para as Partes, porque não foi formalizado nos termos da Cláusula 27 do CAE (§ 106-107 da Tréplica e § 38-39 das Alegações Finais).

66. Nas respetivas Alegações Finais, a Tejo Energia defende que, relativamente aos Impostos Relevantes que se enquadram na alínea a) da Cláusula 20.1 do CAE, como a Tarifa Social, a Cláusula 20.4.1 não implica obrigatoriamente uma alteração ao Encargo de Potência ou Encargo de Energia formalizada através de um alteração tripartida ao CAE em conformidade com o procedimento previsto no Apêndice 11, a não ser que a Tejo Energia assim decida. Ao invés, a Cláusula 20.4.1 do CAE prevê a possibilidade de se seguir outro procedimento de repercussão dos custos que, em última análise, conduza ao mesmo desfecho financeiro, como a simples faturação dos custos (§ 137-141 e 146-147). Afirma que, no caso da Tarifa Social, (i) as Partes optaram por seguir esse procedimento alternativo (§134) e que (ii) não é lógico alterar o Encargo de Potência e/ou Encargo de Energia para restabelecer a posição financeira da Tejo Energia ao abrigo do CAE (porque, relativamente às fórmulas da Encargo de Potência e/ou Encargo de Energia, a alteração das mesmas produziria o mesmo efeito do que a mera faturação mensal desses montantes à REN Trading) (§ 142-143). Além disso, a Tejo Energia afirma que a Cláusula 27 do CAE não é aplicável uma vez que se aplica apenas quando as Partes pretendem alterar uma cláusula contratual específica do CAE, o que não foi o caso da Tarifa Social (§ 148-150).

67. Tendo em vista as alegações da Tejo Energia no decurso da Audiência, a REN Eléctrica afirma nas respetivas Alegações Finais que as Requeridas não violaram a Cláusula 20.4.1 do CAE porque (i) a única obrigação que decorre desse preceito é a necessidade de encetar negociações a fim de alterar o Encargo de Energia e/ou Encargo de Capacidade e (ii) a Tejo Energia reconheceu explicitamente que optou por não iniciar tais negociações (§ 100). Doutro passo, reitera que (i) a Requerente não provou que as Partes acordaram num procedimento alternativo e simplificado e que (ii) mesmo se a Tejo Energia e a REN Trading tivessem alcançado tal acordo, a REN Eléctrica jamais poderia ser forçada a aceitar um acordo do qual não teve conhecimento e que não assinou (§ 103-105 e 109-110). Por fim, relativamente aos custos dos impostos que a Requerente identifica na Réplica, afirma que não foram reembolsados em virtude de um acordo paralelo, mas sim devido a um mecanismo contratual diferente e/ou porque podiam ser repercutidos nas tarifas pagas pelos consumidores de acordo com a ERSE (§ 112-115).

68. Tendo em vista as alegações da Tejo Energia no decurso da Audiência a respeito da Cláusula 20.4.1 do CAE, a REN Trading afirma que o procedimento aí previsto visa a modificação do contrato em matéria de Encargos de Potência ou de Energia e não o reembolso automático dos custos suportados pelo Produtor (§ 51-52 das Alegações Finais). Observa ainda que tal procedimento não foi acionado, considerando que as Requeridas não receberam qualquer proposta a esse respeito (§ 54 das Alegações Finais).

5. Da mudança de comportamento da REN Trading desde fevereiro de 2015

69. A Tejo Energia alega que a REN Trading, na qualidade de Adquirente de Energia ao abrigo do CAE, aceitou essa repercussão e assumiu a obrigação de suportar os custos decorrentes das Alterações no Imposto Relevante desde o momento de adoção da Tarifa Social – obrigação cumprida na íntegra pela REN Trading até janeiro de 2015 – (§ 65-66 da Petição Inicial). Por conseguinte, a Tejo Energia sustenta que o não reembolso dos custos com a Tarifa Social desde fevereiro de 2015 constitui não só uma violação contínua das obrigações contratuais ao abrigo do CAE, como também um abuso do direito na modalidade de venire contra factum proprium que viola o princípio da segurança jurídica e a proteção da confiança incutida à Tejo Energia (§ 71 das Alegações Iniciais e § 158-160 das Alegações Finais).

70. De acordo com a REN Eléctrica, a REN Trading aceitou provisoriamente, em boa-fé, os custos com a Tarifa Social meramente com o intuito de serem repercutidos na tarifa cobrada aos consumidores de eletricidade, sob reserva de reconhecimento dos custos por parte da ERSE. Afirma que estava implícito que a REN Trading já não aceitaria as faturas da Requerente e que os custos anteriormente transferidos teriam de ser reembolsados, se a ERSE rejeitasse tal possibilidade (§ 184-186 das Contestações e § 117-119 das Alegações Finais). Por conseguinte, a REN Eléctrica defende que (i) a Tejo Energia não poderia razoavelmente esperar que a repercussão dos custos fosse definitiva (§ 195 da Contestação) e que a (ii) a REN Trading, desde 2015, deixaria de ter de continuar a suportar, provisoriamente, os custos ao abrigo de quaisquer eventuais deveres acessórios de boa-fé, na medida em que se tornou aparente que a ERSE, muito provavelmente, não aceitaria esses custos – tendo em conta o Parecer da PGR, os comentários do Conselho de Administração da ERSE sobre esse mesmo Parecer e, especialmente, após as alterações ao DL da Tarifa Social – além de que os mesmos começavam a tornar-se extremamente onerosos (§ 188-199 das Contestações e § 140-142 das Alegações Finais).

71. A REN Trading afirma igualmente que o seu comportamento não constitui um abuso do direito na modalidade de venire contra factum proprium dado que não existe uma situação objetiva de confiança que careça de proteção legal (§ 158 e 163 das Contestações). Mais especificamente, realça que (i) as cartas remetidas para a Tejo Energia entre 2013 e 2015 não consubstanciam um acordo para suportar os custos com a Tarifa Social, dado que a possibilidade de transferência dos custos para a REN Trading estava sujeita à condição destes serem refletidos na tarifa geral (§ 42-52 da Contestação, § 120 da Tréplica e § 73-79 das Alegações Finais), (ii) avisou a Tejo Energia que a ERSE poderia rejeitar tal possibilidade, quase dois anos antes de alterar a sua conduta (§ 162 das Contestações e § 81 das Alegações Finais) e (iii) o seu comportamento foi, de qualquer forma, justificado à luz da posição da ERSE nesta matéria – que adotou a interpretação da PGR sobre o regime jurídico da Tarifa Social – da alteração legislativa no DL da Tarifa Social – que reforçou a imputação dos custos com a Tarifa Social aos titulares de centros eletroprodutores – (§ 85 e 161 das Contestações e § 84-85, 91-92 das Alegações Finais) e do aumento significativo nos custos com a Tarifa Social em 2015 – que comprometeria o seu equilíbrio económico e financeiro (§ 94 da Contestação). Por conseguinte, sublinha que nunca aceitou que o procedimento a seguir nestes casos fosse a faturação direta dos custos cobrados pela Tejo Energia, sem qualquer tipo de condição ou reserva (§ 86-87 da Contestação e § 80 das Alegações Finais).

72. A este respeito, a Tejo Energia sustenta que a mudança de comportamento da REN Trading não se justificava e que, em qualquer caso, não se devia à não inclusão de tais custos nas tarifas cobradas aos consumidores de eletricidade, porque esta última continuou a reembolsar os custos até 2014, apesar de ter conhecimento da posição da ERSE na matéria desde dezembro de 2013 (§ 120-121 da Réplica). Ao invés, o aumento desses custos em 2015 e os interesses económicos das Requeridas foram os únicos motivos pelos quais a REN Trading mudou o respetivo comportamento, sem que existisse um litígio efetivo entre as Partes a respeito dos termos do CAE e o âmbito do quadro jurídico aplicável (§ 72-74 da Petição Inicial e § 119 da Réplica). A Tejo Energia defende ainda que não se pode inferir a partir das cartas remetidas pela REN Trading que esta apenas aceitou os custos provisoriamente (§ 117 da Réplica e § 161-162, 168- 174 das Alegações Finais).

73. Na sua Tréplica, a REN Trading argumenta ainda que o seu comportamento não constitui um abuso do direito na modalidade de venire contra factum proprium pois a Tejo Energia não provou (i) que existe realmente um direito (ii) cujo exercício devesse ser considerado abusivo (§ 126). Mais especificamente, afirma que a conduta da REN Trading não envolve o exercício de um direito – uma vez que se limita a cumprir o novo quadro legislativo e regulatório – (§ 128) e que, ainda assim, não poderia ser considerado abusivo, pois existem motivos que justificam a mudança de comportamento (§ 141).

74. Nas suas Alegações Finais, a REN Eléctrica realça que a Tejo Energia tinha conhecimento do facto de que a aceitação da REN Trading estava condicionada à possibilidade de repercutir os custos nas tarifas pagas pelos consumidores (§ 129-130) e que, em qualquer caso, tal condição decorre da neutralidade financeira imperativa da REN Trading (§ 132-134).

6.Da natureza da repercussão dos custos com a Tarifa Social como uma medida de auxílio de Estado

75. De acordo com a REN Trading, se o presente pedido da Tejo Energia fosse deferido, o reembolso dos custos com a Tarifa Social constituiria uma medida de auxílio de Estado nos termos do n.º 1 do artigo 107.º do TFUE. A REN Trading sustenta que, primeiro, perverteria o princípio de neutralidade concorrencial e conferiria à Tejo Energia uma vantagem em relação aos seus concorrentes, que não teria sido obtida em condições de mercado (§ 184, 188 da Contestação e § 203-204 da Tréplica). Segundo, compaginaria uma situação de auxílio de Estado; a este respeito, afirma que a (i) REN Eléctrica foi nomeada por lei para cobrar a Tarifa Social e não lhe assiste o direito legal de usar os respetivos proveitos para qualquer outro fim que não aquele estabelecido na lei e (ii) a REN Trading exerce uma função dotada de características de interesse público, na medida em que foi constituída apenas com o objetivo de gerir os dois CAE restantes, estando votada a extinguir-se quando da cessação desses CAE e opera num regime extremamente regulado (§ 184, 187-188 das Contestações). Terceiro, tal reembolso seria uma medida seletiva, que beneficiaria apenas a Tejo Energia, que seria prejudicial para os restantes titulares de centros eletroprodutores que teriam de financiar esses custos (§ 191 das Contestações e § 206-207 da Tréplica). Quarto, afetaria o comércio entre os Estados-Membros pois envolve um valor significativo e a Tejo Energia é um grande produtor de eletricidade em concorrência com outros produtores de eletricidade de outros Estados-Membros (§ 192 das Contestações).

76. Porém, a Tejo Energia argumenta que a repercussão dos custos com a Tarifa Social não configura um auxílio de Estado pelo facto de que (i) a premissa subjacente a essa alegação é falsa – porque a repercussão contratual dos custos não depende da repercussão dos custos nas tarifas de eletricidade e, por conseguinte, nunca se verificaria o envolvimento dos alegados recursos estatais identificados pela REN por forma a consubstanciar uma situação de auxílio de Estado (§ 145 da Réplica e § 94, 96 das Alegações Finais) e (ii) a implementação de uma medida de auxílio de Estado não pode ser imputada ao Painel Financeiro (§ 147 da Réplica). Mais afirma que o reembolso ao abrigo do CAE não distorce a concorrência, (i) pois as Requeridas não provaram que outros centros eletroprodutores não refletem os custos com a Tarifa Social no preço da eletricidade que vendem e que estão numa posição equiparável para que possa ser realizada uma apreciação de distorção, (ii) pois não tem um direito contratual de vender a eletricidade produzida nas suas instalações diretamente ao mercado, mas ao invés produz eletricidade em conformidade com as instruções de despacho recebidas da REN Trading e (iii) dada a residualidade dos CAE (§ 152-156 da Réplica e § 99- 102 das Alegações Finais).

77. Sem prejuízo do acima exposto, a REN Trading acrescenta que, como o CAE é uma medida de auxílio de Estado para efeitos do n.º 1 do artigo 170.º do TFUE – como a Comissão Europeia reconheceu na sua decisão no caso SA. 161/2004 – as compensações atribuídas ao abrigo do mesmo – incluindo aquelas previstas nos termos da Cláusula 20 – devem respeitar os requisitos do Tratado ou, de outra forma, ser consideradas uma medida ilegal de auxílio de Estado, na medida em que não foram notificadas à Comissão. Clarifica que (i) tal medida de auxílio de Estado é imputável ao Estado e não ao Painel Financeiro e que (ii) a natureza da medida estatal do CAE implica que as compensações previstas na Cláusula 20 envolvem recursos que estavam sob a tutela pública, direta ou indiretamente, antes da transferência para o beneficiário (§ 155-164, 167, 181 da Tréplica). Nas suas Alegações Finais, também justifica a sua posição afirmando que (i) ao não pagar a Tarifa Social, a Tejo Energia estaria a beneficiar de uma “redução fiscal” que envolve a transferência de fundos públicos (§ 97) e que (ii) ainda que o Painel encontrasse quaisquer fundamentos para o ressarcimento da Tejo Energia, a neutralidade financeira da REN Trading proibiria esse pagamento sem que esses custos fossem repercutidos nos consumidores de eletricidade o que, por si só, consubstanciaria um auxílio de Estado (§ 101-102). Outrossim, a REN Trading alega que não é possível conceder qualquer auxílio sem que seja dada à Comissão Europeia a oportunidade de deliberar sobre a legalidade do CAE ao abrigo do n.º 3 do artigo 107.º do TFUE e do n.º 3 do artigo 108.º do TFUE como base jurídica para o reembolso dos custos com a Tarifa Social (§ 237 da Tréplica).

78. Relativamente aos argumentos da Tejo Energia a respeito da distorção da concorrência, a REN Trading considera que a Tejo Energia faz referência a dados quantitativos que não são relevantes para o caso em apreço e usa uma escala geográfica inadequada para realizar tal avaliação (§ 228-232). Todavia, observa que, para efeitos do n.º 1 do artigo 107.º do TFUE, o valor do auxílio é irrelevante e não é necessário definir o mercado em questão (§ 233-234).

79. Tendo em conta os comentários da REN Trading durante a Audiência, a Tejo Energia acrescenta nas suas Alegações Finais que (i) o simples facto de um encargo ser eliminado numa relação contratual estritamente privada não implica o envolvimento de recursos do Estado ou a existência de uma medida seletiva (§ 95, 98) e que (ii) a Comissão Europeia não concluiu que o CAE, como tal, configura um auxílio de Estado, dado que o objeto da referida decisão SA. 161/2004 era um esquema que não afetava o CAE em ncumprimento relativamente ao qual não lhe foi dada previamente a possibilidade de reparar (§ 227-229 da Contestação).

7. Outras alegações apresentadas pelas Partes

i. Da competência do Painel Financeiro ao abrigo do CAE

80. Relativamente às alíneas c) a f) da pergunta 12 levantada durante a Audiência, a Tejo Energia afirma nas suas Alegações Finais que a competência do Painel Financeiro não decorre do subponto 10 do Apêndice 11 do CAE pois, ao abrigo dessa disposição, a intervenção do Painel Financeiro limita-se a casos em que as Partes não chegaram a um acordo para alterar os Encargos de Potência ou Energia – que afirma que não é o objeto deste processo (§ 21-23). Ao invés, a Tejo Energia sustenta que isso decorre: da Cláusula 26 e Apêndice 9 do CAE, pois o litígio está relacionado com disposições sobre “legislação” e “impostos” em conformidade com o ponto 1.3.1 da Parte II do referido Apêndice 9; das Regras Processuais acordadas entre as Partes; e do email de nomeação enviado aos membros do Painel Financeiro (§ 14-18).

ii. Da data de apresentação da Réplica da Tejo Energia

81. Na sua Tréplica, a REN Trading argumenta que a Réplica da Tejo Energia é inadmissível e não deve ser considerada no que respeita à resposta à Contestação da REN Trading, pois não foi apresentada tempestivamente, em conformidade com as Regras Processuais acordadas entre as Partes (a Tejo Energia, que apresentou a sua Réplica em 29 de março de 2018, deveria ter respondido à Contestação e ao pedido reconvencional da REN Trading até ao dia 28 de março de 2018, inclusive) (§ 15-19).

82. A este respeito, a Tejo Energia sustenta nas suas Alegações Finais que (i) a alegação da REN Trading não é acompanhada do pedido de compensação correspondente e necessário e que (ii) a sua Réplica foi apresentada dentro do prazo porque o facto de que as Requeridas submeteram as suas Contestações em datas diferentes não pode ser usado para limitar os direitos processuais da Tejo Energia e, por conseguinte, 793 de 821 o prazo de 20 dias para o envio da sua Réplica começa a contar desde a data de apresentação da última Contestação (§ 31-35).

iii. Da admissibilidade do pedido

83. A REN Eléctrica afirma que o pedido é inadmissível porque a Tejo Energia incorreu num desvio de processo, pois o mecanismo de resolução de litígios previsto no CAE está a ser usado, de forma abusiva, para ganhar uma vantagem de negociação por forma a obter uma compensação injustificada para custos que tem de suportar (§ 213-214 da Contestação). A REN Eléctrica afirma que a Requerente pede ao Painel Financeiro que profira uma decisão que (i) é contrária à lei, (ii) afetaria a existência da solução que o Estado encontrou para acomodar a recusa da Requerente de transitar para o regime CMEC, (iii) colocaria a Tejo Energia numa posição favorável em relação aos seus concorrentes e (iv) comprometeria a estrutura organizacional do setor da eletricidade português, pois poderia redundar na insolvência da REN Trading e na perda da certificação ORT da REN Eléctrica (§ 202-209 da Contestação). Afirma que, considerando as consequências que as procedências dos pedidos da Requerente poderiam ter num setor tão regulado, a aplicabilidade da decisão do Painel Financeiro poderia estar comprometida (§ 219 das Contestações).

84. Pelo contrário, a Tejo Energia nega que a decisão do Painel Financeiro tenha essas externalidades, pois nenhuma das alegações das Requeridas está devidamente fundamentada. Argumenta ainda que a responsabilidade da REN Eléctrica não compromete a sua certificação ORT, pois não implicará o financiamento da produção de eletricidade (§ 160-162 da Réplica e § 84 das Alegações Finais).

