Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
| Relator: | MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA | ||
| Descritores: | PROCESSO ESPECIAL REFORMA DOCUMENTO ESCRITO CASO JULGADO FORMAL PROVA TESTEMUNHAL ADMISSIBILIDADE | ||
| Nº do Documento: | SJ20071127013017 | ||
| Data do Acordão: | 11/27/2007 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | CONCEDIDA | ||
| Sumário : | 1. O processo especial de reforma de documentos, regulado no artigo 1067º e segs. do Código de Processo Civil, comporta uma fase inicial, prévia à citação e sem contraditório, que comporta produção de prova, destinada a que o autor, sumariamente, descreva o documento a reformar, justifique o interesse na sua recuperação e, caso alegue extravio, os termos em que o mesmo ocorreu; 2. Não adquire força de caso julgado formal, quanto à verificação dos requisitos de procedência da acção, a decisão de mandar seguir o processo, proferida no termo dessa fase, prevista na lei com o objectivo de evitar que prossiga uma acção manifestamente inviável; 3. É admissível prova testemunhal para proceder à reforma de um documento escrito que contenha um contrato-promessa de compra e venda de um imóvel, sem qualquer violação do disposto nos artigos 364º, nº 1, ou 393º, nº 1, do Código Civil, pois não se trata de substituir por testemunhas o documento legalmente exigido, mas de o reconstituir; 4. Para proceder o pedido de reforma, é necessário que a prova produzida permita considerar suficientemente descrito o documento a reformar, quer quanto ao respectivo conteúdo, quer quanto à sua aparência formal, mas apenas quanto aos aspectos relevantes. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA e mulher, BB, instauraram contra CC e DD uma acção especial de reforma de documentos, no tribunal da comarca de Fafe. Para o efeito, invocaram: – ter celebrado com os réus, em 15 de Novembro de 1999, um contrato-promessa no qual prometiam vender-lhes e estes se comprometiam a comprar os lotes de um terreno objecto do loteamento titulado pelo alvará nº 61/99, emitido pela Câmara Municipal de Fafe, pelo preço total de 40.000.000$00, dividido em três parcelas: a primeira, de 10.000.000$00, que já haviam recebido como sinal e princípio de pagamento, a segunda, também de 10.000.000$00, a pagar em 8 de Janeiro de 2000 e a terceira, de 20.000.000$00, a pagar na data da celebração da escritura; – que o contrato foi celebrado por escrito, por “documento (…) lavrado em dois exemplares, tendo os Autores ficado com um e os Réus com outro”; – ter entregado aos réus “fotocópias das peças do loteamento e do respectivo alvará”, assim possibilitando que tratassem da celebração da escritura; – que os réus não teriam cumprido o que ficara acordado, não tendo pago mais qualquer quantia nem procedido à marcação da escritura; – que, por essa razão, e após várias vicissitudes e diversas tentativas de os fazer cumprir, os notificaram de que decorrido determinado prazo, considerariam definitivamente não cumprido o contrato-promessa, “com as legais consequências”; – que a esta notificação os réus responderam nunca terem celebrado o contrato descrito pelos autores, mas que estes apenas lhes haviam prometido, verbalmente, vender-lhes “os lotes de um loteamento a especificar em momento posterior”, devendo assim ser-lhes restituídos os 10.000.000$00 que pagaram; – que posteriormente, quando os autores os notificaram de que consideravam resolvido o contrato-promessa, os agora réus propuseram contra eles uma acção pedindo a declaração de nulidade do contrato-promessa, por falta de forma; – que nessa acção, os ora autores, ao contestar, alegaram ter sido furtada a pasta onde AA guardava o seu exemplar do documento correspondente ao contrato, e requereram que a parte contrária fosse notificada para juntar o seu exemplar, o que não sucedeu; – que, portanto, se tornou necessária a propositura da presente acção, uma vez que, estando em causa um requisito de validade do contrato-promessa, precisavam de ter o documento correspondente para poderem reter a quantia que receberam a título de sinal, por incumprimento definitivo pelos promitentes compradores. Pelo despacho de fls. 