Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1332/07.2TTVNG.P1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: SAMPAIO GOMES
Descritores: PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
MATÉRIA DE FACTO
FACTOS CONCLUSIVOS
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
SOCIEDADE
GRUPO DE EMPRESAS
Data do Acordão: 11/09/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário : I - Cabe nos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça, por ser questão de direito, a de saber se o elenco apresentado como contendo a matéria de facto provada se circunscreve, efectivamente, a dados com tal natureza ou se contém matéria que envolva juízos de direito, de valor ou conclusivos e que haja de ser considerada matéria de direito, sendo que, nesse caso, devem considerar-se como não escritos, por aplicação analógica do disposto no artigo 646.º, n.º 4, 1.ª parte, do Código de Processo Civil.

II - O artigo 378.º, do Código do Trabalho de 2003, tem por escopo o reforço da garantia de cumprimento dos créditos laborais através da responsabilização de outras sociedades que não a empregadora – nas situações de coligação societária –, pressupondo que o trabalhador não conseguiu obter junto desta a satisfação desses créditos.

III - Todavia, o trabalhador, para poder beneficiar da garantia creditícia prevista no citado normativo, tem que, nos termos do disposto no artigo 342.º, n.º 2, do Código Civil, provar a existência de sociedades que se encontrem entre si numa relação de participação recíproca, de domínio ou de grupo, nos termos dos artigos 481.º e seguintes, do Código das Sociedades Comerciais.

IV - Nesse tipo de sociedades há uma situação comum: há uma entidade que tem o domínio das sociedades pertencentes ao grupo, isto é, que tem a «direcção unitária» das sociedades, ou que tem o poder de decisão, em última análise.

V - Não resultando provado que as sociedades para as quais as autoras prestavam trabalho estivessem numa relação de grupo com a ora ré, não é possível responsabilizar esta pelo pagamento dos créditos laborais que são titulares.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

                                                      

I)

AA e BB intentaram a presente acção, com processo comum, contra CC, Lda., DD, Lda., EE, S.A., FF e GG, pedindo se declare a ilicitude do seu despedimento, condenando-se as RR., solidariamente, a pagarem as seguintes quantias:

-          à A AA:

-          a importância global de € 96.263,20, sendo:

a)         A título de retribuições vincendas, € 2.872,80;

b)         A título de remunerações em atraso, € 7.261,20;

c)         A título de indemnização por despedimento ilícito € 64.638,00;

d)         A titulo de férias e subsídio de férias vencido em 01/01/07, € 5.745,60;

e)         A título de aviso prévio n/ pago, € 5.745,6;

f)          Por último, a título de danos morais, € 10.000;

-          à A. BB:

-          a importância global de € 22.560,26, sendo:

a)         A título de retribuições vincendas, € 2.872,80;

b)         A título de remunerações em atraso, € 3.805,26;

c)         A titulo de indemnização por despedimento ilícito, € 6.525,00;

d)         A título de férias e subsídio de férias vencido em 01/01/07, € 2.900;

e)         A título de aviso prévio n/ pago, € 2.900;

f)          Por último, a título de danos morais o montante de € 5.000,00.

Para tanto, alegaram:

- Terem sido admitidas ao serviço da 1ª Ré, em 2 de Março de 1992, a 1ª A., para, mediante retribuição, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, desempenhar funções próprias da sua categoria profissional, que era a de Engenheira Civil, enquanto a 2ª R. admitiu ao seu serviço a A. BB, em 2 de Dezembro de 2004, para mediante retribuição, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, desempenhar funções próprias da sua categoria profissional, que era a de Engenheira Civil, o que sucedeu até 02.01.2007, data em que as RR. procederam ao encerramento das suas instalações, sem qualquer prévio procedimento.

- Pelos créditos peticionados são responsáveis as duas 1.ªs RR., sendo que, entretanto declarada a sua insolvência, são responsáveis os demais RR., nos termos do art. 379°, n° 2, do CT.

Contestaram os 3º, 4º e 5.°s RR., por impugnação, e, por excepção, sustentando a sua ilegitimidade para a acção, por não serem empregadores das AA.

Por despacho, transitado (fls. 267-269), foi julgada extinta a instância, por inutilidade superveniente, em relação às duas 1.ªs RR, declaradas insolventes.

Na fase de saneamento/condensação foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, tendo sido julgada a acção procedente contra a 3ª Ré, condenando-se esta a pagar:

-          à Autora AA:

-          a quantia global de 13.006,80 euros por retribuições e subsídios de férias e natal vencidos até ao despedimento;

-          uma indemnização por despedimento ilícito no montante de 48.837,60 euros, acrescida de 2.250 euros por danos morais;

-          e as retribuições que, à razão de 2.872,80 euros por mês, se vençam desde 20/11/2007 até ao trânsito em julgado da decisão, sem prejuízo da dedução dos montantes eventualmente já recebidos a título de subsidio de desemprego;

-          e à Autora BB:

-          a quantia global de 6.604,20 euros por retribuições e subsídios de férias e natal vencidos até ao despedimento;

-          uma indemnização por despedimento ilícito no montante de 7.250 euros, acrescida de 1.000 euros por danos morais;

-          e as retribuições que, à razão de 1.450 euros por mês, se vençam desde 20/11/2007 até ao trânsito em julgado da decisão, sem prejuízo da dedução dos montantes eventualmente já recebidos a título de subsidio de desemprego.

