Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4730/08.0TVLG.L1.P1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: JOÃO TRINDADE
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
RESPONSABILIDADE EXTRA CONTRATUAL
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS FUTUROS
PERDA DA CAPACIDADE DE GANHO
RETRIBUIÇÃO
AJUDAS DE CUSTO
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
INCAPACIDADE PERMANENTE PARCIAL
EQUIDADE
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 03/15/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE
Sumário :

I - Na fixação de indemnização devida por danos patrimoniais futuros (dano biológico), no respeito pelos critérios a que aludem os arts. 562.º a 566.º do CC, importa ter presente: (i) o tempo previsível de vida – e não à esperança de vida activa – do lesado e as suas perspectivas profissionais; (ii) o facto do pagamento da indemnização ser efectuado de uma só vez; (iii) as reais consequências do acidente, como o sejam a incapacidade permanente sofrida, fazendo (iv) intervir a equidade.
II - No cálculo do capital produtor do rendimento que a vítima auferia antes do acidente – por forma a aquilatar da diferença aritmética entre a actual situação patrimonial do lesado e aquela que existiria se não tivesse ocorrido o dano – deve tomar-se em atenção o rendimento pela mesma auferido, nela se incluindo todas as parcelas pagas como contrapartida da actividade profissional que exercia, pagas regular e periodicamente, ainda que sob a rubrica “ajudas de custo”.
III - Revelando os factos provados que: (i) o autor tinha 57 anos de idade à data do acidente; (ii) era pessoa saudável antes do acidente; (iii); auferia € 500 de salário acrescidos de quantias entre € 1280 e € 2560 de “ajudas de custo” (v) as sequelas de que ficou a padecer determinaram-lhe uma IPP de 25%, afigura-se justa e apropriada a quantia de € 35 000, de indemnização por danos patrimoniais, ao invés da quantia de € 16 000, arbitrada pelas instâncias.
IV - Apurando-se, ainda, que (i) o autor foi assistido no Hospital, onde regressou tempos depois, por dificuldade de locomoção, tendo realizado exames complementares de diagnóstico, após o que lhe deram novamente alta para o domicílio; (ii) por se manterem as dores e as dificuldades na marcha, o autor foi submetido a diversos tratamentos medicamentosos e de fisioterapia; (iii) a 30.11.2006, (iv) o autor foi operado ao ombro esquerdo por ruptura da coifa dos rotadores, e fez acromioplastia com sutura do supra espinhoso; (v) em 2008, foi operado ao joelho; (vi) sofreu dores logo após o embate, durante as 2 operações e restantes tratamentos, dores essas que continua a sentir e continuará a sentir para o resto da sua vida; (vii) ficou com a marcha claudicante, o que o envergonha; (viii) não pode fazer caminhadas, pois fica com dores; (ix) não pode pegar em pesos, e tem dificuldades em se baixar; (x) era uma pessoa afável e bem disposta; (xi) é agora ríspido e agressivo com amigos e familiares; sente-se um inválido e que (xii) o acidente foi provocado por culpa exclusiva do condutor do veículo seguro, é equitativa a quantia de € 15 000, arbitrada pelas instâncias, a título de dano não patrimonial.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1- AA intentou,

em 2008-11-24 contra Companhia de BB , SA acção de condenação, com processo ordinário, para efectivação de responsabilidade civil emergente de acidente de viação, pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe:

a)    € 226.756,37 a título de indemnização por danos patrimoniais;

b)    € 20.000,00 a título de compensação pelos danos não patrimoniais;

c)     Juros de mora contados, à taxa legal, sobre as quantias acima indicadas, desde a citação e até integral pagamento.


2 - Para tanto e em síntese alegou que:
Foi interveniente em acidente de viação ocorrido por culpa exclusiva do condutor de veículo automóvel, tendo a ré, por contrato de seguro, assumido a obrigação de indemnizar terceiros por danos decorrentes da utilização daquele.

Do acidente decorreram para si danos patrimoniais e não patrimoniais.


3- Devidamente citada para a causa, a Ré contestou reconhecendo a verificação do acidente de viação invocado na p.i., bem como a culpa do condutor do veículo automóvel por si segurado.

Alegou ainda que, em consequência do acidente, o autor ficou a padecer de uma incapacidade de apenas 1%, e não sofreu qualquer lesão no joelho.

Impugna também, por desconhecimento, a verificação e extensão dos danos invocados pelo autor.

Concluiu pela improcedência da acção.

O autor apresentou réplica, mantendo o que anteriormente alegou e concluindo como na p.i..

                              

4-Foi proferido despacho que saneou o processo e fixou os factos tidos como provados, elaborando-se base instrutória com os que subsistiam como controvertidos (fls. 117 e segs ).

