Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1275/18.4T8CTB.C1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: MARIA CLARA SOTTOMAYOR
Descritores: RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
RESPONSABILIDADE BANCÁRIA
INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
DEVER DE INFORMAÇÃO
NEXO DE CAUSALIDADE
ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA
ÓNUS DA PROVA
ILICITUDE
PRESUNÇÃO DE CULPA
VALORES MOBILIÁRIOS
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
PRESSUPOSTOS
DANO
Data do Acordão: 06/20/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário : I - Nos termos do AUJ n.º 8/2022, no âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos arts. 7.º, n.º 1, 312.º, n.º 1, al. a), e 314.º do CVM, na redação anterior à introduzida pelo DL n.º 357-A/2007, de 31-10, e 342.º, n.º 1, do CC, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos.
II - Não cumpre o dever de informação aludido no art. 7.º, n.º l, do CVM, o Banco, intermediário financeiro, que propôs a subscrição de obrigações subordinadas SLN 2006 a um investidor sem literacia financeira, que não pretendia subscrever produtos de risco, dizendo-lhe que era uma aplicação com as características de um depósito a prazo, com capital e juros garantidos pelo BPN (com rentabilidade assegurada), e omitindo a identidade da empresa emitente, bem como qualquer explicação sobre o conceito de obrigações subordinadas.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

I – Relatório

1. No Tribunal Judicial da Comarca ... - Juízo Central Cível de ... – Juiz ..., AA, residente na ..., em ..., e BB, residente em França, intentaram a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra Banco BIC Português, S.A., com domicílio na Av. ..., em ..., pedindo:

- A condenação do Réu a pagar-lhes a quantia de €106.783,56, bem como os juros vincendos desde a data de citação até efetivo e integral pagamento.

Ou, subsidiariamente, que:

i. Se declare nulo qualquer eventual contrato de adesão que o réu invoque para ter aplicado os €106.783,56, que os pais das autoras lhes entregaram, em obrigações subordinadas SLN 2006;

ii. Se declare ineficaz em relação às autoras, na qualidade de sucessoras e herdeiras, a aplicação que o réu tenha feito desses montantes;

iii. E se condene o réu a restituir às autoras a quantia de 106.783,56€, acrescidos de juros legais vincendos, desde a data da citação até efetivo e integral cumprimento;

E sempre:

- Se condene o réu a pagar-lhes a quantia de €5.000,00 a título de danos não patrimoniais.

Alegam para o efeito, em síntese, que os seus pais, CC e DD, de quem são herdeiras, tinham 100.000,00€ depositados numa conta poupança no Banco Réu, à data BPN, montante esse que foi aplicado pelo Banco BPN, em 2006, em duas obrigações subordinadas de €50.000,00 cada, mas sem que os referidos titulares tivessem noção efetiva de que tal estava a ocorrer.

Que, na verdade, estavam convencidos de que o valor em causa foi aplicado numa aplicação segura, com as características de um depósito a prazo, no âmbito do Banco e não de qualquer entidade terceira, como a SLN, entidade esta que desconheciam, e que não aceitariam aceder, se conhecessem.

Que foi omitido e distorcido o processo informativo relativo à liquidez do capital, do vencimento, da retribuição e dos prazos de reembolso, sendo, por isso, nulo o contrato subjacente a essa aplicação.

Mais sustentam ter sofrido danos não patrimoniais, que descrevem, pelos quais pretendem ser indemnizadas no montante de €5.000,00, a acrescer ao referido montante.

2. O Réu contestou, alegando a incompetência territorial do Tribunal da Comarca ..., bem como a prescrição do direito das Autoras, defendendo que atuou como intermediário financeiro.

Mais sustenta que o produto subscrito era um produto seguro, tendo informado e esclarecido sobre as condições do mesmo, nunca o Réu se tendo responsabilizado por tal produto.

Que a relação do subscritor é com a SLN, sendo o Banco Réu alheio a essa relação jurídica decorrente da subscrição da aplicação SLN 2006.

Termina pedindo a improcedência da ação e a sua absolvição do pedido.

As Autoras responderam à matéria de exceção alegada, sustentando a improcedência quer da incompetência territorial, quer da prescrição da responsabilidade do Réu.

A pedido das autoras foi ordenado o chamamento, como interveniente principal, do lado ativo da ação, de EE e mulher FF, aquele por ser também filho dos falecidos CC e DD.

EE, também herdeiro de CC e DD, veio declarar fazer seus os articulados das autoras – fls.76.