Mais se decidiu absolver os Réus FFe GG do peticionado pelas Autoras.

2. Inconformada, a 3ª Ré recorreu da sentença, tendo o Tribunal da Relação do Porto concedido provimento ao recurso, revogando, na parte impugnada, a sentença recorrida, decidindo não estarem reunidas as condições para a aplicação do regime da responsabilidade definido no art. 378.° do Código do Trabalho, pelo que a recorrente na apelação (3ª Ré) não podia ser considerada responsável pelos créditos laborais das AA.

        

É contra esta decisão que as Autoras AA E BB agora se insurgem, mediante recurso de revista, em que pedem a revogação do acórdão recorrido e se mantenha a decisão de 1ª instância, formulando as seguintes conclusões:

1ª - O objecto do presente recurso é o douto acórdão de Relação do Porto, com processo à margem referenciado, que concedeu provimento ao recurso de apelação, revogando a igualmente douta decisão de primeira instância, pois, como se demonstrará, houve violação da lei substantiva, na perspectiva da errada interpretação e aplicação das normas invocadas.

2ª  - As recorrentes nas suas contra-alegações do recurso de apelação alegaram, em síntese, que existia efectivamente entre as três RR uma relação de grupo ou de domínio exercida por intermédio de intermédio do dito Sr. FF e dizer que tal conclusão carece de fundamento só podia resultar de uma interpretação restritiva e literal do artº 378° do CT e especialmente dos arts. 481° e segs do CSC.

3ª  - Concluíram as suas alegações dizendo que "A decisão (a de 1ª instância) em crise subsumiu correctamente a factualidade apurada na previsão do art.º 378ª  do Código do Trabalho” e dizer o contrário, como fez, a recorrente, é desconhecer, por completo a profunda alteração que nesta matéria, " Garantia dos Créditos", foi introduzida pelo Código de Trabalho de 2003.

4ª - No mesmo sentido se pronunciou doutamente o M. P. no seu Parecer, de que se realça o seguinte com interesse para a decisão deste diferendo, relativamente à decisão sobre a matéria de facto:

A decisão da matéria de facto não foi impugnada pela recorrente.

 Acresce que esta não sofre de qualquer dos vícios de que este Tribunal possa conhecer oficiosamente.

Assim sendo deve ter-se como definitivamente por não poder a mesma ser modificada nos termos do art" 712°do CPC.

5ª - No mui douto acórdão sob recurso, considerou-se e bem que a decisão da matéria de facto da 1ª instância não foi impugnada pelas partes, nem enferma dos vícios previstos no arí° 712° do CPC, pelo que se aceita e mantém.

6ª  - Contudo, de seguida, decidiu que, por conterem meras conclusões, nos termos do art.º 646° n° 4 do CPC, eliminar "os pontos de facto n°s 38, 40 e 41 supra transcritos, atenta a essência da matéria ora em discussão - responsabilização da recorrente apenas em função do disposto no art. 378° do CT."

7ª - Com o devido respeito, que aliás é muito, não tem o Venerando Tribunal da Relação qualquer razão, sendo a exclusão de tais pontos de facto, determinada pela necessidade de adequar a decisão final aos factos provados e não por conterem meras conclusões.

8ª - Dos pontos 38, 40 e 41 dos factos dados como provados não constam quaisquer conclusões, pelo que não estamos perante as hipóteses previstas no n° 4 do art° 646° do CPC, nem por aplicação analógica se poderia lá chegar.

9ª - Assim, não deveriam ter sido eliminados estes 3 pontos da matéria de facto provada, violando-se o referido n° 4 do art. 646°,

10ª - Mutilada a decisão da matéria de facto destes 3 importantes factos, o acórdão sob recurso, partiu para uma interpretação restritiva e literal da inovadora regra contida no art.° 378° do CT, e muito especialmente das normas do CSC, relativas às coligações societárias, nomeadamente arts 481° e segs.

11ª - Concluindo, em consequência que "não estão, pois, reunidas as condições para a aplicação do regime da responsabilidade definido no art. 378° do Código do Trabalho, pelo que a recorrente não podia ser responsável pelos créditos laborais das AA”.

12ª - Nos termos do art. 486° n° 1 do CSC a relação societária de domínio surge nos casos em que uma sociedade (a dita dominante) pode exercer uma influência dominante sobre a outra sociedade  (dependente), directamente ou por interposta pessoa, no caso o Sr. FF, como também o prevê o n° 2 do arr° 483°, como se verificou no caso dos autos.

13° - Do "Regime da responsabilidade solidária pelos créditos laborais em regime de grupo" retiram três ideias perfeitamente aplicáveis ao caso em apreço.

Primeira:

O regime da responsabilidade solidária constante do artº 378°, tem obviamente, como objectivo o reforço da tutela do trabalhador cuja empresa se insere num grupo, em matéria de créditos laborais.

Segunda:

O regime do Código do Trabalho é mais abrangente que o do Código das S. C, uma vez que se aplica não só às relações de grupo em sentido próprio, como também a outras relações de grupo em sentido comum, mais lato.

