Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
393/17.0T8PVZ.P1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO MAGALHÃES
Descritores: RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
ACIDENTE DE VIAÇÃO
RESPONSABILIDADE PELO RISCO
COLISÃO DE VEÍCULOS
DANOS PATRIMONIAIS
RECONSTITUIÇÃO NATURAL
VALOR VENAL
PRIVAÇÃO DO USO DE VEICULO
DANO BIOLÓGICO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
Data do Acordão: 12/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDAS PARCIALMENTE AS REVISTAS
Sumário :
I. A reconstituição natural só se deve considerar excessivamente onerosa para o devedor “quando houver manifesta desproporção entre o interesse do lesado que interessa recompor e o custo que a reparação natural envolve para o responsável”:

II. A mera privação do uso, sem repercussão negativa no património do lesado, não é susceptível de fundar qualquer obrigação de indemnização;

II. Tendo a lesada 33 anos à data do acidente, (e uma esperança de vida aproximada de 50 anos) uma IPG de 15% e um vencimento mensal de €679),considera-se adequada a indemnização pelo dano biológico ( vertente patrimonial ) de € 54.000.

Decisão Texto Integral:

Acordam na 1ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça:


*


AA e mulher BB, e CC, menor, representada pelos primeiros, seus pais, vieram intentar a presente acção contra o Fundo de Garantia Automóvel (representado pelo Instituto de Seguros de Portugal), Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. (atualmente Seguradoras Unidas, SA), e Ageas Portugal, Companhia de Seguros, SA., pedindo a condenação dos réus, solidariamente e/ou proporcionalmente em função da culpa e/ou risco apurado.

Relativamente ao autor AA:

-a procederem à reparação em oficina oficial da marca dos danos sofridos pelo veículo ZO em consequência do acidente ou, em alternativa, a procederem à entrega ao autor de outro veículo idêntico, isto é, que tal como o acidentado satisfaça as suas necessidades, nomeadamente, da mesma marca, modelo, ano, número de quilómetros, cor, estado de uso e conservação, que represente no património do autor o mesmo valor que o ZO;

- a pagarem compensação pela desvalorização comercial do ZO no momento anterior ao embate em 2.000,00€ e, bem assim, indemnização por danos patrimoniais decorrentes da privação do uso do ZO, no valor de 25,00€/dia, desde 22.11.2014 até à data em que o mesmo lhe seja entregue com a reparação referida supra, em quantia global a liquidar ulteriormente, sendo certo que, à data da petição, tal dano se computa em 21.250,00€;

-Ou, subsidiariamente, a pagarem ao autor a quantia de 11.000,00€, correspondente ao custo da reparação do veículo sinistrado e da desvalorização comercial, bem assim, a quantia de 25,00€ por cada dia de imobilização, desde a data do acidente até ao pagamento daquelas quantias, o que tudo perfaz, na data da petição, a quantia global de 32.250,00€; 2.1.4: pagarem a quantia de 15.210,00€, respeitante aos restantes danos patrimoniais e não patrimoniais.

Relativamente à autora CC:

-a pagarem a quantia de 5.000,00€ como indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais, sofridos à data do acidente, acrescida de juros legais desde a citação.

Relativamente à autora BB:

- A pagarem a quantia 106.799,17€ como indemnização por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos e apurados até à data da petição, acrescidos dos juros legais desde a citação;

- A pagarem a quantia a apurar em liquidação de execução de sentença, relativa à I.P.P., com a inerente perda de vencimento e todas as demais despesas, sendo certo e previsível o agravamento dos mesmos (dano futuro) e, bem assim, previsível a necessidade de realizar intervenção cirúrgica para correção das lesões já́ verificadas.

Fundamentando o peticionado, alegam:

Relativamente ao acidente, que no dia 22.11.2014, pelas 18H10, ocorreu um acidente, ao quilómetro .......50 da A..., sentido P.../P..., no qual foram intervenientes: um ligeiro de passageiros de matrícula e condutor desconhecidos; o ligeiro de passageiros matrícula ..-..-ZO, propriedade do autor e por ele conduzido; o ligeiro de passageiros matrícula EQ-..-.., seguro na ré “Tranquilidade”, propriedade de DD e por ele conduzido; e o veículo ligeiro de passageiros matrícula ..-HJ-.., seguro na ré “Ageas”, propriedade de A..., Lda. e conduzido por EE.

O autor circulava no ZO, acompanhado das autoras, as quais seguiam no banco de trás (a autora CC sentada no baby coque aí instalado), pela faixa direita da A..., a velocidade não superior a 100 Km/hora, quando um veículo de matrícula e condutor desconhecido, que seguia no mesmo sentido, mas na faixa esquerda, pretendendo sair para ..., se atravessou à frente do ZO, pisando a linha contínua, sem sinalizar a manobra nem diminuir a velocidade. Tal actuação provocou a travagem do ZO que entrou em despiste, vindo a ficar imobilizado junto ao separador central, em sentido contrário ao que seguia, enquanto o veículo de condutor desconhecido seguiu o seu destino. Imobilizado nesses termos e não tendo conseguido colocar o ZO em circulação, o autor e a autora BB apenas tiveram tempo de acionar a luz avisadora de perigo, retirar a filha CC do veículo e instalar o triângulo de sinalização na frente do ZO.

No entanto, o veículo EQ, que seguia a velocidade não inferior a 140 km/hora e em perseguição e/ou disputa com um outro veículo à sua frente (o qual conseguiu desviar-se do ZO), embateu com a sua frente na frente do ZO. Atingiu o pé́ esquerdo do autor, o qual se encontrava a cerca de 3 ou 4 metros do ZO, e, ato contínuo, ao embater no ZO, arrastou-o contra o separador central, danificando-o, e contra a autora BB, a qual se encontrava junto àquele, no exterior, arrastando o corpo daquela pelo chão até ao separador central. Em consequência, a autora BB ficou presa sob os DPM do separador central, mais concretamente, debaixo do ZO, até ao umbigo, com a cabeça encostada ao pneu direito traseiro e as duas pernas debaixo dos DPM do separador central. Após o embate, o EQ ficou imobilizado no eixo da via, começando a incendiar-se.

Ao embate do EQ seguiu- se, passados alguns segundos, o embate do HJ no EQ (atravessado em cima da linha contínua separadora das vias de trânsito), o qual volta a embater no ZO, desta vez na parte dianteira lateral esquerda.

Quanto aos danos:

Do acidente, resultaram danos materiais para o veículo ZO e corporais para os autores, particularmente graves para a autora BB.

Em consequência do acidente, o veículo ZO sofreu danos na parte dianteira e traseira, que importarão a necessidade de reparação. Desde a data do acidente – 22.11.2014 – o autor está privado da utilização do ZO e, como a sua mulher, teve de se socorrer de transportes alternativos para as suas deslocações pessoais, familiares, profissionais, mas, sobretudo, deslocações aos hospitais, para as consultas de fisioterapia da autora BB.

O autor AA sofreu lesão com dor no joelho, perna e pé́ esquerdo. Desde a data do acidente que apresenta dor recorrente, que lhe dificulta a mobilidade articular, na flexão e extensão, e dor no pé́ esquerdo, inchaço e dormência, que lhe limita a mobilidade das articulações, prejudicando a marcha, tendo dificuldade em calçar-se e em caminhar. Em particular, o drama e a aflição vivido pelo autor ao ver a sua mulher a ser violentamente embatida, tendo receado imediatamente pela sua morte ao vê-la encarcerada, sem sentidos, sem responder aos seus estímulos, ao ver-se sozinho e sem saber a quem auxiliar, se à sua mulher, se à sua filha, visivelmente assustada e necessitada de colo, calor e conforto justificam a atribuição de uma compensação pelos danos não patrimoniais sofridos.

A autora CC, que era transportada no baby coque, no banco de trás do ZO, sofreu danos corporais na sequência do despiste do veículo, sendo de seguida retirada do carro pela mãe, e colocada no meio do separador central da A..., facto que permitiu que não tivesse sofrido mais quaisquer lesões, para além das discriminadas: apresenta reflexos vivos, tórax sem hematomas visíveis, sem SDR, ACP normal, sem marcas de cinto, abdómen mole e depressível, sem sinais de irritação peritoneal, sem hematomas e com boa mobilidade dos 4 membros, mas apresentado, porém, um torcicolo com contratura à direita pós-acidente de viação, que não cede a medidas conservadoras, aliás posteriormente confirmado pelo seu médico de família, que a indicou para fisioterapia, justificando-se que seja indemnizada pelos danos patrimoniais presentes e uma indemnização pelos não patrimoniais.

Por sua vez, a autora BB sofreu várias lesões, foi sujeita a vários exames e esteve hospitalizada, apresentando ainda limitação funcional, dores, diminuição da mobilidade do joelho e tornozelo esquerdo e tíbia vara à esquerda, particularmente, claudicação da marcha por dor ao nível do tornozelo e das lesões resulta como previsível a necessidade de uma intervenção cirúrgica. Acresce que a autora precisou de ajuda doméstica de terceira pessoa, apresentando também dores, incapacidade e dependência e ficou com cicatrizes em várias partes do corpo, nomeadamente na cara. Desde a data do acidente que esteve impedida de trabalhar, apenas tendo regressado ao trabalho em 4 de fevereiro de 2016. Não pode conduzir, não pode mais usar sapatos de tacão alto, correr, saltar e/ou praticar atividades físicas com impacto, nem sabe se não terá́ de usar sempre sapatos adaptativos especiais.

Regularmente citados, todos os réus vieram contestar.

Contestou o Fundo de Garantia Automóvel, alegando que estão em causa três acidentes de viação. Em primeiro lugar um acidente que se consubstanciou no despiste em que interveio apenas o ZO. Só depois de decorrido um hiato de tempo considerável é que vieram a suceder os outros dois embates. Nenhuma responsabilidade poderá́ ser assacada ao réu pelos danos sofridos com os acidentes de viação ocorridos em segundo e terceiro lugar. Mais impugna a factualidade no que respeita à intervenção, no primeiro acidente, de um veículo de matrícula e condutor desconhecido se refere, bem como os danos invocados.

Contestou a ré “Seguradoras Unidas” alegando que o acidente ocorreu em circunstâncias diferentes. Refere que o condutor do EQ circulava a velocidade não superior a 90 Km/hora. Na altura o trânsito era intenso. À sua frente e igualmente pelo corredor de trânsito da esquerda circulava um outro veículo cujo condutor, subitamente, guinou para a direita. Nessa altura, deparou-se ao condutor do EQ o veículo ZO, imobilizado no corredor de trânsito da esquerda, com a parte lateral direita embatida contra os railes e com a frente voltada para ..., sem qualquer tipo de sinalização ou luz que assinalasse a sua presença. Na frente do ZO, em plena faixa de rodagem, encontrava-se um vulto a gesticular que mais tarde se veio a saber ser o autor. O condutor do EQ acionou de imediato os órgãos de travagem do veículo e tentou desviá-lo para a direita, atento o seu sentido de marcha. No entanto, apesar de ter conseguido evitar o embate frontal no autor AA, foi-lhe impossível evitar embater no mesmo de raspão e, bem assim, na frente do ZO. Após o embate, o condutor do EQ saiu do veículo e tratou de ajudar a sua filha que viajava no banco traseiro a abandonar também o EQ. Entretanto, a mulher do condutor do EQ que viajava no lugar da frente ao lado do condutor também abandonou o veículo. Estando todos fora do veículo dirigiram-se para junto do separador central, tendo o condutor do EQ começado a alertar o trânsito para o sucedido através de gestos. Após vários veículos se terem desviado do local onde os veículos EQ e ZO se encontravam embatidos, o EQ foi embatido na traseira pelo veículo HJ, cujo condutor não atentou na sinalização do condutor do EQ nem nos veículos EQ e ZO imobilizados. Com o embate o EQ foi projetado contra a frente do ZO que recuou, acabando por se imobilizar entre os dois corredores de trânsito da A 28, com a parte da frente voltada para o separador central. Mais alega que na altura do embate entre o EQ e o ZO a autora BB encontrava-se junto à traseira do ZO. Por forca do embate do EQ no ZO e, posteriormente, do embate do HJ que projetou o EQ novamente contra o ZO, ficou presa entre este e os railes. Conclui que a existir responsabilidade do condutor do EQ, a mesma terá́ de ser repartida com os condutores do ZO e do HJ e, eventualmente, com o condutor do veiculo que os autores alegam ter sido o causador do despiste e, em relação aos ferimentos e lesões que se venha a apurar, o caso cairá ainda sob a alçada do artigo 570 do C.Civil; quanto aos eventuais danos que se venham a demonstrar em relação à menor CC, a ré não responderá por eles porque não foram consequência do embate do EQ no ZO.

Contestou a ré “Ageas”, impugnando, na sua generalidade, a versão do acidente, bem como os danos invocados. Alega que quando chegou ao local do acidente e colidiu com o EQ, o condutor do HJ já́ não se deparou com sinais de perigo colocados na frente do ZO, bem como com os resultantes da iluminação do ZO, porquanto os mesmos haviam sido removidos e/ou avariados pelo embate do EQ no ZO. O condutor do HJ foi surpreendido por vários veículos e pessoas espalhados por toda a faixa de rodagem, sendo que o EQ estava parado atravessado na linha delimitadora contínua que dividia as duas faixas de rodagem do sentido norte/sul, cortando completamente a linha de trânsito do condutor do HJ.

Foi proferido despacho saneador, no qual se procedeu à fixação do objeto do litígio [“Saber se o sinistro é imputável aos condutores dos veículos segurados nas rés seguradoras e ao condutor do veículo desconhecido e dele decorreram danos para os autores que devam ser indemnizados pelos réus a título de responsabilidade civil por acidente automóvel”] e à enunciação dos temas da prova [“- Circunstâncias de modo/causa do embate. - Imputação do embate aos condutores dos veículos segurados nas rés seguradoras / ao condutor do veículo desconhecido / ao autor. - Danos sofridos pelos autores. - Nexo de causalidade entre o embate e os danos”].

Procedeu-se a julgamento com observância do legal formalismo, como da respetiva ata consta e foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Em face do exposto, julgo a presente acção totalmente improcedente por não provada e, em consequência, absolvo as rés do pedido contra elas formulado. Custas pelos autores - art. 527, n.ºs 1 e 2, do CPC - sem prejuízo do benefício de protecção jurídica que lhes foi concedido”.

Inconformados, os autores vieram apelar e, pedindo a revogação do decidido, pretendem que se declare a) A responsabilidade exclusiva das rés Seguradoras Unidas, S.A. e Ageas, S.A. pelo acidente dos autos, com base em culpa dos condutores dos veículos EQ e HJ, ou, assim não se entendendo, o que por mera hipótese académica se admite, b) A concorrência de culpas entre os condutores dos veículos EQ e HJ, e o autor AA, na proporção de 80% para os condutores do EQ e HJ e de 20% para o autor AA, c) Tudo, com as demais consequências, fixando-se, equitativamente, os valores indemnizatórios devidos aos autores, pelos danos patrimoniais e não patrimoniais alegados e provados.

A ré Ageas-Portugal – Companhia de Seguros, SA respondeu ao recurso, considerando que bem esteve o tribunal recorrido em concluir que apenas o autor marido teve culpa na produção do sinistro, e apenas ambos os autores, marido e mulher, tiveram responsabilidade nas lesões corporais que vieram a sofrer na sequência do mesmo. Como tal, a sentença encontra-se irrepreensivelmente fundamentada, denotando-se uma cuidada análise da prova produzida, assim como uma corretíssima aplicação da lei aplicável, tanto das regras estradais, como do instituto da responsabilidade civil extracontratual.

A ré Seguradoras Unidas, SA, igualmente respondeu ao recurso.

A Relação proferiu acórdão que rematou com o seguinte dispositivo:

“Em conformidade com quanto ficou dito, acorda-se na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto em julgar parcialmente procedente o recurso e, em conformidade, revogando a decisão recorrida na parte em que absolveu as recorridas do pedido formulado pelos autores, mas absolvendo-as do pedido formulado em representação da criança CC condenam-se as mesmas nos seguintes termos:

1 – A recorrida Seguradoras Unidas, SA no pagamento ao autor AA da quantia de 3.100,00€ (três mil e cem euros), sendo devidos juros desde a citação e à taxa legal sobre a quantia de 100,00€ e desde a presente ocasião sobre o montante restante.

