Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
032397
Nº Convencional: JSTJ00004102
Relator: LOPES CARDOSO
Descritores: ULTRAMAR
TRANSGRESSÃO LABORAL
MULTA APLICÁVEL
FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ196801030323973
Data do Acordão: 01/03/1968
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Referência de Publicação: DR IS 1968/01/29, PÁG. 181 - BMJ N º 173, ANO 1968, PÁG. 149
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO.
Decisão: TIRADO ASSENTO.
Indicações Eventuais: ASSENTO DO STJ
Área Temática: DIR CRIM - TEORIA GERAL. DIR TRAB - DIR PENAL LAB.
Legislação Nacional: DLEG 2827 DE 1957/06/05 ARTIGO 115 ARTIGO 218 E ARTIGO 219 ARTIGO 220 PARUNICO ARTIGO 231.
DL 24402 DE 1934/08/24 ARTIGO 28 ARTIGO 31.
DL 43182 DE 1960/09/23.
CPP29 ARTIGO 646 N6 ARTIGO 669.
Sumário :
O paragrafo unico do artigo 220 do Estatuto do Trabalho de Angola, aprovado pelo Diploma Legislativo n. 2827, de 5 de Junho de 1957, determina a aplicação do maximo da multa prevista na alinea e) do artigo 218 do mesmo Estatuto.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

O Ministerio Publico recorreu para o Tribunal Pleno, do acordão da Relação de Luanda proferido em processo de transgressão que moveu contra A pela infracção prevista no paragrafo unico do artigo 220 do Estatuto do Trabalho em Angola.
Invocou oposição entre a interpretação dada pelo acordão recorrido, a esse preceito, e a que, a mesma norma, atribuiu o acordão daquela Relação, de 29 de Outubro de 1965, junto por certidão.
O recurso foi interposto ao abrigo do artigo 669 do Codigo de Processo Penal, ou seja, para se fixar jurisprudencia.
A Secção reconheceu a existencia de oposição e mais condições de seguimento do recurso.
Seguiu-se parecer do Ministerio Publico, que propos se assentasse na doutrina perfilhada pelo acordão de 1965 e, por conseguinte, contraria a seguida pelo acordão recorrido.
Efectivamente, o recurso era de seguir.
O acordão recorrido baseou-se numa interpretação do falado paragrafo unico do artigo 220 do Estatuto do Trabalho segundo o qual esse preceito comina, para a transgressão prevista, o maximo da multa prescrita na alinea do artigo
218 do mesmo diploma correspondente ao numero de pessoas normalmente empregadas pelo infractor: no caso doze.
O acordão de 1965, por seu turno, fundou-se no entendimento de que o dito paragrafo unico decreta o maximo da multa estabelecida no artigo 218, isto e, o maximo da correspondente a quem empregue mais de cinquenta pessoas.
E manifesta a oposição entre as duas soluções.
Por outro lado e visto o disposto no artigo 646, n. 6, do Codigo de Processo Penal, o acordão recorrido, por ter sido proferido em processo de transgressão, não era passivel de recurso ordinario, dando a este nome o alcance que tem no artigo 669 do citado Codigo.
Estão assim verificadas as condições postas pelo mesmo artigo 669 para admissibilidade do recurso.
Ha, pois, que resolver o conflito de jurisprudencia.
Para tanto, convem transcrever os textos legais em causa.
O artigo 218 referido dispõe:
"Os estabelecimentos comerciais ou industriais que não cumprirem os respectivos horarios de trabalho ou as disposições legais relativamente as horas de abertura e encerramento dos serviços, entrada e saida do pessoal, tempos diarios de descanso e descanso semanal serão punidos com as multas seguintes: a) 250 escudos a 500 escudos se as pessoas normalmente ao serviço forem 5 ou menos de 5; b) 500 escudos a 1000 escudos se forem de 6 a 10; c) 1000 escudos a 2000 escudos se forem de 11 a 20; d) 2000 escudos a 5000 escudos se forem de 21 a 50; e) 5000 escudos a 10000 escudos se forem mais de 50".