4. No despacho saneador foi decidido julgar improcedente a exceção dilatória de incompetência territorial do Tribunal da Comarca ... e bem assim quaisquer outras exceções invocadas pelo Réu.

Aí também foi definido o objeto do litígio em causa nos autos, como sendo o alegado direito das autoras e dos intervenientes, na qualidade de herdeiros, de receber do réu as quantias de 106.783,56€ (acrescida de juros vincendos) e de 5.000,00€ (danos morais).

5. Realizou-se a audiência de discussão e de julgamento da causa, com a gravação da prova testemunhal produzida, finda a qual foi proferida a sentença, na qual foi decidido julgar a ação procedente e, em consequência:

«a) Condenar o réu Banco BIC Português, S.A., a pagar às autoras e ao interveniente a quantia de 100.000,00€ (cem mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento; e

b) Absolver o réu do demais peticionado.

Custas da ação a cargo do réu e das autoras/interveniente, nas componentes em dívida (custas de parte e encargos), na exata proporção dos respetivo decaimentos».

6. Dessa sentença interpôs recurso de apelação o Réu, Banco BIC, vindo o Tribunal da Relação a julgar improcedente recurso e a confirmar a sentença recorrida.

7. Novamente inconformado, o Banco Réu interpôs recurso de revista excecional, ao abrigo do artigo 672.º, n.º 1, al. a) e b), do CPC, que veio a ser admitido pela Formação do Supremo Tribunal de justiça, formulando as seguintes conclusões:

«1) O recurso ora interposto é de revista excepcional, a admitir nos termos do disposto no art.º 672 nº 1 als. a) e b) do CPC.

2) Ambas as decisões das instâncias acabam por condenar o Banco-R. no pagamento de indemnização por violação do dever de informação enquanto intermediário financeiro.

3) O âmbito dos concretos deveres de informação a observar pelo intermediário financeiro tem sido objecto de vasta jurisprudência, com soluções e orientações bastante distintas, para não dizer completamente opostas.

4) Pontifica a este propósito as diferentes posições quanto à necessidade e grau de informação do risco de insolvência da entidade emitente bem como do risco de incumprimento da obrigação de reembolso, por oposição à menção de “capital garantido”.

5) Varia, igualmente, e diríamos de forma inaudita, a interpretação e consequências jurídicas do anúncio do produto de “capital garantido”, ali vendo algumas decisões uma verdadeira fiança ou assunção de dívida – como parece ser o caso da decisão recorrida, ao passo que outras veem na mesma exacta expressão apenas uma afirmação de segurança do investimento num contexto de pressuposta segurança por parte de todo o contexto social e financeiro no momento em que é feita a aplicação, ou por fim, quem veja – como é na realidade, uma mera característica da própria emissão, em que o valor de reembolso é necessariamente igual ao valor nominal do título.

6) Estes concretos temas e questões, além de relevantes na discussão da pura dogmática jurídica, são hoje, na ressaca da chamada “crise das dívidas”, uma das pedras de toque de todo o sistema financeiro, por um lado, e judicial por outro, em face do volume de contencioso pendente em todos os Tribunais perante o não reembolso de inúmeras emissões de vários instrumentos de dívida.

Além disso,

7) O volume do contencioso exactamente com este objecto, com a definição e delimitação do dever de informação na comercialização de instrumentos financeiros em momento anterior a Dezembro de 2007, é hoje considerável e com um grande impacto na economia e na sociedade portuguesa em geral, até pela repetição de situações análogas em várias instituições bancárias, por corresponder a uma actividade corrente antes da chamada crise das dívidas.

8) Não podemos senão concluir pela admissibilidade do presente recurso de revista, nos citadosmtermos do disposto no art.º 672º nº 1 . als. a) e b) do Código de Processo Civil.

Acresce que...

9) A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer senso desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação... A este propósito, de resto, e quase esvaziando tudo o que pudéssemos alegar, é eloquente o parecer adiante junto do PROF. PINTO MONTEIRO, onde se chega a esta mesma conclusão!

10) A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido!

11) Veja-se a este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt!

12) Vale isto por dizer que, ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densificação ou explicação aos clientes, a fim de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá firmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave!

13) insistimos no facto de esta menção, ainda que interpretada por um “leigo” apenas deveria permitir concluir pela segurança atribuída ao instrumento financeiro em causa! E não a qualquer tipo de garantia absoluta de cumprimento da entidade emitente.

14) A apresentação de características de um produto financeiro meramente descritivas, com indicaçãomde prazo, remuneração, garantia de capital, liquidez por endosso não parece constituir de qualquer forma uma forma de manifestação de uma vontade de vinculação por parte de quem as anuncia!