50, foi considerada suficiente a prova testemunhal oferecida pelos autores para o efeito de continuação do processo; foi convocada e posteriormente realizada a conferência dos interessados, então citados, prevista no nº 2 do artigo 1069º do Código de Processo Civil. Não tendo havido acordo, os réus contestaram, os autores replicaram e a acção prosseguiu os seus termos, chegando a estar suspensa a requerimento das partes por mais de uma vez. A 3 de Abril de 2006, foi proferida a sentença de fls. 201, que julgou a acção procedente, nos termos conjugados do disposto nos artigos 367º do Código Civil e 1069º do Código de Processo Civil. 2. Tal sentença todavia, veio a ser revogada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de fls. 311, de 14 de Dezembro de 2006. Após ter considerado que, em abstracto, é admissível a reforma judicial de documento que contenha um contrato promessa de compra e venda de um imóvel e que, no caso, não podia proceder a impugnação da decisão sobre a matéria de facto deduzida pelos apelantes, desde logo por não ter sido gravada a prova testemunhal produzida, a Relação concedeu provimento à apelação por entender que “a matéria de facto é insuficiente para a procedência da acção”, pois “desconhece-se por completo que forma reveste o documento cuja reforma é pretendida”. Na parte que agora especialmente releva, a Relação afirmou: “Ora nestes autos que têm uma tramitação especial, o que se pretende reformar é o documento que deve ser descrito completamente quer quanto à forma quer quanto ao conteúdo. A reprodução integral supõe uma memória privilegiada e tanto não é exigido (…). Na impossibilidade de dar uma imagem perfeita, cumpre ao autor indicar, pelo menos, os termos e caracteres essenciais do título, os elementos que permitem identificá-lo (…). Ora da descrição fornecida pelos recorridos desconhece-se qual o tipo de papel, qual a cor, qual o formato, se foi impresso ou manuscrito (…). Acresce que quanto ao desaparecimento/destruição existe confusão na alegação dos recorridos pois se o documento foi furtado, deixou de estar na sua posse (aí a necessidade de reforma) e logo é evidente que não podem saber se foi ou não destruído. Estes detalhes não requerem memória privilegiada. Os recorridos no seu articulado não descrevem minimamente o documento mas o seu conteúdo. E foi esta versão que foi levada à base instrutória. Os autos nunca deviam ter passado da fase inicial pois a lei só exige prova sumária quanto à justificação do interesse na recuperação e quanto às circunstâncias em que o mesmo saiu da posse do requerente – art. 1069º, 2ª parte. No tocante à descrição é claro o comando «descreverá os títulos» – art. cit. 1º parte Repete-se: nada do exigido pela lei ocorreu, mas o processo prosseguiu para julgamento”. 3. Inconformados, os autores interpuseram recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça. Na sua alegação, formularam as seguintes conclusões: “1. Tendo julgado improcedentes todas as conclusões da apelação, o tribunal recorrido não podia revogar a decisão apelada a coberto do conhecimento, ex officio, de questão não suscitada pelos apelantes, que só por inépcia destes não foi submetida à apreciação do tribunal de recurso, não podendo, pois, este substituir-se àqueles sob pena de violar o caso julgado formado, como ensina o Prof. A. dos Reis in Código de Processo Civil Anotado, III, pág. 308. sob pena de os recorrentes se verem prejudicados por tal violação; 2. No tocante à questão propriamente dita da insuficiência da matéria de facto para a procedência da acção, a relação exorbitou nas suas exigências quanto ao que deve ser entendido como «descrição do documento» prevista no art. 1069º, nº 1, do CPC, mormente quando fez defender tal procedência da necessidade de se descrever o tipo de papel, a sua cor e formato e se foi impresso e manuscrito, pois o próprio Prof. Alberto dos Reis não vai tão longe nessa exigência quando limita essa descrição no caso de desaparecimento ou extravio de documentos, à descrição da sua forma e conteúdo ou em última análise, isto é, quando tal não seja possível, à descrição dos termos e caracteres essenciais do documento, que permitam