2 – Ambas as recorridas Seguradoras Unidas, SA e Ageas Portugal, Companhia de Seguros, SA, solidariamente, no pagamento ao autor AA da quantia de 34.333,70€ (trinta e quatro mil, trezentos e trinta e três euros e setenta cêntimos), a que acresce, se necessário a liquidar em incidente próprio, o montante diário de 12,00€ (doze euros) até entrega do valor correspondente ao custo de reparação do veículo e a que acrescem juros, à taxa legal, desde a citação e do vencimento das prestações.

3 - Ambas as recorridas Seguradoras Unidas, SA e Ageas Portugal, Companhia de Seguros, SA, solidariamente, no pagamento à autora BB da quantia de 63.504,30€ (sessenta e três mil, quinhentos e quatro euros e trinta cêntimos), a que acrescem juros desde a presente ocasião sobre a quantia de 58.000,00€ (cinquenta e oito mil euros) e desde a citação sobre a quantia restante.

Custas, da ação e do recurso, pelas rés e pelos autores, na proporção dos seus decaimentos.”

Inconformada, veio a ré Ageas interpor recurso de revista, que rematou com as seguintes conclusões:

1.º- A ora Recorrente, salvo o devido respeito, não pode concordar com o decidido pelo douto Acórdão proferido a fls. ... dos presentes autos, quer no que diz respeito à responsabilidade pela eclosão do acidente em apreço nos autos, quer no que concerne aos montantes arbitrados a título indemnizatório.

2.º- Motivo pelo qual, vem o presente recurso interposto do douto Acórdão a fls. …, que julgou parcialmente procedente o recurso interposto pelos Autores, revogando a douta sentença proferida pela 1.ª Instância e, nessa medida, condenando as ali Recorridas Ageas Portugal – Companhia de Seguros, S.A. e Seguradoras Unidas, S.A., solidariamente, no pagamento ao Autor AA da quantia de €34.333,70, acrescida do valor de€ 12,00diários até entrega da quantia correspondente ao custo de reparação do veículo, à qual acrescem juros desde a citação, e, ainda, no pagamento à Autora BB do valor de € 63.504,30, ao qual igualmente acrescem juros desde a prolação do Acórdão sobre a quantia de € 58.000,00 e desde a citação sobre o remanescente

3.º- No entendimento da ora Recorrente, no presente caso, e sempre com o devido respeito

que é muito, existiu clara violação da lei substantiva, assim como, erro de aplicação e determinação da norma aplicável, para efeitos do disposto no artigo 674.º n.º 1 alínea a) do CPC.

4.º - Pelo que, a manter-se o Acórdão proferido pela Veneranda Relação, existirá uma clara violação e errada aplicação do disposto nos artigos 3.º n.º 2 e 24.º, n.º 1 do CE; 41.º, n.º 1 e 3 do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto; e 483.º, 496.º; 566.º, n.º s 1 e 3; e 570.º todos do CC.

5.º- Com efeito, no que concerne à responsabilidade, a ora Recorrente entende que, face à matéria de facto considerada como provada, não pode ser assacada qualquer culpa ao condutor do veículo por si seguro.

6.º- Aliás, foi com base foi com base na referida matéria de facto que a 1.ª Instância atribuiu aos Autores a culpa exclusiva pela eclosão do acidente dos presentes autos, absolvendo as Seguradoras dos veículos EQ e HJ dos pedidos formulados.

7.º- A verdade é que, da matéria dada como provada e supra referida, não se extrai a culpa, ainda que parcial, dos condutores dos veículos EQ e HJ (este último seguro na ora Recorrente).

8.º- De facto, resultou claro da matéria de facto considerada como provada pela 1.ª Instância, e que não foi posta em crise pelos Autores em sede de Apelação, que estes foram os únicos e exclusivos responsáveis pelo acidente dos autos e pela extensão dos danos daí decorrentes.

9.º- Não obstante, entendeu a Veneranda Relação do Porto que os condutores dos veículos EQ e HJ violaram o disposto no artigo 24.º, n.º 1 do CE e, nessa medida, foram os responsáveis pelo acidente em apreço nos autos.

10.º Sucede que, não resultou provado qualquer facto capaz de levar a crer que o condutor do veículo HJ, seguro na ora Recorrente, circulava a uma velocidade inadequada face à presença de outros utilizadores, às características e estado da via e do veículo, às condições meteorológicas ou ambientais, à intensidade do trânsito e a quaisquer outras circunstâncias relevantes. Da mesma forma que não resultou provado qualquer facto capaz de levar a crer que o condutor do veículo HJ, seguro na ora Recorrente, não guardou a distância necessária a uma condução em segurança.

11.º- Aliás, refira-se que, não resultou sequer da factualidade considerada como provada nos autos a velocidade a que circularia o veículo seguro na ora Recorrente, nem a distância a que o mesmo circulava em relação a quaisquer outros veículos.

12.º- Consequentemente, não dispunha a Veneranda Relação de factualidade que permitisse concluir que o condutor do veículo HJ, seguro na ora Recorrente, circularia a uma velocidade desadequada face às circunstâncias (de intenso tráfego e chuva) e sem manter a devida distância de segurança dos restantes veículos que circulavam na faixa de rodagem.

13.º- Aliás, diga-se de passagem, que, nos presentes autos não ficou provado qualquer facto

capaz de imputar a responsabilidade, ainda que em parte, ao condutor do veículo HJ, seguro na ora Recorrente, porquanto, o mesmo nada poderia ter feito para evitar o embate.

14.º- Resultou inclusivamente provado no ponto 1.118 da douta Sentença recorrida que “Quando chegou ao local do embate, o condutor do HJ já não se deparou com o triângulo que o autor havia colocado na via.”. Tendo resultado também provado, no ponto 1.119 da douta Sentença recorrida, que “Quando o condutor do HJ chegou com o seu veículo ao local, deparou com os veículos ZO e EQ a ocuparem parcialmente a faixa de rodagem, o ZO a ocupar a faixa da esquerda e o EQ atravessado em cima da linha contínua separadora das duas faixas.”.

15.º-Ora, com base nos factos supra transcritos, resulta evidente que, estando o condutor do veículo HJ a circular numa autoestrada, de noite, a chover, e sem qualquer sinalização que alertasse para a presença dos veículos ZO e EQ imobilizados e a ocuparem mais de metade da faixa de rodagem, o condutor do veículo HJ nada poderia ter feito para evitar o embate do seu veículo no veículo EQ, porquanto, quando se apercebeu do sucedido já não havia tempo, nem espaço, para fazer o que quer que fosse.

16.º- Refira-se que, independentemente de considerarmos que o veículo ZO representou uma invasão da faixa de rodagem para os condutores dos veículos EQ e HJ (conforme entendimento da 1.ª Instância) ou um obstáculo na via (segundo o entendimento da Veneranda Relação), certo é que, não é razoável, exigir aos utentes das autoestradas que adequem a sua condução à possível existência de obstáculos na via de circulação, sendo certo que, a verificar-se, essa será uma situação de todo extraordinária e que deverá estar devidamente sinalizada, nos termos previstos no Código da Estrada.

17.º- Assim, nunca se poderia exigir que o condutor do veículo HJ, que, repita-se, conduzia numa autoestrada, sem qualquer aviso nesse sentido, regulasse a sua velocidade de modo a conseguir imobilizar o veículo por si conduzido caso viesse a deparar-se com veículos anteriormente acidentados a ocuparem grande parte da faixa de rodagem.

18.º- Concluindo-se assim que, não foi a velocidade que o condutor do veículo HJ imprimia ao mesmo, nem a distância a que este circulava dos restantes veículos, a causa do embate do veículo HJ no veículo EQ.

19.º- Ademais, e no que concerne ao nexo causal entre o evento e os danos, importa acrescentar que, no presente caso, além do despiste do veículo ZO sem causa justificativa e, portanto, da imperícia na condução do mesmo por parte do Autor AA, ora Recorrido, sempre teremos de ter em conta, no que aos danos alegados pelos ora Recorridos diz respeito, que o Recorrente AA e a Recorrente BB contribuíram para a verificação dos mesmos a partir do momento em que colocaram a menor CC no interior do separador central da autoestrada e permaneceram, sem qualquer razão justificativa, na faixa de rodagem, bem sabendo o perigo que daí advinha.

20.º - Assim, e perante tal conduta, muito se estranha que a Veneranda Relação tenha entendido que o condutor do veículo ZO, ora Recorrido, e, bem assim, a Recorrida BB não tenham violado o disposto no artigo 3.º, n.º 2 do CE.

21.º- De facto, face à factualidade apurada nos presentes autos, resta apenas concluir, como concluiu o douto Tribunal de 1.ªInstância, que o comportamento do Autor AA, ora Recorrido, no momento do despiste, e após o mesmo, e o comportamento da Recorrida BB, atento o facto de terem decidido manter-se apeados em plena faixa de rodagem (sublinhe-se que o acidente ocorreu num autoestrada), e não procurando, qualquer um deles, colocar-se em segurança (à semelhança do que fizeram com a menor CC), salvo melhor opinião, não corresponde à conduta que um peão medianamente diligente, sagaz, competente e capaz adotaria, caso se encontrasse na situação daqueles no momento do acidente.

22.º- Pelo que, pode asseverar-se que o acidente foi causado pela atuação única e exclusiva dos Autores, não impendendo sobre a ora Recorrente qualquer obrigação de indemnização.

23.º- Desta forma, face ao supra explanado, não se encontram verificados todos os pressupostos da responsabilidade civil subjetiva, devendo a ora Recorrente ser absolvida dos montantes a que foi condenada a pagar aos ora Recorridos, sob pena de, a manter-se tal decisão, estarmos perante uma clara violação e errada aplicação das normas previstas nos artigos 3.º n.º 2 e 24.º, n.º 1 do CE e nos artigos 483º e 570.º do CC.

24.º- Ainda que assim não se entenda, sempre terá de se ter em conta, a existência de uma concorrência de culpas, na proporção de 80% para os Autores, 10% para o condutor do veículo EQ e 10% para o condutor do veículo HJ, seguro na ora Recorrente.

Ora,

25.º - Dispõe o artigo 570.º, n.º 1, do CC que “quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.”.

26.º- Pelo que, a existir alguma obrigação por parte da ora Recorrente em indemnizar os ora Recorridos, o que não se admite e apenas por cautela de patrocínio se acautela, tal indemnização sempre deverá ser reduzida, atendendo-se a um valor abaixo do valor dos danos efetivamente sofridos, devido à circunstância dos Recorridos terem contribuído, de forma irreparável, para o resultado que se veio a verificar.

27.º- Refira-se que, o Recorrido AA sempre poderia ter tentado avisar os restantes condutores da imobilização do veículo ZO, ainda que através de gestos, no interior do separador central, de forma segura. O que optou por não fazer, tendo permanecido deliberadamente na faixa de rodagem da autoestrada, de noite e na via da esquerda.

28.º- O mesmo se diga da Recorrida BB, que, tendo tido a possibilidade de permanecer dentro do separador central, em segurança, junto da sua filha bebé, decidiu manter-se, imprudentemente, em plena faixa de rodagem da autoestrada, de noite, após o despiste do veículo onde circulava.

29.º- Pese embora não se conheça (na medida em que não resultou provada) a concreta razão pela qual a Recorrida BB decidiu permanecer na autoestrada, a verdade é que sabemos que aí decidiu manter-se, nas circunstâncias já referidas nos autos, designadamente, de noite e com chuva, tendo sido essa decisão a única causa dos danos que veio a sofrer.

30.º- Aliás, atente-se que, no que diz respeito à filha bebé, que os Recorridos colocaram, e bem, dentro do separador central, esta não sofreu qualquer dano corporal decorrente do embate do veículo EQ no ZO e, posteriormente, do embate do veículo HJ no EQ, o que apenas demonstra que os ora Recorridos, se tivessem optado por permanecer junto da filha bebé, dentro do referido separador, não teriam sofrido qualquer dano.

31.º- Assim sendo, não poderá aceitar-se, de forma alguma a conclusão de que os Autores, ora Recorridos, não tiveram nenhuma culpa na produção dos danos que vieram a sofrer.

32.º- Sendo certo que, repita-se, perante as circunstâncias fácticas que rodearam o acidente, salvo melhor entendimento e com o devido respeito, que é muito, entende a ora Recorrente que andou mal a Veneranda Relação ao atribuir a exclusiva responsabilidade pela produção dos danos aos condutores dos veículos EQ e HJ, tendo o Acórdão recorrido violado a boa aplicação das normas previstas nos artigos 3.º n.º 2 e 24.º, n.º 1 do CE e os artigos 483º e 570.º do CC.

33.º- Sem prejuízo do supra exposto quanto à responsabilidade, entende ainda a ora Recorrente que a Veneranda Relação andou mal na atribuição dos montantes indemnizatórios aos ora Recorridos. Vejamos então.

34.º- Nos termos do douto Acórdão proferido, foi a ora Recorrente condenada, solidariamente com a Seguradora do veículo EQ, a pagar ao ora Recorrido o montante de € 8.761,70, correspondente ao valor necessário à reparação do veículo ZO, e, ainda, o montante de € 25.572,00, à razão de € 12,00 por dia, continuando a mesma a vencer-se, diariamente, até pagamento ao Autor do valor correspondente à reparação do veículo.

35.º- Ora, a ora Recorrente, além de não concordar com a condenação no valor da reparação do veículo ZO, porquanto, resultou provado que o mesmo ficou em situação de perda total, discorda totalmente do valor atribuído ao ora Recorrido a título de privação do uso, entendendo, com o devido respeito, que tal montante afigura-se totalmente descabido perante a realidade fáctica em apreço nos autos, representando um claro enriquecimento do lesado – ora Recorrido – à custa do evento lesivo, in casu, o acidente dos autos.

36.º- Aliás, não podemos deixar de referir que o montante atribuído a título de privação é mesmo três vezes superior ao valor da reparação do veículo ZO, o que, por si só, demonstra o exagero na sua fixação.

37.º- As Seguradoras dos veículos EQ e Hj não deveriam ter sido condenadas no pagamento do valor orçamentado para a reparação do veículo ZO, porquanto, a referida reparação afigurava-se manifestamente onerosa, face ao valor venal da viatura.

38.º- Ademais, refira-se por relevante que, tendo sido o veículo ZO considerado como perda total e tendo havido, por parte da Seguradoras Unidas, S.A., uma proposta de indemnização da referida perda total, não deveria ter havido lugar a qualquer indemnização a título de privação do uso.

39.º- Sendo certo que, no que concerne ao tema da privação do uso do veículo, sempre se dirá que existe Jurisprudência com entendimento diverso do adotado pelo douto Acórdão recorrido, nomeadamente, que entende ser necessária a prova concreta dos efetivos prejuízos e danos causados por tal privação (de que são exemplos o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 13/03/2007 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 08/06/2006.

40.º- Ora, no caso dos autos a ora Recorrente entende que tal prova não foi conseguida por parte dos Autores.

41.º- Ora, até poderemos admitir que exista Jurisprudência que entenda que não será de exigir a prova de danos efetivos e concretos (situação vantajosa frustrada/teoria da diferença), mas a verdade é que a ressarcibilidade também não pode ser apreciada e resolvida em abstrato, aferida pela mera impossibilidade objetiva de utilização da coisa (independentemente de que a utilização tenha ou não lugar durante o período de privação), emergindo como critério de atribuição do direito à indemnização a demonstração no processo que, não fora a privação, o lesado usaria normalmente a coisa, vendo frustrado esse propósito.

42.º- Sendo certo que, o protelamento da situação da privação, para além de um período razoável face às regras da boa fé, em termos de se considerar “culposa” a inércia do lesado, justifica uma repartição do dano global, com a inerente redução do respetivo montante indemnizatório, fundada no concurso de facto do lesado para o agravamento do dano (artigo 570.º, n.º 1 do CC).