O artigo 220 declara:
"A contagem do pessoal para efeito das multas previstas nos artigos 218 e 219 devera ser feita segundo as indicações colhidas pela fiscalização nas folhas de ferias ou livros de pagamento do infractor e, quando no mesmo estabelecimento houver horarios diferentes, pelo numero de pessoas sujeitas ao horario transgredido.
Paragrafo unico - Se o infractor se recusar a facultar estes elementos na ocasião do levantamento do auto ou a abrir prontamente a porta do estabelecimento, ser-lhe-a aplicado o maximo da multa prevista no artigo 218".
O preceito transcrito em primeiro lugar e copia do artigo
28 do Decreto-Lei n. 24402, de 24 de Agosto de 1934, que regulamentou, na Metropole, o horario de trabalho, o artigo 220, tambem transcrito, reproduziu o artigo 31 do mesmo Decreto, acrescentando-lhe apenas as palavras finais "prevista no artigo 218".
Deve dizer-se que os mencionados artigos do Decreto-Lei n. 24402 vieram a ser alterados pelo Decreto-Lei n. 43182, de 23 de Setembro de 1960.
E sobre o entendimento atribuido aquelas palavras finais do paragrafo unico do artigo 220 que divergem os dois acordãos da Relação de Luanda.
Tem-se por mais exacta a interpretação que lhes foi dada pelo de 1965.
Na verdade, o paragrafo que as insere pune a recusa em facultar os elementos segundo os quais se ha-de fazer a contagem das pessoas empregadas, para o efeito de determinar a multa aplicavel nos termos das varias alineas do artigo 220, alem da oposição a entrada no estabelecimento, para fiscalização.
A disposição, na sua primeira parte, so pode justificar-se para prevenir a impossibilidade de contagem em face dos ditos elementos.
Explica-se que, para esse caso, o legislador tivesse dispensado a contagem tornada impossivel pela recusa do infractor e sujeitasse este a multa correspondente ao numero maximo de empregados que por tal contagem poderia ser averiguado. Explica-se ainda que, tomada essa base, tivesse levado tal multa ao maximo do respectivo montante, dada a agravação determinada pela rebeldia do recusante.
A mesma explicação tem haver-se sujeitado a pena igual aquela que se recusa a abrir o estabelecimento para apurar se, dentro dele e a porta fechada, se esta cometendo transgressão prevista no artigo 218.
Alias, a expressão do paragrafo unico do artigo 220 "maximo da multa prevista no artigo 218", entendida literalmente, tem de considerar-se reportada ao maximo estabelecido em todo o artigo e não em uma das suas alineas.
So poderia preterir-se o sentido literal do texto se houvesse razões serias para crer que ele traiu o fim do preceito, que não estava em harmonia com o espirito que o ditou.
Ja se apontaram todavia as razões que o legislador deve ter tido em mente ao estabelecer a punição, razões essas que estão perfeitamente de acordo com a letra da lei.
Pelo exposto, assenta-se em que "o paragrafo unico do artigo 220 do Estatuto do Trabalho em Angola, aprovado pelo Diploma Legislativo n. 2 827, de 5 de Junho de 1957, determina a aplicação do maximo da multa prevista na alinea e) do artigo 218 do mesmo Estatuto".
Sem imposto de justiça.

Lisboa, 3 de Janeiro de 1968

Lopes Cardoso (Relator) - H. Dias Freire - Fernando Bernardes de Miranda - Francisco Soares - Adriano Vera Jardim - Jose Cabral Ribeiro de Almeida (Vencido pelas razões indicadas no projecto do acordão que elaborei como relator e entre as quais figuram as seguintes:
Quando no paragrafo unico 220 foi feita referencia ao maximo da multa prevista no artigo 218 quis aludir-se, certamente, ao maximo da multa fixada nas diferentes alineas deste normativo e não somente aos 10000 escudos, maximo indicado na alinea e).