85. Por sua vez, a REN Trading sustenta que a repercussão dos custos com a Tarifa Social na REN Trading e, se necessário, o pagamento dos mesmos por parte da REN Eléctrica, implicaria o financiamento da produção de eletricidade e, consequentemente, a violação das regras de separação de atividades estabelecidas pelo direito comunitário e português (§ 65-68 da Tréplica).

86. Nas suas Alegações Finais, a REN Eléctrica acrescenta que a Tejo Energia está a tentar esgotar as (alegadas) vias de recurso contratual para que, posteriormente, possa interpor uma ação contra o Estado português (§ 151). A REN Trading toma a mesma posição nesta matéria (§ 110 e 114 das Alegações Finais).

iv. Do pedido reconvencional da REN Trading

87. A REN Trading solicita a restituição dos montantes pagos à Tejo Energia entre 2011 e 2014, acrescidos de juros, desde a data da sua Contestação até integral pagamento ou abatimento. Considera que a Tejo Energia beneficiou de um enriquecimento sem causa que colide com o artigo 473.º do Código Civil português uma vez que arrecadou esses montantes sem nenhum motivo lícito considerando que se procedeu ao reembolso assumindo que a REN Trading conseguiria recuperar esses custos – possibilidade que a ERSE excluiu – (§ 203-209 das Contestações).

88. A este respeito, a Tejo Energia afirma que a REN Trading não tem direito a recuperar qualquer valor, muito menos com juros, pois (i) tal pedido nunca foi anteriormente efetuado, e (ii) o reembolso da Tarifa Social não constitui um enriquecimento sem causa uma vez que a Tejo Energia tem o direito de repercutir esse custo ao abrigo do CAE (§ 137- 138 da Réplica).

v. Da responsabilidade da REN Eléctrica

89. A REN Eléctrica afirma que apenas teve conhecimento formal do incumprimento quando foi citada para o presente procedimento em 17 de fevereiro de 2017, na medida em que nunca recebeu qualquer notificação ou fatura da Requerente relativa ao reembolso dos custos com a Tarifa Social e, outrossim, a Requerente nunca a informou de que tinha solicitado à REN Trading que cumprisse a alegada obrigação. Por conseguinte, sustenta que não pode sofrer as consequências de um alegado incumprimento relativamente ao qual não lhe foi dada previamente a possibilidade de reparar (§ 227-229 da Contestação).

90. Porém, a Tejo Energia observa que a responsabilidade solidária da REN Eléctrica não depende de uma prévia notificação de incumprimento; ao invés, é responsável exatamente nos mesmos moldes que a entidade codevedora (§ 109 da Réplica).

vi. Dos juros devidos

91. Relativamente aos juros exigidos, a REN Trading contesta que tenha de proceder ao reembolso de qualquer montante para a Tejo Energia e, por conseguinte, afirma que não é devido qualquer pagamento a título de juros (§ 196-197 das Contestações). Todavia, defende que, se fossem devidos juros, estes só poderiam ser reclamados a partir da respetiva data de pagamento – e não a partir da data de notificação de cada fatura, conforme pretende a Tejo Energia – até ao dia anterior ao dia de pagamento efetivo – e não até à data do pagamento final, conforme pretende a Tejo Energia – (§ 201 da Contestação). questão (§ 97).

VI. DECISÃO DO PAINEL FINANCEIRO

1. QUESTÕES PRELIMINARES

1.1. DA COMPETÊNCIA DO PAINEL FINANCEIRO AO ABRIGO DO CAE

92. Nas suas observações escritas, as Partes não contestaram a base da competência do Painel Financeiro ao abrigo do CAE. Todavia, os Membros do Painel Financeiro suscitaram esta questão junto das Partes durante a Audiência realizada em 30 de maio de 2018.

93. Tendo em conta o email de nomeação que as Partes enviaram ao Painel Financeiro em 18 de setembro de 2017, a discussão tida durante a Audiência (Transcrição da Audiência 3, Tarde, 00:00:33-00:35:42) e as observações submetidas posteriormente (§ 13-26 das Alegações Finais da Requerente), o Painel Financeiro chegou à conclusão que a sua competência decorre da Cláusula 26 e do Apêndice 9 do CAE.

94. Mais especificamente, considerando as observações escritas e os pedidos das Partes, o Painel Financeiro considera que o litígio que lhe foi submetido não se enquadra no âmbito dos pontos 10.3 e 10.4 do Apêndice 11 do CAE – que são aplicáveis se as Partes não conseguirem chegar a acordo sobre uma alteração ao acordo nos termos da Cláusula 20.4.1 do CAE, depois de terem partilhado e comentado as respetivas propostas de alteração por escrito e, como resultado, decidem submeter a matéria para decisão do Painel Financeiro.

95. Assim, este Painel Financeiro considera que foi nomeado de acordo com a Cláusula 26 do CAE, que estabelece que “salvo disposição expressa em contrário no presente contrato, todos os Litígios devem ser dirimidos em conformidade com as disposições previstas no Apêndice 9”, e com o ponto 1.3 da Parte II do Apêndice 9 do CAE, que estipula que, salvo acordo escrito entre as Partes para remeter um litígio para o Painel Técnico, ou o Presidente do Painel Financeiro decide de outro modo nos termos do subponto 1.6, o litígio deve ser dirimido pelo Painel Financeiro, caso esteja relacionado com as disposições que versam, inter alia, sobre “interpretação” e “impostos".

1.2. DA TEMPESTIVIDADE DA RÉPLICA DA TEJO ENERGIA

96. A REN Trading entende que a Réplica da Tejo Energia não foi apresentada em conformidade com as Regras Processuais acordadas entre as Partes e que, como resultado, é inadmissível e não deve ser considerada para efeitos de resposta às Contestações da REN Trading (§ 15-19 da Tréplica).

97. Em primeiro lugar, importa dar conta de que, como é indiscutível, a Tejo Energia apresentou a sua Réplica e as provas factuais e legais correspondentes de forma válida em relação à Primeira Requerida. Por conseguinte, as alegações e as provas contidas na mesma constam dos registos deste processo e, logo, o Painel Financeiro pode considerar as mesmas na resolução do litígio.

98. Sem prejuízo do acima exposto, de acordo com o ponto 2 da Secção V das Regras Processuais acordadas entre as Partes, “após o recebimento da Defesa das Requeridas, a Requerente deve ter o direito a uma Réplica, após a submissão da qual as Requeridas devem ter direito a uma Tréplica, cujas exposições escritas devem ser realizadas de acordo com o Calendário Processual definido na Secção IV.1 acima”. Por sua vez, o Calendário Processual define um prazo de “20 dias a contar das Contestações” para a apresentação da Réplica.

99. Relativamente à redação do ponto 2 da Secção V das Regras Processuais, este Painel Financeiro entende que tal disposição permite que a Tejo Energia responda a ambas as Contestações através de uma única Réplica. Tendo em conta que a Tejo Energia apenas pode preparar e enviar uma única Réplica, caso tenha recebido ambas as Contestações, na opinião do Painel Financeiro, o prazo de 20 dias previsto no Calendário Processual deve contar a partir da data de submissão da última Contestação.

100. A REN Trading e REN Eléctrica apresentaram as suas Contestações, a 8 e 9 de março de 2018, respetivamente. Assim, o prazo de 20 dias previsto no Calendário Processual começou a contar a partir da data de apresentação das Contestações da REN Eléctrica e, logo, expirou em 29 de março de 2019.

101. Tendo sido transmitida em 29 de março de 2019, deve considerar-se que a Réplica da Tejo Energia foi apresentada dentro do prazo.

1.3. DO SUPOSTO USO ABUSIVO DO PROCESSO

102. O Painel Financeiro não considera que o pedido da Tejo Energia, mediante o qual esta procura um reembolso dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social, constitui um desvio de processo. Ao invés, a Tejo Energia pretende simplesmente aplicar a sua interpretação das obrigações contratuais previstas no Contrato de Aquisição de Energia celebrado entre as Partes. Assim, os pedidos da Tejo Energia são admissíveis.

2. DO MÉRITO DO CASO

2.1. DAS CONDIÇÕES DE APLICAÇÃO DA CLÁUSULA 20 DO CAE

103. Na sua Petição Inicial, a Tejo Energia defende que as Partes previram uma regra de neutralidade contratual na Cláusula 20 do CAE nos termos da qual, se a Tejo Energia fosse obrigada a pagar ou contabilizar quaisquer Impostos Relevantes inexistentes à data de celebração do CAE, as Partes garantiriam, na medida do possível, que a Tejo Energia ficaria na mesma posição financeira ao abrigo do CAE como se a Alteração no Imposto Relevante não tivesse ocorrido. A Tejo Energia considera que, de acordo com este preceito, se fosse obrigada a pagar ou contabilizar quaisquer Impostos Relevantes, deveria ser ressarcida desses custos (§ 28-30). Nesta base, a Tejo Energia reclama o reembolso dos custos com a Tarifa Social.

104. Na realidade, em virtude da Cláusula 20 do CAE, as Partes previram diferentes mecanismos com vista a preservar a carga fiscal suportada pela Tejo Energia à data de celebração do CAE, independentemente da introdução de alterações na legislação fiscal. Contudo, a possibilidade de acionar os mecanismos previstos na Cláusulas 20.2 a 20.5 da CAE está sujeita às condições previstas na Cláusula 20.1 da CAE, que estipula o seguinte:

“20. ALTERAÇÕES DE IMPOSTOS
20.1Alterações Relevantes

Se, após a data do presente Contrato:

(a) o Produtor, o Operador ou a Empresa Fornecedora de Combustível (1) ficar obrigado a pagar ou a deduzir quaisquer Impostos Relevantes, que em 27 de novembro de 1992 não existiam ou não afetavam o Produtor ou (2) incorrer num aumento de custos, em ambos os casos motivado por:

(i)introdução, imposição, tributação ou cobrança de quaisquer Impostos Relevantes e/ou a um aumento na taxa pela qual quaisquer Impostos Relevantes são cobrados e/ou

(ii) qualquer alteração na legislação ou no procedimento publicitado de qualquer autoridade tributária de qualquer modo relacionado com Impostos Relevantes, e/ou

(iii) qualquer outra alteração que seja adversa aos interesses financeiros do Produtor, do Operador ou da Empresa de Fornecimento de Combustível, com base na qual quaisquer Impostos Relevantes são cobrados; ou

(b) o Produtor, o Operador ou a Empresa de Fornecimento de Combustível (1) deixe, após o dia 27 de novembro de 1992, de estar obrigado a pagar ou a contabilizar quaisquer Impostos Relevantes ou (2) passe a beneficiar de qualquer modo de uma redução de custos devido a:

(i)qualquer Imposto Relevante que deixe de ser aplicado, tributado ou cobrado, e/ou

(ii) uma redução na taxa pela qual quaisquer Impostos Relevantes são cobrados, e/ou

(iii) qualquer alteração na legislação ou no procedimento publicitado de qualquer autoridade tributária de qualquer modo relacionada com Impostos Relevantes, e/ou

(iv) qualquer outra alteração favorável com base na qual quaisquer Impostos Relevantes são cobrados;

e desde que (no caso das alíneas (a) ou (b) acima mencionadas) o efeito de tal alteração seja material (conforme definido para os fins da presente Cláusula no Apêndice 11) então, sujeito às disposições das Cláusulas 20.2.2. e 20.3, aplicar-se-ão as Cláusulas 20.2 a 20.5. Não obstante as disposições precedentes, as Cláusulas 20.2.2 e 20.3 são aplicáveis nas circunstâncias previstas nessas Cláusulas.

Para os fins da presente Cláusula e do Apêndice 11, qualquer circunstância prevista nas alíneas (a) ou (b) precedentes considera-se uma “Alteração aos Impostos Relevantes” (expressão que deve incluir o impacto financeiro de tal alteração no Produtor, Operador ou Empresa de Fornecimento de Combustível.”

105. A redação de tal disposição deixa claro que os procedimentos previstos nas Cláusulas 20.2 a 20.5 do CAE apenas se aplicam se (i) for verificado um dos cenários descritos nas alíneas a) ou b) da Cláusula 20.1 do CAE e (ii) se o efeito da Alteração nos Impostos Relevantes descritos nessas alíneas for material em conformidade com o Apêndice 11 do CAE. Por conseguinte, para deliberar sobre se a Tejo Energia tem direito ao reembolso dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social, este Painel Financeiro deve analisar primeiro os requisitos supracitados nas seguintes secções desta Decisão.

(i) DA APROVAÇÃO DA TARIFA SOCIAL ORIGINOU UMA ALTERAÇÃO NUM IMPOSTO RELEVANTE

106. Tendo sido criada em dezembro de 2010, por meio do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro de 2010 (que foi posteriormente alterada pelo Decreto-Lei n.º 172/2014, de 14 de novembro de 2014 e Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março de 2016), a Tarifa Social enquadrar-se-ia no âmbito das alíneas a) a i) da Cláusula 20.1 do CAE, se pudesse ser considerada um Imposto Relevante.

107. A definição de Impostos Relevantes está prevista na Cláusula 1.1 do CAE, mediante a qual “Todos os tipos de impostos, direitos de importação, direitos e deveres aduaneiros e fatores percentuais (“impostos”) imponíveis onde quer que seja e quando quer que seja, ao Produtor, ao Operador ou à Empresa Fornecedora de Combustível ou sobre os quais o Produtor, o Operador ou a Empresa Fornecedora de Combustível tenham de responder por uma Autoridade Competente em relação com a propriedade, manutenção ou operação da Central Elétrica, alguma das suas Unidades ou Partes Comuns ou em relação com a aquisição de combustível para a Central Elétrica ou relativamente a este Contrato, ao Contrato de Aquisição e Construção, e o Contrato de Locação incluindo, sem limitar, Impostos Ambientais Relevantes, valores selados e impostos sobre empréstimos em divisas estrangeiras e transações cambiais e qualquer retenção ou outros impostos sobre o pagamento de juros aos Mutuantes” devem ser considerados Impostos Relevantes, exceto aqueles impostos expressamente especificados na referida cláusula.

108. A este respeito, a REN Eléctrica alega que a Tarifa Social não é um Imposto Relevante pois não reúne os pressupostos para ser considerada uma forma de tributação ao abrigo do direito português, fora antes concebida como uma obrigação de serviço público com um fim social (§ 151-163 das Contestações). Na sua Tréplica, a REN Trading também realça que a Tarifa Social não pode ser considerada um Imposto Relevante, se não couber no conceito de tributo ao abrigo do direito português (§ 84). Todavia, a Tejo Energia argumenta que este requisito apenas devia ser verificado tendo em conta a definição contratual de Imposto Relevante prevista no CAE, independentemente das categorias de tributação existentes no direito fiscal português (§ 73-75 da Réplica e § das Alegações Finais).

109. Muito embora, conforme observado pelas Requeridas, o direito português seja o direito que rege o contrato nos termos da Cláusula 25 do CAE, é evidente que as Partes estabeleceram no CAE a sua própria definição de Impostos Relevantes, sem qualquer referência à legislação portuguesa para esse efeito. Mais, conforme observado pela Tejo Energia, a definição contratual prevista na Cláusula 1.1 do CAE foi elaborada em termos extremamente amplos. A escolha das palavras na supramencionada cláusula – “Todos os tipos de impostos, direitos de importação, direitos e deveres aduaneiros e fatores percentuais (“impostos”) imponíveis onde quer que seja e quando quer que seja impostos ao Produtor” – evidencia uma intenção clara das Partes de se afastarem da definição legal de “impostos” a fim de criar uma noção mais ampla que incluiria qualquer imposição cobrada a respeito de pessoas e eventos referidos na dita definição, salvo expressamente excluídos na lista aí elencada. Assim, nada consta na redação da Cláusula 1.1 do CAE que sugira que as Partes decidiram limitar a noção de Imposto Relevante e, por conseguinte, a aplicação da Cláusula 20 do CAE, às imposições que podem ser consideradas uma forma de tributação ao abrigo do direito fiscal português.

110. Do que se precede se conclui que, na opinião da maioria dos membros do Painel Financeiro, a Tarifa Social, sendo um desconto às tarifas de eletricidade reguladas, que tem de ser financiada pelos produtores de eletricidade em regime ordinário – como a Tejo Energia – nos termos do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro de 2010, enquadra-se na definição de Imposto Relevante prevista na Cláusula 1.1 do CAE, na medida em que é imposta à Tejo Energia em relação à propriedade... ou exploração da Central, independentemente de se enquadrar ou não na noção stricto sensu de “imposto” ao abrigo da legislação portuguesa.

111. Por esta razão, deve concluir-se que a promulgação do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro de 2010 (que foi posteriormente alterado pelo Decreto-Lei n.º 172/2014, de 14 de novembro de 2014, e Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março de 2016), se enquadra no âmbito das alíneas a) e (i) da Cláusula 20.1 do CAE e que, nos termos do último ponto da Cláusula 20.1 do CAE, a imposição da Tarifa Social deve ser entendida como uma Alteração nos Impostos Relevantes para efeitos da Cláusula 20 e do Apêndice 11 do CAE.

(ii) A TEJO ENERGIA NÃO EVIDENCIOU A MATERIALIDADE DA ALTERAÇÃO NO IMPOSTO RELEVANTE

112. Tal como acima referido, para que o Produtor possa acionar os mecanismos previstos nas Cláusulas 20.2 a 20.5 do CAE, a Cláusula 20.1 do CAE estabelece que é necessário cumprir um dos dois cenários descritos nas alíneas a) ou b) da Cláusula 20.1, mas também é necessário que o efeito da alteração nos Impostos Relevantes aí descrita seja material. Tal decorre claramente da redação da Cláusula 20.1 do CAE que, após descrever os cenários expostos nas alíneas a) e b), estipula o seguinte:

“20.1 Alterações Relevantes

(...)

e desde que (no caso das alíneas (a) ou (b) acima mencionadas) o efeito de tal alteração seja material (conforme definido para os fins da presente Cláusula no Apêndice 11) então, sujeito às disposições das Cláusulas 20.2.2. e 20.3, aplicar-se-ão as Cláusulas 20.2 a 20.5. Não obstante as disposições precedentes, as Cláusulas 20.2.2 e 20.3 são aplicáveis nas circunstâncias previstas nessas Cláusulas.”

