Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
117/2000.L1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: ABRANTES GERALDES
Descritores: RESPONSABILIDADE MÉDICA
CIRURGIA PLÁSTICA
CIRURGIA ESTÉTICA
CONTRATOS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
OBRIGAÇÃO DE MEIOS
Data do Acordão: 11/15/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática: DIREITO CIVIL - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL / NÃO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES / CONTRATOS EM ESPECIAL
Doutrina: - Álvaro Dias, Dano Corporal, Quadro Epistemológico e Aspectos Ressarcitórios, pp. 440, 448.
- Carla Gonçalves, “A Responsabilidade Civil Médica, um Problema para além da Culpa”, vol. 14º, do CDB da FDUC, p. 29.
- Clara Gonzalez, “Responsabilidad Civil Médica”, Tratado da Responsabilidade Civil, coord. de Reglero Campos, vol, II, p. 736.
- Dias Pereira, “O Consentimento Informado na Relação Médico-Paciente”, vol. 9, colecção do CDB da FDUC, pp. 399, 424, 432 e 433; “O dever de esclarecimento e a responsabilidade médica”, na Revista dos Tribunais, ano 94º, p. 76.
- Eduardo Dantas, O Inadimplemento dos Contratos de Serviços Médicos, em Estudos sobre o Incumprimento do Contrato, coord. de Maria Olinda Garcia, p. 50 e ss..
- Figueiredo Dias e Sinde Monteiro, em Responsabilidade Médica em Portugal, cit. por Dias Pereira, ob. cit., p. 424.
- José Maria Gonzalez e Andrea Morillo, “La Responsabilidad Médica em el Ordenamiento Español”, em Responsabilidade Civil dos Médicos, Centro de Direito Bioético da FDUC, vol. 11º, pp. 30 e 31 e 36.
- Mafalda Miranda Barbosa, “A jurisprudência portuguesa em matéria de responsabilidade civil médica: o estado da arte”, Cadernos de Direito Privado, nº 38, p. 14 e ss..
Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 487.º, N.º1, 799.º, N.º1, 1154.º.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 5-7-2001, CJSTJ, TOMO II, PÁG. 106;
-DE 4-3-2008, CJSTJ, TOMO I, PÁG. 134;
-DE 11-7-2006, CJSTJ, TOMO II, PÁG. 325;
-DE 18-9-2007, CJSTJ, TOMO III, PÁG. 54;
-DE 22-9-2011, CJSTJ, TOMO III, PÁG. 50;
-DE 15-12-2011, CJSTJ, TOMO III, PÁG. 163;
-DE 22-03-2007, DE 17-12-2009, DE 13-9-2011 E DE 30-11-2011, TODOS EM WWW.DGSI.PT .
Sumário : 1. No contrato de prestação de serviços médico-cirúrgicos, ainda que na vertente da cirurgia estética, o cirurgião assume uma obrigação de meios, devendo aplicar em todas as fases da sua intervenção as leges artis adequadas.

2. A responsabilidade no âmbito do contrato de prestação de serviços depende da prova de uma situação que traduza o incumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação.

3. O facto de se ter esvaziado o soro fisiológico que preenchia um dos implantes mamários, dois anos e meio depois da sua colocação, não integra, por si, o incumprimento ou mesmo cumprimento defeituoso do contrato de prestação de serviços médico-cirúrgicos, estando provado que o cirurgião e demais equipa fizeram uso da diligência devida, quer na escolha, quer na colocação dos implantes.
A. G.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I – J.

instaurou acção com processo ordinário contra

- Z.,
- CENTRO I.,
- ESTADO PORTUGUÊS
e
- M. CORPORATION

pedindo a sua condenação no pagamento do montante que tiver de despender para retirar as próteses mamárias que lhe foram implantadas e para proceder à recuperação estética dos seus seios, em termos que lhe permitam fazer uma vida normal, devendo ainda os 1º, 2º e 4º RR. ser condenados numa indemniza­ção para ressarcimento dos danos morais em montante nunca inferior a € 100.000.000$00, devendo o 3.º R. ser condenado solidariamente com o 1º R., uma vez que o principal efeito da malformação foi causada por este num hospital público.
Alegou que o R. Z. a intervencionou cirurgi­camente aos seios e que, contrariamente ao que lhe afirmou, o período de recuperação não foi o indicado, tendo sofrido dores, além de que uma das próteses utiliza­das, fabricadas pela 3ª R., acabou por rebentar, esvaziando-lhe um dos seios.
O R. Z. voltou a intervencionar a mesma no Hospital …, tendo-lhe aí aplicado uma prótese igualmente fabricada pela 3ª R., mas de tamanho inferior à outra, de onde resultou ter a A. ficado com os seios assimétricos, o que lhe causou grande per­turbação.
A A. tentou mais uma vez junto do R. Z. resolver a situação, o qual a mandou novamente para o Hospital …, pretendendo que a A. fosse vista por um assisten­te, o que esta recusou insistindo em ser observada por aquele, pois queria que este lhe prestasse esclarecimentos, nomeadamente sobre os riscos da nova cirurgia.
Perante as insistências da A., o R. disse-lhe que lhe tirava os implantes deixando-lhe os seios como estava antes, o que causou sofrimento à A. e perda de confiança no R.
A A. sofre com a assimetria dos seios, a qual lhe causa desequilíbrios, ver­gonha e perturbações.

Contestaram todos os RR. por excepção e por impugnação, tendo ainda o R. Z. pedido a intervenção acessória provocada da sua seguradora, A., o que foi admitido, apresentando a mesma contestação em que aderiu aos fundamentos da apresentada pelo R. Z.

A A. apresentou réplica a todas as contestações.

O Estado foi absolvido da instância com fundamento no facto de o Tribunal ser absolutamente incompetente em razão da matéria, sendo ainda conhecidas as restantes excepções e de legitimidade passiva e de prescrição, que foram julgadas improcedentes, excepto no que concerne à excepção de prescrição relativamente à 4ª R., cuja verificação foi relegada para a sentença.

Foi proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu os RR. do pedido.

A A. apelou e a Relação confirmou a sentença.

Interpôs a A. recurso de revista e concluiu que:

a) A decisão sobre a matéria de facto não pode confinar-se nem à mera declaração de quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados, nem a essa declaração acompanhada da fundamentação genérica dos meios de prova que conduziram a um ou a outro daqueles resultados.

b) O nº 2 do art. 653° do CPC exige a análise crítica dos meios de prova produzidos no processo e manda especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador, expressa na resposta, positiva ou negativa, dada à matéria de facto controvertida.

c) A deficiência, obscuridade, contradição ou falta de fundamentação das respostas, além de poderem ser arguidas mediante reclamação, art. 653°, nº 4, podem sê-lo no recurso a interpor da sentença, nos termos do disposto nos nºs 2 e 3 do art. 712° do CPC.

d) No douto despacho que decide a matéria de facto existem respostas afirmativas, negativas, restritivas e explicativas, indicando depois, sumariamente e em bloco, as provas a partir das quais o tribunal formou a sua convicção, sem no entanto expor os motivos que levaram a considerar aquelas provas como idóneas e relevantes, eventualmente em detrimento de outras, bem como 05 critérios utilizados na apreciação das mesmas e o substrato racional que conduziu à convicção concretamente formada.