43.º- Assim, de outra forma não se poderá concluir que não de que houve, da parte do ora Recorrido, um agravamento dos agora alegados danos, ao permanecer – entre a data em que lhe foi comunicada a situação de perda total do veículo e o respetivo valor venal do mesmo e a presente data – inerte perante a discordância face a decisão já tomada de perda total do veículo ZO.

44.º- Acresce que, ainda que assim não se entenda, sempre se dirá que, o valor diário arbitrado pela Veneranda Relação afigura-se manifestamente excessivo, por violação ao critério de equidade estabelecido no n.º 3 do artigo 566.º do CC.

45.º- Veja-se a este respeito, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 10/09/2013, no qual se refere “Recorrendo aos critérios jurisprudenciais que têm vindo a ser seguidos em casos como o do autos em que a indemnização devida ao lesado pela paralisação diária de um veículo deverá ser ponderada à luz de critérios de equidade – de que constituem exemplos o Ac. do STJ de 09.03.2010, em que o valor considerado foi de €10,00 euros diários; o Ac. da Rel. do Porto de 07.09.2010 em que se considerou também o valor de €10,00 euros por dia de paralisação, o acórdão da Relação de Coimbra, de 02.03.2010 no qual foi fixada a quantia de € 8,00 por dia de privação, e, ainda, o Ac. da Rel. de Coimbra de 06-03-2012 no qual foi considerada também a quantia de €10,00 por dia, todos eles disponíveis em www.dgsi.pt – entendemos que peca, por excesso, a indemnização a esse respeito fixada na sentença (€ 7.481,29), por corresponder a uma quantia diária que rondará a de € 20,49/dia, muito superior aos parâmetros jurisprudenciais que vêm sendo seguidos para situações similares. (negrito nosso).

46.º- Pelo que, resta concluir que o valor arbitrado foi estabelecido sem qualquer fundamento ou prova e em clara violação dos critérios de equidade, tendo existido, no douto Acórdão recorrido, clara violação e errada aplicação das normas previstas nos artigos 41.º, n.º 1 e 3 do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto e 483.º, 566.º, n.º 1, 566.º, n.º 3 e 570.º todos do CC.

47.º-De igual forma, também os montantes atribuídos à Recorrida BB a título de dano biológico e de danos não patrimoniais pecaram por excesso.

48.º- Efetivamente, no entender da ora Recorrente o douto tribunal de que se recorre, não cuidou de fazer uma correta interpretação e consequente aplicação do disposto nos artigos 494.º, 496.º, 562.º, 563.º e no n.º 3 do artigo 566.º do CC, desconsiderando as regras da prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das circunstâncias do caso concreto.

49.º-De harmonia com a jurisprudência, a ressarcibilidade do dano biológico – representado pelas limitações funcionais relevantes e por sequelas psíquicas graves – visa compensar o lesado, para além da presumida perda de rendimentos associada ao grau de incapacidade de que é portador, também da inerente perda de capacidades e competências, mesmo que essa perda não esteja imediata e totalmente refletida ao nível do rendimento auferido.

50.º- A reparabilidade deste dano não oferece dúvidas. Árduo é o saber a que parâmetro deve obedecer a determinação do quantum da indemnização dirigida a essa reparação.

51.º - O critério geral para a atribuição da respetiva indemnização é o da equidade (artigo 566.º n.º 3 do CC) e o princípio da uniformidade (artigo 8.º n.º 3 do CC), com apelo aos casos análogos da jurisprudência.

52.º- É claro que tratando-se de avaliar um dano que decorre de um défice ou de uma incapacidade permanente compatível com o exercício de uma atividade profissional, designadamente, com aquela que a vítima exercia ao tempo da lesão, aquele critério deve ser objeto de adequada ponderação e equidade.

53.º- Na verdade, caso se conclua que a Autora terá direito a uma indemnização, não se discute o direito, mas apenas a extensão desse direito, isto é o quantum da indemnização devida como reparação do dano patrimonial, causado por aquele défice funcional, que a atingiu.

54.º-E, face à prova produzida nos autos, é indiscutível a reparabilidade deste dano, no entanto, no caso dos autos, atenta a matéria factual considerada como provada, julga-se equitativa, no entender da Recorrente, a indemnização dirigida para a reparação desse dano em € 20.000,00 e não a quantia de € 33.000,00 fixada pela Veneranda Relação.

55.º- Assim, entende a ora Recorrente que a indemnização atribuída a título de dano biológico foi exagerada e desproporcional, devendo ser tal montante reduzido para o valor de € 20.000,00, por forma a que seja feita uma correta aplicação de todos os princípios que regem a correta atribuição duma indemnização desta natureza.

56.º- De igual forma, a ora Recorrente não pode (de todo) aceitar o valor de € 25.000,00 atribuído a título de danos não patrimoniais, que se reputa de manifestamente excessivo face aos danos concretamente sofridos pela Recorrida e, repita-se, face à sua contribuição para a extensão dos mesmos.

57.º - A ora Recorrente não rejeita que a ora Recorrida tenha sofrido danos não patrimoniais que, atenta a sua gravidade, são merecedores da tutela do Direito, ao abrigo do artigo 496.º, n.º 1 do CC. No entanto, para o cômputo da indemnização, além dos danos sofridos pela Autora, sempre terá de ser analisado “o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso...”, temperado por um juízo de equidade (artigos 494.º e 496.º/3 do CC).

58.º- Salvo o devido respeito por melhor opinião, perante o quadro fáctico em causa nos autos, a indemnização fixada a título de danos não patrimoniais mostra-se manifestamente excessiva, especialmente, quando confrontada com outros casos análogos e dos quais constituem exemplo (entre muitos outros encontrados): i) Acórdão da Relação de Coimbra, de 06/03/2012 (processo 1679/04.0...); ii) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 5 de Fevereiro de 2004; e iii) Acórdão de 15 de Março de 2012, proc. 4730/08.0...

59.º- No caso dos autos, a compensação a atribuir à Recorrida por danos não patrimoniais terá de ser consideravelmente menor, porque menor é o dano desta comparativamente com os casos dos Acórdãos supra identificados.

60.º- Sendo certo que, face às circunstâncias deste caso em concreto, entende a Recorrente que a indemnização fixada para indemnização por danos não patrimoniais da Recorrida deve ser corrigida, devendo a mesma ser reduzida para um valor mais justo e equitativo, o qual não deverá exceder o montante de € 10.000,00, sob pena de violação do artigo 496.º do CC.

61.º- Nesta medida, e por qualquer dos fundamentos supra expostos, deverá ser dado provimento ao presente recurso, sendo revogado o douto Acórdão recorrido, sob pena de violação das normas previstas nos artigos 3.º n.º 2 e 24.º, n.º 1 do CE; 41.º, n.º 1 e 3 do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto; e 483.º, 496.º; 566.º, n.º s 1 e 3; e 570.º todos do CC.

62.º- Nessa medida, por tudo quanto se encontra exposto, e ressalvando novamente o devido respeito, que é muito, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, sendo o douto Acórdão recorrido revogado e substituído por outro que conclua da mesma forma como concluiu, e bem, o Tribunal de 1.ª Instância, devendo a ora Recorrente ser absolvida dos pedidos formulados pelos ora Recorridos, só assim se fazendo JUSTIÇA!

Também a ré Seguradoras Unidas, S.A. interpôs recurso de revista do acórdão, finalizando as respectivas alegações com as seguintes conclusões:

1. O Acórdão recorrido faz uma incorreta ponderação da matéria de facto provada e uma ainda menos acertada aplicação das normas vigentes, nomeadamente do instituto da culpa do lesado.

2. Face ao despiste sofrido pelo ZO, que determinou que o mesmo tivesse ficado imobilizado junto ao separador, em plena Auto Estrada, não se compreende como não foi atribuída responsabilidade ao Autor pelos embates subsequentes.

3. Numa Auto Estrada, em que está estabelecido um limite mínimo de velocidade e em que é proibida a circulação de pesões, velocípedes ou de veículos de tração animal, não é expetável, a um condutor atento e diligente, que surja um obstáculo com as dimensões do ZO, imobilizado na faixa de ultrapassagem.

4. Resultou demonstrado que o triângulo de sinalização foi colocado “na frente do ZO” e que o Autor foi atingido pelo EQ quando se encontrava a “alguns metros do ZO”.

5. De tal redação, é inequívoco que, por um lado, o triângulo de sinalização não foi colocado na via a pelo menos 30 metros do veículo ZO, nem que o mesmo fosse visualizável a pelo menos 100 metros de distância, considerando a configuração da via – curva à direita.

6. Por outro lado, o facto de o Autor ter sido colhido a alguns metros à frente do ZO demonstra igualmente que o mesmo se encontrava à frente não apenas do ZO como do triângulo de sinalização, o que indicia o que estivesse a cortar a visão dos demais condutores para o referido dispositivo de sinalização de perigo.

7. Acresce que o facto de o condutor do EQ não ter conseguido se desviar do Autor e do ZO a tempo de evitar o embate não leva a concluir, per se, que transitasse em desrespeito de qualquer norma estradal.

8. Note-se que a obrigação de guardar do veículo precedente uma distância de segurança está prevista para a possibilidade de esse mesmo veículo ter de travar repentinamente ou imobilizar o veículo, pretendendo-se evitar a ocorrência de um choque com o veículo da frente e não com qualquer obstáculo, mal sinalizado, que surja na via.

9. Assim, a responsabilidade pela ocorrência dos embates dos autos apenas ao Autor é imputável, já que foi o ZO, sem intervenção do EQ ou do HJ que se despistou e se imobilizou em plena auto estrada, e foi o Autor que, com o seu descuido e negligencia, não cuidou de o sinalizar conveniente e legalmente, com vista a alertar os demais condutores da sua presença na via.

10. Impondo-se, assim, a absolvição das Rés do pedido.

11.Da mesma forma, as lesões que os Autores sofreram apenas a si mesmos lhes podem ser imputadas.

12.Após a imobilização do ZO, o Autor vestiu o colete de sinalização, ligou a luz avisadora de perigo do ZO, saiu do ZO, tal como a Autora, retiraram a filha recém nascida de ambos do veículo e colocaram-na, na baby coque, no interior do separador central.

13. Instalaram o triângulo de sinalização “na frente do ZO”, sem que o mesmo estivesse a uma distância mínima de 30 metros, em contravenção com o art. 88º do Código da Estrada, conforme conclusões nºs 4 e 5.

14. O Autor permaneceu apeado na via, à frente do ZO (e, como já referido, também à frente do triângulo de sinalização).

15. A Autora, por razões que se desconhecem, decidiu ficar, também apeada e também em plena via, junto à mala do ZO.

16. Não é razoável, como se decidiu no Acórdão recorrido, defender-se que o Autor teve uma atitude diligente ao permanecer na via, quando tinha um separador central onde podia, se assim entendesse, caminhar a tentar outros condutores da presença do ZO.

17. Tão-pouco é admissível o raciocínio que competia às Rés demonstrar inexistir qualquer motivo justificativo para a Autora permanecer também ela, na via.

18. Na verdade, era de noite, estava a chover e o trânsito era intenso.

19. O ZO estava imobilizado numa curva de uma auto estrada.

20. Ficou demonstrado que os Autores previram a possibilidade da ocorrência de outros eventuais embates, razão pela qual decidiram colocar a sua filha a salvo, no interior do separador central (a qual, por ali se encontrar, não sofreu qualquer lesão).

21. Aliás, o perigo de ali permanecerem era não só evidente para um homem médio e minimamente diligente, como era constante, à medida que veículos passavam pelo local

22. Acresce referir que os Autores não podiam permanecer na via, já que não estavam envolvidos em qualquer operação de remoção ou de reparação do ZO.

23.Daí que os danos e lesões que os mesmos sofreram, assim como as que resultaram direta e indiretamente, do embate do EQ e do HJ apenas a si lhes são imputáveis, já que as mesmas apenas ocorreram porque os Autores decidiram permanecer, na faixa de rodagem, após a imobilização e sinalização do ZO.

24.Como tal, as indemnizações fixadas ao Autor, no valor total de € 3.100,00, e à Autora no montante total de € 63.504,30, devem ser revogadas, absolvendo-se as Rés desses pedidos.

25.Não resultou demonstrado que o ZO, após o despiste e imobilização junto ao separador central, não sofreu qualquer dano, muito embora tenham os Autores alegado, no artigo 6 da PI, que tenham tentado colocar em circulação, sem sucesso).

26. Dessa forma, in compreende-se o motivo pelo qual o Acórdão em crise tenha ignorado tal alegação e, muito embora a totalidade dos danos tenham resultado do “acidente” e não dos embates dos EQ e HJ, não tenha atribuído qualquer parcela de responsabilidade ao aqui Autor pelos danos que resultaram para o ZO.

27. Por outro lado, e mais uma vez, aos embates sofridos pelo ZO não foi alheio o facto de o triângulo de sinalização ter sido colocado junto ao ZO e não a uma distância de pelo menos 30 metros, e visível a 100 metros, nomeadamente tendo em conta o contexto em que o sinistro ocorreu – trânsito intenso, chuva e de noite.

28.Dessa forma, e para o caso de não se concluir que o sinistro dos autos ocorreu por culpa única e exclusiva do Autor, sempre se dirá que a responsabilidade pelos custos da reparação do ZO deve ser repartida pelos três intervenientes: o Autor e as Rés GENERALI e AGEAS.

29.Já quanto ao valor da reparação, tendo resultado demonstrado que o mesmo ascende a € 8.761,70 e o valor venal de mercado do ZO a € 6.000,00, então deverá ser esse o valor, e não o da reparação, o montante a arbitrar a este título.

30.Até porque, para além da reparação se afigurar excessivamente onerosa, traduz-se num ganho ilegítimo e injustificado para o Autor, o qual, munido daquela quantia de € 8.761,70, nunca repararia o ZO, antes o substituindo.

31.O conceito de perda total surge definido no art. 41º do DL 291/2007, de 21 de agosto, sendo que, atenta tal disposição, e os valores de reparação, venal de mercado e salvado, inequívoco que a situação do ZO encontra colhimento na referida previsão legal.

32. Deve, assim, ser arbitrado ao Autor o montante de € 6.000,00, para compensação da perda do veículo, na proporção de 2/3 - € 4.000,00.

33. Face à recusa das Rés em se responsabilizarem pela reparação do ZO, assim como face à confessa incapacidade anímica do Autor para voltar a conduzir (artigo 61º da PI), o Autor podia e devia ter cancelado a matrícula do seu veículo, para o que pagaria uma taxa de € 10,00, não ficando sujeito ao pagamento do IUC.

34. Dessa forma, deve o valor condenatório de € 100,00, a título de IUC, ser reduzido para o total de € 10,00, cabendo ao Autor receber a proporção de 2/3 do mesmo (€ 6,66).

35. Finalmente, no que diz respeito ao quantum indemnizatório fixado ao Autor para compensar a privação do uso, note-se que, para além de ter resultado demonstrada a utilização diária e generalista do mesmo, pelo Autor, não ficou provado qualquer prejuízo efetivo.

36. Por outro lado, tendo o ZO o valor venal de mercado de € 6.000,00, a indemnização fixada de € 25.572,00 revela-se não compensatória, mas sim como uma verdadeira punição das Rés, pura e simplesmente porque as mesmas decidiram discutir a responsabilidade pelo sinistro dos autos.

37. Responsabilidade, essa, que até foi atribuída, em exclusivo, ao próprio Autor, em sede de primeira instância

38. Como tal, não pode a Recorrente aceitar o valor arbitrado em causa, o qual ultrapassa os critérios da razoabilidade, proporcionalidade e adequação, assim como o sentido de Justiça que deve pautar qualquer decisão judicial.

39. O montante de que ora se recorre reveste a natureza de castigo, indo contra o próprio instituto da responsabilidade civil extracontratual, cujo objetivo é a compensação dos danos sofridos pelo lesado e não a punição do lesante.

40. Assim, deve o valor em causa ser reduzido para a quantia de € 6.000,00, a qual, por revestir o valor de mercado do ZO, se afigura como mais que razoável e justa.

41.Valor, esse, que deve ser reduzido em 1/3, considerando a responsabilidade que o Autor teve na produção do sinistro e dos danos que resultaram para o ZO.