113. Assim, a Tejo Energia considera que a Tarifa Social tem sido material desde a sua criação, quando considerada juntamente com outros custos não contabilizados, e fundamenta esta alegação na correspondência apresentada como Prova C-37, incluindo os cálculos do Montante Limiar Aplicável de 2012 e o valor atual líquido dos custos associados aos Impostos Relevantes incorridos pela Tejo Energia em 2012, afetados por um fator de um terço (§ 82-84 da Réplica). Ambas as Requeridas argumentam que a Tejo Energia não provou o efeito material da Tarifa Social, na medida em que a Tejo Energia não identificou o Montante Limiar Aplicável para cada ano (§ 121 da Tréplica da REN Eléctrica e § 95 da Tréplica da REN Trading). Além disso, a REN Eléctrica observa que a Requerente não demonstrou também o cálculo do montante relevante da Tarifa Social (§ 121 da Tréplica). Pelo contrário, a Tejo Energia afirma que apenas era necessário realizar os cálculos da materialidade da Tarifa Social uma única vez – e não anualmente – pois o ponto 1.3 do Apêndice 11 do CAE impõe apenas que a avaliação da materialidade seja realizada uma única vez no que respeita os Impostos Relevantes que são “incorridos periodicamente ou continuamente durante um período de tempo indefinido” (§ 128-129 das Alegações Finais).

114. A este respeito, nos termos da Cláusula 20.1 do CAE, este requisito deve ser verificado à luz da definição que consta do Apêndice 11. Mais especificamente, o ponto 1.3 do Apêndice 11 do CAE estabelece o seguinte:

“1.3 Para os fins do disposto na Cláusula 20.1 e do presente Apêndice, uma Alteração nos Custos ou Alteração nos Impostos Relevantes é “material” se, quer por si só quer em conjunto com outras Alterações nos Custos ou (conforme o caso) outras Alterações nos Impostos Relevantes, que não tenham sido tomadas em conta para os fins da Cláusula 20.3 ou do presente Apêndice, exceder o Montante Limiar Aplicável, líquido de qualquer poupança nos custos ou aumento de receita que o Produtor possa fazer ou realizar, sujeito às disposições do presente Contrato. As Alterações nos Custos ou Alterações nos Impostos Relevantes que sejam incorridas periodicamente ou durante um período de tempo indefinido devem ser avaliadas para se determinar se são materiais por referência a um terço do valor líquido atual da quantia estimada de tal alteração aplicada a uma taxa de desconto acordada pelas partes e, na ausência de acordo, conforme determinado nos termos do Procedimento de Resolução de Litígios. Se for requerido por escrito pela EDP, o Produtor informará do valor de qualquer Alteração nos Custos ou Alteração nos Impostos Relevantes especificados pela EDP logo que o referido valor possa ser razoavelmente determinado, desde que tal afirmação não prejudique os direitos de ambas as partes, previstos na Cláusula 20 ou no parágrafo 8.2.”

115. Uma análise minuciosa do ponto 1.3 do Apêndice 11 do CAE, acima transcrito, revela que essa disposição estabelece diferentes fórmulas para determinar a materialidade de uma Alteração nos Custos ou Alteração nos Impostos Relevantes, consoante a natureza da Alteração nos Custos ou Alteração nos Impostos Relevantes em causa (designadamente, dependendo se a Alteração nos Custos ou Alteração nos Impostos Relevantes é ou não incorrida periodicamente ou continuamente durante um período de tempo indefinido). Desta forma, a segunda frase do ponto 1.3 do Apêndice 11 estabelece que, se a Alteração nos Custos ou Alteração nos Impostos Relevantes for incorrida periodicamente ou continuamente durante um período de tempo indefinido, este requisito não se verificaria por comparação do Montante Limiar Aplicável com o montante da alteração em apreço – individualmente ou conjuntamente com outra Alteração nos Custos ou Alteração nos Impostos Relevantes que não foi tida em consideração para efeitos da Cláusula 20.3 ou do Apêndice 11 – mas, ao invés, por comparação do Montante Limiar Aplicável com o montante resultante de uma fórmula mais complexa – designadamente, por referência a um terço do valor atual líquido do montante previsto de tal alteração, aplicando uma taxa de desconto acordada entre as Partes ou, na ausência de acordo, como determinado nos termos do Procedimento de Resolução de Litígios. Por conseguinte, na opinião do Painel Financeiro, a segunda frase do ponto 1.3 do Apêndice 11, que serve de base à alegação da Tejo Energia, apenas estipula uma fórmula diferente e mais sofisticada que deve ser usada para verificar a materialidade de uma Alteração num Imposto Relevante relativamente às alterações que são incorridas periodicamente ou continuamente durante um período de tempo indefinido, mas nada na redação daquela disposição sugere que, nesses casos, apenas é necessário realizar uma única vez os cálculos da materialidade.

116. Relativamente às Alterações nos Impostos Relevantes que são incorridos periodicamente ou continuamente durante um período de tempo indefinido, a necessidade de realizar este apuramento anualmente, a fim de demonstrar se tal alteração é ou não material, é consistente com o facto de que as duas figuras relevantes para esse fim (o montante da Alteração aos Impostos Relevantes e o Montante Limiar Aplicável) podem variar significativamente ao longo da sua vida. De facto, para Alterações aos Impostos Relevantes desta natureza, o valor da alteração em apreço pode variar ao longo dos anos, como tem sido o caso dos custos com a Tarifa Social, que registaram uma variação significativa em 2015 como resultado da expansão do universo de beneficiários deste regime. Relativamente ao Montante Limiar Aplicável, conforme observado pela REN Eléctrica durante a Audiência (Transcrição da Audiência 1, Manhã, 00:18:49), também podem variar anualmente, na medida em que para cada Ano de Exploração subsequente deverá haver um novo cálculo baseado no Ano de Exploração anterior, ajustado em conformidade com o ponto 1.1 do Apêndice 11:

“Montante Limiar Aplicável” significa, para o primeiro Ano de Exploração;

(a) para os efeitos do ponto 1.3, um sexto do montante médio estimado do CC, calculado de acordo com o previsto ao abrigo do parágrafo 2 do Apêndice 1 para os doze meses completos imediatamente precedentes à relevante Alteração nos Custos ou Alteração dos Impostos Relevantes, conforme o caso; e

(b)para os efeitos do ponto 3.5, o montante médio estimado do CC, calculado de acordo com o previsto ao abrigo da alínea 2 do Apêndice 1 para os doze meses completos imediatamente precedentes à relevante Alteração na Lei  e para cada Ano de Exploração subsequente, deve ser o montante relevante aplicável referente ao Ano de Exploração precedente, ajustado pela alteração percentual no “Índice de Preços no Consumidor, total com exclusão da habitação no território continental” no Boletim Estatístico Mensal conforme publicado pelo Instituto Nacional de Estatística durante o período precedente de 12 meses terminando em setembro no referido Ano de Exploração precedente e o ano precedente ao referido Ano de Exploração;”

117. Por conseguinte, seria contrário à natureza das Alterações nos Impostos Relevantes que são incorridos periodicamente ou continuamente durante um período de tempo indefinido – como a Tarifa Social – realizar os cálculos para verificar este requisito uma única vez e que esse apuramento pudesse ser suficiente para determinar a materialidade de uma Alteração aos Impostos Relevantes dessa natureza durante toda a sua vida. Mais, tal interpretação não tem sustentação na redação do CAE celebrado entre as Partes que, como analisado anteriormente, apenas prevê no ponto 1.3 do Apêndice 11 uma fórmula diferente de realizar essa avaliação, mas não dispensa a Tejo Energia de provar este requisito para cada ano referente ao qual apresenta um pedido.

118. No presente caso, a Tejo Energia provou, por meio de correspondência apresentada como Prova C-37 (i) o Montante Limiar Aplicável para 2012 e (ii) o valor atual líquido dos custos associados com os Impostos Relevantes incorridos pela Tejo Energia em 2012 em conformidade com a fórmula estabelecida no ponto 1.3 do Apêndice 11 do CAE, porém não demonstrou o cálculo do Montante Limiar Aplicável e do montante resultante da fórmula prevista no ponto 1.3 do Apêndice 11 no que concerne aos anos de 2015, 2016 e 2017, cujos custos estão a ser reclamados no âmbito deste processo.

119. Na Audiência (Transcrição da Audiência 2, Manhã, 00:28.24-00:32:18), o advogado da Tejo Energia assinalou que os custos do cumprimento da Tarifa Social aumentaram significativamente durante esse período devido à expansão do número de beneficiários. Como resultado, argumentou que a alteração ao Imposto Relevante seria provavelmente mais material entre 2015 e 2017 do que tinha sido em 2012 ou, nas próprias palavras da Tejo Energia, que “nenhuma das partes tem dúvidas sobre a superação do limiar ou que a tarifa social superou o limiar.” Ora, na exposição da Tejo Energia não era, por conseguinte, necessário calcular a materialidade nos anos subsequentes.

120. Porém, na opinião do Painel Financeiro, é necessário provar a materialidade para efeitos da Cláusula 20.1 por meio de cálculos realizados em conformidade com o Apêndice 11, em cada ano. Não é admissível dispensar aqueles cálculos argumentando que é provável que produzam um determinado resultado. A única qualificação possível seria numa situação em que a REN Trading aceitasse que o teste de materialidade tinha sido cumprido, sem que fosse necessário realizar cálculos para demonstrá-lo. Isto é particularmente verdade considerando que, como referido anteriormente, independentemente de o facto de o custo da Tarifa Social poder aumentar, o Montante Limiar Aplicável também é provável que varie de um ano para o outro (ponto 1.1 do Apêndice 11 do CAE).

121. Face ao acima exposto, não é possível a este Painel Financeiro determinar se os custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social pela Tejo Energia durante 2015, 2016 e 2017, que são objeto de reclamação perante este Painel Financeiro, são materiais para efeitos da Cláusula 20.1 do CAE.

122. Resulta do que precede que, na opinião da maioria dos membros do Painel Financeiro, embora a imposição da Tarifa Social consubstancie uma Alteração a um Imposto Relevante, a Tejo Energia não pode acionar, por agora, os mecanismos previstos nas Cláusulas 20.2 a 20.5 do CAE para garantir, na medida do possível, que ficará na mesma posição financeira ao abrigo do CAE em que estaria se a Tarifa Social não tivesse sido criada porque não provou que tal Alteração no Imposto Relevante é material, em conformidade com as disposições da Cláusula 20.1 e o Apêndice 11 do CAE.

123. Salienta-se, porém, que tal não deve impedir a Tejo Energia de provar a materialidade dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social durante 2015, 2016 e 2017 no futuro, a fim de acionar o procedimento aplicável ao abrigo do CAE.

2.2. O REEMBOLSO DOS CUSTOS COM A TARIFA SOCIAL À LUZ DOS TERMOS DO CAE

124. Na sua Petição Inicial, a Tejo Energia argumenta que, por virtude da Cláusula 20 do CAE – sem qualquer outra precisão – tem direito ao reembolso dos custos decorrentes da Tarifa Social, para manter a mesma situação financeira em que estaria se a Tarifa Social não tivesse sido criada (§ 43). A Tejo Energia considera que a falta de pagamento por parte das Requeridas dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social pela Tejo Energia durante 2015, 2016 e 2017 constitui, inter alia, (1) 9 uma violação do CAE e, assim, solicita a este Painel Financeiro que condene as Requeridas a reembolsar, até à caducidade do CAE, os custos com a Tarifa Social suportados pela Tejo Energia (§ 109-113).

125. Por razões de exaustividade, e como o facto de a Tejo Energia não ter provado o segundo requisito previsto na Cláusula 20.1 do CAE nestes procedimentos não a deve impedir de recorrer aos mecanismos previstos na Cláusula 20.2 a 20.5 do CAE, se futuramente conseguir estabelecer o efeito material da Tarifa Social, este Painel Financeiro considera necessário pronunciar-se sobre o eventual direito da Tejo Energia ser ressarcida dos custos com a Tarifa Social ao abrigo dos termos do acordo celebrado entre as Partes.

126. Nesta linha, a REN Eléctrica defende que a repercussão dos custos apenas está disponível nos termos da Cláusula 20.3 do CAE e acrescenta que, como tal disposição não é aplicável à Tarifa Social, a Tejo Energia apenas poderia solicitar uma alteração de Encargo de Potência e/ou Encargo de Energia em conformidade com a Cláusula 20.4 e o Apêndice 11 do CAE (§ 175-177 da Contestação e § 128-129 da Tréplica). Outrossim, a REN Trading alude na sua Contestação que a Tarifa Social não configura nenhuma das circunstâncias elencadas na Cláusula 20 do CAE, que preveem mecanismos de ajustamento especiais – designadamente as Cláusulas 20.2.2 e 20.3 – (§ 115) e acrescenta que, com base no aumento dos custos, a Tejo Energia podia acionar o procedimento de alteração previsto na Cláusula 20.4 e no Apêndice 11 do CAE (§ 121).

127. Como salientado pelas Requeridas, uma leitura atenta do CAE permite concluir que, consoante a natureza do Imposto Relevante em apreço – conquanto o mesmo tenha tido um efeito material –, a neutralidade do Produtor em relação a alterações no direito fiscal seria garantida por meio de diferentes mecanismos. Mais especificamente, considerando que os Impostos Relevantes que se enquadram no âmbito da Cláusula 20.3.5 do CAE constituiriam fundamento para o Produtor solicitar o reembolso dos custos associados a tal Imposto Relevante (“Repercussão dos Custos”), os Impostos Relevantes restantes (aqueles que não se enquadram no âmbito da Cláusula 20.3.5 do CAE) constituiriam as bases para o Produtor solicitar a alteração do cálculo da Encargo de Potência e/ou Encargo de Energia em conformidade com os procedimentos e princípios previstos na Cláusula 20.4 do CAE e no ponto 10 do Apêndice 11 do CAE (“Alterações nas Circunstâncias”). Por conseguinte, à luz dos termos do CAE celebrado entre as Partes, a Tejo Energia apenas teria direito a ser ressarcida pela REN Trading pelos custos com a Tarifa Social, se esses custos se enquadrassem no âmbito da Cláusula 20.3.5 do CAE.

128. Sendo assim, de forma a deliberar sobre se a Tejo Energia pode ou não pedir o reembolso à REN Trading os custos com a Tarifa Social desde 2015, é necessário analisar o âmbito das cláusulas da CAE em apreço.

A este respeito, a Cláusula 20.3.5 do CAE estabelece que:

“20.3.5 De acordo com o previsto na Cláusula 20.3.6, o Produtor tem direito a recuperar:

(a)quaisquer impostos ou valores selados sobre pagamentos de capital e de juros incluídos na Dívida Sénior e (se a Dívida Sénior tiver sido refinanciada) sobre os pagamentos de capital e de juros, conforme certificado nos termos do Apêndice 1 do Anexo 4 ou no pagamento de capital e juros referentes a empréstimos, com o objetivo de implementar o Apêndice 11;

(b) quaisquer impostos ou valores selados sobre operações de câmbio pagáveis em relação a (i) pagamentos de capital e de juros incluídos na Dívida Sénior e (se a Dívida Sénior tiver sido refinanciada) sobre pagamentos de capital e de juros conforme certificado nos termos do Apêndice 1 do Anexo 4 ou no pagamento de capital e juros referentes a empréstimos, com o objetivo de implementar o Apêndice 11;

(ii) a compra de combustível para a Central Termoelétrica; (c) qualquer imposto municipal sobre imóveis (Contribuição Autárquica) a pagar com referência à Central Termoelétrica, ao Local, à Linha Ferroviária ou em relação à Locação; (d) quaisquer encargos, impostos, direitos de importação, direitos e deveres aduaneiros e fatores percentuais, emolumentos ou custos previstos e na medida determinada pela Cláusula 20.2.2.”

129. Além disso, a Cláusula 20.2.2 do CAE faz referência aos seguintes encargos, impostos, direitos de importação, direitos e deveres aduaneiros, fatores percentuais, emolumentos e custos, que, nos termos da alínea d) da Cláusula 20.3.5 do CAE, também constituiriam motivo para o Produtor solicitar o reembolso dos respetivos custos à REN Trading:

“20.2.2. O produtor deve notificar imediatamente por escrito a EDP se estiver obrigado ou ficar obrigado a pagar ou a contabilizar qualquer um dos seguintes custos:

(a)quaisquer encargos com captação de água (taxa de utilização, taxa de exploração, conservação e beneficiação – confrontar nosº 1 dos nos 21º e 22º do Decreto-Lei n.º 70/99, de 2 de março): ou

(b) quaisquer impostos, direitos de importação, direitos e deveres aduaneiros, fatores percentuais ou custo relacionado com a melhoria da qualidade do ar (taxa para melhoria da qualidade do ar – conforme artigo 30º do Decreto-Lei n.º 352/90, de 9 de novembro); ou

(c) desde que o Produtor empregue todos os esforços razoáveis para obter isenções e que nenhuma isenção tenha sido entretanto obtida, qualquer imposto sobre valor acrescentado e imposto sobre a transferência da propriedade (“SISA”) a pagar pela ou na sequência da celebração do presente Contrato, o Contrato de Aquisição e de Construção, o Contrato de Unidades Adicionais, o Contrato de Locação e o Acordo Direto e as transações por este efetuadas ou por este referidas, e as disposições da Cláusula 20.3.5

(d) serão aplicáveis na data em que o Produtor for ou se torne responsável pelo pagamento de tais impostos, direitos de importação, direitos e deveres aduaneiros, fatores percentuais, emolumentos ou custos, se e na medida em que os mesmos não possam ser deduzidos de quaisquer outros impostos, direitos de importação, direitos e deveres aduaneiros, fatores percentuais, emolumentos ou custos devidos e pagáveis ao Produtor pela autoridade tributária relevante. Após a data em que o Produtor é ou se torne responsável pelo pagamento de tais encargos e impostos, e pela aplicação da Cláusula 20.3.5. (d) (se aplicável), os encargos e impostos, direitos de importação, direitos e deveres aduaneiros, fatores percentuais, emolumentos ou custos referidos nas alíneas (a), (b) e (c) precedentes serão considerados como Impostos Relevantes para os fins do presente Contrato”.