e) Toda a realidade supra descrita inquina a decisão sobre a matéria de facto, devendo dar lugar ao provimento do presente recurso, revogando-se a douta Sentença.

f) O acórdão procedeu à correcção das respostas, mas quanto ao facto 51º da fundamentação da sentença, a que corresponde o ponto 88.° da base instrutória, da prova produzida não se pode pois concluir, como concluiu o Tribunal a quo, devendo ser dado como não provado.

g) Do depoimento da testemunha dos RR., que tem conhecimento directo, tendo participado na segunda cirurgia, afirma peremptoriamente ser impossível encher com apenas 340 cc um implante de 360 cc, depoimento que deveria ser considerado, demonstrando que não foi usada na segunda cirurgia todo o rigor técnico e as técnicas e conhecimentos científicos mais avançados, pelo que deveria o quesito ser dado como não provado.

h) Quanto aos factos 69º e 70º da fundamentação da sentença, a que correspondem os pontos 116° e 117° da base instrutória, o Mº Juiz não possuía os conhecimentos técnicos especiais e científicos para em certeza poder dar como deu, como provados os factos numerados em 69º e 70º e que correspondiam aos ponto da base instrutória 116º e 117.°, nem foi feita, nos presentes autos, qualquer prova quanto a estes, pelo que deveria o Mº Juiz ter dado os factos quesitados como não provados.

i) O Tribunal fez um incorrecto julgamento de todos os pontos de facto que supra se apontaram e cujos meios de prova e de registo de gravação ouvidos impunham decisão diversa sobre esses factos ora impugnados diversa da recorrida.

j) Este julgamento e decisão traduzem-se num erro judicial que carece de revogação, substituindo-se as respostas aos quesitos, e revogando-se a sentença, condenando os RR.

k) Concluiu o acórdão que as mencionadas alterações em nada conflituam com a sentença proferida, pois que não se demonstrou que o apelado Z. tenha tido um comportamento negligente na sua actuação, uma vez que se o seio esquerdo da Apelante devido ao encapsulamento não permitiu que o implante fosse cheio com mais do que os 340 cm3 de soro.

l) Inquestionável é a relação que une A. e o R. - uma relação contratual de prestação de serviços, no domínio de um contrato tal como está desenhado no art. 1154° do CC, ou seja, um contrato em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.

m) A responsabilidade do R., como médico, quando no ano de 1995 a A. o procurou a fim de obter aconselhamento médico sobre eventuais intervenções a nível mamário e que após algumas consultas a aconselhou a, entre outras intervenções cirúrgicas, introdução de próteses mamárias, é então uma responsabilidade contratual.

n) A questão é, em primeira linha, se o médico cumpriu pontualmente a sua obrigação porque - art. 798° do CC - o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor.

o) Mais do que o (in)cumprimento da obrigação há que perguntar, antes ainda, qual é a concreta obrigação do médico e também se o incumprimento, a ter-se por verificado, se deve ou não a culpa do devedor­ médico.

p) O que se pode dizer com segurança, in casu, é que a obrigação ou não foi cumprida ou foi cumprida defeituosamente.

q) Não estamos, na situação concreta em que nos movimentamos, perante alguém que estando doente anseia ser curado (sendo que, não se sujeitando à intervenção do médico, continuará doente). O que estamos é perante alguém, uma mulher, que, não se encontrando perante qualquer doença em movimento, a que pretenda por termo ou atenuar, anseia apenas por novos seios que satisfaçam mais a preceito a sua exigência estética.

r) Se esta pode não ser uma obrigação de resultado, com o médico a comprometer-se em absoluto com a melhoria estética desejada (e acordada entre ambos), é seguramente uma obrigação de quase resultado porque é obrigação em que só o resultado vale a pena. Só o resultado vale a pena, quer para a A. quer para o R.

s) Noutro tipo de intervenções a alternativa será, para o paciente, entre o risco assumido de uma intervenção eventualmente não conseguida e/ou a degradação de um estado de doença a que se pretende pôr termo ou atenuar e em relação ao qual a inércia parece ser o pior dos males; aqui não há dois pólos de uma mesma alternativa, porque ou se concretiza o resultado ou não valia a pena pôr em risco o que era um estado de saúde.

t) Portanto aqui, em intervenções médico-cirúrgicas deste tipo, em cirurgia estética, a ausência de resultado ou um resultado inteiramente desajustado são a evidência de um incumprimento ou de um cumprimento defeituoso da prestação por parte do médico-devedor.

u) E o que aconteceu aqui foi que, efectuada a intervenção cirúrgica para introdução dos implantes mamários, passados dois anos um dos implantes esvaziou por completo e, tendo-se realizado uma segunda intervenção, a A. ficou com dois seios diferentes, em tamanho, dureza e sensação.

v) E se é verdade que imediatamente após a intervenção para aumento do volume dos seios e, pela primeira vez que os viu, a A. ficou satisfeita com o resultado, a verdade é também que posteriormente um dos implantes esvaziou e com a segunda cirurgia a morfologia e fisionomia mamária ficou diferente, no que sem receio se pode afirmar como um facto notório, não é de molde a satisfazer o sentido estético de quem quer que seja, muito menos de qualquer mulher, por menos exigente que seja.

w) E relembrar-se-á que se não afirmou a obrigação do médico, mesmo em medicina estética, como obrigação de resultado mas apenas do que pode chamar-se, pensa-se que apropriadamente, de quase resultado. Porque há sempre algo de imprevisível na natureza humana a introduzir sempre uma dose de imprevisibilidade em qualquer intervenção cirúrgica, por mais simples que seja.

x) Mas se não é de resultado, a obrigação é de meios. E então há-de competir ao médico-devedor, perante um resultado não cumprido ou cumprido defeituosamente, o ónus da prova de que - art. 799°, nº 1, do CC - a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua.

y) A ele competirá a prova de um grau de conhecimentos e de um zelo e diligência demonstrativos do emprego de todos os meios e conhecimentos e diligências adequados à obtenção do resultado (que se não obteve ou que só defeituosamente se conseguiu). E não apenas pela afirmação desta ou daquela diligência, deste ou daquele meio ou desta ou daquela atitude ou opção como as que teve por adequadas, mas pela afirmação da coincidência dessas diligências, meios, atitudes ou opções com aquilo que seria adequado cumprir, por parte de um profissional qualificado, para o tipo de intervenção que ofereceu ao seu cliente.

z) Ao R. competia o ónus da prova da ausência de culpa sua na produção do resultado, o ónus imposto pelo nº 1 do art. 799° do CC.

aa) O que era necessário, passe a abordagem matemática, era que o médico-devedor fizesse a prova de que a sua conduta profissional havia sido de molde a que o concreto resultado estava dentro do risco deste tipo de cirurgias e não, por culpa sua, dentro da percentagem em que normalmente a intervenção tem êxito.

bb) Mas essa prova não a fez o R. quando se provou que a primeira intervenção não foi precedida de análise ou diagnóstico que permitisse saber que tipo de prótese colocar, não se provou que o risco de encapsulamento foi explicado à A. e esta aceitou, não se provou que foi devido ao encapsulamento que foi colocada uma prótese mais pequena e enchida com menor quantidade de soro, com uma diferença de 50 c3;

cc) Não está, pois, provado que o R. tenha cumprido com os seus deveres de médico ou que os actos por si praticados o tenham sido de acordo com as leges artis a que está vinculado.

