Decisão Texto Integral: |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
No 1º Juízo Criminal de Loulé, no processo comum colectivo sob o nº 22/05.ZRFAR (processo principal) e nº 23.053ZRFAR, foram os arguidos abaixo e adiante identificados – todos com os demais sinais dos autos - submetidos a julgamento perante tribunal colectivo e, a final, condenados nos termos seguintes (indicados a seguir à identificação de cada um deles):
I – AA, ou “J...”, nascido a 14 de Maio de 1957, filho de BB e CC, natural da ilha Sacalina, Rússia, de nacionalidade ucraniana, pelos seguintes crimes, nas seguintes penas parcelares:
1. Autoria material do crime doloso consumado de ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 3, do Código Penal - SETE ANOS DE PRISÃO.
2. Autoria material do crime doloso consumado de AUXÍLIO À IMIGRAÇÃO ILEGAL, previsto e punido pelo artigo 183º, nº 1 e nº 2, da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho - DOIS ANOS E SEIS MESES DE PRISÃO.
3. Autoria material, em concurso real, de SEIS crimes dolosos consumados de LENOCÍNIO, previstos e punidos pelo artigo 169º, nº 1 e nº 2, alínea a), do Código Penal - por CADA UM destes seis crimes: SEIS ANOS DE PRISÃO.
4. Autoria material, em concurso real, de TREZE crimes dolosos consumados de EXTORSÃO, previstos e punidos pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal - por CADA UM destes treze crimes: DEZ ANOS DE PRISÃO.
5. Autoria material do crime doloso consumado de RAPTO, previsto e punido pelo artigo 161º, nº 1, alíneas a) e c), do Código Penal - SEIS ANOS DE PRISÃO.
CUMULADAS JURIDICAMENTE as penas parcelares aplicadas, nos termos do artigo 77º do Código Penal, foi o arguido AA condenado na pena única de VINTE E CINCO ANOS DE PRISÃO.
II - GG, ou “V...”, nascido a 20 de Abril de 1979, filho de OO, natural da Ucrânia, de nacionalidade ucraniana, pelos seguintes crimes, nas seguintes penas parcelares:
1. Autoria material do crime doloso consumado de ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 3, do Código Penal - SEIS ANOS E SEIS MESES DE PRISÃO.
2. Autoria material, em concurso real, de DOIS crimes dolosos consumados de LENOCÍNIO, previstos e punidos pelo artigo 169º, nº 1 e nº 2, alínea a), do Código Penal - por CADA UM destes dois crimes: SEIS ANOS DE PRISÃO.
3. Autoria material, em concurso real, de QUATRO crimes dolosos consumados de EXTORSÃO, previstos e punidos pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal - por CADA UM destes dois crimes: NOVE ANOS DE PRISÃO.
CUMULADAS JURIDICAMENTE as penas parcelares aplicadas, nos termos do artigo 77º do Código Penal, foi o arguido GG condenado na pena única de VINTE E DOIS ANOS DE PRISÃO.
III - JJ, nascida a 15 de Novembro de 1977, filha de JJ e de MM, natural da Ucrânia, de nacionalidade ucraniana, por autoria material do crime doloso consumado de ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 3, do Código Penal, na pena de SEIS ANOS E SEIS MESES DE PRISÃO.
IV - KK nos autos inicialmente como NN, nascido a 9 de Junho de 1977, natural da Ucrânia, de nacionalidade ucraniana pelos seguintes crimes, nas seguintes penas parcelares:
1. Autoria material do crime doloso consumado de ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal - QUATRO ANOS E SEIS MESES DE PRISÃO.
2. Autoria material do crime doloso consumado de LENOCÍNIO, previsto e punido pelo artigo 169º, nº 1 e nº 2, alínea a), do Código Penal - SEIS ANOS DE PRISÃO.
3. Autoria material, em concurso real, de QUATRO crimes dolosos consumados de EXTORSÃO, previstos e punidos pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal - por CADA UM destes quatro crimes: NOVE ANOS DE PRISÃO.
4. Autoria material, do crime doloso consumado de USO DE DOCUMENTO FALSO, previsto e punido pelo artigo 256º, nº 1, alínea e), e nº 3, do Código Penal - DOIS ANOS DE PRISÃO.
CUMULADAS JURIDICAMENTE as penas parcelares aplicadas, nos termos do artigo 77º do Código Penal, foi o arguido KK condenado na pena única de VINTE ANOS DE PRISÃO.
V - DD, ou “M...”, nascido a 6 de Março de 1974, filho de TT e PP, natural da Ucrânia, de nacionalidade ucraniana, pelos seguintes crimes, nas seguintes penas parcelares:
1. Autoria material do crime doloso consumado de ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal - QUATRO ANOS E SEIS MESES DE PRISÃO.
2. Autoria material de crime doloso consumado de EXTORSÃO, previsto e punido pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal - NOVE ANOS DE PRISÃO.
3. Autoria material do crime doloso consumado de ROUBO, previsto e punido pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal - SEIS ANOS DE PRISÃO.
CUMULADAS JURIDICAMENTE as penas parcelares aplicadas, nos termos do artigo 77º do Código Penal, foi o arguido DD na pena única de DEZASSETE ANOS DE PRISÃO.
VI - CADA UM dos arguidos:
- EE, nascido em 30 de Junho de 1970, filho de HH e de QQ, natural da Ucrânia, de nacionalidade ucraniana; e
- II, ou “P....”, nascido a 17 de Junho de 1976, filho de RR e ZZ, natural da Ucrânia, de nacionalidade ucraniana,
pelos seguintes crimes, nas seguintes penas parcelares:
1. Autoria material do crime doloso consumado de ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal - QUATRO ANOS E SEIS MESES DE PRISÃO.
2. Autoria material, em co-autoria, de um crime doloso consumado de EXTORSÃO (k Sprevisto e punido pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal - NOVE ANOS DE PRISÃO.
3. Autoria material, em co-autoria, do crime doloso consumado de VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO, previsto e punido pelo artigo 190º, nº 1 e nº 3, do Código Penal - DOIS ANOS DE PRISÃO.
CUMULADAS JURIDICAMENTE as penas parcelares aplicadas, nos termos do artigo 77º do Código Penal, foi CADA UM dos arguidos EE e II, condenado na pena única de TREZE ANOS DE PRISÃO.
VII - CADA UM dos arguidos:
- VV, nascido a 6 de Dezembro de 1969, filho de DDD e de EEE natural da Rússia, de nacionalidade russa; e
-FFF, nascido a 13 de Outubro de 1977, filho de CH...e de Zi.......a, natural da Rússia, de nacionalidade russa,
pelos seguintes crimes, nas seguintes penas parcelares:
1. Autoria material do crime doloso consumado de ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal - QUATRO ANOS E SEIS MESES DE PRISÃO.
2. Autoria material de um crime doloso consumado de EXTORSÃO (UUU), previsto e punido pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal - SETE ANOS DE PRISÃO.
CUMULADAS JURIDICAMENTE as penas parcelares aplicadas, nos termos do artigo 77º do Código Penal, foi CADA UM dos arguidos VV e FFF condenado na pena única de DEZ ANOS DE PRISÃO.
VIII - AAA, nascida a 27 de Abril de 1968, filha de III e de JJJ, natural da Ucrânia, de nacionalidade ucraniana por autoria material do crime doloso consumado de ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal, na pena de CINCO ANOS DE PRISÃO.
IX - KKK, ou “T.....”, nascida a 12 de Novembro de 1976, filha de RR e de OOO natural da Ucrânia, de nacionalidade ucraniana, pelos seguintes crimes, nas seguintes penas parcelares:
1. Autoria material do crime doloso consumado de ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal - QUATRO ANOS E SEIS MESES DE PRISÃO.
2. Autoria material de DOIS crimes dolosos consumados de LENOCÍNIO, previstos e punidos pelo artigo 169º, nº 1, do Código Penal - por CADA UM destes dois crimes: QUATRO ANOS DE PRISÃO.
CUMULADAS JURIDICAMENTE as penas parcelares aplicadas, nos termos do artigo 77º do Código Penal, foi a arguida KKK condenada na pena única de DEZ ANOS DE PRISÃO.
O mesmo Tribunal Colectivo acordou ainda:
Em DECLARAR perdidas a favor do Estado todas as coisas apreendidas, incluindo os veículos, o que deverá ser de imediato comunicado à entidade competente.
Daqueles onze arguidos, apenas JJ e EE, não recorreram.
Inconformados, recorreram os restantes nove arguidos para o Tribunal da Relação de Évora que, por acórdão de 28 de Outubro de 2008, decidiu:
A – Negar provimento ao recurso interposto pelo arguido IIY e confirmar integralmente a decisão recorrida, quanto a ele.
B – Conceder parcial provimento aos seguintes recursos:
B.1. – Recurso do arguido UU
Julga-se parcialmente procedente o recurso interposto por este arguido, em matéria de facto e de direito e, consequentemente:
1.a) Em resultado de ser julgada não provada a matéria de facto antes constante do nº 128 p. da factualidade provada, vai o arguido absolvido da prática de um crime de Extorsão p. e p. pelos artigos 223º nº1 e nº 3 al. a) e 204º nº 2g), do C. Penal, na pessoa de NNN, pelo qual foi condenado em 1ª instância na pena de 10 anos de prisão;
b) Em resultado de ser julgada não provada a matéria de facto antes constante dos nºs 180 p., 181 p., 184 p. e 185 p. da factualidade provada, vai o arguido absolvido do crime de rapto p. e p. pelo art. 161º nº1 als a) e c) do C. Penal, pelo qual foi condenado em 1ª instância na pena parcelar de 6 anos de prisão;
c) Em resultado de ser julgada não provada a matéria de facto respeitante ao arguido AA antes constante do nº 241 p. da factualidade provada, vai revogada a decisão que declarou perdidos a favor do Estado os bens apreendidos àquele arguido;
d) Dado que a matéria de facto descrita (maxime sob os nºs 82p. a 90 p) não integra os elementos objectivos do respectivo crime, vai o arguido absolvido do crime de auxílio à imigração ilegal p. e p. pelo art. 183º nº1 e nº2 da Lei 23/2007 de 4 de Julho, relativamente a PPP., pelo qual foi condenado em 1ª instância na pena parcelar de 2 anos e 6 meses de prisão;
e) Dado que a matéria de facto descrita (maxime sob os nºs 82 p. a 90 p, 91 p. a 99 p, 100 p a 108 p e 126 p. e 127 p., respectivamente) não integra os elementos objectivos dos respectivos crimes, vai o arguido absolvido de quatro crimes de Lenocínio p. e p. pelo art. 169º nº 1 e nº2 a) do C.Penal, relativos a PPP, QQQ, LLL e NNN, pelos quais foi condenado em 1ª instância nas penas parcelares de 6 anos de prisão, por cada um deles;
f) Dada a relação de concurso aparente entre os dois crimes qualificados de Extorsão previstos e puníveis pelo art. 223º nº3 al. a) do C.Penal, praticados nas pessoas de UUU e CCC e os crimes de Lenocínio qualificado por violência e ameaça contra elas, vai o arguido absolvido destes dois crimes de Lenocínio qualificado p. e p. pelo art. 169º nº2 a) do C. Penal, pelos quais foi condenado em 1ª instância nas penas parcelares de 6 anos de prisão, por cada um deles.
Em sua substituição decide-se condenar o arguido pela prática de dois crimes de Lenocínio simples p. e p. pelo art. art. 169º nº1 do C.Penal, nas penas de 3 anos de prisão quanto aos factos relativos a UUU e de 3 anos e 6 meses de prisão quanto aos factos relativos a TTT
2. Em síntese, vai o arguido AA condenado nas seguintes parcelares:
- Autoria material de 1 crime doloso consumado de Associação Criminosa, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 3, do Código Penal, pelo qual foi condenado em 1ª instância na pena de 7 anos de prisão;
- Autoria material de 12 crimes de Extorsão, previstos e punidos pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal, em concurso efectivo real, pelos quais foi condenado em 1ª instância na pena de 10 anos de prisão por cada um deles;
- Autoria de dois crimes de Lenocínio simples p. e p. pelo art. art 169º nº1 do C.Penal, em substituição da condenação por três crimes dolosos consumados de Lenocínio, previstos e punidos pelo artigo 169º, nº 1 e nº 2, alínea a), do Código Penal, praticados nas pessoas de UUU e CCC, nas penas de 3 anos e 3 anos e 6 meses de prisão, respectivamente;
Em cúmulo jurídico vai o arguido condenado na pena única de 22 anos de prisão.
3. - Em resultado da procedência parcial da impugnação da decisão sobre matéria de facto deduzida por este arguido e pela arguida AAA decide-se ainda modificar a decisão recorrida constante da al. ah) do respectivo dispositivo, relativa à perda de bens a favor do Estado, procedendo a impugnação dos arguidos I.....e AAA nesta parte e, em consequência, REVOGA-SE aquela mesma decisão no segmento em que declarou perdidos a favor do Estado os objectos em ouro e pedras preciosas descritos sob o nº 214p. (igualmente referidos sob o nº 210p), a TV, telemóveis, máquina fotográfica, carteira, bolsa, bem como o veículo automóvel “Peugeot Boxer ...........’, referido sob nº 213p, que foram apreendidos aos arguidos AA e AAA os quais devem ser entregues a quem provar pertencer-lhes, após trânsito em julgado da decisão.
B.2. – GG
a) Aproveitando-lhe o recurso interposto pelo arguido AA, vai o arguido absolvido da autoria material de dois crimes de LENOCÍNIO qualificados p. e p. pelo artigo 169º, nº 1 e nº 2, alínea a), do Código Penal, relativos a LLL e CCC;
b) Em substituição, vai o arguido condenado, por co-autoria num crime de Lenocínio simples p. e p. pelo art. 169º nº1 do C.Penal, relativamente a CCC, na pena de 3 anos de prisão;
c) Em síntese, vai o arguido GG condenado nas seguintes penas:
- Seis anos e seis meses de prisão pela co-autoria do crime de ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 3, do Código Penal;
- Três anos de prisão pela co-autoria de um crime de LENOCÍNIO SIMPLES p. e p. pelo artigo 169º nº 1 do Código Penal, relativamente a CCC;
- Nove anos de prisão por cada um de quatro crimes dolosos consumados de EXTORSÃO, previstos e punidos pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal.
Em cúmulo jurídico vai condenado na pena única de 18 anos de prisão.
B.3. – Recurso do arguido KK
a) Vai o arguido absolvido da autoria de 3 crimes de Extorsão qualificada p. e p. pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal , nas pessoas de RRR, XXX e ZZZ.
Em substituição vai o arguido condenado como cúmplice de 1 crime de Extorsão qualificada p. e p. pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), 27º e 73º, do Código Penal , na pessoa de ZZZ., na pena de 4 anos de prisão;
b) Dada a relação de concurso aparente entre o crime qualificado de Extorsão previsto e punível pelos arts. 223º nºs 1 e 3 al. a) e 204º nº2 g), do C.Penal e o crime de Lenocínio qualificado por violência e ameaça p. e p. pelo art. 169º nº2 a) do C. Penal, relativamente a CCC, vai o arguido absolvido deste crime de Lenocínio qualificado.
Em sua substituição decide-se condenar o arguido pela prática de 1 crime de Lenocínio simples p. e p. pelo art. 169º nº1 do C.Penal, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão em concurso real efectivo com o referido crime de Extorsão agravada p. e p. pelos arts 223º nºs 1 e 3 a) e 204º nº2 g), do C.Penal, pelo qual vai agora condenado na pena parcelar de 7 anos de prisão;
Mantém-se o mais decidido quanto a este arguido.
c) Assim, em síntese, vai agora o arguido condenado em concurso efectivo real pelos seguintes crimes e penas:
- Autoria de um crime de Associação Criminosa, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal, na pena de 4 anos de prisão;
- Autoria de 1 crime de Extorsão qualificado, previsto e punido pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal, contra CCC, na pena de 7 anos de prisão;
- Um crime de Lenocínio simples p. e p. pelo art. 169º nº1, contra CCC, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão;
- Cumplicidade na prática de um crime de Extorsão, previsto e punido pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal, na pessoa de ZZZ, na pena de 4 anos de prisão;
- Autoria de 1 crime de Uso de Documento Falso, previsto e punido pelo artigo 256º, nº 1, alínea e), e nº 3, do Código Penal, na pena de 2 anos de prisão.
Em cúmulo jurídico vai o arguido KK condenado na pena única de 14 anos de prisão.
B.4. – Recurso do arguido DD
O recurso deste arguido apenas procede, relativamente à medida concreta das penas aplicadas pelo crime de Extorsão qualificada p. e p. pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal, contra MMM, pelo qual vai agora condenado na pena de 8 meses??????????????? de prisão e na pena aplicada pela autoria de um crime de roubo p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, contra DDDD, pelo qual vai agora condenado na pena de 5 anos de prisão.
Em tudo o mais, julga-se improcedente o recurso interposto por este arguido.
São, assim, as seguintes as penas que integram o concurso de crimes a punir com a pena única a determinar:
- 4 anos de prisão pela co-autoria no crime de Associação Criminosa, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal;
- 8 anos de prisão pela co-autoria no crime de extorsão, previsto e punido pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal, contra MMM;
- 5 anos de prisão pela co-autoria no crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, contra DDDD.
Reformulando o cúmulo jurídico, vai o arguido condenado na pena única de 12 anos de prisão.
B.5. – Recursos dos arguidos VV e FFF.
Os recursos destes arguidos apenas procedem parcialmente relativamente à medida concreta da pena aplicada pelo crime de Associação criminosa e à medida da pena única, improcedendo quanto a tudo o mais.
Assim, procedendo parcialmente o recurso por si interposto, vai cada um dos arguidos condenados pela prática, em co-autoria de um crime de Associação criminosa previsto e punível pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal, na pena de 4 anos de prisão.
Em cúmulo jurídico desta pena com a pena parcelar de 7 anos de prisão (que se mantém) pela co-autoria no crime de extorsão, previsto e punido pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal, contra HHH, vai cada um dos arguidos condenados na pena única de 8 anos de prisão.
B.6. – O recurso da arguida AAA
Julga-se parcialmente procedente a impugnação da decisão sobre a matéria de facto descrita sob o nº 241p da factualidade provada com a consequente revogação parcial da declaração de perda de bens a favor do Estado, proferida em 1ª instância, como decidido a propósito do arguido AA mas, como aí se menciona, aplicando-se totalmente à arguida AAA o aí decidido na sequência do recurso por si interposto.
Julga-se ainda parcialmente procedente o recurso desta arguida em matéria de escolha e medida da pena, improcedendo no mais, quer em matéria de facto, quer de direito.
Assim, vai a arguida condenada pela prática, em co-autoria, de um crime de Associação Criminosa, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, sujeitando a arguida ao dever de entregar a quantia de 500 € (quinhentos euros) a instituição de solidariedade social dedicada a prestar auxílio a ex-prostitutas, no prazo de 3 meses a contar do trânsito em julgado de decisão, com apoio dos serviços de reinserção social, se necessário – cfr art. 51º nºs 1 c) e 4 do C.Penal.
B.7. – O recurso da arguida KKK.
a) Vai a arguida absolvida da prática de um crime de Lenocínio p. e p. pelo art. 169º nº1 do C.Penal relativamente a UUU;
b) Julga-se parcialmente procedente o recurso desta arguida em matéria de escolha e medida das penas, improcedendo no mais, quer em matéria de facto, quer de direito.
Assim, vai a arguida condenada, em concurso efectivo real:
- Pela prática, em co-autoria, de um crime de Associação Criminosa, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal na pena de 2 anos e 6 meses de prisão;
- Pela prática de um crime de Lenocínio p. e p. pelo art. 169º nº1 do C.Penal relativamente a CCC, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão;
Em cúmulo jurídico, vai a arguida condenada na pena única de 3 anos e 6 meses de prisão suspensa na sua execução por igual período de tempo, com regime de prova, cujo plano de reinserção social incluirá - para além do mais que os serviços de reinserção venham a propor e o tribunal a quo a aprovar, de acordo com os considerandos ora expostos relevantes para o efeito - o cumprimento de todas as obrigações indicadas nas alíneas do nº3 do art. 54º C.Penal.
Custas pelos arguidos, fixando-se as respectivas taxas de justiça nos seguintes termos, de acordo com o disposto nos art.s 513º e 514º, do CPP, 82º e 87 nº1 b) e 3 do CCJ:
- o arguido UU, 13 UC;
- o arguido KK, 10 UC;
-os arguidos GG, DD, AAA e KKK, 9 UC;
- os arguidos VV, FFF e II, 8UC
Inconformados com esta condenação, interpuseram recurso os arguidos:
1 – AA
2 – GG
3 – KK
4 – DD
5 – VV
6 – FFF
Nas respectivas motivações, formulam as seguintes CONCLUSÕES:
1 - O arguido/recorrente AA:
Das intercepções telefónicas, e verificando expressamente as identificadas pelos números n.° 36 ( fls. 8539), n.° 41 ( fls. 8541), n.° 43 a 45 ( fls. 43 a 45), não resulta nenhuma ameaça do Recorrente a UUU, nem acto de violência, nem a prática de prostituição, e a testemunha VVV não revela razão de ciência, uma vez que não ouviu qualquer declaração ou manifestação de violência ( Cfr. depoimento gravado em fita magnética J, todo o lado A e desde o início ao n.° 1057 do lado B.), sendo certo que mesmo que UUU lhe tivesse revelado tal facto, tinha sido à luz de declarações prestadas no âmbito do processo, e não se ouvindo a testemunha UUU, o depoimento da testemunha VVV não passa de um depoimento indirecto, que nestas circunstâncias não vale como prova.
E finalmente, ao contrário do que conclui o Acórdão ora recorrido com manifesta falta de fundamentação, a ausência de depoimento de UUU revelando se foi alvo de ameaça ou de acto violência, ou se se dedicava à prostituição, releva para se concluir que não pode ser dado como provado o teor dos pontos 79p. a 81 p. da decisão da Primeira Instância, é que se não existe ameaça ou violência demonstrada nas citadas intercepções telefónicas, nem nas declarações do Recorrente, nem tão pouco no depoimento de VVV que só sabe o que ouviu a testemunha dizer em sede. de recolha de depoimento, e que como tal esse conhecimento jamais pode ser alvo de qualquer credibilidade e nem sequer ponderado atenta à proibição de valoração de conhecimentos por tomada de depoimento, ao que acresce, que se UUU não prestou depoimento em Audiência de Julgamento tal como sucedeu com NNN, e considerando que não existe mais nenhuma prova em ambos os casos aptas a demonstrar a pratica de ameaças ou violências que levassem ao constrangimento, Assim, do exposto resulta claro que do confronto da prova resultante dos presentes autos, conjugado com os tipos legais de extorsão e de prostituição, e com o senso comum, ressalta à evidência que o Recorrente não emitiu qualquer ameaça nem praticou qualquer acto de violência, pelo que o tribunal ora recorrido violou claramente as regras de experiência e baseou-se em juízos arbitrários para considerar provado que o Recorrente praticou os factos descritos nos pontos 79p. e 81 p., e para concluir que praticou um crime de extorsão, quando nem sequer se podiam dar como provados factos que preenchiam estes tipos ( n3o há ameaça, nem violência o que afasta a pratica do crime de extorsão nem existe prática de prostituição, o que afasta o crime de lenocínio).
Considera o ora Recorrente que o Tribunal ora recorrido errou de forma notória na apreciação das declarações para Memória Futura da testemunha TTT, pois demonstra-se a falta de credibilidade das mesmas, exactamente pelo teor das próprias senão vejamos: CCC declarou que pagou ao Recorrente durante 5 meses, se em Março 2005 ela pagou € 2500,00 pela viagem de prostituição ela não pagou em Março, em Setembro 2005 ela devia pagar € 2000 até 15/09/2005 mos isso não aconteceu pois o Recorrente foi preso, pelo que restam só cinco meses - Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto ( 5 meses = 153 dias / 153 : 7 dias = 22 semanas que CCC pagou por prostituição; se CCC diz que ganhava entre € 300 e € 800 por semana que dá uma média de € 550 / semana; € 550 x 22 semanas = € 12 100 conforme declaração para memória futura; No Acórdão ficou provado que CCC pagava 40% à TA do restante 607o era dividido com o recorrente; 40% de € 12100 = € 4840 para TA resta € 7260; € 7260 : 2 = € 3630 para J.... e € 3630 para ela),
Ora se No Verão de 2005, conforme ficou gravado nas escutas telefónicas CCC comprou uma casa na Ucrânia por € 4000 + € 1000 por documento e impostos, e se Zhanna fez € 3630 nos cinco meses querela trabalhou até J.... ser preso, Como é que ela comprou casa, pagou por documentos e impostos, pagou renda de casa em Portugal, comida, roupa, fumava e mandava dinheiro para a família e para a filha? Pelo que a própria testemunha se descredibiliza a si própria, e leva a que se considere como incorrectamente julgado o teor dos pontos 114p., 119p.,120p., 121p., 122p.# 123p. e 124p., pois deviam ser dados como não provados, e isto resulta necessariamente de fls. 3904 a fls. 3932 a que correspondem as declarações da testemunha TTT as quais foram analisadas erroneamente e de forma arbitraria completamente desligado do senso comum.
Vem a decisão de que ora se recorre declarar a páginas 203 que as declarações para Memória Futura da testemunha PPP revelam as razões pelas quais efectuava os pagamentos descritos nos referidos pontos fácticos, mas a verdade é que do depoimento prestado em sede de declarações para Memória Futura de fls. 3933 a fls. 3959, não resulta nenhuma ameaça e muito menos uma ameaça de um mal importante, é que o dizer-se para não fazer algo ou para fazer algo "para não piorar a situação", salvo o devido respeito por opinião contrária, como se refere a fls. 3940, não levar a concluir-se que leve alguém a temer que seja molestado fisicamente.
Se perguntam à testemunha PPP se foi ameaçada e se esta reponde que a avisaram para não enganar para não piorar a situação, e acrescenta "ter sempre liberdade de movimento" mas o Recorrente sabia onde aquela morava" ( Cfr. fls. 3940), não se pode concluir que alguém seja levado a temer a molestação física, porque resulta claro e óbvio à luz do senso comum, que se PPP nunca foi molestada fisicamente ou ameaçada de ser molestada fisicamente, então ninguém pode perceber como "o fazer algo para não piorar a situação" pode ser uma ameaça, pois nunca aconteceu nada para simplesmente se puder perceber como pode a situação piorar.
E não se percebe, porque o dizer-se para fazer algo para não piorar a situação não è. uma ameaça, muito menos uma ameaça de um mal importante, e ainda muito menos uma ameaça que se adequo a constranger a ameaçada. não basta dizer-se ter medo, é que a tutela penal exige que exista mais qualquer coisa do que o medo, e o "temer-se piorar a situação", Q gravidade da pena e do crime de extorsão exige que exista uma ameaça, e uma ameaça importante adequada a sentir-se constrangido, ora o temer alguém dizer para "não piorar a situação" nunca pode ser entendido como ameaça!
E note-se que na disposição monetária de 1000,00 ( Mil Euros ) referente a HHHHe a PPP referida a fls. 3945 e 3946, para além da descrição da disposição monetária, a testemunha é taxativa a dizer que não mais nada senão uma exigência e a respectiva disposição monetária, pois mesmo das declarações de HHH não se compreende qual a ameaça que lhe tenha sido feito, para se compreender se existiu um mal importante que fosse adequado a provocar o constrangimento, o que denota um erro notório na analise das declarações desta testemunha HHH e cujo depoimento encontra-se gravado em fita magnética X, todo o lado A e desde o início ao n.° 0780 do lado B e também gravado em fita magnética X, desde o n.° 0781 ao n.° 2157 do lado 8.
Pelo que o tribunal ora recorrido violou claramente as regras de experiência e baseou-se em juízos arbitrários para considerar provado que o Recorrente praticou os factos descritos nos pontos 86p. e 90p., e 135p. e 136p. e 129p, a 137p. para concluir que praticou um crime de extorsão, quando nem sequer se podiam dar como provados factos que preenchiam este tipo ( não há ameaça de mal importante , nem violência adequada ao constrangimento) o que afasta a pratica do crime de extorsão,
Então, mas se é a própria testemunha EEEE que no seu entendimento das coisas, declara que o Recorrente e os seus amigos nunca a ameaçaram, e se resulta de todas as declarações que o Recorrente nunca teve um acto de violência para com ela, pois de outra forma tinha contado, como é que se pode afirmar na decisão que ora se recorre, que a testemunha reagiu a ameaças indirectas e inequívocas, ainda que implícitas? Não se pode, e só analisando esta prova de forma absolutamente arbitraria e destorcida é que se pode dizer que se provou que EEEE pagava por temer represálias contra a sua pessoa ou da dos seus familiares, quando não existe uma ameaça sequer que o ora Recorrente tenha praticado contra si, por ser tão manifestamente errado o juízo de se considerar provado que esta testemunha pagava ao ora Recorrente quantias por temer represálias contra a sua pessoa ou dos seus familiares, quando a própria testemunha declara não ter sido ameaçada, é que é patente o erro notório na analise das declarações desta testemunha.
E que se não existe ameaça ou violência demonstrada no depoimento de EEEE, jamais se pode dizer que existiu uma ameaça de um mal importante, e assim resulta prejudicado qualquer juízo de adequação do mal ao constrangimento, Como de resto resulta até da fundamentação constante da página 209 do Acórdão ora recorrido ( numeração constante do próprio), que reconhece que só existiram ameaças indirectas, inequívocas e implícitas, cuja contradição entre estes conceitos demonstra um esforço intelectual em verificar ameaças onde não existiram, o que confere um carácter de profunda iniquidade, intolerável num processo penal que se quer fazer crer que é justo e de acordo com o senso comum, e do exposto resulta claro que do confronto da prova resultante das Declarações para memória prestadas no processo pela alegada vitima, com o texto da decisão ora recorrida, conjugados com o tipo legal de extorsão e com o senso comum, ressalta à evidencia que o Recorrente não emitiu qualquer ameaça nem praticou qualquer acto de violência, pelo que o tribunal ora recorrido violou claramente as regras de experiência e baseou-se em juízos arbitrários para considerar provado que o Recorrente praticou os factos descritos nos pontos l00p. e 108p., e para concluir que praticou um crime de extorsão, quando nem sequer se podiam dar como provados factos que preenchiam este tipo ( não há ameaça, nem violência, o que afasta a pratica do crime de extorsão),
Ora salvo o devido respeito este juízo é incorrecto, e o único exercício que se exige para comprová-lo é a leitura das declarações prestadas para Memória Futura pela testemunha ZZZ, e é o erro notório na analise da prova resultante destas declarações que se revela na analise da decisão recorrida à luz da ponderação do senso comum, isto porque de fls, 3976 a fls. 4005 consta as declarações prestadas para Memória Futura prestadas por ZZZ, e da leitura das mesmas resulta óbvio que: Nunca foram cometidas ameaças de agressões aos seus clientes e se frustrasse o negócio do transporte, nem esta testemunha tinha receio de tal facto (143p.); E nunca foram cometidas ameaças de ser causado mal às famílias em Portugal e r\a Ucrânia da testemunha, porque nunca lhe havia sido dito pelo Recorrente que assim aconteceria caso não pagasse ( 144p.), e porque tal nunca foi declarado pela testemunha ZZZ em sede de declarações para Memória Futura de fls. 3976 a fls. 4005, tal nunca poderia ser lido como ocorrido e como tal o teor dos pontos 143p. e 144p, nunca poderiam ter sido dados como provados.
E este erro na apreciação da prova é notório, porquanto a mera leitura das declarações para Memória Futura desta testemunha afasta a ocorrência destes factos narrados e a leitura da pagina 211 da decisão que ora se recorre revela o erro absoluto na analise da prova porquanto nem sequer ousa analisar estas declarações para Memória Futura, com vista a verificar se tal foi declarado pela testemunha, que tal como as outras testemunhas motoristas, avança sempre como ameaça, "o puder acontecer coisas", mas esta testemunha após insistência entendeu falar em incendiar-se a carrinha, ora não merece qualquer credibilidade tal alusão pois as explicações e a contabilização dos ganhos desta testemunha que foram feitos em sede Conclusões do recurso da decisão da Primeira Instancia, demonstram que a testemunha mente descaradamente ou de outra forma não conseguiria custear as viagens e a sua actividade.
Não se percebendo o teor da ameaça, então o medo da testemunha é incompreensível, porque não é admissível que uma pessoa faça um pagamento porque tem medo, pois para existir tutela penal, é necessário que este medo seja provocado por uma ameaça de um mal importante ou de um acto de violência, e isto não sucedeu, por mais que de uma forma arbitrária se tenha procurado explicar com uma ameaça latente, que não se compreende qual, e foi com base numa ameaça latente que não existiu porque não se compreende, pois se as alegadas vitimas não perceberam nenhuma ameaça de mal importante não podemos nós tentar perceber uma ameaça cujo o conteúdo não foi percebido pelas vitimas que nem sequer sabem explicar o que é que perceberam o que lhes podia acontecer se não pagassem, como sucede de forma flagrante no caso da testemunha AAAA.
É o juízo de considerar provado que a testemunha AAAA, receasse pela sua integridade física, da dos seus familiares e da sorte dos seus pertences para decidir pagar o que quer que seja ao Recorrente, que não tem suporte no meio de prova que constitui as declarações da própria pessoa que teria o dito receio, pois o mesmo nem sequer sabe o que sucederia se não pagasse, e por isso, o juízo de considerar provado o teor dos pontos 142p.l43p. 144p. e 157p, sem considerar as declarações do próprio ZZZ incorre em erro notório na apreciação da prova, pelo que o tribunal ora recorrido violou claramente as regras de experiência e baseou-se em juízos arbitrários para considerar provado que o Recorrente praticou os factos descritos nos pontos 142p. 143p. 144p. e 157p., e para concluir que praticou um crime de extorsão, quando nem sequer se podiam dar como provados factos que preenchiam este tipo ( não há ameaça, nem violência o que afasta a pratica do crime de extorsão).
É a própria testemunha ZZZ que no seu entendimento das coisas, declara que não sabia qual era o problema se não pagasse e que nunca foi agredido, pelo que se pergunta como é que se pode dar como provado que a testemunha ZZZ tivesse sido ameaçada ou agredida, como é que se pode dar como provado que a testemunha Tivesse receio pela sua integridade física ou da dos seus familiares ou ainda da destruição da sua viatura, quando a testemunha quando dÍ7 que tem medo a fls. 3770, não diz do que é que tem medo? Não se pode.
E não se pode, porque não sabemos do que esta testemunha ZZZ tinha medo, porque n3o houve nenhuma agressão, nem ameaça, pois esta testemunha nem sequer sabia o que lhe podia acontecer se não pagasse, pelo que não podemos dar como provado que esta testemunha ZZZ receasse pela sua integridade física, da dos seus familiares ou dos seus pertences, é o juízo de considerar provado que a testemunha ZZZ receasse pela sua integridade física, da dos seus familiares e da sorte dos seus pertences para decidir pagar o que quer que seja ao Recorrente, que não tem suporte no meio de prova que constitui as declarações da própria pessoa que teria o dito receio, pois o mesmo nem sequer sabe o que sucederia se não pagasse, sendo certo que não lhe sucedeu nada quando decidiu não pagar ao Recorrente.
E por isso, o juízo de considerar provado o teor dos pontos 169p. 171p. e 173p. sem considerar as declarações do próprio ZZZ incorre em erro notório na apreciação da prova, que é tão manifestamente infundado que esta testemunha pagava ao ora Recorrente quantias por temer represálias contra a sua pessoa ou e dos seus familiares, quando a própria testemunha declara não ter sido ameaçada, nem sabia o que lhe podia acontecer, não se podendo valorar nem a ameaça nem o tipo de mal importante ( e bem sabendo que quando não quis pagar não lhe aconteceu nada), demonstrando-se assim que é patente o erro notário na analise das declarações desta testemunha, assim, do exposto resulta claro que do confronto da prova resultante das Declarações para Memória Futuro prestadas no processo pela alegada vitima com o texto da decisão ora recorrida e conjugados com o tipo legal de extorsão e com o senso comum, ressalta a evidência que o Recorrente não emitiu qualquer ameaça nem praticou qualquer acto de violência.
Pelo que o tribunal ora recorrido violou claramente as regras de experiência e baseou-se em juízos arbitrários para considerar provado que o Recorrente praticou os factos descritos nos pontos 169p. 171p. e 173p., e para concluir que praticou um crime de extorsão, quando nem sequer se podiam dar como provados os factos que preenchiam este tipo ( não há ameaça, nem violência, o que afasta a pratica do crime de extorsão).
Perguntado se foi o Recorrente a dizer que se não pagasse podia ser agredido, responde a testemunha que não, antes de outros condutores e depois quando o Recorrente me disse que eu tenho de pagar, não foi nenhum problema; ( fls, 3791); Perguntado se o Recorrente disse quais os problemas que a testemunha teria consigo se não pagasse, responde a testemunha que ia ter problemas com carro, ou a Policia; ( fls. 3797), pelo que é absolutamente abusivo com base nestas declarações julgar-se provado que existia uma latente ameaça e muito menos que pudesse levar ao constrangimento à disposição monetária em relação a esta testemunha como alegado nos pontos 198p. e 199p..
Então mas se o Recorrente falou em problemas, pois a própria testemunha negou que tivesse sido ameaçado de ser agredido, se a testemunha Andritskyí refere que os problemas seriam com a carrinha ou com a Policia, não há qualquer ameaça de mal importante e muito menos adequada a provocar constrangimento, porque não se sabe quais os problemas que a testemunha teria com a carrinha ou com a Policia.
Não se percebendo o teor da ameaça, então o medo da testemunha é incompreensível, porque não é admissível que uma pessoa faça um pagamento porque tem medo, para existir tutela penal, é necessário que este medo seja provocado por uma ameaça de um mal importante ou de um acto de violência, e isto não sucedeu, por mais que de uma forma arbitrária se tenha procurado explicar com uma ameaça latente, que não se compreende qual.
É o juízo de considerar provado que a testemunha HH, receasse pela sua integridade física, da dos seus familiares e da sorte dos seus pertences para decidir pagar o que quer que seja ao Recorrente, que não tem suporte no meio de prova que constitui as declarações da própria pessoa que teria o dito receio, pois o mesmo nem sequer sabe o que sucederia se não pagasse, e por isso, o juízo de considerar provado o teor dos pontos 198p. e 199p. sem considerar as declarações do próprio GG incorre em erro notório na apreciação da prova, concluindo-se ser tão manifesto o juízo de se considerar provado que esta testemunha pagava ao ora Recorrente quantias por temer represálias contra a sua pessoa ou familiares, quando a própria testemunha não consegue concretizar o teor da ameaça , nem sabia o que lhe podia acontecer, não podendo valorar revelando o patente erro notório na analise das declarações desta testemunha.
Pelo que o tribunal ora recorrido violou claramente as regras de experiência e baseou-se em juízos arbitrários para considerar provado que o Recorrente praticou os factos descritos nos pontos 198p. e 199p., e para concluir que praticou um crime de extorsão, quando nem sequer se podiam dar como provados factos que preenchiam este tipo ( nSo ha ameaça, nem violência o que afasta a pratica do crime de extorsão),
É a própria testemunha XXX que declara expressamente que não foi ameaçado pelo Recorrente e é própria testemunha que não demonstrou conhecimento de nenhum acto de violência praticado pelo Recorrente para que fizesse qualquer pagamento, salientando até que não tinha medo do Recorrente, nem revela nenhum acto de extorsão contra o seu pai SSS, pelo que não se pode considerar provado nenhum facto do Recorrente que implique um acto de violência ou de uma ameaça de um mal importante para constranger XXX, pois da única prova que existe sobre tais factos que resulta das declarações para Memória Futura de XXX, e por isso, o juízo de considerar provado o teor dos pontos 187p. a 192p. sem considerar as declarações do próprio XXX incorre em erro notório na apreciação da prova.
Assim, do exposto resulta claro que do confronto da prova resultante das Declarações para Memória Futuro prestadas no processo pela alegada vitima com o texto da decisão ora recorrida e conjugados com o tipo legal de extorsão e com o senso comum, ressalta à evidência que o Recorrente não emitiu qualquer ameaça nem praticou qualquer acto de violência, pelo que o tribunal ora recorrido violou claramente as regras de experiência e baseou-se em juízos arbitrários para considerar provado que o Recorrente praticou os factos descritos nos pontos 187p. a 192p., e para concluir que praticou um crime de extorsão, quando nem sequer se podiam dar como provados os factos que preenchiam este tipo ( não há ameaça, nem violência, o que afasta a pratica do crime de extorsão) quer contra XXX e SSS.
O dizer-se na decisão de que ora se recorre que se contou com as declarações de todos para fundar a decisão sobre os factos que dizem respeito a cada um deles, é errada. Por um lado, potencia a credibilizaçao no depoimento conjunto que pode sempre padecer de uma combinação prévia das testemunhas para fazer coincidir os depoimentos, o que não parece ao Recorrente que sucedeu. B por outro, demonstra o erro notório na avaliação das declarações prestadas para Memória Futura, pois decidir-se que se provou a prática de prostituição de uma pessoa que não presta depoimento ( como sucede com UUU) com base nas declarações de todas as outras testemunhas, e quando se analisa fIs. 3721 a 4005 e ninguém revela que aquela testemunha que não prestou depoimento se dedicava à prostituição e quando nenhuma testemunha assistiu à pratica de actividade sexual e afirma-o por convicções ( a testemunha VVV), então de forma arbitrária se usa o todo que nada prova para se provar o que individualmente não produz prova.
Tal como sucede, com mulheres que não se dedicavam a prostituição, não foram ameaçadas, nem conseguem explicar do que é que foram ameaçadas com a consequência de não se vislumbrar nenhuma ameaça, nem nenhum mal ameaçado, e muito menos se conseguindo concretizar se o mal era importante, e depois se vem dizer que o depoimento não revela nenhuma ameaça está de acordo com o conjunto dos restantes ( Cfr, declarações de PPP, HHH, LLL e a fundamentação dada para a decisão sobre os factos que dizem respeita a cada uma) sendo certo que as restantes também não confirmam nada como resulta da leitura de fls. 3721 a fls.4005, reincidindo-se na prática iníqua de se usar o todo que nada prova para se provar o que individualmente não produz prova, revelando o erro notário na apreciação das declarações para Memória Futura, da mesma forma sucede com inúmeros motoristas que não revelando que foram ameaçados ( ZZZ, XXX) nem conseguem concretizar o teor das ameaças o que leva a não se compreender os seus receios e relação dos receios com ameaças que não conseguem concretizar ( AAAA e SS), sendo certo, que todos agentes de órgão de policia criminal que prestaram depoimento não tinham razão de ciência alguma sobre os factos que compaginavam a pratica de actos que preenchiam os tipos penais ( como se confere pela analise do depoimento de todos os agentes do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, pelo que se roga a V. Exas. que analisem fls. 3721 a 4005 e confrontem com os factos que se deram como provados e a respectiva fundamentação e verificarão o erro notório na apreciação desta prova, quer no seu conjunto, quer individualmente.
O ter-se dado como provado o teor dos pontos 2p. 3p. 4p. 42p. 43p. 45p. 47p. 55p. 56p. I36p. 158p. 159p. 160p. 161p. 202p. 204p. 208p. 242p. dos Factos Provados, denota-se um erro notório na apreciação da prova, porquanto esta é insuficiente para que o teor dos mesmos possa ser decidido como provado, e esta decisão é profundamente injusta e resulto de convicções arbitrárias que não têm base na prova produzida, porquanto que as testemunhas que depuseram neste processo não revelam razão de ciência que lhes permita demonstrar a existência da alegada associação criminosa.
Pois nem se percebe como é que um líder se presta a fazer aquilo que alegadamente seria feito pelos seus alegados sub-alternos, pelo que devem ser dados como não provados dizem respeito a pratica de um crime de associação criminosa, quer quanto ao Recorrente, quer quanto à arguida Irina Karnaukhova, vertidos nos pontos 2p. 3p. 4p. 42p. 43p. 45p. 47p. 55p. 56p. I36p. 158p. 159p. 160p. 161p. 202p. 204p. 208p. 242p., dizem respeito a pratica de um crime de associação criminosa.
Por outro lado, cabe ainda ponderar a prova documental e a prova que advém das escutas telefónicas realizadas em fase de inquérito, ora nenhuma prova se produziu, quer testemunhal, quer documental, uma vez que não constam dos presentes autos quaisquer documentos, que comprovem entregas do Recorrente à arguida Irina, de dinheiro proveniente de actividades ilícitas
De toda a prova produzida no processo e constante dos presentes autos, considerando a lista enumerada no ponto 50. das presentes Alegações, não temos presentes nos autos para analise, um só documento nos presentes autos que ateste um deposito bancário ou envio de montantes para a Ucrânia através de transferência bancária realizados pela a ora recorrente, sendo certo que se a Recorrente é imigrante e trabalha em Portugal como de resto referiu a testemunha Joaquim Patrício, Inspector do SEF, então até seria óbvia a remessa de montantes, de maior ou menor montante, consoante a periodicidade dos mesmos,
E nem se venha dizer que o montante apreendido à ex - mui her do ora Recorrente eram proveniente de factos praticados nos autos, pois quem deu o montante à ex-mulher do Recorrente foi IIII, jardineiro, casado, nascido em 000000, natural de ......., Silves, residente em Tunes Gnrz, Amendoais, 8365 Amendoais, e que confirmou que emprestou esse montante à ex.mulher do Recorrente, por conhece-la desta trabalhar a noite num bar de alterne e por saber que esta tombem trabalha de dia numa frutaria ( Cfr. voltas 1702 a 2130 do lado A da fita magnética V), pelo que deve ser ordenada a devolução deste montante à ex-mulher do Recorrente por erro notório na apreciação da matéria de facto.
A decisão de que ora se recorre vem na sua página 198 (numeração da própria decisão ) concluir pela não inconstitucionalidade da anterior versão do artigo 188° n.° 3 do Código de Processo Penal. Ora salvo o devido respeito, este entendimento viola o artigo 32.c da Constituição, porquanto é o próprio acórdão de que ora se recorre que reconhece no inicio da sua página 198 (numeração do próprio) que a redacção actual satisfaz de forma mais amplo e cabal os direitos de defesa do arguido, pelo que reconhece que com a redacção anterior do artigo 188.° n.° 3 do Código de Processo Penai, no caso concreto, os direitos do ora Recorrente resultaram diminuídos.
Pois podendo a Acusação escolher, ponderar e socorrer-se do todo que constitui todas as intercepções telefónicas, focando-se nas que sustentam o seu ponto de vista, já o Recorrente nunca o pode fazê-lo, primeiro porque não podia Qced&r a todas as intercepções telefónicas durante o inquérito por causa do segredo de Justiça, e mais tarde, porque as mesmas já tendo sido escolhidas a sua revelia, foram destruídas, demonstrando-se assim a desigualdade de armas e a não sujeição ao contraditório de todas as intercepções telefónicas, é por isto, que resulta violado o artigo 32.° da Constituição, violação que de forma alguma deve ser desvalorizada, porquanto teve reflexos óbvios em termos desvantajosos na esfera jurídica do Recorrente.
Termos em que se conclui pela inconstitucionalidade da redacção do artigo 188.° n.° 3 do Código de Processo Penal na redacção vigente durante as fases de inquérito e instrução do presente processo, por violar o artigo 32.° n°.5 da Constituição, uma vez que o Legislador sentiu necessidade de alterar a redacção daquele preceito legal por forma a equilibrar a igualdade de armas e o contraditório sobre todas as intercepções telefónicas, Com tal facto foi violado o artigo 32.° n.° 1 da Constituição sendo as escutas telefónicas realizadas aos arguidos nos presentes autos nulas, e como tal não podendo produzir-se prova com base neste meio, conforme Entendimento do Tribunal
Vem a decisão de que ora se recorre referir na sua página 196 ( numeração da própria ) que pode o arguido contradizer diferidamente o conteúdo das declarações e contraditar a testemunha em momento posterior, na audiência, para o que é suficiente a indícaç3o expressa das mesmas entre a prova arrolada na acusação, mas sucedeu que mesmo quando o Recorrente quis contraditar a testemunha QQQ durante o Julgamento em Primeira Instância, não o pôde, porque o tribunal não autorizou a sua inquirição, como resulta do despacho constante da acta datada de 24 de Julho de 2007.
Sendo certo que esta testemunha QQQ apesar de ter sido arrolado pelo Recorrente no seu rol de testemunhas apresentado tempestivamente em sede de Contestação, tal como sucedeu com todas as testemunhas que prestaram depoimento em sede de Declarações para Memória Futura, esta testemunha tal como todas as outras não foi convocada, porque se entendeu que a sua inquirição não era necessária, castrando assim a possibilidade dos Arguidos neste processo puderem assim contraditar estas testemunhas.
Pois em sede de Declarações para Memória Futura, a natureza inquisitória do inquérito tal como previsto no Código de Processo Penal, consubstanciado no segredo de Justiça, acompanhado do facto de ao arrepio da Convenção do Direitos do Homem (artigo 6.° paragrafo 3,d.) ao Recorrente bem como aos demais arguidos não ter sido autorizada a presença durante a tomada de depoimento em sede de Declarações para Memória Futura, limitou totalmente a possibilidade de, em tempo útil, se puder com base no conhecimento do próprio Recorrente contraditar as testemunhas, pois só permita a entrada do Recorrente após a tomada de declarações, pelo que se pergunta como é que se podia contraditar estas testemunhas se os Mandatários não conheciam o teor dos autos, ao contrário do que sucedia com o Ministério Público e nem podiam ter os próprios Arguidos presentes em tempo útil na sala por forma a puder recolher dados dos mesmos para serem confrontados a estas testemunhas? Não se pode, e isso limita gravemente as garantias de defesa consagradas no artigo 32,° n.° 5 da Constituição.
Ao que acresce que se nem tão pouco se pode contraditar as testemunhas em sede de Audiência de Julgamento, porque o tribunal entendeu não ser essencial, então é falência total dos meios de garantia de defeso do Arguido em Processo Penal, a que V. Exas. não deixarão de tomar em consideração, fulminando com razão esta forma de produção de prova com a nulidade que se impõe pela elementar Justiça formal, não se permitindo sequer aquilo que o acórdão de que ora se recorre pressupõe na sua pagina 196 (numeração do próprio) com claros prejuízos para as garantias de defesa do Recorrente, pois ou a prova se produz em sede de Audiência de Julgamento ou então a ter se produzido em momento anterior devem ser lidas as declarações em sede de Audiência de Julgamento, por forma a se puder salvaguardar o Principio da Oralidade e da Imediação em sede de Audiência de Julgamento, e por forma a se salvaguardar os direitos e garantias de defesa do Recorrente, enquanto arguido em processo penal, prosseguindo-se as exigências do número 5 do artigo 32° da Constituição.
Quanto a UUU, considerando que não prestou depoimento nos presentes autos, e que mais nenhuma testemunha depôs com razão de ciência sobre factos que se relacionassem com a pratica de prostituição por UUU, como já foi expresso acima em sede de impugnação da decisão sobre a matéria de facto, então não se provando a prática de prostituição por UUU, considerando o tipo penal de lenocínio previsto e punido pefo artigo 169.° do Código Penal, resulta prejudicada a condenação do Recorrente peia prática deste crime quanto a UUU, concluindo-se pela absolvição do Recorrente sobre a prática deste crime quanto a esta testemunha, da mesma forma que considerando-se a prova que se produziu sobre a vitima TTT, se concluí pela absolvição do ora Recorrente sobre a pratica do crime de lenocínio quanto à testemunha TTT.
Veio a decisão de que ora se recorre referir que o crime de Lenocínio não tem natureza patrimonial, nem pessoal, porém entende o ora Recorrente que se o crime de lenocínio protege o bem jurídico da dignidade da pessoa humana na vertente moral desta, também o crime de extorsão prossegue o bem jurídico da dignidade da pessoa humana, na vertente da liberdade individual de se auto-determinar, Pelo que considerando a proibição da dupla valoração e condenação pelo mesmo facto ( ne bis in idem) entendemos que pelos mesmos factos que dizem respeito a estas mulheres, não pode o Recorrente ser condenado duas vezes, pois existe uma relação de consunção impura.
Logo o ora Recorrente foi condenado indevidamente na prática dos crimes de lenocínio e de extorsão, quanto às vítimas UUU e CCC padecendo o Acórdão ora recorrido de erro de direito, pois devia só condenar o Recorrente quanto a estas vítimas pelo crime de lenocínio nos termos do Acórdão, e não condenar na prática dos crimes de lenocínio e de extorsão nos termos constantes do mesmo Acórdão, sempre com a ressalva de que não resulta prejudicado o facto de se impugnar a matéria de facto e se considerar que não se provou a prática pelo o ora Recorrente de nenhum destes crimes.
Ora, salvo o devido respeito, entende o ora Recorrente que, ressalvando o facto de se considerar inocente porque não podiam ser dados como provados os factos que foram considerados provados para o preenchimento do tipo penal, ao ser condenado na prática de treze crimes de extorsão previstos e punidos pelos artigos 223.° n.° í e n.° 3 alínea a) e 204.° n.° 2 alínea g) do Código Penal, quando vinha pronunciado por dois crimes continuados, considera o Recorrente que foi cometido erro de direito, e como tai foi violado o artigo 30.° n.° 2 do Código Penal, por não ter sido aplicado in casu.
De facto, nos factos de que o ora Recorrente vinha pronunciado e nos factos de que o ora Recorrente vem agora condenado, quanto ao crime de extorsão, resulta claro que estamos perante a realização plúrrima do mesmo crime; realizado de forma homogénea e no quadro de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente, tal como o exige o número 2 do artigo 30º do Código Penal, pois estamos perante a realização projectada no tempo do mesmo crime de extorsão, realizada alegadamente da mesma forma, através de alegadas ameaças, as quais seriam feitas dois grupos de alegadas vítimas distintos, um de motoristas de transporte de pessoas e bens de nacionalidade ucraniana e outro de alegadas mulheres de nacionalidade dos países de Leste que alegadamente se dedicam à prostituição.
Termos em que se conclui que o ora recorrente, com a condenação pela prática de doze crimes de extorsão em concurso real, quando vinha pronunciado pela prática de dois crimes continuados de extorsão, violou-se o número 2 do artigo 30.° do Código Penal, pelo que o Acórdão de ora se recorre incorre em erro sobre o Direito aplicável, devendo ser somente ponderada a condenação ou absolvição do Recorrente pelo crime de extorsão, somente a título de crime continuado.
Então se o Acórdão de ora se recorre pretende fazer prova nos pontos 210p. 21 lp. 212p. 213p e 214p de operações documentadas nestes documentos bancários e pretende atribuir as mesmas operações ao ora Recorrente e á arguida Irina e atribuir o perfeito conhecimento à ora Recorrente da proveniência dos montantes alvo das referidas operações bancárias, os mesmos documentos que alegadamente reproduzem as alegadas operações atribuídas ao ora Recorrente e à arguida Irina, tinham necessariamente de constar dos presentes autos, e não constam, sendo coarctada a possibilidade do ora Recorrente conhecer do teor dos mesmos, que é condição básica para se puder defender dos factos que lhe são imputados.
Ao não constarem dos presentes autos os documentos descritos nos pontos 210p. 211p. 212p. 213p. 214p., e que alegadamente reproduzem operações bancarias com montantes que alegadamente eram provenientes de actividades de uma suposta associação criminosa e que alegadamente o ora Recorrente tinha perfeito conhecimento, e ao ser dado como provadas as operações corporizadas e a existência dos documentos que as reproduzem, sem que os mesmos documentos constem dos presentes autos, está violado o princípio do contraditório constitucionalmente previsto no número 5 do artigo 32.° da Lei Fundamental.
Então, se os documentos bancários que reproduzem os factos de que o ora Recorrente vem acusado de ter praticado e que consubstanciam crime, não constam dos autos de processo crime onde está a ser julgado, não pode ser dado como provado quer a existência dos documentos enumerados nos pontos 210p. 211p. 212p. 213p. 214p. dos Factos Provados, quer a ocorrência das operações e factos reproduzidos pelos mesmos documentos e constantes também dos pontos 210p. 211p. 212p. 213p. 214p. .
Porque a decisão que ora se recorre não discrimina de forma alguma sobre que vitimas considerou que foi praticado este crime de extorsão sendo certo que se considera ter errado na contagem do numero de vezes em que este crime foi praticado, tendo em consideração o número de vitimas, os factos não provados em relação a cada uma das vitimas e tendo em consideração o número de extorsões em que o Recorrente veio condenado na decisão da Primeira Instancia que também não discriminou contra quem o Recorrente praticou os crimes de vinha condenado, não se compreende, e o Recorrente considera ter existido erro na subsunção dos factos provados e não provados ao número de crimes de extorsão de que o ora Recorrente veio condenado.
Considerando que o ora Recorrente se encontra absolvido da prática do crime de extorsão quanto a BBBB, JJJJ e NNN, Logo parece ao ora Recorrente que permanece condenado pela prática deste crime contra UUU, PPP, LLL, AAAA, ZZZ, XXX e seu pai, RRR, HH, QQQ e TTT e HHH, o que perfaz somente onze crimes de extorsão e não doze crimes de extorsão, o que prejudica o cumulo jurídico realizado em sede da decisão de que ora se recorre, pelo que se torna essencial a conferência por V. Exas, da subsunção dos factos que vierem a ser considerados provados sobre a prática do crime de extorsão com a decisão sobre o número de crimes de extorsão considerados como praticados pelo Recorrente.