15) E o certo é que as Obrigações eram então, como são ainda de uma forma geral, um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente. Ao que acrescia, no caso concreto, e em abono desta sociedade emitente pertencer ao mesmo Grupo que o Banco Réu - mais, de ser a sua sociedade totalmente dominante!

16) Tanto mais que o risco de um DP no Banco seria, então, semelhante a uma tal subscrição de Obrigações SLN, porque sendo a SLN dona do Banco a 100%, o risco da SLN estava indexado ao risco do próprio Banco.

17) Ao entender esta expressão como tendo valor negocial, o tribunal a quo violou o disposto no art. 236 º do Código Civil.

De resto,

18) O dever de informação quanto aos “riscos do tipo de instrumento financeiro” surge perfeitamente densificado quanto ao seu cumprimento, não deixando o legislador uma cláusula aberta que permita margem para dúvida quanto ao alcance do seu dever.

19) De facto, se é verdade que a informação tem que ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita (art. 7º CdVM), não é menos verdade que o cumprimento desse dever de transmissão da informação não se compadece com qualquer conceptologia idílica e de delimitação difusa quanto ao seu inadimplemento.

20) E desde logo, não se compadece com ideias simplistas como as de mera reprodução de prospectos dos produtos, principalmente antes da transposição da chamada DMIF, em que a complexidade técnica da documentação de cada instrumento financeiro era enorme. Até porque quem defenda que deveria o intermediário financeiro transmitir a informação das primeiras páginas do prospecto não pode deixar de defender que a mesma diligência deveria ser obrigatória quanto ao restante conteúdo do mesmo documento!

21) A informação deve ser prestada não apenas de forma exaustiva, mas essencialmente de uma forma acessível, sendo que a mera reprodução do prospecto, como pretende a decisão recorrida, seriamcertamente tudo menos acessível.

22) A adequação da informação começa exactamente por afastar o cumprimento meramente formal do dito dever de informação, antes visando uma efectiva informação.

23) O CdVM estabelece objectiva e precisamente qual a informação que tem de ser prestada quanto a cada um dos contratos de intermediação financeira e até – em alguns casos –, quanto aos instrumentos financeiros objecto dessa intermediação.

24) E, quanto ao risco, há aqui que chamar à colação o art. 312º nº 1 alínea e) do CdVM, que obrigamentão o intermediário financeiro a informar o investidor sobre os “riscos especiais envolvidos nasmoperações a realizar”. Ora, tal redacção refere-se necessariamente ao negócio de intermediaçãomfinanceira enquanto negócio de cobertura que, depois, proporcionará negócios de execução. E amverdade é que tal menção não pode nunca equivaler ao dever de informação sobre o instrumento financeiro em si (como, aliás, na redacção aplicável ao caso).

25) Neste sentido apontam não só o elemento histórico decorrente da redacção anterior da lei, como também o elemento sistemático já abordado, como até o seu próprio elemento literal.

26) Mas, o que é certo é que, o legislador não deixou nada ao acaso e logo no número seguinte, afirmou claramente o que se devia entender por risco do tipo do instrumento financeiro em causa.

27) Assim é que nas quatro alíneas do no 2 do art. 312º-E obriga a que a descrição dos riscos do tipo do instrumento em causa incluam:

a. a) Os riscos associados ao instrumento financeiro, incluindo uma explicação do impacto do efeito de alavancagem e do risco de perda da totalidade do investimento;

b. b) A volatilidade do preço do instrumento financeiro e as eventuais limitações existentes no mercado em que o mesmo é negociado;

c. c) O facto de o investidor poder assumir, em resultado de operações sobre o instrumento

financeiro, compromissos financeiros e outras obrigações adicionais, além do custo de

aquisição do mesmo;

d. d) Quaisquer requisitos em matéria de margens ou obrigações análogas, aplicáveis aos

instrumentos financeiros desse tipo.

28) São ESTES e APENAS ESTES os riscos do tipo do instrumento financeiro sobre os quais o Intermediário Financeiro tem que prestar informação!

29) A alusão que a lei faz quanto ao risco de perda da totalidade do investimento está afirmada em função das características do investimento. Trata-se, portanto, de um risco que tem que ser endógeno e próprio do instrumento financeiro e não motivado por qualquer factor extrínseco ao mesmo.

30) O investimento em Obrigações, não é sujeito a qualquer volatilidade, sendo o retorno do investimento certo no final do prazo, por reembolso do capital investido ao valor nominal do títulom(de “capital garantido”), acrescido da respectiva rentabilidade.