dd) Está até provado que o R. Z. encheu com 340 cm 3 de soro fisiológico o implante que colocou no seio da A. aquando da operação referida em 22, quando o seio direito tinha um implante de 390 c3, não se provando que tivesse sido assim por já existir membrana resultante da colocação do primeiro implante.

ee) O resultado está incumprido ou cumprido defeituosamente; dos meios, da ausência de culpa sua nos meios a contratualmente cumprir não fez o R. prova; consequentemente, nos termos do que dispõe o nº 1 do art. 799° do CC, o R. tornou-se responsável pelo prejuízo que causou ao credor, à A.

ff) Em cirurgia estética se a obrigação contratual do médico pode não ser uma obrigação de resultado, com o médico a comprometer-se "em absoluto" com a melhoria estética desejada, prometida e acordada, é seguramente uma obrigação de quase resultado porque é uma obrigação em que "só o resultado vale a pena".

gg) Aqui, em cirurgia estética, a ausência de resultado ou um resultado inteiramente desajustado são a evidência de um incumprimento ou de um cumprimento defeituoso da prestação por parte do médico devedor.

hh) Ao médico compete, por isso, em termos de responsabilidade contratual, o ónus da prova de que o resultado não cumprido ou cumprido defeituosamente não procede de culpa sua, tal como o impõe o nº 1 do art. 799° do CC.

ii) Ao médico não basta, para cumprir esse ónus, a prova de que o tipo de intervenção efectuada importa um determinado risco (eventualmente aceite pelo paciente); é necessário fazer a prova de que a sua conduta profissional, o seu rigoroso cumprimento das leges artis, foi de molde a poder colocar-se o concreto resultado dentro da margem de risco considerada e não dentro da percentagem em que normalmente a intervenção teria êxito.

Não houve contra-alegações.