130. Uma leitura atenta das cláusulas supracitadas do CAE revela que a Tarifa Social – que, conforme as Partes referiram nas respetivas alegações, é um desconto sobre as tarifas de eletricidade reguladas que se destina a beneficiar determinados consumidores de energia economicamente vulneráveis – não se enquadra no âmbito da Cláusula 20.3 do CAE, mesmo que a Tejo Energia tivesse provado o seu efeito material, porque tem uma natureza diferente dos encargos especificados nessa cláusula. Por conseguinte, este Painel Financeiro concluiu que, ao abrigo do CAE, a Tejo Energia não pode solicitar à REN Trading o reembolso dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social por parte da Tejo Energia.

131. Resulta do que precede que, caso a Tejo Energia consiga provar futuramente o efeito material da Tarifa Social, a Tejo Energia terá direito a recorrer à Cláusula 20.4 do CAE, isto é, procurar uma alteração do cálculo do Encargo de Potência e/ou Encargo de Energia em conformidade com os procedimentos e os princípios relevantes estabelecidos no ponto 10 do Apêndice 11:

“20.4 Alteração do Contrato

20.4.1 Se o Produtor (no caso previsto pela Cláusula 20.1 (a) ou pela Cláusula 20.3.1 (a)) ou a EDP (no caso previsto pela Cláusula 20.1 (b)) mediante notificação à contraparte assim escolher, o cálculo do Encargo de Potência Instalada e/ou do Encargo de Energia Produzida no presente Contrato será alterado de acordo com os procedimentos e princípios previstos no ponto 10 do Apêndice 11 na medida necessária para garantir, tanto quanto possível, que o Produtor esteja na mesma posição financeira sob o presente Contrato que estaria se a Alteração ao Imposto Relevante não tivesse ocorrido. (...)"

132. Importa dar conta de que a Cláusula 20.4.1 do CAE não confere à Tejo Energia um direito absoluto de ser colocada na mesma situação financeira em que estaria caso não tivesse ocorrido a criação da Tarifa Social. Ao invés, como as Requeridas realçaram nas respetivas Contestações, a Cláusula 20.4.1 do CAE apenas procura garantir esse resultado, na medida do possível (§ 177 da Contestação da REN Eléctrica e § 122 da Contestação da REN Trading).

133. Sem prejuízo do acima exposto, convém observar que, como é inquestionável, a reparação prevista na Cláusula 20.4.1 do CAE (isto é, a alteração do Encargo de Potência Instalada e/ou Encargo de Energia Produzida) nunca foi acionada pela Tejo Energia a respeito da Tarifa Social. A Tejo Energia reconheceu este facto durante a Audiência, referindo “as partes ou a Requerente, se preferirem, optaram por não alterar os Encargos de Energia ou Potência devido ao novo Imposto Relevante que se verificou” (Audiência Transcrição 3, tarde, 00:01:04). Nesta linha, resulta da formulação da Cláusula 20.4.1 do CAE que o mecanismo previsto na mesma para garantir a neutralidade do Produtor ao abrigo do CAE não se aplica automaticamente quando as condições descritas nas Cláusulas 20.1(a), 20.1(b) ou 20.3.1(a) são cumpridas. Pelo contrário, o Encargo de Potência Instalada e/ou o Encargo de Energia Produzida apenas devem ser alterados para esse efeito “se o Produtor... mediante notificação à outra parte assim entender”. Por conseguinte, tendo em conta que a Tejo Energia nunca optou por encetar negociações com vista à alteração da Encargo de Energia Instalada e/ou Encargo de Potência Produzida devido à aplicação da Tarifa Social, tendo optado, pelo contrário, em pedir o reembolso desses custos – embora tal reparação não seja possível ao abrigo do CAE a respeito da Tarifa Social – este Painel Financeiro conclui que, até agora, o mecanismo previsto na Cláusula 20.4.1 da CAE não foi acionado.

134. Todavia, na opinião do Painel Financeiro, tal não deve impedir a Tejo Energia de poder acionar futuramente o mecanismo previsto na Cláusula 20.4.1 do CAE, se conseguir estabelecer o efeito material da Tarifa Social, porque não há nada na redação do CAE que impeça a Tejo Energia de poder refletir os custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social durante 2015, 2016 e 2017, quando for estimado o montante da alteração do Encargo de Energia Instalada e/ou Encargo de Potência Produzida.

135. Resulta do que precede que, ao abrigo dos termos do CAE celebrado entre as Partes, a Tejo Energia não pode solicitar à REN Trading o reembolso dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social, mesmo que estivessem reunidos os pressupostos previstos na Cláusula 20.1 do CAE, na medida em que a Tarifa Social não se enquadra no âmbito da Cláusula 20.3 do CAE (“Exceções e Repercussão dos Custos”). Ao invés, se a Tejo Energia conseguir demonstrar futuramente o efeito material da Tarifa Social, tal facto apenas constituiria motivo para a Tejo Energia solicitar uma alteração do cálculo do Encargo de Potência Instalada e/ou Encargo de Energia Produzida em conformidade com os procedimentos e princípios relevantes estabelecidos no ponto 10 do Apêndice 11 do CAE na medida do necessário para garantir, na medida do possível, que seria colocada na mesma situação financeira em que estaria caso não tivesse ocorrido a criação da Tarifa Social.

136. Independentemente do facto de que, à luz dos termos do CAE celebrado entre as Partes, relativamente à Tarifa Social, a Tejo Energia apenas poderia solicitar a alteração da Encargo de Potência Instalada e/ou Encargo de Energia Produzida, este Painel Financeiro entende que, na sua Réplica, a Tejo Energia afasta-se do procedimento contratual previsto no CAE e sustenta que a prática de longa data e aplicada constantemente das Partes tem sido a adoção de um procedimento simplificado de repercussão dos custos, que tem sido seguido no que concerne a Taxa de Uso da Rede, a Taxa de Gestão de Resíduos, as Taxas Portuárias, as Taxas relativas a Licenças de CO2 e a própria Tarifa Social. A Tejo Energia entende que tal conduta tem de ser considerada um comportamento conclusivo "com efeitos legais vinculativos relativamente à adoção de um procedimento diferente e simplificado (...) significando que embora as Partes não estejam a observar o procedimento previsto no Apêndice 11 do CAE, o procedimento alternativo usado deve produzir o mesmo efeito (§ 89-92).

137. Contudo, este Painel Financeiro concluiu que, conforme observado pelas Requeridas nas respetivas exposições e durante a Audiência, não se pode considerar que os mecanismos previstos no CAE, analisados supra, foram alterados por meio da prática das Partes por dois motivos: (i) porque o reembolso dos outros impostos identificados pela Tejo Energia não é realizado por meio de um procedimento de repercussão dos custos paralelo, simplificado e acordado tacitamente entre as Partes, mas antes já está previsto no CAE, conduziu a alterações do CAE para acomodar esses custos ou justifica-se em virtude de uma decisão do legislador português ou da ERSE, e (ii) porque qualquer alteração do CAE, tal como a que a Requerente sugere, deve ser formalizada em conformidade com as disposições da Cláusula 27 do CAE.

138. Em primeiro lugar, tal como para todas as situações identificadas pela Tejo Energia à exceção da Tarifa Social – Taxa de Gestão de Resíduos, Taxa de Uso da Rede, Taxas Portuárias e Taxas Relativas a Licenças de CO2 – este Painel Financeiro entende que o reembolso dos custos nos quais a Tejo Energia incorreu se baseava nos seguintes fundamentos:

(i) Taxas relativas a Licenças de CO2: conforme evidenciado pela REN Trading, a Tejo Energia conseguiu recuperar estes custos da REN Trading por virtude da Cláusula 4 (“Repercussão dos Custos”) das alterações ao CAE efetivadas em 10 de fevereiro de 2006 e 2 de abril de 2009, apresentados como Provas RT-3 e RT-15.

(ii) Taxas Portuárias: o mecanismo para o reembolso das Taxas Portuárias está expressamente previsto no ponto 12.3 do Apêndice 3 do CAE, do qual releva que “15 dias antes da data-limite de pagamento de quaisquer somas devidas nos termos da Cláusula 12.1.3 do Contrato do Porto, o Produtor deve enviar um extrato à EDP [REN Trading] enunciando o montante daquelas somas juntamente com evidência razoavelmente satisfatória para a EDP [REN Trading] de que esses montantes são devidos e pagáveis pelo Produtor ao abrigo do Contrato do Porto (...) e as somas aí referidas devem ser pagas pela EDP [REN Trading] (...)”.

(iii) Taxa de Gestão de Resíduos: Conforme observado pela REN Trading durante a Audiência, “existe uma lei específica em Portugal, o Decreto-Lei n.º 178 de 2006, que no n.º 8 do artigo 56,º estabelece que a taxa de gestão de resíduos deve ser repercutida nos consumidores (... .) ora, para a taxa de gestão de resíduos, o legislador instituiu um mecanismo de repercussão, logo não foi uma escolha das partes” (Transcrição da Audiência 1, Manhã, 01:39:48). Assim, justifica-se o reembolso destes custos à Tejo Energia com base no facto de que, de acordo com o artigo 58.º do Decreto-Lei n.º 178/2006, a Taxa de Gestão de Resíduos deve refletir-se nas tarifas pagas pelos consumidores.

(iv) Taxa de Uso das Redes: conforme observado por ambas as Demandas, justifica-se o reembolso destes custos à Tejo Energia pelo facto de a ERSE ter aceitado anteriormente a repercussão desses custos nas tarifas pagas pelos consumidores. Por conseguinte, a REN Trading realiza o reembolso destes custos à margem da Cláusula 20.3 do CAE, mas somente devido à decisão da ERSE de transferir estes custos para as tarifas pagas pelos consumidores.

139. Resulta do que precede que o reembolso dos custos identificados pela Tejo Energia na sua Réplica – que não os custos com a Tarifa Social, que serão analisados abaixo – não é realizado por meio de um procedimento de repercussão de custos paralelo simplificado, tacitamente acordado entre as Partes, mas ao invés (i) já está previsto no CAE – Taxas Portuárias – (ii) conduziu a várias alterações ao CAE para acomodar tais custos – Taxas de Licenças CO2 – ou (iii) justifica-se pelo facto de que, de acordo com o legislador português ou a ERSE, esses custos devem repercutir-se nos consumidores – a Taxa de Gestão de Resíduos e a Taxa de Uso de Rede.

140. Quanto à Tarifa Social, o Painel Financeiro assinala que, como refletido na correspondência que a Tejo Energia apresentou como Provas C-23 a C-25, a REN Trading acordou tacitamente reembolsar os custos em que a Tejo Energia incorreu com o financiamento da Tarifa Social entre 2011 e 2014, embora esses custos não se enquadrassem no âmbito da Cláusula 20.3.5 do CAE. Na opinião do Painel Financeiro, a REN Trading, embora não tivesse nenhuma obrigação contratual de reembolsar os custos com a Tarifa Social incorridos pela Tejo Energia, procedeu voluntariamente ao reembolso desses custos durante o referido período tendo em vista a decisão da ERSE sobre a Taxa de Uso de Rede e considerando que ainda não tinha recebido qualquer indicação da ERSE a respeito da Tarifa Social (como se depreende da Prova C-21).

141. O Painel Financeiro considera, todavia, que tais acordos isolados e tácitos em virtude dos quais a REN Trading procedeu ao reembolso dos custos com a Tarifa Social entre 2011 e 2014 não podem modificar os procedimentos e mecanismos previstos no CAE, na medida em que qualquer alteração do CAE tem de ser formalizada em conformidade com a Cláusula 27 do CAE, que estipula o seguinte:

“27. ALTERAÇÕES E VARIAÇÕES

Nenhuma variação ou alteração deste Contrato pode ser efetuada, salvo expressamente por escrito na língua inglesa em documento indicado como suplementar a este Contrato e assinado por ou em nome de todas as partes deste.”

142. Nesta linha, a Tejo Energia sustenta que a Cláusula 27 do CAE apenas se aplica às situações em que as Partes pretendem modificar uma cláusula contratual específica – que, na sua opinião, não foi o caso da Tarifa Social (§ 150 das Alegações Finais). Contudo, o Painel Financeiro não partilha desta opinião, uma vez que o reconhecimento de que a prática das Partes tem efeitos jurídicos vinculativos na adoção de um procedimento diferente e simplificado de repercussão dos custos com a Tarifa Social implicaria a modificação das cláusulas do CAE porque, em virtude de tal acordo tácito, a Tejo Energia teria direito ao reembolso de custos que, de acordo com as Cláusulas 20.3.5 e 20.4.1 do CAE, apenas constituem motivo para solicitar a alteração da Encargo de Potência e/ou Encargo de Energia.

143. Por conseguinte, embora a REN Trading tenha aceitado tacitamente reembolsar a Tejo Energia pelos custos em que esta última incorreu com o financiamento da Tarifa Social entre 2011 e 2014, tais acordos isolados não podem modificar o âmbito dos mecanismos previstos no CAE, descritos acima, porque, para que produzisse esse efeito, tal alteração deveria ter sido formalizada em conformidade com as disposições da Cláusula 27 do CAE. Consequentemente, a REN Trading não pode ser obrigada a reembolsar os custos com a Tarifa Social incorridos pela Tejo Energia desde 2015 porque, à luz dos termos do CAE, a Tejo Energia apenas pode solicitar a alteração do Encargo de Energia e/ou Encargo de Potência em conformidade com a Cláusula 20.4.1.

144. Resulta do que precede que a Tejo Energia apenas pode pedir compensação relativamente aos custos com a Tarifa Social ao abrigo da Cláusula 20.4.1 do CAE (“Alteração do Contrato”), porque é o único mecanismo aí previsto para o efeito.

145. Por fim, por razões de exaustividade, importa dar conta de que a Cláusula 20.4.1 do CAE não permite que a Tejo Energia solicite o reembolso direto ou a repercussão dos custos com a Tarifa Social. Este Painel Financeiro observa que a Tejo Energia, nas respetivas Alegações Finais, afirma que a Cláusula 20.4.1 do CAE concede à Tejo Energia uma dupla possibilidade, designadamente: (i) decidir seguir o procedimento regulado contratualmente especificado, isto é, alterar o Encargo de Potência e/ou Encargo de Energia em conformidade com o Apêndice 11 ou (ii) decidir seguir outro procedimento para a repercussão dos custos que, em última análise, conduza ao mesmo desfecho financeiro (§ 141 das Alegações Finais). Contudo, este Painel Financeiro não partilha da mesma opinião porque não se pode depreender que a Cláusula 20.4.1 permite que a Tejo Energia siga outro procedimento que não aquele previsto nessa mesma cláusula. A redação da Cláusula 20.4.1 do CAE deixa claro que essa disposição procura garantir a neutralidade do Produtor ao abrigo do CAE – conquanto sejam cumpridas as condições descritas na alínea a) da Cláusula 20.1, na alínea b) da Cláusula 20.1 ou na alínea a) da Cláusula 20.3.1 – por meio de uma alteração do cálculo do Encargo de Potência Instalada e/ou o Encargo de Energia Produzida em conformidade com os procedimentos definidos no ponto 10 do Apêndice 11 e que essa disposição não deixa margem para um procedimento diferente. Além disso, tal interpretação colidiria com a intenção das Partes quando celebraram o CAE, uma vez que separaram especificamente as situações em que é possível realizar automaticamente uma repercussão dos custos (Cláusula 20.3) daquelas que levam a uma alteração do CAE (Cláusula 20.4). Por conseguinte, a admissão da interpretação da Tejo Energia iria implicar a desconsideração da intenção das Partes quando celebraram o CAE e o reconhecimento de que os âmbitos dos diferentes mecanismos previstos nas Cláusulas 20.3 e 20.4 do CAE são desprovidos de qualquer mérito.

146. Deve, portanto, concluir-se que a Tejo Energia não pode solicitar à REN Trading o reembolso dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social. Ao invés, na opinião da maioria dos membros do Painel Financeiro – cujo entendimento é o de que a Tarifa Social constitui um Imposto Relevante – se a Tejo Energia conseguir demonstrar futuramente o efeito material da Tarifa Social, tal facto apenas constituiria motivo para a Tejo Energia solicitar uma alteração do cálculo do Encargo de Potência Instalada e/ou Encargo de Energia Produzida em linha com a Cláusula 20.4.1 e o ponto 10 do Apêndice 11 do CAE. Neste caso, se a Tejo Energia invocar posteriormente aquela reparação ao abrigo da Cláusula 20.4, caberá a ambas as partes encetarem negociações e apresentarem as respetivas propostas que garantiriam, na medida do possível, que a Tejo Energia estaria na mesma posição financeira que estaria se não tivesse ocorrido a alteração nos Impostos Relevantes. Nesta linha, não há nada no CAE que impeça a Tejo Energia de propor alterações no Encargo de Potência Instalada e/ou Encargo de Energia Produzida que tenha por efeito repercutir os custos com a Tarifa Social. Se as Partes não conseguirem alcançar um acordo, cada uma das Partes poderá remeter o desacordo para outro Painel que será obrigado a escolher entre as metodologias rivais propostas (v. pontos 10.3 e 10.4 do Apêndice 11).

147. A esta luz, o ponto 10.4 do Apêndice 11 apresenta mais um motivo pelo qual a abordagem adotada pela Tejo Energia neste processo é condenável, porque a Tejo Energia tentou contornar um procedimento acordado contratualmente que estabelece que ambas as partes devem ter a oportunidade de apresentar uma proposta para enquadrar as alterações nos Impostos Relevantes e, em caso de desacordo, um Painel deve escolher entre as várias propostas de alteração. No caso em apreço, nada disto aconteceu ainda.

148. Por fim, deve concluir-se que (i) o procedimento previsto no CAE não foi alterado ou substituído por virtude da prática das Partes e que (ii) as Requeridas não violaram as respetivas obrigações contratuais ao recusarem-se a reembolsar os custos com a Tarifa Social até que seja invocada a reparação ao abrigo da Cláusula 20.4.

2.3. A APLICAÇÃO DA CLÁUSULA 20 DO CAE NÃO DEPENDE DA CAPACIDADE DA REN TRADING DE REPERCUTIR O CUSTO DA TARIFA SOCIAL NAS TARIFAS PAGAS PELOS CONSUMIDORES

149. Ambas as Requeridas solicitam ao Painel Financeiro que considere improcedente o pedido da Tejo Energia com base, inter alia, no papel da REN Trading ao abrigo do CAE e no setor da eletricidade. Em suma, ambas as Requeridas sustentam que a REN Trading tem uma posição neutra em relação aos fluxos financeiros resultantes do CAE e que, assim, não pode suportar a final os custos com a Tarifa Social tendo em conta que, de acordo com a ERSE, não podem os mesmos ser refletidos nas tarifas dos consumidores.