                                       
5- Após realização da audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença (fls.252 e segs) em que se decidiu da seguinte forma:

I.     Julgo a presente acção parcialmente procedente, e, em consequência, condeno a ré “Companhia de Seguros BB”, a pagar ao autor AA a quantia global de € 44 856,37, acrescida de juros de mora contados, à taxa legal, desde a citação e até integral reembolso;

II.    Julgo a presente acção improcedente na parte restante.

                                   
6-Inconformado recorreu desta decisão o Autor concluindo:
1. A título de perdas salariais, o tribunal considerou ser de atribuir ao A. um indemnização no valor de 18.500,00€, correspondente a uma impossibilidade de exercer a actividade profissional durante 3 anos e um mês.
2. Salvo melhor opinião, o tribunal recorrido decidiu com base numa premissa errada, ou seja, numa remuneração mensal de apenas 500,00€. E, errada porquanto o ganho efectivo do A. era substancialmente superior, aliás tal como o tribunal o reconhece designadamente no que se reporta à matéria de facto dada como provada e elementos que serviram para fundamentar a resposta à mesma.
3. Ora, de folhas 22 a 32, consta o contrato de trabalho firmado entre o A. e a dita empresa S......l, Lda., ou seja, temos que o tribunal fundamentou a sua decisão no teor daquele documento conferindo-lhe credibilidade.
4. A entidade patronal suportava os custos com o transporte, alimentação e alojamento dos seus trabalhadores pelo que, todo e qualquer montante pago aos trabalhadores, designadamente ao A., revestia carácter remuneratório.
5. Temos assim que, o A. tinha uma remuneração média mensal de pelo menos entre 1.780,00€ a 3060,00€, ou seja, 2.420,00€ e, é precisamente este o valor que deve ser considerado no cálculo indemnizatório a título de perdas salariais.
6. Deve assim ser alterada a douta sentença nesta parte, atribuindo-se ao A. a título de perdas salariais a quantia de 104.060,00€ (33.880,00€ X 3 anos + 2.420,00€).
7. A título de IPG, considerou o tribunal ser de atribuir ao A. uma indemnização de 7.100,00€ sendo que, para o cálculo desta indemnização levou em consideração uma remuneração mensal de 500,00€ apenas e uma esperança média de vida activa de 65 anos apenas. Considerou ainda que o A. ficou a padecer de uma IPP de 25 pontos quando tinha 57 anos apenas.
8. No que diz respeito ao valor remuneratório, dá-se por reproduzido o atrás alegado em sede de perdas salariais, ou seja, salvo melhor opinião, deveria o tribunal ter considerado um salário médio mensal da ordem dos 2.420,00€, ou seja, uma remuneração média anual da ordem dos 33.880,00€, dispensando-se mais considerandos sob pena de repetição.
9. A idade a considerar como limite de vida activa é os 70 anos e, por outro lado há a considerar que os efeitos da incapacidade ultrapassam a idade da reforma e acompanham os sinistrados, no caso o A., ao longo de toda a sua vida, até à morte.
10. Isto posto e reformulando o cálculo, sempre será devida ao A. uma indemnização a título de danos patrimoniais emergentes da IPP de que ficou a padecer, nunca inferior a 110.110,00€ (33880,00€ X 25% X 13 anos), assim devendo ser alterada a douta sentença recorrida.
11. A título de Danos Não Patrimoniais, entendeu o tribunal a quo ser de ressarcir o A. com o valor de 12.500,00€, valor este que, salvo melhor entendimento, se mostra manifestamente insuficiente para ressarcir o A. de todas as maleitas sofridas e a sofrer em virtude do acidente dos autos, devendo, por isso mesmo e atenta a matéria de facto dada como provada, ser alterada a douta sentença nesta parte, atribuindo-se ao A. quantia nunca inferior a 20.000,00€ a título de danos não patrimoniais.
12- A douta sentença viola o disposto nos artigos 483º, 496º, 562º, 564º, todos do C.C.
Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente alterando-se a douta sentença em conformidade.

A ré contra-alegou concluindo pela improcedência da apelação.

                                        
7- A Relação (fls.297 e segs), julgou parcialmente procedente a apelação condenando a ré a pagar ao autor a quantia de € 59.256.37 (cinquenta e nove mil, duzentos e cinquenta e seis euros e trinta e sete cêntimos), mantendo-se o mais decidido.

8. É desta decisão que vem interposta revista (fls.317 e segs) pelo A., que encerra as alegações com as seguintes conclusões:

1- A título de perdas salariais, o tribunal recorrido considerou ser de atribuir ao A. uma indemnização no valor de 21.500,00€, correspondente a uma impossibilidade de exercer a actividade profissional durante 3 anos e um mês.

2- O ganho efectivo do A. era substancialmente superior, alcançando uma média mensal de 2.420,00€, aliás tal como resultou provado.

3- Ora, sendo o A. um trabalhador especializado já com 57 anos ou seja, com uma longa carreira profissional, não é crível que fosse trabalhar para a Suécia por um salário base de apenas 500,00€. Nem os indiferenciados o fazem, quanto mais um trabalhador experimentado e com a idade do A., privando-se da família, dos amigos e do conforto do lar para ir para um clima tão frio e viver em condições como vemos que vivem os trabalhadores da construção civil.

4- É regra, ou manifestamente usual, as empresas remunerarem os trabalhadores com ajudas de custo como forma de pagarem o efectivo trabalho sem que tenham que suportar os encargos que seriam devidos caso declarassem o efectivo valor remuneratório (Seg. Social e IRS).