II - Factos provados:
1. Os implantes Style mamary implant, salinefilled n.° 27-168391, lote GM 4925 390cc e lote GR 8983 390cc são fabricados pela 4.ª R. M. Corporation e procuram imitar o mais possível os seios humanos – A), 118° e 119°;
2. O fabrico pela 4.ª R. de tais implantes está autorizada pela FDA (Food and Drug Admmistration), o organismo público que, nos EUA, fiscaliza a qualidade e segurança dos produtos farma­cêuticos sendo que a circunstância de um implante mamário se romper ou esvaziar não implica que o mesmo sofra de qualquer defeito à saída da fábrica dessa R. – 109º e 110°;
3. Nos EUA é rigoroso o sistema de controlo de qualidade da fabricação de produtos como os implantes, divulgando a 4ª R. as características dos seus produtos através de revistas da especialidade e na Internet, sendo os aspectos relacionados com a segurança e durabilidade estudados de acordo com a tecnologia mais evoluída existente a cada momento no mercado – 111º, 113º, 114° e 115°;
4. Implantes destinados a imitar e reproduzir os seios de uma mulher têm de ter ne­cessariamente uma grande maleabilidade e capacidade de deformação, de forma que as mulheres que os utilizem não sintam nenhuma sensação de desconforto e es­tes possam adaptar-se à sua vida diária normal a lodos os níveis, incluindo os relati­vos a um relacionamento sexual, pois se o revestimento dos implantes mamários fabricados pela 4.ª R. fosse mais forte, estes poderiam ser mais resistentes e duráveis, mas causa­riam necessariamente sensações de desconforto nas utilizadoras, aumentariam as possibilidades de rejeição pelo corpo e seriam semelhantes a “duas pedras”, não re­produzindo de forma nenhuma a parte do corpo humano que pretende substituir – 116º e 117°;
5. Em 30-3-95 a A. apresentava os seios descaídos e uma acentuada redução do seu volume, alteração fisionómica que a afectou de forma muito grave que, na altura, tinha apenas 21 de idade, tendo sofrido um enorme desgosto em razão dessa alteração da sua fisionomia – 1º a 4º;
6. Em princípios de 1995 a A. tomou conhecimento que o médico português, o 1º R. Z., estava a praticar uma técnica de reconstrução dos seios, denomi­nada mamoplastia e, em 30-3-95, consultou-o com vista à realização de uma in­tervenção cirúrgica de reconstrução dos seios – 5º e 6º;
7. Na referida consulta, o 1º R., após examinar os seios da A., disse-lhe que para obter uns seios mais “equilibrados” e simetrização mamária, deveria efectuar uma mamoplastia de aumento e subida das mamas, com subida também dos mamilos, mas a A. recusou tal intervenção cirúrgica após ter sido informada que, em consequência da mesma, teria de ficar com cicatrizes à vol­ta dos mamilos e por baixo destes – 60º e 61°;
8. Face à recusa da A. em submeter-se a tal intervenção cirúrgica, o 1º R. informou-a que com uma mamoplastia apenas de aumento dos seios obteria uma melhoria morfológica dos mesmos, mas não uma harmonia perfeita dos seus seios - 62°;
9. Funcionárias da 2ª R. indicaram à A. algumas clínicas privadas onde o 1º R. efectuava intervenções cirúrgicas na área da sua especialidade, entre as quais a Clí­nica de …, tendo a A. optada por ser ope­rada nesta Clínica, sujeitando-se, em 5-5-95, a uma mamoplastia realizada, a qual consistiu na colocação de um implante da marca referida em 1. em cada um dos seus seios, im­plantes esses que foram cheios com 390 cm3 de soro fisiológico – 70º, 9º e 32º;
10. O 1º R. usou na operação os implantes referidos em 1., sendo que, na data, eram dos melhores e mais fiáveis que existiam no mercado, tendo sido verificados e testados por si e pelos médicos da sua equipa cirúrgica antes da execução da mamoplastia, não tendo sido encontrada qualquer deficiência – 10º, 11º e 76°;
11. O 1º R. colocou implantes da mesma marca nos seios de várias das suas pacientes que se submeteram a mamoplastias de aumento, não tendo ocorrido qualquer outro esvaziamento - 77°;
12. O 1º R. refere sempre aos seus pacientes que em toda e qualquer intervenção cirúrgi­ca existem riscos cirúrgicos e anestésicos e disse à A. que, com a mamoplastia de aumento, os seus seios não volta­riam a ser o que eram originalmente, passando a mesma, no entanto, a apresen­tar uma melhor morfologia mamária - 66º;
13. Informou ainda a A. que um acidente grave ou uma picada com um ob­jecto perfurante poderia provocar o rompimento dos implantes, e antes da intervenção cirúrgica informou-a de que havia riscos e consequências da operação, tendo a A. assinado o termo de consentimento para intervenção cirúrgica nº 27.364 – 12º e 63º.
14. Após a intervenção, o 1º R. receitou medicação à A. para atenuar as dores decorrentes daquela - 72°;
15. Cerca de um mês após a intervenção cirúrgica os seios da A. ainda se encontravam inchados e sentia dores nos seios, existindo casos de mulheres cujos seios permanecem inchados durante cerca de 6 meses depois de se submeterem a intervenções cirúrgicas idênticas àquela a que a A. se submeteu – 20º a 22º e 73°;
16. Cerca de 2 anos e 6 meses após a intervenção cirúrgica, o seio esquerdo da A. ficou subitamente sem volume, tendo o soro fisiológico que se encontrava na bolsa do implante sido absorvido pelo seu organismo, sendo que a A. não sofreu qualquer acidente ou agressão, tendo o referido implante estoirado sem haver causa aparente para tal – 23º, 24º e 37º;
17. A perda de volume do seio esquerdo da A. não foi consequência da técnica utilizada pelo 1º R. e pelos seus ajudantes na intervenção ci­rúrgica - 74°;
18. Pouco tempo depois do descrito em 16., a A. consultou 1º R. que, no dia 28-10-97, a operou novamente, desta vez no Hospital …, tendo usado nessa cirurgia um implante da mesma marca, com as referências “Cat. N° 27-168361 Lote HD 4054 M. Corporation”, tendo enchido com 340 cm3 de soro fisiológico o implante que colocou no seio es­querdo da A. – 25º a 29°;
19. Antes da intervenção cirúrgica referida em 18., o 1º R. disse à A. que com tal intervenção conseguiria melhorar o aspecto dos seus seios - 97°;
20. A A. exigiu que tal intervenção cirúrgica fosse efectuada pelo 1º R. - 101°;
21. O implante retirado do seio esquerdo da A. aquando da intervenção cirúrgica referida em 18. apresentava um orifício na sua face anterior como se o implante ti­vesse sido picado por um alfinete - 91°;
22. Implantes como os que foram colocados nos seios da A. podem vazar devido a avaria da válvula de enchimento - 93°;
23. Tanto na cirurgia referida em 9., como na mencionada em 18., os implantes foram colocados nos seios da A. através de aberturas feitas para o efeito na zona das suas axilas - 30°;
24. O volume do implante colocado no seio esquerdo da A. aquando da intervenção cirúrgica referida em 18. foi menor que o volume do implante que lhe havia sido colo­cado aquando da intervenção cirúrgica referida em 9. por nesse seio já existir uma membrana resultante da formação dos tecidos resultado da colocação do primeiro implante – 81º e 82º;
25. Após a cirurgia referida em 18. a A. passou a ter seios completamente diferentes em tamanho, em dureza e em sensação, ficando o seio esquerdo com um volume inferior ao direito, diferença que pelos especialistas em cirurgia plástica e estética é considerada “ligeira a moderada” e, encontrando-se a A. vestida, não é notada tal diferença de volume dos seus seios – 34º e 99°;
26. Cerca de um mês depois da intervenção cirúrgica referida em 18., a A. solicitou ao 1.º R. que lhe entregasse o implante então retirado do seu seio esquerdo, o que este não fez por nessa altura já não se encontrar em poder do Hospital …, que o entregou aos SUCH para destruição – 36º;
27. A A. deu o seu consentimento às intervenções cirúrgicas realizadas pelo 1º R. e referidas em 9. e 18., sendo que com essas intervenções cirúrgicas visava obter uns seios mais bonitos e com o mesmo volume - 48º e 49°;
28. A A. sofreu dores em consequência das cirurgias referidas em 9. e 18. e ficou desagradada por o seu seio esquerdo, após a intervenção cirúrgica referida em 18., ter ficado com um volume inferior ao direito, o que lhe causa uma inibição em público, pois tem a desagradável sensação de que toda a gente a observa e nela nota o defeito de duas mamas diferentes – 50º a 52º;
29. A 2ª R. tem ao seu serviço, nas suas instalações, empregadas não licenciadas em medicina que exercem funções de recepcionistas e que atendem quer pessoalmente, quer por telefone, os pacientes do R. Z., que marcam as datas das consultas de acordo com a agenda deste e que contactam os seus pacientes nos períodos pós-operatórios, a fim de se inteiraram da situação dos mesmos e transmitirem àquele qualquer si­tuação anómala - 55°;
30. O 1º R. tem pacientes com mamoplastias por si realizadas há mais de 18 anos que ainda não necessitaram de qualquer correcção e com grande satisfação daquelas - 65°;
31. Em ambas as intervenções cirúrgicas o 1º R. e os seus ajudantes que nelas o auxiliaram utilizaram as técnicas que, à data de cada uma dessas intervenções, eram consideradas as mais adequadas - 88°;
32. Após o descrito em 16., em consequência da intervenção cirúrgica referida em 18., a A. passou a apresentar uma melhor morfologia mamária - 103°;
33. Os implantes fabricados com soro fisiológico, além de poderem esvaziar-se pelas ra­zões referidas em 13., perdem volume com o decurso do tempo à razão de cerca de 5%/ por cada ano que passa após a sua colocação, perda de está prevista na in­formação escrita que a sua fabricante, a 4ª R., disponibiliza com a venda dos mesmos – 104º e 105°;
34. Os riscos de esvaziamento dos implantes referidos em 1., depois de colocados no corpo humano, são descritos num folheto informativo que acompanha as respecti­vas embalagens - 112°;
35. É prática do 1º R., imediatamente antes de colocar os implantes nos seios das pacientes, enchê-los uma primeira vez com soro fisiológico, despejá-los em seguida, voltar e enchê-los, e só depois proceder à sua colocação, rejeitando-os caso sofram ou apresentem algum defeito - 106°;
36. Para procederem à colocação dos implantes nos seios das pacientes os cirurgiões utilizam instrumentos médicos não cortantes - 107°;
37. Na edição de Maio de 1999 da Revista …, encontra-se um artigo intitulado “SEIOS” do qual consta, com referência ao subtítulo denominado “Mamoplastia de aumento”: “RESULTADO: Definitivo. O corpo desenvolve uma membrana que envol­ve a prótese”, sendo o artigo referido é da autoria de uma pessoa com o nome de A. P. – 47º e 98°;
38. A 2ª R. é uma sociedade da qual é sócio e gerente o 1º R. e tem a sua sede social na …, em Lisboa, local on­de o mesmo pratica actos relacionados com a sua actividade de médico especialista em cirurgia plástica e estética – B) e 69°;
39. O 1º R. entregou à A., em 30-3-95, o doc. de fls. 21, emi­tido pela 2ª R. Centro I., que é a sociedade que negoceia a sua intervenção como cirurgião, constando desse docu­mento: equipa cirúrgica 290.000$00, bloco operatório 150.000$00, anestesista 50.000$00, implantes de soro 140.000$00 - 13°;
40. A. entregou à 2ª R., em 15-4-95, o cheque n° …, sobre o Montepio Geral, no valor de PTE 140.000$00, destinado à aquisição dos implantes, valor que a 2ª R. recebeu e de que não passou qualquer factura - 14°;
41. Na data referida em 9., antes de se sujeitar à intervenção cirúrgica ali referida, a A. entregou à Clínica … a quantia de 150.000$00 como garantia do pagamento do montante global que lhe viesse a ser cobrado pela sua estadia na Clínica, pela ocupação da sala de operações da Clínica durante aquela intervenção ci­rúrgica e pelos medicamentos que lhe fossem ministrados na Clínica - 15°;
42. Em 6-5-95 a Clínica …entregou à A. o recibo cuja
cópia consta de fls. 23, no valor de 177.129$00, correspondente ao montante que, a acrescer ao referido em
44., a A. ainda pagou àquela Clínica, pela sua estadia nas instalações desta, pela ocupação da sua sala de operações e pelos medicamentos ali lhe foram ministrados - 16°;
43. A Clínica … cobrou ainda à A., que a pagou, a quantia de 60.000$0 referente aos honorários da médica anestesista - 17°;
44. Pelos serviços prestados à A. pelo 1º R., enquanto cirurgião principal, pelos ajudantes deste e pelo instrumentista, aquando da realização da cirurgia referida em 9., a A. pagou à 2ª R. a quantia global de 290.000$00 – 18º;
45. Os honorários que o 1º R. cobra pelas intervenções cirúrgicas que efectua enquan­to clínico privado são pagos pelos respectivos pacientes directamente à 2ª R. - 56°;
46. O 1º R., através da apólice n° …, transferiu a responsabilidade civil profissional para a U. – Comp. de Seguros, S.A., cuja designação actual é A. – Comp. de Seguros, S.A. - C).