42.Assim não se entendendo, deverá o quantum diário ser alterado para € 6,00, competindo ao Autor a quantia diária de € 4,00.

43.O Acórdão recorrido faz uma incorreta apreciação da matéria de facto provada e uma criticável aplicação do instituto da responsabilidade civil extracontratual e da culpa do lesado, devendo, como tal, ser revogada nos termos supra expostos, fazendo-se, assim, Justiça.”

Por último, a autora BB interpôs recurso subordinado, que terminou com as seguintes conclusões:

1ª - Vem o presente recurso subordinado interposto da parte do Acórdão proferido pela Relação do Porto que fixou a indemnização atribuída à Autora BB, a título de dano biológico, em €33.000,00.

2ª - Para além dos danos de natureza não patrimonial, a afetação da integridade físico-psíquica de que o lesado fique a padecer é suscetível, enquanto dano biológico, de gerar danos patrimoniais, caso em que a indemnização se destina não só a compensar a futura perda de rendimentos pela incapacidade laboral, mas também, as consequências dessa afetação, no período de vida expectável, seja no plano da perda ou diminuição de outras oportunidades profissionais e/ou de índole pessoal ou dos custos pela maior penosidade com o desempenho dessas atividades.

3ª - A atribuição de indemnização por perda de capacidade geral de ganho, segundo um juízo equitativo, varia, essencialmente, em função dos seguintes critérios: i) - a idade do lesado; ii) - o grau de incapacidade geral permanente; iii) - as potencialidades de ganho, antes da lesão, tanto na profissão habitual, ou previsível profissão habitual, como em profissão ou atividade económica alternativas, aferidas, em regra, pelas suas qualificações ou habilitações técnico-profissionais, a par de um outro fator que contende com a conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da atividade profissional habitual do lesado, ou da previsível atividade profissional do lesado, assim como de atividades profissionais ou económicas alternativas, tendo em conta as competências do lesado.

4ª - À luz destes critérios, tendo a Autora BB 33 anos de idade à data do acidente, tendo o acidente tido lugar em 2014, tendo as lesões consolidado em 2016, sofrido uma incapacidade geral permanente de 15 pontos para o exercício da sua atividade profissional habitual e para o exercício de outras atividades para as quais possui competências técnico-profissionais, sendo previsível a existência de dano futuro, e, auferindo um vencimento mensal de cerca de €679,00 revela-se ajustada, em termos equitativos, uma indemnização, a título de dano patrimonial, no valor de, pelo menos, €73.000,00, que pressupõe uma solução em sintonia com a lógica e o bom senso, com apelo às regras da boa prudência, da criteriosa ponderação das realidades da vida, sem apelo a critérios subjetivos e tendo sempre em conta a gravidade do dano.

5ª - Ora, tendo presente o valor assim obtido, tendo presente todas as repercussões a nível físico-psíquico e pessoal emergentes do acidente dos autos, tendo presente que a Autora BB ficou com repercussões que implicam esforços adicionais no desempenho da sua atividade profissional habitual e, ainda, para qualquer outra atividade compatível com a sua preparação técnico-profissional, tendo presente a sua idade (33 anos, à data do acidente), a expectável evolução salarial no dito período temporal, os índices de inflação e a evolução dos juros;

6ª - Afigura-se-nos equitativo fixar-se, no caso dos autos, o valor indemnizatório correspondente à perda de capacidade aquisitiva futura sofrida pela Autora no valor total de €73.000,00, ao invés dos €33.000,00, fixados no acórdão recorrido e para os quais, com o devido respeito, não se vislumbra fundamento bastante, em face dos critérios acima expostos e que vêm sendo acolhidos em termos reiterados pela nossa mais recente jurisprudência.

Nestes termos, e pelo muito que, como sempre, não deixará de ser proficientemente suprido, devem Vªs Exas. dar provimento ao recurso subordinado da Autora e alterar a decisão recorrida no que exclusivamente respeita à indemnização pelo dano biológico, nos termos supra expostos, fazendo, desse modo Justiça”.

Cumpre decidir.

O tribunal recorrido considerou provada e não provada a seguinte matéria de facto, que não se mostra impugnada:

“1. No dia 22.11.2014, pelas 18H10 horas, deu-se um acidente de viação na autoestrada A..., sentido norte/sul (P.../P...).

2. Foram intervenientes:

a) O veículo ligeiro de passageiros matrícula ..-..-ZO, marca Ford, modelo Focus 1.4 i, 16 VS, a gasolina, propriedade do autor AA e por ele conduzido;

b) O veículo ligeiro de passageiros matrícula EQ-..-.., marca Ford, propriedade de DD e por ele conduzido; e

c) O veículo ligeiro de passageiros matrícula ..-HJ-.., marca Mercedes Benz, propriedade de “A..., Lda.” e conduzido por EE.

3. Mediante contrato de seguro titulado pela apólice n.º ...46, a responsabilidade civil emergente de danos causados a terceiros pelo veículo EQ encontrava-se transferida para a ré “Seguradoras Unidas”.

4. Mediante contrato de seguro titulado pela apólice n.º 0045.11.369686, a responsabilidade civil emergente de danos causados a terceiros pelo veículo HJ encontrava-se transferida para a ré “Ageas”.

5. Nas circunstâncias de tempo e lugar identificadas em 1.1., o autor AA circulava no veículo ZO, acompanhado das autoras - a sua mulher BB, a qual seguia no banco de trás, com a sua filha, a autora CC, com 3 semanas de vida, esta última sentada no baby coque instalado no lugar traseiro -, pela A..., no sentido norte/sul (P.../P...), a velocidade não apurada.

6. O veículo ZO despistou-se, vindo a ficar imobilizado na faixa da esquerda da A..., junto ao separador central, em sentido contrário ao que seguia (ou seja, sentido ...).

7. O autor AA e a sua mulher, a autora BB, receando eventuais embates, atento o trânsito existente, acionaram a luz avisadora de perigo do veículo ZO e saíram do mesmo, tendo a autora BB retirado a filha CC do seu interior, após o que a colocaram no meio do separador central da A... e instalaram o triângulo de sinalização na frente do ZO.

8. À frente do veículo EQ seguia um outro veículo, o qual conseguiu desviar-se do veículo ZO.

9. O veículo EQ veio a embater com a sua frente na frente do ZO, não obstante a sua tentativa de se desviar e evitar o embate frontal.

10. O veículo que seguia à frente do veículo EQ retirava visibilidade ao condutor do EQ.

11. O veículo EQ, antes de embater no veículo ZO, atingiu de raspão o autor AA, designadamente o seu pé́ esquerdo, o qual se encontrava na faixa de rodagem a alguns metros do ZO.

12. Ato contínuo, ao embater no veículo ZO, o veículo EQ arrastou-o contra o separador central, danificando a traseira lateral direita do veículo ZO, e contra a autora BB, a qual se encontrava junto à mala do veículo, no exterior, arrastando o corpo daquela pelo chão até aos DPM do separador central.

13. Após o embate, o veículo EQ ficou imobilizado na posição referida em 1.14., tendo tido um início de incêndio.

14. Ao embate do veículo EQ, seguiu-se ainda, passados que foram alguns segundos, o embate de outro veículo, o HJ, naquele veículo EQ - atravessado em cima da linha contínua separadora das vias de trânsito -, o qual, por sua vez, em virtude do embate do veículo HJ, volta a embater no veículo ZO, desta vez, na parte dianteira lateral esquerda.

15. Após ambos os embates, a autora BB encontrava-se presa sob os DPM do separador central, junto ao rodado traseiro do lado direito do veículo ZO, mais concretamente, parte do corpo debaixo do veículo ZO, com a cabeça encostada ao pneu direito traseiro e as duas pernas debaixo dos DPM do separador central.

16. O veículo ZO foi arrastado até ao separador central, ficando, após os embates, imobilizado, com a frente, as laterais e a traseira danificadas, não mais podendo circular.

17. Após os embates, o veículo EQ ficou imobilizado, atravessado em cima da marca M1 (linha contínua separadora de vias de trânsito), com a frente virada para o separador central.

18. Após o embate, o veículo HJ foi imobilizar-se no meio da via de abrandamento da saída para ..., com a frente danificada.

19. Ao local compareceram um veículo de desencarceramento, em virtude de a autora BB se encontrar presa sob os DPM do separador central, junto ao rodado traseiro do lado direito do veículo ZO, e outro veículo que efetuou a limpeza da via, ambos da Corporação de Bombeiros Voluntários de ....

20. O piso da A... pelo qual circulavam os veículos é em alcatrão e apresentava-se molhado, em regular estado de conservação e aderência.

21. O acidente ocorreu de noite, com a via iluminada e tempo chuvoso.

22. Em consequência do acidente, o veículo ZO sofreu danos cuja reparação foi orçamentada, após peritagem, no valor de 8.761,70€.

23. Após o acidente, o veículo ZO foi rebocado para a oficina “S...Auto, de FF”, no qual permaneceu depositado até agosto de 2015.

24. Os autores AA e BB utilizavam o ZO nas deslocações pessoais e profissionais diárias e de fim-de-semana do respetivo agregado familiar, designadamente, nas deslocações do autor AA para a Faculdade ..., da autora BB para o trabalho, para transporte do seu filho mais velho à escola e da sua filha mais nova às consultas mensais no Centro de Saúde.

25. Na sequência do acidente não foi assegurada ao autor qualquer viatura de substituição do veículo ZO, não lhe foi facultada a reparação deste, tendo-lhe apenas sido proposta uma indemnização pela perda total, a qual não permitiria reparar o veículo ZO.

26. Desde a data do acidente - 22.11.2014 - o autor está privado da utilização do veículo ZO e, como a sua mulher, teve de se socorrer de transportes alternativos para as suas deslocações pessoais, familiares, profissionais, mas, sobretudo, para deslocações aos hospitais e para as consultas de fisioterapia da autora BB.

27. Com o veículo ZO, o autor e a sua família conseguiam organizar a sua vida.

28. O veículo ZO é de fevereiro de 2005.

29. Os autores socorreram-se do metro e do autocarro, nas deslocações que fizeram durante os anos de 2015 e 2016, entre outras, da morada do autor na ... à faculdade que frequenta, no ....

30. Em consequência do embate a que se alude em 1.11., as sapatilhas e as calças do autor ficaram inutilizadas, ascendendo o valor das mesmas a cerca de 100,00€.

31. O autor procedeu ao pagamento do imposto de circulação do veículo ZO relativo aos anos de 2015 e 2016, no valor global de 110,00€.

32. Por causa do embate a que se alude em 1.11., o autor AA sofreu trauma/lesão no joelho, perna e pé́ esquerdo, com dor moderada.

33. Foi assistido no local pelo INEM que o transportou logo após para o Serviço de Urgência do Hospital de ..., no ..., com imobilização cervical.

34. Fez radiografia ao tórax/grade costal, a qual não revelou sinais de fraturas ou outros. 35. Teve alta com analgesia e vigilância de sinais de alarme em 22.11.2014.

36. O autor AA nasceu no dia ....05.1978.

37. O acidente causou pânico, angústia e ansiedade ao autor AA.

38. Ao ver a sua mulher encarcerada nos railes da estrada, sem sentidos, o autor AA receou pela sua morte.

39. O autor viu-se sozinho e sem saber a quem auxiliar, se a sua mulher, se a sua filha, assustada e necessitada de colo, calor e conforto.

40. Após o acidente a autora CC foi levada pelo INEM, juntamente com o seu pai, o autor AA, para o ..., no ....

41. A autora CC não apresentava TCE visíveis, nem défice neurológico aparente.

42. Apresentava reflexos vivos, tórax sem hematomas visíveis, sem SDR, ACP normal, sem marcas de cinto, abdómen mole e depressível, sem sinais de irritação peritoneal, sem hematomas e com boa mobilidade dos 4 membros.

43. A autora CC apresentou, no dia 08.01.2015, um torcicolo com contratura à direita pós-acidente que não cedeu a medidas conservadoras, tendo-lhe sido prescrita fisioterapia.

44. Pelo INML foi-lhe fixado:

- um quantum doloris de grau 2/7; e,

- um período de “Défice Funcional Temporário Parcial” de 439 dias.

45. A autora CC nasceu a ....10.2014.

46. A autora CC, enquanto esteve no meio do separador central, esteve sujeita a um ambiente ruidoso, frio e noturno, o que lhe provocou insegurança e desconforto.

47. Em consequência do acidente, a autora BB sofreu:

- fratura metafisária proximal da tíbia esquerda e do pilão tibial esquerdo; - deformidade do joelho;

- dor severa;

- hematoma epicraniano frontotemporal e dos tecidos moles periorbitários pré-septais à esquerda;

- feridas na face (múltiplas), couro cabeludo, cotovelo direito e face anterior da coxa esquerda, as quais foram suturadas;

- múltiplas escoriações na região nadegueira e dorso; - ferida no dedo;

- ferida incisa na coxa direita, a qual, atento o grau de conspurcação, não foi suturada.

48. Foi assistida no local pela VEMER (Veículo Emergência Médica e seus psicólogos) e pelo INEM, que a transportou logo após para o Serviço de Urgência do Hospital de ..., no ....

49. Realizou radiografias à grade costal, antebraço, cotovelo, ráquis e bacia, as quais não revelaram alterações.

50. Realizou ecografia abdominal, a qual não revelou alterações.

51. Realizou TAC cerebral que revelou hematoma epicraniano frontotemporal e dos tecidos moles periorbitários pré-septais à esquerda.

52. Realizou radiografia ao membro inferior que revelou fratura metafisária proximal da tíbia esquerda e pilão tibial esquerdo.

53. Em 23.11.2014 teve alta por transferência externa para o Centro Hospitalar da ... do Conde, onde ficou internada.

54. No Centro Hospitalar da ... do Conde foi-lhe colocado aparelho gessado cruropodálico, tendo registado boa evolução clínica e radiológica durante o internamento, pelo que lhe foi indicado tratamento conservador.

55. Teve alta pelo Centro Hospitalar da ...do Conde em 26.11.2014.

56. Retirou a imobilização gessada em 30.01.2015, tendo sido orientada para reabilitação que mantinha em 08.12.2016.

57. Depois da alta, foi assistida, já́ em casa, pelos enfermeiros do Centro de Saúde da ..., os quais se deslocavam, por vezes mais do que uma vez por semana, a casa da autora, para curativos.

58. Submetida a exame de avaliação do dano corporal sofrido por parte dos serviços da ré “Seguradoras Unidas”, os mesmos também lhe indicaram tratamento conservador.

59. Em 04.08.2015 foi realizada uma ressonância magnética do tornozelo esquerdo da autora, o qual revelou: “Sequelas de fratura da tíbia, que se estende até à superfície articular com o talus, estando já́ consolidada e com regular alinhamento dos topos fraturários. Há́ ligeira alteração do sinal da cartilagem, por condropatia de grau II, contudo sem evidência de avulsão de fragmento osteocondral para o espaço articular (...) É, contudo perceptível um padrão de osteopenia até de aspeto um pouco permeativo do talus e do calcâneo, prolonga-se ao médio tarso, pode traduzir apenas osteopenia por desuso ou até um processo de algodistrofia, a valorizar no contexto clínico do paciente. Ligeiro espessamento da sinovial da face anterior do tornozelo, por alterações inflamatórias de sinovite inespecífica pós-traumática, cursam sem evidente derrame articular associado. Mantém-se regulares e bem definidas as superfícies articulares do tornozelo, subtalares e médio-tarso. Não há́ evidentes sinais de lesão ligamentar do tornozelo, da sindesmose tibioperonial distal nem dos ligamentos do seio társico (...) Discreto edema do tecido celular subcutâneo da face externa do tornozelo, habitual neste contexto clínico.”

60. Na sequência das fraturas da tíbia esquerda, proximal e distal, a autora, em 28.08.2015, apresentava limitação funcional, com queixas particularmente ao nível do tornozelo, que apresentava condropatia da cartilagem tibial e osteopenia do calcâneo e astrágalo e que determinaram a manutenção do tratamento fisiátrico.