5- Aliás de outra forma, não se pode entender a oscilação de valores das ditas ajudas de custo.

6- Se as mesmas fossem para fazer face a encargos extra, então seriam valores uniformes ao longo dos meses, situação que se não verifica tanto mais que, aquela verba destinava-se a pagar efectivo trabalho desempenhado pelo A., pagamento esse que, para não ser contabilizado a título de segurança social e impostos, era camuflado sob a capa das "ajudas de custo".

7- Basta ver o doc. 7 junto com a PI (contrato de trabalho) onde consta no seu anexo que o preço hora era de 12,00€. Mesmo que o A. trabalhasse 8 horas por dia apenas, ganharia por dia pelo menos 96,00€ (12X8) e pelo menos em 22 dias 2.112,00€

8- Mas, ainda que assim não fosse, necessariamente teremos que considerar o valor das ajudas de custo na remuneração porquanto era com tal valor que o A. fazia face a despesas tomo alimentação, alojamento e transporte, entre outros, ou seja, era com esse valor que o A. se sustentava.

9- Ao deixar de trabalhar por força do sinistro, deixou também de auferir não só os 500,00€ mas, uma média de pelo menos 2.420,00€ e, é precisamente este o valor que deve ser considerado no cálculo indemnizatório a título de perdas salariais.

10- Deve assim ser alterado o douto acórdão recorrido nesta parte, atribuindo-se ao A. a título de perdas salariais a quantia de 104.060,00€ (33.880,00€ X 3 anos + 2.420,00€).

11- Considerou o tribunal recorrido ser de atribuir ao A. uma indemnização de 16.000,00€ a título de perda de capacidade de ganho (IPG) sendo que, para o cálculo desta indemnização levou em consideração uma remuneração mensal de 500,00€ apenas (X14 meses / ano) e uma esperança média de vida activa de 70 anos.

12- Considerou ainda que o A. ficou a padecer de uma IPP de 25 pontos quando tinha 57 anos apenas, contabilizando o prejuízo apenas a partir dos 60 anos.

13- No que diz respeito ao valor remuneratório, dá-se por reproduzido o atrás alegado em sede de perdas salariais ou seja, salvo melhor opinião, deveria o tribunal ter considerado um salário médio mensal da ordem dos 2.420,00€ ou seja uma remuneração média anual da ordem dos 33.880,00€, dispensando-se mais considerandos sob pena de repetição.

14- O tribunal os efeitos sinistrados, quo errou ao considerar apenas a esperança de vida activa tanto mais que da incapacidade ultrapassam a idade da reforma e acompanham os no caso o A., ao longo de toda a sua vida, até à morte sendo expectável que o A. viva pelo menos até aos 75 anos de idade.

15- Por outro lado, levou em consideração uma taxa de juro da ordem dos 5%, valor manifestamente exagerado tanto mais que a taxa de juros líquida efectivamente paga pelas aplicações financeiras sem risco, não ultrapassa os 3%.

16- Isto posto e reformulando o cálculo, ainda que se considere que o A. irá receber de uma só vez o que iria receber ao longo de anos, sempre será devida à A. uma indemnização a título de danos patrimoniais emergentes da IPP de que ficou a padecer, nunca inferior a 110.110,00€ (33880,00€ X 25% X 15 anos), assim devendo ser alterada a douta decisão recorrida.

17- A título de Danos Não Patrimoniais, entendeu o tribunal a quo ser de ressarcir o A. com o valor de 15.000,00€, valor este que, salvo melhor entendimento, se mostra manifestamente insuficiente para ressarcir o A. de todas as maleitas sofridas e a sofrer em virtude do acidente dos autos, devendo, por isso mesmo e atenta a matéria de facto dada como provada, ser alterada a douta sentença nesta parte, atribuindo-se ao A. quantia nunca inferior a 20.000,00€ a título de Danos Não patrimoniais, tanto mais que o sofrimento irá acompanhar o A. até final da sua vida.

18- A douta sentença viola o disposto nos artigos 4832,4962, 5629,5642, todos do C.C.

A R. seguradora contra-alegou defendendo a improcedência do recurso.

                                       9- Matéria de facto:

1-    No dia 29 de Novembro de 2005, cerca das 19 h 10 m, no entroncamento da Avª Oliveira Zina com a rua Vale de Achas, Valongo, ocorreu um acidente de viação, no qual foram intervenientes o veículo automóvel de matrícula 00-00-00, pertença de CC, na altura conduzido por DD, e o veículo de matrícula 000000000, pertença do autor e por este conduzido.

2-    O autor circulava na Avª. Oliveira Zina, sentido Sul – Norte.

3-    O veículo automóvel de matrícula 00-00-00 seguia pela Avª. Oliveira Zina, mas em sentido oposto.

4-    O condutor do veículo automóvel de matrícula 00-00-00 pretendia virar à sua esquerda, para assim aceder à rua Vale de Achas.

5-    A rua Vale de Achas entronca na Avª. Oliveira Zina pela esquerda, atento o sentido de marcha do veículo automóvel de matrícula 00-00-00.