31) Logo, não há necessidade de que a advertência do risco de perda da totalidade do investimento seja feita, porque a mesma não é aplicável ao caso!

32) Recordemos que qualquer contrato, seja qual for a sua natureza, apenas um de dois destinos: o cumprimento ou incumprimento! Ou seja, é de uma ingenuidade atroz pensar-se que alguém toma a prestação de qualquer contrato como certa, e não apenas como mais ou menos segura!

33) Por isso, a informação acerca do risco da perda do investimento tem que ser dada em função dos riscos próprios do tipo de instrumento financeiro, o que deve ser feito SE E SÓ SE tais riscos de facto existirem!

34) Não se pode confundir a advertência sobre o risco de perda do investimento com a análise de qualquer qualidade e robustez (ou falta dela) do emitente do título!

35) Não cometeu o R. qualquer acto ilícito!

36) A decisão recorrida violou por errónea interpretação ou aplicação o disposto no art.º 312 do CdVM (na redacção aplicável) e os art.ºs 74 e 75 do RGCISF.

Termos em que se conclui pela procedência do presente recurso, e

por via dele, pela revogação da decisão recorrida e sua substituição por

outra que absolva o Réu do pedido, assim fazendo V. Exas. ...

... JUSTIÇA!»

8. GG e BB, tendo sido notificadas das alegações de recurso apresentadas pelo Recorrente BANCO BIC PORTUGUÊS, S.A., apresentaram contra-alegações em que pugnaram pela manutenção do decidido.

9. Sabido que, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso, a única questão a decidir é a de saber se o Banco réu, enquanto intermediário financeiro, violou culposamente o dever de informação perante os investidores.

10. Em 19-05-2020, foi ordenada a suspensão da instância dos presentes autos, até ser proferido e transitado em julgado o Acórdão Uniformizador do processo n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, que incidiu sobre as questões de direito suscitadas no presente processo e que se reveste de prejudicialidade em relação a esta ação.

11. Declarada a cessação da suspensão de instância, após o trânsito em julgado do AUJ n.º 8/2022, proferido no processo n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1 -A, cumpre apreciar e decidir.

II – Fundamentação

A – Os factos

Factos provados:

1. CC e DD eram clientes do banco BPN, S.A., na sua agência de ..., com a conta no ...08, onde movimentavam parte dos dinheiros, realizavam pagamentos e efetuavam poupanças.

2. No seguimento de contactos por parte de funcionário do BPN, CC aceitou colocar € 100.000,00 seus em obrigações subordinadas SLN 2006.

3. Foi-lhe dito por tal funcionário de que era uma aplicação com as características de um depósito a prazo, com capital e juros garantidos pelo BPN (com rentabilidade assegurada).

4. O referido funcionário do Banco sabia que CC não possuía qualificação ou formação que lhe permitisse conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem.

5. Foi-lhe transmitido que tinha o capital garantido pelo banco réu, com juros semestrais.

6. A subscrição ocorreu sem que CC soubesse, em concreto, o que era, desconhecendo inclusivamente que a SLN era uma empresa.

7. CC ficou convencido de que se tratava de uma aplicação com as características de um depósito a prazo.

8. Se CC tivesse percebido que estava a comprar obrigações de uma sociedade (SLN), cujo pagamento não era garantido pelo banco BPN, nunca teria consentido nem autorizado tal aplicação.

9. Um dos argumentos invocados pela direção comercial do BPN e que os funcionários da rede de balcões do banco réu repetiam junto dos seus clientes, como fizeram com os pais das autoras, era o de que se tratava de um investimento seguro, quanto a capital e juros, e que este assegurava o reembolso do capital investido e juros.

10. Nenhum documento foi entregue acerca de cláusulas sobre “obrigações subordinadas SLN”.

11. As Obrigações SLN 2006 foram emitidas pela SLN, SGPS, S.A., sociedade titular de 100% do capital social do Banco BPN.

12. O capital investido (100.000,00 €) não foi reembolsado até à presente data.

13. O subscritor (pai das autoras) subscreveu os seguintes produtos: Papel Comercial Urbinegócios, em 21 e 24.01.2002, 28.03.2002, 30.09.2002, Papel Comercial Lusafin, em 04.04.2002, Papel Comercial BPN Creditus, em 05.04.2002, 22.04.2002, Papel Comercial Imonações, em 26.04.2002, 09.05.2002, 21.05.2002, 22.07.2002, Papel Comercial Cimpofin, 30.09.2002, Unidades de Participação no Fundo de Investimento Imobiliário Imonegócios em (com o código da CMVM PTYBPDHM0006) 14.01.2003.