Terceira:

O regime do art° 378°, veio estabelecer um sistema de protecção dos créditos laborais reforçado em relação ao já existente para os restantes credores sociais no artº 501° do CSC.

14 - Assim sendo, como efectivamente é, esperam as recorrentes que os senhores Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça façam uma correcta aplicação da lei aos factos provados, não mutilando a decisão da matéria de facto, responsabilizando a 3ª R., aqui recorrida pelos seus créditos laborais, por aplicação do art° 378° do Código do Trabalho, revogando o douto acórdão recorrido, mantendo a decisão de 1ª instância.

15ª - A decisão recorrida violou o art° 378° do Código do Trabalho, os arts 646°, n° 4 e 712° do CPC e ainda os arts. 481° a 486º do CSC.

Não foram apresentadas contra-alegações.

Neste Supremo Tribunal, a Ex. Procuradora-Geral-Adjunta pronunciou-se no sentido de que o recurso das AA. deveria proceder, revogando-se o Acórdão recorrido e repristinando-se, assim, a decisão da 1ª instância, com o fundamento que se sintetiza e transcreve:

“Tendo a decisão da Relação assentado, ‘maxime’ na eliminação de factualidade que, entretanto, se pugna dever ser reposta, a única questão suscitada consiste em saber da validade da condenação da 3ª Ré, em sede de aplicação do artº 378º do CT, concorda-se com os fundamentos expostos constantes da decisão da 1ª instância”.

Notificado às partes este parecer, o mesmo suscitou resposta das recorrentes, no sentido de subscreverem o aí expendido.

Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões, são questões a apreciar, saber se:

- os pontos de facto n°s 38, 40 e 41 devem ser eliminados por conterem matéria conclusiva;

- estão reunidas as condições para a aplicação do regime da responsabilidade definido no art. 378° do Código do Trabalho, e em consequência a recorrente ser responsável pelos créditos laborais das AA.

        

Corridos os vistos, cumpre decidir.

I I)
Factos provados (na 1ª instância):

1-        A 1ª R. admitiu ao seu serviço a A. AA, em 2 de Março de 1992, para mediante retribuição, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, desempenhar funções próprias da sua categoria profissional, que era a de Engenheira Civil, tudo como melhor se constata pelo Certificado de Trabalho, por aquela emitido, que se junta e dá por integralmente reproduzido (Doc. n° 1).

2-        A 2ª R. admitiu ao seu serviço a A. BB, em 2 de Dezembro de 2004, para mediante retribuição, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, desempenhar funções próprias da sua categoria profissional, que era a de Engenheira Civil, tudo como melhor se verifica pelo Certificado de Trabalho, por aquela emitido pela, que se junta e dá por integralmente reproduzido (Doc. n°2).

3-        Auferia a A. AA, ultimamente, a retribuição mensal ilíquida de € 2.872,80, acrescida de subsídio de refeição de € 4,40, como se verifica pelo recibo do passado mês de Novembro de 2006 (Doc. n° 3).

4-        A retribuição actual, mensal ilíquida da A. BB era de € 1.450,00, acrescida de subsídio de refeição de € 4,40, como se verifica pelo recibo do passado mês de Novembro de 2006 (Doc. n° 4).

5-        No dia dois de Janeiro de 2007, as AA., bem como os restantes trabalhadores das duas primeiras rés, ao apresentarem-se, pela manhã, na sede da segunda, à Rua …, n° …, em Canelas, Vila Nova de Gaia, para retomarem o trabalho, depararam-se com os portões encerrados.

6-        O inesperado encerramento das duas empresas foi noticiado pelos órgãos de comunicação social, televisão, rádios e jornais como se constata pela notícia junta, publicada no Jornal Notícias de 09/01/07, que se junta e dá por reproduzida. (Doc. n° 5)

7-        Nessa altura apenas foi dito, pelo Sr. FF, que geria as duas RR, que as empresas encerravam por falta de trabalho.

8-        Mais lhes foi dito que lhes seria entregue o documento para obtenção do subsídio de desemprego e o respectivo Certificado de Trabalho, o que se veio a verificar no dia seguinte.

9-        A "declaração de situação de desemprego" modelo 346 da INCM, então entregue às AA. e subscrita sob o carimbo da gerência das 1ª e 2ª RR, com assinatura ilegível, pelo também R. Sr. FF, indica como motivo da cessação do contrato "Falta de trabalho e encerramento da empresa", impressos estes de que estão juntas cópias e se dão também por reproduzidos. (Docs. n°s 6 e 7)

10-      Foi ainda prometido às AA., como a todos os outros trabalhadores, que os salários em atraso, isto é, o subsídio de férias de férias de 2006, 50% do subsídio de Natal do mesmo ano e o vencimento de Dezembro, seriam pagos no decorrer da semana em causa, até ao dia cinco de Janeiro.

11-      O que ainda se não verificou, até porque as duas primeiras rés foram entretanto declaradas insolventes.

12-      Não foi também paga às AA. qualquer compensação pela cessação dos respectivos contratos de trabalho.