61. Em resultado do acidente, e não obstante o tratamento fisiátrico mantido, a autora apresenta as seguintes sequelas:

- Crânio: cicatriz linear hipocrómica com 4 cm de comprimento, localizada na região mediana frontal, atrás da linha de implantação capilar; ligeiro afundamento da calote craniana com cerca de 4 por 3 cm de maiores dimensões localizada na região parietal posterior

- Face: duas cicatrizes lineares hipocrómicas, uma com 2,4 cm e outra com 2 cm de comprimento, localizadas na região frontal à esquerda, sem retração ou reacção queloide, percetíveis apenas a uma distância ínfima e referidas como dolorosas à palpação; duas cicatrizes lineares hipocrómicas com cerca de 1 cm cada uma, localizadas uma no terço anterior do rebordo mandibular esquerdo e outra no direito, praticamente impercetíveis; cicatriz linear nacarada com 1,5 cm de comprimento localizada na região dorsal do nariz, à direita, praticamente impercetível; cicatriz linear com 1 cm de comprimento localizada no lábio inferior à esquerda, praticamente impercetível;

- Ráquis: contratura paraverteral bilateral da região dorsal e lombar; Shobbër 10-17 cm, restantes movimentos conservados;

- Abdómen: duas cicatrizes hipocrómicas com cerca de 1 cm cada uma, localizadas no flanco abdominal esquerdo; várias cicatrizes lineares hipocrómicas com orientação de cima para baixo e da direita para a esquerda e localizadas na região dorsal, à direita da linha média, com algum relevo, mas sem reacção queloide e sem retrações;

- Membro superior direito: três cicatrizes hipocrómicas, uma com cerca de 2 por 1,5 cm de maiores dimensões, e duas lineares, uma com 1,5 cm de comprimento e outra com 1 cm de comprimento, localizadas na face posterior e lateral do cotovelo; sem retrações ou reacção queloide; cotovelo com arcos de movimento e força musculares conservados e simétricos;

- Membro superior esquerdo: três cicatrizes hipocrómicas aproximadamente lineares, duas com 1 cm de comprimento e uma com 2 cm, dispostas irregularmente, localizados no dorso da falange intermédia do 3.º dedo, referidas como dolorosas à palpação; arcos de movimento do 3.º dedo conservados e simétricos;

- Membro inferior direito: cicatriz hipercrómica com formato grosseiramente oval com 1 cm de maior diâmetro, localizada na região nadegueira;

- Membro inferior esquerdo: distância espinha ilíaca ântero-superior ao maléolo medial de 80 cm (contralateral de 82 cm) e umbigo – maléolo medial de 86 cm (contralateral de 88 cm).

Coxa: cicatriz hipocrómica curvilínea com concavidade inferior e cerca de 10 por 1 cm de maiores dimensões depois de retilinizada, localizada no terço superior da face anterior da coxa, com reacção quelóide e rebordo hipercrómico; perimetria de 43 cm, medida a 15 cm da interlinha articular medial (contralateral de 45 cm);

Joelho: palpação das interlinhas articulares referida como dolorosa, teste da gaveta anterior positivo;

Perna: cerca de seis cicatrizes, lineares hipocrómicas, com cerca de 4 cm de comprimento cada uma, localizadas no terço superior da face anterior da perna e face anterolateral do joelho; perimetria de 33 cm, medida a 16 cm da interlinha articular medial (contralateral de 34 cm);

Articulação tíbio-társica: em flexão de 32 graus, realizando uma flexão plantar ativa até aos 38 graus e passiva até aos 42 graus e uma flexão dorsal passiva e ativa até aos 0 graus; eversão praticamente abolida, inversão conservada; força muscular grau 4+ em 5 nos movimentos dependentes da articulação tíbio-társica;

Encurtamento de 2 cm do membro inferior, quando comparado o seu comprimento com o membro oposto. Atrofia da coxa de 1 cm, quando comparado o perímetro com o lado oposto. Rigidez subastragalina moderada. Tíbia vara de 10 graus. Discretas limitações de mobilidade do tornozelo, com arco de 0-10 graus na dorsiflexão a 0-30 na flexão plantar.

62. A autora BB tem dores ao nível do tornozelo esquerdo.

63. As lesões sofridas pela autora BB podem vir a determinar a necessidade de uma futura intervenção cirúrgica.

64. Na sequência do acidente a autora BB não tinha posição para dormir.

65. Nos primeiros meses após o acidente a autora BB precisou da ajuda doméstica de terceira pessoa (mãe e irmã), sendo que tinha uma bebé para amamentar, cuidar e tratar.

66. A dor, o incómodo, a incapacidade e a dependência provocaram na autora BB ansiedade e transtornos psíquicos e de humor.

67. Durante o período de internamento a autora BB não pode amamentar a sua filha CC, sendo que até aí a amamentou e pretendia continuar a amamentar.

68. A autora BB nasceu em 17.01.1981.

69. À data do acidente era ativa e saudável.

70. Desde a data do acidente que a autora BB esteve impedida de trabalhar, apenas tendo regressado ao trabalho em 4 de fevereiro de 2016.

71. A autora BB não pode usar sapatos de tacão alto.

72. A autora BB não consegue correr nem praticar atividades físicas com impacto.

73. No que se refere à autora BB e de acordo com o relatório pericial elaborado pelo INML:

- a consolidação médico-legal das lesões sofridas foi fixada em 30.09.2016;

- o período de “Défice Funcional Temporário Total” foi fixado num total de 5 dias;

- o período de “Défice Funcional Temporário Parcial” foi fixado num total de 674 dias;

- o período de “Repercussão Temporária na Atividade Profissional Total” foi fixado num total de 439 dias;

- o período de “Repercussão Temporária na Atividade Profissional Parcial” foi fixado num total de 240 dias;

- o quantum doloris foi fixado no grau 5/7;

- o “Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica” foi fixado em 15 pontos, considerando-se ser admissível a existência de dano futuro;

- as sequelas sofridas são, em termos de “Repercussão Permanente na Atividade Profissional”, compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicam esforços suplementares;

- o “Dano Estético Permanente” foi fixado no grau 3/7;

- a “Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer” foi fixado no grau 3/7; e,

- em termos de “Ajudas Técnicas Permanentes” foi previsto o acompanhamento regular em consulta de ortopedia.

74. A autora BB exercia a função de técnica administrativa, auferindo um rendimento mensal ilíquido de 679,00€ e líquido de 570,94€.

75. À data do acidente, a autora encontrava-se a usufruir de licença parental, a qual terminou em 26.02.2015.

76. Desde 27.02.2015 até 03.02.2016 a autora esteve de baixa remunerada pelo I.S.S. por doença direta.

77. Foi-lhe concedida a “Concessão Provisória de Subsídio de Doença”: - no período de 02.03.2015 a 28.03.2015, no valor diário de 12,45€;

- no período de 29.03.2015 a 27.05.2015, no valor diário de 13,58€; e, - no período de 28.05.2015 a 05.12.2015, no valor diário de 15,84€.

78. A autora BB ficou com a roupa que usava no dia do acidente inutilizada, designadamente, um casaco de sarja e um sutiã de amamentação, cujo valor ascende a, pelo menos, 100,00€.

79. O acidente causou na autora BB pânico, angústia e ansiedade.

80. A autora BB sofreu dores, depressão e ansiedade.

81. O condutor do veículo ZO, após o despiste a que se alude em 1.6. colocou o colete refletor.

82. Durante o lapso de tempo que decorreu na prática dos atos a que se alude em 1.7., passaram no local veículos que não embateram no veículo ZO.

83. Nas circunstâncias de tempo e local em que ocorreu o acidente o trânsito era intenso.

84. O veículo EQ e o veículo que seguia à sua frente circulavam pela faixa da esquerda, atento o sentido norte/sul da A....

85. O veículo HJ circulava no sentido norte/sul da A....

86. O veículo HJ colidiu com a sua frente na traseira do veículo EQ.

87. No local do acidente e atento o sentido de marcha V.../P..., a faixa de rodagem da A... é formada por dois corredores de trânsito, divididos a meio por uma linha longitudinal contínua e com a largura total de 7,20 m.

88. Atento o mesmo sentido de marcha, existe no local um terceiro corredor de trânsito, localizado à direita, correspondente à via de abrandamento da saída para ....

89. Atento o sentido de marcha V.../P..., o corredor de trânsito localizado à esquerda é ladeado pelo seu lado esquerdo por um separador central delimitado por railes de protecção metálicos.

90. No local do acidente e atento o sentido de marcha V.../P..., a A... descreve uma curva para a direita.

91. O condutor do veículo EQ circulava no sentido V.../P... da A..., imprimindo ao veículo que conduzia velocidade não superior a 90 Km/hora.

92. Na altura o trânsito processava-se com intensidade por ambos os corredores de trânsito a que se alude em 1.87.

93. À frente do EQ e igualmente pelo corredor de trânsito da esquerda circulava um veículo da marca Volkswagen.

94. Subitamente o condutor do Volkswagen guinou o veículo que conduzia para a direita, atento o seu sentido de marcha.

95. Nessa altura, deparou-se ao condutor do veículo EQ o veículo ZO, imobilizado no corredor de trânsito da esquerda, isto é, no corredor de trânsito por onde circulava o EQ, com a parte da frente voltada para ..., ou seja, totalmente em sentido contrário ao permitido no local.

99. Na frente do veículo ZO, em plena faixa de rodagem, encontrava-se um vulto a gesticular, que mais tarde se veio a saber ser o autor AA.

100. O condutor do veículo EQ de imediato acionou os órgãos de travagem do veículo que conduzia e tentou desviar o veículo para a direita, atento o seu sentido de marcha.

101. Apesar de com tal manobra ter conseguido evitar um embate frontal e direto no autor AA, não logrou evitar embater no mesmo autor de raspão e, bem assim, na parte da frente do veículo ZO.

102. No momento do embate o piso encontrava-se molhado em virtude da chuva que na altura caía.

103. Após o embate no veículo ZO, o condutor do veículo EQ de imediato saiu do veículo e tratou de ajudar uma sua filha que com ele viajava no banco traseiro a abandonar também o EQ.

104. Entretanto, a mulher do condutor do veículo EQ, que com ele viajava no lugar da frente ao lado do lugar do condutor, também abandonou o veículo.

105. Estando todos eles – condutor do EQ, mulher e filha – fora do veículo, todos se dirigiram para junto do separador central a fim de se tentarem colocar em lugar seguro.

106. Depois de, após o embate do veículo EQ no veículo ZO, alguns veículos se terem desviado do local onde aqueles se encontravam embatidos, foi o veículo EQ embatido na parte traseira pelo veículo HJ.

107. Com o embate, o veículo EQ foi projetado contra o ZO, arrastando-o, acabando o EQ por se imobilizar atravessado nos dois corredores de trânsito da A..., com a parte da frente voltada para o separador central.

108. Na altura em que ocorreu o embate do veículo EQ no veículo ZO, a menor CC já́ se encontrava no interior do separador central, em cadeira própria.

109. Na altura do embate do veículo EQ no veículo ZO a autora BB encontrava-se junto à traseira do ZO.

110. A ré “Seguradoras Unidas”, por comunicação escrita datada de 21 de janeiro de 2015, informou o autor AA de que “(...) de acordo com os elementos probatórios de que dispomos, encontramo-nos a assumir 33% dos danos sofridos pela viatura de V. Exa., bem como pelos danos corporais sofridos.”

111. A ré “Seguradoras Unidas”, por comunicação escrita datada de 21 de janeiro de 2015, informou a autora BB de que “(...) de acordo com os elementos probatórios de que dispomos, encontramo-nos a assumir 75% dos danos sofridos por V. Exa.”

112. A ré “Seguradoras Unidas”, por comunicação escrita datada de 21 de janeiro de 2015, informou os autores AA e BB, enquanto representantes legais da autora CC, de que “(...) de acordo com os elementos probatórios de que dispomos, entendemos que nenhuma responsabilidade pode ser assacada ao condutor do veículo que seguramos, relativamente aos danos sofridos por V. Exa.”

113. A proposta da ré “Seguradoras Unidas” foi recusada pelos autores.

114. O veículo Z0 tinha, na data do acidente, o valor venal de mercado de cerca de 6.000,00€.

115. Aos salvados do ZO foi atribuído o valor de 800,00€.

116. A ré “Seguradoras Unidas”, por comunicação escrita datada de 12 de dezembro de 2014, informou o autor AA de que “(...) a viatura de V. Exa. sofreu danos cuja reparação se torna excessivamente onerosa face ao seu valor de mercado antes do acidente”, indicando ao autor os valores da reparação, o valor de mercado do veículo, o valor dos salvados e a entidade com quem o autor poderia comercializar os salvados, se assim o entendesse, mais referindo que “(...) colocamos condicionalmente à disposição de V. Exa. a quantia de 5.200,00€.”

117. A autora foi observada pelos serviços clínicos da ré que lhe deram alta definitiva em 20 de novembro de 2015 e lhe atribuíram um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos e um quantum doloris de 4/7.

118. Quando chegou ao local do embate, o condutor do HJ já́ não se deparou com o triângulo que o autor havia colocado na via.

119. Quando o condutor do HJ chegou com o seu veículo ao local, deparou com os veículos ZO e EQ a ocuparem parcialmente a faixa de rodagem, o ZO a ocupar a faixa da esquerda e o EQ atravessado em cima da linha contínua separadora das duas faixas.”

Factos Não Provados.

Não resultou provado qualquer facto de entre os alegados com interesse para a decisão da causa, designadamente, não se provou que:

“1. No acidente de viação a que se alude em 1.1. foi interveniente um veículo ligeiro de passageiros de matrícula, marca, proprietário e condutor desconhecidos.

2. Quando o autor circulava nos termos a que se alude em 1.5., pela faixa direita da A..., de repente, um veículo de matrícula e condutor desconhecido que seguia na faixa esquerda da A..., sentido P.../P..., pretendendo sair para ..., saída situada à sua direita - o que acabou por fazer -, atravessou-se à frente do veículo ZO, pisando a linha contínua existente, sem pré-sinalizar a referida manobra e/ou diminuir, antecipadamente, a velocidade, a fim de integrar a faixa de desaceleração existente e destinada ao efeito.

3. Tal actuação do veículo desconhecido provocou a instantânea travagem do veículo ZO, imprimida pelo autor a fim de evitar o embate.

4. Foi pelo motivo a que se alude em 2.2. e 2.3. que o veículo ZO se despistou.

5. O veículo de matrícula e condutor desconhecido seguiu o seu destino.

6. Imobilizado nas circunstâncias a que se alude em 1.7, o autor não conseguiu colocar o veículo ZO em circulação, não obstante o tivesse tentado.

7. O veículo EQ seguia a velocidade não inferior a 140 km/hora e em perseguição e/ou disputa com um outro veículo que seguia à sua frente.

8. O veículo EQ seguia imediatamente atrás do veículo que seguia à sua frente, sem manter a distância de segurança.

9. O condutor do veículo HJ, EE, conduzia esse veículo por conta e no interesse do seu proprietário.

10. A reparação permitirá que veículo ZO fique em condições de circular em segurança.

11. Após a reparação, e repostas as mesmas condições de segurança e todas as demais características, o veículo ZO não deixará de ser um veículo sinistrado, o que fará com que aos olhos de qualquer interessado ou posto à venda no ramo automóvel de usados o seu valor comercial seja diminuído.

12. O autor AA prestava, desde a data da aquisição do veículo ZO, todas as assistências de que o Ford necessitava em oficina competente, por forma a mantê-lo em boas condições de funcionamento, encontrando-se a própria pintura original e todo o seu interior em bom estado, sem apresentar quaisquer sinais de deterioração, designadamente, ferrugem ou outros sinais de ter tido qualquer acidente, o que efetivamente não se verificou.

13. A indemnização por perda total não permitiria ao autor adquirir um veículo semelhante ao veículo ZO.

14. A autora BB, quando apenas se deslocava com dificuldade através de canadianas, percorreu, muitas das vezes, para acorrer às consultas no Hospital da ..., mais de 100 metros a pé

15. O custo de aluguer de um veículo com as características do ZO ascende a quantia não inferior a 25,00 €/dia.

16. O veículo ZO tinha e tem, para o autor, um valor não só patrimonial mas sobretudo emocional, já́ que foi uma das primeiras e árduas aquisições do jovem casal, não equiparável ao seu valor de mercado.