identificá-lo; 3. Pelo que ao referir-se a caracteres essenciais certamente não quis reportar-se ao tipo de letra (manuscrita ou impressa) mas antes às características particulares do documento, que deixam de ter sentido pelo menos na data atribuída ao documento – 15/11/99 – em que não era exigível papel selado, de cor azul e o vulgarmente utilizado se reconduz à folha A4, com o contrato reduzido a escrito em letra de imprensa (máquina de escrever ou computador) tanto mais que o documento foi acompanhado e entregue aos RR. com fotocópias das peças do loteamento e respectivo alvará(…); 4. Assim sendo, a matéria de facto que a relação considerou fixada é manifestamente suficiente para a procedência da acção e consequente reforma do título, face ao disposto nos arts. 367 do CC e 1069 e sgs. do CPC, que, para além dos arts. 684, nº 3 e 690, do CPC, se mostram violados pelo douto acórdão recorrido.” Os recorridos contra-alegaram, defendendo a confirmação do acórdão recorrido. 4. A matéria definitivamente considerada provada neste processo é a seguinte: “1. Os RR. intentaram contra os AA. a acção ordinária nº 349/00, que corre termos pelo 1º juízo deste tribunal Judicial da comarca de Fafe. 2. Na petição inicial os R. persistem em alegar a celebração de um contrato-promessa verbal de compra e venda de um terreno loteado; 3. E pedem a declaração de nulidade desse contrato e a restituição da quantia de Esc. 10.000.000$00 (dez milhões de escudos), acrescida de juros vencidos de 542.260$00. 4. Os AA. contestaram aquela acção, alegando a existência de um contrato-promessa de compra e venda reduzido a escrito, tendo como objecto o loteamento e como preço a quantia de 40.000.000$00 celebrado em 15 de Novembro de 1999; 5. Mais alegaram os AA. que ficaram com um exemplar daquele contrato-promessa, tendo os RR. ficado com o outro. 6. Os AA. têm necessidade do documento escrito que titula o contrato-promessa para defesa do seu direito de fazer sua a dita quantia de Esc. 10.000.000$00 que receberam a título de sinal dos réus; 7. Em 15 de Novembro de 1999, entre os AA., como promitentes vendedores e os Réus, como promitentes compradores, foi celebrado um contrato-promessa de compra e venda, reduzido a escrito, através do qual aqueles prometeram vender a estes, que prometeram comprar àqueles, os oito lotes de terreno que formam o loteamento titulado pelo alvará nº 6/1999, emitido pela C. M. de Fafe. 8. Pelo preço total de 40.000.000$00 (…), tendo naquela data da celebração do contrato-promessa os Réus pago aos AA., como sinal e princípio de pagamento, a quantia de Esc. 10.000.000$00 (…), de que estes deram quitação. 9. E a restante parte do preço, na importância de 30.000.000$00 (…) clausulou-se ser paga em duas prestações, uma de Esc. 10.000.000$00 (…) em 8 de Janeiro de 2000 e a outra e última de Esc. 20.000.000$00 (…), na data da celebração da escritura. 10. A escritura teria de ser celebrada até dia 31 de Março de 2000, devendo os RR. tratar de toda a documentação referente à outorga da mesma. 11. O documento contrato-promessa foi lavrado em dois exemplares, tendo os AA. ficado com um e os RR. com outro. 12. Os AA. entregaram aos RR fotocópia das peças do loteamento e do respectivo alvará. 13. Pelo que os RR., para além de terem ficado com um exemplar do dito contrato-promessa de compra e venda, também ficaram com aqueles documentos referentes ao loteamento. 14. No mês de Março de 2000 furtaram ao A. Marido a pasta onde este trazia os documentos, designadamente o contrato-promessa em causa. 15. Os autores do furto ficaram com a pasta e respectivos documentos, não tendo os AA. conseguido a sua restituição”. 