13-      A A. AA era quadro superior da empresa, das mais antigas, com quase 15 anos de casa, de dedicada colaboração, desempenhando funções de Directora Técnica.

14-      Não tiveram para com esta sua fiel e das mais antigas colaboradores, uma única palavra de explicação do que ia suceder.

15-      Sofreu a A. humilhação e desgosto com o facto de terem feito cessar o seu contrato pela forma inesperada.

16-      A A. BB era também um quadro superior da empresa, desempenhando funções de Directora Técnica.

17-      Não tiveram também para com ela uma palavra de explicação do que ia suceder.

18-      Sofreu igualmente humilhação e desgosto com o facto de terem feito cessar o seu contrato pela forma inesperada.

19-      A 1ª R foi constituída nos idos anos de 1988 pelo Sr. FF, aqui 4º R., sendo seus sócios o referido Sr. FF e sua mulher FF, aqui 5ª R., aquele gerente e com uma quota substancialmente maior do que esta, conforme certidão da CRC de Vila Nova de Gaia, que está junta e se dá por reproduzida. (Doc. n° 10).

20-      Por incumprimento de obrigações fiscais e para com a segurança social, o dito FF foi objecto de processo crime e condenado a 16 meses de prisão, com pena suspensa, condicionada ao pagamento das contribuições em dívida, conforme noticia publicada no JN do dia 7 de Janeiro de 2000 (Doc. n° 11).

21-      A 1ª R. estava em risco de perder o "alvará" de construção civil.

22-      O dito Sr. FF, em Novembro de 2002, constitui uma nova empresa, com sua mulher e os seus três filhos, dois deles, ao tempo, ainda menores, a segunda R. "DD, Lda.".

23-      Cerca de um ano após a sua constituição, cedeu as suas quotas e as da sua mulher aos seus três filhos, sendo certo que se manteve como seu gerente, tudo conforme Certidão do Registo Comercial de Vila Nova de Gaia (Doc. n°12).

24-      Apesar desta alteração nominal dos seus sócios, a empresa continuou a ser efectivamente gerida e dominada apenas pelo Sr. FF, que nela mandava como se coisa sua fosse, como se verifica pela "Declaração de Assinante" junta (Doc. n° 13)

25-      Como a R. "CC, Lda." deixou efectivamente de ter alvará de construção civil, o dito Sr. FF transferiu a totalidade das suas obras e a maioria dos seus trabalhadores para a " DD, Lda.", bem como todos os seus equipamentos e imobilizado.

26-      A "CC" deixou de ter qualquer actividade e os poucos empregados que não foram formalmente transferidos para a 2ª R, trabalhavam a tempo inteiro para esta, pois era a única que tinha alvará de construção civil.

27-      A A. AA era Responsável Técnica pelas 2ª a 9ª obras adiante indicadas (como estando em curso aquando do encerramento das empresas), tendo sido junto a título exemplificativo um "Termo de Responsabilidade pela Direcção Técnica da Obra" por si emitido, em papel timbrado da CC, obra da 2ª R, e uma "Declaração" desta para uma sua obra em que é indicado o nome da A. como sua responsável (Docs. 14 e 15).

28-      Foi ainda pelo Sr. FF constituída uma outra sociedade, a 3ª R.

29-      A 3ª R., "EE, SA, inicialmente uma «…» limitada, foi constituída, de novo pelo Sr. FF e por sua esposa, passando mais tarde a sociedade anónima, com a entrada de um novo sócio HH,

30-      O Presidente do Conselho de Administração da 3ª R. ficou sendo, uma vez mais, o Sr. FF, 4º réu, ficando como vogal do mesmo sua esposa FF, 5ª R., conforme cópia do registo comercial junta a fls. 262 e segs.

31-      A 3ª R. é uma empresa do ramo imobiliário que comprava e vendia os empreendimentos habitacionais, construídos pelas duas primeiras RR.

32-      A 1ª e 2ª RR. têm diversos débitos a trabalhadores e fornecedores, tendo sido por estes requerida a insolvência daquelas, o que veio a ser decretado, quanto à "CC, Lda.", em 26/03/07 no 1o Juízo do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia, no Proc. n° 27/07.1TYVNG e, quanto à "DD - Empreiteiros, Lda.", em 04/09/07, no mesmo Juízo, no Proc. n° 90/07.5TYVNG. (docs. n°s 16 e 17).

33-      Ao fisco e à segurança social as dívidas das RR. são igualmente avultadas, tendo sido já penhorada a maioria dos bens da 1a R., como se verifica pela cópia de um "Anúncio" para citação de credores desconhecidos e para venda por propostas em carta fechada, em execução fiscal aí identificada, instaurada pela Repartição de Finanças de Gaia, cuja cópia está junta e se dá por reproduzida. (Doc. n° 18)

34-      Sobre a outra empresa do grupo do Sr. FF, a 3ª R., a EE, S. A., impendem também execuções fiscais, com penhora de bens, conforme se verifica por fotocópia de anúncio junto (Doc. n° 19).