14. O pai das autoras subscreveu tais produtos sem conhecer as características concretas dos mesmos, o que não lhe foi explicado pelo réu, através dos seus funcionários, pensando estar o capital garantido pelo BPN.

15. A ... de Setembro de 2010 faleceu CC, no estado de casado com DD, no regime de comunhão geral, deixando como herdeiros esta e os filhos: EE, AA e BB.

16. A ... de Janeiro de 2016 faleceu DD, no estado de viúva de CC, deixando como herdeiros os filhos: EE, AA e BB.

17. DD deixou testamento, datado de 23.12.2010, instituindo como herdeiras da sua quota disponível, em comum, as filhas: AA e BB.

18. Os pais das autoras, num primeiro momento, e agora as autoras vivem(ram) preocupadas, tristes e com receio e ansiedade de não reaver o dinheiro em causa.

Factos não provados:

a. CC autorizou a subscrição também porque poderia levantar o capital quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias.

b. Pensava que SLN era uma mera denominação de conta a prazo que o banco utilizava.

c. As autoras e os seus pais tiveram dificuldades financeiras para gerirem a sua vida.

d. Por causa do exposto, andavam os seus pais em permanente estado de “stress”, doentes e sem alegria de viver, por terem sido desapossados das suas economias de uma vida.

e. O que se transmitiu às autoras.

f. O produto foi sempre apresentado com a obrigação de entrega do capital e dos juros ser da única e exclusiva responsabilidade da entidade emitente e não do Banco.

g. A actuação do réu limitou-se ao cumprimento de ordens de subscrição decorrentes da vontade do subscritor, cumprindo as instruções recebidas.

h. No momento da subscrição, o subscritor foi informado que as obrigações eram emitidas pela Sociedade que detinha o Banco réu, a SLN, Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.

i. E que o reembolso antecipado só seria possível por iniciativa da SLN a partir do 5o ano e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal.

j. Foi informado que a única forma de liquidar este produto unilateralmente seria transmitindo as obrigações a terceiro, mediante endosso.

k. O subscritor, conhecedor disso, quis e expressou vontade de subscrever obrigações subordinadas da referida Sociedade Lusa de Negócios.

l. O subscritor foi informado de todos os elementos referentes às obrigações, nomeadamente os que constavam da nota informativa do produto, bem como da nota interna sobre o mesmo.

m. O risco da aplicação – obrigações subordinadas em causa – era semelhante ao de um depósito a prazo no próprio banco.

B – O Direito

1. Discute-se no presente processo a responsabilidade civil do Banco, enquanto intermediário financeiro, pela violação do dever de informação acerca das caraterísticas do produto financeiro subscrito (obrigação SLN 2006), pelo pai das autoras, investidor conservador, que, por conselho do seu gestor de conta, aplicou 10.000,00 euros das suas poupanças para adquirir obrigações SLN 2006, julgando tratar-se de uma aplicação com a mesma segurança de um depósito a prazo tal como lhe foi garantido pelo Banco.

2. O direito aplicável é o Código de Valores Mobiliários, na redação originária do DL n.º 486/99, de 13 de novembro, uma vez que as obrigações foram subscritas em 2006, antes do início de vigência do DL n.º 357-A/2007, de 31 de outubro.

Aplicáveis são também as normas de direito comum relativas à responsabilidade civil pré-contratual (artigo 227.º do Código Civil) e à responsabilidade civil contratual (artigos 798.º e seguintes do Código Civil), bem como as normas jurídicas que regulam o dever de indemnização (artigo 562.º e 564.º do Código Civil) e o nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano (artigo 563.º do Código Civil).

3. Sobre a questão de direito aqui suscitada pelo recorrente, foi proferido um Acórdão Uniformizador de Jurisprudência (doravante designado por AUJ n.º 8/2022), proferido no Processo n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A e publicado em Diário da República, I .ª Série, N.º 212, 3 de novembro de 2022, pp. 10 e seguintes.

O AUJ n.º 8/2022 pronunciou-se sobre as questões da ilicitude e do nexo de causalidade enquanto pressupostos da responsabilidade civil do intermediário financeiro, rejeitando a tese de que a presunção de culpa consagrada no artigo 799.º do Código Civil incluiria uma presunção de ilicitude e de causalidade, e onerando o investidor com o ónus de provar que o Banco violou o dever de informação que sobre ele recai e que esse facto ilícito, que se presume culposo, atuou como a causa adequada da decisão de investir do cliente, subscritor do produto financeiro.