150. Este Painel Financeiro já considerou infundado o pedido da Tejo Energia. Contudo, por razões de exaustividade, e considerando que, à luz dos termos do CAE, a Tejo Energia pode recorrer ao procedimento previsto na Cláusula 20.4.1 e Apêndice 11 do CAE, se conseguir determinar o efeito material da Tarifa Social, este Painel Financeiro considera adequado examinar a questão suscitada pelas Requeridas.

151. Este Painel Financeiro observa que a Tejo Energia (tal como a Turbogás, S.A.) optou por não aceitar a cessação antecipada do CAE e a transição para o regime CMEC previsto no Decreto-Lei n.º 185/2003, de 20 de agosto de 2003, e no Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro de 2004. Observa ainda que, para permitir a continuidade do CAE numa forma compatível com as regras de separação de atividades da UE, a REN Trading foi constituída para, inter alia, suceder à REN Eléctrica na sua posição contratual ao abrigo do CAE. Este facto, em especial, foi materializado em virtude da alteração ao contrato executada em 29 de janeiro de 2010 (Prova C-3).

152. Sendo assim, este Painel Financeiro observa que a questão que as Partes levantaram diz respeito às especificidades do estatuto da REN Trading ao abrigo da legislação portuguesa (designadamente, ao abrigo do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006) e às consequências do mesmo sobre os mecanismos de compensação previstos no CAE celebrado com a Tejo Energia.

153. A este respeito, nos termos do n.º 3 do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006, “Compete à ERSE estabelecer as regras necessárias, no âmbito do Regulamento Tarifário, para repercutir na tarifa de uso global do sistema, ou noutra aplicável a todos os consumidores de energia elétrica, a diferença entre os encargos totais a pagar pela entidade concessionária da RNT, ou a entidade que a substituir para o efeito, e as receitas provenientes da venda da totalidade da energia elétrica adquirida no âmbito dos CAE em vigor e dos leilões de gás natural do contrato de aprovisionamento de longo prazo, bem como os mecanismos de incentivos a aplicar à entidade concessionária da RNT, ou à entidade que a substitua, para a eficiente otimização da gestão e dos custos associados a estes contratos”.

154. Este Painel Financeiro nota que o n.º 3 do artigo 70.º do Decreto-Lei n. º 172/2006 define a competência da ERSE para estabelecer as regras necessárias no Regulamento das Tarifas para permitir que a diferença entre os custos suportados pela REN Trading e as receitas obtidas pela mesma com a venda de eletricidade e com mecanismos de incentivos é refletida nas tarifas.

155. Este Painel Financeiro entende, todavia, que, aquilo que as Requeridas referem como a neutralidade financeira da REN Trading em relação aos fluxos financeiros resultantes do CAE (isto é, a repercussão da diferença entre os custos suportados pela REN Trading e as receitas obtidas pela mesma nas tarifas pagas pelos consumidores) não é absoluta e não pode ser interpretada como uma condição sine qua non para a aplicação da Cláusula 20 do CAE.

156. Primeiro, conclui-se que, através de uma análise minuciosa da formulação do referido preceito, a ERSE apenas adotaria essas regras – se adequado – em relação aos custos nos quais a REN Trading já incorreu.

157. Em segundo lugar, considerando o Parecer da ERSE datado de março de 2017 (Prova RTL-3, em especial, as páginas 9-10) – que foi solicitado pelo Secretário de Estado da Energia após a REN Eléctrica ter dado conhecimento ao Governo e à ERSE de que a Tejo Energia pretendia dar início a este processo de resolução de litígios – este Painel Financeiro entende que (i) caso a REN Trading suporte um custo, é da responsabilidade da ERSE apurar se aquele custo deve ou não ser refletidos nas tarifas e (ii) como consequência de tal avaliação, alguns custos incorridos pela REN Trading poderão não ser refletidos nas tarifas pagas pelos consumidores:

“Com efeito, por um lado, a empresa sublinha que nos termos dos CAE qualquer aumento ou diminuição de custos do produtor desde que tal resulte de uma alteração legislativa (alteração legislativa relevante), bem como de alterações a impostos relevantes, em caso de criação ou aumento de impostos (impostos relevantes), é considerada uma alteração de custos que devem ser considerados (alteração nos custos)7. Por outro, é reconhecido pela REN Trading, que de acordo com os CAE pode “não [ser] considerada uma alteração legislativa relevante quando e se essa mesma lei determinar que a alteração em causa não pode ser qualificada como uma alteração legislativa relevante para efeitos do Apêndice 16 do CAE”8 e, por outro lado, segundo o Parecer citado, os encargos com a tarifa social não serão impostos. Pelo que se a REN Trading, designadamente em sede de mecanismo de resolução de conflitos9, vier a ser condenada, por decisão inapelável, ao pagamento dos montantes relativos à tarifa social, daí decorrendo um insustentável desequilíbrio financeiro para aquela empresa regulada, pode colocar-se a necessidade de reequilíbrio financeiro. Nesta hipótese, aventada pela REN Trading e pela REN, importa atentar às seguintes considerações adicionais. A ERSE, nos termos dos seus Estatutos,10 deve assegurar a existência de condições que permitam assegurar o equilíbrio económico-financeiro das empresas em condições de gestão eficiente, e nos termos do n.º 3 do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto,11 compete à ERSE estabelecer as regras necessárias, no âmbito do Regulamento Tarifário, para repercutir a diferença entre os encargos totais a pagar pela entidade concessionária da RNT, ou a entidade que a substituir para o efeito, e as receitas provenientes da venda da totalidade da energia elétrica adquirida no âmbito dos CAE em vigor e dos leilões de gás natural do contrato de aprovisionamento de longo prazo, bem como os mecanismos de incentivos a aplicar à entidade concessionária da RNT, ou à entidade que a substitua, para a eficiente otimização da gestão e dos custos associados a estes contratos.” Não obstante, enquanto entidade reguladora independente, a ERSE encontra-se vinculada apenas pela lei, devendo obediência à mesma, como sublinhou o Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, que conclui que a lei não impõe que os consumidores suportem aqueles pagamentos. Pelo que, salvo entendimento judicial definitivo, que determine outra interpretação da lei, a ERSE, sem alterações legislativas, tem entendido não dever determinar o reconhecimento daqueles custos nas tarifas pagas pelos consumidores.”

158. Na opinião do Painel Financeiro, no dito parecer, a ERSE rejeitou a inclusão dos custos com a Tarifa Social nas tarifas pagas pelos consumidores, embora tenha contemplado que os mecanismos previstos na Cláusula 20 do CAE podem ser aplicáveis e que, como resultado, as Requeridas teriam de compensar a Tejo Energia pelos custos com a Tarifa Social. Assim, conclui-se da formulação do referido parecer que a REN Trading pode incorrer em custos que não estão refletidos nas tarifas cobradas aos consumidores de eletricidade e que, logo, é possível aplicar a Cláusula 20 do CAE mesmo que os custos decorrentes da mesma não sejam refletidos nas tarifas pagas pelos consumidores.

159. Além disso, o reconhecimento de que as obrigações assumidas pelas Partes ao abrigo do CAE podem estar limitadas ou condicionadas pelo regime financeiro da REN Trading e, assim, pelas decisões que a ERSE possa adotar ao abrigo do n.º 3 do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006 não seria consistente com a redação do n.º 1 do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006, que estipula que “Até que o processo de extinção dos contratos de aquisição de energia (CAE) esteja concluído, os centros eletroprodutores, relativamente aos quais os contratos vinculados ainda se mantenham a produzir efeitos, continuam a operar de acordo com o estabelecido no respetivo contrato e com o disposto no Decreto-Lei n.º 183/95, de 27 de julho, na redação que lhe foi dada pelos Decretos-Leis nºs 56/97, de 14 de março, e 198/2000, de 24 de agosto”. Também não seria compatível com a Cláusula 2.3 da Alteração do CAE concluída em 29 de janeiro de 2010, em virtude da qual a REN Trading se tornou uma parte do CAE, que estipula que “[e]ste Contrato Complementar não irá, em caso algum, implicar qualquer alteração ou modificação dos direitos e deveres da TE [Tejo Energia] ao abrigo do CAE além dos que produzam efeitos a partir da Data de Eficácia: (i) A TE assume as suas obrigações, responsabilidades e deveres atinentes à execução do CAE perante a REN [REN Eléctrica] ou a REN Trading e o cumprimento das suas obrigações, responsabilidades ou deveres assumidos perante a REN ou a REN Trading consideram-se cumpridos perante ambas as partes, e (ii) a REN e a REN Trading assumem solidariamente as suas obrigações, responsabilidades e deveres atinentes à execução do CAE perante a TE” (Prova C-3). Por conseguinte, as decisões que a ERSE poderá adotar nesta matéria limitam-se às suas relações com a REN Trading.

160. Assim, este Painel Financeiro conclui que o artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006 não pode ser entendido no sentido de que uma reflexão de um custo nas tarifas é uma condição sine qua non para a REN Trading incorrer nesse custo, o que é o mesmo que dizer que essa disposição não pode ser entendida no sentido de que a reflexão de um custo nas tarifas é uma condição sine qua non para a respetiva compensação por meio dos mecanismos previstos na Cláusula 20 do CAE.

161. Relativamente às considerações acima expostas, este Painel Financeiro considera que não existe qualquer impedimento legal para a REN Trading internalizar os custos incorridos com o reembolso da Tarifa Social.

2.4. O DECRETO-LEI N.º 138-A/2010, DE 28 DE DEZEMBRO DE 2010, ALTERADO EM MARÇO DE 2016, NÃO IMPEDE A APLICAÇÃO DA CLÁUSULA 20 DO CAE

162. Ambas as Requeridas argumentam, nas respetivas observações escritas, que a imputação dos custos previstos no n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro de 2010, alterado em março de 2016, é obrigatória. Daqui decorre que a REN Eléctrica alega que a Cláusula 20 do CAE é inválida ou nula nos termos do artigo 280.º do Código Civil português, enquanto a REN Trading defende que não é aplicável relativamente à Tarifa Social.

163. A este respeito, de acordo com o n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, alterado em março de 2016, “O financiamento dos custos com a aplicação da tarifa social incide sobre todos os titulares de centros eletroprodutores em regime ordinário, na proporção da potência instalada de cada centro eletroprodutor.” É indiscutível que a Tejo Energia, enquanto produtora de eletricidade a operar ao abrigo de um Contrato de Aquisição de Energia, se encontra abrangida pelo regime ordinário nos termos do Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro de 2006 e, assim, é juridicamente responsável pelo financiamento dos custos com a Tarifa Social (§ 34-36 e 41 das Alegações Iniciais). Outrossim, o n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro de 2010, alterado em março de 2016, estipula que esses custos são devidos à entidade concessionária da Rede Nacional de Transporte de Energia Elétrica. Tal facto também é incontroverso (§ 40 das Alegações Iniciais).

164. Relativamente à formulação dessa disposição, este Painel Financeiro entende que a finalidade do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro de 2010, alterado em março de 2016, é estipular sobre quem recai o encargo do financiamento do custo da Tarifa Social, isto é, quem pode ser responsabilizado pelo pagamento da tarifa. A esse respeito, deve considerar-se o referido artigo como uma regra imperativa, na medida em que a obrigação substantiva e os sujeitos da relação jurídica prevista na mesma não podem ser alterados por meio de autonomia privada.

165. Todavia, convém recordar que a finalidade da Cláusula 20 da CAE não é alterar a entidade à qual incumbe a responsabilidade de proceder ao pagamento da tarifa perante o organismo competente, mas antes prever os mecanismos contratuais entre as duas entidades privadas de forma a preservar o encargo fiscal para o Produtor no momento da celebração do CAE e, assim, minimizar o impacto de reformas fiscais sobre a Tejo Energia. Neste sentido, nada da redação do referido Decreto-Lei sugere que, à margem da relação jurídica aí prevista, os produtores de eletricidade no sistema ordinário – como a Tejo Energia – não possam ser compensados por esses custos por outra entidade privada, se assim for acordado entre as partes.

166. Outrossim, deve concluir-se que o Parecer da PGR emitido em 21 de março de 2013 (Prova CL-2) e os comentários ao mesmo do Conselho de Administração da ERSE (Prova CL-3) e o Parecer da ERSE datado de março de 2017 (Prova RTL-3) não impedem a aplicação da Cláusula 20 do CAE tendo em vista as disposições do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro de 2010, na medida em que apenas estabelecem que os custos com a Tarifa Social não podem ser transferidos para os consumidores de eletricidade.

167. Importa dar conta de que, inicialmente, a primeira questão do pedido do Secretário de Estado da Energia suscitada junto da Procuradoria-Geral da República dizia apenas respeito ao cálculo do ajustamento anual do CMEC, que são os montantes devido aos titulares dos centros eletroprodutores que acordaram na cessação antecipada dos respetivos CAE de acordo com o Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, alterado em julho de 2007. Deve referir-se igualmente que, nos termos do n.º 2 do artigo 5.º do referido Decreto-Lei, esses ajustamentos anuais são repercutidos pela totalidade dos consumidores de energia elétrica no território nacional. Na opinião do Painel Financeiro, tal regime jurídico é o motivo pelo qual o pedido foi formulado da seguinte forma (Prova CL-2, página 3):

"Face ao exposto, solicita-se a emissão de parecer sobre a questão de saber se os referidos custos com o financiamento da tarifa social, prevista no Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro, devem ser considerados para efeitos do cálculo do ajustamento anual dos CMEC, apenas devido aos centros electroprodutores em regime ordinário de que deles beneficiem, sendo, ainda, em resultado de tal inclusão, repercutidos por todos os consumidores de energia elétrica (2).

168. A redação da primeira questão do pedido é compatível com o regime jurídico dos ajustamentos anuais do CMEC: a repercussão dos custos com a Tarifa Social nas tarifas pagas pelos consumidores é uma condição sine qua non para a compensação de tais custos por meio de ajustamentos anuais do CMEC, tendo em conta que, nos termos do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, alterado em julho de 2007, esses ajustamentos são necessariamente passados para os consumidores de eletricidade.

169. Em novembro de 2012, este pedido foi ampliado para incluir os eletroprodutores que não aceitaram a cessação antecipada dos respetivos CAE e os termos do mecanismo CMEC (designadamente, Tejo Energia e Turbogás, S.A.). Mais especificamente, o pedido foi ampliado nos seguintes termos (Prova CL-2, página 5):

“4 - Face ao exposto, requer-se ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República que, a par da primeira questão suscitada [...], emita parecer sobre a questão de saber se os encargos com o pagamento pelos titulares de centros electroprodutores de CAE ainda válidos e eficazes de parte dos custos com o financiamento da tarifa social devem ser inteiramente suportados por esses titulares, conforme dispõe o artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro, ou se, pelo contrário, os mencionados encargos legitimam os produtores em causa a requerer o recálculo da respetiva remuneração ao abrigo dos CAE, transferindo, por essa via, a parte dos custos com o financiamento da tarifa social que lhes competem para os consumidores de eletricidade.”

170. Em conformidade, em março de 2013, o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República emitiu o parecer Nº 39/2012 (Prova CL-2) declarando que:

“(...) O Decreto-Lei n.º 138-A/2010 é expresso e inequívoco quando determina, na disposição citada, que os custos com o financiamento da tarifa social recaem sobre «todos os titulares de centros electroprodutores em regime ordinário», e não apenas sobre alguns desses titulares e, muito menos, sobre os consumidores de eletricidade, «o que sucederia, como se afirma no pedido de consulta, em segmento que merece a nossa concordância, no caso de recálculo da remuneração devida aos titulares dos centros electroprodutores com CAE, com vista à sua compensação pelos custos suportados com o financiamento da tarifa social, uma vez que os encargos com o pagamento da referida remuneração, na parte que não esteja coberta pelas receitas provenientes da venda da energia elétrica adquirida ao abrigo dos CAE, são repercutidos na denominada tarifa de uso global do sistema (ou tarifa UGS) que é cobrada a todos os consumidores na sua fatura de eletricidade, nos termos do n.º 3 do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006, de 26 de agosto».

Como aí também se refere, há que «ter presente que o Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro, visou instituir para os custos com a tarifa social um regime de financiamento substancialmente distinto daquele que vigora para os demais custos de interesse geral: quanto a estes custos (como é o caso dos sobrecustos com a promoção das energias renováveis, com os incentivos à garantia de potência e com a convergência tarifária) estabeleceu o legislador que os mesmos devem ser repercutidos na tarifa UGS aplicável a todos os consumidores; diversamente, no que concerne aos custos com a tarifa social, o mesmo legislador dispôs, dentro do "quadro de proteção dos consumidores" que motivou o Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro, que tais custos devem ser suportados por todos os produtores em regime ordinário». Tendo presente o texto da lei que, a nosso ver, corporiza com toda a clareza a intenção do legislador de proteger os consumidores, isentando-os do financiamento dos custos com a tarifa social de fornecimento de energia elétrica através da repercussão tarifária dos mesmos, ao contrário do regime vigente quanto ao financiamento da tarifa social de fornecimento de gás natural que, como já foi dito, é repercutido na tarifa, sendo, consequentemente, suportado pelos consumidores. Assim, concluímos que, por expressa prescrição da lei, os encargos com o pagamento pelos titulares de centros electroprodutores de CAE ainda válidos e eficazes de parte dos custos com o financiamento da tarifa social devem ser inteiramente suportados por estes titulares, conforme dispõe o artigo 4, nª 1, do Decreto-Lei nª 138-A/2010, numa solução paralela à encontrado para os centros electroprodutores que eram partes de contratos de aquisição de energia em que tais custos não devem constituir fator atendível para efeitos de apuramento do valor dos ajustamentos anuais aos montantes das compensações devidas pela cessão antecipada desses contratos.”2 (Prova CL-2, página 33 - nota de rodapé 2).