35-      Em 2/01/2007 estavam, pelo menos, 11 obras em curso, a seguir indicadas, para as quais se dirigiram muitos dos trabalhadores da 1ª e 2ª RR. naquele dia da comunicação do encerramento das empresas:

1-        EE VII - Rua …, Canelas, dono da obra: EE;

2-        Edifício Habitacional Multifamíliar na EN 15 - ... - Rio Tinto;

3-        Área Administrativa/garagem (armazém) do Complexo Desportivo de Sermonde, dono da obra, Câmara Municipal de V. N. de Gaia;

4-        Ampliação da Escola do 1º Ceb de S. Martinho, dono da obra: C. M. de Seia;

5-        Quartel dos Bombeiros do Salto, Montalegre, dono da obra:

Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Montalegre;

6-        "Núcleo museológico O Mundo Rural do Vimeiro, dono da obra, C. M. de Arraiolos;

7-        "Parque desportivo da Pocariça" - construção de infra-estruturas desportivas de lazer, dono da obra CM. de Cantanhede;

8-        Obra da Rua D. Pedro V, dono da obra "Construções II, Unipessoal, Lda.";

9-        Hotel da Boavista - Rua Dr. …, dono da obra JJ;

10-      Câmara de Santa Marta de Penaguião – saneamento;

11-      Câmara municipal de Aguiar da Beira –etar.

36-      Tanto a 1ª como a 2ª RR. foram, como se referiu, constituídas pelo Sr. FF, 4º réu, e por sua mulher, que detinham a totalidade do capital social na primeira, sendo que da segunda faziam parte também os seus três filhos, dois deles menores.

37-      Apesar do Sr. FF e da mulher terem cedido posteriormente as suas quotas a seus filhos na segunda R, continuou aquele a mandar nas duas, pois era gerente de ambas.

38-      A terceira R. é também, como se alegou, uma criação do Sr. FF e de sua mulher, pois foi, de facto e de direito, o presidente do seu Conselho de Administração desde a fundação até renunciar ao cargo no final de 2006, tendo a renúncia sido registada em 15/01/2007, conforme certidão de fls. 263.

39-      A sua mulher, GG, continua a fazer parte do referido órgão de administração, bem como seu filho HH, tendo o Sr. FF sido substituído, de direito, pela sua irmã KK na presidência do CA., conforme resulta da mesma certidão (fls. 264).

40-      Verifica-se, assim, existir também uma relação entre a 3ª R. e as outras duas, sendo o elo de ligação entre elas o Sr. FF, fundador de todas elas, sócio gerente da 1ª, gerente da 2ª e Presidente do C. A. da 3ª, até à data do despedimento das AA.

41-      As três sociedades rés fazem parte do mesmo grupo societário familiar, dirigido exclusivamente pelo Sr. FF, sendo que a totalidade das participações sociais estão nas mãos de sua mulher e seus filhos.

42-      Acresce que a A. AA, subscreveu o Termo de Responsabilidade da obra de construção denominada EE V…, a pedido da 3ª R, conforme documento que se junta e dá por reproduzido. (Doc. n° 21).

43-      O Sr. FF detinha efectivamente o controlo e a direcção unitária das sociedades rés, pois era gerente de ambas e ainda presidente do C. A. da terceira (até ao fim de 2006), sendo que os restantes familiares, incluindo a sua esposa, praticamente em nada interferiam na efectiva gestão das mesmas.

44-      Requerida a insolvência da primeira R. pelo credor "LL, Lda.", o Sr. FF, como gerente daquela não deduziu qualquer oposição, pelo que por sentença de 26/03/07 foi decretada a respectiva insolvência, como se verifica por certidão da mesma, que está junta e se dá por reproduzida. (Doc. n° 22)

45-      Igualmente, por sentença proferida em 03/09/07, no 1o Juízo do Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia foi decretada a insolvência da 2a R, a "DD - Empreiteiros, Lda.", de novo sem que o Sr. FF, seu gerente, tenha deduzido qualquer oposição. (Doc. n° 23).

46-      O Sr. FF usufrui de uma grande quinta, com piscina, campo de jogos, etc, em Canelas.                                       

2.

Importa referir que os pedidos formulados pelas AA. na acção, vêm na sequência da cessação da relação laboral feita por iniciativa das 1ª e 2ª RR, configurando despedimento que foi julgado ilícito, o que não vem posto em causa no presente recurso.

Está em causa, sim, o pagamento dos créditos que as AA. reclamam na acção e a responsabilidade dos mesmos e por quem.

A sentença da 1ª instância - face à declaração judicial de insolvência das 1ª e 2ª RR., entidades patronais das AA., e declarada extinta a instância relativamente às mesmas, por “inutilidade  superveniente da lide”  ­- concluiu pela responsabilização da 3ª Ré, EE, S.A., pelo pagamento dos créditos laborais das AA., com fundamento na responsabilidade solidária decorrente do disposto no artº 378º do CT.

Já o acórdão recorrido, conclui não estarem reunidas as condições para a aplicação do regime da responsabilidade definido no art. 378.° do Código do Trabalho, daí retirando que a recorrente não podia ser considerada responsável pelos créditos laborais das AA.

Previamente a tal conclusão, o acórdão recorrido considerou deverem ser eliminados os pontos 38º,40º e 41º da matéria de facto, sem outro fundamento além do que a seguir se transcreve:

“A matéria de facto supra transcrita, tal qual foi objecto da decisão de facto da 1ª instância, não foi impugnada pelas partes nem enferma dos vícios previstos no art. 712° do CPC, pelo que se aceita e mantém.