Sendo certo que a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e os erros notórios na apreciação da prova levam necessariamente a que os factos que alegadamente preencheriam o tipo de extorsão em relação às pessoas aí descritas sejam dados como não provados, o que implica a necessariamente a absolvição do Recorrente quanto à pratica do crime de extorsão cm relação UUU, PPP, LLL, AAAA, ZZZ, XXX e seu pai, RRR, HH, QQQ e CCC e HHH.
DO NÃO PREENCHIMENTO DO TIPO LEGAL DE EXTORSÃO PREVISTO E PUNIDO PELO ARTIGO 223.° N.° 1 DO CÓDIGO PENAL PELOS FACTOS DADOS CO/AO PROVAbOS SOBRE QQQ, SOBRE XXX E SSS, E SOBRE HHH E DEMAIS VITIMAS;
Como refere a decisão de que ora se recorre, o artigo 223.° n.° 1 do Código Penal prevê que " Quem, com intenção de conseguir para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo, constranger outra pessoa, por meio de violência ou de ameaça com mal importante, a uma disposição patrimonial que acarrete para ela ou para outrem, prejuízo é punido com pena de prisão até 5 anos".
Assim podemos decompor este tipo pelos seguintes elementos: Ameaça com mal importante ou violência; adequação a constrangimento; Disposição Patrimonial; Intenção de Enriquecimento.
O ora Recorrente vem absolvido pela decisão de que ora se recorre da prática de um crime de lenocínio contra QQQ e foi condenado pela decisão de ora se recorre pela prática de um crime de extorsão contra a mesma testemunha QQQ, tendo sido considerados como provados os factos 91p. a 99p, ora confrontando estes factos que foram dados como provados pela decisão da Primeira Instância e pela decisão de que ora se recorre com o teor do tipo de extorsão resulta evidente a ausência de factos provados que preencham o elemento de violência ou ameaça com mal importante como meio e o elemento de adequação ao constrangimento.
É que dos factos dados como provados de 91p. a 99p. não se vislumbra facto algum que descreva a pratica de acto de violência ou de ameaça de mal importante cometido pelo Recorrente contra QQQ, e como não se descreve a pratica de acto de violência ou de ameaça de mal importante cometido pelo Recorrente contra QQQ, não existe acto no qual se possa verificar sequer a adequação ao constrangimento, pelo que deve ser considerado que os factos provados de 91p. a 99, não preenchem o tipo de extorsão previsto no número do artigo 223.° do Código Penal, devendo o ora Recorrente ser absolvido do prática de um crime de extorsão contra QQQ e que pensa o Recorrente estar ponderado entre os doze (que na realidade sao onze como se demonstrou) crimes de extorsão que o Recorrente de forma injusta ainda vem condenado pela decisão de que ora se recorre.
O ora Recorrente vem condenado pela decisão de ora se recorre pela prática de um crime de extorsão contra XXX e SSS tendo sido considerados como provados os factos 187p. a 192p., ora confrontando estes factos que foram dados como provados pela decisão da Primeira Instância e pela decisão de que ora se recorre com o teor do tipo de extorsão resulta evidente a au$&nc'\Q de factos provados que preencham o elemento de violência ou ameaça com mal importante como meio e o elemento de adequação ao constrangimento, é que dos factos dados como provados de 187p. a 192p. não se vislumbra facto algum que descreva a pratica de acto de violência ou de ameaça de mal importante cometido pelo Recorrente contra XXX ou SSS.
E como não se descreve a pratica de acto de violência ou de ameaça de mal importante cometido pelo Recorrente contra XXX ou SSS, não existe acto no qual se possa verificar sequer a adequação ao constrangimento, pelo que deve ser considerado que os factos provados de 187p. a 192.p não preenchem o tipo de extorsão previsto no número do artigo 223.° do Código Penal, devendo o ora Recorrente ser absolvido da prática de um crime de extorsão contra XXX ou SSS e que pensa o Recorrente estar ponderado entre os doze ( que na realidade são onze como se demonstrou) crimes de extorsão que o Recorrente de forma injusta ainda vem condenado pela decisão de que ora se recorre.
Acresce que o ora Recorrente vem condenado pela decisão de ora se recorre pela prática de um crime de extorsão contra HHH, tendo sido considerados como provados os factos 129p. a 137pr, ora confrontando estes factos que foram dados como provados pela decisão da Primeira Instancia e peia decisão de que ora se recorre com o teor do tipo de extorsão resulta evidente a ausência de factos provados que preencham o elemento de violência ou ameaça com mal importante como meio e o elemento de adequação ao constrangimento.
E que dos factos dados como provados de 129p. a Í37p. não se vislumbra facto algum que descreva a pratica de acto de violência ou de ameaça de mal importante cometido pelo Recorrente contra HHH e como não se descreve a pratica de acto de violência ou de ameaça de mal importante cometido pelo Recorrente contra HHH, não existe acto no qual se possa verificar sequer a adequação ao constrangimento, pelo que deve ser considerado que os factos provados de 129p. a 137.p não preenchem o tipo de extorsão previsto no numero do artigo 223.° do Código Penal, devendo o ora Recorrente ser absolvido da prática de um crime de extorsão contra HHH e que pensa o Recorrente estar ponderado entre os doze ( que na realidade são onze como se demonstrou) crimes de extorsão que o Recorrente de forma injusta ainda vem condenado pela decisão de que ora se recorre.
Considerando-se que os factos dados como provados na decisão de que ora recorre, por referência à enumeração conferida pela decisão da Primeira Instância, sobre Natalíya Tatarskhyi, sobre Oleg e XXX e sobre HHH, cabe referir que quanto aos factos e ao preenchimento do tipo de extorsão por actos do Recorrente em relação a UUU, PPP, Olga ôrigoreva, AAAA, ZZZ, HH, e CCC, analisando-se o teor de fls. 3721 a fls. 4005 a que correspondem as declarações para Memória Futura prestadas no presente processo, verifica-se a prova ai produzida não permite ser dado como provada a realização de actos de violência ou de ameaças com mal importante como meio adequado ao constrangimento destas pessoas, simplesmente porque estas testemunhas não revelam a pratica de nenhum acto de violência ou de ameaça com mal importante que permita-se considerar adequada ao seu constrangimento.
E o Recorrente só vem condenado peia crime do crime de extorsão em relação a estas pessoas por causa de erros notórios na apreciação da prova, que a não acontecer permitiria verificar que não são revelados por estas testemunhas nenhuns actos de violência ou de ameaças que se possam compreender o seu conteúdo e alcance, e como não se compreende o conteúdo e o alcance do que se quer fazer crer que foram ameaças, nunca se consegue compreender se a ameaça visou um mal importante e muito menos se consegue aquilatar se a dita ameaça é adequada ao constrangimento.
Pois a decisão de que ora se recorre vem através de interpretações extensivas proibidas cm Direito Penal constantes na decisão de que ora se recorre, que extravasou o conteúdo do tipo de extorsão previsto no artigo 223.° do Código Penal, ao vir falar em conceitos absolutamente contraditórios como ameaças indirectas, inequívocas e implícitas e latentes que não existiram para justificar um medo e um temor que não merece tutela penal, por não ter justificação para a sua existência, pois não há acto de violência ou ameaça que o justifiquem, foi por cima disto tudo que o acórdão de que ora se recorre passou num afa incompreensível em condenar o Recorrente e em manter uma decisão iníqua proferida em Primeira Instância, violando-se o previsto e exigido pelo artigo 223.° n.p 1 do Código Penal, pelo que se conclui que da prova produzida neste processo, e mesmo dalguns factos dados como provados na decisão de que ora se recorre, não resulta preenchido o tipo penal de extorsão previsto e punido pelo artigo 223.° do Código Penal, pelo que deve o ora Recorrente ser absolvido dos doze crimes de extorsão de que ainda vem acusado.
Esta decisão de condenar o Recorrente numa pena de vinte e dois anos de prisão em cumulo jurídico resulta prejudicada, primeiro pelo e.rro na subsunção dos factos provados ao número de crimes de extorsão em que o ora Recorrente vem condenado sendo certo que a decisão de que ora se recorre não faz minimamente a identificação destes factos com os crimes de extorsão em que o Recorrente veio condenado, pelos erros notórios na apreciação da
prova que levou à condenação nos alegados doze crimes de extorsão que acima se alegou e fundamentou, e o consequentemente não preenchimento deste tipo penal, pelos erros notórios na apreciação da prova que levou à condenação no crime de associação criminosa, e o consequente não preenchimento deste tipo penal, pelos erros notórios na apreciação da prova que levou à condenação no dois crimes de lenocínio que acima se alegou e fundamentou, e o consequente não preenchimento deste tipo penal, e finalmente pela consunção impura do crime de lenocínio no crime de extorsão que acima se alegou e se fundamentou.
Ora se assume maior relevância agravante a concreta conduta do Recorrente relativamente a TTT, e pela qual vem o Recorrente condenado numa pena de dez anos, e se consta que em relação aos demais crimes de extorsão também vem o Recorrente condenado em penas de dez anos, então resulta claramente violado o artigo 71.° do Código Penal, pois não pode o ora Recorrente condenado numa pena de de2 anos em crimes cujos factos assumem menor relevância agravante, quando já vem condenado na mesma pena de dez anos por factos que assumem a maior relevância agravante.
Por outro lado considerando a idade do Recorrente, considerando que os antecedentes criminais em Portugal são por crimes de ilícitos rodoviários, considerando que os antecedentes criminais na Ucrânia ( que remontam ao regime totalitário da URSS) dizem respeito a crimes de natureza indeterminada e arbitrária, e que não se encontram cabalmente documentados, considerando que nenhum dos crimes de que o Recorrente veio condenado envolvem agressões à integridade física e muito menos contra à vida, então, temos de concluir necessariamente que a pena de vinte e dois anos de prisão é chocante por ser injusta e manifestamente excessiva, e como tal a decisão de aplicar a pena de vinte e dois anos de prisão ao ora Recorrente é violadora dos artigos 71.° e 77.° do Código Penal.
Veio o ora Recorrente e sua ex-mulher a arguida AAA, tal como os demais arguidos, condenados pelo máximo legal de custas, na decisão da Primeira Instância, ora tal decisão resulta prejudicada pela absolvição parcial do Recorrente e sua ex-mulher AAA, que implica o vencimento parcial dos mesmos, assim considerando o vencimento que merecerá o presente recurso, roga-se pela revogação das decisões sobre as custas e decaimentos parciais do Recorrente e da arguida AAA, considerando precisamente que os vencimentos parciais importam o reflexo proporcional na decisão sobre as custas em sede de Primeira Instância e da decisão de que ora se recorre.
Termos em que deve o ora Recorrente ser absolvido de todos os crimes de que vem condenado e ordenada a entrega de todos os valores apreendidos ao Recorrente e sua ex-mulher, porém, melhor decidirão como for de JUSTIÇA
2 - O arguido/recorrente GG:
1. Nos termos dos art.s 355° e 356° n°2 a) do CPP, para que possa operar a excepção aqui prevista, exige-se que seja permitida a leitura em audiência, ou seja, que os depoimentos prestados para memória futura sejam lidos.
2. Se tais declarações não forem lidas na audiência, o tribunal não pode utilizá-las para fundamentar a sua convicção. Se o fizer, serve-se de prova proibida, e isso implica a nulidade da sentença
3. É inconstitucional, por violação das garantias de defesa do arguido, asseguradas pelo artigo 32.°, n.° 1 e n.°5 da Constituição, e em particular do princípio do contraditório, a interpretação conjugada dos artigos 271°, 355.° e 356° n.°2 a) do Código de Processo Penal que permite que a produção e exame das provas em audiência referidos no n°l do art 355°, abrange conjuntamente a audiência de julgamento propriamente dita e as declarações para memoria futura nos termos do art. 271°, não se exigindo, nos termos do art. 356° n°2 a) a sua efectiva leitura em audiência de julgamento, para que as mesma possam constituir prova validamente utilizável.
4. Por outro lado, o arguido ou o seu defensor nunca tiveram a possibilidade de interrogarem directamente as testemunhas que prestarão declarações para memoria futura,
5. Porque não era ainda arguido quando se produziram nos termos do art. 271° do CPP e porque não estiveram presentes em julgamento apesar de convocadas.
6. Pelo que, do ponto de vista da igualdade de armas, a o direitos de defesa do arguido só são convenientemente realizados se este tiver a possibilidade de exercer o de convocar e interrogar as testemunhas nas mesmas condições que os outros sujeitos processuais. Nomeadamente o MP que o fez sem reservas em inquérito.
7. Os depoimentos para memória futura foram determinantes para a sua condenação. Nâo foi alvo de qualquer vigilância e inquérito e não foi realizado qualquer reconhecimento presencial deste arguido.
8. O arguido nunca teve o seu telefone interceptado, existindo conversas de outros co-arguidos referindo-se apenas GG ou V....
9. Sem as declarações para a memória futura as escutas seriam insusceptíveis de demonstrar factos relacionados com este arguido.
10. É inconstitucional, por violação das garantias a um processo equitativo e de defesa do arguido, asseguradas pelos artigos 20° n.4 e 32.°, n.° 1 e n.°5 da Constituição, e em particular da garantia de igualdade de armas e do princípio do contraditório, a interpretação do artigo 271° do Código de Processo Penal que permite a valoração contra o arguido, de declarações prestadas para memória futura, sem que ao arguido tenha tido a possibilidade de confrontar e questionar directamente as testemunhas inquiridas.
11. Não se verificam os elementos do crime de associação criminosa - art 299° n°l e n°3 do CP.
12. Não resulta da matéria provada, com suficiente intensidade, um encontro de vontades dos participantes hoc sensu, a verificação de um qualquer pacto mais ou menos explícito entre eles tenha dado origem a uma realidade autónoma, diferente e superior às vontades e interesses dos singulares membros.
13. Ou seja, não sobressai um centro autónomo de imputação fáctica das acções eventualmente prosseguidas.
14. Não se provou, que o arguido, ao aderir, representasse a existência da organização para a prática de crimes.
15. Não se deu como provada qualquer tipo de realidade autónoma, diferente e superior às vontades dos seus membros,
16. Não se verifica o crime de extorsão em relação à LLL, CCC, AAAA e ZZZ.
17. Em todos os casos, não se dão como provados factos concretos praticados pelo recorrente que revelem a sua participação e intervenção sobre cada um dos ofendidos, não se bastando com afirmações de carácter genérico ou conceitos de natureza conclusiva.
18. Para que se verifique o crime de extorsão, há-de existir, pois, no processo típico em que os meios de execução estão taxativamente referidos na lei um acto de disposição patrimonial directamente determinado pela violência ou pela ameaça.
19. Com referência aos pontos 100 a 108,109 a 125^ 138 a 157 e 162 a 173, nada consta da matéria de facto provada.
20. Sempre seria de afastar a punição do recorrente com o crime de extorsão agravada pela al. a) do n°3 do art 223° e 204° n°2 al. g) do CP.
21. Pois, como defendeu a decisão instrutória, não é compatível a punição como bando e pelo crime de associação criminosa, verificando-se uma dupla valoração proibida.
22. As penas concretamente aplicadas são exageradas.
23. No crime de associação criminosa, tendo em conta a concreta intervenção do arguido, por comparação com o arguido AA.
24. Nos crimes de extorsão por ausência no seu caso da pratica de qualquer violência ou ameaça.
25. Acabando por também se revelar muito elevada, a pena de 18 anos concretamente aplicada.
3 - O arguido/recorrente KK:
1. Nos termos dos art.s 355° e 356° n°2 a) do CPP, para que possa operar a excepção aqui prevista, exige-se que seja permitida a leitura em audiência, ou seja, que os depoimentos prestadas para memoria futura sejam lidos.
2. Se tais declarações não forem lidas na audiência, o tribunal não pode utilizá-las para fundamentar a sua convicção. Se o fizer, serve-se de prova proibida, e isso implica a nulidade da sentença.
3. É inconstitucional, por violação das garantias de defesa do arguido, asseguradas pelo artigo 32º nº 1 e nº 5 da Constituição, e em particular do princípio do contraditório, a interpretação conjugada dos artigos 271°, 355º e 356° nº 2 a) do Código de Processo Penal que permite que a produção e exame das provas em audiência referidos no n°l do art 355°, abrange conjuntamente a audiência, de julgamento propriamente dita e as declarações para memoria futura nos termos do art. 27 1º, não se exigindo, nos termos do art. 356° n°2 a) a sua efectiva leitura em audiência de julgamento, para que as mesma possam constituir prova validamente utilizável.
4. Não se verificam os elementos do crime de associação criminosa - art. 299° n° l e n° 2 do CP.
5. Não resulta da matéria provada, com suficiente intensidade, um encontro de vontades dos participantes hoc sensu, a verificação de um qualquer pacto mais ou menos explícito entre eles tenha dado origem a uma realidade autónoma, diferente e superior as vontades e interesses dos singulares membros.
6. Ou seja, não sobressai um centro autónomo de imputação fáctica das acções eventualmente prosseguidas.
7. Não se provou, que o arguido, ao aderir, representasse a existência da organização para a prática de crimes.
8. Não se deu como provada qualquer tipo de realidade autónoma, diferente e superior às vontades dos seus membros.
9. Não se verifica o crime de lenocínio relativamente à CCC.
10. A imputação de cada crime, não prescinde da descrição dos factos concretos por ele praticados que revelem a sua participação e intervenção sobre cada um dos ofendidos, não se bastando com afirmações de carácter genérico, ou conceitos conclusivos.
11. Nos pontos 109 a 125, não se dá como provado qualquer co-autoria com outro qualquer arguido, nem qualquer facto que preencha os elementos do tipo deste crime.
12. Não se verifica, pelas mesmas razões, o crime de extorsão em relação à CCC.
13. Sempre seria de afastar a punição do recorrente com o crime de extorsão agravada pela al. a) do nº 3 do art 223° e 204° n°2 al. g) do CP.
14. Pois, como defendeu a decisão instrutória, não é compatível a punição como bando e pelo crime de associação criminosa, verificando-se uma dupla valoração proibida.
15. Em consequência do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Évora, veio o arguido a ser absolvido de vários crimes - convolando-se outros e reduzindo-se penas, o que permitiu operar uma redução na soma de todas as penas de 27 anos e 6 meses de prisão.
16. Ou seja, de um máximo de 48 anos e 6 meses de prisão - 25 anos sempre - o limite superior do seu cumulo jurídico passou para 19 anos e 6 meses de prisão.
17. A pena de 14 anos actual, por oposição da revogada de 20 anos, não revela ainda a drástica redução da participação do recorrente nos factos provados.
4 – O arguido/recorrente DD:
O acórdão de que se recorre
1. Errou, ao indeferir a renovação da prova pessoal, na vertente da leitura das transcrições que o arguido ofereceu, porque ao preterir a mesma está a violar o direito de defesa deste, o qual vai garantido constitucionalmente na consagração do direito ao recurso. (artº 32 n° 1 da CRP).
2. É a sindicância da matéria de facto que permite corrigir erros in judicando ou procedendo, devendo a Relação proceder a efectivo controle da mesma por confronto da matéria dada como provada e da documentação cm acta da prova produzida oralmente em julgamento, o que não fez.
3. Sendo assim está o acórdão recorrido cm violação ao arl1-1 410° n° 2 do CPP na parte cm que dispõe dos vícios da decisão e que se reportam à referida matéria de facto, seja por erro notório na sua apreciação, seja por insuficiência ou contradição insanável, porquanto, para aferir de lais vícios necessário se torna socorrer-se da prova oral feita em julgamento para se concluir que os factos, provados ou não, correspondem àquilo que foi discutido nos autos.
4. O erro na apreciação da prova não pode ser aferido apenas da leitura da decisão, porque esta é a parte conclusiva do raciocínio, composto este pelo caminho interpretativo anterior que impôs tal resultado.
5. Sendo certo como é de processo penal que a prova radica quase sempre nas testemunhas, não pode a mesma ser alijada em recurso para se decidir o que na 1ª instância se provou ou não, devendo pelo contrário sindicar-se a mesma para descoberta da verdade.6. A sua nao observância viola o Princípio da descoberta material e ainda o artº 125° do CPP porquanto o ora recorrente não pode beneficiar-se da prova oral em sua defesa, a qual, a ter sido aferida, alterará, como pretende, o elenco dos factos dados como provados contra, si em 1ª instância.
7. O erro notório na apreciação da prova há-de ser aferido no exame dessa mesma prova e não apenas no texto da decisão porque o erro da decisão, ou de julgamento, radica sempre no erro da interpretação, contrariamente aos argumentos expendidos no acórdão sob censura.
8. O decidido pelo Tribunal ad quem viola os princípios contidos nos artigos 6º da Convenção europeia dos Direitos do Homem e no art° 14° do P1DCP os quais dispõem do julgamento equitativo garantido a todo o cidadão e porque Portugal aderiu aos mesmos constitui direito interno português de aplicação obrigatória.
9. O não conhecimento e total afastamento desta prova constitui omissão de pronúncia porque a questão é de essencial importância na condenação ou absolvição do recorrente.
10. A omissão de pronúncia determina, nos termos do art" 379° do CPP a nulidade da sentença (ou da decisão) pelo que neste particular o acórdão é nulo.
11. Devem assim os autos baixar, no provimento deste recurso, ao tribunal da Relação, para que conheça da matéria de facto anteriormente alijada c como ali se peticionou para cumprimento dos normativos e princípios acima aduzidos.
12. Quanto ao crime de roubo o recorrente pugna pela violação do princípio in dúbio pró reo porquanto foi condenado com base e apenas numa oscula telefónica, a qual foi posta em cansa pelo próprio Juiz de Instrução Criminal duvidando do autor da conversa, no que se refere ao ora arguido, razão pela qual, não se tendo realizado qualquer perícia técnica a garantir ser ou não o arguido em causa, deve se considerar insuficiente lai prova, por não ser sustentada por qualquer outra, tendo em conta que as testemunhas de acusação, em várias dezenas, ouvidas em Julgamento, não foram capazes de incriminar o recorrente por este crime, ou por qualquer outro.
13. E por isso deve ser absolvido por este crime, cm consagração do princípio in dúbio pró reo.
14. O acórdão também errou ao condenar o recorrente pelo crime de Associação Criminosa, porque lhe faltam factos que integrem esta figura, sendo certo como resulta dos factos provados c para os quais remetemos que este arguido não recebeu vantagens ou dinheiros dos crimes de que foi acusado e condenado, provando-se mesmo o contrário e também não se apurou de que forma se repartiam lucros, em que datas ou locais. Não foram apurados nem levados u discussão ou julgamento factos que tipificassem tal ilícito, sendo certo que o recorrente nunca esteve em reuniões de grupo a definir estratégias, não recebeu ordens dos restantes co-arguidos e também não as deu, pelo que cai por terra a ideia de estabilidade e obediência dentro do grupo, requisitos essenciais para esta figura ilícita.
15. O acórdão não cuidou de apreciar figuras paralelas na actuação, como a co-autoria ou comparticipação, próxima da Associação Criminosa, o que deveria, para afastar esta segunda, mais gravosa e apenas enquadrando condutas graves e quando o grupo, formado com base c objectivos de ilicitude, preenche o dolo que lhe é próprio.
16. Por isso, como se deixou dito, deve ser o recorrente absolvido deste crime.
17. Pugnado ainda o recorrente pela nulidade do acórdão por falta de fundamentação, na medida cm que, não sustenta por que razão aceita como fundamentado o acórdão de Ia instância (este também nulo por falia de fundamentação) limitando-se a justificá-lo pela extensão dos autos e pelo grande numero de testemunhas e diligencias de prova realizadas, sendo, como é certo, porque resulta do texto da decisão, que no caso do ora recorrente não há fundamentação para se ter optado por dar como provado este ou aquele facto, que prova formou tal convicção, o que é inconstitucional, porque o arguido não pode impugnar o que não existe.
18. A fundamentação da decisão é obrigatória (art° 205° n° .1. CRP), indo assim violado tal princípio.
19. E não acolhendo como acima, o que o recorrente não deseja posto que espera o contrário, sempre pugnará pela medida da pena a aplicar, a igual foi pesada e não teve cm conta os critérios da socialização e do mundo moderno.
20. Tendo havido, na prolação do acórdão c na aplicação das penas, preterição dos normativos penais, designadamente artigos 70, 71 c 72 do CPP, os quais, atendendo ao facto do arguido ser primário, estar a trabalhar e ter família em Portugal (família de facto), não ter praticado c porque está em liberdade, desde a data dos factos em acusação até à presente qualquer ilícito (tem boa conduta) deveria ter sido sancionado com penas próximas do limite mínimo, o que não aconteceu. 21. Tendo cm conta que o recorrente, tendo respondido em julgamento em liberdade e desde há três anos se mantém com tal estatuto, deve-se considerar mantê-lo na mesma situação, aplicando-se ao mesmo pena suspensa na sua execução.+
5 – O arguido/recorrente VV:
1º- O arguido considera que foram violadas as seguintes normas jurídicas:
Art° 299n°l e 2 do CP; Art° 223 n°l e 3 do CP; Art°2 6 do CP; Art°71 do CP; Art°283 n°3 b); 374 n°2 e 379 n° l a) do C.P.P; Art°129 do C.P.P; Principio Constitucional "In Dúbio Pró reo".
2º - 0 arguido invoca a violação dos artigos supra mencionados na medida em que considera a prática de um crime de associação criminosa e extorsão, sem ter como base factos concretos, mas sim conclusões, factos que não correspondem ao elemento típico e ilícito, nem o preenchem.
3º- Vejamos os factos dados como provados do douto acórdão recorrido, a fls. 261 a 263. Todos eles conclusões sem concretizar a prática de actos conducentes à prática de um crime, como data hora local, com quem, como, qual o dolo existente, como se repartiam os lucros, qual a função desempenhada pelo arguido, se tinha liberdade de acção, etc, invocando a nulidade do douto acórdão.
4º- 0 douto Tribunal recorrido, condenou o arguido, e refere o douto acórdão recorrido, a fls. 263,264 e 265, com base escutas telefónicas, cuja tradução se impugnou já, nomeadamente a tradução a fls. 720, onde o arguido falava na terceira pessoa do plural, e foi traduzido como primeira pessoa do singular, sendo que todo o sentido se altera.
5º- Que as provas conducentes à condenação foi ainda o depoimento para memória futura de PPP, que é depoimento indirecto, neste referindo que ouviu contar, nunca tendo ouvido directamente. Neste sentido é claramente violado o art° 129 do C.P.P., não valendo esta como prova
6º- Ademais a prova testemunhal dos Inspectores que nos seus relatos já devidamente identificados, nada viram no que respeita ao arguido ora recorrente.
7º- Conclui o douto Tribunal pela Associação criminosa sem prova bastante, concluindo sobre factos que nunca foram trazidos aos autos. Neste sentido a fls. 261 e ss. Do douto acórdão, conclusivas unicamente, e consequentemente nulo.
8º- Neste sentido o arguido pugna pela sua absolvição pela prática deste crime, tendo a sua condenação, resultado de conclusões e prova não trazida aos autos, sendo a base desta, e de acordo com o douto acórdão as escutas telefónicas.
9º- Sem considerar ainda que esta podia ficar-se pela tentativa, sem cuidar da concretização, sem apurar tal facto, concluindo, sempre...
10º- Ainda neste crime, não cuidou, estudou ou afastou a existência de uma co autoria ou compartição no crime, nos termos previstos no art° 26 do C. P.
11º- Nos termos do art° 299 do C. P. e vasta jurisprudência desse venerando Tribunal, são elementos essenciais deste ilícito: "um encontro de vontades dos participantes, e que este dê origem a uma nova realidade autónoma, diferente e superior às vontades e interesses dos singulares membros. "Figueiredo Dias e Costa Andrade, in CJ X tomo pags. 11 e segs.
12º- Torna-se necessário, e este é um exercício que os Tribunais recorridos nunca fizeram, dada a matéria provada, subsumi-la a diversas figuras jurídicas, afim de afastá-las ou integrá-las, como a actuação paralela ou comparticipação criminosa, sendo:
"Actuação paralela: em que há uma intervenção de vários agentes na execução do crime, porém sem acordo prévio entre eles, podendo até haver uma certa consciência de colaboração, porém sem concerto prévio ou acordo prévio para uma tarefa comum.
Na comparticipação criminosa, há concerto ou acordo prévio entre os vários agentes do crime ou co-autores para a execução ou contribuição objectiva conjunta.
Na associação criminosa há uma organização concertada entre os vários agentes, com um mínimo de estrutura organizativa e uma certa duração que pode não ser no inicio acordada, resultante de um processo de formação de vontade colectiva, e tendo como escopo ou finalidade a prática de crimes." In CP anotado e comentado, de Manuel Lopes Maia, ed. 2004 pag, 905/06
13º- Importa pois delinear as diferenças, ou o elemento diferenciador da Associação criminosa e da comparticipação, nomeadamente prevista no seu art° 26 do CP.
14º- E de acordo com vasta jurisprudência desse Douto Tribunal, encontramos a grande tónica entre as duas figuras na Estabilidade, no Dolo, na ideia de permanência, estrutura organizativa.
De acordo com o Ac. De STJ de 03.11.2004, proc. N° 46571, é a ideia de estabilidade e permanência, ou o propósito desta, que distingue a associação da comparticipação,
"O encontro de vontades tem que dar origem a uma nova realidade autónoma. O dolo tem por objecto a anuência e adesão à finalidade comum." AC STJ de 18.05.95 proc. N.º 43103.
15º- É necessário também que, entre os seus membros haja laços de disciplina e hierarquia. Ac. STJ de 09.10.1996. Proc.n°47295.
Ac. STJ de 02.07.1998 refere que "... 0 que essencialmente caracteriza a associação criminosa, é a ideia de estabilidade e permanência, ideia esta não presente na comparticipação."
16º- Interessar-nos-á, nesta fase, distinguir pois a associação criminosa da comparticipação.
17º- Assim, no seu art° 26 do CP, a comparticipação na autoria depende de verificação de "Decisão conjunta tendo em vista a obtenção de um resultado e uma execução igualmente conjunta." AC STJ de 18 Julho de 1984 in BMJ 339,276.
Ac do STJ 14.06.1995; CJ Acs STJ III tomo 2, 230: “Para a verificação da co-autoria exige dois requisitos: a) participação directa na execução do facto, conjuntamente com outro ou outros, num exercido conjunto no domínio do facto, numa contribuição objectiva para a realização, que tem a ver com a causalidade, embora possa não fazer parte da execução, como por exemplo a conduta do motorista do veículo onde se deslocam os assaltantes do banco. II- Para a verificação do acordo basta a existência da consciência e vontade de várias pessoas na realização de um tipo legal de crime, basta provar a adesão da vontade de cada um à execução do crime."
18º- Resulta pois desta resenha de jurisprudência que Associação criminosa e co-autoria ou comparticipação, sendo próximas têm definida a sua diferença.
19º- Nomeadamente a ideia de estabilidade na prática de crimes, Estrutura organizativa; repartição de tarefas, de lucros.
20º- Não consta na douta acusação, não consta nos acórdãos da 1ª Instância nem do acórdão ora recorrido, como se distribuíam as tarefas, qual e como se fazia a repartição dos lucros, e ainda o dolo de cada um dos arguidos numa alegada comparticipação.
21º- Considerando os elementos deste ilícito, e com interesse para este arguido, temos:
- Elemento organizativo
- Elemento da estabilidade associativa
- Elemento da finalidade criminosa.
Nenhum destes elementos foi concretamente apurado e dado como provado.
22 - Pelo que se conclui que o douto Tribunal recorrido, salvo o devido respeito por melhor opinião não aplicou a lei processual e a lei penal devidamente tendo-o feito de forma conclusiva sem apurar todos os factos, ou se os factos apurados eram subsumíveis ao ilícito penal em causa, ou a outro, nomeadamente art°26 do CP e condenado com base em conclusões também estas dadas como provadas na matéria de facto, contrariando o disposto no art.° 374 n° 2 e 379 n° l a) do C.P.P.
23º- Basta ainda atentarmos nos objectos apreendidos ao arguido, e concluir que estes estão relacionados e são produto desta actividade criminosa. Conclusivo e não é perceptível.
24º- Quanto ao crime de extorsão vale o supra mencionado, salvaguardando a especificidade do crime.
25º- 0 douto acórdão da primeira Instância, a fls. 69, no seu ponto 20, esclarece que não houve violência.
26º- Vai mais longe e entende que a compleição física do arguido e outro, o FFF, a quem apelida de "gorilas", é suficiente para o crime de extorsão.
27º- Um dos elementos típicos do crime de extorsão é então, se não houver a violência física, a ameaça de um mal importante.
28º- A própria testemunha PPP refere, a fls. 3957 que não foi ameaçada, nem se sentiu intimidada pelo arguido ora recorrente VV.
29º- A base da condenação pela pratica deste crime é novamente o depoimento para memória futura da testemunha PPP, cuja validade no que toca ao depoimento indirecto já foi supra impugnada, mas vale o referido sob o número anterior, não receando qualquer mal do arguido, ora recorrente.
30º- Resumindo a prática deste crime, pela presença do arguido no Mac Donalds de Albufeira, não tendo sido visto pelos Inspectores do SEF nenhuma atitude conducente a ameaça de mal importante com o consequente receio da alegada vitima.
31º- Concluindo o recorrente que não estão verificados os Factos que conduzem aos elementos típicos e ilícitos desta previsão.
32º- Chegados a este ponto resta ainda a medida da pena, que no entender do arguido recorrente só a absolvição corresponderá à justiça ainda por recurso ao principio constitucional que norteia todo o sistema juridico-penal, "In Dúbio Pró Reo".
33º- Só por hipótese académica se porá a hipótese de uma eventual condenação, a pena aplicada é desmesurada, não corresponde nem tal devidamente ponderado e analisado, salvo o devido respeito, à medida da culpa do arguido, sendo primário, com estabilidade profissional e familiar em Portugal.
34º- Termos em que foi violado o art° 71 do CP., devendo a eventual pena, ser substancialmente reduzida e suspensa na sua execução.
35º- 0 arguido recorrente detectou ainda ao ler o douto acórdão do Tribunal recorrido que parece haver confusão entre o arguido KK e o GGG, o que afecta naturalmente este último e também o ora recorrente, pois nos presentes autos estes eram vistos juntos, são acusados e condenados pelos mesmos crimes, o que leva, novamente a interpretações e conclusões não coincidentes com a verdade, confusão essa detectada a fls. 146, ponto 6, referência ao encontro no Mac Donalds em que o Be...... não tem participação;
36º- A fls. 265 quando se remete para o acórdão condenatório do Tribunal de Ia Instância e refere a fls. 78 e 79 deste acórdão ora recorrido.
37º- Nesse ponto, a conversa é entre J.... e Ba......, que não se confunde com o Ch.......
38º- Ainda a referência ao recorrente e esse Chouljenko, na prática de crimes de lenocínio e relação com os motoristas, a fls. 262 do douto acórdão, 201p não tem correspondência alguma sequer com a condenação do arguido, considerando todas as condutas indistintamente.
6 – O arguido/recorrente FFF:
1º- O arguido considera que foram violadas as seguintes normas jurídicas:
Art° 299 n° l e 2 do CP; Art° 223 n°l e 3 do CP; Art° 26 do CP; Art°71 do CP; Art° 283 n°3 b); 374 n°2 e 379 n°l a) do CP.P; Art°129 do CP.P; Principio Constitucional "In Dúbio Pró reo".
2º - 0 arguido invoca a violação dos artigos supra mencionados na medida em que considera a prática de um crime de associação criminosa e extorsão, sem ter como base factos concretos, mas sim conclusões, factos que não correspondente ao elemento típico e ilícito, nem o preenchem.
3º- Vejamos os factos dados como provados do douto acórdão recorrido, a fls. 261 a 263. Todos eles conclusões sem concretizar a prática de actos conducentes à prática de um crime, como data hora local, com quem, como, qual o dolo existente, como se repartiam os lucros, qual a função desempenhada pelo arguido, se tinha liberdade de acção, etc, invocando a nulidade do douto acórdão.
4º- 0 douto Tribunal recorrido, condenou o arguido, e refere o douto acórdão recorrido, a fls. 263,264 e 265, com base escutas telefónicas, cuja tradução se impugnou já, nomeadamente a tradução a fls. 720, onde o arguido VV falava na terceira pessoa do plural, e foi traduzido como primeira pessoa do singular, sendo que todo o sentido se altera.
5º- Que as provas conducentes a condenação foi ainda o depoimento para memória futura de PPP, que é depoimento indirecto, neste referindo que ouviu contar, nunca tendo ouvido directamente. Neste sentido é claramente violado o art° 129 do C.P.P., não valendo esta como prova
6°- Ademais a prova testemunhal dos Inspectores que nos seus relatos já devidamente identificados, nada viram no que respeita ao arguido ora recorrente.
7º- Conclui o douto Tribunal pela Associação criminosa sem prova bastante, concluindo sobre factos que nunca foram trazidos aos autos. Neste sentido a fls. 261 e ss do douto acórdão, conclusivas unicamente, e consequentemente nulo.
8º- Neste sentido o arguido pugna pela sua absolvição pela prática deste crime, tendo a sua condenação resultado de conclusões e prova não trazida aos autos, sendo a base desta, e de acordo com o douto acórdão as escutas telefónicas.
9º- Sem considerar ainda que esta podia ficar-se pela tentativa, sem cuidar da concretização, sem apurar tal facto, concluindo, sempre...
10º- Ainda neste crime, não cuidou, estudou ou afastou a existência de uma co autoria ou compartição no crime, nos termos previstos no art° 26 do C. P.
11º- Nos termos do art° 299 do C. P. e vasta jurisprudência desse venerando Tribunal, são elementos essenciais deste ilícito:"um encontro de vontades dos participantes, e que este dê origem a uma nova realidade autónoma, diferente e superior às vontades e interesses dos singulares membros."Figueiredo Dias e Costa Andrade, in CJ X tomo pags. 11 e segs.
12º- Torna-se necessário, e este é um exercício que os Tribunais recorridos nunca fizeram, dada a matéria provada, subsumi-la a diversas figuras jurídicas, afim de afastá-las ou integrá-las, como a actuação paralela ou comparticipação criminosa, sendo:
"Actuação paralela; em que há uma intervenção de vários agentes na execução do crime, porém sem acordo prévio entre eles, podendo até haver uma certa consciência de colaboração, porém sem concerto prévio ou acordo prévio para uma tarefa comum.
Na comparticipação criminosa, há concerto ou acordo prévio entre os vários agentes do crime ou co-autores para a execução ou contribuição objectiva conjunta.
Na associação criminosa há uma organização concertada entre os vários agentes, com um mínimo de estrutura organizativa e uma certa duração que pode não ser no inicio acordada, resultante de um processo de formação de vontade colectiva, e tendo como escopo ou finalidade a prática de crimes." In CP anotado e comentado, de Manuel Lopes Maia, ed. 2004, pag. 905/06
13º- Importa pois delinear as diferenças, ou o elemento diferenciador da Associação criminosa e da comparticipação, nomeadamente prevista no seu art° 26 do CP.
14º- E de acordo com vasta jurisprudência desse Douto Tribunal, encontramos a grande tónica entre as duas figuras na Estabilidade, no Dolo, na ideia de permanência, estrutura organizativa.
De acordo com o Ac. De STJ de 03.11.2004, proc. N° 46571, é a ideia de estabilidade e permanência, ou o propósito desta, que distingue a associação da comparticipação.
"O encontro de vontades tem que dar origem a uma nova realidade autónoma. O dolo tem por objecto a anuência e adesão à finalidade comum." AC STJ de 18.05.95 proc. N°43103.
15º- É necessário também que, entre os seus membros haja laços de disciplina e hierarquia. Ac. STJ de 09.10.1996. Proc.n°47295.
Ac. STJ de 02.07.1998 refere que “... O que essencialmente caracteriza a associação criminosa, é a ideia de estabilidade e permanência, ideia esta não presente na comparticipação."
16º- Interessar-nos-á, nesta fase, distinguir pois a associação criminosa da comparticipação.
17º- Assim, no seu art° 26 do CP a comparticipação na autoria depende de verificação de "Decisão conjunta tendo em vista a obtenção de um resultado e uma execução igualmente conjunta." AC STJ de 18 Julho de 1984 in BMJ 339,276.
Ac do STJ 14.06.1995; CJ Acs STJ III tomo 2,230: " Para a verificação da co-autoria exige dois requisitos: a) participação directa na execução do facto, conjuntamente com outro ou outros, num exercício conjunto no domínio do facto, numa contribuição objectiva para a realização, que tem a ver com a causalidade, embora possa não fazer parte da execução, como por exemplo a conduta do motorista do veículo onde se deslocam os assaltantes do banco. II - Para a verificação do acordo basta a existência da consciência e vontade de várias pessoas na realização de um tipo legal de crime, basta provar a adesão da vontade de cada um à execução do crime."
18º- Resulta pois desta resenha de jurisprudência que Associação criminosa e co-autoria ou comparticipação, sendo próximas têm definida a sua diferença.
19º- Nomeadamente a ideia de estabilidade na prática de crimes, Estrutura organizativa; repartição de tarefas, de lucros.
20º- Não consta na douta acusação, não consta nos acórdãos da 1ª Instância nem do acórdão ora recorrido, como se distribuíam as tarefas, qual e como se fazia a repartição dos lucros, e ainda o dolo de cada um dos arguidos numa alegada comparticipação.
21º- Considerando os elementos deste ilícito, e com interesse para este arguido, temos;
- Elemento organizativo
- Elemento da estabilidade associativa
- Elemento da finalidade criminosa.
Nenhum destes elementos foi concretamente apurado e dado como provado.
22º- Pelo que se conclui que o douto Tribunal recorrido, salvo o devido respeito por melhor opinião não aplicou a lei processual e a lei penal devidamente tendo-o feito de forma conclusiva sem apurar todos os factos, ou se os factos apurados eram subsumíveis ao ilícito penal em causa, ou a outro, nomeadamente art°26 do C.P., e condenado com base em conclusões também estas dadas como provadas na matéria de facto, contrariando o disposto no art.° 374 n° 2 e 379 n° l a) do C.P.P.
23º- Basta ainda atentarmos nos objectos apreendidos ao arguido, e concluir que estes estão relacionados e são produto desta actividade criminosa. Conclusivo e não é perceptível.
24º- Quanto ao crime de extorsão vale o supra mencionado, salvaguardando a especificidade do crime.
25º- O douto acórdão da primeira Instância, a fls.69, no seu ponto 20, esclarece que não houve violência.
26º- Vai mais longe e entende que a compleição física do arguido CH...., a quem apelida de "gorilas", é suficiente para o crime de extorsão.
27º- Um dos elementos típicos do crime de extorsão é então, se não houver a violência física, a ameaça de um mal importante.
28º- A própria testemunha PPP refere, a fls. 3957 que não foi ameaçada, nem se sentiu intimidada pelo arguido VV.
29º- A base da condenação pela prática deste crime é novamente o depoimento para memória futura da testemunha PPP, cuja validade no que toca ao depoimento indirecto já foi supra impugnada, mas vale o referido sob o número anterior, não receando qualquer mal do arguido, ora recorrente.
30º- Resumindo a prática deste crime, pela presença do arguido no Mac Donalds de Albufeira, não tendo sido visto pelos Inspectores do SEF nenhuma atitude conducente a ameaça de mal importante com o consequente receio da alegada vitima.
31º- Concluindo o recorrente que não estão verificados os Factos que conduzem aos elementos tipicos e ilícitos desta previsão.
32º- Chegados a este ponto resta ainda a medida da pena, que no entender do arguido recorrente só a absolvição corresponderá à justiça ainda por recurso ao principio constitucional que norteia todo o sistema jurídico-penal, "In Dúbio Pró Reo".
33º- Só por hipótese académica se porá a hipótese de uma eventual condenação, a pena aplicada é desmesurada, não corresponde nem tal devidamente ponderado e analisado, salvo o devido respeito, à medida da culpa do arguido, sendo primário, com estabilidade familiar em Portugal.
34º- Termos em que foi violado o art° 71 do C.P., devendo a eventual pena, ser substancialmente reduzida e suspensa na sua execução.
35º- 0 arguido recorrente detectou ainda ao ler o douto acórdão do Tribunal recorrido que parece haver confusão entre o arguido KK e o FFF, ora recorrente, o que afecta naturalmente este último, que conjuntamente com VV são acusados e condenados pelos mesmos crimes, o que leva, novamente a interpretações e conclusões não coincidentes com a verdade, confusão essa detectada a fls. 14 6, ponto 6, referência ao encontro no Mac Donalds em que o BA......não tem participação;
36º- A fls, 265 quando se remete para o acórdão condenatório do Tribunal de 1ª Instância e refere a fls. 78 e 79 deste acórdão ora recorrido.
37º- Nesse ponto, a conversa e entre J.... e Ba......, que não se confunde com o Ch........
38º- Ainda a referência ao recorrente e esse Ch........, na prática de crimes de lenocínio e relação com os motoristas, a fls. 262 do douto acórdão, 201p não tem correspondência alguma sequer com a condenação do arguido, considerando todas as condutas indistintamente.
O MºPº, junto do Tribunal da Relação de Évora não apresentou qualquer resposta.
Remetido o processo a este STJ, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo Tribunal emitiu douto e bem fundamentado Parecer no sentido de que:
- Os recursos dos arguidos VV e FFF devem ser rejeitados por legalmente não admissíveis (questão prévia);
- Os recursos dos arguidos KK, MD, AA e GG devem ser parcialmente rejeitados por legalmente não admissíveis quanto aos crimes relativamente aos quais foram aplicadas, em concreto, penas de prisão inferioes a oito anos de prisão (questão prévia);
- Não devem ser admitidos os recursos respeitantes a matéria de facto, pois o reexame da matéria de facto não é possível;
- Deve ser desatendida a questão suscitada pelos recorrentes no que respeita á validade e relevância das declarações para memória futura (enquanto fundamento da matéria de facto provada); assim como deve ser desatendida a questão suscitada e respeitanteas escutas telefónicas (destruição da parte não relevante sem autorização dos arguidos); os factos provados integram o crime de associação criminosa; existe concurso efectivo – e não apenas aparente – entre o crime de associação criminosa e os crimes por cometidos pela “organização”, designadamente os de lenocínio, de extorsão ou de roubo; e as penas aplicadas mostram-se justas, pelo que, nestes segmentos, os recursos devem improceder.
Foi cumprido o estatuído no artigo 417º-2 do CPP.
Colhidos os vistos, cumpre conhecer.
As duas questões prévias suscitadas pela Exmª PGA neste STJ:
1ª questão prévia:
- Não admissibilidade dos recursos dos arguidos VV e FFF:
Os co-arguidos/recorrentes VV e FFF foram condenados, cada um, em 1ª Instância, pela prática dos seguintes crimes e nas seguintes penas (parcelares):
1. Autoria material do crime doloso consumado de ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal - QUATRO ANOS E SEIS MESES DE PRISÃO.
2. Autoria material de um crime doloso consumado de EXTORSÃO (HHH previsto e punido pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal - SETE ANOS DE PRISÃO.
CUMULADAS JURIDICAMENTE as penas parcelares aplicadas, nos termos do artigo 77º do Código Penal, foi CADA UM dos arguidos VV e FFF condenado na pena única de DEZ ANOS DE PRISÃO.
Essa decisão da 1ª Instância foi proferida em 11 de Dezembro de 2007.
E, na parte respeitante a tais arguidos/recorrentes VV e FFF, tal decisão parcialmente confirmada pelo Tribunal da Relação de Évora que, por acórdão proferido em 28.Outubro.2008, julgou parcialmente procedente os recursos (mas apenas no que toca à medida concreta da pena aplicada pelo crime de associação criminosa e à medida da pena única, improcedendo quanto a tudo o mais), e condenou cada um dos referidos arguidos VV e FFF, na pena de 4 anos de prisão pela prática em co-autoria de um crime de associação criminosa p. e p. pelo artigo 299º-1 e 2 do CP; manteve a pena parcelar aplicada de 7 anos de prisão relativamente á prática, em co-autoria, de crime de extorsão p. e p. pelos artigos 223º-1 e 3º-a) e 204º-2-g); e, em cúmulo jurídico, condenou cada um dos referidos arguidos/recorrentes na pena única de 8 anos de prisão.
Entende a Exmª Magistrada do MºPº junto deste Supremo Tribunal de Justiça, que os recursos em causa, interpostos pelos ditos arguidos EEE e FFF não são legalmente admissíveis porquanto aos arguidos foi aplicada pela Relação, a pena única de 8 anos de prisão e, nessa medida, o acórdão da Relação embora tivesse reduzido a pena aplicada em cúmulo de 10 para 8 anos de prisão (beneficiando cada um dos ditos arguidos), confirmou a decisão da 1ª Instância e aplicou pena de prisão não superior a 8 anos.
Assim, estando em causa, como está, uma pena de prisão não superior a 8 anos, confirmada pela Relação, não é admissível o recurso, face ao disposto no artigo 400º-1-f) do CPP (redacção actual).
Apreciando:
Os arguidos VV e FFF interpõem os presentes recursos de acórdão proferido pela Relação de Évora que, julgando parcialmente procedentes os recursos por eles interpostos, reduziu a pena única aplicada de prisão de 10 anos para prisão de 8 anos, (em virtude de ter alterado a pena parcelar de 4 anos e 6 meses de prisão, para 4 anos de prisão, aplicada a cada um dos ditos arguidos/recorrentes pela prática em co-autoria de um crime de associação criminosa p. e p. pelo artigo 299º-1 e 2, do CP, na sequência do que procedeu à elaboração de novo cúmulo jurídico das penas aplicadas).
No mais, o dito acórdão confirmou a decisão da 1ª Instância.
Sendo assim, como é, o acórdão da Relação de Évora confirmou a decisão de 1ª Instância?
Não temos dúvidas em responder afirmativamente.
Na verdade, a introdução no artigo 400º-1-f) do CPP da chamada “dupla conforme”, pela Lei 48/2007, de 29 de Agosto, deu origem à questão de saber quando é que há confirmação da decisão anterior, isto é, quando é que pode dizer que o acórdão da Relação confirma a decisão da 1ª instância.
A resposta tem sido no sentido de que a decisão do tribunal recorrido é confirmada – no caso que agora nos interessa – quando o Tribunal da Relação aplica uma pena inferior ou menos grave do que a pena da decisão recorrida (confirmação in mellius).
Neste sentido, pode ver-se o Ac. do Tribunal Constitucional nº 20/2007 e os Acs. deste STJ de 16.01.2003 in CJ Acs. STJ, XXVIII, 1, 162; e de 11.03.2004, in CJ Acs. STJ, XII, 1, 224.
E isto, mesmo que tal confirmação seja só parcial (neste sentido, cfr. Ac. deste STJ de 03.11.2004, in CJ Acs. STJ, XII, 3, 221).
Nestes casos em que o Tribunal da Relação aplica uma pena inferior ou menos grave, não há violação do direito ao recurso do arguido (cfr. arts. 32º-1 e 7 e 20º-1, da Constituição da República Portuguesa).
Isto mesmo é defendido também por Paulo Pinto de Albuquerque in Comentário ao Código de Processo Penal, pág. 1020 e 1021.
Por outro lado, a alínea f) do nº 1 do artigo 400º do CPP veio resolver por via legislativa (a nova redacção que lhe foi dada pela lei nº 48/2007, de 29.08) a questão, até então bastante controvertida, de saber se o limite era estabelecido pela pena aplicável ao crime objecto do processo ou se tal limite era estabelecido pela pena concretamente aplicada.
Ficou agora claro que o limite é o da pena efectivamente aplicada, mesmo em caso de concurso de infracções.
Ora, nos termos do artigo 432º-1-b), recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça de decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas Relações, em recurso, nos termos do artigo 400º.
E, nos termos do artigo 400º-1-f), do CPP, não é admissível recurso de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de 1ª Instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos.
Sendo assim, estando, como estamos, perante acórdão do Tribunal da Relação que confirmou a decisão da 1ª instância (confirmação “in mellius”) e sendo a pena aplicada, de prisão não superior a 8 anos, nos termos do estatuído na citada alínea f) do nº1 do artº 400º do CPP, não é admissível recurso.
Os recursos dos arguidos VV e FFF interpostos nos termos supra expostos, não são, portanto, admissíveis.
Pelo exposto, procede esta questão prévia.
Em consequência, os recursos interpostos pelos arguidos VV e FFF por legalmente não admissíveis, terão de ser rejeitados – cfr. artigos 420º-1 e 414º-2, ambos do CPP.
2ª questão prévia:
- Os recursos dos arguidos KK, MD, AA e GG devem ser parcialmente rejeitados por legalmente não admissíveis quanto aos crimes relativamente aos quais foram aplicadas, em concreto, penas de prisão inferiores a oito anos de prisão?
Assim,
Os recursos dos arguidos KK (e não FFF como se refere por manifesto lapso no Parecer) KKKK, MD só são recorríveis quanto à medida da pena única e os dos arguidos AA e GG só são recorríveis quanto aos crimes de extorsão e à medida das penas únicas?
Decidindo:
Antes do mais, e para evitar repetições fastidiosas, permitimo-nos aqui remeter para o que atrás se expôs relativamente à confirmação “in mellius” (aquando da apreciação da questão da inadmissibilidade dos recursos interpostos pelos arguidos VV e FFF), citando ainda o Ac. deste STJ de 30.10.2003, Proc. 2921/03 in SASTJ nº 74, 207, nos termos do qual “Não é admissível recurso para o STJ de acórdão da Relação que alterou a decisão da 1ª instância mas condenou em pena inferior á anteriormente fixada (naturalmente, desde que ao crime não seja aplicada pena superior a 8 anos). Tal acórdão tem de ser havido como confirmativo (confirmação in mellius) da decisão da 1ª instância”.
O arguido AA interpõe recurso do acórdão da Relação que o condenou:
- Pela prática de 1 crime doloso consumado de associação criminosa, p. e p. pelo artigo 299º-1 e 3, do CP na pena de 7 anos de prisão (mantendo a pena aplicada na 1ª instância);
- Pela prática de 12 Crimes de Extorsão, p. e p. pelos artigos 223º1 e 3-a) e 204º-2-g), em concurso efectivo real, na pena de 10 anos de prisão por cada um deles (mantendo a pena aplicada na 1ª instância); e
- Pela prática de 2 crimes de lenocínio simples, p. e p. pelo artigo 169º-1 do CP, nas penas de 3 anos de prisão – quanto a um deles – e 3 anos e 6 meses – quanto a outro - (em substituição de 2 crimes de lenocínio qualificado pelos quais fora condenado em 1ª instância nas penas parcelares de 6 anos de prisão por cada um deles);
Em cúmulo jurídico, foi condenado na pena única de 22 anos de prisão.
O arguido GG interpõe recurso do acórdão da Relação que o condenou:
- Pela prática de 1 crime doloso consumado de associação criminosa, p. e p. pelo artigo 299º-1 e 3, do CP na pena de 6 anos e seis meses de prisão (mantendo a pena aplicada na 1ª instância);
- Pela prática de 4 crimes de extorsão, p. e p. pelos artigos 223º1 e 3-a) e 204º-2-g), em concurso efectivo real, na pena de 9 anos de prisão por cada um deles (mantendo a pena aplicada na 1ª instância); e
- Pela prática de 1 crime de lenocínio simples, p. e p. pelo artigo 169º-1 do CP, na pena de 3 anos de prisão (em substituição de 2 crimes de lenocínio qualificado pelos quais fora condenado em 1ª instância nas penas parcelares de 6 anos de prisão por cada um deles).
Em cúmulo jurídico foi condenado na pena única de 18 anos de prisão.
O arguido KK interpõe recurso do acórdão da Relação que o condenou:
- Pela prática de 1 crime doloso consumado de associação criminosa, p. e p. pelo artigo 299º-1 e 2, do CP na pena de 4 anos de prisão (reduzindo a pena de 4 anos e seis meses de prisão aplicada na 1ª instância);
- Pela prática de 1 crime de extorsão, p. e p. pelos artigos 223º1 e 3-a) e 204º-2-g), na pena de 7 anos de prisão (reduzindo a pena de 9 anos de prisão aplicada na 1ª instância);
- Pela prática de um crime de lenocínio simples, p. e p. pelo artigo 169º-1 do CP, na pena de 2 anos e seis meses de prisão (em substituição de 1 crime de lenocínio qualificado pelo qual fora condenado em 1ª instância na pena de 6 anos de prisão);
- Pela prática, como cúmplice, de 1 crime de extorsão, p. e p. pelos artigos 223º-1 e 3-a) e 204º-2-g), do CP, na pena de 4 anos de prisão (em substituição de 3 crimes de extorsão qualificada pelos quais fora condenado em 1ª instância na pena de 9 anos de prisão por cada um deles); e
- Pela prática de 1 crime de uso de documento falso, p. e p. pelo artigo 256º-1-e) e nº 3, do CP, na pena de 2 anos de prisão (mantendo a pena aplicada na 1ª instância).
Em cúmulo jurídico foi condenado na pena única de 14 anos de prisão.