6-    No local, a Avª. Oliveira Zina configura uma recta, e encontra-se dividida em 3 vias de trânsito, sendo duas no sentido Norte – Sul, e uma em sentido oposto.

7-    Os sentidos de trânsito encontram-se separados por uma linha longitudinal contínua inscrita no pavimento, sendo que, na área de intersecção das duas vias, tal linha é descontínua.

8-    O trânsito no aludido entroncamento é regulado por semáforos.

9-    Estando o sinal verde para os veículos que circulam em ambos os sentidos da AVª. Oliveira Zina, encontra-se também amarelo intermitente para quem, como o veículo automóvel de matrícula 00-00-00, se desloca naquela avenida no sentido Norte – Sul e pretende virar à esquerda para passar a circular na rua Vale das Achas.

10-  O veículo automóvel de matrícula 00-00-00 circulava pela fila da esquerda das duas que lhe eram permitidas.

11-  Quando alcançou o entroncamento atrás referido, não parou e virou à sua esquerda.

12-  Nesse mesmo momento, e a 5 metros, circulava o autor, que, perante o surgimento do veículo automóvel de matrícula 00-00-00 à sua frente, travou, acabando por embater.

13-  O embate ocorreu a cerca de 1,5 metros da berma direita, atento o sentido de marcha do autor, e na sua faixa de rodagem.

14-  Tal embate deu-se entre a frente do veículo do autor e a frente do lado esquerdo do veículo automóvel de matrícula 00-00-00.

15-  Em consequência do embate, o autor foi projectado para o chão.

16-  O veículo automóvel de matrícula 00-00-00 não efectuou qualquer sinalização antes ou durante a manobra de mudança de direcção à esquerda.

17-  O proprietário do veículo automóvel de matrícula 00-00-00 havia transferido para a ré a responsabilidade civil por danos causados a terceiros na condução e por aquele veículo, através da apólice nº 00000000000.

18-  À data do acidente, o autor tinha 57 anos de idade.

19-  Com o acidente, o autor tombou ao chão.

20-  Assistido pelo INEM, o autor foi transportado para o Hospital de Valongo, onde deu entrada no serviço de urgência.

21-  No Hospital de Valongo, ao autor foi efectuado RX da coluna lombo-sagrada e da bacia, tendo-lhe sido prescrita medicação analgésica.

22-  Tempos após o acidente, e por dificuldade de locomoção, o autor regressou ao Hospital de Valongo, onde realizou exames complementares de diagnóstico.

23-  Após o que lhe deram novamente alta para o domicílio.

24-  Por se manterem as dores e as dificuldades na marcha, o autor foi submetido a diversos tratamentos medicamentosos e de fisioterapia.

25-  A 30 de Novembro de 2006, o autor foi operado ao ombro esquerdo por ruptura da coifa dos rotadores, e fez acromioplastia com sutura do supra espinhoso.

26-  Em 2008, o autor foi operado ao joelho.

27-  O autor é canhoto.

28-  Neste momento, e como sequelas definitivas, o autor apresenta:

a.     Claudicação da marcha;

b.    Dores na anca direita;

c.     Dores no ombro esquerdo;

d.    Fobia na circulação de motociclos;

e.     Alterações de humor; e

f.     Alterações de personalidade.

29-  As sequelas referidas em 28- determinam ao autor uma incapacidade permanente geral de 25 pontos.

30-  O autor, no decurso do ano de 2005 (pelo menos entre Abril e inícios de Novembro de 2005), desenvolveu actividade ao serviço da empresa “S......l, Ld”, com a categoria de tubista, prestando o seu trabalho na Suécia.

31-  O autor, no âmbito da actividade referida em 30º, auferiu mensalmente € 500,00 a título de salário e entre € 1.280,00 e € 2.560,00, a título de ajudas de custo.

32-  O autor poderia exercer a sua actividade profissional até aos 70 anos de idade.

33-  Em transportes em automóvel próprio para tratamentos de fisioterapia e consultas, entre 16 de Janeiro de 2006 e 13 de Outubro de 2006, o autor despendeu € 1.000,00.

34-  Em despesas médicas e medicamentosas, o autor despendeu a quantia de € 5.756,37.

35-  O autor sofreu dores logo após o embate, durante as 2 operações e restantes tratamentos.

36-  Dores essas que continua a sentir.

37-  E continuará a sentir para o resto da sua vida.

38-  Ficou com a marcha claudicante.

39-  O que o envergonha.

40-  O autor não pode fazer caminhadas, pois fica com dores.

41-  O autor não pode pegar em pesos, e tem dificuldades em se baixar.

42-  O autor era uma pessoa afável e bem disposta.

43-  Sente-se um inválido.

44-  É ríspido e agressivo com amigos e familiares.

10-O mérito da causa:

Ao presente recurso são aplicáveis as alterações introduzidas pelo DL nº 303/2007, 24/8 ( artº 11º, nº 1 deste mesmo diploma legal),ao Código de Processo  Civil.

O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões neles insertas, salvo as questões de conhecimento oficioso - arts. 684º, nº3 e 690º do Código de Processo Civil.