No entanto, e por conterem meras conclusões, nos termos do art. 646°, n° 4, do CPC, eliminam-se os pontos de facto n°s 38, 40 e 41 supra transcritos, atenta a essência da matéria ora em discussão - responsabilização da recorrente apenas em função do disposto no art. 378° do CT”.

            Isto é, o Acórdão recorrido, embora aceite e mantenha a decisão relativa à matéria de facto fixada na 1ª instância, porque não impugnada, “elimina” pontos dessa matéria de facto porquanto os considera como traduzindo meras conclusões.

            Contra tal decisão se insurgem em sede de revista as recorrentes.

 Vejamos:

Em sede de recurso de revista, como é sabido, a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça no âmbito do apuramento da matéria de facto relevante é residual e destina-se exclusivamente a apreciar a observância das regras de direito material probatório, previstas nos artigos 722.º, n.º 2, e 729.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Civil, ou a mandar ampliar a decisão sobre a matéria de facto, nos termos do n.º 3 do artigo 729.º do mesmo diploma legal.

Especificamente, o n.º 2 do artigo 722.º citado estabelece que “o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou fixe a força de determinado meio de prova”; por outro lado, o n.º 2 do artigo 729.º referido determina que “a decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo o caso excepcional previsto no n.º 2 do artigo 722º ”.

Ora, no caso, não está em causa qualquer das apontadas situações.

Como vimos, o acórdão recorrido eliminou da matéria de facto provada, os pontos 38, 40 e 41, “por conterem meras conclusões”, nos termos do artº 646º nº4 do CPC.

Na revista, as AA. insurgem-se contra tal decisão, defendendo, em síntese, que “tais pontos não contêm conclusões, sendo a exclusão de tais pontos de facto, determinada pela necessidade de adequar a decisão final aos factos provados e não por conterem meras conclusões” (vejam-se as conclusões 6ª a 9ª).

Apreciando:
               Antes de mais cabe referir, que esta questão cabe nos poderes de cognição do STJ, por, como tem sido entendido, constituir questão de direito a de saber se o elenco apresentado como contendo a matéria de facto provada se circunscreve, efectivamente, a dados com tal natureza ou se contém matéria que envolva juízos de direito, de valor ou conclusivos e que haja de ser considerada matéria de direito.
[1]

A selecção da matéria de facto não pode conter qualquer valoração segundo a interpretação ou aplicação da lei ou qualquer juízo, indução ou conclusão jurídica.

Tais juízos de valor sobre os factos materiais que as instâncias tenham feito em função da sensibilidade ou intuição jurídica, por traduzirem valorações legais, exprimem conceitos de direito, e por isso, com se disse, podem ser sindicados pelo Supremo Tribunal de Justiça, e, por aplicação analógica do disposto no artº 646º nº4, 1ª parte, do Código de Processo Civil, devem considerar-se não escritas.

No caso em apreço, os pontos em questão e que o Acórdão recorrido considerou “eliminados”, traduzem-se no seguinte:

“38-    A terceira R. é também, como se alegou, uma criação do Sr. FF e de sua mulher, pois foi, de facto e de direito, o presidente do seu Conselho de Administração desde a fundação até renunciar ao cargo no final de 2006, tendo a renúncia sido registada em 15/01/2007, conforme certidão de fls. 263.

40-       Verifica-se, assim, existir também uma relação entre a 3ª R. e as outras duas, sendo o elo de ligação entre elas o Sr. FF, fundador de todas elas, sócio gerente da 1ª, gerente da 2ª e Presidente do C. A. da 3ª, até à data do despedimento das AA.

41-       As três sociedades rés fazem parte do mesmo grupo societário familiar, dirigido exclusivamente pelo Sr. FF, sendo que a totalidade das participações sociais estão nas mãos de sua mulher e seus filhos”.

Quanto ao ponto 38, é manifesto que é matéria conclusiva a parte em que se diz que “a terceira Ré é também, como se alegou, uma criação do Sr. FF e de sua mulher…”. Trata-se de um juízo formulado na sequência da factualidade ínsita sob o ponto 29, onde se refere que “A 3ª R., "EE, SA, inicialmente uma «…»limitada, foi constituída, de novo pelo Sr. FF e por sua esposa, passando mais tarde a sociedade anónima, com a entrada de um novo sócio HH”.

            Desta forma, não pode deixar de considerar-se no ponto 38 apenas a matéria restante, que resulta, aliás, do documento de fls. 236.

            No tocante ao ponto 40, também a primeira parte traduz um juízo de valor que assenta no que a segunda parte do mesmo ponto factualmente concretiza, isto é, “o Sr. FF, fundador de todas elas (sociedades), sócio gerente da 1ª, gerente da 2ª e Presidente do C. A. da 3ª, até à data do despedimento das AA”.

            No que respeita ao ponto 41, vem o mesmo na sequência do ponto anterior, podendo considerar-se conclusiva a referência, na primeira parte daquele ponto, a que “as três sociedades rés fazem parte do mesmo grupo societário familiar”, já que traduz uma ilação, uma valoração conclusiva, sobre a constituição, gerência, e participações sociais das sociedades em causa.