O AUJ uniformizou jurisprudência de acordo com os seguintes critérios:

«1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos artigos 7.º, nº 1, 312º nº 1, alínea a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, e 342.º, nº 1, do Código Civil, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano.

2. Se o Banco, intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em “produtos de risco” – informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o “reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco”), sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no artigo 7.º, n.º1, do CVM.

3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.

4. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir».

4. No caso vertente, procederemos à aplicação das orientações fixadas no AUJ n.º 8/2022 aos factos do caso concreto, para aferir a violação do dever de informação – a única questão suscitada – através de uma operação de subsunção dos factos na norma.

Esta é a metodologia decisória que resulta da circunstância de o acórdão de uniformização de jurisprudência, apesar de não gozar do caráter vinculativo das fontes de direito, constituir um “precedente judiciário qualificado” (cfr. Castro Mendes/Teixeira de Sousa, Manual de Processo Civil, Volume II, AAFDL Editora, Lisboa, p. 201), conforme se deduz do regime do artigo 629.º, n.º 2, al. c), do CPC, preceito segundo o qual é sempre admissível interpor recurso contra qualquer decisão que contrarie a jurisprudência uniformizada pelo Supremo Tribunal de Justiça.

Apesar de não estarmos, rigorosamente, perante um precedente judiciário em relação ao acórdão recorrido, que foi proferido antes do AUJ n.º 8/2022, há que considerar que o presente processo esteve com a instância suspensa a fim de lhe ser aplicada a orientação que viesse a ser fixada no AUJ a proferir no processo n.º1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, pelo que estamos, num sentido substancial, perante uma decisão uniformizadora dotada de uma força especial de persuasão.

5. Vejamos, pois, se as autoras, herdeiras do autor e da sua mulher, cumpriram o ónus da prova da violação do dever de informação, nos termos exigidos pelo AUJ n.º 8/2022:

CC e DD, pais das autoras, eram clientes do banco BPN, S.A., na sua agência de ... (facto provado n.º 1). No seguimento de contactos por parte de funcionário do BPN, CC aceitou colocar 100.000,00 euros seus em obrigações subordinadas SLN 2006 (facto provado n.º 2). As Obrigações SLN 2006 foram emitidas pela SLN, SGPS, S.A., sociedade titular de 100% do capital social do Banco BPN. (facto provado n.º 11). Segundo o facto provado n.º 3, foi-lhe dito por tal funcionário de que era uma aplicação com as características de um depósito a prazo, com capital e juros garantidos pelo BPN (com rentabilidade assegurada). Note-se que, segundo o facto provado n.º 4, o referido funcionário do Banco sabia que CC não possuía qualificação ou formação que lhe permitisse conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem. O banco transmitiu ao cliente, pai das autoras, que a obrigação SLN 2006 tinha o capital garantido pelo banco réu, com juros semestrais (facto provado n.º 5). O facto provado n.º 6 afirma que a subscrição ocorreu sem que CC soubesse, em concreto, o que era, desconhecendo inclusivamente que a SLN era uma empresa. CC ficou convencido de que se tratava de uma aplicação com as características de um depósito a prazo (facto provado n.º 7). O facto n.º 8 dá como provado que se CC tivesse percebido que estava a comprar obrigações de uma sociedade (SLN), cujo pagamento não era garantido pelo banco BPN, nunca teria consentido nem autorizado tal aplicação. Nenhum documento foi entregue acerca de cláusulas sobre “obrigações subordinadas SLN” (facto provado n.º 10). O capital investido (€100.000,00) não foi reembolsado até à presente data (facto n.º 12). Apesar de o pai da autora ter já subscrito fundos de investimento e papel comercial (facto provado n.º 13), subscreveu tais produtos sem conhecer as características concretas dos mesmos, o que não lhe foi explicado pelo réu, através dos seus funcionários, pensando estar o capital garantido pelo BPN (facto provado n.º 14).