As questões a resolver são as seguintes:

A. Danos patrimoniais futuros -Indemnização - Salário - Ajudas de custo

B. Danos patrimoniais futuros – Indemnização - Esperança de vida -Taxa de juros

C. Danos não patrimoniais - Indemnização

                                        A- Danos patrimoniais futuros - Indemnização - Salário - Ajudas de custo

Conclusões  1 a 11ª

O acento tónico do recorrente, neste ponto, assenta no entendimento que as ajudas de custo devem ser consideradas como integrante do salário e como tal entrar no cálculo da indemnização.

Na sentença da 1ª instância afirmou-se o seguinte:

O autor, pelo menos entre Abril e Novembro de 2005, exerceu actividade profissional como tubista, na Suécia, auferindo, como salário, a quantia mensal de € 500,00, acrescida de valor a título de ajudas de custo, que mensalmente variou entre € 1 280,00 e € 2 560,00 (cfr. pontos 30- e 31- da matéria de facto provada).

Ora, esta última parcela referida manifestamente não pode ser considerada no valor da indemnização a atribuir ao autor, por na essência corresponder a contrapartida que a entidade patronal do autor lhe disponibilizaria como correspectivo de despesas que o autor teria de efectuar precisamente por se encontrar a prestar serviço (literalmente, as ajudas de custo).

Trata-se de valor que representa compensação por despesas acrescidas que acompanham a efectiva prestação de trabalho – despesas que não existem, naturalmente, se o trabalhador não exerce funções.

Logo, atento o princípio consagrado no nº 2 do artigo 566º do Código Civil, o valor que o autor deixou de auferir a título de ajudas de custo no seu património foi compensado pela não realização de despesas com deslocações para trabalhar.

Conclui-se, pois, que o valor da remuneração média mensal, relevante para o que nos ocupa, que o autor auferia (14 vezes num ano) à data do acidente em causa nos autos, ascende a (apenas salário base) € 6 000,00.

A Relação subscreveu este entendimento e acrescenta que as ajudas de custo que o autor pretende ver incluídas na "retribuição", não representam mais do que uma compensação pelas despesas acrescidas que acompanham a prestação de trabalho numa situação específica, que é ocorrer em país estrangeiro (cfr. art. 260º nº 1 a) do CTrab). Isto mesmo é o que resulta, parece-nos, do teor do contrato de trabalho que o autor juntou a fls. 22 e segs. (clª. 5ª).

É certo também que não ficou demonstrado que as ajudas de custo excedessem os montantes normais daquelas despesas.

Contrariamente ao que vem alegado pelo Recorrente, não era a entidade patronal quem suportava os custos com a alimentação e alojamento dos trabalhadores; como decorre da clª 9ª, a entidade patronal só era responsável pelas despesas com o transporte do trabalhador desde Portugal até ao local de trabalho. Não existe, por isso, fundamento para que se reconheça às aludidas ajudas de custo carácter remuneratório.

Vejamos:

As instâncias não consideraram como integrante da retribuição do A./recorrente, o que este auferiu a título de ajudas de custo. (31- O autor, no âmbito da actividade referida em 30º, auferiu mensalmente € 500,00 a título de salário e entre € 1.280,00 e € 2.560,00, a título de ajudas de custo.)

Discordamos.

Decorre, a contrario sensu, do n.º 3 do art. 566.º do CC, que a indemnização por danos patrimoniais deve corresponder, sempre que possível, ao valor exacto dos danos.

“O conceito de prejuízo impõe, para o seu cálculo, a teoria da diferença consagrada no art. 566.º do CC, isto é, a diferença aritmética entre a actual situação patrimonial do lesado e aquela que existiria se não tivesse ocorrido o dano.

Importa assim considerar aquilo que o lesado perdeu ou virá a perder, independentemente do título jurídico pelo qual fazia parte do seu património (ressalvadas as situações que pela sua ilicitude não merecem a tutela do Direito). ([1])

Na sequência, porque no caso se trata de uma prestação com carácter regular, fazendo parte integrante no respectivo contrato, apesar de incerta quanto ao respectivo quantitativo não lhe retira a natureza de retribuição, de rendimento e como tal deve entrar no cálculo da indemnização.

A lei 100/97-13/9 (Lei de Acidentes de Trabalho) no nº 3 do artº 26º reforça a posição que defendemos já que nele se entende por retribuição mensal tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas mensalmente que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios.

Também o D.L. 442-A/88-30/11(Código do Imposto sobre o Rendimento das  pessoas Singulares – IRS) aponta no mesmo sentido quando ao longo das várias alíneas do artº 2º contempla “gratificações”,”comissões”,”subsídios”, ”senhas de presença”,”remunerações acessórias, ainda que periódicas, fixas ou variáveis, de natureza contratual ou não”.

Se assim não fosse estaríamos desfasados da realidade da vida que a situação em apreço, paradigmática, nos transmite e que o Autor/recorrente faz ressaltar quando afirma que sendo um trabalhador especializado já com 57 anos ou seja, com uma longa carreira profissional, não é crível que fosse trabalhar para a Suécia por um salário base de apenas 500,00€. Nem os indiferenciados o fazem, quanto mais um trabalhador experimentado e com a idade do A., privando-se da família, dos amigos e do conforto do lar para ir para um clima tão frio e viver em condições como vemos que vivem os trabalhadores da construção civil.