            Têm, assim, apenas parcialmente razão as recorrentes, devendo manter-se a matéria de facto dos pontos 38, 40 e 41, expurgada que seja, nos termos referidos, das partes que constituem matéria conclusiva, o que implica que esta tenha de se considerar não escrita, nos termos do nº 4 do artigo 664º, do Código de Processo Civil.

Quanto à segunda questão:

É aplicável ao caso dos autos, tal como foi entendido nas instâncias, sem discordância das partes, o regime do Código do Trabalho de 2003, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27/08.

   A questão ora em apreciação consiste em saber da validade ou não da condenação da 3ª Ré, em sede de aplicação do art. 378° do CT.

No presente recurso não está em causa a cessação da relação laboral nem as quantias fixadas e devidas às AA. face à ilicitude do despedimento.

A questão reside, sim, em saber, - sendo as respectivas entidades patronais, a R. CC, Lda., quanto à A. AA e a R. DD, Lda., quanto à A. BB que respondem pelas quantias devidas às AA., e tendo sido elas judicialmente declaradas insolventes, tendo por isso e em relação a elas sido declarada extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, - em que medida pode ser outra das RR. responsável pelos créditos das AA.

A primeira instância entendeu, tal como o invocaram as AA., que o fundamento para a respectiva responsabilização reside no previsto no art. 378° do C.T. quanto à sociedade terceira, a R. EE, S.A.

A Relação, por sua vez, no Acórdão em crise, decidiu não estarem reunidas as condições para a aplicação do regime da responsabilidade definido no art. 378.° do Código do Trabalho, pelo que a recorrente - a Ré EE, S.A. -  não podia ser considerada responsável pelos créditos laborais das AA.

Fê-lo com a seguinte fundamentação:

“Desde logo, é a própria sentença a reconhecer que, formalmente, «não se verifica que as três sociedades sejam sócias umas das outras ou que a 3ª tenha uma participação maioritária no capital das outras, de modo a haver uma relação directa de algum dos tipos previstos nos arts. 485°, 486° ou 489° do CSC».

Não obstante essa afirmação, e contraditoriamente, a sentença acabou por responsabilizar a recorrente, invocando, ainda sem qualquer apoio fáctico, que «a 3ª R., através do Sr. FF, exercia uma influência dominante nas sociedades que, formalmente, eram as entidades patronais das AA.».

Como é sabido, os problemas jurídico-laborais que podem surgir quando o trabalhador se vinculou a uma sociedade integrada num grupo que se submete a uma gestão de facto unitária não foram até 2003 especificamente enfrentados pela nossa legislação.

O Código do Trabalho de 2003 introduziu o inovador art. 378.°, que consagra a responsabilidade solidária das sociedades em relação de domínio ou de grupo, estatuindo que o empregador e as sociedades que com este se encontrem em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, nos termos previstos nos artigos 481° e seguintes do Código das Sociedades Comerciais, respondem solidariamente pelos montantes pecuniários resultantes de créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, vencidos há mais de três meses.

A este respeito, é essencial à compreensão desta temática a obra de Maria do Rosário Palma Ramalho, Grupos Empresariais e Societários incidências Laborais, Almedina, 2008.

Aí se refere, a pag. 146, que «a relação entre sociedade dominante e sociedade dependente se rege pelas normas gerais do direito societário, sendo, pois, no âmbito dessas normas que se devem procurar os instrumentos de tutela dos interesses da sociedade dependente, dos seus sócios e credores sociais».

Aplicando este regime ao caso em apreço, podemos concluir que, na ausência de um domínio directo da recorrente sobre as 1ª e 2ªs RR., a participação ou o seu domínio indirecto sobre as duas outras sociedades RR. só poderia ocorrer:

i) através de uma outra sociedade dependente da recorrente - e não há uma qualquer outra sociedade - dependente ou não da recorrente - que participe no capital das duas 1.ªs RR.

ii) através de uma outra sociedade que estivesse em relação de grupo com a recorrente - não há uma qualquer sociedade, com ou sem relação de grupo, que participe no capital daquelas duas RR.

iii) através de uma pessoa que, por conta da recorrente, detivesse acções das mesmas duas RR., o que está inviabilizado por não serem sociedades por acções e por inexistir um qualquer elemento que permita concluir que o Sr. FF detinha participações no capital daquelas duas RR. por conta da recorrente”.

Subscreve-se no seu todo a fundamentação aí expendida.

Na verdade, nos termos do artº 378º do CT, sempre que o empregador integrar uma das modalidades de coligação societária referidas naquela norma, os trabalhadores podem exigir, não só da sociedade empregadora mas também de qualquer uma das restantes sociedades coligadas, a totalidade dos créditos emergentes do contrato de trabalho, assim como da sua violação ou cessação, verificado que seja o requisito temporal do vencimento há mais de três meses.

Trata-se de assegurar a responsabilização das outras sociedades como mecanismo de reforço da garantia de cumprimento dos créditos laborais, pressupondo que o trabalhador não conseguiu obter a satisfação dos mesmos junto da entidade empregadora.