O arguido MD interpõe recurso do acórdão da Relação que o condenou:
- Pela prática de 1 crime doloso consumado de associação criminosa, p. e p. pelo artigo 299º-1 e 2, do CP na pena de 4 anos de prisão (reduzindo a pena de 4 anos e seis meses de prisão aplicada na 1ª instância);
- Pela prática de 1 crime de extorsão, p. e p. pelos artigos 223º1 e 3-a) e 204º-2-g), na pena de 8 anos de prisão (reduzindo a pena de 9 anos de prisão aplicada na 1ª instância);
- Pela prática de 1 crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210º-1, do CP, na pena de 5 anos de prisão (reduzindo a pena de 6 anos de prisão aplicada na 1ª instância);
Em cúmulo jurídico foi condenado na pena única de 12 anos de prisão.
No mais, o dito acórdão confirmou a decisão da 1ª Instância.
Sendo assim, como é - exceptuadas as medidas das penas únicas aplicadas a todos ao recorrentes e ainda as penas (parcelares) aplicadas aos arguidos/recorrentes AA e OO quanto aos crimes de extorsão - pergunta-se: é admissível recurso quanto ás demais penas (parcelares) de prisão – não superiores a 8 anos - aplicadas aos recorrentes? Nesse casos, o acórdão da Relação confirmou a decisão de 1ª Instância?
Embora haja quem interpretasse a expressão “mesmo em caso de concurso de infracções” constante da alínea f) do nº 1 do Artigo 400º do CPP na redacção anterior à Lei 48/2007, de 29 de Agosto, como significando que no caso da prática pelo arguido, de várias infracções, ainda que cada uma delas não exceda a pena abstracta de oito anos de prisão, se o cúmulo jurídico correspondente, exceder esse tecto de oito anos, o recurso é admissível (neste sentido, entre outros, cfr. Ac. STJ de 24.09.2002, Proc. 1682-3ª, in SASTJ nº 63, pag. 70), a verdade é que – na esteira do entendimento maioritário perfilhado nesta 3ª secção – perfilhamos posição diferente, ou seja, a sustentada pela Exmª PGA neste STJ e neste processo (a título meramente exemplificativo, cfr. Acs. STJ de 30.10.2003, Proc. 2921/03, in SASTJ nº74, 207; de 14.07.2004, Proc. 1101/04-3ª e de 11.10.2005, Proc. 2433/05-5ª in SASTJ, nº 94, pág.104), segundo a qual no caso de concurso de crimes, o que releva para efeitos de in(admissibilidade) de recurso para o STJ (nos termos da alínea f) do nº 1 do Artigo 400º do CPP na redacção anterior à Lei 48/2007, de 29 de Agosto) é a pena aplicável a cada um dos crimes cometidos e não a soma das molduras penais abstractas dos crimes em concurso, sendo que esta interpretação não colide com a CRP (neste sentido, cfr. p. ex. Acs. STJ de 14.07.2004, Proc. 1101/04-3; de 28.09.2005, Proc. 2807/05-3ª; de 21.09.2005, Proc. 2759/05-3ª; de 11.10.2005, Proc. 2433/05-5ª; e de 21.12.2005, in SASTJ nº 96, 79. E Acs. TC nº 2/2006, de 3 de Janeiro in DR II Série de 13.02.2006; nº 64/2006, de 24 de Janeiro, Proc. 707/2005, DR II Série, de 19 de Maio de 2006).
Ora, a expressão “mesmo em caso de concurso de infracções” constante da alínea f) do nº 1 do artigo 400º (redacção anterior) foi eliminada pela Lei 48/2007, de 29 de Agosto.
Interpretamos tal eliminação no sentido de que se quis dar relevância à pena concreta aplicada a cada crime, isto é, dar relevância às penas parcelares concretamente aplicadas.
Por isso, relevante para efeitos de (in)admissibilidade de recurso para o STJ é a pena aplicada a cada um dos crimes cometidos e não a soma das penas aplicadas aos crimes em concurso.
E, a nosso ver, tal interpretação não colide com a CRP “pois esta não impõe ao legislador a obrigação de consagrar o direito de recorrer de todo e qualquer acto do juiz e, mesmo admitindo-se o direito a um duplo grau de jurisdição como decorrência, no processo penal, da exigência constitucional das garantias de defesa, tem de aceitar-se que o legislador possa fixar um limite acima do qual não seja admissível um terceiro grau de jurisprudência. Ponto é que tal limitação não atinja o núcleo essencial das garantias de defesa do arguido” (Ac. STJ de 14.07.2004, Proc. 1101/04 – 3ª).
Nos termos do artigo 400º-1-f) do CPP só é admissível recurso para o STJ, de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de primeira instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos.
Assim, no caso de concurso de crimes, aquele recurso para o STJ (de acórdãos condenatórios proferidos em recurso pela relações) só é admissível:
- Relativamente a cada um dos crimes cuja pena concretamente aplicada seja superior a 8 anos de prisão;
- Relativamente á pena única aplicada desde que superior a 8 anos de prisão.
Portanto, na esteira da posição que vimos seguindo, porque, no caso, estamos perante concurso de crimes e os recorrentes acima referidos, foram condenados – cada um deles – em (algumas) penas parcelares não superiores a 8 anos de prisão (embora a(s) pena(s) única(s) aplicada(s) tenha(m) sido superior(es) a 8 anos de prisão), não é admissível recurso para este STJ relativamente a tais crimes (por que cada um deles foi condenado em pena não superior a 8 anos de prisão).
Porém, é admissível o recurso relativamente a cada uma das penas únicas aplicadas, superior a 8 anos de prisão.
Em face do exposto:
1 - Admitem-se os recursos interpostos pelos arguidos KK MD, AA e GG relativamente à(s) pena(s) única(s) em que cada um deles foi condenado;
2 - Admitem-se os recursos interpostos pelos arguidos AA eGG relativamente aos crimes de extorsão, p. e p. pelos artigos 223º1 e 3-a) e 204º-2-g), por que cada um deles foi condenado (o AA pela prática de 12 desses crimes pelos quais foi condenado na pena de 10 anos de prisão por cada um deles; e o GG, pela prática de 4 desses crimes, pelos quais foi condenado na pena de 9 anos de prisão por cada um deles).
2 - Não se admitem os recursos interpostos:
a) pelo arguido AA, quanto aos crimes de associação criminosa, p. e p. pelo artigo 299º-1 e 3, do CP; e lenocínio simples (2 crimes), p. e p. pelo artigo 169º-1 do CP, pelos quais foi condenado nas penas de 7 anos de prisão, 3 anos de prisão e 3 anos e 6 meses de prisão, respectivamente.
b) pelo arguidoGG, quanto aos crimes de associação criminosa, p. e p. pelo artigo 299º-1 e 3, do CP; e lenocínio simples (1 crime), p. e p. pelo artigo 169º-1 do CP, pelos quais foi condenado nas penas de 6 anos e 6 meses de prisão; e 3 anos de prisão, respectivamente.
c) - pelo arguido KK, quanto aos crimes de associação criminosa, p. e p. pelo artigo 299º-1 e 2, do CP; extorsão p. e p. pelos artigos 223º1 e 3-a) e 204º-2-g); lenocínio simples, p. e p. pelo artigo 169º-1 do CP; extorsão, (como cúmplice) p. e p. pelos artigos 223º-1 e 3-a) e 204º-2-g); e uso de documento falso, p. e p. pelo artigo 256º-1-e) e nº 3, do CP, pelos quais foi condenado nas penas parcelares de 4 anos de prisão; 7 anos de prisão; 2 anos e seis meses de prisão; 4 anos de prisão; e 2 anos de prisão, respectivamente.
d) pelo arguido MD, quanto aos crimes de associação criminosa, p. e p. pelo artigo 299º-1 e 2, do CP; extorsão p. e p. pelos artigos 223º1 e 3-a) e 204º-2-g); e roubo, p. e p. pelo artigo 210º-1, do CP, pelos quais foi condenado nas penas parcelares de 4 anos de prisão; 8 anos de prisão; e 5 anos de prisão, respectivamente.
Nestes segmentos, tais recursos terão de ser rejeitados
Procede, pois, também, esta questão prévia suscitada.
Prosseguindo na apreciação e decisão do demais:
É a seguinte a matéria de facto provada (transcrição):
Com interesse para a decisão da causa resultaram PROVADOS os seguintes factos:
1p. Os arguidos pertencem a um grupo, constituído ainda por outros indivíduos, como por exemplo LLLL, grupo esse que tem como finalidade a prática reiterada e concertada de actos de extorsão a cidadãos imigrantes oriundos dos países do Leste Europeu.
2p. De facto, já desde o ano de 2003, pelo menos, operou no Algarve um grupo de indivíduos oriundos do Leste Europeu, chefiado pelos arguidos AA (J....) e GG (V...), e também pelo arguido separado BBBB ou ......, a estes competindo tomar decisões sobre o que se ia fazer e que vítimas iam ser molestadas, e quantos e quais os elementos que em cada momento integravam e executavam as acções do grupo.
3p. Neste contexto, os arguidos EE, DD (M... Cobra) e II actuavam em conjunto, algumas vezes dois a dois ou com outros elementos do grupo, estabelecendo entre si contacto também através de telemóveis, e definindo a forma como combinavam a sua actuação sobre as vítimas, a quem pressionavam ou molestavam, com o propósito de as constrangerem a entregarem-lhes quantias em dinheiro, tendo ainda o arguido DD contactos directos com o arguido AA depois do regresso do arguido separado CCCC à Ucrânia, pois coube então a este arguido AA exercer o controlo sobre todos os membros do grupo que actuavam no Algarve.
4p. O grupo em que se integravam os arguidos operava de forma organizada e hierarquizada, tendo por objectivo fundamental extorquir dinheiro a imigrantes do Leste Europeu, molestando-os psicológica e fisicamente, por coacção ou ameaça, obrigando-os a entregarem-lhes quantias em dinheiro, que seria dividido entre eles, em circunstâncias e percentagens não concretamente apuradas, fazendo-o em comunhão de esforços e intentos, de forma reiterada e articulada e com ligações à Ucrânia.
5p. MMM, cidadão ucraniano, veio para Portugal, onde passou a residir e a trabalhar.
6p. Em data e hora indeterminadas, durante a passagem de ano de 2004 para 2005, num bar em Montenegro, Faro, foi subtraído ao dito Sadahurskiy um telemóvel Sony Ericsson no valor de 83 Euros.
7p. No dito bar estavam cerca de oito indivíduos, entre os quais os arguidos EE e II
8p. Na altura, por temer a reacção daqueles indivíduos e recear pela sua segurança, o dito MMM nada fez.
9p. Contudo, em meados de Maio de 2005, o mesmo MMM solicitou a seu irmão que interviesse em seu auxílio e recuperasse o telemóvel, e na sequência disso, o irmão do referido .......... confrontou, mas sem qualquer resultado, o arguido II.
10p. De 1 para 2 de Junho de 2005, no entanto, os arguidos EE e II entraram na casa de MMM, na Travessa...................., Faro, fazendo-o sem a autorização ou o consentimento deste.
11p. Uma vez no interior daquela residência, os arguidos EE e II exigiram ao dito MMM o pagamento de 1.500 Euros em dinheiro e, como este se recusasse a pagar-lhes, os mesmos arguidos começaram a agredi-lo, molestando-o fisicamente.
12p. Com efeito, os arguidos EE e II desferiram no aludido Sa.......... pontapés e murros em todo o corpo e na cabeça, fazendo-o no interior da residência do próprio ofendido, no quarto deste, durante meia hora, pelo menos, até o deixarem prostrado no chão cheio de dores e ferimentos.
13p. Enquanto estes factos ocorriam, o arguido separado CCCC (v) e o arguido DD aguardaram no exterior, tendo depois todos abandonado o local, deixando o ofendido ferido e sem providenciarem por auxílio para o mesmo.
14p. Em consequência das condutas dos arguidos EE e II, o ofendido MMM sofreu lesões extensas, constituídas por múltiplas lesões na face, tórax, abdómen e membros; trauma crânio-encefálico e alteração do estado de consciência; escoriações na face, pescoço, tórax (lateral), flancos e membros superiores e inferiores; e ficou traumatizado (fractura das costelas à esquerda), assim como apresentava estados subjectivos dolorosos no dedo médio da mão e na grelha costal esquerda; cicatriz de 2 cms na zona anterior esquerda e aumento de volume discreto do dedo médio da mão direita, lesões que denotaram traumatismo de natureza contundente e demandaram ao ofendido MMM, directa e necessariamente, quarenta e cinco dias de doença, todos com afectação da capacidade para o trabalho.
15p. O ofendido MMM foi transportado pelo INEM, devido às agressões descritas, apresentando múltiplas escoriações, com edemas periorbitários, edemas epicranianos, hemorragia conjuntival; neurologicamente estável com diminuição do murmúrio do pulmão esquerdo, e fez radiografia, a qual revelou fractura da costela à esquerda (fractura do 8º arco costal e do 11º, com quatro fracturas) e fez TAC crânio-encefálica e ecografia abdominal; assim como apresentava derrame pleural esquerdo, e ainda fractura do 3º dedo da mão direita.
16p. Por virtude dessas lesões, o ofendido MMM esteve internado, entre os dias 2 e 6 de Junho de 2005, no Hospital Distrital de Faro e, desde então, ficou sem poder trabalhar, como carpinteiro, durante vários meses.
17p. Os arguidos EE e II introduziram-se na residência de MMM e devassaram a casa e a intimidade deste, fazendo-o contra a sua vontade, assim como molestaram fisicamente o ofendido, provocando-lhe dores e ferimentos, deixando-o depois abandonado à sua sorte, sem lhe prestarem ajuda ou providenciarem por que a recebesse, mas não se coibiram de actuar da forma supra descrita, como actuaram, conformando-se com o resultado das suas condutas.
18p. Os arguidos EE e II actuaram também em comunhão de esforços e intentos, usando a violência para constrangê-lo a entregar-lhes a sobredita quantia em dinheiro, o que conseguiram.
19p. O arguido separado CCCC e o arguido DD transportaram os arguidos EE e II até à residência do ofendido, para que estes lhe extorquissem dinheiro.
20p. Os arguidos CCCC, DD, EE e II actuaram de forma concertada, competindo aos dois últimos executar a tarefa, mediante plano previamente concertado entre todos, não se coibindo de actuar como actuaram, conformando-se com o resultado das suas condutas.
21p. Por recear pela sua vida, o ofendido MMM entregou dias mais tarde a quantia de 400 Euros em dinheiro, pois era esse todo o dinheiro que tinha na ocasião, a dois outros indivíduos enviados para esse efeito, os quais o advertiram de que devia preparar em breve mais dinheiro para o arguido II sob pena de, não o fazendo, ser novamente espancado.
22p. Em ocasião posterior, de Junho para Julho de 2005, e na mesma sequência, o ofendido MMM foi visitado em sua casa pelo arguido II, a quem fez entrega de mais 600 Euros.
23p. No dia 20 de Agosto de 2005, cerca das 22.30 horas, DDDD encontrava-se num café próximo da rotunda da Makro, em Bela Corral, concelho de Faro, sentado na esplanada, e viu dois veículos que chegaram ao local e foram estacionar ali perto.
24p. Um dos indivíduos saiu de um dos veículos e dirigiu-se ao ofendido DDDD, chamando-o pelo nome de “Dani”, ao que o ofendido, admitindo que alguém conhecido estivesse a chamá-lo, se aproximou do veículo da frente, de cor escura, de marca, modelo e matrícula ignorados, e viu quatro indivíduos no seu interior.
25p. Então, um dos indivíduos saiu do veículo e empurrou o ofendido DDDD para o interior do mesmo, onde permaneceu por algum tempo contra a sua vontade, sentado no banco traseiro.
26p. De seguida, o condutor do veículo em causa dirigiu o mesmo para fora daquele local e, embora não querendo, o ofendido DDDD foi manietado devido à superioridade numérica e à envergadura física dos indivíduos.
27p. Com efeito, assim que o ofendido DDDD tentou impedir que o levassem, foi agredido pelos referidos indivíduos, entre eles o arguido DD e um certo Y..a, que o atingiram com socos na cabeça, em particular na zona dos ouvidos e nariz.
28p. O arguido DD apoderou-se do telemóvel do ofendido, da marca Motorola e no valor de 160 Euros, que sabia não lhe pertencerem e que subtraía contra a vontade do dono.
29p. Em consequência daquelas condutas, devido aos socos com que foi agredido, o ofendido DDDD sofreu dores e ferimentos que lhe provocaram tempo indeterminado de doença, perdendo mesmo a consciência.
30p. O ofendido DDDD foi transportado inconsciente e durante tempo indeterminado até um caminho de terra batida, existente nas imediações da propriedade Beluga onde residia, local onde o arguido DD e os demais o deixaram caído, sem lhe prestarem cuidados e sem providenciarem para que fosse medicamente assistido.
31p. O arguido separado CCCC (V....) foi o mandante destes factos e o arguido DD foi executante deles, e o arguido EE sabia também que o ofendido DDDD havia sido fisicamente molestado e ficara prostrado numa estrada de terra batida, mas nenhum dos arguidos fez nada para providenciar por socorro, alheando-se todos do estado de saúde da vítima.
32p. De facto, na sequência de ordens e instruções do arguido separado CCCC (V....), que pretendia saber se o ofendido sobrevivera às agressões, o arguido EE (V....), irmão daquele, deslocou-se depois ao local onde havia sido deixado o ofendido DDDD e confirmou que “ele está deitado, nem muge”, e explicou ao irmão que a vítima estava caída e que no local estava um indivíduo IIII, um português que vive nas barracas, a dizer-lhe que havia sinais de o ofendido ter sido arrastado da estrada.
33p. A actuar da forma supra descrita, o arguido DD pretendia apoderar-se de bens alheios contra a vontade do dono, o que conseguiu por meio de violência física, não se coibindo de actuar como actuou, e conformando-se com o resultado das suas condutas.
34p. O arguido DD e os referidos indivíduos levaram o ofendido DDDD contra a vontade deste, manietando-lhe os movimentos, mantendo-o assim na impossibilidade de ter domínio sobre e sua pessoa e privando-o da sua liberdade pessoal.
35p. O arguido DD, e os referidos indivíduos que se encontravam com ele, abandonaram a vítima depois de a terem agredido brutalmente, deixando-a sem assistência e com riscos para a sua saúde.
36p. O arguido DD agiu em comunhão de esforços e intentos com os demais, mediante plano prévio gizado pelo arguido separado CCCC, e fê-lo de forma voluntária, livre e consciente, sabendo proibidas e puníveis as suas condutas.
37p. O arguido GG foi entretanto detido em França, altura em que a arguida JJ ocupou o lugar do seu companheiro, e esta, por sua iniciativa ou mediante instruções daquele, combinava e decidia com o arguido AA as circunstâncias de tempo, modo e lugar em que podiam explorar o ganho do trabalho, como prostitutas, de mulheres oriundas de países do Leste Europeu, pois essa era uma das principais actividades que lhes permitiam enviar quantias em dinheiro para a Ucrânia.
38p. Neste contexto, o arguido AA (J....) controlava aquela actividade praticada no Algarve pelos membros do grupo, sendo nesta sequência recrutadas para a prostituição, entre outras, PPP, CCC, NNN e QQQ.
39p. Este recrutamento de mulheres para a prostituição era feito pelo arguido AA (J....) e por outras pessoas, competindo àquele e à sua mulher, a arguida AAA receber e acomodar essas mulheres, na sua residência ou noutras casas, colocando-as posteriormente em bares de alterne, ou angariando clientes através da publicação de anúncios no jornal.
40p. Uma vez a trabalhar nesses locais, as mulheres tinham de entregar ao arguido AA metade dos réditos numa primeira fase, em regra durante o primeiro ano, e depois começavam a pagar uma quantia fixa mensal sendo que, se o não fizessem, seriam molestadas física e psicologicamente.
41p. Por sua vez, o arguido AA (J....) entregava os proventos económicos obtidos com estas actividades à sua mulher, a arguida AAA a qual se encarregava de depositá-los, bem como de enviá-los para a Ucrânia, tendo esta arguida AAA perfeito conhecimento das actividades do marido AA (J....), nas quais colaborava.
42p. Em Portimão, os arguidos VV e FFF operavam também sob a coordenação do arguido AA (J....), cabendo-lhes a tarefa de extorquirem dinheiro às vítimas, intimidando-as para que não se subtraíssem a pagar as quantias em dinheiro que lhes eram exigidas.
43p. Preso, entretanto, em França o arguido GG, a companheira deste, que é a arguida JJ, assumiu naquela contingência a posição do companheiro na organização, zelando directamente pelos interesses de ambos, tanto assim que o arguido AA (J....) lhe entregava parte dos lucros obtidos nas referidas actividades.
44p. O arguido AA esteve ausente de Portugal no período compreendido entre 24 de Junho e 13 de Julho de 2005.
45p. Durante a sua ausência, a chefia do grupo foi assumida pelo arguido KK, que ficou também na posse do telemóvel daquele, sendo certo que o mesmo arguido KK tinha como função primordial auxiliar directamente o arguido AA e certificar-se da segurança pessoal dele.
46p. Neste período, o dito J.... dava instruções ao arguido KK e a um indivíduo identificado como S...a, cuja identidade não se logrou apurar em concreto, para que não facilitassem nas cobranças de quantias em dinheiro aos motoristas e às mulheres prostitutas.
47p. Aliás, o arguido AA deu também instruções precisas ao arguido KK para que apontasse em listas tudo o que recebia, sendo que este último entregava seguidamente à arguida AAA as quantias que recebia.
48p. Essas quantias monetárias, provenientes das actividades descritas, eram partilhadas com o arguido GG ou, desde a prisão deste em França, com a sua companheira e co-arguida JJ.
49p. O arguido AA (J....) utilizava habitualmente contactos telefónicos para coordenação das actividades do grupo.
50p. A arguida JJ possuía dois veículos automóveis em que se deslocava habitualmente, um deles Audi A4 Van, com matrícula francesa, e outro o Volkswagen Bora ..........
51p. A arguida JJ estava ao corrente do controlo e extorsão feita sobre motoristas de carrinhas, principalmente de matrícula ucraniana, que faziam o transporte de pessoas e mercadorias dos países do Leste Europeu para Portugal e vice-versa, bem como do controlo de raparigas oriundas do Leste Europeu que, no nosso País, eram obrigadas a prostituírem-se por conta e ordem dos membros deste grupo organizado.
52p. De facto, no dia 19 de Julho de 2005, telefonicamente, o arguido AA explicou à arguida JJ as contas referentes aos rendimentos obtidos com a exploração das mulheres na prostituição e com as quantias extorquidas aos motoristas das camionetas, referindo os montantes que ela iria receber, nos seguintes termos:
“J.....- Eu e tu precisamos de falar, encontramo-nos. Há duzentos euros para ti das raparigas. O que tu...”
“JJ - Escuta! Vem! A Ira fez mal as contas(...)”
”J.... - O que é que está mal?”
“JJ - Porque não está correcto. Lá não é em três partes”.
“J.... - É em quantas?”
“JJ - Não podem estas duas milenas ser para três partes! Porque uma não pertence.”
“J.....- Como é que não pertence?”
“JJ - Como? É assim!”
“J....- Espera aí! Lá... Sim! Lá, são o Iosia, o Vania e eu naquela ... na D.... ... e naquela o Vania, o V.... e eu”
“JJ - Então está certo. Mas saiu assim, que a Ira me deu três partes. Uma tua, uma do Vania e uma deste... Percebes?”
“J.....- De quem? do V....?”
“JJ - Não”.
53p. O arguido KK fazia-se transportar habitualmente na viatura Opel Calibra ..........
54p. O arguido VV (Vlad) fazia-se transportar habitualmente na viatura Renault 5 ........
55p. Por sua vez, a arguida KKK dava apoio aos arguidos AA (J....) e AAA sendo que também colocava mulheres nas casas, providenciando-lhes alojamento, e controlava-as e assegurava-se de que nada lhes faltasse para trabalharem como prostitutas, recebendo, como todos os membros do grupo, parte dos proventos dessa actividade.
56p. Para além da exploração do ganho de mulheres na prostituição e do tráfico de pessoas, quer para prostituição, quer para o trabalho clandestino em Portugal, os arguidos AA (J....) e GG extorquiam quantias em dinheiro a motoristas ucranianos, que transportavam mercadorias e passageiros da Ucrânia para Portugal e vice-versa.
57p. Depois da prisão do arguido GG em França, a sua companheira e co-arguida JJ recebia os proventos que lhes cabiam, conseguidos naquelas actividades.
58p. O arguido KK, e outros membros do grupo, auxiliavam directamente os arguidos AA (J....) e GG nessas actividades ilícitas e, em contrapartida, obtinham o respectivo lucro.
59p. Para o conseguirem, e sempre que isso se lhes mostrava exigível, os arguidos, e outros membros do grupo, propunham-se também ao uso da força para constrangerem e obrigarem as vítimas a pagarem-lhes quantias monetárias.
60p. A arguida AAA tinha também a responsabilidade de tratar da contabilidade do arguido AA (J....), bem como a responsabilidade de enviar dinheiro para a Ucrânia.
61p. Nos “classificados” do jornal diário “Correio da Manhã” eram publicados anúncios com números de telefone, oferecendo sexo, que as mulheres proporcionavam a troco de dinheiro, designadamente, na Av............., direito, em Portimão.
62p. O ......... era o número de telefone móvel utilizado pela vítima LLL, que chegou a controlar a vítima CCC por conta do arguido AA (J....) e dos demais.
63p. O arguido AA conduzia o veículo Peugeot Boxer azul com a matrícula ucraniana 00000000.
64p. UUU, cidadã ucraniana, referida como Leonarda ou L..., nome por que é conhecida, residente na Rua --------------------, em Albufeira, prostituía-se por conta e ordem do arguido AA e dos demais.
65p. No dia 16 de Julho de 2005, pelas 23.30 horas, o arguido AA saiu da sua residência, e conduziu o Peugeot Boxer em direcção à ‘Rotunda dos Globos’, em Albufeira.
66p. No dia 17 de Julho de 2005, pelas 00.05 horas, o arguido AA (J....) e a D.... encontraram-se na ‘Rotunda dos Globos’, em Albufeira.
67p. O arguido AA (J....) estacionou o veículo no parque de estacionamento, em frente ao café Estrela d........................., em Albufeira, e naquele entrou a referida D...., após o que o arguido levou o veículo que conduzia para um beco sem luz nas imediações.
68p. Nos dias 26 e 27 de Julho de 2005, o arguido AA marcou telefonicamente um encontro com a D.... e disse-lhe para preparar o dinheiro todo até esse dia, porque iria ter com ela.
69p. Com efeito, nesses dias, o arguido AA ligou duas vezes à D.... e combinou com ela o local desse encontro.
70p. Assim, no dia 27 de Julho de 2005, via telefónica, o arguido AA combinou com a D.... um encontro para acertarem as contas do dinheiro que esta fizera na prostituição por ordem e conta dele, como vinha acontecendo, entregando-lhe cinquenta por cento do dinheiro que assim obtinha, e porque para isso se sentia ameaçada de agressão física.
71p. No dia 27 de Julho de 2005, às 17.47 horas, a D.... telefonou ao arguido AA e disse-lhe que estava no referido café para lhe entregar dinheiro.
72p. No dia 27 de Julho de 2005, pelas 17.55 horas, o arguido AA estacionou em Portimão o veículo Peugeot que conduzia, dirigiu-se à ‘Pastelaria Internacional’, onde se encontrava a D...., e interpelou-a para entregar-lhe dinheiro.
73p. Ali, o arguido AA encontrou-se com a D...., de quem recebeu dinheiro proveniente da mesma actividade de prostituição que ela efectuava.
74p. Naquele dia, o arguido AA tinha contactado a arguida JJ, e tinha-lhe dito que ia encontrar-se com a D.... e que depois seguiria para Portimão, a fim de dividirem entre si esse dinheiro.
75p. Na verdade, o arguido AA dividiu aquele dinheiro depois com a arguida JJ, com quem se encontrou para o efeito, pois de seguida, o arguido AA e um certo Sanya carregaram o veículo Peugeot Boxer com alguns sacos e partiram na companhia da arguida JJ em direcção à estação de serviço ‘Cepsa’ (A-22, na direcção Albufeira - Espanha), onde, pelas 22.15 horas do dia 27 de Julho de 2005, se encontraram os três com o motorista “Y...”, que transportaria a arguida JJ para a Ucrânia, assim como os sacos supra referidos.
76p. No dia 12 de Agosto de 2005, o arguido AA encontrou-se novamente com a D.... (CCC) na ‘Pastelaria .............’ em Portimão, tendo ambos manuseado agendas ou cadernos pessoais e comparado o seu conteúdo, e tendo a D.... entregue dinheiro ao arguido.
77p. Nos encontros com a D...., o arguido AA encontrava-se por vezes acompanhado pelo arguido KK e por outros membros do grupo.
78p. Os arguidos agiram sempre em comunhão de esforços e intentos, propondo-se molestar, ameaçar e constranger por meio de violência as vítimas, e obrigá-las a prostituírem-se e darem-lhes o dinheiro assim obtido, actuando de forma livre, deliberada e consciente, sabendo as suas condutas proibidas e puníveis pela lei penal.
UUU
79p. A cidadã ucraniana UUU chegou a Portugal e começou a prostituir-se por conta e ordem do arguido AA, a quem entregava parte do dinheiro que ganhava naquela actividade, angariando, através de anúncios colocados em jornais, clientes com quem mantinha relações sexuais a troco de dinheiro.
80p. Esta UUU, ou L..., ou L.......da, prostituiu-se em instalações pertencentes à arguida KKK, juntamente com a vítima CCC, em Quarteira e em Albufeira.
81p. A vítima UUU pagava ao arguido AA, em meados de 2005, pelo menos 700 Euros mensais saídos da sua actividade como prostituta, o que fazia sabendo que a falta de pagamento a fazia incorrer em represálias, designadamente violência física.
PPP
82p. Em Dezembro de 2002, a cidadã ucraniana PPP viajou num mini-bus da Ucrânia com destino a Nápoles, Itália.
83p. Em viagem, numa estação de serviço em Milão, PPP foi recrutada pelo arguido AA para trabalhar como prostituta ou como acompanhante de homens em bares.
84p. PPP permaneceu em Portugal desde Dezembro de 2002, e o arguido AA recrutou-a para trabalhar como prostituta ou em bares de alterne, ficando ela a viver inicialmente na residência deste, nos Olhos d’Água, Albufeira.
85p. Como a ofendida PPP se recusou a prostituir-se, começou a trabalhar num bar de alterne denominado Espelho Mágico, onde trabalhou até Abril de 2005, perto de Boliqueime, exigindo-lhe o arguido, logo que ela começou a trabalhar, que entregasse sempre 50% do que ganhasse, o que variava entre 1.000 e 1.200 Euros mensais, sendo metade entregue ao arguido AA, a quem ainda pagava a quantia de cem euros mensais por viver na casa dele.
86p. Por início de 2004, PPP começou a pagar mensalmente a quantia de 600 Euros, exigida pelo arguido AA, o qual lhe ia dizendo, em tom sério, que “não o enganasse para não piorar a situação”.
87p. PPP cumpria as ordens do arguido AA e entregava-lhe mensalmente dinheiro proveniente dos ganhos que auferia no bar de alterne, por temer que este a molestasse fisicamente.
88p. No verão de 2003, PPP manifestou ao arguido AA o desejo de regressar à Ucrânia e comunicou-lho, tendo ele dito que tinha de continuar a pagar-lhe até Janeiro de 2005, além de que lhe disse “não vais para a Ucrânia”, pressionando-a a ficar em Portugal, conforme ficou.
89p. O arguido AA obrigou-a a trabalhar e a dar-lhe parte dos rendimentos que auferia, durante dois anos, com a promessa de que, findo esse período, teria “liberdade para fazer o que quisesse”, sendo certo que a vítima pagou mensalmente 600 Euros àquele arguido até Janeiro de 2005.
90p. Em data indeterminada de 2005, PPP conheceu HHH, com quem começou a namorar, passando a viver um com o outro, e tendo ela continuado a trabalhar no bar de alterne, Bianco Bar, em Portimão.
QQQ
91p. A cidadã ucraniana QQQ, ou Y...a, viajou num mini-bus com a amigaMMMM, em Maio de 2002, da Ucrânia com destino a Portugal.
92p. Chegada a Olhão, os arguidos AA e AAA esperavam QQQ, ofereceram-lhe alojamento na sua residência e prometeram arranjar-lhe emprego, e à sua amiga MMMM, num bar de alterne sito em Porches.
93p. Nesse bar, os arguidos AA e AAA eram porteiro e empregada de mesa, respectivamente.
94p. QQQ e Oksana faziam companhia aos homens e bebiam, auferindo entre 50 e 60 Euros diários.
95p. Desde então, QQQ entregava ao arguido AA metade do que ganhava no referido bar, bem como do que passou a ganhar no bar denominado ‘Chaminé’, sito em Poço Barreto, a pretexto de protecção que o mesmo nunca lhe prestou e aquela nunca necessitou.
96p. Em regra, QQQ auferia mensalmente entre 1.000 e 1.600 Euros, e durante cerca de um ano, no início de cada mês, entregou metade dessas quantias ao arguido, que habitualmente a contactava para as receber.
97p. Habitualmente, o arguido AA deslocava-se num veículo BMW de cor escura, e para locais previamente estabelecidos por ele, normalmente o McDonald’s de Albufeira, onde recebia o dinheiro.
98p. Até então, QQQ permanecia ilegal em Portugal, não tinha familiares, nem conhecia ou privava com conterrâneos seus, e temia pela sua sorte e integridade física, o que a levou a pagar as supras referidas quantias em dinheiro ao arguido AA, até por saber que outras mulheres também lhe pagavam idênticas quantias sem que a isso se conseguissem opor.
99p. Em 2003, o arguido AA (J....), continuando a exigir quantias em dinheiro a QQQ, decidiu que esta teria de entregar-lhe o montante mensal de 600 Euros, o que passou a acontecer durante cerca de mais um ano.
LLL
100p. A cidadã ucraniana LLL chegou a Portugal na primavera de 2003.
101p. Em data indeterminada, LLL conheceu o arguido AA em casa de uma amiga, no edifício......,...,...raia da Rocha, Portimão.
102p. Mais tarde, através de um amigo dela, os arguidos AA e GG propuseram a LLL que lhes pagasse mensalmente a quantia de 100 Euros em troca de protecção, uma vez quer LLL se prostituía com clientes a troco de dinheiro.
103p. LLL acabou por aceitar a protecção que aqueles arguidos lhe impuseram, e durante dois meses, no Verão de 2005, entregou 100 Euros mensais ao arguido AA.
104p. LLL, tal como, aliás, CCC (D....), pagava ao arguido AA por temer represálias contra a sua pessoa ou familiares seus.
105p. O arguido AA recebia dinheiro das mulheres prostitutas e repartia-o com os demais membros do grupo, nomeadamente com a arguida JJ relativamente à parte que caberia ao seu companheiro, o arguido GG detido em França.
106p. D.... e LLL prostituíam-se em apartamento arrendado pela arguida KKK, e atraíam clientes oferecendo os seus serviços através de um anúncio publicado nos “classificados” do jornal diário “Correio da Manhã”.
107p. LLL prostituía-se com clientes que a procuravam a troco de dinheiro e, por ordem do arguido AA, a D.... elaborava uma lista manuscrita do número de clientes atendidos e as quantias em dinheiro cobradas àqueles, e que devia entregar ao arguido.
108p. LLL cobrava 40 Euros por meia hora de sexo com cada cliente.
CCC (conhecida por D...)
109p. A cidadã ucraniana CCC chegou a Portugal no dia 27 de Fevereiro de 2005, depois de ter sido recrutada na Ucrânia para trabalhar como prostituta e ter viajado numa carrinha conduzida por um indivíduo de nome “Y.......”.
110p. CCC viajou para Portugal munida de passaporte e visto de turismo, mas já com o propósito de trabalhar como prostituta aqui, como previamente lhe determinara o arguido AA, que aliás estava à sua espera no destino.
111p. Quando viajou para Portugal, CCC sabia que tinha que pagar a viagem, pois que essa condição lhe foi imposta pelo mesmo arguido, o que fez em Março de 2005, pagando aos arguidos AA (J....) e GG (V...) cerca de 2.500 Euros.
112p. Nesse mesmo mês, após instalarem CCC no exercício da prostituição, os citados arguidos exigiram a entrega mensal de 50% dos proventos que assim obtinha, calculados sobre o que lhe restava depois de entregar à arguida KKK 40% do que ganhava.
113p. Para aquela actividade, era a arguida KKK quem, a solicitação dos mesmos arguidos e no âmbito das tarefas que lhe competiam no seio do grupo, pagava os anúncios de cariz sexual no jornal “Correio da Manhã”, bem como o alojamento de CCC e outras mulheres, e atendia as chamadas recebidas dos clientes, tendo em conta que as mulheres prostituídas não falavam ou entendiam a língua portuguesa, elaborando uma listagem de clientes e quantias realizadas por aquelas.
114p. Em data não concretamente apurada do ano de 2005, de modo a reiterar perante CCC a sua liderança e seriedade das ameaças com que a mantinha controlada, o arguido AA, em tom sério e voz alta, disse-lhe que se não trabalhasse bem podia ficar numa cadeira de rodas para a vida inteira, o que veio a reforçar os temores da vítima e a determinou a entregar-lhe as quantias exigidas mensalmente.
115p. CCC, ou D...., recebeu clientes e prostituiu-se utilizando apartamentos em Albufeira, Quarteira e Portimão, cuja renda mensal era paga pela arguida KKK.
116p. D.... cobrava 40 Euros por meia hora de sexo com cada cliente, e dos proventos que obtinha, depois de pagar 40% à arguida KKK, entregava metade ao arguido AA, uma ou duas vezes por semana, fazendo-o em locais, datas e horas previamente marcadas por este, no Algarve.
117p. Em média, CCC realizava nessa actividade, semanalmente, entre 300 e 800 Euros.
118p. D.... ou CCC mudava com regularidade entre casas, no Algarve, todas pagas pela arguida KKK.
119p. Aqueles pagamentos eram feitos mensalmente ao arguido AA e ao arguido GG, sendo que, quando este não estava em Portugal, e quando esteve detido, os pagamentos eram combinados e repartidos entre aquele primeiro arguido e a arguida JJ.
120p. Porém, CCC, a partir de data não concretamente apurada de 2005, passou a entregar ao arguido AA uma quantia fixa no montante de 1.050 Euros mensais.
121p. Todavia, durante os períodos de ausência do arguido AA, nomeadamente devido a deslocações deste à Ucrânia, CCC entregava o dinheiro, directamente, ao arguido KK, por ordem do primeiro arguido, o que aconteceu por duas vezes, em datas e locais não concretamente apurados do Algarve, em que, durante ausência do arguido AA, e cumprindo ordens deste, numa delas CCC entregou a quantia de 300 Euros ao dito arguido KK.
122p. CCC, ou D...., estava obrigada a pagar as quantias supra mencionadas ao arguido AA, durante dois anos, sendo que no início de Setembro de 2005 aquela quis regressar à Ucrânia, no que foi impedida por aquele arguido, que lhe disse que não podia sair e que iria falar com a arguida JJ.
123p. Na realidade, CCC não regressou à Ucrânia devido à oposição do arguido AA, que lhe perguntou se “queria o coração dela em cima de uma mesa”, e por temer represálias contra a sua pessoa ou contra familiares seus, que deixara no seu país de origem.
124p. No entanto, e como CCC persistia no propósito de regressar à Ucrânia, no início de Setembro de 2005, o arguido AA reduziu o valor mensal da sua exigência de 1.050 para 700 Euros, tendo-lhe sido dito que, se insistisse em ir-se embora, deveria entregar-lhe a quantia global de 2.000 Euros até 15 de Setembro de 2005, o que não sucedeu porque aquele arguido veio entretanto a ser detido.
125p. Desde a detenção de parte dos arguidos, CCC (D....) deixou de pagar quaisquer quantias, assim como deixou de ser molestada.
NNN ( conhecida por Lera)
126p. A cidadã russa NNN, ou Lera, chegou a Portugal em 2005 ou antes e passou a dedicar-se à prostituição juntamente com a vítima LLL, com a qual partilhou, para esse efeito, um apartamento em Portimão.
127p. Em data indeterminada, durante a ausência de ambas, um indivíduo desconhecido introduziu-se no seu apartamento e subtraiu uma quantia pertencente a NNN.
128p. – (O TR de Évora julgou não provada a mtéria que, sob este número, a 1ª instância considerara provada)
HHH
129p. No dia 20 de Agosto de 2005, no café ‘Serra da Estrela’, nas traseiras do McDonald’s de Albufeira, compareceram PPP, HHH, conhecido por ‘P.....’, e os arguidos VV e FFF.
130p. Os arguidos VV e FFF haviam procurado anteriormente HHH, de forma a constrangê-lo a entregar a quantia de 1.000 Euros.
131p. Assim, no dia 20 de Agosto de 2005, pelas 20.05 horas, o arguido AA (J....) chegou ao parque de estacionamento do McDonald’s conduzindo o veículo Peugeot Boxer, tendo em simultâneo chegado o veículo Rover ..-..-.., do qual saíram HHH e PPP.
132p. Estes dirigiram-se para o café ‘Serra da Estrela’ e sentaram-se a uma mesa.
133p. Pelas 20.11 horas, chegaram ao local também VV e FFF no veículo Renault ............, entraram no mesmo café e sentaram-se na mesa onde estavam os outros três.
134p. O arguido AA exigiu então a HHH que lhe fizesse o pagamento de 1.000 Euros pelo facto de ser namorado de PPP, e para que assim se mantivesse, quantia que o ofendido lhe entregou contra a sua vontade e à custa do seu património e da namorada, que contribuiu para o efeito.
135p. Os arguidos VV, FFF e AA, mediante plano prévio deste e actuando em comunhão de esforços e intentos, actuando com intenção de conseguirem para si e para o grupo lucro económico, constrangeram psicologicamente o ofendido HHH a entregar-lhes dinheiro contra a sua vontade e com o correspondente prejuízo.
136p. Acresce que aqueles arguidos AA, VV e FFF actuaram como membros do mesmo grupo organizado, fazendo dessa actividade meio de vida e actuando em concertação de vontades e esforços, não se coibindo de o fazer como fizeram, e conformaram-se com o resultado das suas condutas.
137p. Os arguidos agiram voluntária, livre e conscientemente, bem sabendo proibidas e puníveis as suas condutas por lei.
AAAA
138p. AAAA, cidadão ucraniano, conhecido por UUUU, era proprietário de uma carrinha da marca Mercedes, matrícula ucraniana -------------, e exercia, como outros indivíduos, a actividade de transporte de pessoas e mercadorias entre a Ucrânia e Portugal, e vice-versa, por conta própria e independente.
139p. A maior parte dos cidadãos ucranianos que são transportados nessas condições têm como destino Portugal, Espanha ou Itália.
140p. AAAA, em regra, transportava entre quatro a seis passageiros por cada viagem de ida ou de volta.
141p. Quer AAAA, quer os demais condutores de veículos de transportes a trabalhar nas mesmas condições, efectuavam em média duas viagens mensais a Portugal, no princípio e no meio de cada mês.
142p. O dito AAAA iniciou aquela actividade por Novembro de 2003, até que, em certa ocasião, os arguidos AA e GG, acompanhados de outras pessoas, o abordaram na auto-estrada, perto de Vila Real de Santo António, logo lhe exigindo o pagamento de 200 Euros, que este AAAA pagou na primeira área de serviço, ou de descanso.
143p. O referido AAAA sabia que outros condutores de carrinhas de transporte pagavam a redes organizadas, no caso a do arguido AA, e acedeu assim a fazer o pagamento de uma quantia fixa por cada viagem que efectuasse, evitando assim que os clientes fossem agredidos, e como tal se lhes frustrasse o negócio de transporte.
144p. Por cada viagem que realizava, AAAA começou a pagar a quantia de 200 Euros aos arguidos AA e GG, os quais conhece e tratou sempre pelos nomes de “J.....” e “V...”, respectivamente.
145p. O arguido AA utilizava o número de telemóvel ......... nas comunicações, designadamente com os motoristas de transportes.
146p. Algumas vezes, AAAA contactava o arguido AA através do seu telemóvel ----------- e combinavam encontro na Av. ---------, ao lado oposto ao bar Cadillac, em Quarteira, para as entregas de dinheiro.
147p. Em cumprimento daquele acordo, e sempre que chegava a Portugal, AAAA telefonava para o arguido AA, a fim de combinar o local e modo como seriam pagas as quantias.
148p. O pagamento era feito ao arguido AA (J....) ou ao arguido GG (V...), os quais se faziam transportar para esse efeito num veículo BMW 520 de cor cinzenta e matrícula estrangeira.
149p. O arguido AA também utilizava o telemóvel ................ nos contactos com outros motoristas.
150p. Foi assim que, à semelhança do que fizera em viagens anteriores, no dia 17 de Julho de 2005, um domingo, cerca das 14.00 horas, AAAA concluía o transporte de três passageiros para Portugal, quando seguia para Portimão, e recebeu uma chamada no seu telemóvel do arguido AA que, em tom exaltado, lhe perguntou porque razão não lhe ligara já antes.
151p. Receava o arguido AA que AAAA não lhe fizesse a entrega do dinheiro, mas este tranquilizou-o, dizendo-lhe que sabia que tinha de lhe pagar e que lhe ligaria assim que pudesse.
152p. Nesse mesmo dia, o arguido AA, cerca das 21.15 horas, abordou a carrinha de AAAA na estação de serviço de Silves (A-22), no sentido Portimão - Faro.
153p. Assim, o ofendido AAAA entregou a quantia de 400 Euros em dinheiro directamente ao arguido AA, ou seja, o valor de 200 Euros por cada uma das carrinhas de transporte, a sua que chegava nesse dia 17 de Julho de 2005, e a de RRR, irmão do ofendido AAAA, que chegara já no dia 15 de Julho de 2005, 6ª feira.
154p. O arguido AA fazia-se transportar nesse dia no veículo Peugeot Boxer azul, de matrícula ucraniana ..........
155p. A partir do momento em que AAAA e RRR, bem como diversos outros motoristas nas mesmas situações, começaram a pagar quantias fixas ao arguido AA, deixaram de ter problemas durante o trajecto e nunca mais foram abordados por quaisquer indivíduos ao longo da viagem da Ucrânia e com destino ao nosso país.
156p. Os motoristas das carrinhas de transportes aceitaram efectuar os pagamentos aos arguidos GG (V...) e AA (J....), por temerem ser molestados nas suas pessoas e bens, nomeadamente por temerem que algum mal viesse a suceder-lhes, ou às carrinhas, ou aos passageiros que transportavam, uma vez que haviam sido ameaçados anteriormente e tinham podido constatar a seriedade dessas ameaças.
157p. Aliás, temiam também que fosse feito algum mal às suas próprias famílias em Portugal ou na Ucrânia, uma vez que lhes havia sido dito pelos arguidos que assim aconteceria caso não pagassem.
158p. Os arguidos DD (M... Co......), JJ (JJ), KK, EE, AAA KKK, II, VV e FFF, liderados pelos arguidos AA (J....) e GG (V...) e também pelo arguido separado CCCC (V....), pertenciam a um grupo hierarquicamente organizado que, mediante encontro de vontades e propósitos, se dedicavam à prática das actividades ilícitas descritas, de controlo e constrangimento das vítimas imigrantes de leste e motoristas de carrinhas de transporte, por forma a obrigá-las a entregar-lhes dinheiro contra a sua vontade, com regularidade e de forma duradoura, dividindo as tarefas, que se encontravam bem definidas pela estratégia de actuação, pelo menos, dos arguidos GG e AA, ou só deste na ausência do primeiro.
159p. Além disso, de forma a colocar na prostituição e melhor controlar as jovens mulheres imigrantes ilegais, os arguidos AA e AAA contavam com o apoio e colaboração para tal da arguida KKK, cabendo-lhe colocar mulheres nas casas onde se prostituíam, controlando-as e assegurando-se de que trabalhavam, a fim de entregarem à organização o dinheiro assim obtido.
160p. À semelhança dos demais, também os arguidos KK, VV e FFF, mas sobretudo o primeiro, colaboravam com o arguido AA, cumprindo ordens e instruções deste, fazendo-lhe umas vezes segurança pessoal, outras vezes controlando e auxiliando a constranger as vítimas, prostitutas e motoristas das carrinhas de transporte, por forma a obrigá-los a fazerem as entregas de dinheiro que aquele havia determinado, o que estes faziam contra vontade.
161p. Todos os arguidos sabiam que as actividades do grupo, a forma como agiam no fomento da imigração ilegal e do tráfico de mulheres para a prostituição, e na obtenção de lucro ilícito à custa do património, segurança e saúde delas e dos motoristas, lesavam direitos pessoais das vítimas e sociais da comunidade envolvente, fundamentais para o desenvolvimento e realização de ambos, mas não se coibiam de actuar como actuaram, de modo reiterado e em comunhão de esforços, e conformaram-se com os resultados dos seus comportamentos que quiseram e conseguiram realizar, agindo todos de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo proibidas e puníveis por lei as suas condutas.
ZZZ
162p. O cidadão ucraniano ZZZ (Y.......) vive na Ucrânia, e desloca-se a Portugal desde os finais de 2004, como condutor de veículos de transporte de pessoas e mercadorias.
163p. Em média, ZZZ efectua duas viagens mensais e cobra entre 110 e 130 Euros a cada passageiro, incluindo a bagagem respectiva, utilizando para esse efeito a carrinha Mercedes Sprinter ..........., de cor branca, com a capacidade máxima de 8 pessoas.
164p. Em finais de 2004 ou início de 2005, o arguido AA contactou-o e exigiu-lhe o pagamento de 200 Euros por cada viagem Ucrânia-Portugal-Ucrânia, a pretexto de “lhe evitar problemas”.
165p. A partir de então, o arguido AA exigiu-lhe e recebeu dele quantias em dinheiro entre 150 e 250 Euros, que ZZZ lhe pagava por cada uma das viagens que efectuava, duas por mês em média.
166p. O ofendido entregava as referidas quantias ao arguido AA (J....), algumas vezes acompanhado pelo arguido GG (V...), e que, como sempre faziam com as restantes vítimas, procuravam realizar os encontros sempre em locais públicos.
167p. Os locais e as datas dos encontros eram indicados pelo arguido AA ou pelo arguido GG que, através de telemóvel, contactavam ZZZ, que não deixava de comparecer e de pagar-lhes as quantias exigidas por cada viagem feita.
168p. Na ausência do arguido AA, ZZZ pagava ao arguido KK, por ordem do arguido AA, que marcava o local e a hora do encontro.
169p. ZZZ não recebia qualquer protecção ou serviços de segurança em contrapartida, mas nunca questionou os arguidos AA, GG ou KK sobre o assunto, uma vez que temia represálias destes e sabia que lhes deveria pagar para poder continuar a actividade de transporte entre a Ucrânia e Portugal.
170p. O ofendido ZZZ é um dos condutores que, à semelhança de AAAA, procedia ao transporte de pessoas e mercadorias entre Portugal e a Ucrânia.
171p. Tal como os restantes motoristas, o ofendido ZZZ acedia a fazer os pagamentos, por recear que, caso não os fizesse, corresse riscos na sua integridade física ou na dos seus familiares, assim como receava que pudessem destruir a sua viatura, uma vez que era o seu meio de subsistência.
172p. No dia 27 de Julho de 2005, o arguido AA encontrou-se novamente com ZZZ na estação de serviço ‘Cepsa’, em Olhão (A-22), ficando ambos a conversar no interior do veículo Peugeot Boxer...............
173p. A certo momento, ZZZ saiu desse veículo, tendo a ele regressado momentos após com a carteira na mão, donde retirou dinheiro que entregou ao arguido AA, e que este lhe havia exigido sob a latente ameaça de violência física.
XXX e RRR
174p. O cidadão ucraniano XXX entrou em Portugal em 18 de Abril de 2002 e, durante cerca de dois anos, trabalhou no Algarve, em Lagos, em diversas obras da construção civil.
175p. XXX legalizou-se aqui (AP nº 00000000), e em Março ou Abril de 2003 começou a transportar pessoas e mercadorias da Ucrânia para Portugal e vice-versa, inicialmente de dois em dois meses, e depois uma vez por mês.
176p. Para o efeito, XXX comprou a carrinha Mercedes Sprinter com a matrícula ucraniana 000000000, fazendo em regra o transporte de três ou seis pessoas por viagem e ainda de objectos, cujo transporte lhe era solicitado.
177p. Habitualmente, XXX cobrava entre 100 e 120 Euros por pessoa, incluindo as respectivas bagagens, e cobrava por cada saco ou mala apenas 5 Euros.
178p. Desde Julho ou Agosto de 2003 até data não apurada, XXX foi abordado por diversas vezes por pessoas que lhe exigiam dinheiro em Espanha e Portugal, mas nada pagou, até que por aquela data, quando se dirigia a um posto de lavagem de carros em Portimão, foi molestado por indivíduos cuja identidade se não apurou, que o manietaram, meteram dentro da viatura e levaram para Ayamonte, Espanha, onde permaneceu fechado numa casa, durante três dias, sendo repetidamente agredido, até fornecer o número de telefone de seu pai na Ucrânia.
179p. A fim de voltar a ver o filho e para reaver a carrinha Mercedes, RRR, pai de XXX, viu-se obrigado a pagar a quantia de 5.000 Euros aos sequestradores.
180p., 181p, 184p e 185p – Passaram a factos não provados, pelo Acórdão da Relação de Évora.
182p.Com efeito, decorridos dois dias, o arguido AA recebeu a quantia de 3.500 Euros do pai do ofendido já em Portugal, e libertou XXX na estação de comboios de Vila Real de Santo António.
183p. Depois disso, o arguido AA dirigiu-se a Lisboa, na companhia do pai de XXX, e devolveu-lhe a carrinha Mercedes, propriedade deste.
186p. O arguido AA actuou sempre de forma voluntária, livre e consciente, bem sabendo proibidas e puníveis por lei aquelas condutas.
187p. A partir de Agosto de 2003, o arguido AA sugeriu ao ofendido XXX que lhe pagasse para receber protecção, e forneceu-lhe o número do seu telemóvel, o que este último passou a fazer, para não ter mais dissabores.
188p. O arguido AA procedeu da mesma forma com outros ofendidos, também motoristas.
189p. Para evitar ser molestado pelos indivíduos que o abordavam, XXX fornecia-lhes o número de telemóvel do arguido AA, tendo começado a pagar 100 Euros por viagem a este arguido, e no primeiro trimestre de 2005 passou a pagar-lhe 200 Euros por cada viagem Ucrânia-Portugal-Ucrânia, à semelhança de outros condutores, que efectuavam idênticos transportes e pagavam idênticas quantias ao mesmo arguido.
190p. Os referidos pagamentos eram feitos por XXX e por outros directamente ao arguido AA que, via telefónica, os procurava e combinava encontros em Portimão ou Albufeira com o propósito de receber aquelas quantias, sendo que, durante oito meses, aqueles lhe pagaram para não serem molestados nas suas pessoas ou bens.
191p. Nos encontros supra descritos, o arguido AA apareceu acompanhado pelo arguido KK, pelo indivíduo referido como S....., ou pelos dois.
192p. No dia 15 de Julho de 2005, após ter estado ausente, o arguido AA telefonou a XXX, tendo-lhe perguntado se havia pago tudo correctamente na sua ausência.
HH
193p. No dia 28 de Julho de 2005, o arguido AA ligou para o motorista HH(V... e repreendeu-o por se estar a eximir aos pagamentos, pois não entregara o pagamento devido ao arguido KK, encarregue de o ir buscar.
194p. A falta de pagamento por parte dos condutores na ausência do arguido AA já havia sido motivo de conversa entre este e a arguida JJ (JJ).
195p. Em dia indeterminado de Julho de 2005, após telefonema do arguido AA a dizer-lhe que tinha de “pagar a outro gajo”, o ofendido HH dirigiu-se ao McDonald's de Albufeira, como o arguido AA lhe havia dito para fazer, e aí se encontrou com o arguido KK, ao qual entregou quantia não inferior a 150 Euros em dinheiro.
196p. O ofendido HH é um dos motoristas que estavam sob o domínio da rede criminosa controlada também pelo arguido AA, sendo que, desde 2004, aquele se dedica ao transporte de passageiros e mercadorias de Portugal para a Ucrânia, e vice-versa, uma a duas vezes por mês.
197p. Iniciada a sua actividade, o ofendido I.... foi interpelado pelo arguido AA, que o advertiu de que devia pagar cerca de 140 Euros por cada viagem que efectuasse.
198p. O ofendido HH sempre pagou as quantias exigidas, por temer pela sua segurança e da sua família, assim como receava que os arguidos destruíssem os seus bens, nomeadamente a sua carrinha, que era o seu sustento.
199p. Assim, até 25 de Setembro de 2005, o ofendido HH pagou, na totalidade, não menos de 1.000 Euros ao arguido AA, para poder continuar a fazer transportes de passageiros e mercadorias da Ucrânia para Portugal.
200p. Até à data da detenção dos arguidos, o ofendido HH pagou pontualmente as quantias que eram exigidas, a última das quais ocorreu em meados de Setembro de 2005, no McDonald's de Albufeira, onde entregou 140 Euros ao arguido AA.
201p. Através das condutas supra descritas, os arguidos AA (J....), GG (V...), KK, VV e FFF actuaram com a intenção de conseguirem para si e para o grupo organizado enriquecimento ilegítimo, constrangendo os motoristas a entregarem-lhes somas de dinheiro, por meio de violência psicológica e ameaça à vida e integridade física deles e das suas famílias, e ameaça aos seus bens patrimoniais, o que conseguiram.