Também a jurisprudência deste Tribunal vai neste sentido conforme se pode constar entre outras na

Revista n.º 1077/05 - 6.ª Secção 03-05-2005

IV - No cômputo da indemnização pelos danos patrimoniais futuros, decorrentes da IPP de 20%, as instâncias consideraram a remuneração normal, a quantia paga por força da cláusula da CCT e uma parte das ajudas de custo recebidas pelo autor.

Revista n.º 1474/02 - 2.ª Secção 20-06-2002

I - O conceito de retribuição abrange todos os benefícios outorgados pela entidade patronal que se destinem a integrar o orçamento normal do trabalhador, conferindo-lhe a expectativa do seu recebimento, pela sua regularidade e continuidade.

II - O subsídio mensal pago sob a incorrecta denominação de ajudas de custo, como contrapartida do trabalho em regime de deslocação com carácter regular no estrangeiro, deve considerar-se como integrando retribuição nos termos dos art.ºs 82 e 87, 2.ª parte, da LCT, pelo que deve ser tido em linha de conta para efeitos do cálculo da indemnização por ITA determinada pelas lesões sofridas em acidente de viação.

Revista n.º 4092/05.8TBAVR.C1.S1 - 1.ª Secção 29-04-2010

I - É de considerar integrado na retribuição do trabalho o subsídio de alimentação, pois que no conceito legal (e laboral) de retribuição abrange-se não só retribuição base (salário propriamente dito), mas todas as demais prestações pecuniárias ou não, satisfeitas com carácter de regularidade e de continuidade.

II - Para a determinação da indemnização parcelar pela incapacidade temporária absoluta para o trabalho (ITA), emergente de acidente de viação, são devidos 11 meses de subsídio de alimentação (excluindo o mês de férias), constituindo, tal como o salário base, um lucro cessante que, por virtude do acidente, o autor deixou de auferir.

III - Os prémios de produtividade e assiduidade, visto que se trata de prestações que não têm carácter regular e periódico, podendo ou não ser atribuídos consoante as circunstâncias de cada caso concreto, face ao nível de dedicação e eficiência do trabalhador, não podem integrar-se no conceito de retribuição a que o autor tivesse uma legítima expectativa de os vir a receber se não fora o acidente.

Definido este ponto importa agora chegar ao montante justo.

Como se escreveu no acórdão deste STJ de 17-12-2009 de que foi Relator o Exmo Conselheiro Serra Baptista (in http;//www.dgsi.pt,),

…tem a nossa jurisprudência vindo a fazer um esforço de clarificação dos métodos a adoptar para alcançar tal necessário objectivo, visando o estabelecimento de critérios de apreciação e de cálculo de danos que reduzam ao mínimo o subjectivismo do tribunal e a margem de arbítrio que, embora jamais se possa excluir destes juízos, se pretende minimizar o mais possível.

Tendo vindo a assentar-se, tal como de forma generalizada se explicitou no citado ac. deste STJ, de 17/6/08, nos seguintes princípios e ideias que presidirão à quantificação da indemnização em apreço e que aqui e agora assim se esquematizam para maior facilidade de exposição e compreensão do nosso pensamento:

a) A indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não auferirá e que se extinguirá no período provável da sua vida;

b) No cálculo desse capital interfere necessariamente, e de forma decisiva, a equidade, implicando o relevo devido às regras de experiência e àquilo que, segundo o curso normal das coisas, é razoável;

c) As tabelas financeiras por vezes utilizadas para o alcance da indemnização devida, terão sempre mero carácter auxiliar, indicativo, não substituindo, de modo algum, a devida ponderação judicial com base na equidade;

d) Deve sempre ponderar-se que a indemnização será paga de uma só vez, o que permitirá ao seu beneficiário rentabilizá-la em termos financeiros, e, assim, considerando-se esses proveitos, deverá introduzir-se um desconto no valor achado, sob pena de se verificar um enriquecimento abusivo do lesado à custa de outrem (o que estará contra a finalidade da indemnização arbitrada);

e) Deve ter-se preferencialmente em conta a esperança média de vida da vítima (,,,) pois, mantendo-se o dano fisiológico para além da vida activa, é razoável que, num juízo de equidade sobre o dano ora em causa, se apele à esperança média de vida)”.

Por conseguinte, os critérios matemáticos de cálculo do capital correspondente à indemnização por danos patrimoniais futuros são apenas um instrumento ao serviço do juízo de equidade, devendo os resultados alcançados funcionar como valores de referência que devem ser ponderados com outros elementos objectivos cuja relevância emerge e se impõe naturalmente ao julgador (como são o percebimento de uma só vez e em antecipação da indemnização correspondente a danos que se prolongam no futuro por vários anos, a evolução provável da sua carreira profissional, da taxa de juro, etc).