6. Neste quadro fáctico, deve entender-se que ficou demonstrado que foi o Banco, através de funcionário em quem o pai das autoras confiava, que propôs a aplicação do dinheiro em obrigações SLN 2006, iniciativa que faz aumentar a intensidade da culpa do Banco na violação do dever de informação que possa ocorrer. O pai das autoras era um cliente não qualificado e sem literacia financeira, o que o funcionário do Banco sabia, e, mesmo assim, propôs a compra de obrigações SLN a um cliente conservador, sem ter em conta o perfil deste e sem o informar devidamente. Apesar de o pai das autoras ter subscrito outros produtos financeiros, fê-lo sempre sem ter sido esclarecido pelo réu e julgando tratar-se de depósitos a prazo (factos provados n.os 13 e 14). O Banco prestou, pois, informação errónea, inexata e obscura ao pai das autoras, na medida em que o iludiu quanto ao risco de perda de capital, negando esta possibilidade, quando tinha conhecimento que o autor não tria subscrito a obrigação se soubesse que podia perder capital. O Banco omitiu também quem era a entidade emitente da obrigação e, afirmando que se tratava de um produto semelhante a um depósito a prazo, omitiu explicações que eram devidas quanto ao tipo de investimento em causa, aos riscos da operação e ao regime jurídico das obrigações em caso insolvência da entidade emitente. Todos estes aspetos são considerados pela lei e pelo AUJ n.º 8/2022, caraterísticas essenciais do produto que deviam ter sido esclarecidas ao autor para que este pudesse tomar uma decisão livre e consciente. Veja-se o artigo 312.º, n.º 1, als. a) – c), do CVM/99, que inclui no dever de informação os riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar, qualquer interesse que o intermediário financeiro ou as pessoas que em nome dele agem tenham no serviço prestado ou a prestar, a existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de proteção equivalente que abranja os serviços a prestar. É entendimento da lei e da jurisprudência, que o AUJ n.º 8/2022 também adotou, que a relação contratual obrigacional, que se estabelece entre o cliente e o intermediário financeiro, exige deste um elevado padrão de conduta, com lealdade e rigor informativo pré-contratual e contratual: informação completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita (artigo 7.o, n.o 1, do CVM/1999), tendo em conta que, entre clientes não qualificados, a avaliação do risco não é tão informada quanto a da contraparte.

7. A lei consagra ainda o princípio da proporcionalidade inversa, de acordo com o qual «A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente» (n.º 2 do artigo 312.º do CVM).

Acresce que, nos termos do AUJ n.º 8/2022, o intermediário financeiro tem o dever de se informar sobre o cliente e proporcionar-lhe informação clara, cabal e relevante para a opção que pretende tomar e tem de ter a iniciativa de prestar a informação, não tendo o investidor não institucional o dever de a solicitar. Ou seja, o Banco tem de ter um papel proativo na prestação da informação ao investidor não qualificado, em vez de esperar passivamente pela iniciativa do investidor.

Reportando-se a um caso semelhante aos destes autos, o AUJ n.º 8/2022, esclarece que, se o intermediário financeiro equipara uma obrigação a um depósito a prazo e afirma que o capital é garantido, sem informar que não é o Banco a entidade responsável pelo crédito e qual o regime jurídico das obrigações em caso de insolvência e a inexistência de fundos de garantia em caso de incumprimento da entidade emitente, falta aos seus deveres de informar com verdade, rigor e exatidão o investidor:

«Ora, se o intermediário financeiro equipara simplesmente a subscrição de obrigações subordinadas a um depósito a prazo, viola esse dever de informação, porquanto existem diferenças assinaláveis e muito significativas entre os dois produtos, que aqui resumidamente se apontam:

— As obrigações representam um direito de crédito sobre a entidade emitente (artigo 348.º do Código das Sociedades Comerciais), o que implica que é a entidade emitente que fica obrigada a restituir ao titular da obrigação (credor obrigacionista) quer o montante que lhe é mutuado quer os juros respetivos, quando convencionados, restituição que dependerá sempre da solidez financeira da entidade emitente.

A subscrição de uma obrigação é um investimento e, através da sua aquisição, os investidores aplicam as suas poupanças visando uma remuneração do capital investido mais elevada, embora com mais riscos do que aqueles que resultariam de outras aplicações do capital, designadamente, através dos depósitos a prazo.

As entidades emitentes colocam no mercado, pelo melhor preço que consigam obter, os valores mobiliários que emitem no intuito de conseguirem formas alternativas de financiamento da sua atividade sem os custos do recurso ao crédito bancário.

— Os depósitos a prazo são exigíveis no fim do prazo por que foram constituídos, podendo as instituições de crédito conceder aos seus depositantes, nas condições acordadas, a sua mobilização antecipada (artigo 1.º, n.º 4, do Decreto -Lei n.º 430/91, de 2 de novembro).