17. À data do acidente o autor não pensava trocar, vender, ou de algum modo desfazer-se do veículo ZO, ou sequer, comprar outro carro, até porque nunca o poderiam fazer, pois não dispunham nem dispõem de condições económicas para tal.

18. Por razões de insuficiência económica, os autores nunca puderam comprar um outro veículo.

19. O autor AA apresenta, desde 22.11.2014, dor recorrente no joelho esquerdo que lhe dificulta a mobilidade articular na flexão e extensão, e dor no pé́ esquerdo, inchaço e dormência, que lhe limita a mobilidade das articulações do tarso de forma dolorosa, prejudicando a marcha, tendo dificuldade em calçar-se e em caminhar.

20. O autor AA ficou portador de um défice funcional permanente de integridade física não inferior a 5 pontos.

21. Por causa do acidente, o autor AA passou a sofrer de ansiedade e stress permanente.

22. O autor AA nunca mais conseguiu circular de carro e o simples facto de atravessar a rua cria-lhe ansiedade depressiva reativa.

23. O seu sentido de alerta está exacerbado, já́ que o simples travar mais brusco de um carro e/ou qualquer movimento súbito o faz rever mentalmente a situação vivida e ansiar e recear que vá acontecer tudo de novo.

24. Tornou-se mais vulnerável e de choro fácil.

25. Recorda, diariamente, o regresso da autora BB a casa, vinda do hospital, as noites sem dormir e o choro quase ininterrupto da sua filha CC, momentos em que teve que tomar a rédea de tudo.

26. A autora CC ficou a padecer de um défice funcional permanente de integridade física de, pelo menos, 2 pontos.

27. A autora CC ficou a padecer de um défice funcional permanente de integridade física não inferior a 3 pontos.

28. A autora BB revela início de osteoporose por desuso, provocada pelo tempo de imobilização.

29. Dias há́ em que a autora BB não consegue tratar da sua higiene e cuidados pessoais, sendo-lhe nesses dias difícil andar e executar tarefas domésticas.

30. A autora BB não pode conduzir.

31. O carrinho de bebé da autora CC, trio, marca BebeConfort, que seguia na mala em estado novo ficou inutilizável, com a manete partida, carrinho esse que havia custado 700,00€.

32. A cadeira tripartida do filho mais velho que se encontrava no banco de trás, no valor de 60,00€, ficou inutilizada.

33. No local onde ocorreu o despiste a que se alude em 1.6. havia visibilidade superior a 50 metros.

34. O condutor do veículo ZO esteve dentro dele a tentar por diversas vezes colocá-lo novamente em andamento, sem qualquer êxito.

35. O veículo EQ e o veículo que seguia à sua frente circulavam muito próximos da berma esquerda.

36. O autor AA, ao aperceber-se da trajetória desses veículos ainda acenou com os braços para alertar para a presença daquele obstáculo na via mais à esquerda da A..., atento o sentido de marcha norte/sul, tanto mais que pela via mais à direita não circulava qualquer veículo.

37. Quando o condutor do veículo EQ, tal como se refere em 1.95., se depara com o veículo ZO, este último está com a parte lateral direita embatida contra os railes referidos em 1.89. e sem qualquer tipo de sinalização ou luz que assinalasse a sua presença.

38. Após o que se refere em 1.105., o condutor do veículo EQ de imediato começou a alertar o trânsito para o sucedido através de sinais e gestos.

39. Na mesma data da comunicação a que se alude em 1.110., a ré enviou ao autor um recibo de indemnização com o valor correspondente a 33% do valor de mercado do veículo, deduzido do valor dos salvados.”

O Direito,

O tribunal recorrido surpreendeu três momentos na dinâmica do acidente, que, para melhor compreensão, se transcrevem:

“Conforme resulta da factualidade apurada, há três momentos na dinâmica do sinistro. Vejamos essa factualidade. Assim, tendo-se provado que “No dia 22.11.2014, pelas 18H10 horas, deu-se um acidente de viação na autoestrada A281 [cujo piso é em alcatrão e se apresentava molhado, em regular estado de conservação e aderência, sendo de noite, com a via iluminada e tempo chuvoso] no qual intervieram o ligeiro de passageiros, matrícula ..-..-ZO, conduzido pelo autor AA; o ligeiro de passageiros, matrícula EQ-..-.., propriedade de DD e por este conduzido e o ligeiro de passageiros, matrícula ..-HJ-.., propriedade de “A..., Lda.” e conduzido por GG”.

A – Num primeiro momento:

- O autor AA circulava no ZO, acompanhado das autoras - a sua mulher BB, que seguia no banco de trás, com a sua filha, a autora CC, com 3 semanas de vida, esta sentada no baby coque instalado no lugar traseiro -, a velocidade não apurada.

- O ZO despistou-se, vindo a ficar imobilizado na faixa da esquerda da A..., junto ao separador central, em sentido contrário ao que seguia.

- O autor e a sua mulher, receando eventuais embates, atento o trânsito existente, acionaram a luz avisadora de perigo do ZO e saíram do mesmo, tendo a autora BB retirado a filha CC do seu interior, após o que a colocaram no meio do separador central da A... e instalaram o triângulo de sinalização na frente do ZO.

B – De seguida:

- À frente do veículo EQ seguia um outro veículo (que retirava visibilidade ao condutor do EQ), o qual conseguiu desviar-se do veículo ZO [mas] o EQ veio a embater com a sua frente na frente do ZO, não obstante a sua tentativa de se desviar e evitar o embate frontal.

- Antes de embater no ZO, o EQ, atingiu de raspão o autor AA, designadamente o seu pé́ esquerdo, o qual se encontrava na faixa de rodagem a alguns metros do ZO.

- Ato contínuo, ao embater no ZO, o EQ arrastou-o contra o separador central, danificando a traseira lateral direita do veículo ZO, e contra a autora BB, a qual se encontrava junto à mala do veículo, no exterior, arrastando o corpo dela pelo chão até aos DPM (Dispositivos de Proteção de Motociclistas) do separador central.

- Após o embate, o EQ ficou imobilizado na posição referida infra (“atravessado em cima da linha contínua separadora das vias de trânsito”, tendo tido um início de incêndio.

C – Por último:

- Ao embate do EQ, seguiu-se ainda, passados que foram alguns segundos, o embate de outro veículo, o HJ, naquele veículo EQ - atravessado em cima da linha contínua separadora das vias de trânsito -, o qual, por sua vez, em virtude do embate do veículo HJ, volta a embater no veículo ZO, desta vez, na parte dianteira lateral esquerda.

- Após ambos os embates, a autora BB encontrava-se presa sob os DPM do separador central, junto ao rodado traseiro do lado direito do veículo ZO, mais concretamente, parte do corpo debaixo do veículo ZO, com a cabeça encostada ao pneu direito traseiro e as duas pernas debaixo dos DPM do separador central.

- O veículo ZO foi arrastado até ao separador central, ficando, após os embates, imobilizado, com a frente, as laterais e a traseira danificadas, não mais podendo circular; o EQ ficou imobilizado, atravessado em cima da marca M1 (linha contínua separadora de vias de trânsito), com a frente virada para o separador central e o HJ foi imobilizar-se no meio da via de abrandamento da saída para ..., com a frente danificada.”

Em face dos factos, considerou que os autores não tiveram culpa, que o autor, condutor do ZO não infringiu o disposto no art. 3º, nº 2 do Código da Estrada e que os veículos EQ e HJ violaram o disposto no art. 24º, nº 1 do CE.

Culpa dos autores:

Entende a Relação, ao contrário da sentença, que o condutor do ZO não invadiu inesperadamente a via. Desconhecendo-se a causa do despiste, a imobilização do veículo ZO passou a ser apenas um obstáculo na via.

Cremos que a Relação terá razão. Não existem fundamentos de facto para atribuir a imobilização do veículo ZO na via a qualquer comportamento censurável do autor enquanto condutor do ZO. Os recorrentes não lograram provar, pois, que o condutor do ZO tenha infringido qualquer disposição estradal.

Noutra perspectiva, insistem os recorrentes na violação pelos autores do art. 3º, nº 2 do C.Estrada.

Alega a Ageas, em particular, que o recorrente AA e a recorrente BB contribuíram para o acidente e para os danos que dele resultaram a partir do momento em que colocaram a menor CC no interior do separador central e permaneceram sem qualquer razão justificativa na faixa de rodagem.

Porém, o que se se sabe é que depois de instalado o triângulo de sinalização o condutor do EQ deparou com um vulto a gesticular na frente do veículo ZO, não se sabendo se o vulto aí permanecia na faixa de rodagem sem justificação ou se vinha de colocar o triângulo de sinalização (o que o obrigaria a deslocar-se dentro da faixa de rodagem).

Também não se sabe por que razão a autora se encontrava na traseira do veículo, quando o ZO sofreu o embate. Aliás, no que a esta respeita, não se vê como é que a autora, que se encontrava atrás do veículo ZO. podia impedir ou embaraçar o trânsito ou comprometer a segurança ou a comodidade dos utentes das vias.

Não se surpreende, assim da parte dos autores a violação do art. 3º, nº 2 do C.Estrada.

Alega, ainda, a Seguradoras Unidas que o autor infringiu o art. 88ª do Código da Estrada porque o triângulo de sinalização não estava a uma distância mínima de 30 metros. Todavia, tal não ficou provado.

Culpa dos condutores do EQ e do HJ:

A Relação imputou aos condutores do EQ e do HJ a violação do art. 24, nº 1 do Código da Estrada, segundo o qual “ O autor deve regular a velocidade de modo que, atendendo às características e estado da via e do veículo, à carga transportada, às condições metereolócias ou ambientais, à intensidade do trânsito e quaisquer outras circunstâncias relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente”.

Insurgem-se ambas as Seguradoras recorrentes contra este enquadramento.

Vejamos.

Condutor do EQ:

Revertendo ao caso sub judice, verifica-se que, efectivamente, nas circunstâncias de tempo e local em que ocorreu o acidente (de noite, com a via iluminada 21) o trânsito era intenso (83 e 92), em ambos os corredores de trânsito, o piso se encontrava molhado em virtude da chuva que na altura caía (20, 21 e 102).

Porém, também se provou que o piso se encontrava em regular estado de conservação e aderência (20).

Por outro lado, resultou apenas provado que o condutor do veículo EQ circulava no corredor esquerdo a velocidade não superior a 90 Km / h (91), o que significa que não se sabia a que a velocidade concreta o veículo EQ circulava abaixo dos 90 Km/H.

Além disso, não se provou a que distância é que o EQ conduzia do veículo que seguia à sua frente (8 e 93).

O que se sabe é que, subitamente, o condutor deste último veículo o guinou para a sua direita ( 94) e conseguiu desviar-se do veículo ZO, o que o EQ não logrou fazer ( 8 e 9 ), uma vez que- apesar de ter acionado os órgãos de travagem e de ter tentado desviar o veículo para a direita, evitando, com tal manobra, um embate frontal e directo no autor AA, que se encontrava na faixa de rodagem na frente do veículo ZO ( 99), a alguns metros deste ( 11) atingindo-o apenas de raspão, designadamente no pé esquerdo( 11 e 101)- embateu de frente no veículo ZO ( 9 e 101) que se encontrava imobilizado no mesmo corredor, com a frente virada para o EQ ( 95). E que o veículo que seguia à sua frente lhe retirava visibilidade (10).

Como se disse atrás, o art. 24º do Código da Estrada pressupõe a inverificação de condições anormais ou de obstáculos inesperados e imprevisíveis. Com efeito, “o dever do condutor de fazer parar o veículo no espaço visível à sua frente significa dever assegurar-se de que a distância entre ele e algum obstáculo visível é suficiente para o fazer parar em caso de necessidade, mas é disso pressuposto a inverificação de condições anormais ou de obstáculos inesperados, sobretudo os derivados da imprevidência alheia, por não lhe ser exigível que com eles conte” (Ac. STJ de 8.5.2003, proc. 03B444, em www.dgsi.pt); ou noutra formulação, “a regra, afirmada pelo nº1 do art. 24º do CE, de que o condutor deve especialmente fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente significa dever assegurar-se, no exercício da condução automóvel, de que a distância entre ele e qualquer obstáculo visível é suficiente para, em caso de necessidade, o fazer parar, regendo especialmente para os condutores que circulam com veículos automóveis à sua vanguarda e pressupõe a inverificação de condições anormais ou obstáculos inesperados e imprevisíveis, não lhe sendo exigível que contem com eles, nomeadamente os derivados da imprevidência alheia. (ponto I do sumário do Ac. STJ de 28.11.2013, proc. 372/07.6..., no mesmo site)

Ora, não é esperado nem previsível que, depois de o veículo que seguia à frente se desviar subitamente (94), um condutor se depare com um veículo imobilizado, virado em sentido contrário, com um vulto à frente desse veículo.

Ainda que assim não fosse, esse obstáculo sempre lhe devia ser visível, de modo a poder regular a velocidade.

Ora, o EQ tinha um veículo a sua frente que lhe retirava visibilidade.

Portanto, não se pode garantir que o obstáculo do veículo ZO lhe era visível antes de o veículo que o seguia se ter desviado da sua frente.

Pode observar-se que se o condutor do EQ tivesse guardado a distância necessária do veículo da frente se teria desviado como esse veículo que se desviou e como se desviaram outros veículos que passaram antes do Volkswagen.

Porém, as situações não são comparáveis: o veículo que seguia à sua frente pode ter avistado o triângulo e imobilizado o veículo a uma distância menor do que o EQ; e a perícia desse condutor pode ter sido outra.

Não se dispondo de dados exactos ou aproximados sobre a velocidade nem sobre as distâncias entre os veículos, torna-se difícil, assim, conjecturar, com a segurança possível, não apenas sobre a velocidade desejável do veículo EQ como sobre a destreza a e a perícia necessárias para evitar o embate no ZO, sendo que esta ultima matéria, ou seja, a apreciação da culpa decorrente da inobservância dos deveres gerais de diligência, mão constitui matéria de direito, enquadrável no âmbito de um recurso de revista ( cfr. Ac. STJ de 6.1.2020, , proc. 7624.12.1TBMAI.P1.S1)

Vejamos agora o condutor do HJ:

Após o embate no AA, com o embate no ZO, o EQ arrastou-o contra a autora BB que se encontrava junto à mala do veículo no exterior arrastando o corpo daquela até aos DPM do separador central (12), tendo o veículo EQ ficado imobilizado, atravessado em cima da linha contínua das vias de trânsito (14). Passados alguns segundos, apareceu o HJ que embateu na traseira do veículo EQ (86) que volta a embater no veículo ZO, ficando o EQ em cima da dita linha contínua, com a frente virada para o separador central (17), tendo o HJ ido imobilizar-se no meio da via de abrandamento da saída para ... (18), sendo que antes deste último embate passaram alguns veículos que se desviaram do local onde o EQ e o ZO se encontravam embatidos (108).

Pode dizer-se que a conduta do veículo HJ é mais impressiva do que a do EQ, na medida em que, não seguindo com qualquer veículo à frente, sempre teria mais visibilidade que o EQ,

Porém, não existem dados seguros sobre a visibilidade: não se provou que o condutor do HJ tivesse visibilidade superior a 50 m, como também não se provou que tivesse visibilidade inferior a 50 m.

Assim, não se conhecendo ´ a velocidade instantânea do HJ e a distância a que os veículos (estava não um mas dois veículos imobilizados na via) se depararam ao condutor do HJ, não é possível aferir do excesso de velocidade, a que se reporta o art. 24º do Código da Estrada

Concorrência de culpas:

Não se tendo provado a culpa de nenhum dos veículos intervenientes no acidente, fica prejudicada a questão da concorrência de culpas, nos termos do art. 570º, nº 1 do CC.