Tratando-se de danos patrimoniais futuros e dada a impossibilidade de averiguar exactamente este tipo de danos futuros, nomeadamente, por incapacidade de prever o tempo exacto de duração da capacidade profissional do lesado, por impossibilidade de prever a evolução do montante salarial, ou da sua eventual e hipotética mobilidade laboral, além da impossibilidade de quantificar exactamente o acréscimo de esforço que a incapacidade gera para o lesado desempenhar a sua função profissional, há que fazer intervir a equidade, nos termos do art. 566.º, n.ºs 2 e 3, do CC.

Assim afigura-se-nos justo e adequado o montante de  27.500,00.

                                         

B- Danos patrimoniais futuros – Indemnização - Esperança de vida-Taxa de juros

Conclusões  11ª a 14ª

Neste ponto põe em causa o A. recorrente a esperança média de vida activa de 70 anos que o acórdão recorrido teve em conta, quando deveria ser de 75 anos e a taxa de juro de 5% usada no cálculo quando devia ser de 3%.Defende assim uma indemnização título danos patrimoniais emergentes da IPP um montante nunca inferior a 110.110,00€(33880,00x25%x15 anos)

Na sentença, pelo referido dano patrimonial, foi fixada a indemnização de € 7.100,00.

O Recorrente sustenta que essa indemnização não deve ser inferior a €110.110,00, tendo em conta a retribuição média anual de € 33.880,00, a incapacidade de 25% e o período de 13 anos.

A Relação ponderou que deve ser atendida uma esperança de vida até, pelo menos, aos 70 anos, uma vez que, como tem sido afirmado, finda a vida activa do lesado não é razoável ficcionar que a vida física desaparece no mesmo momento e com ela todas as suas necessidades[2].

Considerando, pois, um período de 10 anos (57 anos de idade mais três anos em que o autor esteve afectado de incapacidade temporária), o rendimento mensal de € 500,00 (14 meses/ano), a incapacidade permanente de que o autor ficou afectado (25%), a taxa nominal líquida de 5% e uma taxa anual de crescimento da prestação de 3%, atinge-se o montante arredondado de € 16.000,00, em que a indemnização deve ser fixada.

Vejamos:

Na indemnização do dano futuro decorrente de IPP deve atender-se que o A. era uma pessoa saudável antes do acidente, tinha 57 anos à data do acidente, a IPP foi fixada em 25%, a retribuição total mensal por aquele auferida já fiada no ponto 1 , à taxa de juro do capital produtor do rendimento que, neste momento não será inferior a 3% ao ano.

 Acresce que temos de atentar ao à esperança de vida e não à esperança de vida activa, sendo que esta actualmente se situa nos 75 anos de idade.([3]) na diferença entre o rendimento que auferiria ao longo do tempo caso não tivesse sofrido a IPP e aquele que irá auferir com a lesão e ainda a evolução da unidade monetária em que a indemnização se irá exprimir

Só assim se logra, «reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação» - artº 562º do CCivil.

Tudo ponderado afigura-se-nos adequada uma indemnização de 35.000.00 €.

C- Danos não patrimoniais - Indemnização

Conclusão  17ª

Defende o A./recorrente que indemnização a este título deve ser fixada em 20.000,00€.

A 1ª instância entendeu que o autor sofreu danos não patrimoniais de relevo (dores; submissão a diversos tratamentos e intervenções cirúrgicas; claudicação da marcha; fobia na circulação de motociclos; alterações de personalidade), que, manifestamente, merecem a tutela do direito (artigo 496º do Código Civil), não se verificando motivos que justifiquem a limitação equitativa do seu valor (a que se refere o artigo 494º do Código Civil).

Partindo do critério orientador fixado no artigo 494º do Código Civil, considerando a natureza das lesões sofridas pelo autor, as dores que sofreu (recordando-se que o IML fixou em 5 o nível das dores sofridas pelo autor, em 2 o nível do dano estético causado) e que continuará a sofrer (pontos 36- e 37- da matéria de facto provada) – e tendo ainda em conta que no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Maio de 2007 (disponível em www.dgsi.jstj.pt/) foi considerada adequada a quantia de € 9 000,00 para compensação de sofrimento físico-psíquico resultante de susto e receio pela própria vida nos instantes anteriores ao embate; de traumatismo torácico anterior e do nariz e das escoriações da face; de dores no grau 2 em escala de 7 durante mais de 10 meses, e a sua continuação em caso de esforço físico e mudanças de tempo; de sequelas de cervicalgias bilaterais no pescoço; de toracalgia mediana anterior; de insónias, irritabilidade, ansiedade, défice mnésico progressivo e incapacidade geral permanente de 8%; e sempre tendo em conta a importância que os valores eminentemente pessoais assumem como meio para a realização da pessoa (afinal, o núcleo ético inviolável da nossa sociedade - acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 1993, publicado na Colectânea de Jurisprudência; 1993; tomo 3; página 181) - afigura-se adequado fixar € 12 500,00 o valor pecuniário susceptível de compensar o autor pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência do acidente em causa nos autos.