202p. Justamente com esse propósito, actuavam em parcerias ou agrupados, umas vezes os arguidos AA (J....) e GG (V...), e outras vezes os arguidos AA (J....) e KK como dupla, ou os arguidos AA (J....), VV e FFF.
203p. Aliás, o lucro ilícito obtido com a exigência reiterada e persistente aos motoristas era repartido pelos membros do grupo, fazendo-se essa repartição em moldes não apurados.
204p. Os arguidos AA (J....), GG (V...), JJ, KK, VV e FFF actuaram de forma concertada, mediante plano prévio e em conjugação de esforços, com o intuito de obterem lucro ilícito, como obtiveram, e não se coibiram de actuar como actuaram, e conformaram-se com o resultado das suas condutas ou com as condutas dos seus co-arguidos.
205p. Os arguidos GG e JJ, enquanto aquele esteve preso, tinham conhecimento do modo de actuação e das actividades dos demais membros do grupo, que os colocavam ao corrente das exacções feitas aos motoristas de transportes e do controle a que eram submetidos ao longo do percurso entre a Ucrânia e Portugal ou vice-versa, bem como da obrigação imposta a estes de pagarem quantias em dinheiro logo que entrassem no nosso país.
206p. Com a sua parte nesse lucro ilícito, o arguido GG comprava automóveis usados no estrangeiro - entre outros, a viatura Volkswagen Bora cinzenta 31-10-ZZ - os quais importava e legalizava em Portugal, onde eram vendidos a quem os quisesse comprar, tornando o seu dinheiro, aparentemente, obtido de forma lícita.
207p. Após a reclusão do arguido GG em França, a arguida JJ assumiu a posição daquele no grupo organizado e, além de participar nos actos e condutas supra descritas, também diligenciou pela venda dos sobreditos automóveis a pessoas que os quisessem comprar, em Portugal e, desse modo, obteve lucro proveniente dessa actividade, que ela e o companheiro usaram em proveito de ambos, enviando parte para a Ucrânia, através de transferência bancária.
208p. Ao actuarem pela forma descrita, os arguidos AA (J....), GG (V...), JJ, KK, VV e FFF fizeram-no em comunhão de esforços e intentos, reiteradamente ao longo do tempo e de modo voluntário, livre e consciente, sabendo proibidas e puníveis as suas condutas por lei.
209p. Vieram a ser detidos os arguidos AA (ou J....), KK (que se identificou na altura da detenção como NN), AAA JJ (JJ), VV, DD (M...), EE, II e FFF, e para o efeito foram executados mandados de busca a veículos e residências desses indivíduos.
210p. Assim, no dia 25 de Setembro de 2005, pelas 07.40 horas, foi efectuada busca à residência do arguido AA, sita na Rua J............... 4, rés-do-chão, em Albufeira, na qual foram apreendidos objectos, documentos e dinheiro, entre os quais:
- Cartão de segurança referente ao telefone da operadora móvel TMN com o nº ..................
- Telemóvel Motorola V620, com cartão na............... pertença da arguida AAA;
- Haste de guia e mola recuperadora, ou seja, peças de uma arma de fogo;
- Um bastão extensível metálico, com 17,5 cms fechado, e 32 cms, em extensão;
- Documento comprovativo de depósito bancário no BPI, conta nº ......................, no valor de 500 Euros, a favor do arguido AA;
- Um envelope contendo 1.520 Euros;
- Dois pedaços de papel quadriculado, tamanho A6, nos quais se encontra o nome de “DIANNA” em cabeçalho e datas de 18 de Julho a 13 de Agosto, com registo de números e somas de dinheiro;
- Aviso de lançamento em conta bancária no valor de 15.373 Euros da conta do BPI nº 000000000000000, de que é titular a arguida AAA para a Ucrânia, sendo beneficiária RRRR;
- Diversos artigos, em ouro e pedras, preciosas, bem como relógios e jóias, avaliados no total de 3.356 Euros.
- Falsificações grosseiras de cartas de condução ucranianas;
- Dois talões referentes a transferências internacionais de dinheiro de Portugal para a Ucrânia pela ‘Western Union’, remetidos por MMMM, tendo como destinatários VI.....e O...K...., respectivamente nos valores de 760 e 415 Euros;
- Três talões referentes a transferências internacionais de dinheiro de Portugal para Ucrânia pela ‘Westem Union’, remetidos pela arguida AAA tendo como destinatários NNNN no valor de 400 Euros, OOOOno valor de 2.000,00 e CC no valor de 246000$00;
- Cópia de talão de transferência internacional de dinheiro de Portugal para a Ucrânia pela ‘Western Union’, remetido pela arguida AAA tendo como beneficiária BBB no valor de 177,50 Euros;
- Cópia de talão de transferência internacional de dinheiro de Portugal para a Ucrânia pela ‘Western Union’, remetido pela arguida AAA tendo como beneficiário PPPP, no montante de 105 Euros;
- Cópia de talão de transferência internacional de dinheiro de Portugal para a Ucrânia pela ‘Western Union’, remetido pela arguida AAA tendo como beneficiária CC, no valor de 302.000$00;
- Cópia de talão de transferência internacional de dinheiro de Portugal para a Ucrânia pela ‘Western Union’, remetido pela arguida AAA tendo como beneficiária QQQQ, no valor de 273,50 Euros.
211p. Na mesma residência, e no quarto da arguida AAA foram apreendidos documentos e objectos, entre os quais:
- A quantia de 6.000 Euros em notas;
- Seis renovações de contas a prazo referentes à conta com o nº 00000000 e à conta com o nº 000000000, em nome da arguida AAA do Banco Atlântico;
- Três extractos combinados do Banco Atlântico referentes à conta 000000000, de que é titular AAA;
- Dezasseis extractos integrados trimestrais referentes a depósitos e aplicações da arguida AAA do banco BPI;
- Treze renovações de contas a prazo referentes à conta com o nº 0000000000 e à conta com o nº 00000000000, em nome da arguida AAA do banco Millenium BCP;
- Quatro extractos combinados do Banco Millenium BCP, referentes à conta 00000000000, de que é titular a arguida AAA;
- Cinco avisos de lançamento efectuados pela arguida AAA sendo beneficiária RRRR na Ucrânia, efectuados da conta bancária nº 0000000000do Banco BPI, nos montantes de 3.006,10 Euros em 17 de Junho de 2005, 10.000 Euros em 2 de Maio de 2005, 1.028,60 Euros em 6 de Julho de 2004, 1.000 Euros em 7 de Maio de 2004, e 3.528,60 Euros em 7 de Janeiro de 2004 e ainda sete extractos de emissão de ordem de pagamento para o estrangeiro, figurando como remetente a arguida AAA e como beneficiária RRRR, nos montantes de 15.373 Euros em 20 de Setembro de 2005, 2.977,50 Euros em 16 de Junho de 2005, 10.000 Euros em 29 de Abril de 2005, 1.000 Euros em 2 de Julho de 2004, 3.500 Euros em 6 de Janeiro de 2004, e 1.000 Euros em 6 de Maio de 2004, totalizando a quantia de 52.413,80 Euros enviados a RRRR, dinheiro esse proveniente das provadas actividades dos arguidos AA e AAA;
- Dois extractos do Banco BPI, via Internet, referentes à arguida AAA;
- Uma matraca de metal.
212p. No quarto do arguido AA foi apreendido o seguinte:
- Talão de depósito de valores e numerário em nome do arguido AA, no montante de 450 Euros, datado de 14 de Janeiro de 2003, na conta nº .................. do Banco Atlântico;
- Um cartão de segurança da TMN relativo ao telemóvel com o nº ....................
213p. No mesmo dia 25 de Setembro de 2005, pelas 14.00 horas, foi apreendido o veículo automóvel Peugeot Boxer ..........., propriedade do arguido AA, o qual foi adquirido por este com o lucro que lhe advém das actividades ilícitas que desenvolve, relacionadas com extorsões e exploração da prostituição.
214p. Feita revista ao interior desse veículo, e na posse do arguido AA (J....), foram apreendidos objectos, documentos e dinheiro, entre eles:
- Imitação de carta de condução ucraniana com o nº .............emitida a favor do arguido AA;
- Imitação de carta de condução ucraniana, rasgada em três partes, com a fotografia do arguido AA, com o nº 1........;
- Cópia de carta de condução ucraniana nº .............. emitida a favor do arguido AA;
- Carta de condução ucraniana nº ............. emitida a favor de V.Vanchenko;
- Cartão para registo de infracções ao código da estrada ucraniano, em nome de Vladimir Vanchenko, com o nº 00000000;
- Cartão de segurança TMN referente ao telemóvel com o nº 00000000
- Caixa de madeira com tampo e fundo em pele sintética de cor castanha, com fecho de mola e cantos de metal dourado, contendo:
- relógio prateado e dourado com mostrador branco e bracelete metálica e pele, de marca Quemex;
- um anel de senhora de metal dourado e prateado com dezanove pedras incrustadas de cor branca;
- crucifixo de metal dourado tipo pingente com dimensões aproximadas de 5x3,5cm com inscrições no verso;
- uma pulseira de metal dourado com aproximadamente 20 cm, com medalha de metal dourado com motivo da Rainha Elisabete II de Inglaterra e São Jorge no verso;
- conjunto de dois brincos de metal dourado e três pedras incrustadas de cor branca;
- um relógio de senhora de metal prateado, com bracelete metálica prateada, de marca Unitas, com o mostrador rachado e com o número 2714 inscrito no verso;
- Cartão de segurança referente ao cartão da TMN com o n° 000000000;
- Cartão de segurança referente ao cartão da TMN com o nº 000000000
- Cartão de segurança referente ao cartão da TMN com o nº 000000000;
- Cartão de segurança referente ao cartão Optimus com o nº 000000000000;
- Cartão SIM da OPTIMUS com o nº00000000
- Aviso de lançamento em conta bancária do valor de 15.373 Euros na conta do BPI nº 000000000000, de que é titular a arguida AAA para a Ucrânia, tendo como beneficiária RRRR;
- Bolsa de cor verde com motivo camuflado militar, contendo uma navalha de marca Wolf com o cabo de cor marfim e relevo, com lâmina de 7 cm;
- Uma navalha com lâmina de 7 cm, marca Rostfrei, com cabo em madeira e metal dourado;
- TFT LCD COLOR ..........com controlo remoto;
- Relógio com pulseira metálica prateada, mostrador dourado, de marca Rolex modelo Explorer II;
- Um telemóvel de marca Motorola V620, com o IMEI 00000000000, com o cartão TMN nº 000000000 a que corresponde o número de telemóvel 00000000;
- Bolsa azul e preta de marca Werlisa Sport, contendo máquina fotográfica Kodak modelo KB22, de 35 mm, na qual se encontra inserido rolo fotográfico marca Fuji, com 11 fotografias tiradas;
- Uma carteira de marca Escos em pele, de cor castanha;
- Três notas de vinte grivna cada;
- Uma nota de dois grivna, uma nota de cinco grivna e uma nota de um grivna;
- Uma nota de dez zloty;
- Um envelope rasgado enviado pelo banco BPI ao arguido AA, referente ao envio de código de cartão, papel com o código do cartão Visa do banco BPI com o nº 00000000 e um cartão plástico Multibanco Visa Electron do banco BPI com o nº 000000000;
- Um documento tipo carta de condução internacional emitido em nome do arguido AA.
Esta matéria foi modificada, em parte, pela Relação de Évora, nos termos seguintes:
“Não se encontra provado que os objectos em ouro e pedras preciosas descritos sob o nº 214p (igualmente referidos sob o nº 210p), a TV, telemóveis, máquina fotográfica, carteira, bolsa, bem como o veículo automóvel “Peugeot Boxer ...........” referido sob o nº 213p, aprendidos aos arguidos AA e AAA, constituem produto ou proventos das actividades ilícitas que aqueles arguidos vinham exercendo, em grupo organizado e de forma reiterada e organizada”.
215p. À arguida AAA foram apreendidos documentos, objectos e dinheiro, entre os quais:
- Um documento oficial emitido pelas autoridades ucranianas relativo ao veículo automóvel Peugeot Boxer, com a matrícula ........... e
- Uma nota de 500 Euros, duas notas de 200 Euros, nove notas de 100 Euros, cinquenta e oito notas de 50 Euros, cinquenta e seis notas de 20 Euros, quinze notas de 10 Euros e seis notas de 5 Euros, perfazendo o total de 6.000 Euros.
216p. Na busca realizada à Casa Alpouvar, vivenda com caixa postal nº 156, letra Z, 8200 Albufeira, habitada pelo arguido KK, foram apreendidos documentos, objectos e dinheiro, entre os quais:
- Um passaporte lituano n° ..............em nome de NN;
- Um euro ‘traveller’ cheque no valor de 50 Euros;
- Um ‘kit’ Vodafone do telefone ...........;
- Uma máquina fotográfica, marca Praktica, modelo Zoam 700 AF;
- Uma máquina fotográfica digital Fujifilm, modelo S3000;
- Uma máquina de choques eléctricos, marca Ckat-I;
- Um bastão táctico em ferro;
- Um objecto metálico, tipo soqueira perfurante, constituído por adaptador de chave de raquete, acoplado a uma haste em aço afiada na extremidade;
- Uma navalha de ponta e mola;
- Um canivete suíço;
- Um par de luvas de boxe, marca MA;
- Agenda com números de telefone de inúmeras pessoas, agora testemunhas neste processo;
- Um telemóvel Nokia, modelo 3310, com cartão SIM TMN nº 0000000 e
- Um telemóvel Nokia 7250i, com o cartão SIM TMN 000000000 telemóvel pertença deste arguido KK.
217p. No dia 25 de Setembro de 2005, pelas 09.00 horas, foi apreendido e revistado o veículo automóvel Opel Calibra ........., propriedade do arguido KK, no interior do qual foram apreendidos documentos e objectos, entre os quais:
- Uma bolsa de cor preta, contendo uma máquina fotográfica, marca Braun Photo Technik, modelo Handy BF, com rolo fotográfico no interior;
- Uma guia de depósito em numerário do Banco BPI, em nome da arguida JJ, no valor de 300 Euros;
- Uma nota de 50 Euros, três notas de 20 Euros e uma nota de 10 Euros, perfazendo a quantia de 120 Euros;
- Uma carta de condução lituana nº J0000000e
- Um título de registo de propriedade nº 00000000.
218p. Aquando da realização da referida busca e detenção, o arguido KK identificou-se com o passaporte lituano n° 00000000, emitido em 14 de Agosto de 2004, como sendo o titular do mesmo, dizendo chamar-se NN, natural de Kedainiv R. Sav., Lituânia, cidadão lituano, nascido a 18-11-1983, solteiro, e não quis fornecer a sua filiação.
219p. Também no dia 25 de Setembro de 2005, pelas 13.30 horas, na residência e no veículo do arguido VV foram apreendidos documentos, dinheiro e objectos, entre os quais:
- Um documento de identificação russo, emitido ao arguido VV, com fotografia e com o número 00000000, com 20 páginas;
- Passaporte russo, com o nº 00000000000, emitido ao arguido VV, com a página biográfica solta, no qual se encontra aposto um carimbo com indicação de anulado, e com um corte ao nível da página 16, de onde foi extraído o número de série;
- Uma nota com o valor nominal de um dólar americano, seis notas com o valor nominal de dez rublos e uma nota com o valor nominal de cem rublos;
- Um caderno, onde estão manuscritos diversos contactos telefónicos referentes a indivíduos que constam deste processo;
- Um telemóvel Samsung ..........., com o IMEI 000000000000 e o número de série 000000000000, no qual se encontra inserido o cartão da operadora TMN com o nº 0000000000;
- Um telemóvel Samsung .........., com o IMEI 0000000000e o número de série 00000000000, no qual se encontra inserido o cartão da operadora TMN com o nº 000000000000000;
- Um telemóvel Siemens MC-60, com o IMEI 0000000000 251 e a referência 0000000000000, no qual se encontra inserido o cartão da operadora TMN com o nº 00000000000;
- Fragmento de madeira (pau) com cerca de 78,5 cm de comprimento e com um prego numa das extremidades;
- Ferro extensível em metal com pega em borracha e chave acoplada de 17-19 mm.
220p. À arguida JJ foram apreendidos documentos, dinheiro e objectos que detinha na habitação objecto de busca, na Rua 2............ apartamento .., Quinta do Bispo, em Portimão, entre eles:
- Um cartão de segurança da operadora móvel TMN referente ao número de telefone 0000000000;
- Cartão de telemóvel da operadora Vodafone com o número SIM ...........;
- Cartão Multibanco do Banco BPI nº 000000000000 em nome da arguida JJ;
- Cartão Multibanco do Banco BPI nº 000000000000 em nome do arguido GG;
- Talão de depósito do Banco BPI, de 1.200 Euros, cujo beneficiário é a arguida JJ;
- A quantia de 1.315 Euros em notas;
- Uma nota com o valor nominal de um dólar americano, uma nota com o valor nominal de dois grivna e uma nota com o valor nominal de um grivna;
- Declaração aduaneira de veículo referente ao veículo usado de matrícula ..............e cujo adquirente é o arguido GG;
- Um telemóvel NOKIA 7250i, com o IMEI ................., onde se encontra inserido o cartão SIM com a inscrição SIMSIM nº ...............;
- Um telemóvel NOKIA 6170, com o IMEI ................, onde se encontra inserido o cartão SIM da operadora móvel TMN com o nº ..............., pertença da arguida JJ;
- Um envelope contendo documentação relativa ao veículo Volkswagen Bora, designadamente livrete, requerimento para registo inicial de propriedade em nome do arguido GG, declaração aduaneira de veículo em nome do arguido GG (duas), guia contendo a matrícula portuguesa do veículo ........, factura para matrícula do veículo emitida pela Direcção Geral de Viação, guia de circulação de veículo automóvel ligeiro, certificado de matricula na França em nome de F......li Da......d, e certificado de venda de veículo francês cujo comprador é o arguido GG;
- Uma bolsa plástica contendo uma tabela referente a imposto automóvel, um certificado de venda de veículo referente ao veículo de matrícula ......... em que o comprador é o arguido GG, duas declarações aduaneiras de veículo referente ao veículo de matrícula ............., duas declarações aduaneiras de veículo referente ao veículo de matrícula ............, uma fotocópia de um livrete referente ao veículo de matrícula ........... anteriormente designado pela matrícula .............., uma declaração aduaneira de veículo referente ao veículo de matrícula ............., um requerimento declaração para registo de propriedade onde consta a matrícula ........... marca Volkswagen, modelo Passat, tendo como vendedor o arguido GG, um requerimento para registo inicial de propriedade referente ao mesmo veículo, cujo proprietário é o arguido GG, cópia do título de registo de propriedade da viatura BMW ............., cujo proprietário é o arguido GG, e uma guia de substituição de documentos da viatura...........;
- Documento comprovativo para alteração de titular de conta bancária referente à conta n°..........do Banco BPI, onde é aditado como titular o arguido GG à referida conta, de que era titular a arguida JJ;
- Duas declarações aduaneiras de veículo Volkswagen Bora de matrícula .........., em que consta como adquirente o arguido GG.
221p. No domicílio, sito na Rua ............, 1º andar, casa junto à ............., onde habita o arguido DD (M...), foram apreendidos documentos, objectos e dinheiro, entre os quais:
- A quantia de 500 Euros em notas;
- Um telemóvel Siemens A52, IMEI ................, com o cartão TMN n° ..........;
- Um pedaço de papel manuscrito, na frente com os números de telefone ............. referente a “Vasta - carrinha”, ........... referente a “Vitalik - servente - Cabanas” e ainda os números .......... e ....... sem referência legível. No verso um número de telefone manuscrito .......... referente a “SER. MOL”;
- Cinco talões de depósito em numerário na conta número ......... da Caixa de Crédito Agrícola, cujo titular é DD: 5 de Maio de 2003 depósito de 130 Euros; 20 de Junho de 2003 depósito de 450 Euros; 8 de Setembro de 2003 depósito de 1.900 Euros; 4 de Junho de 2004 depósito de 100 Euros; 6 de Dezembro de 2004 depósito de 200 Euros, e dois talões de depósito na conta poupança nº 000000000000 a Caixa de Crédito Agrícola e cujo titular é DD: 17 de Novembro de 2004 depósito de 300 Euros e 6 de Dezembro de 2004 depósito de 400 Euros;
- Documentos comprovativos de envio de dinheiro via “WU” para a Ucrânia, cujo remetente é o arguido DD para XX nos montantes de 77 Euros em 5 de Abril de 2003, 174 Euros em 27 de Maio de 2003, 92 Euros em 9 de Julho de 2003 e 184 Euros em 4 de Agosto de 2003; para T.....U.... nos montantes de 480 Euros em 2 de Março de 2003, 70 Euros em 4 de Abril de 2003, 800 Euros em 30 de Junho de 2003 e 40 Euros em 31 de Agosto de 2003; para SSSS no montante de 144 Euros em 16 de Fevereiro de 2003 e para Petru DD no montante de 66 Euros em 9 de Março de 2003;
- Documentos comprovativos de envio de dinheiro via “WU” para a Ucrânia, cujo remetente é o arguido DD para XX no montante de 177 Euros em 10 de Abril de 2004, e para T......U....nos montantes de 800 Euros em 17 de Abril de 2004, 2.000 Euros em 10 de Outubro de 2004, 500 Euros em 14 de Novembro de 2004 e 500 Euros em 9 de Dezembro de 2004;
- Documentos comprovativos de envio de dinheiro via “WU” para a Ucrânia, cujo remetente é o arguido DD para I...P... no montante de 206 Euros em 4 de Agosto de 2005, e para T...... U...... nos montantes de 1.000 Euros em 8 de Fevereiro de 2005 e 464,50 Euros em 9 de Setembro de 2005;
- Um telemóvel Siemens A52 com o IMEI 0000000000 com o cartão SIM da TMN nº 00000000000;
- Uma nota com o valor nominal de dez zloty, cinco notas com o valor nominal de dez rublos, uma nota com o valor nominal de cinquenta grivna, uma nota com o valor nominal de vinte grivna, uma nota com o valor nominal de dez grivna, uma nota com o valor nominal de cinco grivna, três notas com o valor nominal de dois grivna, uma nota com o valor nominal de mil liras, três notas com o valor nominal de vinte dólares americanos, uma nota com o valor nominal de um dólar americano, quatro notas com o valor nominal de cem euros e cinco notas com o valor nominal de vinte euros; e
- Uma máquina de filmar Sony CCD.... com o número 000000000, com carregador, comando à distância, cabos de ligação e respectiva bolsa de cor azul.
222p. Também foi buscado o domicílio, sito na Rua 0000000000000000, 2º direito, em Faro, onde habita o arguido EE, na posse do qual foram apreendidas objectos e documentos, nomeadamente os seguintes:
- Um cartão Mastercard Gold do Bank of Scotland com o nº 00000000000000 em nome de J.CALLAN;
- Uma navalha com cabo de cor preta trabalhado, com duas lâminas, de 8,5 e 10 cm;
- Um anel em ouro, tipo aliança de casamento, liso;
- Um pedaço de papel, com o número de telefone manuscrito 00000000000;
- Um cartão de segurança referente ao cartão com o número 00000000000 da operadora TMN;
- Um cartão de segurança referente ao cartão telefónico com o número 000000000000.
223p. Igualmente foi buscado o domicílio, sito na Praceta ...........,..... direito, traseiro, em Faro, onde habita o arguido II na posse do qual foram apreendidos objectos e documentos com relevo para a investigação, nomeadamente, os seguintes:
- Dois cartões de segurança da operadora móvel TMN, plastificados, referentes aos cartões telefónicos com os números .............;
- Caderneta bancária da Caixa de Crédito Agrícola, balcão de Olhão, referente à conta com o NIB 00000000000, de que é titular o arguido II;
- Uma caixa Nokia referente ao telemóvel modelo 7210 com o IMEI 000000000000, contendo manual de instruções referente ao telemóvel Nokia 6600, CD de instalação de ‘software’ e um panfleto referente ao mesmo telemóvel;
- Três carregadores Nokia, um carregador de isqueiro Nokia e um auricular também Nokia, e
- Um telemóvel Nokia 6600, com o IMEI 00000000000, no qual se encontra inserido o cartão SIM da operadora móvel TMN, com o nº 00000000000.
224p. No dia 25 de Setembro de 2005, pelas 10.30 horas, perante eD... C....s, este na qualidade de funcionário do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, o indivíduo referenciado e conhecido nos autos como KK foi constituído arguido, prestou termo de identidade e residência e identificou-se com o nome e demais elementos de identificação seguintes: NN, com a alcunha ‘KK’, natural de ......R. Sav., de nacionalidade lituana, nascido a 18-11-1983, solteiro, titular do passaporte lituano nº00000000000 emitido em 14-08-2004, mas não quis fornecer os elementos de identificação relativos à sua filiação.
225p. O arguido KK foi detido e, no dia 26 de Setembro de 2005, pelas 22.00 horas, foi submetido a primeiro interrogatório judicial no Tribunal da Comarca de Loulé, e, advertido de que a falta de resposta às perguntas que lhe seriam feitas sobre a identidade e antecedentes criminais, ou a falsidade das mesmas, o pode fazer incorrer em responsabilidade penal, aquele disse o seguinte: “Não querer responder nem quanto aos factos que lhe são imputados nem quanto à sua identificação”.
226p. O arguido KK compreendeu o teor da advertência que lhe foi feita pelo Mmo Juiz de Instrução em língua portuguesa, devidamente traduzida para língua russa através da intérprete presente, e mesmo assim recusou-se a fornecer a sua identificação pessoal, assim como se recusou a responder às perguntas que lhe foram feitas acerca dos seus antecedentes criminais.
227p. Sucede, porém, que o pretenso NN foi resenhado e, através de comparação das suas impressões digitais e do passaporte lituano número 0000000000, as autoridades lituanas esclareceram e confirmaram que esse documento é falso.
228p. Por outro lado, o Ministério da Administração Interna da Ucrânia (Interpol de Kiev) confirmou que o falso NN, e indivíduo resenhado nestes autos, é efectivamente o cidadão ucraniano de nome KK, nascido a .........., natural de Sokal, distrito de Lviv - Ucrânia, com última residência na Rua , .......................
229p. Assim sendo, o arguido KK é cidadão ucraniano, e não lituano e, segundo o MAI da Ucrânia, foi condenado, em 00-00-00, pelo Tribunal Distrital de Lviv, pela prática de factos que integram crime de desordem pública (previsto e punido pelo artigo 206°, nº 2, do Código Penal da Ucrânia), na pena de dois anos de prisão.
230p. Com efeito, o arguido KK compreendeu o alcance das perguntas legais e as consequências da sua recusa, sabendo que a ordem era legítima e provinha de autoridade judicial com competência mas, não obstante, persistiu na sua conduta, que sabia que o fazia incorrer na prática de crime previsto na lei e conformou-se com isso.
231p. Por outro lado, o arguido KK era detentor de passaporte lituano número 0000000, e utilizou-o como documento de identificação pessoal, o qual exibiu ás autoridades policiais e judiciais portuguesas, fazendo-se passar por outra pessoa e ciente de que o mesmo é falso.
232p. O arguido KK obteve o sobredito passaporte em circunstâncias não concretamente apuradas de tempo, modo e lugar, assim como forneceu uma fotografia sua que foi aposta no mesmo com o propósito de se identificar, caso fosse necessário, como cidadão lituano.
233p. Uma vez submetido a exame laboratorial, revelou ser falso o passaporte da Lituânia nº 000000000000, emitido a favor de NN, apresentando também sinais de ter sido alterado por substituição de fotografia, patentes nos detalhes seguintes: vinco paralelo aos limites da fotografia; partículas de pó entre o laminado e o suporte de papel; laminado desalinhado em relação ao suporte de papel; e rugas na película laminada.
234p. O arguido KK detinha o referido passaporte lituano, no qual tinha aposta a sua fotografia, e utilizou-o a seu bel-prazer como documento de identificação, incluindo para viajar desde a Ucrânia com destino a Portugal e vice-versa, bem como noutros países da Comunidade Europeia, dissimulando a sua nacionalidade ucraniana.
235p. Ao agir pela forma supra descrita, o arguido KK usou e exibiu aquele passaporte e, ao apor fotografias e assinatura suas, sabia que fazia constar factos juridicamente relevantes e falsos, mas, não obstante esse facto, quis utilizá-lo como sendo verdadeiro, ciente de que é falso.
236p. Não se coibiu de exibi-lo perante as autoridades policiais com vista a comprovar a nacionalidade lituana, o que sabia não corresponder à verdade, e tinha consciência de que o mesmo fora falsificado, mas não se coibiu de usá-lo como usou, e conformou-se com o resultado da sua conduta.
237p. O arguido KK possuía uma faca de ponta de mola (arma com embuste, examinada nos autos) e detinha-a sem fim útil ou definido.
238p. O arguido AA (J....) detinha componentes de armas de fogo.
239p. Os arguidos KK e AA agiram sempre de forma voluntária, livre e consciente, bem sabendo proibidas e punidas as suas condutas por lei.
240p. No dia 29 de Dezembro de 2005, foi realizada busca à residência do arguido FFF, sita na Rua V...................., Portimão, onde foram apreendidos objectos e documentos entre eles:
- Um telemóvel Siemens A60, com o IMEI 00000000;
- Duas cadernetas da Caixa Geral de Depósitos, relativas à conta n° 0000000000, de que é titular TTTT;
- Um álbum de fotografias.
241p. Os referidos objectos, documentos, quantias em dinheiro, veículos automóveis e instrumentos de agressão apreendidos aos arguidos AA, JJ, KK, DD, EE, II, VV e FFF constituem produto ou proventos das actividades ilícitas que os mesmos vinham exercendo, em grupo organizado e de forma reiterada e organizada.
Este número foi modificado pela Relação de Lisboa, nos mesmos termos em que o foi o nº 214, da factualidade provada.
242p. Os arguidos, todos e cada um de per si, agiram de modo livre, deliberado e consciente, querendo praticar os factos que lhes são imputados, designadamente, querendo manter-se como membros convictos do provado grupo criminoso, com o fim de cometerem ilícitos criminais destinados a renderem-lhes proventos, bem como quiseram praticar todos os demais factos que lhes vêm atribuídos, pressionando mulheres prostitutas, condutores de carrinhas e outras pessoas para que lhes fizessem pagamentos, espancando as vítimas S..... e C.... tirando a este um telemóvel, penetrando pela força na casa daquele, apresentando o passaporte em nome de NN, trazendo clandestinamente para Portugal a vítima PPP, aproveitando-se das quantias pagas pelas referidas pessoas, outorgando às mulheres as condições indispensáveis a que estas exercessem a prostituição, e daí tirando proventos, capturando e mantendo em seu poder a vítima XXX, e em suma fazendo tudo o que se provou, nomeadamente por fazerem todos os factos em causa parte do modo de vida dos arguidos.
243p. Os arguidos, todos e cada um, actuaram cientes de que as suas condutas eram punidas pela lei como crimes, circunstância esta que em caso algum os dissuadiu de praticarem os factos agora provados.
244p. O arguido GG foi julgado e condenado, em França, por crime de "destruição e degradação de veículos privados", cometido em 22 de Maio de 2002 na portagem da auto-estrada A36 (Evans), em França e cumpriu pena de prisão no Centro de Detenção de Neuvic (desde 26-05-2005).
245p. A arguida JJ e o seu companheiro V... (o arguido GG) investiram o dinheiro de proveniência ilícita nos já referidos veículos, entre eles o Audi A4.
246p. Os arguidos AA (J....) e KK foram julgados e condenados na Ucrânia, onde cometeram crimes e sofreram penas de prisão, sendo certo que o arguido AA cumpriu pena de dezassete anos de prisão.
247p. E o arguido KK foi condenado em 29-01-1996, pelo Tribunal da Região de Lvov, na pena de um ano de prisão pela prática de um crime de desordem e arruaça, vulgo ‘hooliganismo’.
248p. Os arguidos AA, GG, DD, KK, JJ, AAA KKK, EE, II, VV e FFF são cidadãos estrangeiros e não têm familiares, descendentes ou ascendentes, a residir em Portugal.
249p. O arguido DD não deu ordem aos restantes para baterem no ofendido MMM, nem para lhe extorquirem dinheiro.
250p. O arguido AA tem família a cargo na Ucrânia, designadamente filhos e sobrinhos.
251p. Em Portugal, o arguido AA foi já condenado em 2002, 2005 e 2006 por crimes de desobediência e de condução de veículo em estado de embriaguez cometidos em 2002, 2003 e 2004, tendo cumprido as penas de multa que então lhe foram impostas.
252p. O arguido GG tem família a cargo na Ucrânia e não tem antecedentes criminais conhecidos por factos praticados em território português, onde trabalhou na construção civil.
253p. A arguida JJ não tem antecedentes criminais conhecidos por factos praticados em território português.
254p. O arguido KK tem família na Ucrânia.
255p. O arguido DD tem família na Ucrânia, e em território português trabalhou na construção civil.
256p. O arguido EE foi condenado em 2006 por crime de condução de veículo em estado de embriaguez praticado em 2002.
257p. O arguido II tem família na Ucrânia e não tem antecedentes criminais conhecidos por factos praticados em território português.
258p. O arguido VV tem menores a seu cargo e não tem antecedentes criminais conhecidos por factos praticados em território português, onde tem trabalhado na construção civil.
259p. A arguida AAA tem uma filha a estudar na Ucrânia, para a qual, conforme se provou, remete quantias em dinheiro, e não tem antecedentes criminais conhecidos por factos praticados em território português.
260p. A arguida KKK deu à luz no período em que decorreu a audiência, e não tem antecedentes criminais conhecidos por factos praticados em território português.
261p. O arguido FFF, por sua vez, foi pai também durante o curso da audiência, e não tem antecedentes criminais conhecidos por factos praticados em território português, onde aliás não lhe é conhecida qualquer ocupação.
262p. O Hospital Distrital de Faro prestou cuidados a MMM, na sequência das agressões infligidas pelos arguidos EE e II, aliás com a colaboração do arguido DD e do arguido separado CCCC, tendo com os tratamentos efectuados uma despesa de 2.953,12 Euros, que ainda se encontra por pagar.
-
- B - FACTOS NÃO PROVADOS -
Dos factos com interesse para a decisão da causa, resultaram NÃO PROVADOS os seguintes:
1NP. Que os arguidos DD, EE e II tivessem também a tarefa de escolher as vítimas.
2NP. Que os arguidos EE e II procurassem sempre algum pretexto para confrontarem as suas vítimas e para, a partir desse momento, exigirem o pagamento de quantias em dinheiro.
3NP. Que o arguido DD se tenha apoderado de cem euros em dinheiro e de um maço de tabaco pertencentes a DDDD.
4NP. Que o grupo criminoso se tenha dividido em células.
5NP. Que competisse exclusivamente ao arguido separado CCCC (V....) coordenar a actuação local do grupo em Tavira.
6NP. Que, na ausência do arguido separado CCCC (V....), o comando do grupo em Tavira fosse assegurado e exercido pelo co-arguido DD (M....).
7NP. Que as ordens do arguido AA (J....) fossem transmitidas ao arguido separado CCCC (V...), para que este diligenciasse no sentido de cumprir com o que lhe era ordenado.
8NP. Que o arguido CCCC (V....) recebesse e cumprisse as ordens do arguido AA, designadamente comunicando-as aos arguidos EE e II.
9NP. Que o grupo controlasse os fluxos de imigração para esta zona do País, falsificando documentos.
10NP. Que a angariação de jovens mulheres (como CCC) para a prostituição fosse também feita pelo arguido AA.
11NP. Que o arguido DD fosse membro destacado do grupo no desempenho das referidas actividades, se deslocasse no veículo Renault Clio ..-..-.., e recebesse parte dos lucros provenientes da exploração do ganho de mulheres na prostituição.
12NP. Que no dia 15 de Julho de 2005, o arguido GGGG tenha estado em conversa com o arguido DD, queixando-se de que “alguém disse que levou dinheiro dos motoristas de Lagoa” e da falta de “trabalho”, respondendo-lhe este último “eu dou-te o dinheiro das gajas”.
13NP. Que os arguidos DD EE e II, pertencentes ao grupo, tenham recebido ordens directas do arguido AA no sentido de angariarem vítimas para depois lhes extorquirem dinheiro e, bem assim, no sentido de molestarem fisicamente imigrantes da Europa de Leste, subtraindo-lhes dinheiro e outros pertences.
14NP. Que nos “classificados” do jornal diário “Correio da Manhã” de dia 19 de Julho de 2005, donde constam os números de telefone 000000000000, 00000000, 0000000000 e 00000000, sejam oferecidos favores sexuais de mulheres pelos preços de 30 Euros e 50 Euros por sexo oral ou vaginal, respectivamente, e 100 Euros por sexo anal, indicando todas as mulheres contactadas através dos sobreditos números de telefone a Av. S.....,.....,...m Portimão, como morada para a prática de prostituição.
15NP. Que MMM tenha chegado a Portugal em 2001, tendo regularizado a sua situação em território nacional no decurso do ano de 2003.
16NP. Que o arguido separado CCCC e o arguido DD tenham ficado sentados dentro do automóvel enquanto, como se provou, acompanhavam os arguidos II e EE no espancamento a MMM.
17NP. Que o arguido DD tenha ordenado aos co-arguidos EE e II que espancassem a vítima MMM.
18NP. Que, em finais do mês de Junho de 2005, em dia e hora indeterminados, o arguido separado CCCC e o arguido DD se tenham dirigido à residência do ofendido MMM, recordando-lhe que, caso não pagasse a quantia de 1.500 Euros, seria espancado, e que lhe tenham ordenado que preparasse a quantia de 600 Euros para entregar ao arguido II, o qual iria contactá-lo em breve, não lhe antecipando qual o dia, hora e local onde esse encontro haveria de ter lugar.
19NP. Que o provado em 22p tenha sucedido em finais de Julho de 2005, num domingo, pelas 20.00 horas; que neste dia e hora os arguidos II e EE se tenham dirigido, novamente, à residência de MMM, sita em Montenegro - Faro, fazendo-o com o propósito de lhe exigirem a entrega do dinheiro; que, tendo batido à porta, lhes tenha surgido DD, colega do ofendido; que este tenha aberto a porta e lhes tenha perguntado ao que vinham, tendo eles ordenado que chamasse o MMM; que o ofendido MMM tenha vindo à porta; que os arguidos II e EE lhe tenham exigido, imediatamente, o pagamento de 600 Euros como se os devesse ao arguido II; que o ofendido se tenha recusado a pagar-lhes a pretendida quantia, alegando que nada devia a II; que, acto contínuo, os arguidos II e EE lhe tenham dito que tinha de pagar a referida quantia, pois se o não fizesse levava uma “sova” pior que a anterior, conduzindo então o ofendido para o interior do quarto; que então, temendo pela sua vida e receando ser fisicamente molestado, o ofendido MMM lhes tenha entregue a quantia exigida de 600 Euros em dinheiro.
20NP. Que, nos dias 17 a 19 de Julho de 2005, o arguido AA (J....) se tenha deslocado por diversas vezes a Portimão, transportando mulheres prostitutas para uma casa existente nas imediações da “Praça Cigana”, sita na Avenida ...................., em Portimão.
21NP. Que o arguido AA transportasse as mulheres prostitutas no veículo Peugeot Boxer azul com a matrícula ucraniana ................, e que algumas delas fossem molestadas fisicamente, por vezes em público, por não cumprirem as ordens dele, como no dia 22 de Julho de 2005, pelas 12.15 horas, junto à esplanada do estabelecimento Estrela-do-Mar em Albufeira; que aqui tenha o arguido AA abordado e agredido verbal e fisicamente, arrastando-a, UUU.
22NP. Que o arguido AA tenha efectivamente agredido a vítima CCC.
23NP. Que a vítima CCC tenha estado na companhia de uma certa “Ja”, cidadã do Leste da Europa.
24NP. Que a vítima UUU tenha sido transportada numa carrinha da Ucrânia para o nosso País, começando a viver em casa de um indivíduo de nome V.....a.
25NP. Que o propósito de UUU tenha sido emigrar para Portugal, para aqui trabalhar sem possuir contrato de trabalho e sem autorização de permanência em território nacional.
26NP. Que a quantia provadamente exigida a UUU o tenha sido em finais de Novembro de 2004.
27NP. Que o apartamento onde UUU recebia os seus clientes fosse o nº .... do Edifício Orion, na Rua ......, em Albufeira.
28NP. Que UUU tenha começado por entregar ao arguido AA 50% do dinheiro que fazia na prostituição, conquanto fosse essa, como se provou, a regra estabelecida.
29NP. Que UUU tenha entregue a quantia global de 5.600 Euros em dinheiro ao arguido AA.
30NP. Que a vítima PPP tenha saído da Ucrânia com visto de turismo, mas com intenção de trabalhar e fixar domicílio em Portugal, tendo para isso pago pela viagem cerca de mil e quinhentos dólares americanos, incluindo uma promessa de trabalho na limpeza de uma vivenda no Algarve.
31NP. Que o arguido AA, em Itália, conduzisse um veículo BMW de cor escura e se fizesse acompanhar de um indivíduo moldavo, de nome Radu, e de um indivíduo ucraniano, de nome V.....
32NP. Que o arguido AA se tornasse por vezes violento para com QQQ e que, para receber o dinheiro, muitas vezes aparecesse acompanhado do arguido GG (V...).
33NP. Que QQQ tenha aceitado dedicar-se à prostituição, designadamente desde finais de Maio de 2002 até Janeiro de 2003.
34NP. Que NNN tenha viajado para Portugal com visto de turismo e com intuito de fixar residência e trabalhar no nosso país sem autorização ou contrato de trabalho prévios.
35NP. Que NNN tenha sido iniciada na actividade de prostituição por LLL.
36NP. Que NNN não tenha apresentado queixa por recear ser presa, devido a estar em situação de permanência ilegal em Portugal.
37NP. Que NNN, nos meses de Junho a Agosto de 2005, entregasse mensalmente 150 Euros ao arguido AA, e que este não lhe tenha prestadou protecção alguma.
38NP. Que o trajecto de AAAA entre a Ucrânia e Portugal fosse pelo itinerário Ucrânia-Hungria-Áustria-Itália-França-Espanha.
39NP. Que há cerca de dois anos, em datas não concretamente apuradas de 2004 e 2005, AAAA, viajando para Portugal, fosse frequentemente abordado no seu veículo, assim como os de outros motoristas, por cidadãos pertencentes a redes organizadas que tinham por objectivo cobrar a cada passageiro cerca de 100 Euros em dinheiro e que tivessem usado de violência física, agredindo os passageiros transportados nas carrinhas com bastões e facas, de modo a coagi-los a entregarem dinheiro.
40NP. Que, em consequência disso, o número de pessoas dispostas a fazerem as viagens com esses riscos diminuiu progressivamente, preferindo aquelas fazê-lo por via aérea e, desse modo, sem que fossem perturbadas durante a viagem.
41NP. Que AAAA e outros condutores de carrinhas de transporte tenham contactado com os responsáveis das redes organizadas, no caso o arguido AA, acedendo a fazer o pagamento de uma quantia fixa por cada viagem que efectuassem, e evitando assim que os clientes fossem agredidos, e como tal se lhes frustrasse o negócio de transporte.
42NP. Que, a partir de data não concretamente apurada, mas seguramente desde o início de 2005, AAAA, sempre que era mandado parar durante o trajecto Ucrânia-Portugal e vice versa, e como combinara com o arguido AA que lhe faria o pagamento no final de cada transporte, facultava ao grupo que o abordava o número de telemóvel deste e que, uma vez na posse desse número de telemóvel, os indivíduos ligassem para o arguido AA, confirmando o transporte e a protecção, mandando a carrinha seguir viagem.
43NP. Que o cidadão ucraniano BBBB, motorista de profissão, desde Março de 2004 efectuasse o transporte de passageiros e mercadorias da Ucrânia para Portugal e vice-versa, sendo que, em data, local e hora indeterminados, mas no Algarve, quando aquele efectuava a segunda viagem da Ucrânia para Portugal, ao entrar em território nacional, BBBB tenha sido abordado pelos arguidos AA (J....) e GG (V...), que lhe exigiram o pagamento duma quantia em dinheiro por cada viagem que efectuasse, sob pena de, não o fazendo, suceder algo de grave consigo ou com a sua família na Ucrânia.
44NP. Que, por temer pela sua vida e pela dos seus familiares, BBBB tenha aceitado pagar as quantias em dinheiro que lhe eram exigidas e as tenha entregado sempre, umas vezes directamente ao arguido AA, outras ao arguido GG.
45NP. Que no dia 15 de Julho de 2005, num parque de estacionamento do McDonald’s de Albufeira, o arguido AA tenha obrigado o motorista ZZZ a entregar-lhe a quantia de 250 Euros, fazendo-se acompanhar do arguido KK, que assistiu à entrega do dinheiro, e esteve presente para garantir a segurança no recebimento dele e, do mesmo modo, intimidar a vítima e obrigá-la a pagar a quantia que fora exigida.
46NP. Que no dia 17 de Julho de 2005, pelas 19.09 horas, o condutor ZZZ (Y..a) tenha telefonado ao arguido AA, a fim de combinarem encontrar-se no McDonald’s de Albufeira, e que cinco minutos decorridos o arguido KK tenha telefonado ao arguido AA, confirmando-lhe que o Y..a efectivamente ali estava com o mini-bus, da marca Mercedes.
47NP. Que nesse mesmo dia 17 de Julho de 2005, pelas 19.15 horas, o arguido aa, na companhia do arguido KK, se tenha encontrado com o ofendido ZZZ (YU....) junto ao McDonald’s de Albufeira e que, chegado ao local, o arguido AA tenha saído do seu veículo Peugeot Boxer e se tenha dirigido à carrinha Mercedes do ofendido, tenha entrado nela e se tenha sentado no banco da frente do passageiro, ao lado deste, e que, na sequência de uma discussão tida entre ambos, o arguido tenha exigido dinheiro e ZZZ lho tenha entregue, enquanto o arguido KK permanecia na esplanada do McDonald’s a controlar o desenrolar dos acontecimentos.
48NP. Que neste contexto, enquanto o arguido AA exigia a ZZZ o pagamento de determinada quantia em dinheiro, o arguido KK permanecesse junto ao primeiro, numa postura de intimidação e controlo da zona envolvente, ainda que fosse essa a sua postura habitual.
49NP. Que no dia 18 de Agosto de 2005, após as 00.00 horas, o arguido AA se tenha dirigido à estação de serviço de Olhão na A-22, sentido Faro-Espanha, acompanhado do arguido KK, tendo, pela 01.30 horas, interceptado os motoristas de carrinhas ZZZ (Y..a) e XXX, com o propósito de lhes cobrar quantias em dinheiro pelo facto de entrarem em Portugal e transportarem cidadãos do Leste Europeu, sob pena de, não o fazendo, serem molestados fisicamente ou serem-lhes destruídos bens patrimoniais, tendo aqueles acedido e entregado quantia não apurada em dinheiro.
50NP. Que, feito o aludido pagamento, os motoristas XXX e ZZZ (Y..a) tenham seguido em direcção ao posto fronteiriço de Vila Real de Santo António e aí tenham sido fiscalizados pelo SEF, tendo-se identificado como sendo ZZZ (Y..a), titular do passaporte nº0000000000 e nº AP 000000000, e XXX, titular do passaporte nº A0000000000 e nº AP P00000000
51NP. Que o arguido KK tenha algumas vezes intervindo por ordem do arguido AA, usando a sua força física para molestar as vítimas, para que não deixassem de pagar as quantias que lhes eram exigidas
52NP. Que XXX tenha sido abordado sete ou oito vezes por indivíduos desconhecidos em Vilamoura, Lagos, Portimão e Albufeira, os quais lhe exigiam dinheiro, tendo-o então contactado o arguido AA a dizer-lhe que se lhe pagasse não teria mais problemas, ao que o ofendido acabou por aceder.
53NP. Que o arguido AA mudasse frequentemente de número de telemóvel para os seus contactos.
54NP. Que XXX tenha efectuado o último pagamento ao arguido AA numa 4a feira do mês de Agosto de 2005, quando utilizava a carrinha Volkswagen Transporter vermelha CE5019AA.
55NP. Que as viagens de XXX, desde o mês de Janeiro e até meados de Março de 2005, tenham sido em número de quatro entre a Ucrânia e Portugal, e que desde Abril até meados de Julho de 2005 tenha interrompido a sua actividade de transportes, por ter o seu visto caducado.
56NP. Que JJJJ, motorista de profissão, desde Fevereiro de 2005 se dedique ao transporte de passageiros e mercadorias da Ucrânia para Portugal e vice-versa e que, na segunda viagem que fez da Ucrânia, ao chegar a Portugal, tenha sido abordado na estrada pelo arguido AA, e este lhe tenha exigido o pagamento de 30 Euros por cada passageiro que transportasse, de modo e não colocar em risco a sua segurança.
57NP. Que JJJJ tenha acedido de imediato, por saber que os outros condutores também eram obrigados a pagar para evitar problemas, tanto assim que uma viatura similar à sua já fora incendiada em França.
58NP. Que JJJJ, em viagens posteriores, tenha tentado eximir-se ao pagamento, tendo-o o arguido AA abordado de novo e advertido de que, se fugisse novamente ao pagamento, iria ter sérios problemas, e que doravante iria “controlá-lo” em Espanha.
59NP. Que, por temer pela sua segurança e dos seus pertences, o ofendido JJJJ tenha passado a pagar regularmente ao arguido AA as quantias em dinheiro exigidas por cada viagem da Ucrânia para Portugal.
60NP. Que no dia 1 de Agosto de 2005, o arguido AA se tenha encontrado com HH na estação de serviço de Olhão, na A-22, para este lhe pagar o que aquele lhe exigia em troca de protecção que, afinal, não lhe dava.
61NP. Que o arguido DD não conhecesse o ofendido MMM, e nunca tenha estado em sua casa, no interior ou no exterior.
62NP. Que o arguido DD não tenha estado presente no bar provado em 6p.
63NP. Que o arguido DD não tenha estado presente quando do provado em 9p.
128 dos factos que haviam sido considerados provados na 1ª instância, do teor seguinte: “Na sequência deste facto, NNN (L.....) começou a pagar a quantia mensal de 100 Euros ao arguido AA (J....) a troco de protecção e porque temia, na realidade, que algo de mal lhe viesse a suceder”.
180, 181, 184 e 185 dos factos que haviam sido considerados provados na 1ª instância, do teor seguinte:
“180p. Entretanto, o arguido AA (J....) entrou em contacto com o pai de XXX, disse-lhe que interviria como intermediário junto dos sequestradores e forneceu-lhe o seu número de telemóvel.
181p. O arguido AA simulou estes factos, a fim de obter dinheiro da família de XXX, o que conseguiu.
184p. O arguido AA, por meio de violência e astúcia, mandou raptar o ofendido XXX, com a intenção de sujeitá-lo a cárcere e, desse modo, obter resgate ou recompensa, como conseguiu, não se coibindo de actuar como actuou, e conformou-se com o resultado da sua conduta.
185p. Por outro lado, o arguido AA engendrou um esquema, conjuntamente com outros indivíduos de identidades não apuradas, e mediante execução de plano prévio, em comunhão de esforços, com intenção de conseguir para si e para a organização enriquecimento ilegítimo, constrangeu o pai da vítima, por meio de violência e de ameaça à saúde e vida do filho, a dispor do seu património, provocando-lhe prejuízo patrimonial”.
- C - MATÉRIA NÃO INCLUÍDA -
Não se apuraram outros factos com interesse para a decisão da causa. Não foram consignadas, igualmente, considerações gerais, nem foram incluídos factos implicitamente decorrentes de outros, e já explicitamente provados ou não provados na sede própria, bem como se omitiram algumas repetições, redundâncias e considerações de carácter geral.
- D - PROVAS DOS FACTOS E SUA ANÁLISE -
1 - Optando por evoluir da parte para o todo, começar-se-á por analisar a prova que se formou sobre as situações particulares, e em seguida atentar-se-á naquela que justifica as conclusões de carácter geral em matéria de facto, terminando-se pela justificação do valor atribuído à prova.
2 - Temos, assim, em primeiro lugar os factos atinentes à testemunha MMM, sobre os quais se formou a prova seguinte:
a - 1. A folhas 1614, em declarações para memória futura transcritas a folhas 3827 e seguintes, diz que, pelos nomes, conhece os arguidos II e EE, presentes num café onde a testemunha se viu privada dum telemóvel ‘Ericsson’ no valor de 83 Euros, por via de furto, tendo o arguido II sido mais tarde confrontado com este facto.
2. O arguido II reagiu asperamente à suspeita de ser o autor do furto, e em breve compareceu em casa da testemunha juntamente com o arguido EE, a exigir-lhe o pagamento de 1.500 Euros, sob a ameaça de vir a sofrer espancamento, o que de pronto aconteceu por ter a testemunha recusado pagar.
3. Na casa estava também a testemunha DD, que nada pôde fazer em auxílio deste MMM, porque no exterior havia mais dois homens, que são o arguido DD e o arguido separado CCCC, ostensivamente em apoio dos arguidos que espancavam aquele, se bem que não se tenha mostrado necessária a sua intervenção.
4. A testemunha MMM declara, também, que reconheceu por fotografia o arguido DD e o referido CCCC.
5. A testemunha esteve no hospital e, depois da alta, veio a fazer pagamentos, de 400 Euros numa vez e de 600 Euros noutra, não tendo vindo a entregar a quantia de 500 Euros em falta no mencionado valor de 1.500 Euros, mas sem que a testemunha saiba por que não lha exigiram, pois dispunha-se a pagar para não voltar a sofrer espancamentos.
6. Refere ainda que a última quantia, 600 Euros, foi entregue directamente ao arguido II, que se apresentou sozinho a reclamar o dinheiro.
b - 1. Com efeito, no apenso ............., a folhas 14, 20, 173, 175, 177, 196 e 200, há reconhecimento fotográfico dos arguidos II, EE e DD, bem como do dito CCCC, por parte do mesmo MMM e, bem assim, do aludido Daraduda.
2. Estes reconhecimentos são confirmados, e bem assim reforçados, pelos reconhecimentos pessoais constantes de folhas 2086 a 2092, e 3655 a 3657, feitos pelos mesmos MMM e Daraduda, e que recaem sobre os arguidos II, EE e DD.
3 - Segue-se a testemunha DDDD, a respeito de quem se provou o seguinte:
a - 1. A folhas 1614, em declarações para memória futura transcritas a folhas 3809 e seguintes, diz que conhece o arguido EE e o arguido separado CCCC, a quem conhece pelo diminutivo V...., e conhece-os porque são irmãos e vivem na sua proximidade.
2. Relata que quatro indivíduos o obrigaram à viva força a entrar num veículo, dentro do qual o agrediram, desconfiando a testemunha de que este facto está associado a que o dito V.... estava muito zangado, porque o patrão lhe descontou 160 Euros a mais, com destino à Segurança Social, tendo o mesmo V.... dito à testemunha que esta tinha de lhe pagar aquele dinheiro, já que foi a testemunha quem lhe arranjou aquele emprego, com aquele patrão.
3. Mais diz a testemunha que lhe tiraram um telemóvel e 100 euros em dinheiro que tinha no maço de tabaco, especificando que, dentro do carro, ficou com um indivíduo dum lado e outro do outro lado.
b - A testemunha reconheceu fotograficamente o arguido EE e o dito CCCC a folhas 1225 a 1227, nisso nada mais fazendo do que confirmar as declarações que veio a prestar.
4 - Temos em seguida a testemunha PPP, sobre a qual se formou a seguinte prova:
a - 1. A folhas 1626, em declarações para memória futura transcritas a folhas 3933 e seguintes, diz que, pelos nomes, conhece os arguidos AA, AAA e VV.
2. A testemunha entrou em Portugal em Dezembro de 2002, depois de viajar da Ucrânia com destino a Nápoles, mas desentendeu-se com os motoristas em Milão, onde apareceu o arguido AA, que lhe propôs trabalho num bar em Portugal, a “entreter os homens”, o que a testemunha aceitou, indo trabalhar no bar ‘Espelho Mágico’ em Boliqueime, e mais tarde no ‘Bianco Bar’, em Portimão.
3. A testemunha viveu um mês em casa do arguido AA, pagando 100 Euros mensais, mas este exigiu-lhe, logo no primeiro dia de trabalho no bar ‘Espelho Mágico’, que lhe entregasse 50% dos seus ganhos, que variavam entre 1.000 e 1.200 Euros mensais.
4. Durante um ano, a testemunha pagou àquele arguido a dita percentagem, para fiscalização do que organizava uma lista do dinheiro ganho todas as noites, mas depois passou a pagar a quantia fixa de 600 Euros, sempre àquele arguido que algumas vezes se fez acompanhar do arguido GG.
5. A testemunha era frequentemente advertida pelo arguido AA de que não deveria enganá-lo nas contas, a fim de “não piorar a situação”, o que lhe causava receio de ser molestada no caso de não pagar, sendo essa a razão por que pagava, e por que desistiu de voltar para a Ucrânia, quando formulou esse desejo e o arguido lhe disse que não ia, e que a encontrava onde quer que ela estivesse, mantendo-se esta situação por dois anos.