5. A questão fundamental que é colocada no âmbito do presente recurso de revista prende-se, portanto, com os requisitos legalmente exigidos para ser determinada judicialmente a reforma de um documento que desapareceu – no caso, por ter sido dado como provado que foi furtado ao seu titular. Em especial, e antes de mais, está em causa determinar se os factos tidos como provados são ou não suficientes para se considerar descrito o documento cuja reforma se pretende. O acórdão recorrido entendeu que se exige uma descrição “quer quanto à forma, quer quanto ao conteúdo”, e que os autores da acção não cumpriram a primeira parte desta exigência. Os recorrentes discordam do acórdão, por dois motivos: – Porque entendem que, não tendo sido invocada nas conclusões do recurso de apelação a agora decretada insuficiência de factos, a Relação excedeu os poderes de que dispunha para julgar o recurso, assim incorrendo em violação de caso julgado por apreciar questão já definitivamente assente na acção, como resultaria do disposto nos nºs 3 e 4 do artigo 684º, nos artigos 690º e 1069º do Código de Processo Civil e 367º do Código Civil; – Por não terem fundamento as exigências que a Relação considerou não cumpridas para haver como descrito o documento cuja reforma foi pedida. 6. É sabido que o objecto de um recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, como fundamentalmente decorre da conjugação entre os nºs 3 e 4 do artigo 684º do Código de Processo Civil. E é igualmente sabido (não relevando agora a possibilidade de ampliação prevista no artigo 684º-A) que, por essa via, o recorrente está a delimitar também os poderes de cognição do tribunal de recurso, como claramente resulta da conjugação daqueles preceitos com o disposto no nº 2 do artigo 660º do Código de Processo Civil, aplicável à apelação nos termos do nº 2 do artigo 713º, também do Código de Processo Civil. A infracção destas regras determinará, em regra, a nulidade do acórdão, por excesso de pronúncia (artigos 716º, nº 1 e 668, nº 1, d), do mesmo Código). Os agora recorrentes, todavia, não vêm arguir a nulidade do acórdão recorrido, como se poderia deduzir, nomeadamente, da citação que fazem da obra de Alberto dos Reis, ao longo das alegações de recurso; antes o acusam de, por esta via, ao conhecer oficiosamente de questão não suscitada pelos recorrentes, violar o caso julgado entretanto formado, em seu prejuízo. Não é, todavia, procedente esta acusação. Em primeiro lugar, note-se (como, aliás, os agora recorridos apontam nas contra-alegações da revista) que não é exacto afirmar-se que se trata de questão silenciada nas alegações que apresentaram na apelação; vejam-se, em particular, as conclusões nºs 26 a 30º, nas quais se sustenta que a prova produzida não é suficiente para se considerar descrito o documento, de modo a permitir a sua reforma. Em segundo lugar, porque a invocação de prejuízo do caso julgado já formado quando à suficiência da matéria provada para se considerar descrito o documento só poderia ter apoio no disposto no artigo 1069º do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 1073º. Na verdade, o processo especial de reforma de documentos, regulado nos artigos 1069º e segs. do Código de Processo Civil, comporta uma fase inicial, prévia à citação e, portanto, sem contraditório, em que o autor tem de descrever os documentos e justificar sumariamente o interesse na sua recuperação e, caso se trate de extravio (seja qual tiver sido a causa), os termos em que ele ocorreu. É manifesto que nada do que se apurar nessa fase inicial – na qual, note-se, se produz prova – se pode considerar definitivamente assente, sob pena de não ter sentido todo o processamento que se segue e que, naturalmente, inclui a prova do preenchimento (ou não) de todos os requisitos necessários à procedência da acção (cfr. em especial o nº 1 do artigo 1071º). Bastaria, aliás, a verificação de que decorre sem contraditório para afastar qualquer definitividade da conclusão a que o tribunal chegasse. A lei apenas não quer que prossiga um processo quando é manifesto, logo nesta primeira fase, que a acção é inviável (como, por exemplo explica José Alberto dos Reis, em Processos Especiais, II, reimp., Coimbra, 1982, pág. 71, esclarecendo que, neste fase, “o juiz deve contentar-se com prova indiciária, com prova de probabilidade e verosimilhança”). Ora, apesar de o acórdão da Relação ter resumido essencialmente a duas as questões colocadas pelos então recorrentes (admissibilidade de reforma judicial de um contrato-promessa de compra e venda de imóvel e modificabilidade da decisão de facto), a verdade é que tal afirmação, nem obrigava o mesmo Tribunal a não tomar em consideração que os recorrentes sustentaram adequadamente o não preenchimento do requisito da descrição do documento, nem o impedia de o dar como não verificado, nomeadamente tendo em conta o carácter não definitivo da decisão de mandar seguir o processo após a fase inicial acabada de referir. Improcede, pois, a acusação de violação do “caso julgado formado”, por parte dos ora recorrentes. 