III - Decidindo:
1. Das extensas conclusões apresentadas pela recorrente emergem questões de uma dupla natureza: umas ligadas ao modo como foi apreciada e valorada a prova produzida e outras atinentes ao regime de responsabilidade civil no âmbito do exercício de actos médicos.

2. Quanto ao primeiro núcleo de questões (matéria de facto), a resposta é fácil e inequívoca.
O recurso de revista está, por regra, circunscrito a questões de direito, sendo limitadíssimas as possibilidades de discutir questões de facto. Tal ocorre apenas dentro dos apertados limites definidos pelos arts. 722º, nº 3, e 729º, nº 3, do CPC, cumprindo evidenciar, para o caso concreto, que a intervenção deste Supremo Tribunal supõe a violação de disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova ou que fixe a força de determinado meio de prova.
Ora, para além de a A. recorrente se referir nas alegações do presente recurso ao julgamento efectuado pela 1ª instância (quando na realidade a decisão recorrida é um acórdão da Relação), nenhuma das questões que foram suscitadas se integra em tal previsão normativa, tanto mais que quer o Tribunal de 1ª instância quer, depois, a Relação, agiram dentro dos poderes que a lei concede às instâncias em sede de valoração e livre apreciação de meios de prova, designadamente da prova testemunhal que no caso era admissível para prova ou contraprova dos factos.

3. Seguindo a acção, depois do despacho saneador, contra os RR. Z., Centro I., e M. Corporation, relativamente à matéria de direito, a A. suscita questões que unicamente respeitam ao 1.º R. e que assim se podem sintetizar:
a) Qualificação jurídica da responsabilidade civil que lhe é imputada;
b) Apreciação do tipo de obrigação assumida: obrigação de meios ou, como pretende a recorrente, obrigação de “quase resultado”;
c) Apreciação da actuação médica, verificando se existe uma situação de incumprimento ou de cumprimento defeituoso e culposo da obrigação assumida relativamente a qualquer das duas intervenções cirúrgicas: a primeira para colocação de dois implantes mamários e a segunda para substituição de um dos implantes por outro.

3.1. Quanto à primeira questão, a matéria de facto não suscita qualquer dúvida.
A relação que se estabeleceu entre a A. e o 1.º R. é inequivocamente de natureza contratual, na modalidade de prestação de serviços médico-cirúrgicos (cfr. Eduardo Dantas, O Inadimplemento dos Contratos de Serviços Médicos, em Estudos sobre o Incumprimento do Contrato, coord. de Maria Olinda Garcia, págs. 50 e segs.).
Qualificação igualmente extensiva à consulta e intervenção cirúrgica que foram realizadas depois da verificação do incidente que se traduziu no esvaziamento de um dos implantes mamários e absorção pelo organismo do respectivo soro fisiológico. Apesar de esta última intervenção cirúrgica ter sido realizada no Hospital …, nada foi apurado no sentido de se modificar a natureza da relação jurídica.
A aferição e afirmação da natureza da responsabilidade civil ganham relevo para efeitos de preenchimento do elemento subjectivo, já que, enquanto na responsabilidade extracontratual ou aquiliana é sobre o lesado recai o ónus de prova da existência de culpa relativamente à prática do facto ilícito (art. 487º, nº 1, do CC), na responsabilidade contratual, provada que seja uma situação de incumprimento ou de cumprimento defeituoso da obrigação assumida, presume-se a culpa, recaindo sobre o prestador de serviços (devedor) o ónus da sua elisão (art. 799º, nº 1, do CC).
Sem embargo, pode afirmar-se que aquilo que no plano contratual constitui incumprimento de obrigação preexistente, cujo conteúdo se integra pela diligência, na responsabilidade extracontratual integra simplesmente negligência, sendo que ambos os aspectos devem ser aferidos em função das leges artis ajustadas a cada situação, como critério valorativo de correcção do acto médico executado pelo profissional de medicina, tendo em conta as especiais características do seu autor, a complexidade ou a transcendência vital do paciente (Clara Gonzalez, em Responsabilidad Civil Médica, inserida no Tratado da Responsabilidade Civil (coord. de Reglero Campos), vol, II, pág. 736).
Por conseguinte, mostra-se crucial aferir, a partir da apreciação da realidade consolidada pelos factos apurados pelas instâncias, da existência ou não de uma situação de incumprimento da obrigação.

3.2. A resposta à questão suscitada depende da definição do tipo de obrigação que recaía sobre o 1º R. Z. quando se dispôs a praticar as intervenções cirúrgicas de natureza estética na pessoa da A.
3.2.1. Inscritas num contrato de prestação de serviços, estamos perante obrigações de prestação de facto. Mais interesse e mais dificuldades suscita, no entanto, a qualificação dessa obrigação como obrigação de meios, obrigação de resultado ou, como pretende a A., obrigação de “quase resultado”.
Nas típicas obrigações de resultado, o cumprimento apenas se considera satisfeito quando ocorre o resultado projectado pelas partes. Assim sucede, por exemplo, com a obrigação do empreiteiro, do transportador ou com as obrigações principais que integram a generalidade dos contratos de prestação de serviços. Em tais situações, a obtenção de resultado pretendido pelo credor faz parte da essência do próprio contrato, independentemente de nele ser aplicado um trabalho intelectual ou manual (art. 1154.º do CC).
Mas o valor de tal afirmação não pode ser absoluto, designadamente em casos em que o prestador do serviço, sem deter o total domínio do processo executivo, está submetido ou condicionado pela interferência de factores externos, designadamente os inerentes aos riscos próprios de determinadas actividades.
É o que ocorre, por exemplo, na generalidade dos contratos de prestação de serviços forenses (mandatos judiciais), em que a obtenção de um determinado resultado não pode valer em termos absolutos, na medida em que existem variáveis que o profissional de modo algum pode controlar, designadamente ligados à prova dos factos ou à sua valoração. Por isso que, em tais situações, basta que nos fixemos numa obrigação de meios, cujo cumprimento ou incumprimento, com relevo para efeitos de verificação ou não de responsabilidade civil, deve ser aferido em função do empenho, da diligência ou da aplicação dos conhecimentos adequados à concreta situação. Em tais circunstâncias, o facto de o resultado projectado pelo interessado que solicita os serviços não ser alcançado não corresponde necessariamente a uma situação de incumprimento ou mesmo de cumprimento defeituoso do contrato, efeito condicionado pela verificação do incumprimento das leges artis que em concreto se mostrem exigíveis.