6. A certa altura, a testemunha iniciou namoro com um certo HHH, a quem o arguido AA exigiu, ao sabê-lo, o pagamento de 1.000 Euros, que o dito RRR pagou ao arguido no ‘MacDonald’s’ de Albufeira, na presença dos arguidos KK e VV, ambos convocados pelo arguido AA.
7. Os outros pagamentos feitos pela testemunha ao arguido AA ocorreram sempre no carro deste, em encontros combinados no ‘MacDonald’s’ de Albufeira, e sempre no fim do mês, sendo o carro do arguido ora um BMW, ora um Alfa Romeo, ambos de cor cinza.
8. A testemunha nada sabe sobre a arguida AAA excepto que ela trabalhou num bar em Poço Barreto.
b - A testemunha PPP reconheceu fotograficamente o arguido GG a folhas 1389 e, bem assim, reconheceu pessoalmente, a folhas 2104 e 2118, os arguidos AA e AAA.
5 - É a vez da testemunha QQQ, a respeito da qual se formou a seguinte prova:
a - 1. A folhas 1626, em declarações para memória futura transcritas a folhas 3959 e seguintes, diz que, pelos nomes, conhece os arguidos AA e AAA.
2. A testemunha veio para Portugal em Maio de 2002, em companhia de outra mulher ucraniana, chamada Oxana, a qual tinha em Portugal um amigo de nome RRR, que as ajudou a ambas, tendo a testemunha e a OX......começado a viver em Olhão, num quarto cedido pelo arguido AA, além de que foram ambas trabalhar num bar em Porches “entretendo” os homens.
3. O arguido AA cobrava 40 Euros mensais pelo quarto a cada uma, e estava empregado como porteiro no bar de Porches, onde a arguida AAA servia à mesa, tendo a testemunha trabalhado nele dois meses.
4. Enquanto trabalharam no bar de Porches, tanto a testemunha, como a Oxana recebiam entre 50 e 60 Euros por dia, e destas quantias entregavam metade ao arguido AA, o que continuou a fazer quando passou a trabalhar, até Janeiro de 2003, no bar ‘Chaminé’ em Poço Barreto.
5. A testemunha pagava ao arguido AA para que este a protegesse, e o mesmo fazia a Ox....., ambas por proposta do arguido, tendo a Ox...... regressado à Ucrânia em Abril de 2003, após o que a testemunha passou a pagar àquele arguido a quantia fixa de 600 Euros mensais no princípio de cada mês, o que durou até Maio de 2004, data em que efectuou o último pagamento, por ter já pago durante dois anos, passando assim a protecção do arguido a ser gratuita.
6. Refere a testemunha que o arguido AA a levava por vezes ao hospital, e bem assim que, ao tempo em que lhe foi oferecida a protecção, sentia medo, afirmando que aquele arguido nunca a ameaçou a ela ou à Ox......
7. As quantias que, na primeira fase, pagou ao arguido AA variaram entre 500 e 800 Euros mensais, sendo certo que agora, embora não lhe pague, tem medo dele, pois o arguido conhece pessoas na Ucrânia que, por sua vez, conhecem os familiares da testemunha, a quem aliás a arguida AAA contactou, à beira de ela prestar as suas declarações para memória futura, mostrando-lhe o rol de testemunhas e advertindo-a de que tinha de “pensar bem” no que viria dizer ao Tribunal.
8. A testemunha nada disse a respeito do arguido GG.
b - A testemunha QQQ reconheceu fotograficamente, a folhas 1409 a 1413, os arguidos AA, AAA e GG, reconhecendo pessoalmente os dois primeiros a folhas 2096 e 2120.
6 - Cumpre agora ponderar sobre a testemunha LLL, a respeito da qual se formou a seguinte prova:
a - 1. A folhas 1624, em declarações para memória futura transcritas a folhas 3872 e seguintes, diz que chegou a Portugal na Primavera de 2003, tendo então conhecido o arguido AA, e através deste conheceu o arguido KK, facto a propósito do qual refere que a arguida AAA lhe fez chegar um escrito, no qual lhe diz que não deve, no Tribunal, pronunciar o nome de “KK”, nem de “NN”.
2. A testemunha diz ainda que só conhecia a arguida AAA de ouvir falar dela e de vê-la nas fotografias, mas que esta arguida a visitou pessoalmente um dia antes de fazer-lhe chegar às mãos o aludido escrito, sendo que, durante essa visita, falou com a testemunha na casa de banho, e aí quis saber quais as declarações desta.
3. Quando a testemunha vivia na Praia da Rocha com outra mulher, chamada Al...... ou L...., ou Va....,, a sua casa foi assaltada, tendo então a testemunha falado com um amigo, M..., que contactou um I....n e o arguido AA, para que estes lhe dessem protecção, o que eles aceitaram, mediante o pagamento de 100 Euros mensais por cada uma.
4. Isto aconteceu em 2005, e a testemunha pagou somente dois meses, sendo certo que aceitou pagar, para não voltar a ter aquele tipo de problemas, pois convenceu-se de que o assalto à casa fora perpetrado por pessoas afectas ao arguido AA, tanto mais que já ouvira falar de “outras raparigas” que pagavam a este arguido para estarem protegidas, como a D.... e a L....
5. A testemunha ganhou, assim, medo aos arguidos AA e KK, por este ser amigo daquele.
6. A testemunha pagou somente dois meses, porque o arguido AA a encarregou de controlar o trabalho da D...., para o que fez esta mudar para a sua casa, dispensando-a de continuar a pagar protecção.
7. A situação evoluiu, e a testemunha acabou por ir viver para a casa da D...., sendo então que o arguido AA, pouco tempo antes de ser preso, lhe exigiu que voltasse a pagar 100 Euros pela protecção.
8. A testemunha viu uma vez a D...., num café, pagar dinheiro, cerca de 100 Euros, àquele arguido e, se bem que este nunca tenha ameaçado a testemunha, esta apesar disso tinha medo dele, até porque presenciou o arguido AA, na cozinha da casa da testemunha, a dizer à D.... que já matara várias pessoas.
9. Além disso, a testemunha ouviu falar da JJ, cujas fotografias afirma que viu, como sendo a antiga mulher daquele M... através de quem conheceu o arguido AA.
10. A testemunha convenceu-se de que o dinheiro pago a este arguido era para ele e para os amigos dele, embora tenha sempre feito entrega do dinheiro directamente ao arguido AA.
11. A D.... trabalhava para este arguido, e ganhava o seu dinheiro na prostituição, pagando àquele metade dos seus ganhos, sendo que exercia a sua actividade em apartamentos, primeiro no da TA, depois no da testemunha, angariando os clientes através dum anúncio no ‘Correio da Manhã’.
12. A testemunha também se dedicava à prostituição, mas quanto à D...., tinham ambas de fazer uma lista dos clientes desta, discriminando os dias e os ganhos, mas combinavam as duas escrever a mesma coisa, para a D.... poder ganhar mais algum dinheiro, assim enganando as duas o arguido AA.
13. A D...., aliás TTT, pagava semanalmente ou quinzenalmente, de 20 até 100 Euros por dia, em média, para um ganho de 40 Euros por meia hora, de que aquele arguido recebia metade, sendo o pagamento sempre num café, mas a testemunha assistiu a discussões entre a D.... e o arguido, motivadas por querer aquela passar a pagar menos a este.
14. Acresce que a D.... quis, a certa altura, voltar para a Ucrânia, mas o arguido AA não permitiu, acabando a D...., a partir de certa altura, por pagar uma quantia fixa, em vez duma percentagem, não sem que o arguido tivesse feito sentir à D.... que esta ainda tinha de trabalhar mais tempo, dizendo-lhe, entre outras coisas, que mostrava à D.... o próprio coração desta, se fosse preciso.
15. Pouco tempo antes de ser preso, o arguido AA disse à D.... que esta podia voltar a Ucrânia, se lhe pagasse dois mil e tal Euros, sendo certo que aquele arguido, para receber o dinheiro, ora aparecia sozinho, ora aparecia acompanhado do arguido KK, ora também dum certo RRR, e sendo certo que, tendo certa vez de ausentar-se, o arguido AA deixou explícito que era o arguido KK quem tratava das coisas.
16. O M... que apresentou a testemunha ao arguido AA tem o apelido Sorotskiy.
17. A testemunha pagou ao arguido AA somente por protecção, nunca por outra coisa.
b - A testemunha LLL reconheceu pessoalmente, a folhas 2079, 2100 e 2116, os arguidos KK, AA e AAA.
7 - Temos, em seguida, a testemunha CCC, a respeito da qual se formou a seguinte prova:
a - 1. A folhas 1626, em declarações para memória futura transcritas a folhas 3904 e seguintes, diz que chegou a Portugal, numa carrinha, em 27 de Fevereiro de 2005, dia esse em que conheceu o arguido AA.
2. A testemunha veio da Ucrânia expressamente para se dedicar à prostituição em Portugal, onde o Ivan - que é o arguido GG - e aquele arguido a alojaram com a TA - que é a arguida KKK - e a L... - UUU - em Albufeira, pagando 40% dos seus proventos à TA, e pagando 50% do restante ao arguido AA, sempre mensalmente, excepto no último mês, em que o pagamento era semanal.
3. Aos arguidos GG e AA pagou 2.500 Euros pela viagem, mais 500 Euros não sabe porquê, tendo ambos proposto à testemunha que pagasse 1.000 Euros por mês, ou que pagasse metade dos seus ganhos.
4. A testemunha pagava à arguida KKK, ou TA, pela publicidade, pelo alojamento e por responder às chamadas telefónicas.
5. À testemunha foi dito e repetido pelo arguido AA que, se não trabalhasse bem, poderia ficar numa cadeira de rodas para o resto da vida, e por isso a testemunha pagava porque tinha medo.
6. A TA controlava a testemunha, que tinha de dar-lhe sempre satisfações sobre as suas saídas, sendo ela quem a avisava, pelo telemóvel, sobre a chegada de clientes, por exemplo para atendimento pela testemunha e pela L... em Quarteira, numa casa paga também pela TA, e onde a testemunha e a L... viveram juntas na actividade de prostituição.
7. A TA fazia listas, o mesmo fazendo a testemunha e a L..., para controle dos clientes relativamente aos pagamentos combinados com aquela e com o arguido AA, e que recaíam sobre ganhos de 40 Euros por cada meia hora.
8. A testemunha prostituiu-se em Albufeira, em Quarteira e em Portimão, aqui juntamente com mais quatro mulheres, O..., Va....a, Y.... e uma L... diferente da de Quarteira, sendo sempre a TA quem pagava o alojamento.
9. A testemunha e as demais mulheres compravam para si alimentação e vestuário.
10. Numa altura em que o I... esteve ausente, os pagamentos a efectuar pela testemunha eram regulados pela JJ e pelo arguido AA, e quando este também se ausentou, a testemunha passou a pagar ao arguido KK.
11. Por ocasião de querer a testemunha, em Setembro de 2005, voltar para a Ucrânia, o arguido AA disse-lhe que era coisa a tratar com a JJ, a quem o arguido telefonou na presença da testemunha, mas dizendo a esta que todas as raparigas deviam trabalhar dois anos e que, por isso, não podia ir-se embora, no que lhe baixou o pagamento de 1.050 para 700 Euros mensais, vindo posteriormente a dizer-lhe que podia regressar se lhe pagasse 2.000 Euros, e sendo certo que estes factos se passaram próximo da prisão do arguido AA, terminando assim a testemunha por não ter de fazer pagamento algum.
12. Na última vez que a testemunha falou com o arguido AA, este perguntou-lhe se queria ver o seu próprio coração em cima da mesa, passando-se isto em contexto de discussão entre os dois, ao debaterem o regresso da testemunha à Ucrânia, discussão essa que recaiu em cifras diversas de pagamento por parte da testemunha, que ficou comprometida a pagar a dita quantia de 2.000 Euros para poder regressar, o que não chegou a acontecer.
13. A testemunha adoptou, para trabalhar na prostituição, o nome de D...., tal como a O.....também mudou o nome de G........para Pr.......a, sendo certo que a testemunha auferia, em média, entre 300 e 800 Euros por semana, e guardava para si, depois de feitos os pagamentos a que era obrigada, de 800 a 1.500 Euros por mês, que mandava quase integralmente para a Ucrânia, onde tem família necessitada de auxílio, designadamente uma filha de quem tem muitas saudades.
14. A certa altura, a LLL também controlava os proventos da testemunha, mas esta nada lhe pagava, antes pagava os ditos 40% à TA, além dos pagamentos ao arguido AA, a quem a O...a pagava somente pela protecção.
15. O falado preço de 40 Euros por cada meia hora foi fixado pela TA para a testemunha, para a L... e para as demais mulheres que se prostituíam, no dito contexto de que a TA pagava o alojamento e a publicidade, recebendo dinheiro das mulheres, designadamente da testemunha e da L....
16. Quanto ao arguido AA, a testemunha ia pagar-lhe o dinheiro em cafés ou no carro do arguido, que aparecia inicialmente na presença do I..n, passando a aparecer depois sozinho.
17. A testemunha não percebeu se, no contacto do arguido AA com a JJ, a última palavra foi dela ou dela, mas a testemunha sabe que esta JJ é a mulher do I...n, de quem ouviu dizer que fora preso em França.
18. Quanto ao arguido KK, a testemunha conheceu-o quando teve de pagar-lhe a ele em vez de pagar ao então ausente arguido AA, mas isto durou somente alguns dias, porque este último regressou prontamente.
19. Entretanto, a testemunha aprendeu algum português e passou a atender o telefone pessoalmente, e a TA também deixou de controlá-la, por ter ido à Ucrânia, altura em que, de resto, a testemunha passou a pagar uma quantia fixa, o que dispensava o controle.
b - A testemunha CCC reconheceu pessoalmente, a folhas 2069, 2108 e 2114, os arguidos KK, AA e AAA.
8 - Seguidamente, e pelo que toca à testemunha AAAA, formou-se a respeito desta a prova seguinte:
a - 1. A folhas 1891, em declarações para memória futura transcritas a folhas 3975 e seguintes, solicita a remoção dos arguidos presentes, durante as suas declarações, e diz que nunca veio para Portugal, antes começou a transportar pessoas entre Portugal e a Ucrânia, em ambos os sentidos, desde Novembro de 2003.
2. Uma vez, o arguido AA, acompanhado de alguns homens, designadamente o arguido GG, fê-lo parar na auto-estrada, perto de Vila Real de Santo António, e aí lhe exigiu que pagasse 200 Euros, após o que o seguiram até uma área de serviço ou de descanso, onde lhes pagou.
3. O arguido AA persuadiu a testemunha a pagar, fazendo-lhe sentir que, se o não fizesse, poderia dar azo a que acontecessem coisas à sua pessoa ou à sua carrinha, pois esta poderia incendiar-se durante a noite.
4. A testemunha começou, pois, a pagar, e para esse efeito, cada vez que chegava a Portugal, recebia telefonema do arguido AA, que depois ia ter com a testemunha para receber o dinheiro, isto é, 200 Euros.
5. Com o fim de estar informado das idas e vindas da testemunha, o arguido AA anotou o telefone daquela, que efectuava em média duas viagens de ida e volta por mês e que pagou ao arguido até que este foi preso, sendo aquele número 000000000.
6. Para cobrar o dinheiro, o arguido AA fazia-se acompanhar, se bem que nem sempre, pelo arguido GG, com que chegou a repartir a paga na presença da testemunha, sendo certo que este último veio a ser preso em França.
7. Logo de entrada, os arguidos exigiram pagamento dos passageiros também, mas os motoristas assumiram sempre todos os pagamentos.
8. A testemunha nada sabe de qualquer envolvimento das arguidas JJ e AAA ou de outras pessoas, comoFF ou Lyliya Busumura, mas viu outros motoristas pagarem ao arguido AA, sendo certo que a testemunha pagou ao arguido KK em Junho de 2005, durante uma ausência do arguido AA.
9. Certa vez, nos meses de Maio e de Junho, a testemunha pagou 400 Euros em vez de 200, assim cobrindo as quantias que seu irmão, RRR, também tinha de pagar, dado que também tinha uma carrinha e que se dedicava à mesma actividade.
10. Na véspera da sua inquirição, a testemunha foi contactada telefonicamente pelo arguido DD, que conheceu em Portugal, e este instruiu a testemunha para que, nas suas declarações, e a respeito do dinheiro que passava das mãos da testemunha para as mãos do arguido AA, dissesse que estava a emprestar dinheiro a este, não a fazer-lhe pagamentos.
11. Na Ucrânia, a família da testemunha começou a receber chamadas anónimas, comunicando que alguém iria procurar a testemunha.
b - A testemunha AAAA reconheceu pessoalmente, a folhas 2391 e 2393, os arguidos AA e KK.
9 - Temos seguidamente a testemunha ZZZ, a respeito de quem se formou a prova seguinte:
a - 1. A folhas 1524, em declarações para memória futura transcritas a folhas 3751 e seguintes, a testemunha esclarece que não mora em Portugal, mas que vem cá frequentemente desde Fevereiro de 2000, fazendo transportes entre Portugal e a Ucrânia, desde finais de 2004, à cadência de duas viagens por mês.
2. A testemunha cobra, nessas viagens, entre 130 e 110 Euros por passageiro, conforme tenham ou não bagagem, e utiliza para o efeito uma carrinha Mercedes branca, com a matrícula ........... que comporta oito passageiros.
3. Já em 2005, talvez em Fevereiro, a testemunha recebeu um telefonema do arguido AA, que lhe disse que tinha de pagar, sem que a testemunha percebesse porquê, mas pagou-lhe 150 Euros a primeira vez, e depois ainda lhe pagou 200 Euros e 250 Euros, sempre para não ter problemas.
4. Para fazer a colecta, o arguido AA fez-se acompanhar do I... e também do M...... mas também apareceu sozinho, tomando sempre, no entanto, a iniciativa de telefonar para a testemunha, sendo certo que a colecta chegou a ser feita pelo arguido KK, que foi encontrar-se com a testemunha no ‘MacDonald’s’ de Albufeira.
5. O I.....e o arguido KK também telefonaram à testemunha, este último somente uma vez, mas o I....... várias vezes.
6. A testemunha nunca recebeu ameaças directas, mas ouviu de outras pessoas que era melhor pagar, e pronto, porque todos pagam, e isto fez a testemunha recear as consequências de não pagar.
7. A testemunha não fez dois dos pagamentos exigidos, porque a carrinha sofreu uma avaria e deu uma grande despesa, pelo que esse dinheiro não lhe foi exigido.
b - A testemunha ZZZ reconheceu pessoalmente, a folhas 2073 e 2094, os arguidos KK e AA.
10 - Segue-se agora a testemunha XXX, a respeito da qual se formou a prova seguinte:
a - 1. A folhas 1524, em declarações para memória futura transcritas a folhas 3721 e seguintes, a testemunha esclarece que chegou a Portugal pela primeira vez em 18 de Abril de 2002, numa carrinha, e esteve a trabalhar na construção civil, entre Lagoa e Lagos, até Janeiro de 2003.
2. Passado um tempo, comprou uma carrinha Mercedes Sprint e começou a fazer viagens entre Portugal e a Ucrânia, transportando pessoas, que deixava também em Itália ou na Espanha, e a quem cobrava de 100 a 120 Euros cada.
3. Em 2003, houve quem o abordasse em Portugal e em Espanha exigindo dinheiro, que a testemunha, todavia, não pagou, até que, em Maio ou Junho de 2003, foi sequestrado em Portimão, de onde foi levado para Aiamonte, em Espanha.
4. Aí, retiveram-no dois dias num apartamento, onde lhe bateram e onde lhe exigiram o número de telefone de seu pai, a quem telefonaram exigindo 5.000 Euros para ele voltar a ver seu filho.
5. O pai da testemunha pediu o dinheiro emprestado a amigos, e um destes apresentou-lhe o arguido AA, que disse ao pai da testemunha que desse aos sequestradores o número de telefone dele, AA.
6. Na sequência destes factos, a testemunha dirigiu-se, em companhia do arguido AA, a uma localidade próxima de Lisboa, onde o dinheiro - 5.000 Euros, mais 3.500 Euros entretanto acordados - foi entregue aos sequestradores da testemunha, sendo a esta, então, devolvida a carrinha.
7. Em seguida, o arguido AA foi propondo à testemunha que lhe fizesse pagamentos, a fim de gozar de protecção, e a testemunha acabou por aceder, iniciando pagamentos em Março ou Abril de 2004, para evitar que se repetisse o episódio do sequestro, ou que outro semelhante viesse a acontecer.
8. Entretanto, sempre que alguém abordava a sua carrinha, designadamente em Albufeira, Quarteira, Vilamoura ou Lagos, a testemunha dava como referência o número de telefone do arguido AA, tendo como resultado que lhe era permitido seguir sem incidente.
9. Aliás, desde que começou a pagar, a testemunha deixou de ter problemas com as abordagens, tal como, de resto, lhe prometera o arguido AA, a quem a testemunha fez vários pagamentos, em valores que iam de 30 a 200 Euros.
10. Os pagamentos eram feitos pela testemunha directamente ao arguido AA, que se fazia acompanhar, ora pelo arguido KK, ora por um certo Sanya, ora pelos dois.
11. A testemunha tinha contacto telefónico com o arguido AA, que usava mais do que um telemóvel, e que recebia dinheiro de outros motoristas, conforme a testemunha chegou a presenciar.
12. Também, a testemunha viu o Ivan duas vezes em companhia daquele arguido, mas só pagou a este último, sendo certo que pagava por viagem e que fazia até duas viagens por mês.
b - A testemunha XXX reconheceu pessoalmente, a folhas 2083 e 2110, os arguidos KK e AA.
11 - Temos agora a testemunha HH, e a seu respeito formou-se a prova seguinte:
a - 1. A folhas 1525, em declarações para memória futura transcritas a folhas 3772 e seguintes, a testemunha esclarece que chegou a Portugal em 1999 e trabalhou para uma firma de Lagoa, e depois para outra de Vilamoura, tendo posteriormente, por 2004, feito transportes para a Ucrânia.
2. A testemunha utilizou para esses transportes uma carrinha Mercedes de oito lugares para passageiros, com a matrícula 60-08-AA, cobrando por cada passageiro entre 110 e 120 Euros.
3. Sabedor da actividade da testemunha, o arguido AA contactou-a num bar em Quarteira e fez-lhe sentir que tinha de pagar pelas viagens, o que a testemunha passou a fazer.
4. O arguido AA telefonava com regularidade à testemunha, a saber quais os seus planos, e depois contactava para receber em conformidade, acabando por cobrar-lhe, ao todo, mais de 1.500 Euros.
5. A testemunha pagou por ter medo, pois foi-lhe dito por aquele arguido que, se não pagasse, podia haver problemas com a testemunha, ou com a carrinha, tendo o último pagamento, de 140 Euros, tido lugar em meados de Setembro de 2005 no ‘MacDonald’s’ de Albufeira.
6. Em Agosto, a testemunha pagara 150 ou 160 Euros, e em Julho fizera o pagamento a “outro gajo”, chamado KK, a quem pagou também no ‘MacDonald’s’ de Albufeira.
7. O arguido AA recebeu dinheiro da testemunha também em Quarteira, e apareceu uma vez, pelo menos, acompanhado do Ivan.
b - A testemunha HH reconheceu pessoalmente, a folhas 2106, o arguido AA.
12 - Há ainda, porém, a testemunha RRR, da qual flui a prova que se segue:
a - 1. A folhas 1525, em declarações para memória futura transcritas a folhas 3794 e seguintes, a testemunha esclarece que faz viagens entre a Ucrânia e Portugal desde Novembro de 2004, à razão de uma ou duas viagens por mês, usando para isso uma carrinha Mercedes, matrícula 0000000000, de sua propriedade, que comporta oito passageiros.
2. A testemunha nem sempre transporta oito passageiros, frequentemente vão apenas quatro ou cinco e chega a fazer a viagem sem passageiro algum, apenas com bagagem, mas a cada passageiro cobra de 110 a 120 Euros.
3. A testemunha tem feito viagens também acompanhada por um irmão seu.
4. Carta vez, chegado a Portugal, recebeu telefonema do arguido AA, que lhe exigiu dinheiro, mais propriamente 200 Euros, e prontamente combinaram encontrar-se em Quarteira para se proceder à entrega, o que aconteceu, pois a testemunha logo se deslocou ali e encontrou-se com aquele arguido, a quem pessoalmente fez entrega daquela quantia, sendo certo que o arguido AA estava sozinho quando isso aconteceu.
5. A testemunha entregou dinheiro ao arguido AA pelo menos uma vez, e fê-lo porque seu irmão, que também tinha uma carrinha e também pagava àquele arguido, já lhe dissera que era melhor pagar, de contrário podia acontecer alguma coisa ao próprio ou à sua carrinha.
6. A testemunha pagou mais vezes, mas sem que fosse a própria a entregar o dinheiro, pois seu irmão encarregava-se de fazer as entregas de dinheiro que respeitavam às duas carrinhas, a sua e a da testemunha.
7. A testemunha observava, porém, quando seu irmão entregava o dinheiro ao arguido AA, a quem acontecia, inicialmente, fazer-se acompanhar do arguido GG.
8. Numa ocasião, a testemunha viu a JJ dentro do carro em que se deslocaram os arguidos AA e GG para fazerem a colecta do dinheiro.
9. Noutra vez, o irmão da testemunha fez a entrega do dinheiro ao arguido KK, por não estar então em Portugal o arguido AA.
10. Na última vez em que os arguidos AA e GG se apresentaram juntos, faziam-se transportar num veículo Volkswagen Passat azul escuro, sendo certo que, em regra, o arguido AA utilizava uma carrinha Peugeot.
11. Depois da prisão do arguido AA, a testemunha continuou a fazer transportes, mas não voltou a fazer qualquer pagamento.
b - A testemunha RRR reconheceu pessoalmente, a folhas 2081 e 2102 os arguidos AN.. KKKK e AA.
13 - a - A prova mostra-se dividida em duas partes fundamentais, a saber, a que se formou na fase de inquérito e a que veio a constituir-se durante a audiência.
b - Da fase de inquérito, há a destacar a prova que flui das declarações para memória futura e dos reconhecimentos pessoais - e que se acaba de ver - e bem assim a que resulta das escutas telefónicas, estas consubstanciadas nas transcrições apensas aos autos, a todas servindo de complemento os reconhecimentos fotográficos, os relatos de vigilância e seguimento, as fotografias obtidas durante estes e os autos de apreensão, bem como abundante e vária documentação junta aos autos.
c - Do que se obteve em audiência, destacam-se as declarações prestadas pelas testemunhas pertencentes ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, prova que é a conjugar com a anterior, em obediência, cronologicamente ou não, ao que manda o senso comum e ao que determinam critérios achados na lógica e na experiência.
d - Do valor de todo este acervo probatório se deixará justificação suficiente.
14 - As escutas telefónicas revelam-se, nos presentes autos, como o paradigma da necessidade instante de acompanhar o comportamento de suspeitos, cujos actos e motivações poderiam, doutro modo, perder-se na diluída amálgama do dia a dia.
15 - a - Dentre as escutas mais precoces, uma há de 29 de Junho de 2005 a surpreender uma conversação entre os arguidos II e EE, na qual estes falam de trabalho, de falta de emprego e de dificuldades de dinheiro - e conversa mais inocente não se poderia conceber, mas nela, como noutras, se manifesta de imediato a necessidade de descodificar, para lá da tradução, certas maneiras de dizer típicas das línguas eslavas.
b - As melhores traduções de autores eslavos, com as suas anotações, encontram-se ao obrigatório alcance de todos, pela necessidade, não apenas cultural, de conhecer DO.... Tol....ï, G...., etc, e nelas se encontra o culto, tipicamente eslavo, e literariamente delicioso, do diminutivo - Na.......a por Nat...., Tâ..... por TA, M... por M...., P.... por P...., V... por I..., I... por I...., M.... por Ma...a, e assim por diante.
c - 1. Assim, na escuta da conversação aludida, vemos que o arguido FF se dirige ao arguido II chamando-lhe P........ka, e este pergunta àquele se está com o V.....a.
2. O arguido FF é irmão do arguido separado CCCC, habitualmente tratado pelo diminutivo V...., e a ele se refere, claramente, o diminutivo V......ka que aqui se encontra.
3. Na mesma conversação, de resto, o arguido II termina por tratar o arguido FF pelo diminutivo V....a, muito encontrado nos autos.
16 - a - Já em 17 de Julho, há um contacto entre o dito CCCC, aliás V...., e seu referido irmão, que passa o telefone a um KK, e este é pelo mesmo V.... tratado por HH, e a conversa refere-se a J.... - que é o arguido AA - e a M..., que é no caso o arguido DD, a não confundir com outro M..., que é o antigo marido da arguida JJ, de seu nome FFFF.
b - Dir-se-ia que, neste contexto, também J.... pode ser outro AA que não o arguido AA mas nos autos não há lugar a semelhante ponderação, dado que as restantes escutas, além de não deixarem dúvidas sobre a inelutável coincidência entre o personagem J.... e o arguido AA.
c - Quanto a V...., é este o arguido separado CCCC, mas não é, por sua vez, a confundir com um condutor V...., nem com outro V...., estoutro residente na Ucrânia, onde o arguido AA não o visitou durante a sua ausência de Junho para Julho de 2005, tendo este então de explicar-se, quer perante essoutro V...., quer perante outro personagem, que trata o arguido AA por “velhote”, e a quem este fala cerimoniosamente e com deferência (San Sanitch em 20 de Julho de 2005, a quem o arguido AA explica que não esteve na Z.......tia, que é onde, na Ucrânia, reside o outro dito V....).
17 - a - O referido diminutivo An..... surge numa escuta anterior, de 24 de Junho de 2005, a mais antiga registada nos autos, na qual um KK se identifica a si mesmo como An..... a um certo K.... que, da Alemanha, telefona para o telemóvel do arguido AA para falar com KK ou com Sanya.
b - Na realidade, o arguido AA deixou o seu telemóvel na posse do arguido KK, para que este agisse em seu lugar durante a viagem que fez à Ucrânia, e por isso o An...a identificado nesta chamada é o dito arguido KK, a quem o arguido AA, aliás, chama a atenção, noutro contacto, para que ele está a usar o seu telefone.
c - No entanto, o arguido AA regressou no dia 14 de Julho de 2005 e, ao tempo da escuta de 17 deste mês, já recuperara o seu telefone, que prontamente recomeçou a usar.
d - Este facto condiz com o uso, pelo primeiramente citado An...a, do telefone do arguido FF na sua conversa com o V...., e o contexto nada tem a ver com o outro FFF conhecido nos autos, e que é o arguido FFF, homem de mão sem latitude para pedir instruções ao V.... relativamente, segundo parece, à entrega dum telefone ao arguido AA, a quem, no indicado dia 17 de Julho, o V.... faz menção de telefonar para recuperar os “ba-.......”, palavra que vem traduzida como “dinheiro” em várias notas de tradutor, e que corresponderá ao jargão português “carcanhóis”.
18 - a - Em escuta de 25 de Julho de 2005, aliás, o arguido FF comunica-se com um certo Kostia, e aí mostra algo da sua personalidade, quando diz a este que “falta só ir e roubar” e quando lhe diz, em linguagem rebarbativa, que não presta a caixa de velocidades “desse carro roubado”.
b - Nesta mesma escuta se levanta o véu doutra realidade, quando o arguido FF confirma ao mesmo Kostia que está em Olhão, nas barracas onde mora “o V...., o V.....a”, isto é, seu irmão CCCC.
c - Essoutra realidade, que aqui aflora, mas que se revela mais agudamente ao longo das escutas, vem a ser a de que os arguidos, a despeito de forçarem conterrâneos seus a entregarem-lhes dinheiro para se eximirem a dissabores, nada têm de abastados, pois vivem em condições de profunda miséria moral, e de latente miséria material, camuflada pela posse de carros que, todavia, não são novos, e nem é certo que tenham sido propriamente comprados.
d - Aliás, com excepção dos arguidos AA e FFF, bem como das arguidas mulheres, todos os demais arguidos revelam, nas escutas, que têm problemas com os seus postos de trabalho, por exemplo manifestando contrariedade por estarem livres somente a determinada hora - livres, entenda-se, para corresponderem às necessidades de intervenção expressas, sobretudo, pelo arguido AA, a quem, diga-se desde logo, cabe o papel mais proeminente no contexto dos autos, visto como o arguido GG foi preso em França a certo ponto, apenas o arguido AA restando no papel de coordenador, ou, como o próprio diz numa escuta de 15 de Agosto de 2005, no papel de “pakhan”, algo como padrinho da máfia (“cabecilha dum grupo criminoso”, como se vê em nota do tradutor).
19 - a - Vem porventura a propósito esta escuta de 15 de Agosto, onde HHH, agora companheiro da vítima PPP, formula ao arguido AA o desejo de lhe falar em Albufeira.
b - O arguido AA, que trata o dito HHH como ‘Pa.........r’, ou seja, cabeleireiro, pergunta-lhe na sua rebarbativa linguagem: “Cagaste-te, querido?” - ou seja, pergunta-lhe se ficou com medo - e no seguimento da conversa pergunta-lhe: “Agora és ‘pakhan’ em Portimão, ou como é que decidiste?” - e perante a estupefacção do seu interlocutor, diz-lhe: “Eu tenho razões para falar assim! De peso!”.
c - 1. É o depoimento de PPP, já examinado, que faz luz sobre esta conversa, e a sua mais minuciosa transcrição para este acórdão, aliás como se vê a folhas 3945 a 3947, permitirá melhor atentar no seu conteúdo.
2. Assim, PPP descreve que passou a viver com HHH e que este um dia recebeu uma chamada telefónica, e era o J.... que pretendia 1.000 Euros, para autorizar que o dito RRR continuasse a viver com uma mulher que, até então, lhe era tributária de rendimentos - as “razões de peso” do arguido AA.
3. O aludido RRR pediu prazo para pagar, porque não tinha o dinheiro, e finalmente esta PPP, o referido HHH, e os arguidos AA, VV e FFF encontraram-se em Albufeira, ao pé do ‘MacDonald’s’, onde o mesmo RRR entregou o dinheiro ao arguido AA.
d - Temos assim que, no mesmo dia 15 de Agosto, o arguido VV contacta com o arguido AA - “J.... olá, é o Vlad que está a telefonar outra vez” - e diz-lhe que “o P..... veio completamente branco”, isto é, branco de medo, revelação que diverte o arguido AA, ficando ambos despedidos “até quarta-feira”.
e - 1. Em escuta de 17 de Agosto de 2005, o arguido VV liga novamente ao arguido AA, a fim de se encontrarem no ‘Leclerc’ de Portimão, isto por decisão deste último, que pergunta ao arguido EEE: “e o RRR vai lá ter sozinho, ou como?”, dizendo-lhe em seguida: “agarrem-no pelos tomates e tragam-no, eu telefono-lhe e ele não atende, cabrão”, ao que o arguido EEE responde “está bem, então passamos para o buscar”.
2. Pouco mais tarde, o arguido EEE comunica ao arguido AA que o arguido FFF acompanha o dito HHH ao Leclerc: “pronto, apanhámo-lo, o An...a vai com ele” - mas este “An...a” é o único FFF presente no episódio, o arguido FFF
3. Pouco mais tarde, o arguido EEE liga mais uma vez ao arguido AA a dizer que “ele está a pedir mais dois ou três dias”, referindo-se ao mesmo RRR, e isto irrita o arguido AA, que pragueja “que dá alguma coisa já, para o caralho dois ou três dias”, redarguindo o arguido EEE “como é tirar se não tem?”, observando o arguido AA “que vá pedir emprestado à M...”, referindo-se a PPP, acabando o arguido EEE por perguntar “então ir ter com ele e pressionar de maneira mais dura?”, respondendo o arguido AA “então, claro”.
4. Momentos mais tarde, HHH telefona ao arguido AA a dizer “Jeka, eu preciso de dois ou três dias, eu dou tudo, mas simplesmente agora isso é irreal, não tenho mesmo”, o que provoca um acesso de ira ao arguido AA: “por que é que tu não disseste logo? foda-se, és idiota ou quê? passa o auscultador aos rapazes”, e tendo um dos dois arguidos -EEE ou FFF - ao telefone, ordena “combinem o dia, a data, tudo com exactidão”, e ainda “que dê a palavra, caralho, e que a cumpra, e se não cumprir, foda-se, batam-lhe até ficar corcunda, caralho, entendeste?”, recebendo um “está bem, está bem” de assentimento.
f - 1. Em escuta de 18 de Agosto de 2005, o arguidoEEE liga ao arguido AA, a dizer que o ‘P......r’ não quer entregar-lhes o dinheiro a eles - “ele não o quer entregar a nós” - ou seja, aos arguidos EEE e FFF, insistindo em entregá-lo pessoalmente ao arguido AA, que dá o seu assentimento, ordenando “venham juntos, ouvem?”.
2. Algum tempo depois, o dito RRR telefona ao arguido AA a dizer que não quer a companhia dos arguidos EEE e FFF - “eu queria ir sozinho, não preciso da ajuda deles” - recebendo como resposta a observação seguinte, sintomática, aliás, do contexto de todo este processo: “eu entendo, mas os assuntos não são tratados assim”, acabando por combinar encontro no ‘MacDonalds’ de Albufeira.
3. Mais tarde, o arguido AA pergunta a V...m - diminutivo óbvio de V...v, para além de V..d, inculcando aliás que ao volante vai o arguido FFF - “onde é que vocês estão?”, ao que o arguido EEE responde “nós já estamos a chegar a Albufeira”, acrescentando a respeito do dito HHH “ele não precisa de ajudantes, ele é que disse”.
g - 1. A sequência já não consta das escutas, pois a cena foi acompanhada e contemplada por inspectores do SEF, que tudo observaram em pormenor, somente não identificando o quantitativo pago ao arguido AA pelo aludido HHH.
2. A vítima PPP, no entanto, confirmou que o seu companheiro RRR pagou 1.000 Euros ao arguido AA, tal como confirmou a presença dos arguidos EEE e FFF, presença, aliás, confessada por este último, invocando que estava ali por acaso e sem conhecimento do que se estava a passar.
20 - a - É importante, a este ponto, um breve parêntesis para esclarecer uma questão da mais transcendente importância no tipo de crimes aqui em apreço.
b - A “arte” - permita-se a expressão - de exigir dinheiro pela força consiste, predominantemente, numa exibição dessa mesma força, e só raramente no seu efectivo exercício, e daí a observação do arguido AA ao referido HHH de que “os assuntos não são tratados assim”.
c - A presença de “gorilas” - permita-se, mais uma vez, a expressão - no acto de recolha dum pagamento forçado tem sua semelhança com a presença de armas num assalto à mão armada, em que o seu uso não é desejado por ninguém, tal como num pagamento à força ninguém deseja o emprego dessa mesma força, mas esta tem de estar latente, de contrário o extorquido não se deixará extorquir.
d - Uma imagem ilustrativa pelo método cartesiano do absurdo permite ver, com plena clareza, até que ponto vai a realidade da extorsão organizada.
e - Assim, se alguém em sua casa for visitado pelo vizinho do lado, e este exigir dinheiro - “dá cá mil euros” - o mais natural é que a polícia acabe por ser convocada e o exactor desista da ideia.
f - Mas se o visitado se vir na presença de alguém que lhe diz: “amanhã, a tal hora e em tal parte, entregas mil euros a fulano, que vai lá estar” - e esse visitado souber que esta suave “informação”, dita porventura com um sorriso para não levantar suspeitas, tem subjacente um grupo que, na falta do pagamento, o espancará brutalmente na primeira vez em que tal se proporcione, então o pagamento acontecerá.
g - Qual foi a violência exercida sobre a pessoa a quem, para mais com um sorriso, foi dito que pagasse mil euros? Quem lhe bateu? Quem fez ameaças de morte? Quem apontou armas? Não houve qualquer violência efectiva, com efeito.
h - O que houve, e há, e persistirá como distintiva marca do crime de extorsão por grupo organizado, é a violência latente, a expressão de força potencial, decorrente, no caso, da presença dos arguidos EEE e FFF.
i - Daqui, porém, só uma conclusão é possível extrair: o extorsionário tem de dispor dum grupo minimamente organizado, que constitua a sua reserva de força, a sua “artilharia” por assim dizer, para poder impor-se às suas vítimas discretamente e sem exuberâncias que chamem a atenção da polícia.
j - Por outras palavras: não é concebível, em teoria sequer, que alguém obrigue prostitutas, ou condutores, ou quem quer que seja a desembolsar quantias do seu labor e sustento, a não ser que esteja rodeado duma organização suficientemente poderosa, eficiente e violenta para se sobrepor àquelas pessoas.
l - Organização violenta não significa organização que em todos os casos efectivamente exerça violência, o que significa é que, em todo e qualquer caso, e sendo preciso, efectivamente exercerá a violência.
m - No caso dos arguidos neste processo, pretender demonstrar que não há qualquer organização criminosa equivale, na realidade, a querer fazer a demonstração de que o arguido AA, por exemplo, convenceu as prostitutas e os condutores a fazerem-lhe pagamentos pela simples manifestação da sua encantadora personalidade.
21 - a - Nesta sequência, serão sobremaneira esclarecedoras a escutas atinentes à vítima DDDD.
b - DDDD foi espancado pelo arguido DD e por outros indivíduos que, no carro a que atraíram a vítima, lhe infligiram pancadas de toda a sorte e com a maior brutalidade, tudo por ordem do arguido separado CCCC.
c - Tudo terá começado por ter o dito CCCC, ou V...., ou Bomba, furtado, roubado ou extorquido algum dinheiro a um certo M ...o, aparentemente seu colega de trabalho.
d - 1. Em escuta de 20 de Agosto de 2005, sobre um contacto telefónico entre o mesmo V.... e um certo Miron, que reproduz uma conversa com um certo Spasskiy, o qual terá perguntado ao dito Miron “onde está o Bomba”, segue-se uma referência vaga a alguém que queria o dinheiro do KK, e a isto o V.... reage violentamente: “resumindo, o paneleiro disse ao M....o que eu “saquei” dele o dinheiro”, acrescentando “eu agora parto-o em casa, cabrão, por causa dessa treta toda, eu agora telefono daqui, os rapazes amanhã vão encontrá-lo, cabrão, eu sei de tudo, onde ele mora, o paneleiro fodido”.
2. O certo é que no mesmo dia, cerca de duas horas mais tarde, o arguido DD recebeu do dito V.... uma chamada num telemóvel que ele, arguido DD, usava, com o número 000000, tendo-lhe o V.... dito “verifica nos bolsos dele”, ao que o outro respondeu “sim, nós vamos ver, nós atiramo-lo cá para fora, caralho, e vamos embora”.
3. Minutos depois, o arguido DD ligou ao V.... dizendo “pode ser que seja para tirar alguma coisa a alguém”, querendo isto dizer que se tratava de simular o roubo como móbil do espancamento a DDDD, pois o mesmo arguido continua, dizendo “nós agora tiramos-lhe o telefone, ele não tem mais nada”, esclarecendo ainda ao V.... que “ele está deitado na estrada, porque ali arrancou um carro e nós “bazámos”, sugerindo ainda ao V.... que o irmão deste, o arguido EE, passe por ali de bicicleta, “lá está o V..... de bicicleta, pode ser que o V..... venha de bicicleta ver, sabes? para não acontecer uma treta qualquer”.
4. De facto, um tanto mais tarde, o arguido EE telefonou ao seu irmão V.... dizendo “está deitado, feito cadáver, foda-se”, informando que “está aqui o português que vive nas barracas, perto” e recomendando ao V.... “seja atento, eu agora volto a telefonar-te, vou andar por aqui, pode ser que vou saber alguma coisa”, respondendo o V.... “está bem, está bem, ele pelo menos está vivo? recuperou?”, acabando o arguido FF por dizer-lhe que “ele não fala, está deitado, nem muge”.
5. Minutos mais tarde, o dito V.... liga ao arguido DD a increpá-lo, “ouve, o que é que vocês lhe fizeram, que ele não respira? está deitado feito cadáver”, seguindo-se este diálogo: “não respira?”, “eu não sei, vocês deram cabo dele, ou quê?”, “nem o caralho, no carro, sabes, demos-lhe um par de vezes com a palma da mão no focinho, caralho”, “quem? quem?”, “eu bati, ele saiu ui! ui!, o Y... deu-lhe debaixo do esterno, caralho, deu-lhe duas vezes no esterno, foda-se, e ele começou hã! hã!, entrámos no carro e “bazámos”, desabafando depois o V.... que “eu estou preocupado para ele não chamar os bófias, caralho” e “vocês exageraram, caralho”, defendendo-se o arguido DD “porquê exagerámos? ninguém lhe bateu, V...., demos um par de vezes com a palma da mão”.
6. Ainda no mesmo dia o V.... e o arguido DD discutem por causa do telefone tirado a DDDD, num contexto em que o V.... se queixa de que alguém - o próprio DDDD - está a bater à sua porta aos gritos de “vou à polícia, vou à polícia, devolve o telefone, caralho”, perguntando o V.... “como sabe que eu estava com vocês no carro, caralho?”, inculcando isto que o V.... saiu do carro antes do espancamento, esperando não ser visto, e a uma pergunta do arguido DD sobre se a vítima “está mal”, o V.... responde “não, não te preocupes, é tudo treta”, acrescentando “ele diz que quer o telefone e tudo o resto amanhã, tipo, o resto sem problemas”, acabando o arguido DD, na perspectiva de que o telefone vai ficar para o V...., por dizer a este que “tu já nos deves dez euros, nós já avaliámos, já nos deves dez euros”, dando assim uma ideia da modéstia das “tarifas” cobradas por este tipo de “trabalho”.
e - 1. Em escuta de 21 de Agosto de 2005, o V.... e o arguido DD falam sobre o tabaco e o dinheiro que a vítima DDDD exige.
2. O arguido DD explica que procuraram no local, “nós andámos para a frente e para trás, e não há nem o caralho, não há cigarros, nem dinheiro”, e perante a insistêncoa do V.... - “ele disse que pediu ao patrão para comprar comida amanhã, a comida, a treta toda” e “caralho, tiraram os cigarros, foda-se, o telefone, e estava lá a “guita” - o arguido DD esforça-se por explicar melhor, “eu vi pessoalmente, estás a perceber? eu estacionei o carro, chegou o An.....a, andou para a frente e para trás, eu para a frente a para trás, procurámos, procurámos, não há nem o caralho, V....”, o que levou o V.... a exclamar “M..., M..., eu acredito”, assim libertando o arguido DD da suspeita de que tivesse guardado o dinheiro para si, sem dizer nada ao seu superior hierárquico.
22 - Uma escuta do mesmo dia 21 de Agosto de 2005 surpreende outra conversa entre o arguido DD e o V...., da qual resulta o modo de vida destes, e dos demais, fora das horas do trabalho, ou quando não trabalham, dizendo o arguido DD “ele agarrou-me no braço, sabes, eu dei-lhe como deve ser, na tola, caralho, ele depois, sabes, como fosse agarrar-me na perna, demos-lhe pontapés”, perguntando o outro “então não vai haver nenhum? ele não tem nem o caralho?”, respondendo o outro “nós tirámos um par de rublos e pronto”, assentindo o V.... “entendido” e fechando o outro “é assim, nem chega a uma centena” - e na sequência disto, em escuta do dia seguinte, 22 de Agosto, o arguido DD queixa-se do trabalho, “e não sei se vou amanhã, dói-me o dedo do pé, caralho, ficou azul”, o que deixa bem explícita a violência dos pontapés aplicados no dono do “par de rublos”, cujo total “nem chega a uma centena”.
23 - Intercalarmente, convém observar que as escutas - revelando a pitoresca e rebarbativa linguagem dos escutados, aliás típica do seu estrato social, e condizente com a sua violenta forma de vida - fornecem quadros sucessivos e bem ilustrados das actividades que justificaram as intercepções telefónicas, dando a imagem do quotidiano criminoso dos visados de modo tão explícito, tão gráfico e tão vívido, que a sua leitura, e posto que para elas se tem de remeter, por nem fazer sentido a sua integral reprodução aqui ipsis verbis, revelará sempre o que, na realidade, fez cada um dos arguidos, ressalvadas algumas lacunas, em parte justificativas, aliás, da matéria de facto não provada.
24 - O relacionamento com os condutores de carrinhas flui das escutas num contexto de linearidade, em que o pagamento das quantias assume um papel, por assim dizer, exclusivo, tornando outros assuntos - transporte de encomendas, busca de uma bagagem perdida da vítima CCC, transporte da arguida JJ para França, em visita ao arguido GG, etc - meramente secundários, e alguns exemplos vão ficar expressos por forma a que a parte forneça uma ideia clara do todo.
25 - Assim, de Junho de 2005, temos as seguintes escutas relativas aos condutores das carrinhas:
a - Do dia 26 - O arguido AA telefona da Ucrânia para o arguido KK, este na posse do telemóvel do primeiro, e dá-se, a certa altura, o diálogo seguinte entre J.... (J) e KK (A), por esta ordem e por excerto: (J) “telefona para aqueles números para os motoristas, o que se passa aí, eles pagam, não pagam?”, (A) “eu telefono, eu telefono”, (J) “sim, então pronto”, (A) “resumindo, por duas viagens devem... um e outro agora devem-me pagar por duas viagens”, (J) “quem?”, (A) “no dia vinte e nove”, (J) “quem? Y...?”, (A) “Y... e mais, eu agora vejo para ti”, (J) “V..., V... do Caravelle”, (A) “eu tenho tudo apontado” - e aqui sobressaem os condutores ZZZ e HH.
b - Do dia 28 - O arguido AA telefona da Ucrânia para o arguido KK, este na posse do telemóvel do primeiro, e para um Sanya, tendo lugar o diálogo seguinte entre J.... (J), S.....a (S) e KK (A), por excerto: (S) “espera, diz um par de palavras ao An...a”, (J) “An...a, não larguem os condutores”, (A) “não largo, eu telefono constantemente”, (A) “o mal é que tu não me apresentaste a eles, não os mostraste”, (J) “então, An...a, houve tempo?”, (J) “eu fui porque recebi a chamada”, (A) “eu tenho tudo escrito, quem disse o quê, quem e como se “safou”, sabes?”, (A) “quem disse que paga por duas viagens, em que dia é que disse, em que dia chegou, saiu, tenho isso tudo apontado”, (J) “P.....ra não pagou, não?”, (A) “o P.....ra ainda não pagou, ele devia ter ido, não telefonou, eu telefonei-lhe, o telefone não toca agora”, (J) “escreve tudo, escreve tudo sobre todos”, (J) “está bem, está bem, An...a, não é pelo telefone, tu estás a falar no meu telefone”, (J) “telefonem para todos os condutores”, (S) “sim, o An...a telefona”, (J) “se está a tocar e eles não atendem, então insistem, telefonam de outro telefone, apanham”, (J) “Caravelle 200, Sprinter 250, não levam menos”, (J) “dizem que vos disseram assim, se deu menos, então escrevem na lista o nome e quem é” - e aqui há a salientar, além do mais, uma chamada telefónica que obrigou o arguido AA a ir precipitadamente à Ucrânia, donde telefona, e uma alusão ao condutor P.....ra, isto é, o AAAA ou o RRR, mais provavelmente o primeiro, que as escutas mostram mais em contacto com o arguido AA, sendo claro que a carrinha Caravelle paga 200 Euros e a carrinha Sprinter paga 250 Euros.
26 - De Julho de 2005, há as seguintes escutas relativas aos condutores das carrinhas:
a - Do dia 14 - O arguido AA telefona do seu telemóvel, que estava em poder do arguido KKKK, e J.... (J) e KK (A) falam do seguinte modo, por excerto: (A) “ouve, eu tenho lá uma centena, eu ontem fui buscar àquele, deu cento e cinquenta”, (J) “a quem?”, (A) “ao V..., ao V... da carrinha vermelha”, (J) “ele cento e cinquenta”, (A) “cento e cinquenta, queixou-se, abriu a carrinha para mim, tipo: encomendas de treta, poucas, eu disse: tu vê lá, eu digo tudo o que eu vi”, (J) “tu escreves tudo, quem deu o quê, as datas, quando e como?”, (A) “eu ontem escrevi tudo, tenho na minha agenda”, (J) “precisamos sistematizar tudo, sistematizar cada condutor à parte, quantas viagens” - e vê-se aqui a alusão ao condutor HH, ou V....
b - Do dia 15 - O arguido AA telefona ao condutor XXX, desenrolando-se, por excerto, o seguinte diálogo entre J.... (J) e XXX (AP): (J) “quantas vezes viajaste enquanto eu não estava?”, (AP) “eu naquela altura, quando acertei as contas contigo em Albufeira, ainda viajámos duas vezes com o Y..a e pronto”, (J) “tu tinhas entregue o dinheiro aos rapazes?”, (AP) “claro que entregámos”, (J) “e porquê só duzentos, e não duzentos e cinquenta como tínhamos falado?”, (AP) “simplesmente está fraco com a carga e com as pessoas, nós fomos os dois, eu e o Y..a, no mesmo autocarro”, (J) “vocês estragam o relacionamento, foda-se, mal nós desaparecemos, pronto, começou a manhosice”, (J) “quando é que tu vais?”, (AP) “hoje à noite, ou amanhã de manhã”, (AP) “o dinheiro está com o Y..a, e ele paga por mim”, (J) “duzentos e cinquenta cada” - e nesta conversa fala-se do condutor ZZZ, ou Y..a.
c - Do dia 17 -
1. A arguida JJ telefona ao arguido AA, e o diálogo entre eles, J.... (J) e JJ (I) é, por excerto, o seguinte: (I) “acabei de chegar com o UUUU”, (J) “por que ele não me telefonou? o XXX foi-se embora e não pagou, foda-se, durante esse tempo todo, eu tenho cá as listas, aqui os rapazes recolheram cerca de mil e tal de todos os motoristas”, (I) “estás a ver? eles estiveram, vieram e foram-se logo embora”, (J) “aqui enganavam e iam-se embora, vinham Y..a e XXX como se fossem viajar na mesma carrinha, foda-se”, (I) “eles vieram na mesma carrinha juntos”, (J) “por que era assim?”, (I) “porque sim, isso seu sei”, (J) “mas Y..a agora foi-se embora e não pagou, o XXX foi-se embora e nem telefonou mesmo”, (I) “eles já vão fazer a terceira viagem este mês”, (I) “e mesmo assim, ou duzentos cada, ou não pagaram, ou depois pagam”, (J) “quem foi buscar dinheiro em Lagoa? dos condutores?”, (I) “eu não fui buscar”, (J) “alguém foi buscar e disse “entrego ao V... e ao J...a”, daquele V.... gordinho, daquele homem, do azul, nem um tostão, eu estou a dizer-te que é cerca de mil e cem” - e aqui fala-se dos condutores AAAA, ZZZ, XXX e dum condutor V...., ou seja, CCCC, dando a impressão de que, na ausência do arguido AA e da sua atitude disciplinadora, os condutores tiveram artes de convencê-lo de que não podiam pagar porque já tinham pago a alguém não determinado que viera da parte do V... (arguido GG) e do J.....a (arguido AA).
2. O arguido AA telefona ao condutor AAAA a increpá-lo, aliás, e por excerto, nos termos seguintes entre J.... (J) e o condutor (EP): (J) “por que é que tu, UUUU, não me telefonas?”, (J) “Por que é que tu não pagaste? Os rapazes vieram ter contigo, davas duzentos, não pagavas, por que é que tu fazes assim, UUUU?”, (EP) “como não paguei? eu só ainda devo pagar por uma viagem”, (J) “e porquê duzentos? nós falámos que são duzentos e cinquenta, UUUU”, (EP) “bolas, J...., então...”, (J) “então o quê? então o quê, UUUU?” - e eis como é clara a zanga do arguido AA pela aparente “fuga ao fisco” do condutor AAAA.
3. Um certo KK fornece ao arguido AA o telefone 000000000, da rede de Faro, pertencente a um outro KK, e recebe do arguido a recomendação “tu aí também não faças asneiras, traz o dinheiro no dia 1”, ao que o outro balbucia “então isso... eu ainda não recebi, eu só há uma semana é que comecei a trabalhar, eu...” - o que dá a indicação segura de que se trata dum trabalhador por conta de outrem, como alguns dos arguidos, mas estranho ao “círculo” destes e por isso obrigado a pagar-lhes, de preferência no dia 1.
d - Do dia 20 - O condutor AAAA telefona ao arguido AA, e do diálogo entre J.... (J) e o condutor (EP) vai extraído o seguinte: (EP) “na próxima viagem um homem dá-me duzentos e eu dou-te estes duzentos”, (J) “preciso de dinheiro para o V...”, (J) “UUUU, tu tens tanta gente, filho da puta, tu estás cheio de carga”, (EP) “duzentos eu dou-te na próxima viagem, sim?”, (J) “duzentos e cinquenta, UUUU”, (EP) “mas cinquenta, tu disseste que eu trouxe a JJ...”, (J) “mas tu deste duzentos, não deste cinquenta pela vez anterior, porque tu trouxeste a JJ, tu deste cinquenta a menos, tu deste duzentos”, (EP) “todos dão duzentos e cinquenta, e tu dizes-me: todos deram duzentos e cinquenta cada um”, (J) “claro, claro”, (EP) “e eu dou-te duzentos e cinquenta”, (J) “claro”, (EP) “dão todos duzentos cada um, e eu dou duzentos”, (J) “está bem” - e aqui se vê um reacerto das regras, querendo este condutor pagar não mais do que os demais pagam, no que recebe o assentimento do arguido.
e - Do dia 28 - O arguido AA liga ao condutor HH, e do diálogo subsequente entre J.... (J) e o condutor (IA) vai extraído o seguinte: (J) “por que é que tu não telefonaste a dizer que vieste?”, (IA) “não sabia que estavas cá, vou telefonar para quê?”, (J) “como é que não sabias, o An...a estava cá, os rapazes estavam cá, porquê?”, (J) “quantas pessoas é que tu tinhas?”, (IA) “cinco”, (J) “V..., V...!”, (IA) “sim”, (J) “é preciso telefonar, eu não sou eu, qual é a diferença? aqui não sou eu, represento, nem o KK, nem ninguém, aqui representam todos completamente outras pessoas, tu entendeste-me ou não?”, (J) “pergunto se percebeste”, (IA) “sim” - e aqui vê-se o arguido AA a frisar ao seu interlocutor a existência da organização e do modo como é preciso manter a mesma linha de conduta, no caso, telefonar a dizer que chegou, para poder ser feita a cobrança, pois o próprio arguido tem contas a prestar a “outras pessoas”.