7. Já o mesmo se não pode entender quanto à questão de saber se o documento se deve ou não considerar suficientemente descrito para efeitos de ser determinada a sua reforma, nos termos em que decidiu o acórdão recorrido. Está fora dos poderes do Supremo Tribunal de Justiça, enquanto Tribunal de revista, introduzir qualquer modificação no julgamento da matéria de facto, a não ser nos limites do disposto nos artigos 722º, nº 2 e 729º do Código de Processo Civil; aliás, os ora recorrentes não a impugnam no presente recurso. O processo de que nos ocupamos destina-se a reconstituir – a reformar – um documento que os autores da acção dizem que continha um contrato-promessa de compra e venda (bilateral) de coisa imóvel, tal como foi dado como provado. Não está, portanto, de forma alguma em causa uma eventual infracção das regras contidas nos artigos 364º, nº 1 e 393º, nº 1, do Código Civil, que não permitiriam “substituir” o documento em falta por prova testemunhal, caso em que o Supremo Tribunal de Justiça poderia intervir. É, aliás, essa impossibilidade de “substituição” que explica a necessidade de recorrer ao processo de reforma, como se sabe. A questão agora está, portanto, em apurar se os factos provados são ou não suficientes para se poder considerar descrito o documento desaparecido, e, assim conceder provimento à revista. O acórdão recorrido entendeu que, do ponto de vista do conteúdo, a descrição era suficiente, decisão que não merece qualquer observação. Considerou-o, todavia, não suficientemente descrito do ponto de vista da forma, ou, se quisermos, da sua aparência material, pois, como se viu, entendeu que os autores da acção não indicaram qual o tipo de papel do documento, qual a sua cor ou formato, ou se foi impresso ou manuscrito (aspecto sobre o qual houve depoimentos contraditórios das testemunhas). Quanto à descrição externa do documento, não há dúvida de que os elementos apontados pelo acórdão recorrido nem foram alegados, nem, portanto, provados; sucede, todavia, que são irrelevantes para o efeito da reforma do documento especificamente em causa. Não é possível, a não ser pondo em causa o julgamento da matéria de facto, considerar não suficientemente descrito o documento. Na verdade, dele decorrem os elementos suficientes para tornar materialmente viável a reforma: trata-se de um documento particular, sem qualquer intervenção notarial, assinado por autores e réus (caso contrário não poderia ter ficado assente que uma e outros se haviam comprometido, através do documento desaparecido, a celebrar o contrato definitivo). Na verdade, a reforma não implica a reconstituição de um documento material ou externamente igual ao reformado; nomeadamente, no caso, é totalmente irrelevante que o documento tenha sido manuscrito ou dactilografado. 8. O mesmo se diga, por fim, quanto ao requisito do “desaparecimento/destruição”: tendo ficado provado que o documento foi furtado e que os autores não conseguiram a sua restituição, tanto basta para ser julgado procedente o pedido de reforma, adequado em ambas as hipóteses (cfr. artigo 1072º do Código de Processo Civil). Nem é agora possível averiguar se, no caso, seria ou não exigível a publicação de anúncios referida neste último preceito, pois que, mesmo que se concluísse pela positiva, estaria totalmente precludida a hipótese de invocar qualquer eventual nulidade decorrente da sua omissão. 9. Nestes termos, concede-se provimento à revista, revoga-se o acórdão recorrido e determina-se a reforma do documento correspondente ao contrato-promessa de compra e venda, nos precisos termos constantes dos factos provados, tal como se decidiu em primeira instância. Custas pelos recorridos. Lisboa, 27 de Novembro de 2007 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (relatora) Salvador da Costa Ferreira de Sousa |