A Relação teve em atenção o grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica, do lesado e do titular do direito de indemnização e às demais circunstâncias do caso. Nestas podem incluir-se a desvalorização da moeda, bem como os padrões de indemnização geralmente adoptados pela jurisprudência[4].

Afirmam ainda Pires de Lima e Antunes Varela [5] que o montante indemnizatório deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas, da criteriosa ponderação das realidades da vida.

Em suma, a compensação por danos não patrimoniais deve tender efectivamente a viabilizar um lenitivo ao lesado; deve ter um alcance significativo e não meramente simbólico, observando, porém, uma ponderada e adequada proporção à gravidade do dano.

Com relevância para esta questão, apurou-se que:

- O autor foi assistido no Hospital de Valongo, onde regressou tempos depois, por dificuldade de locomoção, tendo realizado exames complementares de diagnóstico, após o que lhe deram novamente alta para o domicílio;

- Por se manterem as dores e as dificuldades na marcha, o autor foi submetido a diversos tratamentos medicamentosos e de fisioterapia;

- A 30.11.2006, o autor foi operado ao ombro esquerdo por ruptura da coifa dos rotadores, e fez acromioplastia com sutura do supra espinhoso;

- Em 2008, o autor foi operado ao joelho;

- Apresenta como sequelas definitivas: claudicação da marcha; dores na anca direita; dores no ombro esquerdo; fobia na circulação de motociclos; alterações de humor e alterações de personalidade, que determinam uma IPG de 25 pontos;

- Sofreu dores logo após o embate, durante as 2 operações e restantes tratamentos, dores essas que continua a sentir e continuará a sentir para o resto da sua vida.

- Ficou com a marcha claudicante, o que o envergonha;

- Não pode fazer caminhadas, pois fica com dores.

- Não pode pegar em pesos, e tem dificuldades em se baixar.

- Era uma pessoa afável e bem disposta; é agora ríspido e agressivo com amigos e familiares; sente-se um inválido.

Estas consequências decorrem de acidente provocado por culpa exclusiva do condutor do veículo seguro; são relevantes e inequivocamente merecedoras da tutela do direito.

O autor foi submetido a duas intervenções cirúrgicas com o inerente internamento hospitalar; suportou um longo período de tratamento; as lesões sofridas e as sequelas permanentes que apresenta são graves, com reflexos físicos e anímicos; sofreu e irá sofrer dores, vendo-se impossibilitado ou sentindo dificuldades no exercício de actividades comuns, como caminhar, pegar em pesos ou baixar-se.

Neste circunstancialismo, pelo que sofreu com o acidente e posterior tratamento, pelas dores que suportou e irá suportar, pela limitação funcional que afecta não só a capacidade profissional mas também a qualidade de vida, com relevante prejuízo de afirmação pessoal[6], entende-se justo e adequado, para compensar esse dano não patrimonial sofrido, considerando os padrões de vida reportados à data da propositura da acção, o montante de €15.000,00.

Decidindo:

Em virtude da decisão recorrida ter ponderado e sopesado cuidadosamente todos os elementos que devem ser tidos em conta na fixação da indemnização a título de danos não patrimoniais não vemos razão para alterar o montante fixado.

Deste modo, dando parcial provimento á pretensão do A./recorrente fixa-se a indemnização devida em 62.500 € (27.500,00 €+35.000€) em tudo o restante se mantém o decidido, nomeadamente a indemnização por danos não patrimoniais de 15.000,00€ e a indemnização por despesas no valor de 6.756,00 €,bem como juros desde a citação.

11-DECISÃO:

Nesta conformidade, acorda-se em conceder parcial provimento à revista do recorrente AA fixando-se a indemnização devida em 62.500,00 € (27.500,00 €+35.000,00€) em tudo o restante se mantém o decidido, nomeadamente a indemnização por danos não patrimoniais de 15.000,00€ e a indemnização por despesas no valor de 6.756,00 €, bem como juros desde a citação.

Custas a cargo do autor e da ré na proporção do decaimento.

Notifique.

                                        

Lisboa, 15 de Março de 2012                                                                                                                                          

João Trindade (Relator)

  Abrantes Geraldes

  Tavares de Paiva

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[1] Revista n.º 36/2002.C1.S1 - 2.ª Secção 10-09-2009 Bettencourt de Faria (Relator)
[2] Deve ter-se por referência a esperança média de vida, de modo a contar com a vida activa e com o período posterior à normal cessação da actividade laboral – Cfr. J.J. Sousa Dinis, CJ STJ, V, 2, 15 e os Acórdãos do STJ de 28.10.99, de 25.06.2002 e de 25.06.2009, em www.dgsi.pt.  
[3] Cfr. entre outras Revista 5064/06.TBRG.G1.S1.6ª-21.4.10, Revista 2663/08  28-10.082592/01-6.11.01 , 1369/08.4TBBRG.G1.S1-1ª -28.6.11
[4] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I, 10ª ed., 607; Ac. do STJ de 23.10.79, BMJ 290-390.
[5] Cód. Civil Anotado, I, 4ª ed., 501.
[6] Cfr. Fernando Oliveira Sá, Clínica Médico-Legal da Reparação do Dano Corporal em Direito Civil, 99 e 100.