3.2.2. Mais vincada é a qualificação da obrigação contratual, como obrigação de meios, quando nos situamos na generalidade dos contratos que envolvem a prestações de serviços médicos e, de forma ainda mais acentuada, prestação de serviços médico-cirúrgicos. É nos cuidados de saúde que relevam de vínculos contratuais que se encontram os exemplos mais paradigmáticos de obrigação de meios, por oposição a obrigações de resultado.
Na verdade nem as partes nem o intérprete podem deixar de ponderar que toda a actuação médica comporta uma certa margem de risco. Dependendo das concretas circunstâncias objectivas, assim será maior ou menor a possibilidade de o profissional de saúde controlar todo o processo, desde o diagnóstico da situação, à sua cura, passando pela prescrição ou pelo tratamento.
Como refere Álvaro Dias, “aqueles que empreendem uma certa actividade que exige especiais qualificações não deverão contentar-se em proceder de modo diligente e empenhado, antes deverão referenciar a sua conduta ao padrão de proficiência que é legítimo esperar das pessoas que exercem uma tal profissão e que na verdade se lhes exige”, sendo naturalmente maior o grau de perícia exigível a um profissional que se arroga a qualidade de especialista. Acrescenta ainda que “o ponto de partida essencial para qualquer acção de responsabilidade médica é, por conseguinte, a desconformidade da concreta actuação do agente no confronto com aquele padrão de conduta profissional que um médico medianamente competente, prudente e sensato, com os mesmos graus académicos e profissionais, teria tido em circunstâncias semelhantes, naquela data” (Dano Corporal, Quadro Epistemológico e Aspectos Ressarcitórios, pág. 440, pág. 448).
Perante uma resposta negativa a tais normas de conduta, considerar-se-á preenchido o primeiro pressuposto da responsabilidade, sendo disso exemplo o caso que apreciado no Ac. do STJ, de 30-11-11 (www.dgsi.pt), em que, estando em causa a necessidade de uma intervenção cirúrgica numa veia, foi intervencionada uma artéria.

3.2.3. Todavia, vem sendo questionada a aplicabilidade desta solução – obrigação de meios - quando se trate de intervenções cirúrgicas ditadas unicamente por razões de ordem estética, designadamente operações de lifting ou de emagrecimento ou intervenções cirúrgicas de implantes mamários por motivos de ordem puramente estética.
A recorrente insiste precisamente neste ponto, alegando que foi orientada pelo único objectivo de melhorar o seu aspecto físico e de ultrapassar, por via da colocação de implantes mamários, uma situação que a perturbava. Tendo sido esclarecida pelo 1º R. Z. de que tal seria possível através da técnica utilizada, conclui a A. que o cumprimento da obrigação que este assumiu não se deve considerar satisfeito apenas com a prova da execução da intervenção cirúrgica segundo as regras que a ciência médica prescrevia, sendo exigível a obtenção do resultado projectado na relação paciente/médico. Resultado esse que não foi conseguido, quer porque um dos implantes entretanto perdeu o seu conteúdo líquido, quer porque, depois de ter sido realizada uma segunda intervenção, se verifica um desequilíbrio de volume entre os dois seios da A.
A questão vem sendo discutida na doutrina e na casuística jurisprudencial.
No Ac. do STJ, de 13-9-11 (www.dgsi.pt) admite-se, ainda que em termos genéricos, que, traduzindo a obrigação do médico, em regra, uma obrigação de meios e não de resultado, tal não impede que dos contornos concretos do contrato de prestação de serviços celebrado entre um doente e um médico ou clínica médica, nomeadamente, no campo das especialidades clínicas, possa resultar que o médico se obrigou em termos de garantir um resultado concreto, pelo que poderá ter de responder civilmente pelo seu incumprimento ou cumprimento defeituoso.

Também no Ac. do STJ, de 22-03-07 (www.dgsi.pt), se afirmou que “no contrato dirigido à correcção estética do rosto, o qual enfermava de envelhecimento precoce, traduzido em rugas e flacidez da pele, estamos em presença de uma obrigação de resultado”, ainda que, em concreto, se tenha considerado que a actuação da paciente impedira a execução de todas as fases necessárias tendentes à obtenção desse resultado.

Já no Ac. do STJ, de 17-12-09 (www.dgsi.pt), alude-se a uma obrigação de “quase resultado”.

3.2.4. Vejamos:
Não está liminarmente afastada a possibilidade de qualificar como de resultado determinados actos médicos contratados, qualificação que no Ac. do STJ, de 4-3-08 (CJSTJ, tomo I, pág. 134), foi admitida numa situação em que estava em causa uma determinada análise clínica.
Não assim, em nosso entender, quando se trata de intervenções cirúrgicas, maxime de cirurgias precedidas de procedimentos anestésicos, mesmo que se trate de cirurgias gizadas por objectivos puramente estéticos.

Em todas essas circunstâncias um qualquer médico consciencioso, cumpridor dos seus deveres legais e deontológicos e ciente das vicissitudes de qualquer operação cirúrgica, apenas se pode comprometer seriamente com a utilização dos meios que, em concreto, se ajustarem à respectiva situação, cumprindo a sua obrigação quando, depois de esclarecer devidamente o doente dos riscos associados à intervenção cirúrgica, emprega os conhecimentos e as técnicas ditadas pelas leges artis da especialidade, usando para o efeito de toda a diligência, profissionalismo, dedicação ou perícia que as concretas circunstâncias exigirem (cfr. o Ac. do STJ, de 5-7-01, CJSTJ, tomo II, pág. 106).

A propósito desta questão, com específica incidência nas cirurgias estéticas, Dias Pereira assevera, em correspondência com as regras da experiência ou as contingências do ser humano, que as mesmas “têm um carácter aleatório como quaisquer outras, sendo, aliás, por vezes, de enormíssima complexidade técnica e com enormes riscos”. Considera que, por isso, o acento tónico deve ser posto na prestação de informações ao paciente (O Consentimento Informado na Relação Médico-Paciente, vol. 9 da referida colecção do CDB da FDUC, págs. 432 e 433). Noutro local o mesmo autor reforça esta ideia, dizendo que “o critério determinante da necessidade de tratamento é co-determinante do quantum de informação a prestar, sendo, aliás, este aspecto e não o da natureza jurídica da obrigação (de meios ou de resultado) que verdadeiramente distingue a cirurgia estética pura das intervenções terapêuticas” (O dever de esclarecimento e a responsabilidade médica, na Revista dos Tribunais, ano 94º, pág. 76).