Responsabilidade pelo risco:

Mas se não se pode fazer a prova da culpa dos veículos seguros nas rés seguradoras, pode averiguar-se, oficiosamente, se o pedido dos autores procede à luz da responsabilidade pelo risco, salvo se dos autos resultar que a(s) vítima(s) só pretende(m) a indemnização se houver culpa do(s) réu(s), o que não é o caso, uma vez que os autores pediram a condenação dos réus, “solidariamente e/ou proporcionalmente em função da culpa e/ou risco apurado” (Pires de Lima e Antunes Varela, CC anotado, volume I, 3ª edição, Ac. STJ de 4.10.2007, Santos Bernardino, Ac. STJ de 9.12.2010, Álvaro Rodrigues e Ac. STJ de 21.1.2014, Azevedo Ramos, ambos em www.dgsi.pt).

Nos termos do art. 503º, nº 1 do Código Civil “aquele que tiver a direcção efectiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar no seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos danos provenientes dos riscos próprios do veículo, ainda que ele não se encontre em circulação.”

São duas, pois, as circunstâncias de que depende a responsabilidade pelo risco em caso de circulação automóvel: ter a pessoa a direcção efectiva do veículo causador do dano e estar o veículo a ser utilizado no seu próprio interesse.

A simples alegação da propriedade do veículo, sem a invocação expressa de quem tem a sua direcção efectiva e interessada, é suficiente para poder conduzir à procedência do pedido de indemnização emergente de acidente de viação formulado contra a Seguradora, na medida em que o ónus da prova de que o dono do veículo não tinha a sua direcção efectiva e de que a utilização dele não era feita no seu próprio interesse, cabe às rés seguradoras, como factos impeditivos que são (cfr. Ac. STJ de 29.1.2014, proc. 249/04.7TBOBR.C1.S1 e Ac. STJ de 6.1.2020, proc. 7624.12.1TBMAI.P1.S1, ambos no site do IGFEJ)

Ora, revertendo ao caso concreto, verifica-se que as seguradoras não alegaram nem provaram que os seus segurados não tinham a direcção efectiva do veículo nem que não o utilizavam no seu próprio interesse (art. 503º, nº 1 do CC).

As seguradoras devem, assim, responder pelos danos provenientes dos riscos próprios do veículo EQ e do. E esses riscos tanto têm a ver com os acidentes causados pelos veículos quando estavam em circulação, em movimento, como quando estavam parados (Pires de Lima e Antunes Varela, CC anotado, Vol. I, 3ª edição, pág. 487, Dário Martins de Almeida, Manual de Acidentes de Viação, Almedina, 3ª edição, a pág. 318 e segs., citados pelo Ac. STJ de 6.1.2020).

E que danos são os provenientes desses riscos?

Sobre o assunto, escreve Dario Martins, loc. cit: “Dentro dos pressupostos da responsabilidade civil, o dano indemnizável será aquele que estiver em conexão causal com o risco. Para traduzir esta ideia, a lei refere-se aos “danos provenientes dos riscos próprios do veículo”. O dano liga-se por um nexo causal ao facto material em que se configura o risco, não sendo, todavia, necessário um contacto material entre o veículo e o sinistrado ou entre duas viaturas (…). O dano terá sempre de ser condicionado por uma relação de causalidade, mesmo indirecta, com o facto em que se materializa o risco “(Ac. STJ de 6.1.2020)

É exacto que o facto de os autores se encontrarem na faixa de rodagem contribuiu causalmente para o acidente (12). E que a responsabilidade é excluída quando o acidente for imputável ao próprio lesado sendo que para os efeitos do art. 505 do Código Civil, não se mostra necessária a culpa, bastando a causalidade (P. Lima e A. Varela, CC anotado, I vol., 3ª edição, pág. 491).

Porém, quando o acidente não for exclusivamente imputável ao lesado ou a terceiro, a jurisprudência do STJ tem admitido, ultimamente, que o outro interveniente possa responder pelo risco, admitindo, inclusivamente, a concorrência da culpa com o risco, e que se sujeite a quantificação da indemnização à ponderação prevista no art. 570º do Código Civil (cfr., v.g., Acs. STJ de 4.10.2007. 5.11.2013, 11.7.2013, 17.5.2012 e 3.12.2009, em www.dgsi.pt.).

Ora, o acidente não resulta apenas do facto das vítimas, nem apenas de terceiro, pelo que estão, assim, reunidos os pressupostos da responsabilidade pelo risco do veículo EQ e do veículo HJ.

Todavia, pensamos que as contribuições causais destes veículos devem ser valoradas de forma diferente, consoante o tipo de danos considerado.

Riscos causais de danos na pessoa do autor:

Revertendo ao caso judice, verifica-se que os riscos próprios do EQ são, todos eles, adequados à produção dos danos sofridos pelo autor, no seu corpo (11 e 32).

Porém, atendendo à dinâmica do acidente, afigura-se-nos que a sua contribuição pelo risco deve ser valorada na proporção de 55%, sendo 30% para o ZO, imobilizado na via e 15% para o autor, que estava também dentro da via( e contribuiu também para o acidente).

Riscos causais de danos no/e com o veículo do autor:

Em relação ao veículo do autor, provou-se que o EQ atingiu a frente do veículo ZO (9) e que o arrastou contra o separador central, danificando a traseira lateral direita do veículo ZO (12).

E que, depois, por força do embate do HJ, volta a embater no veículo ZO na parte dianteira lateral esquerda (14), sendo que, após os embates, o veículo ZO foi arrastado até ao separador central, ficando imobilizado com a frente, as laterais e a traseira danificadas, não mais podendo circular (16).

Ou seja: o risco do EQ foi adequado à produção de todos os danos sofridos pelo veículo do autor em consequência do acidente (22).

Porém, em relação ao HJ, afigura-se-nos que o seu risco é apenas potencialmente causador dos danos sofridos pelo veículo ZO, na parte dianteira lateral esquerda (14). Na verdade, não está demonstrado que o HJ tenha contribuído para os danos que o veículo sofreu na parte da frente e traseira lateral direita.

Atendendo a que o ZO estava parado na via, o EQ embateu duas vezes no ZO, uma delas por força do embate do HJ e que o HJ embateu uma vez no EQ, distribuem-se assim os riscos, em relação aos danos sofridos pelo veículo ZO, na parte dianteira lateral esquerda : 20% para o ZO, 40% para o EQ, 30% para o HJ (que embateu no EQ e o levou ao embate no ZO) e 10% para o autor (que estava na via, da 1ª vez que o EQ apareceu).

Em relação aos danos sofridos pelo veículo na parte da frente e traseira lateral direita distribuem-se, assim, os riscos: 55% para o veículo EQ, 30% para o ZO e 15% para o autor.

Riscos que causaram os danos sofridos pela autora:

Como se provou, foi o EQ que arrastou o veículo ZO contra a autora, a qual se encontrava junto à mala, no exterior, arrastando (através do ZO) o corpo daquela pelo chão até aos DPM do separador central (12)

Quanto ao HJ, verifica-se que o risco do mesmo é apenas adequado aos danos sofridos pelo veículo do autor, na parte dianteira lateral esquerda. O HJ não está na origem das lesões do autor, produzidas apenas pelo EQ, nem das lesões sofridas pela autora, pois, quanto a esta, não ficou provado que o ZO, que sofreu novo embate do EQ, por força do HJ, tenha dessa vez, atingido a autora.

Também aqui se deve atender que o risco de um veículo parado em sentido contrário (ainda que sinalizado com a luz avisadora de perigo e um triângulo de sinalização a distância que se desconhece) é um risco importante. Porém, deve ser valorado em maior risco o de veículos em andamento, uma vez que o seu potencial causador de acidente é maior.

Pensamos, assim, que o risco do EQ deve ser valorado: em 10% da autora, que se encontrava ainda na via, 20% para o veículo ZO (parado na via), e 70% para o veículo EQ (que dá origem ao embate do ZO na autora).

De acordo com a referida distribuição dos riscos, analisemos então os danos.

Danos do autor:

Foi atribuída ao autor a indemnização de € 3.000 a título de indemnização de danos não patrimoniais da responsabilidade da ré Seguradoras Unidas, indemnização que não foi questionada pelo próprio, nem pela seguradora.

Como assim, não se altera a fixação de tal indemnização.

Já vem questionada, no entanto, a condenação da ré seguradora a reembolsar o autor do IUC pago.

Tendo em conta que o autor procedeu ao pagamento do imposto de circulação do veículo ZO relativo aos anos de 2015 e 2016, no valor global de 110,00€ (31) e que o autor não podia de deixar de cumprir essa obrigação, a Relação condenou a ré Seguradoras Unidas a pagar ao autor a quantia de € 100 (terá havido lapso na não condenação em € 110).

Insurge-se a ré contra tal condenação, argumentando que, face à recusa das rés em se responsabilizarem pela reparação do ZO, assim como face à confessa incapacidade anímica do autor para voltar a conduzir (artigo 61º da PI), o autor podia e devia ter cancelado a matrícula do seu veículo, para o que pagaria uma taxa de € 10,00, não ficando sujeito ao pagamento do IUC, pelo que deve, dessa forma, o valor condenatório de € 100,00, a título de IUC, ser reduzido para o total de € 10,00, cabendo ao autor receber a proporção de 2/3 do mesmo (€ 6,66).

O dano é de € 110, não se nos afigurando que o autor tenha concorrido para o agravamento do dano. Num contexto em que pretendia a recuperação do veículo, afigura-se-nos que, mau grado a recusa das seguradoras em se responsabilizarem pelo valor integral da reparação, não lhe era exigível que cancelasse a matrícula, aliás, não se provou que o autor estivesse ciente dessa possibilidade de cancelar a matrícula para evitar o pagamento do IUC.

Tendo em consideração que para a imobilização do veículo contribuíram os veículos segurados, o veículo do autor e este próprio, afigura-se-nos que, tendo em conta a divisão de risco atrás operada, que faz recair sobre a ré Seguradoras Unidas a responsabilidade pelo risco de 40% e sobre a ré Ageas a de 30% em relação aos danos sofridos pelo veículo na parte dianteira lateral esquerda e 55% sobre a ré seguradoras unidas em relação aos demais danos ( danos da frente e traseira lateral esquerda), a responsabilidade das seguradoras (dependente do valor dos danos sobre o qual irá incidir a sua responsabilidade pelo risco) deverá ser apurada em incidente de liquidação, devendo incidir sobre a quantia de € 110 a mesma responsabilidade pelo risco das seguradoras que for calculada relativamente aos danos e à sua valoração que forem apurados, por um lado, em relação à parte dianteira lateral esquerda do veículo ZO (da responsabilidade conjunta das seguradoras) e, por outro, em relação à frente e traseira lateral direita do veículo (exclusivamente produzidos pelo veículo seguro na ré Seguradoras Unidas)

Custo da reparação do ZO/ valor venal de mercado:

A Relação condenou as rés solidariamente a pagar ao autor a quantia correspondente ao custo da reparação de € 8.761,70, por entender que, apesar de ultrapassar o valor venal do veículo (aliás, somado ao valor dos salvados de € 800, ultrapassa em 120 % esse valor) a reparação não se revela materialmente impossível.

Sustenta a Seguradoras Unidas (EQ) que deverá ser o valor venal do veículo o montante a arbitrar porque, para além de a reparação se afigurar excessivamente onerosa, traduzindo-se num ganho injustificado para o A. o montante de € 8.761,70 nunca repararia o ZO, antes o substituindo.

Mas não tem razão.

Em primeiro lugar, e conforme é jurisprudência pacífica, o art. 41º do DL 291/2007 de 21.8 apenas teria aplicação se a indemnização fosse acordada no âmbito do regime da proposta razoável, o que não é o caso (v., v.g., Ac. STJ de 3.11.2016, proc. 524/11.4TBALQ.L1.S1)

Assim, a apreciação deve enquadrar-se no disposto no art. 566º do CC.

E aqui vem a propósito o Ac. STJ de 31.5.2016, proc. 741/03.0TBMMN.E1.S, de que se destaca o seguinte sumário:

“ (…)

V - A excessiva onerosidade da reconstituição natural tem de ser aferida, não, apenas, em função da diferença entre o preço da reparação e o valor venal do veículo, mas, também, no confronto entre aquele preço e o valor patrimonial do veículo, como o valor de uso que dele retira o seu proprietário, sendo que a um insignificante valor comercial daquele pode corresponder a satisfação, em elevado grau, das necessidades do seu proprietário.

VI - É errado estabelecer-se a comparação entre o valor venal ou de mercado do automóvel, antes do acidente, por um lado, e o custo da sua restituição natural [reparação ou aquisição de bem idêntico, em valor e qualidades], por outro, porquanto os termos da relação são, antes, entre o valor necessário para a satisfação dos interesses legítimos do credor, por um lado, e o custo da restauração natural, por outro.

VII - A existência da excessividade da restauração natural resulta da verificação cumulativa de dois requisitos, sendo o primeiro o do benefício para o credor, consequente à reconstituição, e o segundo o de que esta se revele iníqua e abusiva, por contrária aos princípios da boa-fé, pelo que a reconstituição natural será, excessivamente, onerosa para o devedor e, portanto, de excluir, por inadequada, apenas, quando se apresente como um sacrifício, manifestamente, desproporcionado para o lesante, quando confrontado com o interesse do lesado na integridade do seu património.

(…)”

Assim, é errado estabelecer-se uma mera comparação entre o valor venal do veículo (€6.000) e o custo da sua restituição natural (€8.761,70), devendo atender-se também ao grau de satisfação das necessidades que aquele veículo, enquanto tal, proporciona ao seu proprietário ( cfr. Ac. STJ de 11.1.2005, proc. 0427006). Ora, como decorre da matéria de facto provada, o valor do veículo para o autor não se resume ao seu valor de mercado, tendo para ele indisfarçável utilidade (cfr. facto 24), sendo que não está demonstrado que um veículo adquirido agora no mercado por € 8.761,70 ofereça os mesmos préstimos que o veículo usado do autor.

A reconstituição natural só se deve considerar excessivamente onerosa para o devedor “quando houver manifesta desproporção entre o interesse do lesado que interessa recompor e o custo que a reparação natural envolve para o responsável” (Pires de Lima e Antunes Varela, C.C. anotado, 3ª edição, vol. I, 551).

Ora, não está demonstrado que exista significativa desproporção entre o valor que o veículo tem para os autores (que não se reduz ao valor venal) e o custo da reparação (€ 8.761,70). Não está, assim, demonstrado qualquer ganho injustificado para o autor.

Como acima se referiu, deve a responsabilidade pelo risco de as seguradoras ser apurada em incidente de liquidação, fazendo incidir a proporção da responsabilidade (já definida) sobre os valores dos diferentes danos que necessitam de ser apurados, por um lado, em relação à parte dianteira lateral esquerda do veículo ZO (da responsabilidade conjunta das seguradoras) e, por outro, em relação à frente e traseira lateral direita do veículo (exclusivamente produzidos pelo veículo seguro na ré Seguradoras Unidas).

Privação do uso.

Com apelo aos factos 24 a 29, a Relação entendeu que os factos mostram com clareza que a impossibilidade de utilização do veículo causou efectivos danos ao seu proprietário. Assim, entendeu, num juízo de equidade, fixar a indemnização no montante diário de 12 euros, montante que liquidou, à data do acórdão, na quantia de 25.572,00 (2131 dias x 12 euros).

Considera a ré Seguradoras Unidas que a indemnização se revela punitiva, motivo por sustenta a redução para € 6.000, reduzido, ainda, em 1/3; assim não se entendendo deverá o quantum diário ser alterado para 6 euros, competindo ao autor a quantia diária de 4 euros.

Também a Ageas considera que tendo havido perda total e tendo havido uma proposta de indemnização da referida perda total, não deveria ter havido lugar a indemnização a título de privação do uso, além de que, em seu entender, o recorrente não fez a necessária prova dos prejuízos causados por tal privação, sendo certo que não se justificaria a situação de inércia do autor, perante a decisão da seguradora, considerando que ainda que assim não se entenda, o valor diário arbitrado pela Relação se deverá considerar excessivo.