171. Por seu turno, a ERSE expressou a sua posição nesta matéria em dezembro de 2013 – ao comentar o parecer emitido pelo Conselho Tarifário sobre a sua “Proposta de tarifas e preços para a energia elétrica e outros serviços em 2014” – nos seguintes termos (Prova CL-3, páginas 4 a 5):

“(...) Com efeito, o Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro, criou a tarifa social de fornecimento de energia elétrica a aplicar a clientes finais economicamente vulneráveis e definiu a forma de fixação e financiamento da tarifa social, bem como os critérios de elegibilidade e os procedimentos para a sua atribuição aos consumidores de energia elétrica. Conforme previsto neste diploma, a tarifa social é calculada anualmente mediante a aplicação de um desconto na tarifa de acesso às redes em baixa tensão normal, de forma a limitar a variação da tarifa social de venda a clientes finais dos comercializadores de último recurso ao valor fixado anualmente através de despacho do membro do Governo responsável pela área da energia. Refira-se que, aplicando o desconto na tarifa de acesso, assegura-se que qualquer cliente, independentemente do seu comercializador, pode beneficiar da tarifa social. Também por determinação do Decreto-Lei n.º 138-A/2013, o financiamento dos custos com a aplicação da tarifa social incide sobre todos os titulares de centros eletroprodutores em regime ordinário, na proporção da potência instalada. Estes custos são devidos à entidade concessionário da Rede Nacional de Transporte de Energia Elétrica, enquanto operador do sistema, que é responsável por assegurar os fluxos destes montantes entre os agentes intervenientes na cadeia de valor do setor elétrico, até à aplicação do correspondente desconto na tarifa de acesso. Assim, os custos com a tarifa social não são incluídos nos custos com os CAE e com os CMEC. Neste particular, a ERSE deu seguimento ao Parecer n.º 39/2013 de 26 de abril, da Procuradoria-Geral da República, publicado em Diário da República, 2ª série, n.º 87, de 7 de maio de 2013. (...)”

172. Além disso, a ERSE emitiu um parecer em março de 2017 (Prova RTL-3), no qual reproduziu o raciocínio do Parecer da PGR (Prova RTL-3, páginas 2 a 5) e acrescentou:

“FLUXOS FINANCEIROS RELACIONADOS COM A TARIFA SOCIAL – SITUAÇÃO DOS CAE

Como citado, os comercializadores são responsáveis pela aplicação da tarifa social em conformidade com a legislação aplicável, mediante a aplicação de um desconto na tarifa de acesso ao sistema. O desconto da tarifa social é aplicado ao nível das tarifas de acesso e é passado para a atividade correspondente à compra e venda de acesso do Operador de Redes de Distribuição (ORD), representando um rendimento negativo. Assim, o ORD não recupera todos os custos de acesso ao sistema mediante a aplicação das tarifas de acesso aos consumidores. O ORD recebe subsequentemente estes montantes através de transferências mensais do Operador da Rede de Transporte. Por sua vez, este Operador fatura às centrais em regime ordinário na proporção da respetiva capacidade instalada o montante necessário para cobrir o rendimento permitido da atividade correspondente à compra e venda de acesso do ORD. Por motivos conhecidos, a ERSE não considerou estes montantes, correspondendo ao financiamento da tarifa social por cada central em questão, no cálculo tarifário para efeitos de determinação se os sobrecustos do CMEC bem como do CAE seriam sujeitos a revisão. Os sobrecustos do CAE representam a diferença entre os custos incorridos ao abrigo dos referidos contratos, menos as receitas das vendas de energia elétrica, suportados pela REN Trading. Esta empresa regulada é uma entidade que foi criada no âmbito do Grupo REN justamente para assegurar, em substituição do Operador do Sistema de Transmissão de Eletricidade, as responsabilidades previstas nos CAE. Por sua vez, os custos incorridos pela REN Trading são ressarcidos por via dos proveitos permitidos, definidos pela ERSE, por aplicação da tarifa de Uso Global do Sistema (UGS) do Operador da Rede de Transporte (pass through). A ERSE não transferiu qualquer custo da Tarifa Social para as tarifas do setor da eletricidade desde a criação deste regime. A REN teria suportado este custo até 2014. A partir de 2015, a REN Trading deixou de reembolsar os eletroprodutores com CAE pelos custos pagos por estes últimos atinentes à Tarifa Social. Relativamente à quantificação dos custos para financiar a tarifa social suportada pela Tejo Energia, a tabela seguinte demonstra os montantes suportados pelo eletroprodutor (previstos e efetivos), os valores efetivos que a REN Trading pagou ao produtor, bem como o facto de a ERSE não ter incluído qualquer valor na base de cálculo tarifário. (...) Apesar do facto de os consumidores não terem suportado quaisquer montantes desta natureza por força da decisão da ERSE relativa às tarifas, o anterior pode ser relevante, incluindo para efeitos de verificar se cumprem efetivamente as condições materiais para terem excedido o limiar considerado contratualmente relevante, a fim da Tejo Energia iniciar o procedimento de resolução de litígios.

POSIÇÃO ASSUMIDA PELA ERSE

Tendo especialmente em conta o Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, a ERSE decidiu repetidamente não incluir os custos com a Tarifa Social nos custos do CAE. Deve referir-se que não aceitou estes custos apresentados pela REN Trading. Na realidade, à luz da teoria do direito elencada naquele Parecer, a norma que obriga as centrais com CAE a assumirem os custos com a Tarifa Social, sem qualquer impacto para os consumidores, também se aplica aos próprios CAE e, por conseguinte, não há necessidade de ajustar o equilíbrio.

(...) PERSPETIVAS ADICIONAIS NO CONTEXTO DO SEN (SISTEMA ELÉTRICO NACIONAL)

Conforme referido anteriormente, devido ao facto de a ERSE não reconhecer os custos com a Tarifa Social nos custos da CAE, em linha com o Parecer citado, esta Entidade Reguladora foi informada de que a REN Trading deixou de assumir estes custos em 2015, tendo rejeitado as respetivas faturas enviadas pelas referidas centrais. Contudo, a REN Trading, na qualidade de empresa regulada responsável pela gestão dos CAE em vigor, sublinhou o risco interpretativo inerente aos CAE. Por um lado, a empresa realça que nos termos do CAE, qualquer aumento ou diminuição nos custos do produtor, desde que tal alteração resulte de uma alteração legislativa, assim como de alterações aos Impostos Relevantes, no caso da criação ou agravamento dos impostos, considera-se que constitui uma alteração nos custos que deve ser considerada. Por outro lado, a REN Trading reconhece, em conformidade com os CAE, que uma “alteração legislativa não pode ser considerada relevante quando e se essa lei estabelece que a alteração em questão não pode ser classificada como uma alteração legislativa relevante para efeitos do Apêndice 16 do CAE, e, adicionalmente, de acordo com o Parecer citado, os custos com a Tarifa Social não são impostos. Por conseguinte, se houver uma decisão definitiva contra a REN Trading que não seja passível de recurso, especialmente com base no mecanismo de resolução de litígios, que condene ao pagamento dos montantes relacionados com a tarifa social, assim resultando num equilíbrio financeiro insustentável para essa empresa regulada, poderá haver necessidade de um reequilíbrio financeiro. Nesta hipótese, aventada pela REN Trading e pela REN, importa atentar às seguintes considerações adicionais. Nos termos dos seus Estatutos, a ERSE assegura a existência de condições que permitam a obtenção do equilíbrio económico e financeiro por parte das atividades dos setores regulados exercidos em regime de serviço público, quando geridas de forma adequada e eficiente, e em conformidade com o n.º 3 do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto, compete à ERSE estabelecer as regras necessárias, no âmbito do Regulamento Tarifário, para repercutir a diferença entre os encargos totais a pagar pela entidade concessionária da RNT (Rede Nacional de Transporte de Energia Elétrica) e as receitas provenientes da venda da totalidade da energia elétrica adquirida no âmbito dos CAE em vigor e dos leilões de gás natural do contrato de aprovisionamento de longo prazo, bem como os mecanismos de incentivos a aplicar à entidade concessionária da RNT, ou à entidade que a substitua, para a eficiente otimização da gestão e dos custos associados a estes contratos.” “Não obstante, enquanto entidade reguladora independente, a ERSE encontra-se vinculada apenas pela lei, devendo obediência à mesma, como sublinhou o Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, que conclui que a lei não impõe que os consumidores suportem aqueles pagamentos. Por conseguinte, salvo uma interpretação jurídica definitiva que estabeleça uma interpretação diferente da lei, a ERSE, sem alterações na lei, entendeu que não deve determinar o reconhecimento desses custos nas tarifas pagas pelos consumidores. Noutro plano, sublinha-se que a REN Trading é detida pelo Operador da Rede de Transporte, sua “sociedade mãe”, sendo, nessa medida, responsável pelas obrigações daquela. Interpreta-se que foi a este título que a REN interpelou o Governo. Nessa circunstância, caso o Operador da Rede Transporte venha a ter de responder pelos custos com a Tarifa Social o mesmo poderá invocar que isso desvirtua significativamente as condições de exploração da Concessão, requerendo a reposição do equilíbrio contratual junto do Concedente. Para tanto o concessionário terá de fazer prova de que não pode prover a tal reposição recorrendo aos meios resultantes de uma correta e prudente gestão financeira e a prova seja aceite pelo Concedente (Base XXXIV da Concessão da Rede de Transporte de Eletricidade).(...)”

173.Como constatado pela Tejo Energia (§ 76 das Alegações Finais), a pergunta efetuada ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República pressupõe que os custos com a Tarifa Social são transferidos para os consumidores de eletricidade ou são suportados na íntegra pelos produtores de eletricidade. Esta premissa, que é compatível com o regime jurídico do regime CMEC - mediante o qual a compensação realizada através dos ajustamentos anuais é necessariamente refletida nos consumidores de eletricidades nos termos do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro – não pode ser extrapolada para produtores de eletricidade que ainda operam ao abrigo de um CAE dado que, neste caso, a repercussão dos custos nas tarifas pagas pelos consumidores não constitui uma condição sine qua non para compensação por meio de mecanismos contratuais previstos no CAE.

174. Tendo em conta o que precede, na opinião do Painel Financeiro, nunca foi solicitado ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República que emitisse parecer sobre a questão de saber se a Tejo Energia podia ser compensada pela REN Trading pelos custos com a Tarifa Social mediante o mecanismo contratual previsto no CAE sem transferir esses custos para os consumidores de eletricidade. Pelo contrário, foi solicitado ao Conselho Consultivo que emitisse um parecer sobre se os produtores podiam solicitar um recálculo da remuneração ao abrigo dos CAE, “assim transferindo para os consumidores de eletricidade a parte dos custos do financiamento da tarifa social pelos quais são responsáveis”.

175. Além disso, o cerne do argumentário da PGR reside na impossibilidade de transferir os custos com a Tarifa Social para os consumidores de eletricidade devido à finalidade daquela figura – que visa proteger os consumidores – e devido às diferenças significativas no que toca ao regime de financiamento de outros custos – como os sobrecustos de incentivo das energias renováveis, que devem estar refletidos na tarifa aplicável a todos os consumidores de acordo com o legislador. É claro que tais argumentos são alheios à aplicação da Cláusula 20 do CAE e às obrigações contratuais assumidas pelas Partes ao abrigo do mesmo.

176. Por conseguinte, o Painel Financeiro entende que a conclusão do Parecer da PGR, de acordo com a qual “por expressa prescrição da lei, os encargos com o pagamento pelos titulares de centros eletroprodutores de CAE ainda válidos e eficazes de parte dos custos com o financiamento da tarifa social devem ser inteiramente suportados por esses titulares, conforme dispõe o artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 138-A/2010”, deve ser interpretada como impedindo meramente a repercussão desses custos nas tarifas pagas pelos consumidores, na medida em que esse foi o âmbito da questão suscitada pelo Secretário de Estado da Energia e o raciocínio subjacente do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República.

177. Outrossim, uma análise exaustiva ao teor e contexto dos comentários emitidos pelo Conselho de Administração da ERSE em dezembro de 2013 (Prova CL-3), permite concluir que tais comentários apenas visavam apurar ou não se os custos com a Tarifa Social devem ser refletidos nas tarifas pagas pelos consumidores.

178. Nesse documento, acima transcrito, a ERSE conclui que “os custos com a Tarifa Social não estão incluídos nos CAE e nos CMEC” e reconhece que “a este respeito, a ERSE deu seguimento ao Parecer n.º 39/2013, de 26 de abril, da Procuradoria-Geral da República”.

179. Importa dar conta de que esses comentários não fazem referência e, assim, não analisam os diferentes mecanismos previstos no CAE. Mais tais comentários baseiam-se, principalmente, no Parecer da PGR que, como já se concluiu, apenas se versou sobre se aqueles custos podiam ser transferidos para os consumidores. Doutro passo, estes comentários foram realizados a respeito do parecer emitido pelo Conselho Tarifário sobre a “Proposta de tarifas e preços para a energia elétrica e outros serviços em 2014” da ERSE.

180. Todas estas circunstâncias levam à conclusão de que os comentários que a ERSE emitiu em dezembro de 2013 se limitaram a deliberar se os custos com a Tarifa Social podiam ou não se refletidos nas tarifas pagas pelos consumidores.

181. A esta luz, na opinião do Painel Financeiro, os comentários tecidos pelo Conselho de Administração da ERSE em dezembro de 2013 nos quais concluíram que “os custos com a Tarifa Social não serão incluídos nos custos com os CAE e com os CMEC”, devem interpretar-se meramente como estabelecendo que os custos com a Tarifa Social não são custos do CAE que possam ser refletidos nas tarifas cobradas aos consumidores de eletricidade.

182. Por conseguinte, deve concluir-se que o Parecer da PGR emitido em 21 de março de 2013 (Prova CL-2) e os comentários ao mesmo do Conselho de Administração da ERSE (Prova CL-3) não impedem a aplicação da Cláusula 20 do CAE tendo em vista as disposições do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro de 2010, na medida em que apenas estabelecem que os custos com a Tarifa Social não podem ser transferidos para os consumidores de eletricidade.

183. O mesmo é válido para o Parecer da ERSE de março de 2017. De facto, como acima se explicou, este parecer contempla que os mecanismos previstos na Cláusula 20 do CAE podem ser aplicados e que, como resultado, as Requeridas teriam de compensar a Tejo Energia pelos custos com a Tarifa Social, independentemente da impossibilidade de transferência desses custos para os consumidores de eletricidade.

184. Em particular, após afirmar que “por motivos conhecidos, a ERSE não considerou estes montantes, correspondendo ao financiamento da tarifa social por cada central em questão, no cálculo tarifário para efeitos de determinação se os sobrecustos do CMEC bem como do CAE seriam sujeitos a revisão”, a ERSE facultou uma tabela que evidencia os valores suportados pelo produtor (previsto e efetivo), os valores efetivos que a REN Trading pagou ao produtor, bem como o facto da ERSE não ter incorporado qualquer valor em sede de cálculo tarifário e notou que “Não obstante os consumidores não terem suportado quaisquer valores a esse título, em virtude da decisão tomada pela ERSE em sede tarifária, o exposto poderá ter relevância, inclusivamente, para verificação sobre se estão efetivamente reunidas as condições materiais, por ter sido ultrapassado o limiar contratualmente tido por relevante, para a Tejo Energia acionar o procedimento de resolução de litígios.” (Prova RTL-3, páginas 7-8).

185. Igualmente, a ERSE observou o seguinte “Noutro plano, sublinha-se que a REN Trading é detida pelo Operador da Rede de Transporte, sua “sociedade mãe”, sendo, nessa medida, responsável pelas obrigações daquela. Interpreta-se que foi a este título que a REN interpelou o Governo. Nessa circunstância, caso o Operador da Rede Transporte venha a ter de responder pelos custos com a Tarifa Social o mesmo poderá invocar que isso desvirtua significativamente as condições de exploração da Concessão, requerendo a reposição do equilíbrio contratual junto do Concedente. Para tanto o concessionário terá de fazer prova de que não pode prover a tal reposição recorrendo aos meios resultantes de uma correta e prudente gestão financeira e a prova seja aceite pelo Concedente. (Base XXXIV da Concessão da Rede de Transporte de Eletricidade).” (Prova RTL-3, página 10).

186. Logo, este Painel Financeiro não pode aderir à conclusão de que este parecer impede a aplicação da Cláusula 20 do CAE tendo em conta as disposições do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro de 2010.

187. O objetivo desse parecer era manifestar a posição da ERSE sobre a repercussão destes custos nas tarifas pagas pelos consumidores e, logo, diz respeito apenas à relação entre a REN Trading e a ERSE.

188. Sendo assim, deve concluir-se que a única finalidade do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro, alterado em março de 2016, é estipular quem é responsável perante o organismo competente pelo pagamento da Tarifa Social, sem que seja possível aderir à conclusão de que a redação daquela disposição ou do Parecer da PGR emitido em 21 de março de 2013 (Prova CL-2), os comentários a respeito do mesmo realizados pelo Conselho de Administração da ERSE (Prova CL-3) ou o Parecer da ERSE datado de março de 2017 (Prova RTL-3) impedem que a Tejo Energia seja compensada pela REN Trading por meio dos mecanismos previstos no CAE, conforme interpretado na Secção 2.2. da presente Decisão. Logo, deve considerar-se Cláusula 20 do CAE válida e aplicável.

2.5. A APLICAÇÃO DA CLÁUSULA 20 DO CAE NÃO CONFIGURA UM AUXÍLIO DE ESTADO

189. A REN Trading sustenta que, se o presente pedido da Tejo Energia fosse atendido, o reembolso dos custos com a Tarifa Social constituiria uma medida de auxílio de Estado, nos termos do n.º 1 do artigo 107.º do TFUE.

190. Já se concluiu que, à luz dos termos do CAE, a Tejo Energia não pode pedir o reembolso dos custos com a Tarifa Social, mas sim pedir a alteração do Encargo de Potência Instalada e/ou Encargo de Energia Produzida em conformidade com a Cláusula 20.4.1 e Apêndice 11 do CAE, caso consiga demonstrar que os custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social são materiais. Contudo, por razões de exaustividade, deve referir-se que a compensação de tais custos à Tejo Energia por meio dos mecanismos contratuais previstos no CAE não constituiria uma medida de auxílio de Estado ao abrigo do n.º 1 do artigo 107.º do TFUE.

191. Mais especificamente, este Painel Financeiro concluiu que, se os mecanismos contratuais previstos no CAE fossem aplicados a fim de compensar a Tejo Energia pelos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social, essa circunstância não implicaria o envolvimento de recursos estatais para efeitos do n.º 1 do artigo 107.º do TFUE porque, conforme analisado anteriormente, os custos daí decorrentes seriam internalizados pela REN Trading – que é uma empresa integralmente detida por privados – e não seriam refletidos nas tarifas pagas pelos consumidores – tal como foi estabelecido pela ERSE.