Também noutros quadrantes, José Maria Gonzalez e Andrea Morillo nos confrontam com a aleatoriedade própria da ciência médica que é influenciada por processos naturais e intrínsecos ao paciente, alheios ao controlo do profissional de saúde, impedindo que se exija deste uma responsabilidade baseada unicamente na sua actuação e no domínio da sua esfera de controlo e afirmando taxativamente que a obrigação do médico é sempre uma obrigação de meios e não de resultado. Ao estabelecerem o confronto com uma determinada tendência que se faz sentir em Espanha quanto à distinção entre os actos de “medicina curativa” e de “medicina voluntária”, assumindo para esta uma maior objectivação da responsabilidade (com menção de arestos do Supremo Tribunal), os mesmos autores sustentam a manutenção do princípio da culpa como critério de imputação subjectiva da responsabilidade (La Responsabilidad Médica em el Ordenamiento Español, inserido na obra colectiva Responsabilidade Civil dos Médicos, do Centro de Direito Bioético da FDUC, vol. 11º, págs. 30 e 31 e 36).

O mesmo juízo é feito por Carla Gonçalves quando refere que, contra a colocação das situações de cirurgia estética no campo das obrigações de resultado, se revela um “forte movimento no sentido de excluir qualquer tipo de procedimento cirúrgico do campo das obrigações de resultado, tendo em vista que todas as cirurgias envolvem certos riscos que nem sempre poderão ser controlados pelos especialistas” (A Responsabilidade Civil Médica, um Problema para além da Culpa, vol. 14º, do CDB da FDUC, pág. 29).

3.2.5. Consideramos também que a especificidade da cirurgia estética, apesar de se situar na vertente da cirurgia voluntária, sem efeitos curativos necessários, não nos deve desviar da rigorosa qualificação da obrigação assumida como obrigação de meios (prestação dos meios clínico-cirúrgicos) e não de resultado (assegurar o efeito concretamente pretendido).

Atentas as específicas circunstâncias ligadas à motivação do paciente, às expectativas geradas ou à oportunidade da intervenção, o acento tónico deve ser posto ao nível do grau de diligência exigível do profissional de saúde (presuntivamente dotado do necessário grau de especialização), a par do grau de informação que deve ser ministrado ao paciente, pondo-o a par dos riscos associados a qualquer intervenção no organismo humano, designadamente com a colocação de corpos estranhos, como as próteses (sobre o dever de informação e o seu doseamento de acordo com as circunstâncias cfr. Dias Pereira, O Consentimento Informado na Relação Médico-Paciente, vol. 9º do CDB da FDUC, pág. 399).
Naturalmente que aquelas e outras circunstâncias reclamam do profissional diligência o uso das leges artis da especialidade. E não estando em perigo nem a vida nem a saúde física do paciente, necessariamente que se exige uma maior ponderação dos riscos associados, em confronto com as vantagens e os inconvenientes, sem que isso baste para que se modifique a natureza das obrigações assumidas no domínio dos cuidados que envolvam a prática de cirurgia estética.
O facto de se tratar de uma cirurgia ditada por razões de carácter pessoal ou psicológico não deve fazer-nos olvidar jamais que se trata de uma “agressão” ao organismo humano, designadamente com submissão a anestesia, cortes e suturas, dependendo os resultados almejados não apenas do modo diligente como os diversos profissionais desempenhem a sua função, mas também do comportamento do próprio organismo intervencionado ou da qualidade ou durabilidade das próteses que porventura sejam aplicadas.
Enfim, o referido objectivo e as circunstâncias que rodeiam tais intervenções cirúrgicas, por comparação com outras cirurgias com finalidades curativas, não nos devem perturbar na definição da natureza da obrigação assumida, como obrigação de meios (Acs. do STJ, de 15-12-11, CJSTJ, tomo III, pág. 163, de 22-9-11, CJSTJ, tomo III, pág. 50, de 18-9-07, CJSTJ, tomo III, pág. 54, ou de 11-7-06, CJSTJ, tomo II, pág. 325), influindo tão só noutros aspectos ligados aos comportamentos dos profissionais antes, durante e após a intervenção.
Porém, verificado que seja o cumprimento dessas obrigações, não será o facto de, contrariando as expectativas, o resultado almejado ser prejudicado que revelará necessariamente uma situação de incumprimento ou de cumprimento defeituoso do contrato de prestação de serviços.
Nega-se, assim, à recorrente a pretensão de encontrar para o caso uma qualificação intermédia, como “obrigação de quase resultado”, aliás, sem interesse para a resolução do litígio.
Com efeito, como referem Figueiredo Dias e Sinde Monteiro, em Responsabilidade Médica em Portugal (cit. por Dias Pereira, ob. cit., pág. 424), “só por absurdo se pode admitir que o doente, para obter uma indemnização, além de outros pressupostos gerais, tenha apenas de provar a não obtenção de um resultado, isto é, de forma típica, a não recuperação da saúde”, concluindo que “a natureza de obrigação de meios só tem por consequência que o paciente tenha de provar o incumprimento das obrigações do médico, isto é, tem de provar objectivamente que não lhe foram prestados os melhores cuidados possíveis”.
O que pode porventura afirmar-se é que, como em qualquer outro acto cirúrgico, o cirurgião plástico se obriga a realizar a intervenção cirúrgica que for mais adequada ao caso concreto, agindo com a diligência que concretamente seja exigível pelas regras da especialidade. Por isso, mais do que insistir na divisão entre obrigação de meios e obrigação de resultados, importa que se acentue que o objecto da obrigação do cirurgião plástico, na modalidade de cirurgia estética, é integrado pelo conjunto de actos instrumentais que visam a obtenção do resultado desejado pelo paciente.
Por conseguinte, mais do que tergiversar sobre a qualificação jurídica, é importante verificar se houve ou não incumprimento das leges artis nos procedimentos médico-cirúrgicos: consulta e diagnóstico, escolha da intervenção adequada, qualidade intrínseca das próteses e verificação das mesmas antes da inserção, procedimentos e técnicas empregues nas cirurgias ou cuidados no pós-operatório, considerando a intervenção do cirurgião plástico e da respectiva equipa, etc.

3.3. Estão sob apreciação neste caso duas intervenções cirúrgicas: a inicial, que se traduziu na colocação de dois implantes mamários; a segunda, que se destinou a substituir um dos implantes que se esvaziou.
3.3.1. Quanto à primeira intervenção cirúrgica, relevam essencialmente os seguintes factos:
- Pretendendo ficar com seios mais bonitos, mas tendo recusado uma mamoplastia de aumento e de subida dos seios e também dos mamilos, a A. aceitou ser submetida a uma mamoplastia apenas de aumento que consistiu na colocação de implantes preenchidos com soro fisiológico.
- O 1º R. Z. informou a A. de que havia riscos e consequências da operação, dizendo-lhe que com a mamoplastia de aumento os seus seios não volta­riam a ser o que eram originalmente, passando a mesma, no entanto, a apresen­tar uma melhor morfologia mamária.
- Foram usados implantes que, na data, eram dos melhores e mais fiáveis do mercado, tendo sido seguida a rotina de cuidados habituais, incluindo a sua verificação e teste, sem que tivessem sido encontradas deficiências; foram utilizadas na cirurgia as técnicas que, à data, eram consideradas as mais adequadas.
- Implantes com o objectivo dos que foram utilizados têm de ter ne­cessariamente uma grande maleabilidade e capacidade de deformação, de forma que as mulheres que os utilizem não sintam nenhuma sensação de desconforto e possam adaptar-se à sua vida diária normal a todos os níveis, incluindo os relati­vos a um relacionamento sexual; de facto, se o seu revestimento fosse mais forte, poderiam ser mais resistentes e duráveis, mas não re­produziriam a parte do corpo humano que pretendem substituir e causa­riam necessariamente sensações de desconforto.
- Cerca de 2 anos e meio depois, o seio esquerdo da A. ficou subitamente sem volume, efeito determinado pelo facto de soro fisiológico que se encontrava na bolsa ter sido absorvido pelo organismo.
- Verificou-se então que esse implante apresentava um orifício na sua face anterior como se ti­vesse sido picado por um alfinete, mas não se apurou a razão do seu esvaziamento; sabe-se, contudo, que nem a A. sofreu qualquer acidente ou agressão, nem essa situação foi provocada pela técnica utilizada na sua aplicação, desconhecendo-se a razão do referido esvaziamento.