Em nosso entender, a privação do uso (sobretudo do veículo automóvel por virtude do acidente) que não implique prejuízo específico na esfera jurídica de quem de direito não confere direito a indemnização, transcrevendo-se por relevantes os seguinte arestos: os acórdãos de 3.5.2011 e 10.1.2012, relatados por Nuno Cameira e sumariados de forma idêntica “ I - A privação do uso de uma coisa pode constituir um ilícito gerador da obrigação de indemnizar, uma vez que impede o seu dono do exercício dos direitos inerentes à propriedade, isto é, de usar, fruir e dispor do bem, nos termos genericamente consentidos pelo art. 1305.º do CC. II - Não é suficiente, todavia, a simples privação em si mesma: torna-se necessário que o lesado alegue e prove que a detenção ilícita da coisa por outrem frustrou um propósito real – concreto e efectivo – de proceder à sua utilização”; os acórdãos do STJ de 12.01.2012 e de 03.10.2013, em que foi relator Fernando Bento, disponíveis, como os anteriores, em www.dgsi.pt, no último dos quais se expendeu, a propósito, o seguinte: “A privação do uso (ou da possibilidade de uso) só constitui dano ressarcível mediante a referenciação às concretas e efectivas utilidades atingidas ou cuja fruição se frustrou; só assim se concretizará tal dano em termos de susceptibilidade da medição através da teoria da diferença (art. 566º nº2 CC); o dano normativo da privação do uso – isto é, sem consideração daquelas utilidades - é meramente abstrato e não exprime uma diferença entre situações patrimoniais, a menos que seja concretizado e explicitado em factos reveladores do prejuízo e dos benefícios frustrados em que consistiu a impossibilidade de gozo”; o Acórdão do STJ, de 22.4.2015, Hélder Roque (relator), cujo sumário se transcreve: “III - A privação do uso só constitui dano ressarcível desde que demonstradas as concretas e efectivas utilidades atingidas ou cuja fruição se frustrou, só assim se concretizando tal dano, em termos de susceptibilidade de medição através da teoria da diferença (art. 566.º, n.º 2, do CC). O dano da privação do uso, sem consideração dessas utilidades, é meramente abstracto e não exprime uma diferença entre situações patrimoniais, a menos que seja concretizado e explicitado em factos reveladores do prejuízo e dos benefícios frustrados em que consistiu a impossibilidade de gozo(…) “

Ou seja: de acordo com a posição, atrás expressa, se a privação do uso representa um facto ilícito a obrigação de indemnização depende da existência de danos; e de um nexo de causalidade entre os mesmos e o facto, devendo a indemnização pecuniária ser medida em função da diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que teria nessa data se não existissem danos (art. 566º, nº 2 do CC). A indemnização não prescinde, pois, do apuramento dos factos que revelam a existência de dano na esfera patrimonial da pessoa afectada. Assim, a mera privação do uso, sem repercussão negativa no património do lesado não é susceptível de fundar qualquer obrigação de indemnização.

Revertendo ao caso sub judice, verifica-se que ficou provado:

“24. Os autores AA e BB utilizavam o ZO nas deslocações pessoais e profissionais diárias e de fim-de-semana do respetivo agregado familiar, designadamente, nas deslocações do autor AA para a Faculdade no ..., da autora BB para o trabalho, para transporte do seu filho mais velho à escola e da sua filha mais nova às consultas mensais no Centro de Saúde.

25. Na sequência do acidente não foi assegurada ao autor qualquer viatura de substituição do veículo ZO, não lhe foi facultada a reparação deste, tendo-lhe apenas sido proposta uma indemnização pela perda total, a qual não permitiria reparar o veículo ZO.

26. Desde a data do acidente - 22.11.2014 - o autor está privado da utilização do veículo ZO e, como a sua mulher, teve de se socorrer de transportes alternativos para as suas deslocações pessoais, familiares, profissionais, mas, sobretudo, para deslocações aos hospitais e para as consultas de fisioterapia da autora BB.

27. Com o veículo ZO, o autor e a sua família conseguiam organizar a sua vida.

28. O veículo ZO é de fevereiro de 2005.

29. Os autores socorreram-se do metro e do autocarro, nas deslocações que fizeram durante os anos de 2015 e 2016, entre outras, da morada do autor na ... à faculdade que frequenta, no ....

70. Desde a data do acidente que a autora BB esteve impedida de trabalhar, apenas tendo regressado ao trabalho em 4 de fevereiro de 2016.

73. No que se refere à autora BB e de acordo com o relatório pericial elaborado pelo INML: - a consolidação médico-legal das lesões sofridas foi fixada em 30.09.2016 (…);

75. À data do acidente, a autora encontrava-se a usufruir de licença parental, a qual terminou em 26.02.2015.

76. Desde 27.02.2015 até 03.02.2016 a autora esteve de baixa remunerada pelo I.S.S. por doença direta.”

Ou seja; ficou provado que os autores usavam a viatura nas deslocações do autor para a Faculdade, da autora BB para o trabalho e no transporte do seu filho para a escola e da sua filha mais nova às consultas mensais no Centro de Saúde; e que desde a data do acidente - 22.11.2014 - o autor e a sua mulher, autora, ficaram privados da utilização do veículo ZO e que tiveram de se socorrer de transportes alternativos para as suas deslocações pessoais, familiares, profissionais, mas, sobretudo, para deslocações aos hospitais e para as consultas de fisioterapia da autora BB, sendo que os autores se socorreram do metro e do autocarro, nas deslocações que fizeram durante os anos de 2015 e 2016, entre outras, da morada do autor na ... à faculdade que frequenta, no ....

Pode argumentar-se que não está provado que as viagens de metro e de autocarro (transportes alternativos) tenham tido um custo superior àquele que o autor teria se utilizasse o veículo.

Porém, é das regras de experiência comum que se o autor usava o seu veículo para a Faculdade no ..., para deslocar a autora BB para o trabalho, para transporte do seu filho mais velho à escola e da sua filha mais nova às consultas mensais no Centro de Saúde e se deixou de o fazer, passando os autores a andar de metro e de autocarro, designadamente, o autor entre a ... e a Faculdade do ... que frequenta, os autores deixaram de utilizar o mesmo veículo e passaram a utilizar diferentes transportes para os seus locais de trabalho, para a escola do filho, para as consultas da filha no Centro de Saúde, para os hospitais e para as consultas de fisioterapia, o que envolveu um acréscimo de despesas.

Está provado apenas que o fizeram durante os anos de 2015 e 2016, não se sabendo se o fizeram ulteriormente, não se podendo, assim, afirmar, com segurança ou previsibilidade, que os danos da privação do uso se tenham mantido a partir de 2016. Também não é possível extrapolar qualquer repercussão negativa no património do autor relativamente às deslocações pessoais e de fim de semana, na medida em que se desconhece a natureza das deslocações e os meios alternativos utilizados.

Como assim, remete-se para liquidação o apuramento do acréscimo de despesas que o autor teve desde o acidente e durante os anos de 2015 e 2016, relacionado com as deslocações do autor para a Faculdade do ..., da autora BB para o trabalho, do filho para a escola, para os hospitais, para as consultas mensais da filha no Centro de Saúde e para as consultas de fisioterapia da autora BB.

Por esse dano serão responsáveis as seguradoras solidariamente na mesma proporção da responsabilidade que for apurada em relação ao valor da reparação do ZO.

Danos na autora.

A autora foi vítima do embate do EQ no ZO,

O risco de um veículo parado em sentido contrário representa um risco importante. Porém, deve ser valorado em maior risco o de veículos em andamento, uma vez que o seu potencial de causador de acidente é maior.

Pensamos que o risco do EQ deve ser valorado: em 10% da autora, que se encontrava ainda na via, 20% para o veículo ZO (parado na via), e 70% para o veículo EQ (que dá origem ao embate na autora)

Dano biológico:

A Relação arbitrou a indemnização de € 33.000 a título de indemnização de dano biológico.

No seu recuso, a BB pediu a elevação da indemnização para € 73.000.

Por sus vez, a Ageas pediu a redução para € 20.000, caso se conclua que a autora deve ter direito a uma indemnização.

Em situação aproximada à destes autos ( em termos de idade, vencimento e incapacidade permanente), tendo o lesado, com 30 anos à data do acidente e que auferia € 750 mês, ficado com um défice funcional permanente de 15 pontos, sendo de admitir a existência de dano futuro, e tendo ficado privado ainda de réditos que auferia de cerca de €6.000/ ano, pela sua actividade de motociclista, que esperava prolongar por mais 10 anos, o Supremo considerou justificada (atentos os padrões jurisprudenciais) a indemnização por danos patrimoniais futuros (dano biológico) de € 60.000 fixada pela Relação ( cfr. Ac. STJ de 8.11. 2022, proc. 2133/16.2...).

Tendo a autora 33 anos à data do acidente, a IPP de 15% e um vencimento mensal de €679 (e uma esperança de vida aproximada de 50 anos) considera-se adequada a indemnização de € 54.000.

Tendo em conta a responsabilidade exclusiva pelo risco da seguradora Seguradoras Unidas na proporção de 70%, deve a mesma responder pela indemnização de € 37.800.

Assim, e neste aspecto, se julga procedente o recurso da Ageas e se dá parcial provimento ao recurso da autora.

Danos não patrimoniais:

Tendo em conta o sofrimento revelado no momento do acidente e posteriormente a este, a impossibilidade de acompanhar de imediato a filha bebé, a duração da doença, os tratamentos a que a autora esteve sujeita, as dores que lhe foram quantificadas e toda a envolvente das lesões e sequelas, em tempo, angústia e desgaste consideráveis, numa mulher jovem e que acabara, há poucos meses, de ter uma filha, a Relação atribuiu a indemnização de € 25.000 por danos não patrimoniais à recorrente BB.

Pugna a recorrente Ageas pela redução da indemnização para € 10.000, por a considerar adequada.

Mas é óbvia a sua falta de razão.

Voltando ao cotejo com o Ac. STJ de 8.11.2022: “ Tendo sido atribuído ao lesado de 30 anos um quantum doloris de 6 numa escala de 7, um dano estético relevante de 4 em 7 e repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer de 6 em 7 pontos - uma vez que, quanto a este índice, ficou privado de continuar a praticar o motociclismo, o que fazia com regularidade, participando em diversas provas, incluindo federadas e, ainda, impossibilitado de praticar desportos que também fazia, como bicicleta BTT, esqui na neve e esqui aquático, tendo ficado, ainda, condicionado no exercício da actividade desportiva de mergulho, que também praticava- a tudo acrescendo a circunstância de ter sido submetido a cinco intervenções cirúrgicas, com um pós-operatório prolongado (com uma repercussão temporária na actividade profissional total de 870 dias), de continuar a necessitar de medicamentos, consultas e tratamentos no futuro e de continuar padecer de dores, afigura-se ajustada a indemnização de € 70.000 por danos não patrimoniais que foi atribuída pela Relação.”

Ora, verificando-se que à autora foi atribuído quantum doloris de 5 numa escala de 7 (73) um dano estético de 3 em 7 (várias cicatrizes e encurtamento de 2 cm de um dos membro inferiores, atrofia da coxa de 1 cm e discretas limitações de mobilidade do tornozelo ) (61), uma repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer de 3 em 7 pontos ( não consegue correr nem praticar actividades físicas com impacto, 72), um período de repercussão temporária na actividade profissional de 439 dias, que sofreu e continua a sofrer dores, que tinha uma bebé para amamentar e tratar, tarefas para as quais precisou de ajuda, sendo que durante o internamento não pôde amamentar a sua filha., fazendo o cotejo com o Ac. STJ de 8.11.2022, afigura-se-nos que os danos não patrimoniais não podem ser compensados, por isso, mediante quantia inferior a € 25.000.

Aliás, consultando a jurisprudência mais recente, verifica-se, desde logo, que não se têm arbitrado indemnizações por danos não patrimoniais inferiores a € 25.000 a lesados com incapacidades não inferiores a 15%: cfr. Ac. STJ de 30.4.2020, proc, 69118/16, no site do ECLI, em que a um lesado de 56 anos, em que o quantum doloris era idêntico ao da lesada, se atribuiu indemnização de €25.000; e o Ac. STJ de 27.11.2018, proc, 46/13, em “Sumários” do STJ, em que o quantum doloris era também de 5/7 e o estético de 3/7 e se fixou indemnização por danos não patrimoniais no montante de €45.000.

No entanto, tendo a responsabilidade da ré “ Seguradoras Unidas“ sido fixada na proporção de 70%, a mesma ré deverá responder apenas por € 17.500.

Responsabilidade solidária das rés:

Nos termos do art. 507º, nº 1 do CC “se a responsabilidade recair sobre várias pessoas, todas respondem solidariamente pelos danos, mesmo que haja culpa”; nos termos do nº 2 “nas relações entre os diferentes responsáveis, a obrigação de indemnização reparte-se de harmonia com o interesse de cada um na utilização do veículo”, isto é, nas relações entre as seguradoras, a obrigação de indemnização repartir-se-á de acordo com a responsabilidade pelo risco que foi definida.

Assim, “…identificando-se uma pluralidade de responsáveis ( porque coexistem vários tipos de imputação, desde logo concorrência entre responsabilidade objectiva e subjectiva, pense-se, por ex., no concurso de responsabilidade do dono do veículo e do condutor comissário, locatário ou comodatário, ou no caso de diversos proprietários de um mesmo veículo, mas também, apesar da letra do nº 2, na hipótese de o acidente ser causado por vários veículos ou resultar da colisão destes) em face do lesado todos responderão solidariamente … “ ( Raul Guichard, Comentário ao Código Civil, Direito das Obrigações, 2018, pág. 422, em anotação ao art. 507º do CC).

Revertendo ao caso sub judice, verifica-se que o HJ não interveio no embate que vitimou o autor e a autora, razão por que, em nosso entender, não deve a seguradora Ageas ser condenada solidariamente nas indemnizações que lhes foram arbitradas ( pelos danos corporais).

Já deverá ser condenada solidariamente na indemnização que for apurada em incidente de liquidação relativamente ao valor da reparação do veículo.

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em, concedendo parcial provimento ao recurso da ré Ageas Portugal, Companhia de Seguros, S.A, ao da ré Seguradoras Unidas, S.A. e ao recurso da Autora BB:

a) revogar, em parte, o ponto 2 da decisão da Relação e absolver a ré Ageas dos pedidos da autora de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais;

b) revogar, em parte, o ponto 1 da decisão a Relação e condenar a ré Seguradoras Unidas, S.A, e a ré Ageas Portugal, Companhia de Seguros, S.A., solidariamente. a pagarem ao autor as quantias que se apurarem em incidente de liquidação relativamente ao valor da reparação do ZO e ao valor do IUC, calculadas de acordo com a responsabilidade que for atribuída às rés seguradoras, nos termos acima definidos, acrescida de juros desde a data da liquidação até pagamento;

c) manter a condenação da Seguradoras Unidas, S.A. a pagar ao autor AA a quantia de € 3.000,00, acrescida de juros desde a data da decisão da Relação até integral pagamento;

d) alterar o ponto 2 da decisão da Relação e condenar a ré Seguradoras Unidas S.A. e a ré Ageas Portugal, Companhia de Seguros, S.A., solidariamente, a pagarem, a título de indemnização de privação do uso, a quantia que se apurar em incidente de liquidação relativa ao acréscimo de despesas que o autor teve desde o acidente e durante os anos de 2015 e 2016, relacionado com as deslocações dele autor para a Faculdade do ..., da autora BB para o trabalho, do filho para a escola, com as deslocações para os hospitais, para as consultas mensais da filha no Centro de Saúde e para as consultas de fisioterapia da autora BB;

e) alterar o ponto 3 da decisão da Relação e condenar a ré Seguradoras Unidas a pagar à autora BB a quantia de € 60 804,30, acrescida de juros de mora, à taxa legal, sobre a quantia de € 55.300 fixada a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, desde a data da decisão da Relação até integral pagamento e juros de mora sobre a quantia de € 5.504,30 desde a data da citação até integral pagamento.

As custas da revista da recorrente Ageas ficam na proporção de ¼ para ela e ¾ para os autores, as da revista da recorrente Seguradoras Unidas na proporção de 65% para a mesma e 35% para os autores e a da autora/recorrente subordinada na proporção de 9/10 para os autores e 1/10 para a recorrente Seguradoras Unidas.


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Lisboa, 12 de Dezembro de 2023

António Magalhães (Relator)

Jorge Arcanjo

Maria Clara Sottomayor