192. Por conseguinte, deve concluir-se que a compensação dos custos com a Tarifa Social incorridos pela Tejo Energia por meio dos mecanismos contratuais previstos no CAE – como interpretado na secção 2.2 desta Decisão – não constituiria um auxílio de Estado ao abrigo do n.º 1 do artigo 107.º do TFUE.

2.6. PEDIDO RECONVENCIONAL DA REN TRADING

193. Conforme já indicado, à luz do CAE, a REN Trading não tem qualquer obrigação contratual de reembolsar os custos com a Tarifa Social incorridos pela Tejo Energia. Todavia, tal como acima indicado, a REN Trading aceitou voluntariamente reembolsar a Tejo Energia pelos custos em que esta última incorreu com o financiamento da Tarifa Social entre 2011 e 2014, por força de acordos separados.

194. Perante isto, a REN Trading argumenta que procedeu ao reembolso assumindo que conseguiria recuperar esses custos – possibilidade que a ERSE excluiu – e, consequentemente, pede a restituição dos montantes pagos à Tejo Energia entre 2011 e 2014, acrescidos de juros, desde a data das Contestações até ao integral pagamento ou compensação. Por conseguinte, a REN Trading sustenta que a Tejo Energia beneficiou de um enriquecimento sem causa que colide com o artigo 473.º do Código Civil português. Pelo contrário, a Tejo Energia alega que a correspondência remetida como Provas C-23 a C-25 demonstra que aquela aceitação foi definitiva e incondicional e, por conseguinte, o não reembolso dos custos com a Tarifa Social desde fevereiro de 2015 constitui abuso de direitos na modalidade venire contra factum proprium.

195. Face aos elementos levados ao seu conhecimento – designadamente, a carta enviada pela REN Trading à Tejo Energia em 14 de fevereiro de 2013 (Prova C-23) – o Painel Financeiro considera que a possibilidade de recuperar os montantes reembolsados à Tejo Energia estava presente nos acordos separados por força dos quais a REN Trading reembolsou à Tejo Energia os custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social entre 2011 e 2014.

196. Mais especificamente, a REN Trading transmitiu na referida missiva que:

“Os custos com a Tarifa Social são financiados pelos centros eletroprodutores em regime ordinário, conforme disposto no Decreto-Lei n.º 215-B/2012, de 8 de outubro, desde 1 de janeiro de 2011. No caso dos produtores com CAE estes custos são transferidos para a REN Trading, que suporta o custo até que o mesmo seja reconhecido pela ERSE. (...)”

197. A redação da missiva supracitada, mediante a qual a REN Trading afirma que “estes custos são transferidos para a REN Trading, que suporta o custo até que o mesmo seja reconhecido pela ERSE”, demonstra inequivocamente que a REN Trading aceitou o reembolso dos custos com a Tarifa Social apenas no pressuposto de que a ERSE aceitaria que aqueles fossem refletidos nas tarifas cobradas aos consumidores. Na opinião do Painel Financeiro, é evidente que, considerando a decisão da ERSE relativa à Taxa de Uso das Redes, e na medida em que a ERSE não forneceu quaisquer indicações relativas aos custos com a Tarifa Social, a REN Trading aceitou provisoriamente os referidos custos – muito embora não estivesse contratualmente obrigada a fazê-lo – exclusivamente com vista a que os mesmos fossem repercutidos nas tarifas cobradas aos consumidores e, assim, sob reserva de que a ERSE aceitasse os mesmos para essa finalidade.

198. Como a ERSE impediu a possibilidade dos custos com a Tarifa Social serem refletidos nas tarifas pagas cobradas aos consumidores (v. Provas CL-3 e Provas RTL-3), este Painel Financeiro concluiu que (i) a alteração do comportamento da REN Trading desde fevereiro de 2015 não pode ser entendida como um abuso do direito na modalidade de venire contra factum proprium e (ii) a Tejo Energia deve restituir os montantes que recebeu previamente da REN Trading nessa condição.

199. Há que recordar que o cerne da proibição de comportamento contraditório (venire contra factum proprium) reside em evitar comportamentos que são inconsistentes com condutas prévias após ter produzido noutros uma expectativa legítima.

200. Sendo um mecanismo que visa proteger a confiança, esta figura apenas é aplicável quando (i) há uma conduta precedente adotada pelo agente que criou uma situação objetiva de confiança, (ii) o lesado atuou em boa-fé, (iii) verificou-se um investimento de confiança, que se traduziu no desenvolvimento de uma atividade com base em tal conduta precedente, e (iv) existe um nexo de causalidade entre a situação objetiva de confiança e o investimento no qual se baseou.

201. Perante isto, embora tenha existido de facto uma conduta anterior por parte da REN Trading – o reembolso dos custos com a Tarifa Social incorridos pela Tejo Energia entre 2011 e 2014 – não se pode considerar que esta conduta criou uma situação objetiva de confiança que deve ser protegida, porque, considerando a redação da correspondência enviada pela REN Trading, a Tejo Energia não poderia razoavelmente esperar que o reembolso dos custos com a Tarifa Social fosse definitivo e incondicional. Por conseguinte, este Painel Financeiro não pode aderir à conclusão de que a falta de pagamento por parte da REN Trading desde 2015 constitui abuso do direito na modalidade de venire contra factum proprium.

202. Além disso, com base no acima exposto, este Painel Financeiro entende que a Tejo Energia deve devolver os montantes previamente recebidos da REN Trading entre 2011 e 2014 nessa condição, acrescidos de juros desde a data da respetiva Contestação até ao pagamento integral à taxa legal aplicável.

203. Todavia, conforme referido no parágrafo § 123 da presente Decisão, na opinião da maioria do Painel Financeiro – que considera que a Tarifa Social é um Imposto Relevante – o acima exposto não deve impedir a Tejo Energia de, subsequentemente, provar a materialidade dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social entre 2015 e 2017, a fim de acionar o procedimento ao abrigo da Cláusula 20.4 para cada um desses anos. Pelos mesmos motivos, a nossa decisão não impede a Tejo Energia de provar a materialidade para o período entre 2011 e 2014 e invocar o procedimento previsto na Cláusula 20.4 do CAE para cada um desses anos. Se a Tejo Energia for bem-sucedida a este respeito, é possível que a totalidade ou quase totalidade dos montantes devolvidos à REN Trading (vide ponto 202 desta Decisão) tenha de ser novamente restituída. Por este motivo, se a REN Trading pretender executar a Decisão do Painel Financeiro relativa ao Pedido Reconvencional, primeiro terá de aceitar por escrito que será responsável por devolver os reembolsos à Tejo Energia se e na medida em que a Tejo Energia consiga invocar o procedimento previsto na Cláusula 20.4 para os anos de 2011 a 2014.

2.7. CONCLUSÃO

204. Em conclusão, este Painel Financeiro considera que o pedido da Tejo Energia relativo ao reembolso dos custos com a Tarifa Social é improcedente porque não se provou que os custos incorridos sejam materiais e, além disso, esses custos apenas constituiriam motivo para solicitar a alteração do Encargo de Potência e/ou Encargo de Energia ao abrigo da Cláusula 20.4.1 do CAE, que este Painel Financeiro considera válida e aplicável. Mais, ao considerar o pedido reconvencional da REN Trading devidamente fundamentado, a Tejo Energia deve devolver os montantes previamente reembolsados pela REN Trading entre 2011 e 2014.

3. CUSTOS

205. A Secção XIV das Regras Processuais acordadas entre as Partes estabelece que:

1. Os custos do Painel Financeiro compreendem os honorários e as despesas dos membros do Painel Financeiro.

2. O Painel Financeiro determina o valor do Litígio por referência aos pedidos apresentados por cada Parte.

3. O Painel Financeiro determinará os honorários e os custos administrativos do Litígio tendo por referência os honorários por árbitro estabelecidos no Regulamento de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional atualmente em vigor. Assim, em conformidade com a secção XIII (“Valor em Litígio”) destas Regras Processuais, o montante estimado de honorários e custos administrativos é de € 300.000 (trezentos mil euros) (à data de 31 de outubro de 2017). O Painel pode modificar este montante caso o valor em litígio se altere durante a condução do processo. As Partes devem informar prontamente o Painel de quaisquer alterações ao valor atualmente em discussão.

4.As despesas dos membros do Painel Financeiro devem ser pagas em conformidade com o custo efetivamente incorrido.

5.Os honorários e as despesas dos membros do Painel Financeiro devem ser suportados, sem prejuízo da decisão final do Painel Financeiro quanto à imputação dos custos, em partes iguais pela Requerente e as Requeridas (ou seja, 1/2 para a Requerente e 1/2 para as Requeridas).

6.A Requerente e as Requeridas devem depositar até 31 de dezembro de 2017 o montante de € 100.000 (cem mil euros) pelas Partes (50% pela Requerente, 25% pela REN Elétrica e 25% pela REN Trading).

7.Se o Litígio terminar antes da Decisão final, o Painel Financeiro poderá, após consultar as Partes e considerar as circunstâncias do caso em apreço e, em especial, a celeridade e eficiência do Painel Financeiro na condução do processo, bem como a complexidade do processo e o tempo despendido pelo Painel Financeiro, e a fase em que o processo foi concluído ou qualquer outra circunstância considerada relevante, reduzir os honorários do Painel Financeiro para: (i) 30% do valor inicialmente determinado em conformidade com o ponto 3 da presente Secção, se o Litígio terminar antes de as Partes trocarem algumas das suas alegações; (ii) 50% se o Litígio terminar antes do início da audiência final; e (iii) 70% se o Litígio terminar 20 (ou mais) dias antes da data em que o Painel Financeiro deveria proferir a sua decisão.

8.O Painel Financeiro deve incluir na Decisão a imputação desses custos e despesas a qualquer parte, incluindo honorários e despesas de advogados, e despesas de peritos e testemunhas, que o Painel Financeiro considere razoáveis. Ao realizar esta alocação, o Painel Financeiro deve considerar o sucesso relativo das Partes nos seus pedidos, pedidos reconvencionais e defesas, assim como outras circunstâncias tidas como relevantes.

206. Os custos incorridos por cada Parte até à data são discriminados em seguida:

a) Tejo Energia: ‒ Honorários e despesas legais: 410.727,66 € (IVA incluído) ‒ Jurista: 55.350,00 € (IVA incluído) ‒ Custos do Painel Financeiro: 163.800 € (IVA incluído) ‒ Despesas do Painel Financeiro: 716,34 € ‒ Custos da Audiência: 909,47 € (IVA incluído) Total: 631.503,47 € (IVA incluído).

b) REN Eléctrica ‒ Honorários e despesas legais: 132.811,30 € (IVA incluído) ‒ Jurista: 43.050,00 € (IVA incluído) ‒ Custos de tradução: 923,98 € (IVA incluído) ‒ Custos do Painel Financeiro: 81.900,14 € (IVA incluído) ‒ Despesas do Painel Financeiro: 358,17 € ‒ Custos da Audiência: 454,73 € (IVA incluído) Total: 259.498,32 € (IVA incluído)

c) REN Trading i.Custos incorridos em relação ao pedido: ‒ Honorários e despesas legais: 128.669,00 € (IVA incluído) ‒ Jurista: 13.259,40 € (IVA incluído) ‒ Custos do Painel Financeiro: 81.900,14 € (IVA incluído) ‒ Despesas do Painel Financeiro: 358,17 € ‒ Custos da Audiência: 445,64 € (IVA incluído) ‒ Outros custos: 10.411,13 € (IVA incluído) ii.Custos incorridos em relação ao pedido reconvencional: ‒ Honorários e despesas legais: 2.625,90 € (IVA incluído) ‒ Jurista: 270,60 € (IVA incluído) ‒ Custos da Audiência: 9,09 € (IVA incluído) ‒ Outros custos: 212,47 € (IVA incluído) Total: 238.161,54 € (IVA incluído)

207. Nos termos do ponto 8 da Secção XIV das Regras Processuais, aquando da imputação dos custos e despesas, este Painel Financeiro deve considerar o sucesso relativo das Partes nos seus pedidos, pedidos reconvencionais e defesas, assim como outras circunstâncias consideradas relevantes.

208. O Painel Financeiro entende que as Regras Processuais parecem favorecer que os custos sejam imputados à Parte vencida, salvo argumentação em contrário.

209. Em suma, a Tejo Energia foi vencida neste processo porque não é possível dar provimento ao pedido da Requerente à luz dos termos do CAE celebrado entre as Partes. Todavia, os pedidos da Tejo Energia não são desprovidos de mérito. Este Painel Financeiro considerou fundamentadas as alegações e os argumentos da Tejo Energia a respeito dos quatro pontos principais seguintes: (i) a maioria dos membros deste Painel reconhece a existência de uma Alteração nos Impostos Relevantes para efeitos da Cláusula 20 do CAE; (ii) a ausência de repercussões do regime financeiro da REN Trading sobre as obrigações contratuais assumidas pelas Partes ao abrigo do CAE; (iii) a interpretação da imputação dos custos prevista no n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 138-A/2010 e os pareceres emitidos pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República e pela ERSE; e (iv) a inexistência de uma medida de auxílio de Estado. Relativamente ao comportamento das Partes, deve referir-se que ambas atuaram de forma profissional e contribuíram para o bom desenrolar do processo.

210. Após uma ponderação cuidada de todas estas circunstâncias, este Painel Financeiro entende que, a fim de garantir uma repartição dos custos que reflita as considerações acima expostas, a Tejo Energia deve suportar as suas próprias despesas e metade dos custos incorridos pelas Requeridas neste processo, enquanto as Requeridas suportam a restante metade dos seus próprios custos”.

Conhecendo:


I

Recordando o pedido formulado na acção, do seguinte teor: “anulação da sentença do tribunal arbitral que, em Lisboa e aos 10.06.2020, se declarou “parcialmente competente, designadamente, para conhecer as questões identificadas no parágrafo 186 da sentença, designadamente nas alíneas b), c), d), f), g) e h), na medida em que se pronunciou sobre questões que ultrapassam o âmbito da convenção de arbitragem contida na Cláusula 26 e no Anexo 9 do CAE e/ou que não se encontram abrangidos pela convenção de arbitragem”.

A decisão arbitral referida, a anular, na pretensão das Autoras, dizia:

“186. A maioria do Tribunal declara que

a) As matérias contidas na Secção VI (Decisão do Painel Financeiro), Parte 2 (O Mérito do Caso) da Decisão são “decisões” para os efeitos do Procedimento de Resolução de Litígios do CAE, na medida em que constituem determinações após a consideração dos factos e da lei;

b) O Painel Financeiro decidiu por unanimidade que a aplicação da Cláusula 20.ª não depende da capacidade da Segunda Demandada de repercutir o custo da tarifa social nas tarifas pagas pelos consumidores; em conformidade, esta decisão é final e vinculativa para as Partes;

c) O Painel Financeiro decidiu por unanimidade que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE não é vedada pela lei Portuguesa relevante; e em conformidade, esta decisão é final e vinculativa para as Partes;

d) O Painel Financeiro decidiu que a aplicação da Cláusula 20.ª do CAE não configura um Auxílio de Estado. Em conformidade, esta decisão é final e vinculativa para as Partes;

e) As questões decididas de forma não unânime pelo Painel Financeiro são definitivas e vinculativas para as Partes ao abrigo do CAE, salvo quando contestadas;

f) As Demandadas contestaram: (i) a decisão não unânime do Painel Financeiro de que a Tarifa Social constituía uma Alteração Relevante; e (ii) a decisão não unânime do Painel de que a Demandante tem direito a utilizar os mecanismos estabelecidos nas Cláusulas 20.2 a 20.5 do CAE, se for capaz de demonstrar o efeito material da imposição da Tarifa Social. Consequentemente, a Demandante tem direito a remeter o litígio para arbitragem nos termos do Anexo 9 do CAE;

g) O Tribunal tem competência, mas a sua competência é limitada a decisões não unânimes do Painel Financeiro que foram contestadas pelas Demandadas; e

h) O Tribunal tem poderes para condenar as Demandadas ao cumprimento do procedimento nos termos da Cláusula 20.ª e do Anexo 11 do CAE, caso venha a decidir que a Tarifa Social é um Imposto Relevante nos termos do CAE.

A Lei da Arbitragem Voluntária (Lei n.º 63/2011 de 14/12) dispõe, na verdade, que a anulação da sentença arbitral pode ser pedida quando a mesma sentença não observar os limites da convenção de arbitragem – artº 46.º n.º3 al.a)iii) LAV.

Assim, o âmbito subjectivo ou objectivo da Convenção de Arbitragem pode determinar a incompetência do tribunal arbitral.

Daí que a norma do artº 18.º n.º 9 LAV estabeleça que a decisão interlocutória sobre competência pode ser impugnada por qualquer das partes perante o tribunal estadual, ao abrigo, entre outros, do citado artº 46.º n.º3 al.a)iii) ou do art.º 59.º n.º1 al.f) LAV.

Portanto, em tese, nada obstava ao conhecimento do pedido formulado pelas Autoras na acção, enquanto decisão sobre a competência, questão aliás suscitada oportunamente pela ora Recorrente nos artºs 164.ºss. da Oposição, bem como apreciada pelo acórdão recorrido no enunciado ponto 2, prévio ao conhecimento de mérito.

Questão resolvida enquanto quarto pedido da demandante e ora Recorrente.

O acórdão arbitral incluiu aliás a destrinça entre uma questão relativa à interpretação da convenção de arbitragem – que é impugnada na presente acção, e pode cair no âmbito do disposto no artº 46.º n.º3 al.a)iii) LAV (decisão do quarto pedido) – e a própria questão material da eventual condenação das ora Recorridas, que considerou fora dos seus poderes de conhecimento (sétimo pedido).

Tudo se passou, portanto, no âmbito da interpretação da convenção de arbitragem e da sua possível impugnação pela via anulatória.

O facto de o mérito do pedido, dando origem a uma “sentença parcial”, se prender, em parte, com “o direito a remeter o litígio para a arbitragem” constitui verdadeira “questão de instância” relativa à competência do tribunal arbitral, posto que a interpretação da convenção deve ser feita perante a hipótese concreta colocada ao tribunal arbitral, e não simplesmente em abstracto.