Como se refere no acórdão de 5/12/2019, no contrato de depósito bancário, o Banco (depositário) tem a obrigação de restituir quantia idêntica à depositada, findo o prazo do depósito, acrescido de juros, caso hajam sido convencionados. No depósito bancário o valor depositado será sempre disponibilizado quando solicitado pelo cliente, não obstante a eventual perda dos frutos do depósito, mesmo nos casos de depósito a prazo não mobilizáveis antecipadamente. E quando os depósitos da instituição de crédito se tornam indisponíveis, o reembolso dos depósitos é garantido pelo Fundo de Garantia de Depósitos até ao valor global dos saldos em dinheiro de cada depositante, em conformidade com o limite estabelecido na lei.

— o Fundo de Garantia de Depósitos encontra -se regulado nos artigos 154.º e ss. do Regime Geral das Instituições de Crédito. A garantia de depósitos foi regulada pela Diretiva n.o 94/19/CE, do Parlamento e do Conselho, de 30 de maio de 1994 e foi transposta para a ordem jurídica interna pelo Decreto -Lei n.º 246/95, de 14 de setembro —(...).

8. Considera-se, pois, cumprido pelas filhas do autor, suas herdeiras, o ónus da prova da ilicitude dos factos. Os factos ilícitos praticados presumem-se, também, culposos nos termos da lei (artigo 799.º, n.º 1, do Código Civil e 314.º, n.º 2, do CVM).

Da matéria de facto provada decorre que esta presunção não foi afastada. A culpa do intermediário financeiro não se afere pelo critério geral e abstrato da pessoa média (ou bom pai de família, na expressão arcaica do artigo 487.º do Código Civil), mas antes, dada a natureza profissional do banco/intermediário financeiro, é-lhe exigível um grau de diligência mais acentuado, devendo este atuar de acordo com padrões de elevada diligência, lealdade e boa fé, não sendo toleráveis procedimentos que possam sequer ser incursos em culpa leve (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 10-04-2018, proferido no processo n.º 753/16.4TBLSB.L1.S1).

9. Em conclusão, à luz da lei, que tem por objetivo a proteção da parte mais fraca da relação contratual – os investidores não qualificados – e à luz do AUJ n.º 8/2022, que a interpreta também nesse sentido, é manifesto que, nos factos do caso sub judice, o Banco violou o dever de informação a que está vinculado, facto ilícito que se presume culposo, nos termos dos artigos 799.º, n.º 1, do Código Civil e 314.º, n.º, 2, do CVM.

10. Não tendo o recorrente questionado, no recurso de revista, a existência ou não de nexo de causalidade entre o facto e o dano, nem a prova do dano e o método de cálculo da indemnização, nada mais há a apreciar, remetendo-se para o acórdão recorrido que consagrou na matéria de facto o requisito do nexo causalidade adequada, no facto provado n.º 8 – «Se CC tivesse percebido que estava a comprar obrigações de uma sociedade (SLN), cujo pagamento não era garantido pelo banco BPN, nunca teria consentido nem autorizado tal aplicação» - em formulação idêntica ao segmento 4 do AUJ n.º 8/2022.

Tendo ficado provado no facto n.º 12 que o capital investido (100.000,00 euros) não foi reembolsado até à presente data, está provado o dano patrimonial indemnizável e confirma-se a decisão das instâncias que condenaram o Banco réu, Banco BIC Português, S.A., a pagar às autoras e ao interveniente a quantia de €100.000,00 (cem mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

11. Anexa-se sumário elaborado pelo Relatora, de acordo com o n.º 7 do artigo 663.º do CPC:

I – Nos termos do AUJ n.º 8/2022, no âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos artigos 7.º, nº 1, 312º nº 1, alínea a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, e 342.º, nº 1, do Código Civil, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente imposto.

II. Se o Banco, intermediário financeiro – que propôs a subscrição de obrigações subordinadas SLN 2006 a um investidor sem literacia financeira, que não pretendia subscrever produtos de risco, dizendo-lhe que era uma aplicação com as características de um depósito a prazo, com capital e juros garantidos pelo BPN (com rentabilidade assegurada), e omitindo a identidade da empresa emitente, bem como qualquer explicação sobre o conceito de obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no artigo 7.º, n.º1, do CVM.

III – Decisão

Pelo exposto, decide-se na 1.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça negar a revista e confirmar o acórdão recorrido.

Custas da revista pelo recorrente.

Lisboa, 20 de junho de 2023


Maria Clara Sottomayor (Relatora)

Pedro de Lima Gonçalves (1.º Adjunto)

Maria João Vaz Tomé (2.ª Adjunta)