27 - De Agosto de 2005, há as seguintes escutas relativas aos condutores das carrinhas:
a - Do dia 5 -
1. O arguido AA recebe telefonema de Espanha, de um condutor chamado A----kadiy, e do diálogo subsequente entre J.... (J) e o condutor (A----k) vai extraído o seguinte: (A----k) “agora é preciso ir para recuperar dinheiro”, (J) “e como é que nós vamos resolver?”, (A----k) “como? resolver o quê? está tudo normal”, (J) “então? ou o Y..a é que dá?”, (A----k) “sim, o Y..a entrega-te”, (J) “dá quatrocentos e esta ida, não é?”, (A----k) “e não me baixas mais cem? porque eu dei pelo visto, se puderes”, (J) “quanto é que tu lhe entregaste?”, (A----k) “eu entreguei-lhe trezentos”, (J) “tu queres por duas vezes?”, (A----k) “sim, sim”, (J) “então vamos fazer assim”, (J) “se eu sair, tu não vais saber o telefone francês, aqui fica o rapaz, o KK, entendeste?”, (J) “ele está a par de todos os assuntos, todos o conhecem, em Espanha, conhecem em todo o lado, entendeste?”, (A----k) “está bem”, (J) “para não ficares admirado porque o KK vai falar, então vais combinar com ele se eu não estiver” - e vê-se como, desta feita, o arguido AA procura eximir-se a faltas de pagamento pelos seus “contribuintes”, desde logo avisando este condutor de que o arguido KK vai mandar na sua ausência, num contexto em que o condutor A---....diy fica de entregar ao condutor ZZZ dinheiro para o arguido.
2. O condutor ZZZ telefona ao arguido AA, e do diálogo subsequente entre J.... (J) e o condutor (Y) vai extraído o seguinte: (Y) “cheguei agora mesmo, estou a telefonar”, (J) “quantas pessoas é que tu trouxeste?”, (Y) “três pessoas”, (J) “o A----kacha entregou-te?”, (Y) “entregou sim”, (Y) “ele deu-te nas mãos?”, (J) “não, ele telefonou-me”, (Y) “lá deve ser trezentos, não é?”, (J) “sim, foi o que ele disse” - e esta conversa, no seguimento da anterior, dá-nos mais um diminutivo, A----kacha por A----kadiy, no contexto da fiscalização do arguido AA, atento aos seus interesses.
b - Do dia 6 - O arguido AA recebe uma chamada de um certo V.....a, e do diálogo subsequente entre J.... (J) e V.....a (V) vai extraído o seguinte: (V) “parece que sei aproximadamente onde é que mora aquele paneleiro”, (J) “é preciso encontrar, eu devo-vos uma dezena, devolvo”, (V) “tu não podias emprestar-me um par de centenas?”, (J) “eu não tenho”, (J) “vinte ou trinta euros, não tem conversa, mas duzentos...”, (J) “encontra aquele caralho, foda-se, e tiramos, vamos hoje e tiramos”, (V) “se eu o encontrasse, então claro que eu logo batia nele e tirava o dinheiro, mas eu ainda não sei ao certo onde é que ele está”, (J) “eu também paguei o apartamento, paguei oitocentos pelo carro, foda-se”, (J) “não tenho nem o caralho”, (J) “estou às custas da Irka” - resultando claro que os dois interlocutores gostariam de saber ao certo onde pára determinado indivíduo, para lhe baterem e lhe tirarem o “par de centenas” almejado pelo dito V.....a, contexto em que surge outro diminutivo, I....a por , mulher do arguido AA, a expensas de quem este diz que se encontra... Em escuta de 17 de Agosto, no entanto, o referido indivíduo está já localizado pelos mesmos dois interlocutores.
28 - Outras escutas há, nas quais é patente o diálogo entre o arguido AA - que não deixa os seus créditos por mãos alheias - e outros condutores, como Aleksey (7 de Agosto), HH (11 e 16 de Agosto), AAAA (16 de Agosto) e V.... (17 e 18 de Agosto), que é ameaçado de “ser castigado” por não telefonar.
29 - Há também um certo Igor, localizado pelo arguido VV, e que é increpado asperamente pelo arguido AA, de quem recebe a recomendação “não desapareças”, devido a uma dívida que tem para com o arguido separado CCCC (17 de Agosto).
30 - Em diálogo com um certo RRR, o arguido AA fala de que “os meus rapazes estão sem trabalho” e troca impressões sobre um furto que pretendem fazer, aparentemente de um veículo (20 de Agosto).
31 - São abundantes as escutas relativas às prostitutas, e para elas se remete, se bem que fiquem aqui desde já salientadas algumas, para além de um lote, que se segue, de sintomáticas transcrições: 15 de Julho (o arguido AA, ou J...., conversa com FFFF, ou M...), 21 de Julho (o arguido AA, ou J...., conversa com o arguido KK), 22 de Agosto de 2005 (o arguido AA conversa com a vítima CCC sobre alojamento para esta, problema agudizado por não querer ela ficar com UUU, ou L..., e por continuar ausente, até Setembro, a arguida KKK, ou T...a).
32 - Duma conversação de 28 de Junho de 2005 entre os arguidos AA e KK, transcrevem-se as seguintes falas de J.... (J) e KK (A): (J) “se telefonar o irmão do V..., ele vai levar dinheiro dessas raparigas, setecentos”, (A) “irmão do V...”, (J) “irmão do V..., sim”, (A) “vai buscar dinheiro das raparigas”, (J) “porque nem o V..., nem eu estamos aí” - e aqui se vê que os arguidos AA e GG, aliás V..., estão fora, este último preso em França e aqueloutro ausente na Ucrânia, o que não impede que o arguido FEDAK receba a sua parte do “dinheiro dessas raparigas” através do irmão, que parece ser J.....h ou I....a, a avaliar pelo contexto doutras transcrições.
33 - Duma conversação de 2 de Julho de 2005 entre os arguidos AA e KK, transcrevem-se as seguintes falas de J.... (J) e KK (A): (A) “963, mais”, (A) “164”, (A) “071, que número é esse?”, (J) “L..a”, (J) “ouve, telefona agora”, (J) “vai ter com ela, ela dá-te setecentos euros, e a outra dá-te a lista, eu não sei quanto dinheiro vai ser lá, vai dar conforme a lista”, (J) “para que obrigatoriamente haja a lista da parte da segunda, L... dá setecentos assim, sem a lista, e aquela tem que dar a lista diária, dizes-lhe”, (A) “resumindo, a L... tem que dar, e quem mais tem que dar?”, (J) “a que está ao pé dela, eu não me lembro como ela se chama, mais certo não sei como ela se chama, ela está dentro do assunto, isso é em Quarteira” - ou seja, as prostitutas em causa são UUU, ou L..., e CCC, ou D...., ambas, como já se viu, aos cuidados da arguida KKK (que está ausente, contudo, até Setembro), dúvidas não restando também de que ao arguido KKKK é ordenada a colecta dos ganhos de duas de tais mulheres em Quarteira,
uma pela quantia de setecentos euros e outra de harmonia com a “lista diária”, de que paga uma percentagem omitida na conversa, já que a própria visada “está dentro do assunto”, não podendo ignorar-se que a colecta cabe, antes de mais, ao arguido AA, que se vê obrigado a fornecer ao arguido KKKK, seu lugar-tenente, o número da dita L...,..........
34 - Duma conversação de 3 de Julho de 2005 entre os arguidos AA e KK, transcrevem-se as seguintes falas de J.... (J) e KK (A): (J) “An...a, olá, como vocês estão aí?”, (A) “está tudo normal, eu ontem recebi daquelas, levei para a tua mulher”, (J) “quanto é que era conforme a lista?”, (A) “resumindo, setecentos deu essa L..., e agora quinhentos e noventa deu outra, e na segunda-feira tem que dar o resto, eu levei tudo a tua mulher”, (J) “e até que dia quinhentos e noventa? eu entendi que os quinhentos e noventa foram até à data”, (A) “não são quinhentos e noventa, deve novecentos e setenta, mas o resto tem que dar na segunda-feira” - e vê-se, para lá do óbvio, que o arguido KKKK teve a preocupação de levar o produto da colecta, imediatamente, à arguida AAA. Sobre esta, insiste o arguido KKKK, em conversação de 14 de Julho: (A) “e pronto, eu explico-te tudo, o que eu fui buscar a quem, eu tenho tudo escrito pelas datas, e a tua mulher tem tudo escrito, quando eu entreguei o quê, em que data”.
35 - Duma conversação de 3 de Julho de 2005 entre o arguido KK e a vítima CCC, ou D...., transcrevem-se as seguintes falas de KK (A) e de CCC(Z): (Z) “KK? sou eu, a D....”, (A) “eu entendi, sim, olá”, (Z) “olá, eu quero dar-te o dinheiro”, (A) “eu volto a telefonar, não sei, daqui a cerca de uma hora”, (Z) “está bem, volta a telefonar, eu dou-te o dinheiro” - e parece ser esta CCC que tem de “dar o resto na segunda-feira”.
36 - Duma conversação de 14 de Julho de 2005 entre o arguido AA e a vítima UUU, ou L..., transcrevem-se as seguintes falas de J.... (J) e de UUU (O): (O) “Alô?”, (J) “Leonarda, olá”, (J) “eu já cheguei”, (O) “eu percebi”, (J) “onde é que vocês estão?”, (O) “em Albufeira”, (J) “lá na casa da T...a, não é?”, (O) “já no outro apartamento”, (O) “J...a, eu vou atender o do anúncio, está bem?”, (J) “tu já atendes, sim?”, (O) “por que é que a pequena ... tão pouco? o quê? quer comprar uma casinha? engana-nos?” - e daqui se retira que a dita UUU e “a pequena”, que é a vítima CCC, ou D.... (de quem o arguido AA desconfia, por achar que ela entrega pouco dinheiro), mudaram do apartamento onde tinham estado com a arguida KKK, ou T...a, para outro apartamento.
37 - Duma conversação de 15 de Julho de 2005 entre o arguido AA e a vítima UUU, ou L..., transcrevem-se as seguintes falas de J.... (J) e de UUU (O): (O) “Alô?”, (J) “Lena, onde estás?”, (O) “eu agora não estou em casa”, (J) “e a pequena está em casa?”, (O) “não, também não está em casa”, (J) “ouve, como é que é com a pequena, por que é que ela não trabalha?”, (O) “nós trabalhamos, só hoje, agora não trabalhamos, trabalhamos constantemente”, (J) “resumindo, diz à pequena que ela amanhã vai trabalhar para Portimão”, (O) “e eu?”, (J) “se quiseres, tu também, e tu queres?”, (O) “não, não quero”, (J) “isso é contigo” - onde se revela a persistente vigilância do arguido AA sobre a vítima CCC, através da sua aparente familiaridade com a vítima UUU, devendo aquela passar a “trabalhar” em Portimão.
38 - A proeminência desta CCC, ou D...., acentua-se numa conversa de 19 de Julho entre o arguido AA e a vítima LLL, extraindo-se o seguinte desse diálogo entre J.... (J) e EEEE(O): (O) “sim?”, (J) “Olga, olá, é o Jeka”, (O) “olá, estou a ver”, (J) “Olga, por que é que a L... não atende o telefone? telefono, telefono, foda-se”, (O) “que L...? D....?”, (J) “D...., certo, D....”, (O) “nós trabalhamos, nós simplesmente temos um anúncio para cada uma”, (J) “e tu queres dar o anúncio para o telefone dela?”, (O) “sim, ela ontem comprou telefone, escreve que é bonitinha, jovem, nova, treta toda”, (J) “então ela não... treta toda? eh, não escrevas essa treta toda, não é preciso, ficam assustados, ouve, mas ela ainda fala mal”, (O) “não, sou eu que vou responder” - aqui também se vendo o modo como o arguido exerce o controle através de outra prostituta, ambas através de anúncios oferecendo sexo, intermediando ainda a dita Olga, porque é insuficiente ainda o português falado por CCC.
39 - Duma conversação também de 17 de Julho de 2005 entre os arguidos AA e JJ, transcrevem-se as seguintes falas de J.... (J) e de JJ (I): (J) “há duzentos euros para ti das raparigas”, (I) “a Ira fez mal as contas”, (J) “espera aí, lá, sim, lá são o Iosia, o V... e eu naquela, na D...., e naquela o V..., o V.... e eu”, (I) “então está certo, mas saiu assim, que a Ira me deu três partes” - vindo aqui referida a arguida AAA ou Ira, como contabilista e tesoureira, neste caso, dos réditos das prostitutas, a repartir pelos arguidos AA e GG, ou V..., e também V...., ou CCCC, não sendo seguro que se trate do arguido separado CCCC, e também a repartir por I....a, que surge noutros contextos das escutas, e é muito provavelmente irmão do arguido GG, por este e pelo arguido AA.
40 - Duma conversação também de 9 de Agosto de 2005 entre o arguido AA e um M..., que é provavelmente o antigo marido da arguida JJ, o já mencionado FFFF, transcrevem-se as seguintes falas de J.... (J) e de M... (M): (M) “alô J...., viva, é o M...”, (J) “viva, o que há aí, M...?”, (M) “então amanhã, isso... vamos ter com as gajas?”, (J) “sim, mas M..., elas lá vão pagar duzentos, porque elas ficaram com a pequena”, (J) “disseram que... descontamos por causa dela, então descontamos cem”, (J) “vão dar duzentos”, (M) “vamos ver”, (J) “hã?”, (M) “vamos ver, amanhã vamos ou não?”, (J) “então, vamos, eu vou de qualquer maneira, preciso resolver lá com a pequena” - e este M... é, pelo número escutado (00000000), e pelo tipo de linguagem, que resultou no mesmo tipo de tradução, o mesmo que diz ao arguido AA, em 15 de Julho de 2007, “eu dou-te o dinheiro das gajas”, aqui aflorando também a preocupação do arguido AA com “a pequena”, sendo certo que nos autos este arguido faz uso deste designativo somente a respeito da vítima CCC, ou D.....
41 - Aliás, uma escuta de 12 de Agosto de 2005 sobre conversação entre o arguido AA e a vítima CCC, ou D...., dá-nos o seguinte extracto do falado entre J.... (J) e CCC(Z): (J) “a Olga está aí?”, (Z) “a O......a está em casa, sim”, (J) “então diz que eu também quero encontrar-me com a Olga”, (J) “prepara aí a listazinha”, (Z) “a listazinha? por causa disso é que eu quero falar contigo”, (J) “até ao dia de hoje”, (Z) “está bem”, (J) “e uma centenazinha era preciso para o dia dez”, (Z) “Jeniazinho, não podemos combinar de maneira que eu... a centenazinha e depois passado um par de dias devolvo o dinheiro todo? eu ontem fiz anos e amanhã queríamos ir a um restaurante”, (J) “cento e cinquenta dá para divertirem-se oito, então está bem, vou aí ter, dás a centena” - e este diálogo, que revela a colecta dos ganhos de CCC, prostituta, põe a nu outro detalhe, verificável noutras escutas de conversas entre este arguido e a mesma Zhanna, e também entre o dito arguido e a vítima UUU, e que vem a ser o tom carinhoso, se bem que imperativo, do arguido com estas duas mulheres, de quem claramente obtém favores sexuais, e disto que dá evidência o excerto final: (J) “e vais ser meiguinha e fofinha comigo”, (Z) “e meiguinha e fofinha”.
42 - Na sequência desta escuta, outra há de 16 de Agosto de 2005, também entre o arguido AA e a vítima CCC, ou D...., a qual nos dá o seguinte extracto do falado entre J.... (J) e CCC(Z): (J) “olá, D....zinha”, (Z) “olá”, (Z) “então eu... o dinheiro... fodi o dinheiro”, (J) “como fodeste?”, (Z) “então como, no restaurante, para cá, para lá”, (J) “tu vive de maneira mais modesta, porque assim tu não juntas para a tua casa”, (Z) “eu sei, J.......ho, mas eu faço anos uma vez por ano”, (Z) “de qualquer maneira, eu fiz dezanove”, (J) “eu não tenho dinheiro, e eu já tenho cinquenta, então, foda-se, é uma data, foda-se, devia juntar metade da cidade, foda-se”, (Z) “eu trabalho”, (J) “por que é que então não tens dinheiro, se trabalhas? e escreve aí tudo certo”, (Z) “eu escrevo tudo certo”, (J) “dou-te dois, três dias” - e aqui se ilustra uma zanga entre o arguido e a vítima CCC, que gastou, ao que disse, numa festa de anos o dinheiro que teria de entregar ao arguido, e este enfureceu-se, provavelmente menos por ter a vítima, porventura, gasto o dinheiro como disse, mas mais por desconfiar ele de ter ela enviado o dinheiro para a Ucrânia, ou aforrado sem lhe dar nada, ideia esta apoiada pela objurgatória “escreve aí tudo certo”, referindo-se às listas de clientes que servem de base ao cálculo do “imposto” a pagar pela vítima.
43 - De relevo é também a escuta de 18 de Agosto, sobre conversação entre o arguido AA e a vítima UUU, ou L..., da qual vai extraído o seguinte, falado entre J.... (J) e L... (L): (J) “a D.... sabe quanto é que tu pagaste, não?”, (L) “a D....?”, (L) “não, não sabe”, (J) “de certeza que não sabe?”, (L) “eu não lhe disse, pode ser que alguém lhe disse, J...a, eu não lhe disse”, (J) “e quem é que lhe podia ter dito?”, (L) “uma vez, quando eu te dei dinheiro no carro”, (L) “tu voltaste a perguntar-me quanto é que é, e tu mencionaste a quantia”, (J) “isso não faz mal, porque pode ser que isso não é a quantia toda” - e aqui se manifesta a persistente preocupação do arguido AA com a vítima CCC, ou D...., de quem diz à vítima UUU que arranjou namorado e que não atende o telefone, numa evidente zanga relativamente à dita CCC.
44 - Em 19 de Agosto, porém, o arguido AA tem com a vítima CCC, ou D...., o diálogo, do qual vai extraído o seguinte, falado entre J.... (J) e CCC(Z): (J) “podemos acertar as contas contigo, não?”, (Z) “sim”, (J) “vá, sai”, (Z) “agora?”, (J) “eu já estou cá, sim”, (Z) “está bem”, (J) “então, escreve a lista, para que...”, (Z) “está bem, vou sair” - e parece que não há nada a acrescentar, excepto que esta mulher está na mesma casa com a vítima LLL, de quem CCC diz a J.... que “ainda está a dormir”.
45 - Em 24 de Agosto o arguido AA tem uma amarga troca de impressões com a arguida JJ, no limiar de lacunas surgidas na organização, sobretudo pelo que toca às prostitutas, e eis o extracto do falado entre J.... (J) e JJ (I): (J) “eu transferi lá os trezentos, para o cartão”, (I) “que trezentos?”, (J) “levei da pequena, (J) “ela agora não trabalha, e agora quer sozinha, e diz “eu vou lá pagar pela casa quinhentos, sozinha, trabalho sozinha, ponham-me a vencimento”, eu não sei o que fazer, ela está histérica, ela já estava a preparar-se para ir embora e o caralho sabe o quê”, (J) “ela separou-se da Lena” - (a conversa recai sobre CCC, que deixou a casa onde estava com UUU, mas que deu trezentos Euros ao arguido AA para o cartão telefónico do arguido GG) - (I) “ainda não foste buscar à L...?”, (J) “não, a L... é no fim do mês”, (I) “vou partir na sexta-feira” - (a arguida JJ vai a França estar com o arguido GG, para quem leva os trezentos Euros “da pequena”) - (I) “resumindo, está entendido”, (J) “não, ouve”, (J) “como é que é com a pequena? o que fazer com a pequena?”, (I) “Jeka, eu vou partir na sexta-feira, chego no domingo e telefono-te”, (J) “tu vais estar cá?”, (I) “sim, sim”, (J) “resumindo, diz ao V....a que a T.....a não está, e já não está há dois meses, com a L... ela não quer trabalhar, e a L... não quer trabalhar com ela, entendeste?” - (o arguido AA quer que o V......a, isto é, o arguido GG, saiba que a arguida KKK, ou Tangia, está ausente há dois meses, o que causa evidente perturbação, e que as vítimas CCC e UUU não se dão bem, havendo que resolver o problema da primeira, que é a chamada D....) - (J) “ela sabe que a L... pagava setecentos, dizer-lhe setecentos?”, (I) “é pena perdê-la”, (J) “então, não é perder, dizer setecentos, para que paga por mês”, (I) “amanhã ou segunda-feira o V... deve telefonar-me”, (J) “então aconselha-te com o V..., diz que a situação é foda-se, ela já estava a preparar-se para partir”, (J) “diz-lhe que realmente, para não a perder, para ela não fugir para casa, caralho”, (J) “é preciso metê-la a vencimento, para ter o vencimento, e o caralho com ela, receber uma vez por mês como da L..., ela sabe que são setecentos, eu penso fazer da mesma maneira, se calhar”, (I) “então está bem, resumindo, eu dou-lhe uma dica, vou ver o que ele diz”, (J) “ela começa já com tretas, “eu vou para casa, para que caralho eu preciso disto”, assim e assado, é assim, foda-se, e ela já fode pelas prendas, não é pelo dinheiro, eu não sei mesmo pelo que é que ela lá fode, as coisas são assim” - (a arguida JJ pondera que “é pena” perder o pagamento vindo da vítima CCC, com a qual o arguido AA está desesperado, por ela aceitar ter relações sexuais em troca de presentes pessoais, em vez de dinheiro, batendo-se este arguido por que a arguida JJ persuada o arguido GG a aceitar que a referida Z.....na, ou D...., passe a pagar setecentos Euros por mês, como a vítima UUU) - e aqui se vê a proeminência do arguido GG na decisão sobre o que fazer, dado que não interessa ter de exercer efectiva violência sobre a vítima CCC, ou sobre os seus familiares na Ucrânia, porquanto isso significará que dela deixou de vir dinheiro, e viu-se no que isso deu relativamente a HHH e PPP, com desfecho em 20 de Agosto.
46 - De 26 de Agosto há uma escuta de conversa entre o arguido AA e um certo Iosef, que surge com este nome noutras escutas escrito (nas transcrições) como Y.....ef, ou Josef, e este liga da Itália para aquele arguido, havendo a extrair, no essencial, o seguinte, do falado entre J.... (J) e Iosef (If): (If) “aquela pequena telefonou-me, a D...., não sei o que é que ela quer”, (J) “ela não quer trabalhar, ela não tem onde morar, a T...a, onde ela foi colocada, não está”, (J) “ela ficou na rua, é assim, e pede que a ponham numa quantia”, (J) “e não é cinquenta por cento”, (J) “ela ganhou seiscentos em algum tempo, ela já há muito tempo que não está na T...a”, (If) “o quê?”, (J) “eu estou a dizer que só ganhou seiscentos em algum tempo”, (If) “sim?”, (J) “sim, então ela um dia tem, outro não tem, e não há que sejam três, só houve uma vez, duas, e pronto”, (If) “pode ser que para a semana eu vou estar aí, em Portugal, porque eu agora estou na Itália, aí assim já resolvemos”, (J) “então vá, resolve” - e este I....f, ou Y........f, ou Josef (provavelmente irmão do arguido GG) revela aqui um poder de decisão inegável, não à escala local, como o arguido AA, mas a uma escala mais alargada, pois declara, a partir da Itália, que vem a Portugal resolver as coisas, visto que a vítima CCC ganhou num certo período de tempo somente 600 Euros, em vez de ganhar mais do que isso, “não quer trabalhar” e, para cúmulo, “a T...a não está”, aqui se vendo, mais uma vez, a falta do papel estabilizador da arguida KKK, ou T...a.
47 - A partir desta altura, ganha maior vulto a intervenção da arguida JJ, que assume um papel como que de coordenação numa fase em que seria mais necessária, para a coesão do grupo, a interacção directa entre os arguidos AA e GG, sendo esta arguida quem surge como elo de ligação entre ambos, além de fazer as vezes do arguido Fe.....K, como também consta - e vejamos.
48 - Assim, no dia 29 de Agosto de 2005, o arguido AA, ou J.... (J), tem com a arguida JJ (I) uma conversa, da qual essencialmente se extrai o seguinte: (J) “por que é que não telefonas?”, (I) “eu só cheguei há duas horas atrás”, (J) “entendido, resumindo, há um problema com a pequena”, (J) “alugou um apartamento sozinha, a T...a não está, ninguém está, todas essas raparigas foram cada uma para seu lado, ela queria ir com elas, eu emprestei-lhe dinheiro, ela não tem dinheiro para alugar um apartamento” - ainda o problema da vítima CCC, a quem o arguido AA teve de emprestar dinheiro para a renda dum apartamento, estupefacto por ela não ter apurado sequer o dinheiro para esse efeito, sendo certo que o apartamento é condição sine qua non de a vítima continuar a prostituir-se e a render lucro ao grupo, e que mais uma vez se faz sentir, de modo agudo, a falta da arguida KKK.
49 - Mais tarde, já em 7 de Setembro de 2005, o arguido AA, ou J.... (J), tem com a arguida JJ (I) uma outra conversa, da qual essencialmente se extrai o seguinte: (J) “...D...., o que se passa, o Iosia autorizou a pequena a ir para casa?”, (I) “eu não sei o que ele...”, (J) “eu combinei com ela por dois anos, ela telefonou-lhe e ele disse: então vai para casa, se quiseres”, (I) “eu estou a ouvir isso pela primeira vez”, (J) “ela disse-me essa treta agora, e disse: eu no final do mês vou-me embora”, (I) “para onde é que ela lhe telefonou, para a Ucrânia?”, (J) “eu não sei, se calhar”, (I) “eu telefono-lhe à tarde”, (J) “vá, ele que me telefone, por que é que ele está a fazer parvoíces? eu combinei com ela por dois anos, e ela estava satisfeita, tudo, e agora ela diz-me: a minha mãe disse que não vai tomar conta da filha, para que caralho preciso eu da tua criança? tenho montes de meus, e ela disse: eu vou-me embora para casa, disse: eu combinei com o Iosia por meio ano, por um ano se aguentar, então pelo menos dizia para ficar cá até fazer um ano, foda-se, pelo menos ficava cá um ano”, (I) “tens o telefone ucraniano dele?”, (J) “não, eu não me relaciono com ele, tu sabes” - e este Iosia é o Iosef que estava dias antes em Itália (provavelmente irmão do arguido GG), e certo é que o arguido AA não “se relaciona” com ele, pois foi ele quem, como se viu, telefonou ao arguido, em tom, que aqui se confirma, de maior autoridade.
50 - No dia 9 de Setembro de 2005, o arguido AA, ou J.... (J), tem com a arguida JJ (I) uma breve troca de palavras, da qual essencialmente se extrai o seguinte: (J) “JJ? então o Iosia vem amanhã?”, (I) “eu não sei, estou a ouvir pela primeira vez, a mim ninguém telefonou, não disse nada”, (J) “eu telefonei à D...., ela disse: amanhã vem o Iosia”, (I) “eu não sei, J...., eu não... isso... eu agora telefono para o número italiano dele, para saber”, (J) “desejável que ele vem antes de se encontrar com ela, então, para não se encontrar com ela, depois nós íamos juntos” - e aqui, além de se confirmar em absoluto que Iosia da Ucrânia e Iosef da Itália são a mesma pessoa, temos a perplexidade do arguido AA, irritado por aquele ter sobreposto a sua autoridade à sua, deixando-o sem possibilidade de reacção, sendo por isso que o arguido AA pretende falar-lhe antes que ele contacte a vítima CCC, ou D.....
51 - No dia 11 de Setembro de 2005, o arguido AA, ou J.... (J), tem com a arguida JJ (I) outra breve troca de palavras, da qual essencialmente se extrai o seguinte: (J) “estás a ouvir? eu vou aí agora, levo o dinheiro da D...., daquele mês”, (J) “que ela tinha escritos ainda, então... isso... falamos sobre aquele... o I...ia mentiu-lhe, disse: não me deixaram entrar na Áustria”, (J) “tinha estado em Itália, para que caralho ele mente? se perdeu algures a mala, devolve, eu agora travo o dinheiro dele, se não encontrar a mala, ela tira o dinheiro dela” - e aqui se confirma, em absoluto, que I....a, ou I..., é o Y....ef que trouxe a vítima CCC para Portugal, sendo este Y.....ef, ou Iosia, motorista da carrinha, da qual se terá perdido, durante a viagem, uma mala pertencente à mesma Z.....na, ou D...., havendo aqui que realçar que este motorista faz parte do grupo e tem autoridade acima da do arguido AA, que tem de dar-lhe dinheiro, a despeito da fanfarronada “eu agora travo o dinheiro dele”, num contexto em que ainda há dinheiro a haver da vítima CCC, do tempo em que ela fazia as listas.
52 - Há então, no dia 12 de Setembro, uma conversação sintomática entre os mesmos AA (J) e JJ (I), de que se extrai o seguinte: (J) “resumindo, combinei com ela até ao Ano Novo, até Dezembro, foda-se, está a chorar, cadela, depois vamos ver”, (I) “tu agora tinhas estado com ela?”, (J) “sim”, (I) “tu abateste para ela?”, (J) “sim, até setecentos”, (I) “então está bem, que fique assim”, (J) “mas eu disse ao I...a: I...ia, pronto, vai fumar para o caralho”, (I) “sim, e depois vai correr normalmente, pode ser que o V... vem e vá falar com ele”, (I) “e mesmo ela não trabalha cá como ‘top-model’, está certo?”, (J) “não, JJ, se ela já cá está, ela está conosco, ela está debaixo de nós” - e eis que se dá uma cisão no grupo por causa da vítima CCC, pois o arguido AA obrigou-a a ficar até Dezembro de 2005, fazendo-a chorar, mas contando a arguida JJ com os préstimos do arguido GG para falar com o dito I..a, provavelmente seu irmão, isto é, para atenuar a sua desautorização pelo arguido AA, que se prevalece de que CCC, ou D...., “está debaixo de nós”.
53 - É tempo de transcrever algo de outras escutas, sendo que para todas elas se remete, procurando deixar um quadro suficientemente claro dos factos subjacentes às intercepções telefónicas.
54 - Assim, dentre as escutas mais reveladoras, temos uma de 17 de Julho de 2005, onde o arguido AA liga para um telefone da rede de Faro - 000000000 - e fala com um certos, a quem ordena que restituam a um cidadão moldavo coisas que foram roubadas a este: “nós naquela altura dissemos para vocês lhe devolverem as coisas deles todas, que levaram, devolvam e parem com essa treta, ele é normal, ele simplesmente foi tratar de uns assuntos”, respondendo o dito Sp.... “entendi”, insistindo o arguido “entendido, ou não?”, ao que o outro responde “claro”, seguindo-se as instruções do arguido: “pronto, façam isso hoje”, “de preferência antes de almoço” - e torna-se claro até que ponto, no seu posto em Portugal, o arguido AA goza de autoridade, havendo ainda que notar a designação de “normal” atribuída ao esbulhado moldavo, indicando tal designação que é pessoa a quem não se pode roubar, porque pertence ao mesmo meio, isto é, ao mundo do crime.
55 - Duma escuta de 20 de Julho de 2005, sobre uma conversação entre o arguido AA e o V...., ou CCCC, residente na Ucrânia, e que já foi aqui mencionado, são particularmente reveladores os seguintes extractos do falado entre J.... (J) e V.... (V): (V) “tu onde estás?”, (J) “em Portugal, onde devia estar? estás a ouvir V....?”, (V) “sim”, (J) “eu passei por França, foda-se, não existe nem carro, nem isto, nem aquilo, nós precisamos de assentar as coisas com ele”, (V) “em relação a quê? em relação ao Alfa, é?”, (J) “claro, tu não sais para trabalhar, não há trabalho, foda-se, pu-lo no comum e perdi o carro, foda-se”, (V) “entendido”, (J) “eu agora estou com treta na garganta, preciso de “bazar” daqui”, (V) “tu estiveste na Ucrânia, por que é que não vieste ter comigo?”, (J) “porque fui pela Polónia, andei entretido com o carro, andei a tirar moças, nem tive tempo, nem uma hora sequer”, (V) “Jeka, tu sabes, o carro trabalhou para o comum, não há discussão, só que é preciso definirmo-nos, percebes? agora eu preciso de dinheiro, e tu precisas de dinheiro, foda-se, e o V... está preso, também precisa de dinheiro, entendes? desmembra-se tudo, foda-se”, (J) “mas o V... que relação é que tem com ele? ele nunca trabalhou nele, nunca, ele só esteve uma vez, porque ele aqui só se ocupava com os quiosques”, (V) “mas o carro estava numa base comum, certo?”, (J) “certo”, (V) “é por isso, caralho, é esse o assunto, o carro estava numa base comum e falta só definir quanto é que tu e eu tínhamos lá a retirar, em quanto é que tu o avalias?”, (J) “em um e meio, em quanto avaliá-lo?”, (V) “J....a, se se tiver de retirar alguma coisa, é só um assunto de três, entendes como é? suponhamos que nós os dois trabalhamos, mas trabalhou numa base comum, não é correcto, foda-se, deu dinheiro também para a caixa comum”, (J) “sim, retirar da caixa comum, ou quê? foda-se”, (V) “não, por que é que se deve retirar da caixa comum? retirar dos três, há uma receita, vocês têm ainda uma rapariga que trabalha, permitam-me, isso se se tiver de retirar”, (J) “V...a, é por isso que estou a ligar, eu quero aconselhar-me como é que é”, (V) “simplesmente, depois é preciso encontrar o moldavo, foda-se, e castigá-lo, daquela vez também quando saíram com o V... de avião e foderam o dinheiro, eu disse: V..., vai resolver com estes búlgaros, vou, vou, nem foi, nem resolveu, foda-se”, (V) “sabes o que me dizem? o J.... estava em casa, foda-se, a mim ninguém me diz um caralho, a L... lamenta-se, diz que quer ir para casa”, (J) “não dês ouvidos à L..., para que é que lhe dás ouvidos?”, (J) “então, tu simplesmente pediste por ela e fizeram-lhe, para que não a sobrecarreguem muito, fizeram-lhe setecentos e não seiscentos a ela, entendes? a propósito, o teu dinheiro deste mês está com o Iosia”, (V) “mas eu vi o Ioska, e ele nem me deu”, (J) “é porque eu também não estava cá, foram buscar e a Ira não sabia e deu-lhos”, (J) “em casa há menos, foda-se, em casa não me pararam, e aqui é em cada curva, aqui chegas ao mercado, estão lá parados dois polícias obrigatoriamente, caralho, vêem todos os carros, eu sou suspeito, eu sou suspeito para todos, a mim vêem em tudo quanto é sítio, chego a um Lidl, a um caralho qualquer, ao Modelo, ao Leclerc, a algum lado que chego, estão lá dois polícias e logo observam, verificam os documentos em cada esquina, caralho”, (J) “tu não dês ouvidos à L..., foda-se, eu queria pô-la numa boa casa, ‘não!’, ela está com um galante qualquer, ela em breve já vai ser patroa, a tua L..., tu não penses assim, ela lamenta-se, ela mente à mãe, elas aqui vestem-se bem, ficaram gordinhas, floriram, foda-se” - e esta longa conversa, aqui concisamente reproduzida, mais confirma a organização, a proeminência do dito CCCC, ou V...., a arguida AAA ou Ira, como contabilista e tesoureira do grupo chefiado em Portugal, antes de mais, pelos arguidos AA e GG, e os métodos destes, subjacentes à ideia de “castigar o moldavo” expressa pelo aludido V...., o que faz sentido no diálogo a respeito do carro, um Alfa-Romeo, que um “V... moldavo” terá comprado, mas que não terá pago, além da pressa que o arguido AA começa a manifestar de voltar a Ucrânia, também latente na apreensão que lhe causa a presença da polícia que, a seu ver, está em todo o lado.
56 - Outra escuta, de 1 de Agosto de 2005, sobre uma conversação entre o arguido AA e um certo S....ik, este a partir da Ucrânia, revela as seguintes e sintomáticas falas entre J.... (J) e Sl.....ik (S): (S) “o Ch......ok quer falar contigo”, (J) “então ele quer e eu vou queimar dinheiro?”, (S) “não conseguimos entrar em contacto contigo”, (S) “para conversar sobre os futebolistas”, (J) “quem?”, (S) “há dois futebolistas”, (J) “e então?”, (S) “para que eles... lá para Portugal, eles estão a assinar um contrato, uma treta assim, para que tu os lá... sob controle ou... resumindo, que uma boa treta, tem a ver com os futebolistas”, (J) “para onde eles vão, para que clube?”, (S) “eu não consigo explicar, J.......a”, (S) “eu dou-lhe o teu telefone, e ele que telefone, e conta-te como é que é, no sentido que lá vai haver dinheiro sério”, (J) “então escreve o meu telefone”, (S) “isso é o teu telefone português?”, (J) “sim, o meu telemóvel”, (S) “o V.... Cherenok liga-te, e ele é que te conta pessoalmente, dois rapazes futebolistas, qualquer coisa, ou eles assinaram o contrato, resumindo, o caralho, eu não sei”, (J) “está bem, preciso saber para onde eles... para que clube” - e mais não é preciso para se concluir que o grupo, a que se encontra ligado o arguido AA, pretende exercer força sobre dois futebolistas, por certo ucranianos, a fim de cobrar deles “dinheiro sério”, surgindo aqui mais um V...., ou CCCC, a quem o dito S....ik se refere também como ‘V....a’.
57 - Uma escuta em particular, de 6 de Agosto de 2005, dá-nos uma conversa entre o arguido AA e um certo Kosynskiy, e em seguida também entre os arguidos AA e DD, e dela se faz o seguinte extracto, sendo os interlocutores J.... (J) e K.......kiy (K), e J.... (J) e M... (M): (K) “é o K.......iy do Esteval”, (J) “o que há aí?”, (K) “um rapaz bêbedo “patinou”, o rapaz voltou do trabalho, assim e assado, aquele pegou e fodeu-o na cabeça com o martelo, foda-se, o rapaz está cheio de sangue”, (J) “então o quê? ir lá resolver?”, (K) “Jeka, peço desculpa, a questão é se vier alguém ter com o rapaz, pressionar”, (K) “e o rapaz não deve a alma a Deus, não bebe nada, disse que chegou do trabalho, foda-se, e o rapaz, o moldavo, bêbado, disse “tu, assim e assado”, e deu com o martelo”, (J) “e o M... está lá? telefonem para o M..., para o Vova”, (K) “está bem”, (J) “eles que resolvam com ele, se for alguma coisa eu vou lá ter”, (M) “sou eu, o M...”, (J) “eu entendi, M..., o que há aí?”, (J) “eles embebedaram-se em algum lugar”, (M) “essa pessoa autorizou-te para que tu... então... se houver problemas... ele disse “eu entendo, quanto é que eu devo?”, (J) “quinhentos, e para o rapaz”, (M) “sim, eu disse-lhe”, (J) “e que paga para o rapaz”, (M) “sim”, (J) “a visita é quinhentos, e diz, foda-se, isso, senão, foda-se, dar cabo dele com os tacos”, (M) “queres dizer-lhe alguma coisa?”, (J) “explica-lhe a culpa para que assume, carrega, e pronto”, (M) “ele assumiu, ele assumiu”, (J) “e que dê dinheiro já”, (M) “ele disse que é preciso esperar um mês, mas ninguém vai esperar um mês”, (J) “claro, que peça emprestado, caralho, dá-lhe dois ou três dias”, (M) “está bem, está bem”, (J) “diz que fui eu é que lhe disse” - e aqui resulta claro que o arguido AA estabelece a “indemnização” a pagar por um certo moldavo que agrediu um “rapaz”, indemnização essa que, diga-se a verdade, contempla também o agredido, já que o agressor deve pagar quinhentos euros para o grupo, e deve pagar também ao indicado “rapaz”, se bem não venha dito quanto.
58 - É também sintomática das actividades e ligações dos arguidos a escuta de 7 de Agosto de 2005 duma conversa entre um T.....s, que fala da Ucrânia, e o arguido AA, e depois entre este e o arguido KK, de que faz o seguinte extracto, sendo as falas de J.... (J), Ta....s(T), e depois de J.... (J) e KK (A): (J) “olá, T...as”, (T) “viva, Je......ho”, (T) “olha, há uma situação que... chegar a Itália, sim?”, (J) “sim”, (T) “lá vai andar um carrito”, (T) “este carrito só para o... mandar fora o gajo, para o caralho”, (J) “sim”, (T) “cinquenta euros”, (J) “mil?”, (T) “então o quê?”, (J) “então entendi”, (J) “posso sair mesmo agora”, (T) “liga se faz favor para o telefone... conheces o Bo...a, não?”, (J) “o telefone do Bo...a?”, (T) “igual ao meu, só que o último é quatro”, (A) “alô, sim J...., viva”, (J) “ouves, An..........in?”, (J) “tu não tens nada contra ir, por causa de um bom trabalho, a Itália comigo?”, (A) “como, como?”, (J) “um trabalho simples e bem pago na Itália”, (A) “sim, isso não é para falar pelo telefone, J....a”, (J) “sim, sim, mas em geral sim”, (A) “é preciso pensar nisso”, (J) “cinquenta, An...a”, (A) “eu não estou contra, não tem conversa, claro”, (A) “única coisa é a estrada, faz-me um pouco tenso, sabes, a verificação de documentos, foda-se”, (J) “An...a, a Itália não é a Alemanha”, (A) “então sim, sim, não tem conversa” - e aqui se vê como os nomes próprios continuam a ser submetidos a uma flexão imaginativa, mas fica sobretudo confirmado que os arguidos AA e KKKK se entregam, de profissão, a actividades criminosas, como esta de “mandar fora o gajo, para o caralho”, o que constitui “um trabalho simples e bem pago”, a saber, o de infligir maus tratos, ou pior, a determinada pessoa em Itália, em troca de cinquenta Euros para o arguido KKKK, mas mil para o arguido AA, que assumirá obviamente as despesas.
59 - a - Sobre a arguida KKK, ou T...a, é elucidativa uma escuta de 16 de Setembro de 2005, da qual se faz o extracto de falas de J.... (J) e de T...a (T), como segue: (J) “tu partiste tudo, foda-se, não deixaste ninguém para aquelas e elas foram cada uma para seu lado, ficaram mal comportadas, e agora o caralho é que as mete na box”, (T) “ouve lá, eu ia-me embora, antes da minha partida eu telefonei para ti e para o V.....a, os vossos telefones estavam desligados, vocês não deixaram ninguém, vocês bazaram um mês antes da minha partida”, (J) “não me enganas”, (T) “eu não consegui entrar em contacto com vocês de maneira nenhuma, nem contigo, nem com o V.....ka”, (J) “por que é que tu não deixaste normalmente as pessoas para alguém?”, (T) “para quem? eu deixei para a minha pessoa, mas o que as raparigas começaram a fazer, eu estou em choque”, (J) “para quem é que tu deixaste?”, (T) “eu deixei para o meu Salgados, ele não saía do apartamento, mas ele também tem a família, filhos, trabalho, ele estava no apartamento vinte horas por dia, e quatro ele tinha para trabalhar, para ele e para mais um homem, estava lá a polícia, a treta toda, e vocês piraram-se um mês antes do meu voo, eu não podia entrar em contacto com vocês de maneira nenhuma, onde é que eu devia meter as raparigas? deitá-las fora para a rua? mesmo com os pertences?”, (J) “mas aconteceu mesmo assim”, (T) “eu arranjei-lhes o apartamento, ainda preciso encontrar uma Madre Teresa dessas”, (J) “então, passados três dias expulsaram-nas dali”, (T) “não é passados três dias, passadas três semanas, porque as raparigas começaram a andar na farra, foda-se”, (J) “expulsaram-nas passados três dias”, (T) “deixa lá, no dia 18 de Julho, e eu voei no dia 30 de Junho, vinte dias elas estavam sem mim, eu dei-lhes tudo”, (J) “mas acontece que o V... está preso e comigo aconteceu desgraça na Bélgica, eu tive que ir à Ucrânia, nós íamos por três dias, ele e eu”, (T) “eu andei à vossa procura, foda-se, vocês piraram-se, e tudo ficou nas minhas costas quando eu estou na Ucrânia, “controla”, quando eu estou completamente noutro país”, (J) “disseram-te que o V... está preso, e eu tinha problemas, tive de fugir para a Ucrânia”, (T) “então...”, (J) “agora ouve lá, no final do mês eu vou e trago alguém”, (T) “J...a, eu preciso sentar-me contigo normalmente, como pessoas adultas, não é como crianças, sentar e conversar normalmente à mesa, tomando uma chávena de café”, (J) “está bem, amanhã”, (T) “então vá, tu tens o meu número” - e eis como a arguida KKK, que tem deveres no grupo, mas goza de algum espaço de manobra, tendo de ausentar-se, tenta chegar à fala com o arguido AA e com o arguido GG (a quem chama Va.....a), mas sem sucesso, porque este foi preso em França (de Maio para Junho), e o arguido AA, prevenido de que ia suceder-lhe o mesmo, fugiu, como ele próprio diz, para a Ucrânia, passando as mulheres a ter completa liberdade de acção.
b - Daqui se vê que a chefia do arguido KK nem sequer primava pela eficácia, pois pouco mais fazia do que seguir as instruções do arguido AA, mostrando-se impotente para manter o pulso necessário à amostra de força evidenciada sempre por este.
c - Por outro lado, tudo isto deixou as coisas dispostas para que a investigação dos presentes autos ganhasse um notável fôlego, visto que as mulheres, entregues a si próprias, perceberam que tinham plena liberdade de acção, podendo mesmo dirigir-se à Polícia, esperançadas em que os arguidos viessem, como vieram, a ser presos, o que não as exime de estarem ameaçadas por eles, desta feita sem margem para contemplações logo que sejam soltos, mas num contexto agora de retaliação, não num contexto de persuasão por via da violência latente.
60 - Sempre remetendo para as transcrições das escutas, deixa-se ainda um extracto duma conversação de 29 de Agosto de 2005, entre os arguidos AA, ou J.... (J), e KK (A), na qual se diz: (J) “não, eu simplesmente quero dizer-te, para dar na cabeça da pessoa precisam motivos sérios, para ele ofender, mas como ele está a comportar-se, chega ao pé e diz “por que é que tu estás a comportar-te assim?”, justifica, isso e aquilo, estás a perceber?”, (A) “eu entendi”, (J) “estás a perceber? também não se pode dar pontapés nas pessoas”, (A) “então, claro, eu em princípio contra isso”, (A) “mas se chega ao pé de um, estás a ouvir, pergunta “o que recebem de ti?”, ou mais qualquer coisa, resumindo, sabes, pergunta, não sei o que...”, (J) “chega ao pé dele e diz “por que é que tu estás a perguntar? queres levar na cabeça? vou ver mais uma vez, levas na cabeça”, avisa-o”, (A) “mas eu em princípio já o avisei”, (J) “então, se continua dá-lhe na cabeça, mas só assim, explica-lhe, foda-se, diz “o que é que tu tens?”, foda-se, passaste-te?”, (A) “entendido” - onde se vê a preocupação de limitar o uso da força ao mínimo possível, mas sempre com a disponibilidade de “dar na cabeça” de quem não se submeta.
61 - Sempre remetendo para as transcrições das escutas, vale a pena, sucintamente, salientar mais algumas, pelo que oferecem de sintomático:
a - Assim, em conversa de 9 de Agosto de 2005, CCCC comunica ao arguido II a sua pressa em vender o seu carro e em regressar o mais depressa possível à Ucrânia, sendo certo que, de conversa havida no dia 24 de Agosto entre os arguidos RR e EE, resulta que o dito CCCC (V.......ka) ainda não conseguiu ir-se embora; mas em 29 de Agosto, o mesmo CCCC já está na Ucrânia, conforme conversa entre os dois mesmos arguidos daquela data.
b - A escuta de 17 de Setembro de 2005 mostra uma conversa entre M... (o arguido DD) e J.... (o arguido AA), na qual aquele diz a este que tem, há dois dias, um telefone novo, com o número 000000000.
c - No dia 24 de Setembro, falando do dito telefone 00000000 o arguido DD instrui um certo RRR para contactar o arguido AA, e dá-lhe o número deste, 00000000, dizendo-lhe que o nome dêste último é J.... e recomendando-lhe que diga “J..a, sou da parte do M...”, ao que o outro insiste “e do Cobra, sim?”, confirmando o arguido DD “sim, do M... Cobra, resumindo”.
62 - a - Nas suas declarações, o arguido AA nega, basicamente, todos os factos, mas dá algumas referências úteis para a prova que se formou.
b - Assim, UUU era prostituta e exercia essa actividade com CCC, mas chegara a Portugal primeiro do que esta.
c - Os motoriatas das carrinhas de transporte de passageiros e bagagem eram muitas vezes assaltados, e por isso pagavam ao arguido, mas espontaneamente, para que o arguido garantisse a segurança de coisas e pessoas - embora o arguido não explique ao certo como conseguia garantir essa segurança.
d - Em todo o caso, o arguido organizava as viagens, e para isso tinha pelo menos dois telemóveis, um para os condutores e outro para os passageiros.
e - Os pagamentos feitos pela D...., que é CCC, tinham por finalidade o reembolso, por parte desta, de 1.700 Euros que o arguido lhe emprestara.
f - Além disso, vendeu telemóveis a UUU, dos quais esta necessitava para atender telefonemas de clientes, que apareciam em resposta a anúncios.
63 - O arguido FFF, ao que declarou, encontrou-se por mero acaso, em Agosto de 2005, no ‘MacDonalds’ de Albufeira com os arguidos EEE e AA, e ainda com PPP e HHH.
64 - a - A testemunha VVV pôde verificar, em vigilâncias, que UUU, prostituta, estava alojada no apartamento da arguida KKK.
b - Esta arguida T......NA dominava o português e estabelecia, assim, a comunicação entre a dita UUU e os clientes desta.
c - A testemunha, também em vigilâncias, pôde verificar que o arguido AA se fazia frequentemente acompanhar do arguido FFF.
65 - A testemunha VVVVviu o encontro dos arguidos AA e FFF com PPP e HHH.
66 - a - A testemunha XXXX presenciou, nas imediações do ‘MacDonalds’ de Albufeira, uma discussão entre o arguido AA e o condutor ZZZ, com o arguido KK junto a ambos.
b - A mesma testemunha presenciou que, em Portimão, numa pastelaria, o arguido AA e CCC comparavam o conteúdo de cadernos, ou blocos de notas, que ambos tinham.
c - Noutra ocasião, na mesma pastelaria, a testemunha presenciou cena idêntica, estando presentes o arguido AA e também CCC e LLL, tendo estas, discretamente, entregue entregue dinheiro àquele.
d - Esta testemunha refere que viu o arguido AA fazer-se frequentemente acompanhar do arguido KK.
67 - a - A testemunha AAAAA assistiu de longe a uma conversa entre o arguido AA e o condutor ZZZ, estando junto de ambos o arguido KK.
b - A mesma testemunha observou que, pela data em que foi agredido DDDD, no ‘MacDonalds’ de Albufeira, os arguidos AA, EEE e FFF tiveram um encontro com PPP e HHH.
c - Também esta testemunha observou que o arguido AA se fazia frequentemente acompanhar do arguido KK, sendo certo que viu este último arguido somente duas vezes, ambas junto com AA, designadamente noutro encontro, desta feita com um condutor, também nas proximidades do ‘MacDonalds’ de Albufeira.
68 - a - Este encontro mencionado em último lugar foi também presenciado pela testemunha João Cardoso, que presenciou, além disso, entregas de dinheiro ao arguido AA com o arguido KKKK a “fazer segurança”.
b - Também esta testemunha viu, em Portimão, um encontro do arguido AA com CCC, ou D...., e outra mulher que a testemunha não soube identificar, tendo ambas entregue discretamente dinheiro ao arguido, depois de compararem notas com este.
c - A testemunha presenciou também, na noite de 13 de Agosto de 2005, que no sítio do Patacão os condutores ZZZ e XXX entregaram dinheiro ao arguido AA, que tinha junto de si o arguido DD.
69 - Também as testemunhas BBBBB e CCCCC viram os arguidos AA e KKKK juntos em encontros com condutores.
70 - Quanto ao valor da prova, cuja exposição acabou de se fazer, temos:
a - É crucial a prova constituída pelas declarações para memória futura, pelas escutas, pelos reconhecimentos pessoais e fotográficos, e pelos exames médico-legais.
b - É auxiliar, mas valiosa, a prova decorrente dos inúmeros documentos constantes dos autos, dos autos de busca e apreensão, dos relatos de vigilância e respectivas fotografias, das declarações tomadas em audiência e de outros meios, como os autos de exame e avaliação.
71 - a - As declarações para memória futura foram colhidas de pessoas que, sentindo-se protegidas, ou pelo menos acolhidas, puderam prestar o seu depoimento sem receio, ou com mitigado receio, de virem a sofrer represálias.
b - Significa isto que tais declarações promanam de quem tudo - ou quase tudo - quer revelar, promanam, outrossim, de quem nada revelaria se sentisse a ameaça dos arguidos.
c - É típico, de resto, que pessoas sujeitas ao domínio de outras manifestem, directa ou indirectamente, o fundado medo de revelarem factos desfavoráveis àqueloutras, calando-se ou faltando à verdade.
d - Daqui nasce uma sintomatologia inquietante, porém: perante o Tribunal, de modo público e transparente, sob protecção de guarda suficiente, a testemunha não se sente confortada com as condições adequadas a dizer aquilo que sabe, sem que daí lhe advenham dissabores.
e - É a audiência pública - e publicável - que, paradoxalmente, encerra os germes mesmos da frustração da prova, por ausência de mecanismos eficazes de protecção de quem depõe, e é por isso que as declarações prestadas fora da audiência pública dão, elas sim, garantias seguras de corresponderem à genuína verdade dos factos, ou muito próximo dela.
72 - a - As escutas, reproduzidas em três volumes - e mais uma vez para elas se remete - não permitem “ver” os factos a sucederem-se no encadeamento próprio do dia-a-dia, mas permitem, por certo, “ouvir” as vozes dos protagonistas desses mesmos factos, numa sucessão eivada de tão grande autenticidade, que se torna impossível ignorar o que se passou antes, e que é referido a propósito, o que está a passar-se, e que é comentado em harmonia com o relato simultâneo que, na verdade, constitui, e ainda o que virá a passar-se no futuro, de conformidade com o que se combina, o que se promete, o que se faz menção de executar.
b - As escutas, acompanhando os alvos, são precedidas da definição destes, aliás abundantemente constantes dos autos, para os quais também se remete, e daí que se torne fácil saber quando fala certa pessoa e quando fala uma outra, tarefa, de resto, fortemente auxiliada pelo próprio diálogo, já que os protagonistas são os primeiros a quererem saber quem são os seus interlocutores.
c - O fio condutor das conversações, de resto, é de tal forma característico, que a sequência daquelas rapidamente induz com facilidade o intérprete das transcrições no contexto em que as coisas se passam, e que é unívoco e inequívoco, tamanha é a nitidez de contornos.
73 - a - Os reconhecimentos fotográficos baseiam-se em autos de verificação da identidade de pessoas, através de fotografias que, no caso, assumem grande nitidez, e isso permite ao Tribunal, sem esforço algum, verificar que a pessoa, que fez o reconhecimento, estava de boa fé quando tal aconteceu.
b - Dos dois, porém, são os reconhecimentos pessoais que se revestem de maior valor, sem que isso desvalorize, no contexto, os reconhecimentos fotográficos, e constituem o inapelável “apontar de dedo” da testemunha ao arguido, para mais feito com pleno à-vontade e fora das vistas deste - e já vimos que este detalhe é da maior importância.
74 - Os demais elementos de prova recolhidos permitem completar um quadro, no qual as realidades, diga-se desde logo, são já muito nítidas e muito precisas, havendo a realçar, sobretudo, a circunstância de que não há qualquer contradição ou incongruência a assinalar, antes pelo contrário.