Trata-se de uma decisão parcial exclusivamente formulada sobre a questão da competência, que incide sobre as decisões não unânimes do Painel Financeiro, e não sobre a concretização da “materialidade” da questão (considerada “não unânime”) relativa ao direito a reaver custos tributários, se a ora Recorrente for capaz de demonstrar o efeito material respectivo.

Por isso, não há dúvida de que nos encontramos perante uma questão que se prende com a constituição do tribunal para efeitos de conhecimento de determinada pretensão da ora Recorrente e, por isso, perante uma questão que, em substância, se prende com a instância arbitral e a convenção de arbitragem e não com o mérito do litígio que opõe as partes no Contrato (CAE).

Saber se existe uma decisão não unânime de um painel, por um lado, e se essa decisão pode ser suscitada em tribunal arbitral, por força da convenção, é uma questão de competência do tribunal.

Conhecer dos próprios pedidos formulados, ou seja, das matérias decididas de forma não unânime, é que constitui a questão de mérito.

De outra forma, a entrega da questão dos autos à arbitragem nunca poderia ser impugnada, posto que pressupõe necessariamente a interpretação da abrangência, em concreto, da hipótese dos autos, conjugada com a convenção arbitral.


II

Relembrando o que dispunha a Convenção de Arbitragem – anexo 9 – 11, do Contrato de Aquisição de Energia (CAE) vigente entre as partes:

“No caso de qualquer uma das partes desejar contestar uma decisão não unânime do Painel ou no caso de o Painel não ter chegado a uma decisão de acordo com o Regra do Painel 6.1, o Litígio será submetido por notificação escrita para o diretor executivo do Produtor e para o representante oficial da EDP, nomeado para o referido fim pela EDP, os quais reunirão e envidarão esforços para resolver as questões que existam entre as partes. A decisão conjunta e unânime dos referidos diretor executivo e representante oficial será vinculativa para as partes, mas caso não cheguem a acordo no prazo de 28 dias contados a partir da data em que o assunto lhes foi remetido, qualquer das partes pode submeter o Litígio a arbitragem.”

Assim, os litígios entre as partes devem ser submetidas a um Painel Técnico ou Financeiro, do qual podem submeter sequentemente questões à arbitragem, quanto a decisões maioritárias do Painel, previamente “contestadas” pelo modo estabelecido no Contrato.

Após a decisão não unânime do Painel, uma decisão conjunta e unânime dos diretor executivo do produtor e representante oficial da EDP será vinculativa para as partes, mas caso não cheguem a acordo no prazo de 28 dias contados a partir da data em que o assunto lhes foi remetido, qualquer das partes pode submeter o litígio a arbitragem – como a ora Recorrente submeteu.

E é, na verdade, sobre a interpretação do conceito de “decisões” a cargo do Painel que se centra a divergência entre as partes na revista e a divergência da Recorrente/Requerida quanto ao decidido no tribunal a quo.


III

Aprecie-se então o mérito da decisão sobre a competência do tribunal arbitral.

Basicamente, aquilo que o Painel Financeiro prévio fundamentou, na respectiva decisão que, por sua vez, constitui o fundamento da competência arrogada do tribunal arbitral, é que o pedido da agora Recorrente Tejo Energia ali formulado (pagamento de valores suportados pela Ré a título de “Tarifa Social”), pese embora, em abstracto, pudesse ser formulado, desde logo porque a imposição dessa “Tarifa Social” corresponde à alteração de um imposto relevante, nos termos do Contrato, não podia ser, de imediato, considerado pelo Painel, posto que a agora Recorrente não provou ali que a alteração do imposto relevante assumia uma característica “material”.

Esta “materialidade”, constante da Cláusula 20.1 do Contrato, aferia-se por meio de cálculos realizados de acordo com o apêndice 11.

Ora, nos termos da decisão prévia do Painel Financeiro, condicionadora da intervenção do Tribunal Arbitral, a aqui Recorrente Tejo Energia “não demonstrou o cálculo do Montante Limiar Aplicável e do montante resultante da fórmula prevista no ponto 1.3 do Apêndice 11 no que concerne aos anos de 2015, 2016 e 2017, cujos custos estão a ser reclamados no âmbito deste processo” (§ 118).

Daí concluindo que, se o pedido da Tejo Energia não podia ser accionado (“por agora”), tal não devia impedir a Tejo Energia de provar a materialidade dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social durante os anos de 2015 a 2017, no futuro, a fim de acionar o procedimento aplicável ao abrigo do Contrato.

E (§146) “se as Partes não conseguirem alcançar um acordo, cada uma das Partes poderá remeter o desacordo para outro Painel que será obrigado a escolher entre as metodologias rivais propostas (v. pontos 10.3 e 10.4 do Apêndice 11)”.

Apesar de, quer nas “conclusões”, quer no “dispositivo”, o Painel Financeiro consagrar a procedência do pedido reconvencional das ora Recorridas, bem como a improcedência do pedido da ali Requerente Tejo Energia, volve-se o Painel em sumário do acórdão, exprimindo: “os pedidos da Tejo Energia não são desprovidos de mérito. Este Painel Financeiro considerou fundamentadas as alegações e os argumentos da Tejo Energia a respeito dos quatro pontos principais seguintes: (i) a maioria dos membros deste Painel reconhece a existência de uma Alteração nos Impostos Relevantes para efeitos da Cláusula 20 do CAE.”

Fê-lo no conhecimento de uma questão prejudicial, relativamente ao objecto directo do conhecimento do Painel, como se extrai claramente do § 105 do conhecimento do “mérito do caso”, na decisão do referido Painel.

Questão prejudicial que, diga-se, mesmo no processo civil português pode caber ao “tribunal competente para a acção” (art.ºs 91.º n.º1 e 92.º CPCiv).

É daquele referido sumário, aliás em consonância também com os §§ 110 e 111 da fundamentação decisória do Painel, que o Tribunal Arbitral retira a respectiva competência de acordo com os procedimentos constantes do Contrato.

Todavia, é espúria (e com o devido respeito) a distinção sobre se se interpreta um Contrato ou uma Decisão Judicial ou que a esta decisão possa ser equiparada (proferida à luz das leis processuais portuguesas).

O que está em causa são os próprios termos da decisão ou da fundamentação do Painel Financeiro, que remeteu as partes, e a Ré, para uma decisão futura produzida em linha com o disposto na Cláusula 20.4.1 e no ponto 10 do Apêndice 11 do Contrato.

E é saber se, nos termos do Contrato e da decisão do Painel, a apreciação da materialidade dos custos incorridos pela ora Recorrente com o financiamento de um novo imposto poderia ser remetida para um Tribunal Arbitral, ou então, antes remetida de imediato para um novo Painel Financeiro que apreciasse a materialidade desses custos.

Ora, do teor da decisão do Painel Financeiro poderia resultar que remetia as partes para um novo procedimento à luz da cláusula 20.1 e apêndice 11, sendo que também o próprio contrato regula as matérias em discussão, relativas ao apuramento da materialidade do imposto relevante (sua existência e eventual montante), obrigando as partes aos procedimentos aí descritos e, portanto, no caso, eventualmente obrigando à avaliação da “materialidade” em causa por um novo Painel Financeiro.

Ou simplesmente, nada tendo decidido antes o Painel, que as partes deveriam submeter a questão da repercussão da “Tarifa Social” a um novo Painel.


IV

A interpretação dos actos de terceiros decisores, em direito português, sentenças de tribunais estaduais ou arbitrais, dispositivos de formações técnicas, v.g., contratualmente previstas, constituem actos jurídicos, aos quais se aplicam as regras regulamentadoras dos negócios jurídicos (artº 295.º CCiv).

Nesse sentido tais decisões/dispositivos cabem ser interpretados com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, pudesse deduzir do seu contexto – art.º 236.º n.º1 CCiv.

Assim sendo, é inequívoco que a decisão do Painel Financeiro estabeleceu que “a Tejo Energia deve devolver os montantes previamente recebidos da REN Trading entre 2011 e 2014 nessa condição, acrescidos de juros desde a data da respetiva Contestação até ao pagamento integral à taxa legal aplicável”.

Porém, a mesma decisão também frisa que, na respectiva opinião maioritária a Tarifa Social é um Imposto Relevante, pelo que não se encontra a Tejo Energia impedida de, subsequentemente, provar a materialidade dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social entre 2015 e 2017, a fim de acionar o procedimento ao abrigo da Cláusula 20.4 para cada um desses anos.

E que, pelos mesmos motivos, a decisão não impede a Tejo Energia de provar a materialidade para o período entre 2011 e 2014 e invocar o procedimento previsto na Cláusula 20.4 do CAE para cada um desses anos.

“Se a Tejo Energia for bem-sucedida a este respeito, é possível que a totalidade ou quase totalidade dos montantes devolvidos à REN Trading (vide ponto 202 desta Decisão) tenha de ser novamente restituída.”

A decisão, na respectiva fundamentação, apontava para um novo procedimento à luz da Cláusula 20 do Contrato, ou seja, a colocação eventual de nova questão ao Painel Financeiro – cujas decisões são prévias à colocação de questões ao tribunal arbitral e, se tomadas por maioria, são vinculativas.

No dispositivo final, o pedido da ora Recorrente era rejeitado e condenada a mesma ora Recorrente no pedido reconvencional formulado pelas ora Autoras/Recorridas.

De forma que se poderia dizer apenas aparentemente contraditória, seja com a decisão explícita, seja com os termos gerais da fundamentação, sumariou-se que, apesar de a Tejo Energia ter sido vencida no processo, porque não é possível dar provimento ao pedido da Requerente à luz dos termos do CAE celebrado entre as Partes, mesmo assim “os pedidos da Tejo Energia não são desprovidos de mérito; este Painel Financeiro considerou fundamentadas as alegações e os argumentos da Tejo Energia a respeito dos quatro pontos principais seguintes: (i) a maioria dos membros deste Painel reconhece a existência de uma Alteração nos Impostos Relevantes para efeitos da Cláusula 20 do CAE”.

A afirmação, assim formulada a final, não pode ser descontextualizada do atrás afirmado pelo Painel Financeiro, isto é:

- que não se encontrava a Tejo Energia impedida de, subsequentemente, provar a materialidade dos custos incorridos com o financiamento da Tarifa Social entre 2015 e 2017, accionando o procedimento ao abrigo da Cláusula 20.4 para cada um desses anos;

- que não se encontrava a Tejo Energia impedida de provar a materialidade para o período entre 2011 e 2014 e invocar o procedimento previsto na Cláusula 20.4 do CAE para cada um desses anos;

- que, em caso de sucesso da Tejo Energia, era possível que a totalidade ou quase totalidade dos montantes devolvidos à REN Trading tivesse de ser novamente restituída;

- que a decisão apontava para um novo procedimento à luz da Cláusula 20 do Contrato, ou seja, a colocação da questão agora novamente colocada para decisão – forçosamente nos termos da cláusula 9ª do Contrato (CAE), embora a decisão não refira de algum modo a forma como tal questão deveria ser recolocada.

Concorda-se que a decisão do Painel Financeiro, integrado por técnicos e não por juristas, não tem por força que possuir a estrutura de uma decisão judicial no ordenamento português – mas é necessário que tal decisão exprima explícita, claramente, qual o seu sentido, qual o seu dispositivo, independentemente de o mesmo se revelar a final da decisão, ou integrando quaisquer fundamentos, de forma, no mínimo, não contraditória.

Não está por isso em causa que a matéria relativa à eventual Alteração dos Impostos Relevantes não tenha sido objecto de apreciação pelo Painel – mas está em causa que a mesma tenha sido objecto de decisão.

Mais que a alegação das partes ou o dispositivo, em estrita obediência jusprocessual, importava interpretar a decisão do Painel Financeiro.

No entender do Painel, essa matéria da “materialidade” cumpria ter sido resolvida pela forma estabelecida no Contrato para a resolução de litígios, eventualmente colocada à apreciação de um Painel Financeiro.


V

Quanto à intervenção do Tribunal Arbitral, ela deveria ocorrer em face de uma decisão não unânime do Painel Financeiro e após o iter processual referenciado nos apêndices do Contrato.

Ora, a decisão do Painel, tomada no sentido de opção explícita dos membros respectivos, pese embora não conste do dispositivo, não foi apenas no sentido de que “a maioria dos membros deste Painel reconhece a existência de uma Alteração nos Impostos Relevantes para efeitos da Cláusula 20 do CAE”.

Foi também (veja-se o § 122 da decisão) no sentido de que “na opinião da maioria dos membros do Painel Financeiro, embora a imposição da Tarifa Social consubstancie uma Alteração a um Imposto Relevante, a Tejo Energia não pode acionar, por agora, os mecanismos previstos nas Cláusulas 20.2 a 20.5 do CAE para garantir, na medida do possível, que ficará na mesma posição financeira ao abrigo do CAE em que estaria se a Tarifa Social não tivesse sido criada porque não provou que tal Alteração a um Imposto Relevante é material, em conformidade com as disposições da Cláusula 20.1 e o Anexo 11 do CAE”.

E como a decisão arbitral anulanda refere (§ 162):

“Não é claro se o Painel Financeiro decidiu por unanimidade ou por maioria que a Demandante foi incapaz de demonstrar que a Tarifa Social era material (exceto em 2012), uma vez que a redação “por maioria” é apenas usada no parágrafo 122. Em qualquer caso, mesmo que, arguendo, fosse uma decisão não unânime, tal decisão, incontestada pelas Partes, não foi contestada por qualquer das Demandadas. Para ser mais claro, o Painel Financeiro não decidiu que o efeito da imposição da Tarifa Social era imaterial. O Painel Financeiro decidiu que, para estabelecer tal materialidade, a Demandante tinha de fornecer provas para cada ano relevante, o que a Demandante não fez, mas, de acordo com o Painel Financeiro podia fazer no futuro. Quando as Demandadas se opuseram aos procedimentos do Anexo 11 após a Decisão do Painel Financeiro, as Demandadas não contestaram que a Demandante foi incapaz de demonstrar a materialidade da imposição da Tarifa Social perante o Painel Financeiro.”

Ou seja, e para os efeitos relevantes expressos no acórdão arbitral, a inexistência de unanimidade na decisão do Painel teria por força de considerar-se como abrangendo dois segmentos ou premissas:

- a primeira, que imposição da Tarifa Social consubstanciava uma Alteração a um Imposto Relevante;

- a segunda, que a Tejo Energia não pode accionar ainda os mecanismos previstos nas Cláusulas 20.2 a 20.5 do CAE para garantir, na medida do possível, que ficará na mesma posição financeira ao abrigo do CAE em que estaria se a Tarifa Social não tivesse sido criada, porque não provou que tal Alteração a um Imposto Relevante é material, em conformidade com as disposições da Cláusula 20.1 e o Anexo 11 do CAE.

Imaterialidade que se consubstancia na impossibilidade de liquidação do pedido, em conceito jusprocessual.

A segunda referida premissa impunha-se, pois que “quando as Demandadas se opuseram aos procedimentos do Anexo 11 após a Decisão do Painel Financeiro, as Demandadas não contestaram que a Demandante foi incapaz de demonstrar a materialidade da imposição da Tarifa Social perante o Painel Financeiro”.

Assim sendo, a inexistência de unanimidade, na referida interpretação, que se aceita, permitiu colocar as duas questões referidas ao tribunal arbitral.

Os considerandos do voto de vencido do Sr. Dr. BB, no âmbito da arbitragem, acentuam, na interpretação da decisão de um Painel Financeiro internacional, um teor marcadamente jusprocessual, à luz do ordenamento português, designadamente no que respeita ao princípio da necessária substanciação do pedido, da necessária relação entre pedido e motivo do pedido (causa de pedir, em linguagem do processo civil) e da circunscrição do julgado à própria decisão.

Todavia, do ponto de vista que adoptámos, não pode ser assim – e tal não apenas por não se tratar a decisão do painel de uma peça jurisdicional, mas sobre o mais porque a decisão sobre a Alteração ao Imposto Relevante era necessária à composição integral do litígio, era uma pronúncia necessária ao sucesso da pretensão da ora Recorrente Tejo Energia, pretensão essa que o Painel Financeiro deixou em aberto, por resolver.

Tal pretensão deve passar pela decisão do tribunal arbitral incidente sobre as expostas questões não resolvidas por unanimidade.


Concluindo:

I – A anulação da sentença arbitral pode ser pedida quando a mesma sentença não observar os limites subjectivo ou objectivo da convenção de arbitragem – artº 46.º n.º3 al.a)iii) LAV, nos termos dos arts.º 18.º n.º 9 LAV.

II – A interpretação dos actos de terceiros decisores, em direito português, sentenças de tribunais estaduais ou arbitrais, dispositivos de formações técnicas, v.g., contratualmente previstas, constituem actos jurídicos, aos quais se aplicam as regras regulamentadoras dos negócios jurídicos (arts.º 295.º e 236.º n.º1 CCiv), pelo que cabem ser interpretados com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, pudesse deduzir do seu contexto.

III – A decisão de um Painel Financeiro, integrado por técnicos e não por juristas, não tem por força que possuir a estrutura de uma decisão judicial no ordenamento português – mas é necessário que tal decisão exprima explícita, claramente, qual o seu sentido, qual o seu dispositivo, independentemente de o mesmo se revelar a final da decisão, ou integrando quaisquer fundamentos, de forma não contraditória.

IV – Concebe-se que o Painel pudesse conhecer de uma questão prejudicial, relativamente ao objecto directo de conhecimento, questão que, mesmo em processo civil, pode caber ao “tribunal competente para a acção” (art.ºs 91.º n.º1 e 92.º CPCiv).

V – Se a intervenção do tribunal arbitral se convencionou que apenas ocorreria na inexistência de unanimidade na decisão do Painel Técnico ou Financeiro, teria por força de considerar-se como abrangendo dois segmentos ou premissas dessa ausência de unanimidade do Painel, ainda por solucionar, e que tinham tido relevância directa na apreciação do pedido formulado ao Painel.

Decisão:

Concedendo-se a revista, julga-se a acção improcedente, por não provada, absolvendo-se a Requerida do pedido.

Custas pelas Autoras.

Lisboa e S.T.J., 30/11/2021

Vieira e Cunha (relator)

Abrantes Geraldes

Tomé Gomes