Fica, assim, reforçada a garantia creditícia dos trabalhadores de sociedades inseridas em certas configurações empresariais em que a manutenção da individualidade jurídica é acompanhada de uma dependência económica de onde podem resultar riscos adicionais para os credores, entre eles os trabalhadores.

O art. 378º do CT, que deve ser visto como um mecanismo adicional de protecção dos trabalhadores, como categoria específica de credores não circunscreve a responsabilidade à sociedade-mãe, alargando o âmbito de aplicação do artº 501º do Código das Sociedades Comerciais, pois alarga-a a todas as sociedades que se encontrem em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo com o empregador.

Mas a integração daquele preceito exige o recurso ao Código das Sociedades Comerciais, desde logo pela própria remissão que ali é feita para os arts. 481 e sgs.  do CSC.

Assim, a solução propugnada pelo artigo em análise vale apenas para sociedades que se encontram em relação de participações recíprocas de domínio ou de grupo nos termos dos arts. 481º e sgs. do CSC. E este dispositivo é claro ao restringir o regime em análise às relações entre sociedades por quotas, anónimas e em comandita por acções.

Assim, o trabalhador, para beneficiar daquela garantia creditícia - independentemente da prova de créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação não cumpridos pelo empregador, assim como o seu não pagamento no prazo dos três meses avós vencimento  -  tem, nos termos do artº 342º do CC, de provar a existência de uma relação societária relevante nos termos acima expostos.

Voltando à situação sub judice, há, então, que apreciar se, face ao direito societário, se verificam os pressupostos exigidos pelo citado artº 378º do CT.

O grupo de sociedades ou a coligação a que se refere o artº 481º do CSC, em sentido amplo, é o conjunto de duas ou mais sociedades sujeitas a uma influência comum, quer porque uma (s) participa na outra(s), quer porque todas acordaram em subordinar-se à orientação de uma delas ou de uma terceira entidade.

Quanto à participação (artº 482º e 483º do CSC),  as sociedades consideram-se em relação de simples participação quando uma delas é titular de quotas ou de acções de outra em montante igual ou superior a 10% do capital desta.

Nenhuma factualidade assente permite integrar a verificação desta relação entre a sociedade recorrente (3ª Ré) e as sociedades empregadoras (1ª e 2ª RR).

Por sua vez, para determinar a existência de uma relação de domínio entre sociedades atende-se á influência dominante que uma exerça sobre outra. E este critério pode ser aferido pela detenção de participações maioritárias no capital, da possibilidade de designação de mais de metade dos membros da administração, da disposição de mais de metade dos votos, além de outros efeitos que o CSC contempla e que podem conduzir à presunção da existência de uma relação de domínio (artº 482º e 486º do CSC).

Também neste ponto inexiste sustentáculo factual que permita concluir pela verificação da relação de domínio a que se refere o artº 378º na referência feita ao direito societário.

Por último, saber se a sociedade recorrida (3ª Ré) e as sociedades empregadoras se encontravam em relação de grupo nos termos do direito societário, e com relevância para a responsabilidade solidária prevista na citada norma do CT, encontra a resposta na expressão do Prof. Raúl Ventura quando refere que nos três tipos de sociedade em relação de grupo (sociedades em relação de domínio total, em relação de grupo paritário e em relação de subordinação), há uma situação comum: “em todos eles há uma entidade que tem o domínio das sociedades pertencentes ao grupo, isto é, que tem a ‘direcção unitária’ das sociedades, ou que tem o poder de decisão, em última análise”.

Nenhum elemento factual no caso concreto, permite concluir que aquelas sociedades (a recorrente e as sociedades empregadoras) se encontrassem em relação de grupo seja qual for a forma que assuma (artº488º, 489º, 492º e 493º) na perspectiva societária, já que não se limita, nem confunde com o conceito de grupo económico, que é bem mais amplo.

Deste modo, sendo certo que a estatuição fundamental do art. 378º do CT determina a responsabilidade solidária dos empregadores e as sociedades que com aqueles se encontrem em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, nos termos previstos nos arts.481º e sgs. do CSC,  pelos montantes pecuniários resultantes de créditos emergentes de contratos de trabalho e da sua violação ou cessação, certo é, também, que é no direito societário que temos de encontrar os pressupostos para a sua efectivação.

No caso em apreço, a matéria de facto não traduz, por um lado, essa relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, entre as Rés empregadoras e a 3ª Ré ora recorrente, ou, por outro, a existência de uma estrutura organizativa que conduza à aplicabilidade do previsto no artº 378º do CT.

Improcedem, face ao expendido, as conclusões 1ª e 10ª a 15ª do recurso, procedendo parcialmente as restantes.

I I I)

Pelo exposto, decide-se negar a revista.

Custas a cargo das autoras/recorrentes.

Lisboa, 9 de Novembro de 2011

Sampaio Gomes (Relator)

Pereira Rodrigues

Pinto Hespanhol

_________

[1] Entre outros, cfr. os acórdãos desta Secção do Supremo Tribunal de Justiça de 04.12.2002, no processo n.º 3494/02, de 13.07.2006, no processo n.º 1073/06, e de 14.02.2007, no processo n.º 3955/06.