75 - Elabora-se, finalmente, uma lista dos elementos de prova coligidos, com indicação da sua localização no processo, para todos eles desde logo se remetendo:
a - Intercepções telefónicas de folhas 31, 81 (apenso), 119 (apenso), 186 (apenso), 268 (apenso);
b - Relatos de vigilância de folhas 69, 84, 96, 159, 284, 288, 291, 296, 300, 303, 308, 317, 360, 368, 379, 382, 387, 432, 440, 444, 447, 511, 534, 540, 543, 547, 553, 647, 673, 678, 687, 692, 703, 709, 711, 718, 1251, 1255, 1260, 1266, 1269, 1273, 86 (apenso), 158 (apenso), 191 (apenso), 202 (apenso), 208 (apenso), 210 (apenso), 262 (apenso) 265 (apenso);
c - Fotografias de folhas 89, 100, 164, 237, 286, 290, 294, 299, 302, 306, 311, 322, 327, 364, 372, 376, 381, 384, 389, 434, 442, 446, 450, 482, 514, 518, 537, 542, 546, 551, 557, 632, 643, 650, 668, 675, 680, 685, 689, 694, 698, 705, 710, 713, 720, 758, 1235, 1246, 1253, 1258, 1263, 1268, 1271, 1277, 1391, 2357, 2599, 2734, 22 (apenso), 89 (apenso), 128 (apenso), 160 (apenso), 193 (apenso), 128 (apenso), 160 (apenso), 193 (apenso), 204 (apenso), 217 (apenso), 260 (apenso), 264 (apenso), 267 (apenso);
d - Passaportes de folhas 104, 239, 272, 453, 498, 669, 708, 790, 828, 845, 875, 880, 897, 932, 933, 934, 1393, 1408, 1481-A, 1676, 1777, 1789, 2140, 2359, 2412, 2901, 3278, 5403, 5406, 5408, 5410, 5412, 6029, 6083;
e - Autorizações de intercepções de folhas 207, 225, 282, 417, 469, 476, 597, 605, 621, 1716, 1851, 2278, 2636, 2825;
f - Notas sobre intercepções de folhas 219;
g - Contratos de trabalho de folhas 240, 248, 270, 2300, 2930, 2931, 2932, 2935;
h - Certificados do registo criminal de folhas 263, 277, 4903, 4904, 4905, 4906, 4907;
i - Anúncios de folhas 315;
j - Autos de fim de intercepção de folhas 334, 335, 2590;
l - Documentos pessoais de folhas 484, 505, 686, 744, 2949;
m - Documentos de trabalho de folhas 491;
n - Autos de início de intercepção de folhas 524, 721, 726, 2561, 2683;
o - Documentos fiscais de folhas 657;
p - Autos de busca e apreensão de folhas 793, 799, 804, 819, 823, 835, 839, 847, 853, 862, 940, 2728, 3243, 3246, 3249, 3252, 3253, 3256, 3261, 3263, 3266, 3268, 3273, 319 (apenso), 329 (apenso), 332 (apenso), 335 (apenso), 351 (apenso);
q - Autos de verificação de números de telemóvel de folhas 808, 856, 859, 2730, 338 (apenso);
r - Autos de revista e apreensão de folhas 811;
s - Autos de apreensão de veículo de folhas 825, 877, 4241, 4242;
t - Fotografias e passaportes de folhas 1098, 1123;
u - Fichas de folhas 1178, 2139, 3238, 5121, 283 (apenso);
v - Autos de reconhecimento fotográfico de folhas 1225, 1227, 1389, 1409, 1411, 1413, 1778, 1780, 1785, 1787, 2411, 2591, 2593, 14 (apenso), 20 (apenso), 173 (apenso), 175 (apenso), 177 (apenso), 182 (apenso), 196 (apenso), 198 (apenso), 200 (apenso);
x - Documentos de veículo de folhas 1298;
z - Declarações para memória futura de folhas 1519, 1609, 1621, 1883, 1933;
aa - Autos de reconhecimento pessoal de folhas 2069, 2071, 2073, 2075, 2077, 2079, 2081, 2083, 2086, 2088, 2090, 2092, 2094, 2096, 2098, 2100, 2102, 2104, 2106, 2108, 2110, 2112, 2114, 2116, 2118, 2120, 2391, 2393, 2395, 3655, 3657, 3659;
ab - Autos de transcrição de disco compacto de folhas 2161, 2343;
ac - Transcrições de folhas 2719, 3720, 3833, 4547;
ad - Certidão de folhas 2781;
ae - Extracto CGD de folhas 2946;
af - Antecedentes criminais estrangeiros de folhas 3181;
ag - Relatório pericial de folhas 3187, 3648;
ah - Lista de chamadas de telemóveis de folhas 3545;
ai - Autos de exame e avaliação de folhas 3674, 4426, 4429;
aj - Lista de objectos de folhas 4075;
al - Informação de números de telefone de folhas 4216;
am - Documentos hospitalares de folhas 60 (apenso);
an - Exames médico-legais de folhas 134 (apenso), 243 (apenso);
ao - Facturas e nota de débito de folhas 5316 a 5319 (cuidados de saúde prestados a MMM).
OS FACTOS E O DIREITO
Como decorre do artigo 412º do CPP, é pelas conclusões extraídas pelo recorrente na motivação apresentada, em que resume as razões do pedido, que se define o âmbito do recurso.
É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões, exceptuadas as questões de conhecimento oficioso.
E o conhecimento oficioso pelo STJ verifica-se por duas vias: uma primeira que ocorre por necessidade de indagação da verificação de algum dos vícios da decisão recorrida, previstos no artigo 410º-2 do CPP; e outra que poderá verificar-se em virtude de nulidade de decisão, nos termos do estatuído no artigo 379º-2 do mesmo diploma legal.
Por outro lado, definindo os poderes de cognição deste STJ, estatui o artigo 434º do citado CPP que, sem prejuízo do disposto no artigo 410º-2 e 3, o recurso interposto para este Tribunal visa exclusivamente o reexame da matéria de direito.
Na verdade, enquanto antes de 01.01.1999 estava estabelecido um sistema de “revista ampliada”, após a reforma da Lei 59/98, de 25 de Agosto, deixou de ser possível recorrer para o STJ com fundamento da existência de qualquer dos vícios referidos nas várias alíneas do artigo 410º-2 do CPP.
Anteriormente, o Supremo tinha poderes de intromissão em aspectos fácticos, mesmo nos casos em que o conhecimento se restringia a matéria de direito, embora de forma mitigada pois o reexame da matéria de facto apenas poderia ter lugar através da análise do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum e podendo o recorrente invocar como fundamento do recurso os vícios referidos.
Após a reforma de 1998, o STJ pode ainda conhecer dos vícios do artigo 410º-2 do CPP, não a pedido do recorrente, isto é, como fundamento do recurso, mas por iniciativa própria, para evitar que a decisão de direito se apoie em matéria de facto claramente insuficiente, ou fundada em erro de apreciação ou assente em premissas contraditórias, detectadas por iniciativa do STJ, ou seja, se concluir que, por força da existência de qualquer daqueles vícios, não pode chegar a uma correcta solução de direito e devendo sempre o conhecimento oficioso ser encarado como excepcional, surgindo como último remédio contra tais vícios – cfr. Acs. deste STJ de 12.09.2007 (que aqui seguimos de perto) in Proc.2583/07 – 3ª; de 17.01.2001, de 25.01.2001, de 22.03.2001, in CJSTJ 2001, I, pág 210, 222 e 257; de 04.10.2001 in CJSTJ 2001, III, 182, de 24.03.2003 in CJSTJ 2003, I, 236, de 27.05.2004 in CJSTJ 2004, II, 209, de 30.03.2005 in Proc. 136/05 – 3ª, de 03.05.2006 in Processos 557/06 e 1047/06, ambos da 3ª secção, de 20.12.2006 in CJSTJ 2006, III, 248, de 04.01.2007 in Proc. 2675/06 – 3ª, de 08.02.2007 in Proc. 159/07 – 5ª, de 15.02.2007 in Processos 15/07 e 513/07, ambos da 5ª secção, de 21.02.2007 in Proc. 260/07 – 3ª, de 02.05.2007 in Processos 1017/07, 1029/07 e 1238/07, todos da 3ª secção e ainda Simas Santos e Leal Henriques, CPP anotado, 2ª edição, II volume, pág. 967, onde se refere: “O considerar-se que não podem invocar-se os vícios do nº 2 do artigo 410º como fundamento do recurso directo para o STJ de decisão final do tribunal colectivo, não significa que este Supremo Tribunal não os possa conhecer oficiosamente, como ocorre no processo civil e é jurisprudência fixada pelo STJ (…)”.
Por outro lado, continua em vigor o Acórdão do Plenário das secções criminais do STJ, de 19.09.1995, in DR I Série-A, de 28.12.1995 e BMJ 450, 71 (acórdão 7/95) que no âmbito do sistema de revista alargada decidiu ser oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410º-2 do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito.
Ora, os arguidos/recorrentes
- AA nas partes em que alega:
a) a existência do vício de erro notório na apreciação da prova;
b) que no processo não estão os documentos em que o tribunal se alicerçou para atribuir ao recorrente o perfeito conhecimento da proveniência e dos montantes alvo de operações bancárias àquele atribuídas – alegadamente provenientes de actividades de uma suposta associação criminosa; e
c) que não se fez prova da prática de prostituição por UUU e TTT (neste aspecto deve ter-se em atenção que – ao contrário do que alega o recorrente - consta dos factos provados que TTT se prostituiu – cfr., nomeadamente, nºs 109p, 110p, 112p, 113p, 115p, 116p, 117p, 118p – e também se prostituiu UUU (cfr. nomeadamente, os nºs 79p a 81p inclusive).
- DD na parte em que alega:
a) Ttambém a existência do vício de erro notório na apreciação da prova; e
quanto ao crime de roubo, violação do princípio “in dubio pro reo”;
a)
b) - Nulidade da sentença por omissão de pronúncia (na medida em que a Relação, examinou o recurso interposto pelo recorrente, quanto à matéria de facto, socorrendo-se apenas da leitura da sentença – que considerou sem vícios a apontar-lhe).
Quanto ao crime de roubo, violação do princípio “in dubio pro reo”;
invocam, nas respectivas motivações e conclusões – nos segmentos indicados - vícios da matéria de facto.
Porém, como decorre claramente do atrás se expôs, o recurso para este Supremo Tribunal é restrito á matéria de direito, embora o STJ possa conhecer dos vícios da matéria de facto nos termos (supra) referidos: por iniciativa própria, para evitar que a decisão de direito se apoie em matéria de facto claramente insuficiente, ou fundada em erro de apreciação ou assente em premissas contraditórias, detectadas por iniciativa do STJ, ou seja, se concluir que, por força da existência de qualquer daqueles vícios, não pode chegar a uma correcta solução de direito e devendo sempre o conhecimento oficioso ser encarado como excepcional, surgindo como último remédio contra tais vícios.
Ora, da análise do acórdão recorrido, do respectivo texto, por si só ou conjugado com as regras da experiência comum e sem recurso a quaisquer elementos externos ou exteriores ao mesmo (designadamente declarações ou depoimentos exarados no processo, designadamente em julgamento e/ou documentos) não se indicia a existência de qualquer um daqueles vícios.
Na verdade, daquele texto considerado nos termos referidos e indicados no citado artigo 410º-2 do CPP, não se indicia quer a insuficiência da matéria de facto para a decisão de direito, quer erro notório na apreciação das provas ou seja erro de que todos se apercebam directamente ou que a decisão esteja eivada de clara contradição insanável na fundamentação.
Isto é, da decisão recorrida, considerada por si só ou conjugada com as regras da experiência comum não se indicia erro grosseiro na decisão da matéria de facto, erro patente, que não escapa à observação do homem de formação média.
Do texto da decisão recorrida considerada nos termos referidos não resulta de forma evidente uma conclusão contrária àquela a que o tribunal chegou.
Aliás, resulta claro daquela motivações dos recorrente que estes – nos aspectos atrás referidos - afinal impugnam a convicção adquirida pelo tribunal “a quo” sobre determinados factos, em contraposição com a que sobre os mesmos eles adquiram em julgamento, esquecendo-se do princípio da livre apreciação da prova constante do artigo 127º do CPP.
Só que, como se disse, estamos no domínio da livre apreciação da prova – artigo 127º do CPP – que não se confunde com apreciação arbitrária da mesma e que tem como pressupostos valorativos a obediência a critérios da experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica.
E é dentro destes pressupostos que o julgador deve colocar-se ao apreciar livremente a prova (cfr. Alberto dos Reis in CPC anotado e comentado, III, 246; Cavaleiro de Ferreira in Curso de Processo Penal, II, 288; Eduardo Correia, Les Preuves em Droit Penal Portugais, RDES, XIV; e Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, 107).
E o CPP instituiu sistemas de motivação e controle em sede de apreciação da prova, com realce para a consagração de um sistema que obriga a uma correcta fundamentação fáctica das decisões que conheçam a final do objecto do processo, de modo a permitir-se um efectivo controle da sua motivação (cfr. Marques Ferreira in Jornadas de Direito Processual Penal, 228).
Ora, no caso em apreço, está bem explícita na decisão recorrida a forma como o Tribunal adquiriu e formou a sua convicção, que está bem fundamentada, objectivada e logicamente motivada, sendo que os elementos de prova produzidos, foram apreciados pelas instâncias de acordo com as regras legalmente estabelecidas.
De qualquer modo, estamos – alegadamente - perante vícios atinentes à matéria de facto que, por isso, só podem ser conhecidos por este Supremo Tribunal, nos termos supra explanados.
Ora, analisado o texto da decisão recorrida - considerado por si só e sem recurso a quaisquer elementos externos nos termos indicados no citado artigo 410º-2 do CPP - concluimos pela inexistência dos alegados vícios e dos previstos no artigo 410º-2 do CPP.
Refira-se ainda – e para que dúvidas não subsistam - o acórdão recorrido refere expressamente – fls. 214 e 215 – que constam do processo, constituindo um apenso com a designação de doc. 14 e apenso A4 (o que aliás é de certo modo confirmado pelo recorrente, na medida em que lhe faz referência) os documentos em que o tribunal (também) se alicerçou para atribuir ao recorrente AA o perfeito conhecimento da proveniência e dos montantes alvo de operações bancárias àquele atribuídas – alegadamente provenientes de actividades de uma suposta associação criminosa, referindo-se ainda no acórdão recorrido que “aqueles documentos foram mesmo examinados, segundo auto de exame constante do apenso L … confirmando-se que ainda se encontram, como sempre se encontraram, juntos aos autos” – fls. 215 do acórdão recorrido.
E, porque, como se disse, o recurso para este Supremo Tribunal visa exclusivamente o reexame da matéria de direito, não sendo possível recorrer-se para o STJ com fundamento na existência de vícios da matéria de facto (designadamente os previstos nas várias alíneas do nº 2 do artigo 410º do CPP), os recursos acima referidos, dos arguidos AA e DD, não são admissíveis com aquele fundamento.
Por isso e no(s) segmento(s) atrás indicado(s), rejeita-se cada um daqueles recursos.
Assim:
Conhecer-se-á das questões – de direito - suscitadas por cada um dos recorrentes e que, face ás conclusões da respectiva motivação (atrás transcritas), são as seguintes:
1 - Recurso do arguido AA:
Como atrás se decidiu, o recurso, no segmento relativo á impugnação da matéria de facto, foi rejeitado.
A – Inconstitucionalidade do artigo 188º- 3 do CPP (versão anterior à dada pela Lei 48/2007, de 29 de Agosto) – relevante apenas quanto aos crimes de extorsão (segmento em que o recurso foi admitido).
B – Não leitura em audiência, das declarações para memória futura – nulidade desta prova – relevante apenas quanto aos crimes de extorsão (segmento em que o recurso foi admitido)
C – Crime de extorsão sob a forma continuada e não vários 12 crimes de extorsão em concurso real.
D – Pretende o recorrente que – considerando-se provados os crimes de extorsão em concurso real – então só cometeu 11 crimes desse tipo e não 12 como foi condenado.
Entende ainda que não cometeu o crime de extorsão contra QQQ nem contra XXX e SSS, nem sobre HHH e demais vítimas porque não está provada a violência ou ameaça com mal importante como meio e o elemento de adequação ao constrangimento.
E – Medida da pena do cúmulo é excessiva face aos antecedentes criminais e à idade do arguido.
F – Uma vez que teve vencimento parcial no recurso para a Relação, não se justifica a sua condenação em custas no máximo legal, impondo-se uma redução.
Apreciando:
A - Inconstitucionalidade do artigo 188º- 3 do CPP (versão anterior à dada pela Lei 48/2007, de 29 de Agosto), na interpretação segundo a qual é permitida, sem audição do arguido, a destruição de gravações de intercepções telefónicas não seleccionadas e a respectiva relevância no julgamento da matéria de facto e respeitante aos factos pelos quais o arguido foi condenado.
Trata-se de questão relativa à validade da decisão recorrida.
No caso dos autos, o Juiz de Instrução ordenou a destruição de gravação de escutas telefónicas porque as considerou como sem relevância ou não relevantes e disso o arguido/recorrente não teve conhecimento de forma a poder pronunciar-se sobre aquele aspecto (da relevância ou não relevância dessas escutas).
O Tribunal Constitucional, nos acórdãos nºs 660/06 de 28.11.2006, 450/07 de 18.09.2007 e 451/07, também de 18.09.2007, considerou aquela norma inconstitucional quando interpretada no sentido supra referido ou seja, no sentido de permitir aquela destruição sem que o arguido tivesse conhecimento das escutas de forma a poder pronunciar-se sobre a relevância ou não, das mesmas. Refira-se, porém, que nesses acórdãos houve votos em sentido contrário (votos de vencido) – cfr. www.tribunalconstitucional.pt.
Porém, na sequência desses acórdãos, o Tribunal Constitucional, em Plenário, proferiu o Acórdão nº 70/2008, de 31.01.2008 que, por maioria, decidiu não julgar inconstitucional a referida norma quando interpretada no sentido atrás apontado ou seja, quando interpretada no sentido de que o juiz de instrução pode destruir o material coligido através de escutas telefónicas, quando considerado não relevante, sem que o arguido dele tenha conhecimento e possa pronunciar-se sobre o eventual interesse para a sua defesa.
E, como se diz nesse Acórdão do TC nº 70/2008, de 31 de Janeiro, citado na decisão recorrida “ …O princípio acusatório e o reconhecimento do direito de contraditoriedade tem, pois … um sentido … que é o de assegurar ao arguido a possibilidade de, nas fases ulteriores do processo, contrabater as razões e as provas que tenham sido contra ele coligidas e tomar também iniciativas instrutórias e de realização de prova que considerar pertinentes.
No entanto, como é bom de ver, esse direito de contraditório existe em relação às provas em que se funda a acusação, as mesmas que serão ponderadas pelo juiz de instrução, para efeito de emitir o despacho de pronúncia, e levadas a julgamento, para efeito da condenação do réu.
É só em relação a essas provas – e não a quaisquer outras que os investigadores tenham considerado irrelevantes ou tenham abandonado por considerarem (bem ou mal) imprestáveis para os fins de indiciação da prática de ilícito – que o arguido poderá responder, alegando as razões que fragilizam os resultados probatórios ou indicando outras provas que possam pôr em dúvida ou infirmar esses resultados.
É o exercício desse direito, nas fases processuais subsequentes à investigação, que permite justamente equilibrar a posição jurídica da defesa em relação à acusação e dar cumprimento ao princípio da igualdade das armas. E é esse – e apenas esse – o sentido do princípio do acusatório que decorre do disposto no artigo 32º nº 5 da Constituição.
É essa também a essência do processo equitativo ou do “due processo f law”, que justamente envolve como um dos seus aspectos fundamentais (para além da independência e imparcialidade do juiz e a lealdade do procedimento) a consideração do arguido como sujeito processual a quem devem ser asseguradas as possibilidades de contrarias a acusação.
…
… Ainda que possa considerar-se aconselhável de iure condendo assegurar a integralidade das conversações telefónicas interceptadas, por razões de política legislativa que considerem prevalecentes as vantagens daí advenientes para a justiça do caso concreto (o que foi consagrado com a Lei 48/2007), tais considerações não justificam um juízo de inconstitucionalidade relativo à norma do art. 188º nº3 do CPP (na versão anterior a essa Lei) que, por tudo o que foi dito, não representa uma violação das garantias de defesa do arguido.”
Concordamos com os argumentos e fundamentos do citado Acórdão nº 70/2008, de 31.01, do Plenário do Tribunal Constitucional.
Por isso se conclui pela não inconstitucionalidade da norma contida no art. 188º nº3 do CPP, (na anterior versão á dada pela Lei 48/2007, de 29 de Agosto) e, no caso em apreço, pela legalidade da destruição das gravações ordenadas na fase de inquérito, pelo juiz de instrução.
Refira-se ainda que, da análise do processo, não se vê que o arguido/recorrente (e/ou os demais) tenha(m) alguma vez requerido ao Juiz, cópia dos suportes magnéticos com todas as transcrições. E não estavam impedidos de o requerer (questão diferente é saber se tal pedido seria deferido ou não).
Acresce que resulta do processo (cfr. fls. 6472 – vol 22) que a decisão instrutória foi lida em 25.Setembro.2006 e a desmagnetização dos suportes magnéticos só após os despachos do Exmº Juiz de Instrução (cfr. vol. 24) datados de 22.Dezembro.2006 (cfr. fls. 7083), de 08.Janeiro.2007 (cfr. fls. 7118) e de 11.Janeiro.2007 (cfr. fls. 7134), donde se conclui que tais registos estiveram disponíveis até à remessa do processo para julgamento.
Porém, como dissémos, o Tribunal Constitucional, em Plenário, proferiu o Acórdão nº 70/2008, de 31.01.2008 que, por maioria, decidiu não julgar inconstitucional a referida norma quando interpretada no sentido atrás apontado.
Portanto, o recurso improcede com este fundamento.
B - Da não leitura em audiência de julgamento, das declarações prestadas para memória futura.
Embora das conclusões da respectiva motivação não conste expressamente, resulta do teor da motivação que o recorrente questiona não só o facto de as declarações para memória futura não terem sido lidas em audiência, mas também o facto de tais declarações não terem sido traduzidas para a língua do recorrente.
Apreciando, dir-se-á que – como consta do auto de declarações para memória futura (vol. 6, fls. 1519 a 1525 e vol.7, fls. 1621 e 1626) – após a tomada daquelas declarações foi ordenada a comparência dos arguidos na sala para resumidamente serem instruídos das declarações das testemunhas, o que foi feito pelo Mº juiz.
Dessas actas resulta ainda: que estava presente o arguido, ora recorrente AA e o seu advogado; que aquando dessas declarações para memória futura foi nomeada intérprete aos arguidos de nacionalidade russa e ucraniana, por não falarem português, Elena Vassilieva; que o arguido/recorrente AA não assistiu às declarações por ter sidfo ordenada a sua saída da sala com os demais arguidos; que, porém, o defensor do mesmo arguido AA assistiu a todas essas declarações; que o Sr. Juiz “resumidamente instruiu do teor dos depoimentos prestados” o arguido/recorrente (AA); o mesmo arguido/recorrente AA tomou conhecimento das declarações prestadas para memória futura, através de tradução oral do essencial das mesmas.
Constata-se, portanto, que foi observado todo o mecanismo processual legalmente estabelecido para a audiência de julgamento em qualquer caso de afastamento do arguido durante a prestação de declarações (cfr. artigos 332º-7 e 352º-2, ambos do CPP).
E constata-se, também, que mediante a nomeação de intérprete na diligência em questão (declarações para memória futura) – em observância do estatuído no artigo 92º-2 do CPP - foi efectuada a tradução dos depoimentos prestados.
Do exposto resulta claro e inequívoco que, através do resumo que lhe foi feito pelo Mº juiz de Instrução, do teor dos depoimentos que tinham sido prestados, o arguido teve conhecimento do teor e acesso às declarações para memória futura.
Acresce que o seu defensor assistiu a toda aquela diligência, com a possibilidade de suscitar as questões que entendesse convenientes ou necessárias para a defesas e /ou formular perguntas adicionais (art. 271º-5, do CPP).
Sendo assim, foram observados e respeitados os comandos legais contidos no CPP e respeitado e assegurado o contraditório, pelo arguido, à prova contra ele produzida, sendo certo que, como bem se refere no acórdão recorrido, não se vê “razão para impor regime mais garantístico que o assegurado para os que compreendem a língua do processo, pois também a estes o artigo 352º apenas assegura o resumo a que se refere o nº 7 do artigo 332º, ambos do CPP, sendo tal regime conforme com o direito de interrogar ou fazer interrogar as testemunhas de acusação reconhecido pelo artº 6º § 3 d), da CEDH, ao acusado”.
E, como se disse, o defensor do arguido, ora recorrente, esteve presente á diligência de tomada de declarações para memória futura colocando as questões que entendeu dever colocar e não se vê do processo – e nem sequer se alega agora – que o arguido/recorrente, quando teve conhecimento – embora resumido – do teor dos depoimentos prestrdos, tenha pedido quaisquer esclarecimentos a alguma das testemunhas.
Por isso, no caso, foi efectivamente assegurado e respeitado o contraditório, sendo ainda certo que, depois, em audiência, sempre o arguido podia apreciar e criticar aquelas declarações prestadas.
Relativamente ao facto de aquelas declarações prestadas para memória futura não terem sido lidas em audiência de julgamento – como na verdade não foram – entendemos que essa leitura não é absolutamente indispensável para que possam ser consideradas válidas e para que possam ser valoradas pelo Tribunal, aquando do julgamento e, designadamente, para fundamentar a convicção relativamente à matéria de facto.
É que, como resulta do teor do artigo 271º do CPP (na redacção então vigente) – nos termos e com observância do qual aquela prova testemunhal foi produzida – tal representa uma antecipação – ainda que parcial, limitada e excepcional – do julgamento onde foi assegurado, como se viu, o exercício do com traditório e o princípio da oralidade.
Foi, pois, respeitada a estrutura acusatória do processo e assegurado um processo equitativo, com igualdade de armas.
Basta ver que aquelas declarações foram prestadas perante um juiz, foi assegurada a presença do(s) arguido(s) nos mesmos termos aos da audiência de julgamento, estiveram presentes o defensor e o MºPº (como a lei determina) e a inquirição das testemunhas é (e foi) feita permitindo-se o interrogatório cruzado das mesmas.
E, como se disse, o arguido pode contradizer as declarações e contraditar as testemunhas, posteriormente, em audiência de julgamento, apresentando as provas que entender.
É certo que o artigo 355º-1 do CPP estatui que “não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência”.
É a consagração e afloramentos do princípio do contraditório e da imediação da prova.
Porém, nos termos do nº 2 do mesmo normativo, “ressalvam-se do disposto no número anterior as provas contidas em actos processuais cuja leitura, visualização ou audição em audiência sejam permitidas, nos termos dos artigos seguintes”.
Ora, a interpretação conjugada deste preceito legal, com o artigo 356º, do mesmo Código, “ … não impõe que toda a prova documental indicada como tendo servido para formar a convicção do tribunal sobre os factos dados como provados tenha de ser lida em audiência de julgamento.
Dos citados artigos resulta que as únicas provas documentais cuja leitura é permitida em audiência são autos, não se encontrando porém o tribunal vinculado a fazer tal leitura, porquanto é uma faculdade que lhe assiste. …
O disposto no artigo 355º-1 do CPP visa tão só evitar que o tribunal possa formar a sua convicção alicerçando-se em material probatório não apresentado e junto ao processo pelos diversos intervenientes e relativamente ao qual não tenha sido exercido o princípio do contraditório” – Ac. deste STJ de 25.02.1993, BMJ 424, 535 (no mesmo sentido, cfr. Acs. do STJ de 04.06.2003, Proc. 519/03 – 3ª; SASTJ nº 72, 56; de 02.07.2003, Proc. 1802/03 – 3ª, SASTJ nº 13, 119 e de 29.11.2006, CJ Acs. STJ, Ano XIV, tomo 3, 235).
Daqui resulta, a nosso ver, que as declarações prestadas para memória futura não precisam de ser lidas, depois, em audiência propriamente dita para serem validamente utilizáveis. Podem ser lidas. Mas não têm necessariamente que ser lidas para serem validamente utilizáveis.
Na verdade o nº 2 do citado artigo 355º do CPP excepciona da regra do nº 1 (que a prova tenha sido produzida ou examinada em audiência) as provas contidas em actos processuais cuja leitura seja permitida (como é o caso das declarações prestadas para memória futura – artigo 271º do CPP).
Por isso, este normativo (355º do CPP) não impõe, não obriga, que o respectivo conteúdo seja efectivamente lido em audiência de julgamento para ser validamente utilizável.
Nem isso é exigido pelos princípios da imediação e do contraditório supra referidos e que, como se disse, foram assegurados neste caso concreto.
Neste sentido, cfr. Ac.STJ de 07.11.2007 que refere expressamente “ … As declarações para memória futura, verificados os pressupostos em que a produção é processualmente admitida (art. 271.º, n.º 1, do CPP), constituem um modo de produção de prova pessoal, submetido a regras específicas para acautelar o respeito por princípios estruturantes do processo, nomeadamente o respeito pelo princípio do contraditório.
IV - O princípio do contraditório – com assento constitucional no art. 32.º, n.º 5, da CRP – impõe que seja dada oportunidade a todo o participante processual de ser ouvido e de expressar as suas razões antes de ser tomada qualquer decisão que o afecte, designadamente que seja dada ao acusado a efectiva possibilidade de contrariar e contestar as posições da acusação.
V - A construção da verdadeira autonomia substancial do princípio do contraditório leva a que seja concebido e integrado como princípio ou direito de audiência, dando «oportunidade a todo o participante processual de influir através da sua audição pelo tribunal no decurso do processo» (cf. idem, pág. 153).
VI - A densificação do princípio deve, igualmente, relevante contributo à jurisprudência do TEDH, que tem considerado o contraditório um elemento integrante do princípio do processo equitativo, inscrito como direito fundamental no art. 6.º, § 1.º da CEDH.
VII - Na construção convencional, o contraditório, colocado como integrante e central nos direitos do acusado (apreciação contraditória de uma acusação dirigida contra um indivíduo), tem sido interpretado como exigência de equidade, no sentido em que ao acusado deve ser proporcionada a possibilidade de expor a sua posição e de apresentar e produzir as provas em condições que lhe não coloquem dificuldades ou desvantagens em relação à acusação.
VIII - No que respeita especificamente à produção das provas, o princípio exige que toda a prova deva ser, por regra, produzida em audiência pública e segundo um procedimento adversarial; as excepções a esta regra não poderão, no entanto, afectar os direitos de defesa, exigindo o art. 6.º, § 3.º, al. b), da Convenção que seja dada ao acusado uma efectiva possibilidade de confrontar e questionar directamente as testemunhas de acusação, quando estas prestem declarações em audiência ou em momento anterior do processo (cf., v.g., entre muitas referências, o acórdão Vissier c. Países Baixos, de 14-02-2002).
IX - Os elementos de prova devem, pois, em princípio, ser produzidos perante o arguido em audiência pública, em vista de um debate contraditório. Todavia, este princípio, comportando excepções, aceita-as sob reserva da protecção dos direitos de defesa, que impõem que ao arguido seja concedida uma oportunidade adequada e suficiente para contraditar uma testemunha de acusação posteriormente ao depoimento; nesta perspectiva, os direitos da defesa mostram-se limitados de maneira incompatível com o respeito do princípio sempre que uma condenação se baseie, unicamente ou de maneira determinante, nas declarações de uma pessoa que o arguido não teve oportunidade de interrogar ou fazer interrogar, seja na fase anterior, seja durante a audiência. São estes os princípios elaborados pela jurisprudência do TEDH a respeito do art. 6.º, §§ 1 e 2, al. d), da CEDH (cf., v.g., acórdãos Craxi c. Itália, de 05-12-2002, e S. N. c. Suécia, de 02-07-2002).
X - Em certas circunstâncias pode ser necessário que as autoridades judiciárias recorram a declarações prestadas na fase do inquérito ou da instrução, nomeadamente quando a impossibilidade de reiterar as declarações é devida a factos objectivos, como sejam a ausência ou a morte, ou a circunstâncias específicas de vulnerabilidade da pessoa (crimes sexuais); se o arguido tiver oportunidade, adequada e suficiente, de contraditar tais declarações posteriormente, a sua utilização não afecta, apenas por si mesma, o contraditório, cujo respeito não exige, em termos absolutos, o interrogatório directo em cross-examination.
XI - O princípio do contraditório tem, assim, uma vocação instrumental da realização do direito de defesa e do princípio da igualdade de armas: numa perspectiva processual, significa que não pode ser tomada qualquer decisão que afecte o arguido sem que lhe seja dada a oportunidade para se pronunciar; no plano da igualdade de armas na administração das provas, significa que qualquer um dos sujeitos processuais interessados, nomeadamente o arguido, deve ter a possibilidade de convocar e interrogar as testemunhas nas mesmas condições que os outros sujeitos processuais (a “parte” adversa).
XII - O modo de prestação de declarações para memória futura respeita os elementos essenciais do contraditório, dadas as garantias que o n.º 2 do art. 271.º do CPP estabelece: o arguido pode estar presente na produção, e assegura-se a possibilidade de confrontação em medida substancialmente adequada ao exercício do contraditório (art. 271.º, n.º s 2 e 3, do CPP).
XIII - Para salvaguarda do exercício do contraditório também não é necessária a leitura das declarações em audiência, nem dela depende a validade da prova para memória futura.
XIV - No caso das declarações para memória futura, o princípio da imediação mostra-se respeitado sempre que a prova é apreciada pelo conjunto e não elemento a elemento, pressupondo a conjugação sistémica com todos os elementos de prova processualmente admissíveis e produzidos nas condições da lei”
Pelo exposto, o recurso improcede com este fundamento.
C – Crime de extorsão sob a forma continuada e não vários crimes de extorsão em concurso real?
Entende o mesmo arguido/recorrente que só poderia ter sido condenado pela prática de crime de extorsão sob a forma continuada e não em concurso real.
Isto, porque entende o recorrente que estamos perante a realização projectada no tempo do mesmo crime de extorsão, realizada alegadamente da mesma forma, através de alegadas ameaças, as quais seriam feitas a dois grupos de alegadas vítimas distintos, um de motoristas de transporte de pessoas e bens de nacionalidade ucraniana e outro de alegadas mulheres de nacionalidades dos Países do Leste que alegadamente se dedicam à prostituição. E, o facto dos elementos que compõem ambos os grupos de alegadas vítimas, dentro de cada um dos grupos se conhecerem, comunicarem entre si e repartirem os factos que são imputados ao ora recorrente e ainda assim não tenham agido, por entenderem, quiçá por convicção, quiçá porque nunca tenham efectivamente sentido medo do ora recorrente ou que nem foram ameaçados, como muitos disseram em sede de declarações para memória futura, faz com que se deva ponderar unicamente a condenação do ora recorrente num crime continuado de extorsão.
A nosso ver, porém, não lhe assiste razão.
Na verdade, além de outros requisitos, o artigo 30º do Código Penal exige, no seu nº 2, para a verificação do crime continuado que a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime, seja executada “no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente”.
Ora esse requisito ou pressuposto não se verifica no caso em apreço.
Como se diz no acórdão recorrido, “a repetição da conduta do arguido ao longo do tempo e envolvendo diversas pessoas, ainda que de forma essencialmente homogénea, caracteriza a conduta criminosa do arguido tal como projectada e executada por si, enquanto actividade ilícita a desenvolver ao longo do tempo de forma organizada, não tendo, de modo algum, cariz exógeno, alheio à inclinação endógena do arguido para a prática de crime, que pudesse de algum modo explicar a repetição e, desse modo, fundamentar a punição por um só crime continuado.
Por outro lado, mesmo a entender-se com o arguido que se mostravam preenchidos todos os pressupostos de que o art. 30º faz depender a punição por um só crime continuado, sempre no caso concreto seria de afastar a punição nesses termos por estarem em causa bens eminentemente pessoais e serem diversas as vítimas, o que, conforme entendimento pacífico na doutrina e jurisprudência desde o início de vigência do C.Penal de 1982, afasta a punição da conduta plúrima como um só crime continuado. Como diz, por todos, Taipa de Carvalho, «A extorsão de várias pessoas determina um concurso efectivo de crimes, havendo tantos crimes quantos os ofendidos. Tal fundamenta-se no facto de ser elemento essencial da extorsão a lesão de bens eminentemente pessoais desde logo e sempre a lesão da liberdade de acção. A mesma razão leva à exclusão da figura do crime continuado, afirmando-se tantos crimes quantas as vezes que o crime de extorsão tiver sido cometido…» (cfr ob. supracitada p. 350).
O referido normativo (nº 2 do artº 30º do CPP) teve por fonte o artigo 33º do Projecto da Parte Geral do Código Penal de 1963 e inspirou-se na formulação do Prof. Eduardo Correia, exposta na Unidade e Pluralidade de Infracções. E, aquando da discussão daquele artigo 33º, na sessão da Comissão Revisora (em 08.02.1964), foi aprovado um último período para a redacção daquele nº 2, do seguinte teor: “A continuação não se verifica, porém, quando são violados bens jurídicos inerentes à pessoa, salvo tratando-se da mesma vítima”.
É certo que esse último período ou parágrafo não ficou a constar do texto da lei aprovado mas isso não significa que tenha sido adoptado outro entendimento, mas apenas que o legislador considerou aquela afirmação desnecessária, face ao entendimento que já era perfilhado pela doutrina (neste sentido, cfr. Maia Gonçalves, CP anotado, 2007, pág. 156 ao dizer: “ Deve ser excluída a possibilidade de unificação sob a forma de crime continuado das condutas que violam bens jurídicos inerentes às pessoas, apesar de a consagração desta exclusão não figurar agora na lei. É uma emanação da natureza eminentemente pessoal dos bens violados, que se individualizam em cada uma das vítimas; resulta da própria natureza das coisas, indiscutível e formulada pela doutrina. Por isso, a lei considerou dispensável fazer a afirmação expressa de que a continuação se não verifica quando são violados bens jurídicos inerentes à pessoa, salvo tratando-se da mesma vítima, apesar de algumas legislações estrangeiras a fazerem).
Tendo tudo isto presente e porque no caso agora em apreço inexiste uma situação exterior propiciadora da reiteração criminosa e capaz de justificar uma menor exigibilidade com a inerente ou consequente diminuição da culpa, inexiste crime continuado, verificando-se tantos crimes quantas as vítimas (no caso, doze, pois tinha sido condenado, em 1ª instância pela prática de treze crimes dessa natureza e o Tribunal da Relação de Évora, no acórdão recorrido, absolveu-o quanto ao crime – de extorsão – relativo a NNN.
Por isso, o recurso improcede também neste segmento.
D – Pretende o recorrente que – considerando-se provados os crimes de extorsão – então só cometeu 11 crimes desse tipo e não 12 como foi condenado.
Entende ainda o recorrente que não cometeu o crime de extorsão contra QQQ nem contra XXX e SSS, nem sobre HHH e demais vítimas porque não está provada a violência ou ameaça com mal importante como meio e o elemento de adequação ao constrangimento.
Alega o recorrente que veio pronunciado pela prática doze crimes de extorsão nas pessoas das vítimas UUU, PPP, LLL, NNN, AAAA, BBB ZZZ, XXX e seu pai, RRR, JJJJ e HH; mais dois crimes de extorsão nas pessoas das vítimas QQQ e CCC; e um crime de extorsão na pessoa da vítima HHH.
Na 1ª instância, foi absolvido do crime de extorsão quanto às vítimas BBBB e Viktor Nuka, tendo sido condenado pela prática de treze crimes dolosos consumados de extorsão.
E na Relação foi absolvido do crime de extorsão também quanto à vítima NNN.
Ora, considerando o número de vítimas relativamente às quais foi condenado pelo crime de extorsão verifica-se que só cometeu 11 crimes deste tipo e não 12 por que foi condenado na Relação.
Apreciando e decidindo, dir-se-á que, nesta parte, o recorrente tem razão.
Na verdade, face à matéria de facto assente, apenas cometeu o crime de extorsão relativamente a 11 pessoas e não a 12.
A confusão resulta de, no relatório do acórdão da 1ª instância – que, depois, a Relação transcreveu – se ter referido que o arguido AA vinha pronunciado pela prática de doze crimes de extorsão nas pessoas das vítimas UUU, PPP, LLL, NNN, AAAA, BBB ZZZ, XXX e seu pai, RRR, JJJJ e HH.
Ora, se contarmos bem o número das vítimas referidas, elas são apenas 11.
Destes crimes, o arguido/recorrente foi absolvido na 1ª instância relativamente a dois de que alegadamente teriam sido vítimas BBBB e JJJJ.
Assim, teria cometido 9 crimes de extorsão quanto ao grupo de vítimas supra identificadas.
Para além destes, cometeu mais 3 crimes de extorsão relativamente às vítimas QQQ, CCC e HHH.
Assim, no total cometeu – relativamente á sentença da 1ª instância 12 crimes de extorsão e não de 13.
E, porque na Relação, foi absolvido ainda do crime de extorsão relativamente à alegada vítima NNN, é fácil constatar que cometeu 11 crimes de extorsão e não 12 como decidiu a Relação.
Por isso, neste segmento, o recurso merece provimento (o que eventualmente relevará apenas em termos de pena única a aplicar em cúmulo jurídico).
Entende ainda o recorrente que não cometeu o crime de extorsão contra QQQ nem contra XXX e SSS, nem sobre HHH e demais vítimas porque não está provada a violência ou ameaça com mal importante como meio e o elemento de adequação ao constrangimento.
Só que, da conjugação dos factos provados sob os nºs 91p a 99p, 174p a 179p, 182p, 183p, 187p a 192p e ainda nºs 129p a 137p, resulta suficientemente provado que:
Quanto a HHH:
O ora recorrente, mediante plano prévio dele e actuando em comunhão de esforços e intentos, actuando com intenção de conseguirem para si e para o grupo, lucro económico, constrangeram psicologicamente o ofendido HHH a entregar-lhe dinheiro, contra a sua vontade e com o correspondente prejuízo (nº 135p);
Acresce que o arguido ora recorrente e VV e FFF actuaram como membros do mesmo grupo organizado, fazendo dessa actividade meio de vida e actuando em concertação de vontades e esforços, não se coibindo de o fazer como fizeram e conformaram-se com o resultado das suas condutas, tendo agido voluntária, livre e conscientemente, bem sabendo mproibidas e puníveis as suas condutas por lei (nºs. 136p e 137p).
Quanto a XXX e RRR:
175p. XXX legalizou-se aqui (AP nº .........., e em Março ou Abril de 2003 começou a transportar pessoas e mercadorias da Ucrânia para Portugal e vice-versa, inicialmente de dois em dois meses, e depois uma vez por mês.
176p. Para o efeito, XXX comprou a carrinha Mercedes Sprinter com a matrícula ucraniana ............., fazendo em regra o transporte de três ou seis pessoas por viagem e ainda de objectos, cujo transporte lhe era solicitado.
177p. Habitualmente, XXX cobrava entre 100 e 120 Euros por pessoa, incluindo as respectivas bagagens, e cobrava por cada saco ou mala apenas 5 Euros.
178p. Desde Julho ou Agosto de 2003 até data não apurada, XXX foi abordado por diversas vezes por pessoas que lhe exigiam dinheiro em Espanha e Portugal, mas nada pagou, até que por aquela data, quando se dirigia a um posto de lavagem de carros em Portimão, foi molestado por indivíduos cuja identidade se não apurou, que o manietaram, meteram dentro da viatura e levaram para Ayamonte, Espanha, onde permaneceu fechado numa casa, durante três dias, sendo repetidamente agredido, até fornecer o número de telefone de seu pai na Ucrânia.
179p. A fim de voltar a ver o filho e para reaver a carrinha Mercedes, RRR, pai de XXX, viu-se obrigado a pagar a quantia de 5.000 Euros aos sequestradores.
182p.Com efeito, decorridos dois dias, o arguido AA recebeu a quantia de 3.500 Euros do pai do ofendido já em Portugal, e libertou XXX na estação de comboios de Vila Real de Santo António.
183p. Depois disso, o arguido AA dirigiu-se a Lisboa, na companhia do pai de XXX, e devolveu-lhe a carrinha Mercedes, propriedade deste.
186p. O arguido AA actuou sempre de forma voluntária, livre e consciente, bem sabendo proibidas e puníveis por lei aquelas condutas.
187p. A partir de Agosto de 2003, o arguido AA sugeriu ao ofendido XXX que lhe pagasse para receber protecção, e forneceu-lhe o número do seu telemóvel, o que este último passou a fazer, para não ter mais dissabores.
188p. O arguido AA procedeu da mesma forma com outros ofendidos, também motoristas.
189p. Para evitar ser molestado pelos indivíduos que o abordavam, XXX fornecia-lhes o número de telemóvel do arguido AA, tendo começado a pagar 100 Euros por viagem a este arguido, e no primeiro trimestre de 2005 passou a pagar-lhe 200 Euros por cada viagem Ucrânia-Portugal-Ucrânia, à semelhança de outros condutores, que efectuavam idênticos transportes e pagavam idênticas quantias ao mesmo arguido.
190p. Os referidos pagamentos eram feitos por XXX e por outros directamente ao arguido AA que, via telefónica, os procurava e combinava encontros em Portimão ou Albufeira com o propósito de receber aquelas quantias, sendo que, durante oito meses, aqueles lhe pagaram para não serem molestados nas suas pessoas ou bens.
191p. Nos encontros supra descritos, o arguido AA apareceu acompanhado pelo arguido KK, pelo indivíduo referido como S.....a, ou pelos dois.
192p. No dia 15 de Julho de 2005, após ter estado ausente, o arguido AA telefonou a XXX, tendo-lhe perguntado se havia pago tudo correctamente na sua ausência.
Resulta destes factos, que RRR, para voltar a ver o filho e para reaver a carrinha Mercedes teve de pagar 5.000 euros aos sequestradores, tendo o ora recorrente dele recebido 3.500 euros. E na sequência disso, o ora recorrente libertou XXX na estação de comboios de Vila Real de Santo António e depois disso, (o ora recorrente) dirigiu-se a Lisboa na companhia do pai de XXX (RRR) e devolveu-lhe a carrinha Mercedes.
Tudo isto evidencia e consubstancia violência contra pessoas e contra bens das vítimas por parte do recorrente, para as obrigar a entregarem-lhe dinheiro, o que conseguiu, tendo recebido 3.500 euros.
Quanto a QQQ:
91p. A cidadã ucraniana QQQ, ou Y....a, viajou num mini-bus com a amiga MMMM em Maio de 2002, da Ucrânia com destino a Portugal.
92p. Chegada a Olhão, os arguidos AA e AAA esperavam QQQ, ofereceram-lhe alojamento na sua residência e prometeram arranjar-lhe emprego, e à sua amiga Oksana, num bar de alterne sito em Porches.
93p. Nesse bar, os arguidos AA e AAA eram porteiro e empregada de mesa, respectivamente.
94p. QQQ e MMMM a faziam companhia aos homens e bebiam, auferindo entre 50 e 60 Euros diários.
95p. Desde então, QQQ entregava ao arguido AA metade do que ganhava no referido bar, bem como do que passou a ganhar no bar denominado ‘Chaminé’, sito em Poço Barreto, a pretexto de protecção que o mesmo nunca lhe prestou e aquela nunca necessitou.
96p. Em regra, QQQ auferia mensalmente entre 1.000 e 1.600 Euros, e durante cerca de um ano, no início de cada mês, entregou metade dessas quantias ao arguido, que habitualmente a contactava para as receber.
97p. Habitualmente, o arguido AA deslocava-se num veículo BMW de cor escura, e para locais previamente estabelecidos por ele, normalmente o McDonald’s de Albufeira, onde recebia o dinheiro.
98p. Até então, QQQ permanecia ilegal em Portugal, não tinha familiares, nem conhecia ou privava com conterrâneos seus, e temia pela sua sorte e integridade física, o que a levou a pagar as supras referidas quantias em dinheiro ao arguido AA, até por saber que outras mulheres também lhe pagavam idênticas quantias sem que a isso se conseguissem opor.
99p. Em 2003, o arguido AA (J....), continuando a exigir quantias em dinheiro a QQQ, decidiu que esta teria de entregar-lhe o montante mensal de 600 Euros, o que passou a acontecer durante cerca de mais um ano.
Dos factos provados resulta claro que o ora recorrente por si e com outros, a pretexto de lhes prestarem segurança, obrigavam as vítimas a entregar-lhe dinheiro e, se estas não acedessem a tal exigência, ameaçavam-nas seriamente e estas, temendo pela sua integridade física e até pela vida e receando fortes represálias, entregavam-lhe dinheiro, por várias vezes e de forma regular.
É certo que o Tribunal da Relação, alterando – parcialmente - a matéria de facto, julgou não provados os factos que na 1ª instância o tinham sido, sob os nºs 180p, 181p, 184p e 185p.
Porém tais factos relevariam apenas relativamente ao crime de rapto e, por isso mesmo, o arguido foi absolvido (pelo Tribunal da Relação) desse crime.
Porém, os demais factos tidos por assentes permitem subsumi-los na previsão legal do crime de extorsão por que o ora recorrente foi condenado.
E estas considerações valem também relativamente às demais vítimas (UUU, PPP, LLL, AAAA, ZZZ, HH e CCC).
Parece-nos pertinente transcrever uma pequena passagem do acórdão da 1ª instância que, sobre o aspecto agora em causa – prova da violência ou da ameaça séria – diz: “Nos autos, temos um contexto de relacionamento entre pessoas que desembolsam - prostitutas e condutores, pelo menos - e outras que exigem e recolhem esses desembolsos, sem que estas tenham de “dizer a ameaça” cada vez que é preciso pagar.
Cada vez que é preciso pagar, a vítima toma, não raro, a iniciativa de oferecer o pagamento, e algumas escutas há em que o arguido AA pergunta aos condutores a razão de terem chegado e de não terem telefonado logo, pois é essa a conduta que se espera, e nesta pergunta pode estar encerrada uma ameaça.
A iniciativa da vítima de estabelecer o contacto, porém, nada tem a ver com qualquer ameaça, antes a impulsiona a noção de que, sujeita a violência em qualquer momento, mais vale à vítima afastar, por algum tempo, a sujeição a essa violência tomando a iniciativa de pagar.
Aqui reside a diferença entre a existência duma organização criminosa e a acção isolada dum criminoso, pois este esgota a sua conduta num acto, que pode prolongar-se no tempo, mas que o sujeita a reacção imediata, por estar sozinho e desprovido de outros que o continuem - ao passo que a noção das vítimas de que, não comparecendo a contactá-las o arguido AA, outra pessoa o fará, de que a detecção e captura deste não só não faz cessar os pagamentos, como para além disso pode ocasionar retaliações, então sim pelo efectivo exercício da violência, essa noção, pois, exerce um efeito de intimidação inelutável, essa noção, induzida pelo grupo na sua vítima, é violência na mais autêntica acepção do termo”.
É isto que na verdade, ressalta evidente da apreciação e cotejo da globalidade dos factos provados.
Veja-se, quanto a QQQ que permanecia ilegal em Portugal, não tinha familiares nem conhecia ou privava com conterrâneos seus e temia pela sua sorte e integridade física ao que a levou a pagar quantias em dinheiro ao ora recorrente, até por saber que outras mulheres também lhe pagavam idênticas quantias sem que a isso conseguissem opor-se. E as supra referidas quantias que ela pagava ao ora recorrente, que habitualmente a contactava para as receber, constituíam metade das quantias que auferia mensalmente (entre 1.000 e 1.600 euros).
Daqui resulta evidente que ela pagava aquelas quantias em dinheiro obrigada, porque o recorrente as exigia e porque temia pela sua sorte e pela sua integridade física, pois, obviamente, o recorrente ameaçava-a se não pagasse.
E o mesmo se diga quanto a HHH a quem o arguido “mediante plano prévio dele e actuando em comunhão de esforços e intentos, actuando com intenção de conseguirem para si e para o grupo, lucro económico, constrangeram psicologicamente o ofendido HHH a entregar-lhe dinheiro, contra a sua vontade e com o correspondente prejuízo”
E também quanto a RRR e XXX este, em Portimão, quando seguia na carrinha Mercedes que comprara, foi manietado e levado para Ayamonte onde permeneceu fechado numa casa, durante três dias, sendo repetidamente agredido, até fornecer o número de telefone de seu pai que, para voltar a ver o filho e reaver a carrinha Mercedes teve de pagar 5.000 euros, dos quais o ora recorrente recebeu 3.500 após o que o arguido/recorrente libertou o XXX na estação de comboios de Vila Real de santo António e em Lisboa devolveu a carrinha a RRR.
Finalmente, ainda quanto ao aspecto em questão, deve dizer-se que, no fundo, do recorrente discorda é da matéria de facto provada, contrapondo á convicção do tribunal aquela que ele adquiriu em julgamento.
É o que decorre claramente da respectiva motivação, designadamente da parte em refere textualmente: (fls. 10573) “E como não se compreende o conteúdo e o alcance do que se quer fazer crer que foram ameaças, nunca se consegue compreender se a ameaça visou um mal importante e muito menos se consegue aquilatar se a dita ameaça é adequada ao constrangimento. De resto foi isto mesmo que já se referiu acima, quando se analisou os erros notórios cometidos na apreciação da prova que injustamente levou o ora recorrente a ser condenado pelos crimes de extorsão” (sublinhado nosso).
Pelo exposto, neste segmento, o recurso não pode proceder.
E – A medida da pena do cúmulo é excessiva?
Já vimos atrás que a conduta do arguido integra a prática dos crimes por que foi condenado, excepto quanto ao número de crimes de extorsão cometidos: 11 e não 12.
Por outro lado, invoca o recorrente que o acórdão recorrido o condenou na pena de 10 anos de prisão por cada um dos crimes de extorsão, quando, o mesmo acórdão refere que assume maior relevância agravante a concreta conduta do recorrente relativamente a TTT.
Sendo assim, pretende o recorrente que aos outros crimes de extorsão deveria corresponder uma pena menos grave.
Quid júris?
O recorrente lavra em erro na medida em que o aspecto que foca do acórdão recorrido não se reporta aos crimes de extorsão (como alega) mas sim aos crimes de lenocínio.
Na verdade, sobre este ponto, o que se diz no acórdão recorrido é o seguinte:
“… b) Posto isto, há que proceder à determinação da medida concreta da pena a aplicar ao arguido por cada um destes dois crimes de Lenocínio simples, que o art. 169º nº1 do C.Penal pune em abstracto com prisão de 6 meses a 5 anos.
São as seguintes as circunstâncias que não fazendo parrte do tipo de crime depõem contra o arguido (cfr art. 71º do C.Penal):
- O dolo directo, o grau de ilicitude do facto, traduzido na forma profissional como o arguido desenvolvia a sua conduta (i.e. de forma habitual e com carácter regular, extraindo de tal actividade proventos que contava ordinariamentre entre os seus activos patrimoniais, por contraponto à actividade pontual, esporádica) e no lucro obtido (UUU entregava-lhe cerca de 700€ mensais em meados de 2005 e CCC cerca de 1000 € mensais - cfr nºs 116, 117 e 120 da factualidade provada).
Na medida em que a violência exercida sobre estas mulheres faz parte do tipo legal de Extorsão agravada pelo qual o arguido vai condenado em concurso efectivo com os crimes de Lenocínio simples ora em análise, não será tal violência tomada em consideração nas penas concretas por estes últimos crimes em obediência ao princípio da proibição de dupla valoração manifestado no art. 71º nº2 do C.Penal.
Quanto às consequências da conduta do arguido, tendo em vista o bem jurídico protegido ligado à tutela de um certo tipo de vida mas, sobretudo, à tutela antecipada de formas de violação da liberdade de determinação da vontade, assume maior relevância agravante a concreta conduta do arguido relativamente a CCC (sublinhado nosso) a quem procurou reter, prolongando o exercício da prostituição com benefício para si.
No que respeita à situação pessoal e económica do arguido, conduta anterior e posterior aos factos, relevam aqui sobretudo os antecedentes criminais do arguido e o seu alheamento de formas lícitas de ganhar a vida, ausência de confissão e arrependimento que, globalmente, lhe é desfavorável. (vd infra).
Atentas estas circunstâncias, afigura-se-nos adequada a pena de 3 anos relativamente ao crime cometido através de UUU e a pena de 3 anos e 6 meses de prisão relativamente a CCC. …”.
Portanto, quanto aos crimes de lenocínio, a conduta do arguido assume maior relevância agravante relativamente a CCC, quanto às consequências da conduta daquele, na medida em que procurou reter aquela e prolongar o exercício da prostituição com benefício para ele.
Mas esse facto foi devidamente ponderado para a determinação da medida concreta da pena.
E, por isso mesmo, se fixou em 3 anos de prisão a pena relativa ao crime de lenocínio cometido em realação a UUU; e em 3 anos e 6 meses de prisão a pena relativa ao crime de lenocínio cometido em realação a CCC.
Por isso, neste aspecto, não assiste razão ao recorrente que incorre em manifesta confusão quanto aos crimes em causa.
O recorrente entende que a pena única que lhe foi aplicada é exagerada atendendo ainda á (sua) idade; ao facto de os antecedentes criminais que tem em Portugal respeitarem a crimes/ilícitos rodoviários; os antecedentes criminais que tem na Ucrânia (que, na alegação do recorrente, remontam ao regime totalitário da URSS) dizerem respeito a crimes de natureza indeterminada e arbitrária e que não se encontram cabalmente documentados; e que nenhum dos crimes por que vem condenado envolvem agressões à integridade física e muito menos contra a vida.
Quid júris?