3.3.2. O acervo de factos é concludente no sentido de obstar a que se afirme em relação à actuação do 1º R. Z. (e da respectiva equipa ou demais RR.) uma situação de incumprimento ou incumprimento defeituoso da obrigação acordada.
São inequívocas as dificuldades com que se defronta o lesado ou o credor da prestação de serviços médicos no tocante à prova dos factos relevantes para efeitos de responsabilidade civil, quer extracontratual - prova da culpa, nos termos do art. 487.º do CC -, quer contratual - prova da situação de incumprimento ou de cumprimento defeituoso da obrigação de tratamento assumida pelo profissional de saúde, nos termos do art. 799º do CC (analisadas por Mafalda Miranda Barbosa, no trabalho intitulado “A jurisprudência portuguesa em matéria de responsabilidade civil médica: o estado da arte”, nos Cadernos de Direito Privado, nº 38, págs. 14 e segs.).
No caso concreto, a causa do decesso da pretensão da A. resulta da conjugação entre a prova positiva de uma actuação médica conforme com a metodologia que as circunstâncias impunham, a par do desconhecimento do real motivo que levou a que um implante que, à partida, dava todas as garantias de qualidade se tivesse esvaziado.
Não sendo possível afirmar o incumprimento de qualquer dever de diligência inscrito nas leges artis concretamente exigíveis, a matéria de facto revela, pela positiva, esse cumprimento em todas as fases, desde a preparação até à intervenção, passando pela informação dos riscos e pelo acompanhamento clínico.
Com efeito, não só a A. foi alertada dos riscos da concreta intervenção, como ainda se apurou que todos agiram de acordo com as regras que na ocasião vigoravam naquela especialidade, cumprindo os deveres de cuidado que as circunstâncias impunham. Em relação a todas as fases se pode afirmar, para contrariar a pretensão da recorrente, que não houve desleixo, nem desatenção, nem imprevidência, nem precipitação, nem práticas agressivas, nem falta de conhecimentos, nem imperícia, nem violação das técnicas mais actualizadas, etc.
Nem mesmo à qualidade dos implantes se pode imputar a causa do incidente. Afinal, nenhum indício foi revelado do que veio a ocorrer dois anos e meio depois de terem sido colocados, obedecendo a níveis de qualidade insuspeita, como a experiência de outras intervenções já o tinha comprovado, ignorando-se se a sua ruptura ocorreu por qualquer razão intrínseca ou se foi provocada por outro fenómeno externo.
Diga-se ainda que o resultado pretendido pela A. foi inicialmente alcançado, mantendo-se até se verificar o referido esvaziamento.
Por conseguinte, constituindo a obrigação contratual médico-cirúrgica uma obrigação de meios, não pode imputar-se ao 1.º R. Z. o seu incumprimento, mesmo dentro dos elevados padrões concretamente exigíveis, de modo que também não lhe poderá ser imputada qualquer responsabilidade pelo resultado lamentável que veio a verificar-se.
Mas ainda que porventura se pudesse considerar que a concreta intervenção cirúrgica traduzira para o cirurgião plástico uma obrigação de resultado, nem assim a conclusão se alteraria, na medida em que todo o circunstancialismo que a rodeou permite afirmar, sem reservas, a ausência de culpa relativamente ao que veio a ocorrer dois anos e meio depois.

3.3.3. Quanto à segunda intervenção cirúrgica, apurou-se essencialmente que:
- Por sua solicitação, a A. foi sujeita a nova intervenção cirúrgica para remoção e substituição de um dos implantes, tendo sido usado implante da mesma marca, por ser a que se mostrava aconselhável; também nesta segunda cirurgia foram utilizadas as técnicas que, à data, eram consideradas as mais adequadas.
- O referido implante foi preenchido com soro fisiológico com volume inferior ao que na primeira intervenção fora inserido no outro, solução justificada pelo facto de já existir uma membrana resultante da formação dos tecidos e de os implantes daquele género perderem volume à razão de cerca de 5% ao ano.
- Depois da segunda intervenção, o seio esquerdo da A. ficou com um volume inferior ao do seio direito, havendo também diferenças em termos de dureza e sensação; mas aquela diferença é de considerar “ligeira a mode­rada”, não sendo sequer notada quando a A. se encontra vestida.
- Sem embargo, a A. ficou desagradada com esse facto, o que lhe causa uma inibição em público, pois tem a desagradável sensação de que toda a gente a observa e nela nota o defeito de duas mamas diferentes.

3.3.4. Também não é possível apreender relativamente a esta segunda intervenção qualquer violação das leges artis exigíveis.
É verdade que, com referência ao resultado, os seios da A. não ficaram totalmente simétricos. Mas esta situação encontra justificação na diversidade de circunstâncias em que ocorrera a primeira implantação no seio direito e a colocação de novo implante no seio esquerdo, dois anos e meio depois.
Por outro lado, posto que existam reflexos subjectivos de tal diferença, em termos objectivos, a mesma é de qualificar como “ligeira ou moderada”, não sendo sequer notada quando a A. se encontra vestida.
Tudo para concluir que também relativamente a esta situação não pode afirmar-se a existência de uma situação de incumprimento ou sequer de cumprimento defeituoso da obrigação de prestação de facto, não relevando para o caso a mera percepção subjectiva da A. relativamente à diferença de volume.
Seja qual for a perspectiva com que se encare a obrigação que nesta segunda ocasião também foi assumida, não se modifica o juízo formulado relativamente à responsabilidade do R. Z..
Com efeito, quanto aos meios empregues, seguindo a técnica adequada, foi aplicado o implante que se mostrava adequado. Até a redução do volume do soro fisiológico encontra justificação aceitável no facto de o outro implante perder paulatinamente uma certa percentagem por cada ano de uso.
Quanto ao resultado, a diferença de volume dos seios, no contexto em que ocorreu, fruto da segunda intervenção, em conexão com a sua qualificação objectiva ou médico-legal e com o facto de nem sequer ser notada quando a A. se encontra vestida, nem sequer assume relevo suficiente para se considerar a existência de incumprimento ou mesmo de cumprimento defeituoso (dentro das leges artis) da obrigação.

IV – Face ao exposto, acorda-se em julgar improcedente a revista, confirmando o acórdão recorrido.
Custas a cargo da recorrente.
Notifique.

Lisboa, 15-11-12

Abrantes Geraldes (Relator)

Bettencourt de Faria

Pereira da Silva