Se assim não fosse, impunha-se que tivesse sido feita expressa referencia ao maximo que figura dessa ultima alinea e tal qual vai passar a entender-se em consequencia do agora decidido.
A opinião que fez vencimento, ressalvado o respeito que merece, fixou uma igualdade que devia ser repelida, atenta a desigualdade cabidamente estabelecida nas diferentes alineas do referido artigo 218.
Afigura-se-nos palpavel não ser acertado punir todas as transgressões, em casos identicos aos dos autos, com a multa fixa de 10000 escudos e não interessar que estivessem normalmente ao serviço ate 5, 10, 20, 50 ou mais de 50 pessoas.
O legislador não deve ter querido uma punição igual e visto que se a desejasse, contrariamente ao que se depreende das referenciadas alineas, te-lo-ia dito por forma a não permitir legitimas duvidas.
Impunha-se a existencia de um assento que determinasse, bem ao contrario, a aplicação do maximo da multa prevista naquele escalão do artigo 18 e que ao caso coubesse.
O entendimento contrario outrossim não e bem conforme aos proprios dizeres do corpo do artigo 220 e visto que nele se alude, alem do mais, "A contagem do pessoal para efeito das multas previstas no artigo 218".
Tudo nos conduz, consequentemente, ao justificado convencimento de que apenas devia ser imposta a multa maxima de 500 escudos, 1000 escudos, 2000 escudos, 5000 escudos e 10000 escudos, conforme tivessem de ser tidas em atenção as correspondentes alineas a), b), c), d) e e) do artigo 218, aplicaveis segundo o numero de pessoas normalmente ao serviço fosse, respectivamente, ate 5, 6 a
10, 11 a 20, 21 a 50 ou mais de 50.
Acresce que os artigos 115 e 231 do mesmo diploma se referem aos minimos que figuram nas faladas alineas daquele artigo 218 e, consequentemente, aos maximos dessas alineas e que se quis referir o paragrafo unico do artigo 220.
Temos como evidente que não existe contradição entre os referenciados preceitos e e tambem certo que, em caso contrario, cumpria harmoniza-los.
Uma vez que o numero de pessoas ao serviço era de 12, não competia aplicar uma multa excedente a 2000 escudos (maximo fixado na alinea c) daquele tantas vezes citado artigo).
As desiguais multas fixadas nas suas diferentes alineas não deviam passar a ser uma e a mesma (maximo apontado na ultima delas) em casos identicos aos dos autos.
Para se poder concluir contrariamente, impunha-se que o legislador tivesse dito no paragrafo unico do artigo 220, ser de impor o montante do maior escalão do artigo 218, o que seria estabelecer uma igualdade que este normativo não consente.
A ser cabido aplicar, sempre, a multa de 10000 escudos, nunca sera ultrapassado o maximo fixado na alinea e) do artigo 218 e que bem podia ser imposto, mesmo que não fosse desrespeitado o paragrafo unico do artigo 220.
Uma vez que se esteja em presença de qualquer das restantes quatro alineas onde se impõem multas de quantitativo bem diferente), visto ser menor o numero de pessoas ao serviço), aqueles 10000 escudos importa serem os respectivos maximos (500 escudos, 1000 escudos, 2000 escudos e 5000 escudos) elevados, respectivamente, 20 vezes, 10 vezes, 5 vezes e 2 vezes, o que o legislador certamente não quis, alem do mais, porque seria estabelecer uma desigualdade que, segundo nosso parecer, não teria uma convincente justificação).
Tem voto de conformidade dos Senhores Conselheiros Gonçalves Pereira, Albuquerque Rocha, Torres Paulo Ludovico da Costa, Joaquim de Melo, Teixeira de Andrade,
Correia Guedes, Santos Carvalho e Oliveira Carvalho, que não assinam por não estarem presentes . - Lopes Cardoso.