Importa ter em atenção as penas parcelares aplicadas correspondentes aos crimes praticados pelo arguido/recorrente:
- 7 anos de prisão por autoria material de 1 crime doloso consumado de ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 3, do Código Penal;
- 10 anos de prisão pela prática em autoria material, em concurso efectivo e real, de cada um dos 11 crimes de EXTORSÃO, previstos e punidos pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal;
- 3 anos de prisão relativamente ao crime de lenocínio simples, p. e p. pelo artigo 169º-1 do Código Penal, cometido em relação a UUU;
- 3 anos e 6 meses de prisão relativamente ao crime de lenocínio simples p. e p. pelo artigo 169º-1 do Código Penal, cometido relativamente a CCC.
Relativamente á pena a fixar em cúmulo jurídico, há que ter em conta, no seu conjunto, os factos e a personalidade do agente (artº 77º-1 do CP).
De acordo com Figueiredo Dias (obra supra citada, pág. 291), o conjunto dos factos fornecerá “ … a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique.
Na avaliação da personalidade – unitária – do agente, relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é recondutível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma “carreira”) criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuír á pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização). … “.
Por outro lado, a pena (única) aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicvadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e, como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (artº 77º-2 do CP).
Assim sendo e face ao que acima se deixou dito, no caso do recorrente a pena aplicável tem como limite mínimo 10 anos de prisão e como limite máximo 25 anos de prisão (pois que a soma material de todas as penas concretamente aplicadas - 123 anos e 6 meses - excede substancialmente aquele limite).
Ora, ponderando os factos e a personalidade do arguido, diz-se no acórdão recorrido:
“Procedendo à ponderação da globalidade dos factos e da personalidade do arguido no caso concreto, é evidente não estarmos perante hipótese de plurocasionalidade incongruente com a personalidade do arguido, mas antes em face de uma carreira delinquente bem marcada, revelando o arguido clara inclinação para organizar o seu modo de vida no campo da ilicitude penal, com desrespeito pela integridade de bens jurídicos de grande importância na convivência social, como sejam a liberdade, nomeadamente de acção e determinação, e a integridade física, o que é bem patente não só na factualidade típica provada nos autos mas também na que respeita aos seus antecedentes criminais, cumprindo destacar o cumprimento na Ucrânia de uma pena de 17 anos de prisão (cfr nº246p da factualidade provada)
Todavia, globalmente considerada, a ilicitude dos factos afasta-nos da pena máxima aplicável (não obstante o resultado da soma material das penas parcelares), pois a violência e ameaça típicas do crime de extorsão, que constitui o tipo penal determinante no caso presente (doze crimes) só pontualmente assumiram especial intensidade sendo certo que no plano da ilicitude material pode mesmo falar-se de alguma sobreposição entre a circunstância especial modificativa (actuar com outros membros do bando) e a condenação pelo crime de associação criminosa.
O ponto de vista da prevenção especial não assume no caso papel relevante de sentido favorável ao arguido, antes pelo contrário, tanto mais que para além dos antecedentes criminais o arguido não se encontra arrependido, não confessou os factos com relevância para a descoberta da verdade nem tomou qualquer atitude posteriormente aos factos que pudesse minorar as consequências dos seus actos ou mesmo a forma como se relaciona com as exigências impostas pelo ordenamento jurídico-penal. A possível ressocialização do delinquente, que constitui uma das finalidades das penas afirmada positivamente entre nós no art. 40º do C. Penal, há-de ser prosseguida no caso durante a execução da pena de prisão.
Afigura-se-nos, pois, adequada a pena única de 22 anos de prisão, abaixo da qual ficariam em crise a defesa do ordenamento jurídico, ou seja, as necessidades de prevenção geral positiva ou de integração presentes no caso, dada a grande insegurança que actividades violentas organizadas, como a espelhada nos autos, suscitam na população, sendo certo que não se verificam motivos atinentes às exigências de prevenção especial positiva que impliquem medida concreta inferior”.
Ponderando, pois, tudo o que se deixa dito e tendo ainda em conta não só a gravidade da conduta do arguido/recorrente, mas também que, no caso, a matéria apurada é insuficiente para formular um juízo de prognose social favorável; e tendo ainda em atenção o número de crimes cometidos (como se disse, são 11 os crimes de extorsão e não 12), entendemos que a pena unitária de 22 anos de prisão, aplicada em cumulo, deve ser alterada e ligeiramente reduzida.
Por isso, se fixa agora tal pena em 21 anos de prisão pois, como se viu, essa pena (unitária) oscilava entre um mínimo de 10 anos de prisão (a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes) e um máximo de 25 anos (pois a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, tendo já em atenção que são 11 os crimes de extorsão, era de 123 anos e 6 meses de prisão e, por isso, excedia em muito aquele limite máximo fixado na lei) – cfr. artigo 77º-2 do Código Penal.
Refira-se, por último, que agora, o número de crimes de extorsão por que o arguido vai condenado, é de 11 (onze), o que justificou a ligeira diminuição da pena única fixada, não obstante o elevado número de crimes praticados – mesmo daquele tipo (extorsão) - a gravidade dos mesmos, a gravidade das suas consequências e todo o demais circunctancialismo atrás evidenciado, em que os factos ocorreram.
Por isso, neste segmento, o recurso procede:
- quer na parte respeitante ao número de crimes de extorsão praticados pelo recorrente - 11 (onze) – (mantendo-se porém, as penas parcelares respeitantes a cada um dos vários crimes por ele praticados);
- quer quanto à pena única aplicada em cúmulo jurídico que agora se fixa em 21 anos de prisão.
G – Uma vez que teve vencimento parcial no recurso para a Relação, não se justifica a sua condenação em custas no máximo legal fixado na 1ª Instância, impondo-se uma redução; e justifica-se também a redução da taxa de justiça fixada na Relação?
Quanto à 1ª parte deste segmento (taxa de justiça fixada na 1ª instância) limitar-nos-emos a referir que esta questão não foi suscitada pelo recorrente no recurso interposto para o Tribunal da Relação.
Trata-se, portanto, de questão nova e, como tal, não pode ser apreciada neste recurso.
Quanto á condenação em custas na Relação, deve dizer-se, desde logo, que tendo o ora recorrente sido condenado em taxa de justiça fixada em 13 UCs, tal não corresponde ao máximo, atentos os limites fixados no artigo 87º-1-b) e 3, do CCJ e tendo em atenção que o recurso foi julgado em conferência.
Por isso, falha o pressuposto alegado pelo recorrente.
Acresce que a taxa de justiça variável é fixada pelo juiz em função da situação económica do devedor e da complexidade do processo, sendo que a taxa normal é igual ao dobro do seu limite mínimo.
Decorre do exposto que, em processo criminal, a fixação da taxa de justiça nada tem a ver com o vencimento ou decaimento no recurso.
Assim sendo e pese embora a taxa fixada na Relação se situar próximo do limite máximo, face á complexidade do processo a que, obviamente não é alheia a extensão da motivação de cada um dos recorrentes e do número e complexidade das questões ali suscitadas, tendo em atenção que o processo tem 38 volumes (com inúmeros apensos), que são 11 os arguidos dos quais 9 interpuseram recurso para a Relação, sendo que a motivação do ora recorrente é francamente extensa contendo igualmente inúmeras e extensas conclusões que se estendem (apenas estas) de fls. 13 a 34 dos autos, não se justifica a redução da taxa de justiça quanto a ele fixada.
Pelo exposto e sem necessidade de outras considerações, o recurso improcede neste segmento.
Em resumo:
O recurso interposto pelo arguido AA procede quer na parte respeitante ao número de crimes de extorsão que cometeu (11 – onze), quer na parte respeitante à pena unitária, aplicada em cúmulo jurídico.
2 - Recurso do arguido GG:
A – A não leitura em audiência dos depoimentos/declarações prestados para memória futura – nulidade da sentença porque o tribunal fundamentou a sua convicção nessas declarações.
B – Inconstitucionalidade dos artigos 271º, 355º e 356º-2 do CPP quando interpretados no sentido de que a produção e exame das provas em audiência referidos no artigo 355º-1 abrange conjuntamente a audiência propriamente dita e as declarações para memória futura não se exigindo a sua leitura efectiva em audiência de julgamento para que as mesmas possam constituir prova validamente utilizável.
C – Inconstitucionalidade do artigo 271º do CPP interpretado no sentido de permitir a valoração contra o arguido, de declarações prestadas para memória futura, sem que o arguido tenha tido a possibilidade de confrontar e questionar directamente as testemunhas (violação de igualdade de armas) – aspectos relevantes apenas quanto aos crimes de extorsão (segmento em que o recurso foi admitido).
Decidindo:
Aquando da decisão do recurso do arguido AA já nos pronunciamos no sentido de que a prova alicerçada em declarações para memória futura prestadas na presença do arguido e seu defensor, é válida e admissível, mesmo que as testemunhas não sejam ouvidas em audiência de julgamento e não se proceda (nessa audiência) à leitura daquelas declarações.
Basta, para tanto, a presença do arguido e seu defensor aquando daquelas declarações para memória futura, com possibilidade de intervirem e formularem questões ficando assegurado o contraditório e ainda a possibilidade de, posteriormente, em audiência, exercer os direitos que a lei lhe(s) faculta com vista a aferir da credibilidade da testemunha e do respectivo depoimento desta forma ssegurando igualmente o contraditório.
Por isso, nesta parte, remetemos para o que se disse aquando da apreciação do recurso do arguido AA.
Porém, no caso do ora recorrente GG a situação de facto é diferente, na medida em que:
- O ora recorrente só foi constituído arguido em 11.04.2006, com a dedução da acusação;
- Antes de ter sido constituído arguido, o ora recorrente não interveio nos autos por qualquer forma, designadamente através de advogado em sua representação;
- As declarações para memória futura tiveram lugar em 31.Outubro. 2005 e em 08.Novembro.2005, isto é, antes de o recorrente ter sido constiuído arguido.
Por isso, o ora recorrente não foi notificado da tomada de declarações para memória futura e não consta das respectivas actas entre os arguidos presentes ou ausentes naquelas diligências (cfr. vol. 6, pág 1519 e vol. 7, pág. 1621).
Sendo assim, poderia o tribunal a quo fundamentar a prova dos factos relativos ao ora recorrente, em declarações para memória futura prestadas na ausência deste e do seu defensor? É este o segundo aspecto da questão acima elencada e suscitada pelo recorrente.
Entendemos que sim e passamos a explicar porquê.
Desde logo porque o artigo 271º do CPP ao regulamentar as declarações para memória futura e interpretado em conformidade com o artigo 32º da Constituição da República Portuguesa (que consagra as garantias do processo criminal) não exige, para que aquelas (declarações) sejam admissíveis, que se encontre constituído arguido no processo.
Neste mesmo sentido, decidiu já este STJ no Ac. de 22.09.2005, onde se refere expressamente: “ As declarações para memória futura constituem um incidente processual admissível mesmo no caso de à data da diligência não haver ainda arguido constituído. Doutro modo poder-se-ia frustrar a utilidade do acto processual como aconteceria, p. ex, no caso de a testemunha (que poderia ser até a única que assistiuà prática do crime) sofrer de doença com a previsibilidade dum período de vida curto e o suspeito não ser localizado”.
Estamos, portanto, de acordo com o acórdão recorrido, quando diz “Na verdade, as situações que justificam o recurso excepcional à forma de antecipação de prova acolhida no art. 271º do CPP ocorrem amiúde antes de o inquérito correr contra suspeito identificado ou, pelo menos, localizado e localizável, pelo que a inadmissibilidade – e consequente perda - do contributo probatório em causa, constituiria preclusão irrazoável da descoberta da verdade e obstáculo desproporcionado à função intrínseca do processo penal”.
A questão deve ser colocada do ponto de vista dos direitos mínimos assegurados ao acusado, pela Convenção Europeia dos Direitos do Homem que inclui o direito (do acusado) ao contraditório e a um processo equitativo e especificamente o direito (do acusado) a interrogar ou fazer interrogar as testemunhas de acusação (artigo 6º-3-d) da CEDH).
E, como se refere no Ac. do STJ de 07.11.2007 atrás citado (in www.dgsi.pt) embora o princípio do contraditório imponha, em regra, que toda a prova seja produzida em audiência pública e segundo um procedimento adversarial, são admitidas excepções a essa regra, podendo mesmo ser necessário, em certas circunstâncias, que as autoridades judiciárias recorrarm a declarações prestadas na fase de inquérito ou da instrução. Necessário é que seja assegurada a protecção dos direitos de defesa o que implica – em princípio – que o arguido tenha oportunidade de interrogar ou fazer interrogar, a testemunha, seja na fase anterior, seja durante a audiência.
Deste ponto de vista e como atrás dissemos (aquando da apreciação do recurso do arguido AA), o artigo 271º ao estabelecer o regime da prestação de declarações para memória futura, configura-o como um antecipação (parcial e limitada) da audiência de julgamento e assegura o contraditório e um processo equitativo, quando se encontra já consituído arguido (as declarações são necessariamente prestadas perante um juiz, é assegurada a presença do arguido em termos idênticos ao que sucede com a audiência de julgamento, impõe-se a presença do defensor, para além do MP, e a inquirição das testemunhas desenvolve-se de modo a salvaguardar o interrogatório cruzado das mesmas. Para além disso, não fica inibido o arguido de contradizer o conteúdo das declarações em momento posterior, na audiência, apresentando as provas que entender).
Mas quando, á data das declarações para memória futura, ainda não se encontra constituído arguido e não for possível ouvir aquelas testemunhas depois, em audiência de julgamento, então, nesse caso, o arguido fica sem possibilidade de exercer o contraditório através da prova ou pela prova (cfr. Damião da Cunha in O Regime Processual de Leitura de Declarações na Audiência de Julgamento (artigos 356º e 357º do CPP), RPCC 7 (1997), pág. 409 e Joaquim Malafaia, CPCC 14 (2004) nº 4, pág. 532 e 533 – citados aliás no acórdão recorrido) pois não tem possibilidade de interrogar ou fazer interrogar aquelas testemunhas.
Nesse caso, o arguido apenas pode exercer o contraditório sobre a prova, isto é, sobre o seu conteúdo e sobre a pessoa do declarante.
Aliás, esta mesma situação pode acontecer nos casos previstos no artigo 356º-4 do CPP (vigente): quanto a declarações prestadas perante o juiz ou o MP se os declarantes não tiverem podido comparecer por falecimento, anomalia psíquica superveniente ou impossibilidade duradoura.
Estas declarações podem ser lidas em audiência e valoradas em nome do princípio da conservação da prova (cfr. o mesmo estudo doutrinário de Damião da Cunha, na RPCC, ano 7, fasc. 3º, pág. 418 e 419), apesar de não se mostrar previamente assegurado o contraditório aquando da prestação do depoimento, nem ser o mesmo possível em toda a sua extensão na audiência de julgamento (apenas é possível exercer o contraditório sobre o conteúdo das declarações e as condições em que foi prestado o depoimento).
Face ao que se deita dito – sobretudo tendo em conta a estrutura acusatória do processo pena, a subordinação ao princípio do contraditório e o direito a um processo equitativo (arts. 20º-4 e 32º, ambos da CRP e 6º da CEDH) - volta a colocar-se a questão supra enunciada: poderia o tribunal a quo fundamentar a prova dos factos relativos ao ora recorrente, em declarações para memória futura prestadas antes da constituição de arguido e, portanto, na ausência deste e do seu defensor e sem que as testemunhas venham, depois, a ser ouvidos em audiência de julgamento e, ainda, sem que sejam lidas ou ouvidas em audiência as declarações prestadas para memória futura, como aconteceu no caso em análise?
No nº 1 do artigo 6º da Convenção e no artigo 20º-4 da CRP, consagra-se o direito de qualquer pessoa a um processo equitativo.
E os direitos do acusado, referidos no nº3 daquele artigo 6º, são concretizações daquele princípio (consagrado no nº 1 do mesmo normativo).
Por isso a prestação de declarações para memória futura – com a presença do arguido e do seu defensor – é uma excepção ao contraditório entendido como direito da audiência. E a prestação dessas declarações sem a presença do arguido e do seu defensor aparece no limite do admissível, face aos princípios referidos.
Como refere Ireneu Cabral Barreto (in A Convenção Europeia dos Direitos do Homem, anotada, 3ª edição, Coimbra Editora, 2005, pág. 175 – e jurisprudência do TEDH aí citada) “As garantias específicas (do nº 3 do art. 6º) ilustram a noção de processo equitativo relativamente a situações processuais típicas mas o seu fim é sempre o de assegurar ou de contribuir para a equidade do processo no seu conjunto, pelo que devem ser interpretadas à luz da noção geral contida no nº1 do art. 6º”.
Para a jurisprudência do TEDH, a prova resultante daquelas declarações só pode ser valorada contra o arguido se puder concluir-se pela equidade do processo globalmente considerado, o que implica desde logo a reserva de protecção dos direitos de defesa, que impõem que a condenação não se baseie unicamente ou de forma determinante nas declarações de uma pessoa que o arguido não teve possibilidade de interrogar ou fazer interrogar (Cfr Ac STJ de 07.11.2007 suptacitado e jurisprudência do TEDH aí citada, designadamente os acórdãos Craxi c. Itáliade 5.12.2005 e S.N. c. Suécia de 2 de Julho de 2002), para além de ser concedida ao arguido uma oportunidade adequada e suficiente para contraditar a testemunha de acusação posteriormente ao depoimento (cfr. o ac. SN c. Suécia).
Assim haverá que averiguar se, neste caso concreto, foi (ou não) respeitado o contraditório quanto ao arguido/recorrente GG.
A este propósito, diz-se no acórdão recorrido:
“Lembremos a traço grosso as principais linhas da situação processual deste arguido:
- Aquando da prestação de declarações para memória futura, o arguido GG não se encontrava constituído como tal, pelo que não foi convocado para as diligências em causa nem lhe foi nomeado defensor para aí estar presente;
- Os depoimentos das testemunhas foram prestados na sua língua nacional com tradução simultânea para português por intérprete nomeado pelo tribunal, foram registados em suporte áudio e posteriormente transcritos, encontrando-se a transcrição claramente indicada na Acusação e na Pronuncia entre as provas que as fundamentam;
- Nenhuma daquelas testemunhas foi ouvida em audiência de julgamento;
- O arguido não requereu a leitura dos depoimentos e não consta dos autos nem o alegam os recorrentes, que tivessem requerido o acesso às cassetes áudio contendo os depoimentos para memória futura.
Em face deste quadro, devemos concluir que não foram assegurados os direitos de defesa destes arguidos em termos tais que permitissem considerar que a sua condenação teve lugar com respeito do direito a um processo equitativo?
Vejamos.
… Embora o arguido não tenha podido exercer o contraditório através da prova, nomeadamente através do interrogatório cruzado das testemunhas, o seu defensor teve pleno e atempado acesso às declarações transcritas das testemunhas, podendo requerer em audiência quaisquer provas que afectassem a credibilidade das diversas testemunhas, bem como o conteúdo dos respectivos depoimentos. Mesmo no que respeita à percepção dos depoimentos por parte do arguido, este podia ter-se socorrido das gravações áudio das declarações para memória futura (prestadas em língua que compreende), o que lhe teria permitido ouvir na íntegra esses mesmos depoimentos e transmitir ao seu defensor as informações e instruções que tivesse por pertinentes para sua defesa.
Isto é, tratando-se de hipótese em que ao arguido apenas é possível contraditar o conteúdo das declarações das testemunhas em momento posterior à sua prestação, encontrava-se suficientemente assegurado o acesso do arguido e do seu defensor a essas mesmas declarações, antes mesmo da audiência de julgamento, pois aquelas encontravam-se claramente indicadas na acusação e na pronúncia, com vista a exercer o respectivo contraditório de forma diferida no tempo. …”(sublinhado nosso).
Concordamos inteiramente com este entendimento e, por isso, concluímos que foram protegidos os direitos de defesa e o arguido ora recorrente podia ter exercido o contraditório
Mas, independentemente do que se deixa dito, face á jurisprudência do TEDH nesta matéria, há que averiguar ainda se as declarações para memória futura, sem que o arguido tenha interrogado ou feito interrogar aquelas testemunhas, fundaram de forma exclusiva ou determinante a sua condenação.
A este propósito, refere-se no acórdão recorrido:
“Apreciando genericamente o valor da prova produzida, explica o acórdão condenatório que foi “ …crucial a prova constituída pelas declarações para memória futura, pelas escutas, pelos reconhecimentos de pessoas e fotográficos e pelos exames médico-legais [sendo] auxiliar mas valiosa a prova decorrente dos inúmeros documentos constantes dos autos, dos autos de busca e apreensão, dos relatos de vigilância e respectivas fotografias, das declarações tomadas em audiência e de outros meios, como os autos de exame e avaliação” – cfr fls 8555 dos autos.
Concretamente no que respeita ao arguido GG (que cumpriu pena de prisão em França de 26.05.2005-cfr facto nº 244p até 06.04.2006 – cfr fls 4476-vol. 17), o tribunal a quo teve em conta os depoimentos – para memória futura – prestados pelas testemunhas CCC, AAAA,ZZZ, RRR XXX e HH, pelo menos. QQQ nada terá dito sobre este arguido.
Quanto a outros meios de prova, pelo menos PPP. e QQQ. reconheceram fotograficamente o arguido GG e foram-lhe feitas variadas referências nas conversas telefónicas interceptadas, que são objecto de análise circunstanciada na apreciação crítica da prova feita no acórdão recorrido, designadamente em conversa de 17.07.05 entre o arguido I.....e a arguida JJ (mulher do arguido GG, também referenciado por V... nas conversas telefónicas), em conversa de 20.07.05 entre o mesmo arguido e a testemunha ZZZ, de 28.06.05 entre o mesmo arguido AA e o arguido KK, conversas de 17.07.05, 24.08.05, 29.08.05, 07.09.05, 09.09.05 e 12.09.05, entre os referidos arguidos AA e JJ, de 20.07.05 entre o arguido AA e o arguido (a julgar em separado)BBBB, também referenciado por V.... ou ainda conversa entre o mesmo arguido AA e KKK.
Também o auto de busca e apreensão relativa à busca feita em casa de JJ Soroska (mulher de GG, como referido) refere documentos pertencentes a este arguido.
Ora, do quadro dos meios de prova considerados pelo tribunal a quo para fundamentar, no plano factual, a condenação do arguido GG, conclui-se que as declarações para memória futura das testemunhas não foram o único meio de prova, nem tão pouco meio de prova determinante no sentido que é possível extrair da jurisprudência do TEDH e que se nos afigura ser o relevante para efeitos da satisfação do direito a um processo equitativo. Prova determinante será a prova que não tenha sido corroborada por outras provas em termos tais que deva concluir-se que a decisão condenatória foi tomada essencialmente com base na prova em crise sem que a mesma se mostre suficientemente concordante com outros meios de prova. Mesmo que a prova seja de grande relevância, se a mesma é confirmada, complementada por outros meios de prova, não poderá dizer-se que a mesma tenha sido exclusiva ou determinante da condenação, pois o que pretende é obviar a que alguém possa ser condenado por causa de prova que não pôde contrariar de forma suficiente e adequada.
No que respeita a outras circunstâncias que do ponto de vista dos direitos de defesa do arguido possam contrabalançar a impossibilidade de contra-interrogar ou fazer interrogar as testemunhas – compensação a que o TEDH confere a maior importância - , afigura-se-nos terem sido as mesma suficientes.
Por um lado, os depoimentos testemunhais foram prestados por diversas pessoas, muitas destas não tinham ligação entre si e reportavam-se mesmo a contextos diferentes (maxime actividade de prostituição e de alterne, uns, transportadores de cidadãos estrangeiros, outros); todas as testemunhas se encontravam claramente identificadas e os depoimentos das pessoas oriundas do mesmo contexto factual não apresentaram incoerências, imprecisões ou simples discrepâncias relevantes, no que respeita aos factos em causa.
Por outro lado, os depoimentos foram prestados perante juiz, com a presença dos defensores de outros arguidos, cuja posição não era de antagonismo relativamente ao arguido GG, antes pelo contrário, os quais tiveram oportunidade de colocar as questões que entenderam pertinentes, muitas delas de interesse comum aos restantes arguidos e ao arguido GG.
Por último, o arguido pôde aceder atempadamente, por si e pelo seu defensor, a todas as declarações prestadas, permitindo-lhe contrariar o seu conteúdo e contraditar as testemunhas, quer para fundar o seu pedido de instrução com vista à não prronúncia, quer apresentando em audiência outras testemunhas e demais provas que entendesse conveniente.
Ou seja, do ponto de vista dos seus direitos de defesa, maxime o direito ao contraditório enquanto dimensões do direito a um processo equitativo, impõe-se, concluir pela equidade do julgamento do arguido de que resultou a sua condenação.
Não estamos, pois, perante prova proibida ou prova afectada de qualquer outro vício que obstasse à sua atendibilidade pelo tribunal a quo, fundamentando, eventualmente, o invocado erro notório na apreciação da prova (art. 410º nº2 c)) ou diferente consequência de ordem processual …”.
Resulta do exposto claro que as declarações para memória futura não foram nem o único meio de prova para a condenação do ora recorrente, nem apenas prova determinante para tal condenação pois”prova determinante” é a que não tenha sido corroborada, confirmada e complementada, por outras provas.
No caso em apreço – e como resulta do acórdão recorrido - a prova resultante daquelas declarações para memória futura foi confirmada, complementada e corroborada por várias outras provas.
E o arguido/recorrente tinha acesso, directamente ou pelo seu defensor, a todas as declarações prestadas, tendo tido possibilidade de contrariar o respectivo conteúdo e contraditar as testemunhas, quer apresentando em audiência os meios de prova que entendesse necessários (designadamente testemunhas) quer, muito antes, requerendo a abertura de instrução e aí apresentado as provas que tivesse por convenientes com vista à (sua) não pronúncia.
Aliás, o contraditório não exige, em termos absolutos, o interrogatório directo em “cross-examination”.
E o arguido teve oportunidade de contraditar a credibilidade e os depoimentos das testemunhas ouvidas em declarações para memória futura quer na instrução (onde esteve presente e representado por advogado – cfr. actas do debate instrutório a fls. 6074, 6099, 6185, 6212, 6278 do volume 21 – quer em sede de audiência (neste sentido cfr. Ac. STJ de 16.06.2004 in www.dgsi.pt).
E, anteriormente, o defensor do ora recorrente foi notificado do despacho que declarou aberta a instrução (cfr. volume 20, pág 5944).
E, antes disso, o arguido/recorrente tomou contacto com o processo, formal e substancialmente, em 11.Abril.2006, quando foi sujeito a primeiro interrogatório judicial (cfr. volume 18, pág. 5148).
Concluímos, portanto que, no caso em apreço foram salvaguardados e respeitados os direitos de defesa do arguido, designadamente o contraditório enquanto expressão do direito a um processo equitativo.
Pelo que não estamos perante prova proibida ou que não pudesse ser atendida e valorada pelo tribunal a quo, não tendo sido violados quaisquer preceitos constitucionais, designadamente os artigos 32º-1 e 5 e 20º-4, da CRP.
Por isso, o recurso improcede com este fundamento.
D – Crime de extorsão em relação a LLL, CCC, ZZZ e I...T.
Pretende o recorrente que os factos provados não integram a pratica do crime de extorsão relativamente às pessoas supra referidas.
Ora, resulta do conjunto da factualidade assente – maxime 100p a 108p, 111p a 124p e 142p a 156p - resulta que o ora recorrente ao acompanhar outros membros do grupo, designadamente o arguido AA, por algumas vezes (embora não se concretizem em número, tempo e espaço) e ao receber dinheiro de CCC (nºs 111, 112, 116 e 119), de EEEE (nºs 102, 103, 104, 105), de (ZZZ nºs 142, 143, 144, 148, 156) o fez em comunhão de esforços e intentos (pelo menos com o dito arguido GGGG), propondo-se molestar, ameaçar e constranger por meio de violência as vítimas e obrigá-las a prostituírem-se e a darem-lhes o dinheiro assim obtido, actuando de forma livre, deliberada e consciente, sabendo as suas condutas proibidas e puníveis pela lei.
E dos depoimentos de EEEE e de CCC apreciados conjugadamente com a restante prova respeitante à forma como o arguido AA obtinha dinheiro de outras pessoas, nomeadamente a fls. 8528, resulta que aquelas fizeram os pagamentos aos arguidos como resposta e reacção a ameaças indirectas mas inequívocas feitas por aqueles e apenas para evitarem sofrer ataques na sua pessoa ou património por parte daqueles.
Mais uma vez se transcreve o seguinte trecho da decisão de 1ª instância, por se nos afigurar pertinente e elucidativa quanto ao aspecto em questão:
“Nos autos, temos um contexto de relacionamento entre pessoas que desembolsam - prostitutas e condutores, pelo menos - e outras que exigem e recolhem esses desembolsos, sem que estas tenham de “dizer a ameaça” cada vez que é preciso pagar.
Cada vez que é preciso pagar, a vítima toma, não raro, a iniciativa de oferecer o pagamento, e algumas escutas há em que o arguido AA pergunta aos condutores a razão de terem chegado e de não terem telefonado logo, pois é essa a conduta que se espera, e nesta pergunta pode estar encerrada uma ameaça.
A iniciativa da vítima de estabelecer o contacto, porém, nada tem a ver com qualquer ameaça, antes a impulsiona a noção de que, sujeita a violência em qualquer momento, mais vale à vítima afastar, por algum tempo, a sujeição a essa violência tomando a iniciativa de pagar.
Aqui reside a diferença entre a existência duma organização criminosa e a acção isolada dum criminoso, pois este esgota a sua conduta num acto, que pode prolongar-se no tempo, mas que o sujeita a reacção imediata, por estar sozinho e desprovido de outros que o continuem - ao passo que a noção das vítimas de que, não comparecendo a contactá-las o arguido AA, outra pessoa o fará, de que a detecção e captura deste não só não faz cessar os pagamentos, como para além disso pode ocasionar retaliações, então sim pelo efectivo exercício da violência, essa noção, pois, exerce um efeito de intimidação inelutável, essa noção, induzida pelo grupo na sua vítima, é violência na mais autêntica acepção do termo”.
Improcede, portanto, o recurso com este fundamento.
VOU AQUI
E – Sempre seria de afastar a punição do recorrente pelo crime de extorsão agravada pois não é compatível com a punição como bando e pelo crime de associação criminosa, verificando-se uma dupla valoração proibida.
Do conjunta dos factos provados resulta claro que o arguido, como membro de bando destinado á prática de crimes contra o património (extorsão), com a colaboração de outro membro do mesmo bando (arguido AA) constrangeram vários ofendidos a entregarem-lhe várias quantias em dinheiro (disposição patrimonial em prejuízo deles), com o intuito de obterem enriquecimento ilegítimo para ele(s) (arguido(s).
Assim, estão preenchidos os crimes de associação criminosa e extorsão, não se vendo que, pelo facto de se recorrer à noção de “bando” e o arguido ter sido condenado pela prática de associação criminosa, aquele facto tenha sido valorado duplamente.
É que, “São elementos constitutivos do crime de extorsão a) o emprego de violências ou ameças, ou a colocação da vítima na impossibilidade de resistir; b) constrangimento, daí resultante, a uma disposição patrimonial que acarrete prejuízo para a vítima ou para terceiros; e c) intenção de conseguir para si ou para terceiro, um enriquecimento ilegítimo (cfr. Acs STJ de 28.07.1987, BMJ 369, 406; de 17.05.1995, CJ Acs STJ, III, Tomo 2, 206; e de 10.10.1996, CJ Acs. STJ IV, Tomo 3, 156.).
E as traves mestras para a verificação da existência de uma associação criminosa são apenas o fim abstracto de cometer crimes, a estabilidade organizativa e uma ideia de permanência, de duração (cfr. Acs. STJ de 26.05.1993, BMJ 427, 278; de 30.06.1994 in Proc. 45271-3ª; e de 13.05 de 1992, CJ XVII, Tomo 3, 15).
Não se vê, portanto, nem que o conceito de “bando” seja comum aos citados crimes, nem que, no caso em apreço, aquele facto tenha sido duplamente valorado.
Além disto, trata-se de questão que não foi suscitada anteriormente pelo recorrente, sendo, portanto, questão nova e, por isso, mesmo, sem possibilidade de ser conhecida agora neste recurso.
E, ao contrário do alegado pelo recorrente, não há dupla valoração dos factos na condenação daquele por co-autoria de 2 crimes de lenocínio por se integrarem no crime de extorsão.
É que, nos termos do disposto no artigo 30º do CP, o número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente.
E na doutrina existem os conceitos de concurso real e concurso ideal de crimes consoante a conduta do agente preenche separadamente vários crimes ou várias vezes o mesmo crime (concurso real) ou quando com a mesma conduta são violadas várias normas penais ou a mesma norma repetidas vezes (concurso ideal).
Os crimes efectivamente cometidos enquadram-se assim, no concurso efectivo, com o limite nos casos de concurso aparente e crime continuado (cfr. Ac STJ 10.10.2007, Proc. 2301 – 3ª).
No caso em apreço, para que houvesse concurso aparente seria preciso que fossem seguidas as regras da consunpção e, como o acórdão recorrido sustentou, alterando até a decisão da 1ª instância passando os crimes de lenocínio que deu como provados de agravados a simples, os bens jurídicos protegidos neste crime (do artigo 169º-1 do CP – está protegida a defesa do sentimento geral de pudor e de moralidade – cfr. Anabela Rodrigues in Comentário Conimbricense, pag. 521) e no crime de extorsão (liberdade da disposição patrimonial como bem fundamental e subsidiariamente a liberdade de decisão e de acção; é, pois, crime contra o património que protege a liberdade de disposição centrando-se no constrangimento da vítima por meio de violência ou ameaça importante – cfr. Ac STJ de 27.10.2004, Proc. 3237/04 – 3ª) não coincidem.
Razões por que, também neste segmento, o recurso tem de improceder.
F – As penas concretamente aplicadas são exageradas, quer as parciais (relativas aos crimes de extorsão – segmento em que o recurso foi admitido) quer a do cúmulo.
Alega o recorrente que nos crimes de extorsão, veio a ser condenado na pena de 9 anos por cada um daqueles crimes, numa moldura penal de 3 a 15 anos o que é exagerado pois não se provou qualquer tipo de violência.
E os 18 anos em que foi condenado em cúmulo são excessivos e passíveis de correcção face à moldura penal que oscila entre um mínimo de 9 anos e um máximo de 25 anos de prisão.
Apreciando:
Actualmente, todos estão de acordo em que é susceptível de revista a correcção do procedimento ou das operações de determinação, o desconhecimento pelo tribunal ou a errónea aplicação dos princípios gerais de determinação, a falta de indicação de factores relevantes para aquela ou, pelo contrário, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis.
Porém, há quem defenda que a valoração judicial das questões de justiça ou de oportunidade, estariam subtraídas ao controlo do tribunal de revista.
Outros ainda, distinguem: a questão do limite ou da moldura da culpa, estaria plenamente sujeita a revista, assim como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção.
Mas a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum de pena, o recurso de revista seria inadequado.
Só assim não será – e aquela medida será controlável mesmo em revista, se, p.ex, tiverem sido violadas regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada (cfr. Figueiredo Dias in Direito Penal Português – As consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, § 278, pág.211; e Ac. deste STJ, 3ª Secção, in Proc. 2555/06).
Nos termos do artigo 71º nº 1 do Código Penal, a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
Toda a pena tem, como suporte axiológico-normativo uma culpa concreta.
Daí que não haja pena sem culpa - nulla poena sine culpa.
Mas, por outro lado, a culpa constitui também o limite máximo da pena – (cfr. Ac STJ de 26.10.00 in Proc. 2528/00, desta 3ª Secção: “a culpa jurídico-penal traduz-se num juízo de censura que funciona, a um tempo, como um fundamento e um limite inultrapassável da medida da pena”.
Isto mesmo resulta claro do estatuído no artigo 40º-2 do CP: em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa.
Além disso, como se disse, há que atentar nas exigências de prevenção, quer geral, quer especial.
“Com o recurso à prevenção geral busca-se dar satisfação aos anseios comunitários da punição do caso concreto, tendo em atenção de igual modo a necessidade premente da tutela dos bens e valores jurídicos.
Com o apelo à prevenção especial aspira-se em conceder resposta às exigências da socialização (ou ressocialização) do agente delitivo em ordem a uma sua integração digna no meio social” – Cfr. Ac. desta 3ª Secção deste Supremo Tribunal, de 26.10.00, in processo nº 2528/00, supra citado.
Citando Figueiredo Dias (obra supra citada, pág. 214) “ … a culpa e prevenção são, assim, os dois termos do binómio com auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena”.
E, mais adiante (pág. 215) “ …a exigência legal de que a medida da pena seja encontrada pelo juiz em função da culpa e da prevenção é absolutamente compreensível e justificável. Através do requisito de que sejam levadas em conta as exigências de prevenção, dá-se lugar à necessidade comunitária da punição do caso concreto e, consequentemente, à realização in casu das finalidades da pena. Através do requisito de que seja tomada em consideração a culpa do agente, dá-se tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime – ligada ao mandamento incondicional de respeito pela eminente dignidade da pessoa do agente – limita de forma inultrapassável as exigências de prevenção …”.
A este respeito, é pertinente citar aqui o acórdão do STJ de 1/03/00, in processo nº 53/2000, desta 3ª Secção “ … a culpa, salvaguarda da dignidade humana do agente, não sendo o fundamento último da pena, define, em concreto, os seus limite mínimo e máximo absolutamente intransponível, por maiores que sejam as exigências de carácter preventivo que se façam sentir. A prevenção especial positiva, porém, subordinada que está à finalidade da protecção dos bens jurídicos, já não tem virtualidade para determinar o limite mínimo, este logicamente não pode ser outro que não o mínimo da pena que, em concreto, ainda realiza, eficazmente, aquela protecção … se, por um lado, a prevenção geral positiva é a finalidade primordial da pena e, se, por outro, esta nunca pode ultrapassar a medida da culpa, então parece evidente que – dentro, claro está, da moldura legal – a moldura da pena legal aplicável ao caso concreto (moldura de prevenção) há-de definir-se entre o mínimo imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias e o máximo que a culpa do agente consente; entre tais limites, encontra-se o espaço possível de resposta às necessidades da sua reintegração social …”.
Assim e quanto ás penas parcelares aplicadas e supra referidas, atendendo a que o arguido agiu com dolo directo e intenso, que o grau de ilicitude dos factos é elevado, dado que o arguido desenvolvia a sua conduta de forma “profissional” ou seja, de forma habitual e com carácter regular, retirando dessas actividades proventos que contava no seu património (não sendo, portanto, uma actividade pontual ou esporádica); e que havia lucros para a associação criminosa; atendendo ainda que o arguido foi julgado e condenado em França por crime de “destruição e degradação de veículos privados”, cometido em 22 de Maio de 2002 e cumpriu pena de prisão no Centro de Detenção de Neuvic desde 26.05.2005, que tem família a cargo na Ucrânia e não tem antecedentes criminais conhecidos por factos praticados em território português, onde trabalhou na construção civil, temos como justas e adequadas as seguintes penas parcelares aplicadas:
- 9 anos de prisão pela prática em co-autoria material, em concurso efectivo e real, de cada um dos 4 crimes de EXTORSÃO, previstos e punidos pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal;
Relativamente á pena a fixar em cúmulo jurídico, há que ter em conta, no seu conjunto, os factos e a personalidade do agente (artº 77º-1 do CP).
De acordo com Figueiredo Dias (obra supra citada, pág. 291), o conjunto dos factos fornecerá “ … a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique.
Na avaliação da personalidade – unitária – do agente, relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é recondutível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma “carreira”) criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuír á pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização). … “.
Por outro lado, a pena (única) aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicvadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e, como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (artº 77º-2 do CP).
Assim sendo e face ao que acima se deixou dito, no caso do recorrente a pena aplicável tem como limite mínimo 9 anos de prisão e como limite máximo 25 anos de prisão (pois que a soma material de todas as penas concretamente aplicadas - 45 anos e 6 meses - excede substancialmente aquele limite).
Ora, ponderando os factos e a personalidade do arguido, diz-se no acórdão recorrido:
“Na medida concreta da pena única a aplicar são considerados em conjunto, os factos e personalidade do agente (Cfr art. 77º nº1 CP) nos termos genericamente referidos a propósito do arguido AA, sendo de considerar especialmente quanto ao arguido GG que não estamos, igualmente, perante hipótese de pluriocasionalidade, mas antes perante opção por uma carreira delinquente, embora de forma menos marcada que o arguido AA (ainda que seja bastante mais novo que aquele)”.
Além disso, entendemos que, considerada globalmente a ilicitude dos factos, afasta-nos da pena máxima aplicável (não obstante o resultado da soma material das penas parcelares), pois a violência e ameaça típicas do crime de extorsão, que constitui o tipo penal determinante no caso presente (4 crimes) só pontualmente assumiram especial intensidade.
Ponderando, pois, tudo o que se deixa dito e tendo ainda em conta não só a gravidade da conduta do arguido/recorrente, o número de crimes cometidos (tendo-se designadamente em atenção que para além de 1 crime de associção criminosa e de 4 crimes de extorsão, cometeu e foi condenadp ainda pela prática de um crime de lenocínio simples) e que, no caso, a matéria apurada é insuficiente para formular um juízo de prognose social favorável, temos por equilibrada e justa a pena unitária fixada, de 18 anos de prisão aplicada em cúmulo que, como se viu, oscilava entre um mínimo de 9 anos de prisão (a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes) e um máximo de 25 anos (pois a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, era de 45 anos e 6 meses de prisão e, por isso, excedia em muito aquele limite máximo fixado na lei) – cfr. artigo 77º-2 do Código Penal.
Pelo exposto, também neste segmento, improcede o recurso.
Em resumo: o recurso deste recorrente GG improcede totalmente.
3 - Recurso do arguido KK:
Face ao que acima se deixou consignado, o recurso deste arguido é limitado á medida da pena única aplicada. No mais, o recurso não foi admitido.
A – A pena aplicada em cúmulo é exagerada e não revela a drástica redução da participação do recorrente nos factos provados (resultante do acórdão da Relação por comparação como acórdão da 1ª instância).
Como refere o recorrente, no recurso para a Relação veio ele a ser absolvido de 2 crimes de extorsão qualificada (havia sido condenado na pena de 9 anos de pisão por cada um); de um crime de lenocínio qualificado (havia sido condenado na pena de 6 anos de prisão), passando a lenocínio simples (foi condenado na pena de 2 anos e 6 meses de prisão); e de um crime de extorsão qualificada (fora condenado na pena de 9 anos de prisão) passando a cumplicidade (e foi condenado na pena de 4 anos de prisão).
E a pena do crime de participação em associação criminosa foi reduzida de 4 anos e 6 meses para 4 anos; e a pena do crime de extorsão qualificada foi reduzida de 9 anos para 7 anos de prisão.
Por isso, a pena aplicada em cúmulo, passou de 20 anos para para 14 anos de prisão.
Entende o recorrente que esta redução da pena única não revela a drástica redução da sua participação nos factos provados.
Na elaboração do cúmulo juríco das penas parcelares aplicadas, o Tribunal da Relação, na decisão recorrida refere expressamente:
“A moldura abstracta da pena aplicável em concurso tem na pena de 7 anos de prisão o seu limite mínimo, por ser a mais elevada das penas parcelares, e como limite máximo 19 anos e 6 meses de prisão, correspondente à soma das penas parcelares.
Na medida concreta da pena única a aplicar são considerados em conjunto, os factos e personalidade do agente (Cfr art. 77º nº1 CP) nos termos genericamente referidos a propósito do arguido AA, sendo de considerar especialmente quanto ao arguido KK que não estamos, igualmente, perante hipótese de pluriocasionalidade, mas antes perante opção por uma carreira delinquente, sendo de considerar contra o arguido ter antecedentes pelo uso de violência, ainda que em pena relativamente pouco grave (1 ano de prisão).
Afigura-se-nos, pois, adequada a pena única de 14 anos de prisão, abaixo da qual ficariam em crise a defesa do ordenamento jurídico, ou seja, as necessidades de prevenção geral positiva ou de integração presentes no caso, co0mo referido a propósito dos restantes arguidos, pois este aspecto é comum a todos eles”.
A decisão recorrida ponderou devidamente todo o circunstancialismo concorrente nos factos e no agente.
Mercê dessa ponderação, absolveu o recorrente de crimes por que havia sido condenado e, quanto a outros, alterou algumas das penas que haviam sido aplicadas, baixando-as.
E, depois, apreciando a globalidade dos factos e a personalidade do agente (artigo 77º-1 do CP) e tendo ainda em consideração os demais critérios legais, aplicou a pena única de 14 anos de prisão.
A nosso ver, essa pena revela-se justa e adequada, no caso em apreço.
È verdade que, como se disse, na Relação, o arguido foi absolvido de alguns crimes e viu baixadas as penas quanto a outros.
Mas também não pode deixar de ter-se em atenção que a pena única de 20 anos de prisão, que lhe havia sido aplicada na 1ª Instância, baixou, na decisão recorrida, para 14 anos de prisão.
Isto é, a pena única baixou em 6 anos de prisão o que, tendo em conta que se trata de pena aplicada em cúmulo jurídico com outras penas parcelares, não pode deixar de considerar-se como bastante significativo (não esquecendo, obviamente, as alterações ocorridas nos factos e na qualificação jurídica de alguns deles).
Por outro lado, não pode esquecer-se que o arguido foi condenado pela prática, em concurso real, pelos seguintes crimes e penas (parcelares):
- Autoria de um crime de Associação Criminosa, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal, na pena de 4 anos de prisão;
- Autoria de 1 crime de Extorsão qualificado, previsto e punido pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal, contra CCC, na pena de 7 anos de prisão;
- Um crime de Lenocínio simples p. e p. pelo art. 169º nº1, contra CCC, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão;
- Cumplicidade na prática de um crime de Extorsão, previsto e punido pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal, na pessoa de ZZZ, na pena de 4 anos de prisão;
- Autoria de 1 crime de Uso de Documento Falso, previsto e punido pelo artigo 256º, nº 1, alínea e), e nº 3, do Código Penal, na pena de 2 anos de prisão.
E deve lembrar-se que a moldura abstracta da pena aplicável em concurso tem como limite mínimo, 7 anos de prisão, por ser a mais elevada das penas parcelares, e como limite máximo 19 anos e 6 meses de prisão, correspondente à soma das penas parcelares.
Por outro lado, no caso em apreço, fazem-se sentir fortemente, considerações de prevenção geral respeitantes às exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico. A acção dos arguidos – de cada um deles e de todos – tem como consequência que uma parte (franja) de cidadãos particularmente vulneráveis e desprotegidos fiquem fora da esfera de protecção da lei e da jurisdição do Estado Português.
Sendo assim e não esquecendo que, no caso do recorrente “não estamos, … perante hipótese de pluriocasionalidade, mas antes perante opção por uma carreira delinquente …” e que o mesmo tem “ …antecedentes pelo uso de violência, ainda que em pena relativamente pouco grave (1 ano de prisão) …”, atendendo ainda às condições pessoais do arguido (cfr. o relatório social a ele respeitante – volume 25 fls 7549) entendemos que a pena de 14 anos aplicada em cúmulo jurídico se revela adequada e justa e, ao contrário do que entende o recorrente, traduz uma acentuada diminuição da pena única que lhe havia sido aplicada na 1ª instância, diminuição essa só possível em resultado duma acentuada diminuição da participação do recorrente nos factos provados.
Por isso, se mantém aquela pena única.
Por isso, improcede o recurso.
4 - Recurso do arguido DD:
Como atrás se decidiu, os segmentos deste recurso atinentes á alegação de: e
A – Erro notório na apreciação da prova; n.
B - Nulidade da sentença por omissão de pronúncia (na medida em que a Relação , considerando não haver lugar à transcrição da prova, examinou o recurso interposto pelo recorrente, quanto à matéria de facto, socorrendo-se apenas da leitura da sentença – que considerou sem vícios a apontar-lhe); e violação do princípio in dubio pro reo relativamente ao crime de roubo., foram rejeitados por respeitarem a matéria de facto e o recurso para este STJ visa exclusivamente o reexame da matéria de direito.
Por outro lado, o recurso deste arguido apenas foi admitido quanto á medida da pena única aplicada.
Por isso, para além da arguida/pretensa nulidade do acórdão por falta de fundamentação, há que apreciar apenas a questão da medida da pena única aplicada.
AD – O acórdão (da 1ª instância) é nulo por falta de fundamentação, na medida em que não sustenta por que razão aceita como fundamentado o acórdão da 1ª Instância (este também nulo por falta de fundamentação) limitando-se a justificá-lo pela extensão dos autos e pelo grande número de testemunhas e diligências de prova realizadas, não havendo fundamentação para – quanto ao ora recorrente - se dar como provado este ou aquele facto, que prova formou tal convicção, o que é inconstitucional e o arguido não pode impugnar o que não existe.não fundamentado, o que a Relação não considerou, aceitando a fundamentação do acórdão da 1ª instância por remissão para este ou aquele meio de prova sem que contudo sustentasse porquê e como (conclusões 17ª e 18ª)..
No fundo, o recorrente invoca a nulidade da decisão da Relação por falta de fundamentação nos termos do artigo 205º da CRP e do artigo 6º da CEDH e do artigo 14º do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos na medida em que julgou válida a decisão - sobre a matéria de facto – proferida pela 1ª Instância.
Isto é, o recorrente, no recurso interposto para a Relação arguiu a nulidade do acórdão da 1ª instância.
E tal nulidade foi desatendida pelo tribunal da Relação, de forma fundamentada.
Só que o recorrente discorda dessa decisão.
Porém, sem razão.
Na verdade, a este propósito diz o acórdão recorrido:
“A decisão recorrida mostra-se cabalmente fundamentada, nomeadamente no que respeita ao exame crítico da prova a que se refere o art. 374º nº2 do CPP. Conforme resulta da sua mera leitura, sendo aceitável que não se pronuncie sobre o depoimento de cada uma das pessoas arroladas pela defesa num processo tão extenso e que envolveu tão grande número de intervenientes e multiplicidade de provas. No seu conjunto, a análise crítica da prova afasta qualquer receio de arbitrariedade ou falta de ponderação sobre a prova produzida e examinada pelo tribunal a quo, mostrando-se assim cumprido o citado art. 374º nº2 do CPP e, portanto, excluída a aludida nulidade de falta de fundamentação da sentença a que se reporta o art. 379º nº 11 al. a) do CPP”.
Daqui resulta que, ao contrário do que pretende o recorrente, o acórdão recorrido apreciou e decidiu a alegada nulidade imputada ao acórdão da 1ª instância, considerando-a inexistente.
E a decisão agora sob recurso, no segmento em questão, está devidamente fundamentada, tendo-se observado e respeitado o estatuído no artigo 374º-2 do CPP.
O recorrente parece pretender que se devia ter feito uma análise e apreciação detalhadas e pormenorizadas sobre cada uma das provas produzidas, designadamente as apresentadas por ele.
Ora o acórdão recorrido é claro ao referir que a decisão (da 1ª instância) se mostra cabalmente fundamentada, nomeadamente no que respeita ao exame crítico da prova a que se refere o artigo 374º-2 do CPP.
Porém, esclarece, é aceitável - face ao tão grande número de intervenientes no processo e multiplicidade de provas – que o acórdão não se pronuncie sobre o depoimento de cada uma das pessoas arroladas pela defesa.
Isto é, aceitou a fundamentação da decisão recorrida nos termos em que foi efectuada, considerando aceitável que o acórdão não se tivesse pronunciado, sobre cada um dos depoimentos concretos das testemunhas de defesa.
E bem, pois a lei não exige nem impõe uma fundamentação desse tipo.
A decisão tem de estar fundamentada nos termos referidos pelo artigo 374º-2 do CPP.
E, como decorre da decisão recorrida, a fundamentação dela constante satisfaz essa exigência legal, sendo ainda certo que, ao contrário do que parece entender o recorrente, o facto de a decisão não se ter pronunciado em colncreto sobre cada um dos depoimentos das testemunhas de defesa, não significa que os mesmos não tivessem sido devidamente atendidos e ponderados na decisão.
Pelo exposto, o acórdão recorrido – da Relação – não contém omissão de pronúncia.
Por isso, o recurso improcede com este fundamento.
B – A pena única aplicada – 12 anos de prisão – é excessiva comparando com os demais arguidos e atendendo a que é primário, trabalha, tem família com quem co-habita, sempre esteve legalizado no País, cumpriu sempre as apresentações periódicas a que ficou obrigado e não abandonou o País (não fugiu) e já passaram mais de 3 anos sobre os factos sem que tenha cometido qualquer ilícito, pelo deve ser-lhe aplicada uma pena que fique suspensa na sua execução.
Relativamente á pena a fixar em cúmulo jurídico, há que ter em conta, no seu conjunto, os factos e a personalidade do agente (artº 77º-1 do CP).
De acordo com Figueiredo Dias (obra supra citada, pág. 291), o conjunto dos factos fornecerá “ … a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique.
Na avaliação da personalidade – unitária – do agente, relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é recondutível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma “carreira”) criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuír á pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização). … “.
Por outro lado, a pena (única) aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e, como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (artº 77º-2 do CP).
No caso, o arguido/recorrente DD foi condenado nos seguintes crimes e penas parcelares:
- 4 anos de prisão pela co-autoria no crime de Associação Criminosa, previsto e punido pelo artigo 299º, nº 1 e nº 2, do Código Penal;
- 8 anos de prisão pela co-autoria no crime de extorsão, previsto e punido pelos artigos 223º, nº 1 e nº 3, alínea a), e 204º, nº 2, alínea g), do Código Penal, contra MMM. S.;
- 5 anos de prisão pela co-autoria no crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, contra DDDD.
Assim sendo e face ao que acima se deixou dito, no caso do recorrente a pena aplicável tem como limite mínimo 8 anos de prisão (a mais elevada das penas concretamente aplicadas) e como limite máximo 17 anos de prisão (soma material de todas as penas concretamente aplicadas aos vários crimes).
Ora, ponderando os factos e a personalidade do arguido, diz-se no acórdão recorrido:
“ … Na medida concreta da pena única a aplicar são considerados em conjunto, os factos e a personalidade do agente (Cfr art. 77º nº1 CP) …, sendo de considerar especialmente quanto a este arguido que não estamos … perante hipótese de pluriocasionalidade, mas antes perante opção por uma carreira delinquente, embora seja de considerar a seu favor não lhe serem conhecidos antecedentes criminais e ter mesmo chegado aa trabalhar em Portugal na construção civil. …”.
Ponderando, pois, tudo o que se deixa dito e tendo ainda em conta não só a gravidade da conduta do arguido/recorrente, o número de crimes cometidos (tendo-se designadamente em atenção que para além de 1 crime de associção criminosa e de 1 crime de extorsão, cometeu e foi condenado ainda pela prática de um crime de roubo), que a conduta do arguido se prolongou por muito tempo, que não assumiu factos nenhuns, não interiorizou a sua culpa, naõ manifestou arrependimento e que, no caso, a matéria apurada é insuficiente para formular um juízo de prognose social favorável e que a pena não pode em caso algum ultrapassar a medida da culpa (cfr. artº 40º-2 do Código Penal), temos por equilibrada e justa a pena unitária fixada, de 12 anos de prisão aplicada em cúmulo que, como se viu, oscilava entre um mínimo de 8 anos de prisão e um máximo de 17 anos, situando-se, ainda assim, mais próximo do limite mínimo.
Por isso, se mantém aquela pena única.
Por isso, improcede o recurso, também neste segmento.
DECISÃO:
Nos termos expostos, acorda-se em:
1 - Rejeitar, por legalmente não admissíveis, os recursos interpostos pelos arguidos VV e FFF.
2 – Rejeitar parcialmente os recursos interpostos pelos arguidos UU, GG, KK e DD, relativamente a todas as penas parcelares não superiores a 8 anos de prisão, em que foram condenados.
3 – Rejeitar os recursos dos arguidos UU e DD, nos segmentos respeitantes à matéria de facto.
4 – Negar provimento aos recursos dos arguidos GG, KK e DD.
5 - Conceder parcialmente provimento ao recurso do arguido UU e, em consequência:
a) – Declarar que, relativamente aos crimes de extorsão, p. e p. pelos artigos 223º-1 e 3-a) e 204º-2-g, do CP, cometeu 11 (onze) desses crimes;
b) – Alterar a pena aplicada em cúmulo jurídico, condenando-se agora o recorrente na pena única de 21 anos de prisão.
6 – No mais, (designadamente quanto ás penas únicas aplicadas a cada um dos restantes arguidos), manter o decidido no acórdão recorrido.
7 – Condenar nas custas os arguidos/recorrentes – artigo 513º-1 do CPP.
8 – Fixar em 13 UCs a taxa de justiça para o recorrente UU (artigos 74º-1, 82º-1 e 87º-1-a) e 3, todos do CCJ).
9 - Fixar em 10 UCs a taxa de justiça para o recorrente GG (artigos 74º-1, 82º-1 e 87º-1-a) e 3, todos do CCJ).
10 – Fixar em 8 UCs a taxa de justiça para cada um dos recorrentes VV, FFF, KK e DD (artigos 74º-1, 82º-1 e 87º-1-a) e 3, todos do CCJ).
11 – Os recorrentes VV e FFF pagarão ainda 4 UCs de taxa de justiça nos termos do artigo 420º-4 do CPP.
12 – Os recorrentes UU, GG, KK e DD pagarão ainda 3 UCs de taxa de justiça nos termos do artigo 420º-4 do CPP.
Lisboa, 25 de Março de 2009
Fernando Fróis (Relator)
Henriques Gaspar
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