Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2098/11.7TBPBL.C1-A.S1.A
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: PINTO DE ALMEIDA
Descritores: RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
OPOSIÇÃO DE JULGADOS
REQUISITOS
DUPLA CONFORME
Data do Acordão: 04/14/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Decisão: MANTIDA A DECISÃO LIMINAR DO RELATOR QUE NÃO ADMITIU O RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS.
Doutrina:
- Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 43 e 386.
- Alberto dos Reis, CPC Anotado, Vol. VI, 268.
- I. Galvão Teles, Recurso para o Tribunal Pleno, CJ, X, V, 7 e segs..
- Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil” Anotado, Vol. 3.º, Tomo I, 2.ª ed., 208.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (NCPC): - ARTIGOS 641.º, N.º2, 671.º, N.º3, 688.º, N.º1, 689.º, N.º1, 690.º, N.ºS 1 E 2, 692.º, N.º1.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 721.º, N.º3, 721.º-A, N.º1, AL. A), 763.º, N.º2.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 11.04.2013; DE 06.07.2005, DE 14.05.2009, DE 12.05.2010, DE 13.07.2010 E DE 27.09.2012, TODOS EM WWW.DGSI.PT .
Sumário :
1. O recurso para uniformização de jurisprudência (art. 688º nº 1 do CPC) exige que haja contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão-fundamento, no domínio da mesma legislação e relativamente à mesma questão fundamental de direito.

2. No caso, a questão fundamental de direito tem a ver com o conceito da dupla conformidade e com a interpretação e aplicação da norma do art. 671º nº 3 do CPC (acórdão recorrido) e, bem assim, na versão anterior deste diploma, do art. 721º nº 3 (acórdão-fundamento).

3. Sobre tal questão, os referidos acórdãos adoptaram entendimento diferente:
- Para o acórdão recorrido, mesmo que não haja perfeita coincidência de decisões, continuará a existir dupla conforme, se, na procedência parcial da apelação, a Relação emitir decisão que seja mais favorável para o recorrente do que a decisão da 1ª instância;
- Para o acórdão-fundamento, para existir dupla conforme, terá de se verificar uma sobreposição integral de decisões, ou seja, uma total e irrestrita coincidência entre a decisão da 1ª instância e o acórdão da Relação.

4. Porém, a redacção das normas dos citados arts. 671º nº 3 e 721º nº 3 evidencia que a caracterização da figura da dupla conforme sofreu uma alteração restritiva, passando a exigir-se que a confirmação da decisão da 1ª instância seja feita sem fundamentação essencialmente diferente.

5. Ora, a oposição de acórdãos, como fundamento do recurso de uniformização, pressupõe que se esteja no domínio da mesma legislação; releva, pois, que, no intervalo entre um e outro acórdão, não tenha ocorrido qualquer mudança legislativa com interferência directa ou indirecta na questão de direito controvertida.

6. Para vingar a oposição entre os acórdãos, as situações apreciadas em cada um deles teriam de ser nuclearmente idênticas e as soluções teriam de ser diferentes, independentemente da alteração legislativa ocorrida entre eles.

7. Não é isso, porém, o que se verifica no caso: perante o quadro normativo anterior, sem interferência da fundamentação das decisões, operaria a contradição entre os acórdãos (limitada ao referido diferente entendimento sobre a dupla conforme); à luz da norma actual, a decisão do acórdão recorrido, fruto da diferente fundamentação, não seria, perante a situação apreciada no acórdão-fundamento, diferente da decisão adoptada neste, ou seja, não existiria dupla conforme.

8. Assim, apesar do diferente entendimento dos dois aludidos acórdãos sobre o conceito da dupla conforme, as situações apreciadas num e noutro não são idênticas, assim como não é substancialmente idêntico o quadro normativo neles considerado e aplicado, não se verificando todos os pressupostos do recurso para uniformização de jurisprudência.
Decisão Texto Integral:

Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça[1]:

AA – …, Lda veio interpor recurso para uniformização de jurisprudência, nos termos do art. 688º e segs do CPC, do acórdão deste Tribunal, proferido no processo apenso, que indeferiu a reclamação (art. 643º do CPC), que a mesma havia apresentado, contra a decisão que não admitiu o recurso de revista que ela havia interposto.

Invoca como fundamento a oposição entre o acórdão recorrido e o Acórdão do STJ de 08.09.2011, proferido no Proc. nº 880/08.1TBVRS.E1.S1

Foi proferida decisão liminar que não admitiu o recurso para uniformização por, no essencial, se entender que não ocorria, no caso, uma contradição relevante entre os acórdãos em confronto.

Vem agora a Recorrente requerer que sobre tal despacho recaia acórdão, por continuar a entender que existe a oposição alegada.

A parte contrária não respondeu.

Dispensados os vistos, cumpre decidir.

A fundamentação da aludida decisão liminar é deste teor:

"Dispõe o art. 688º nº 1 do CPC que as partes podem interpor recurso para o pleno das secções cíveis quando o Supremo Tribunal de Justiça proferir acórdão que esteja em contradição com outro anteriormente proferido pelo mesmo tribunal, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão de direito.

As disposições legais seguintes indicam-nos os requisitos formais específicos a satisfazer pelo recorrente: o prazo de 30 dias, a contar do trânsito em julgado do acórdão recorrido, para interposição do recurso (art. 689º nº 1); a alegação do recorrente, a acompanhar o requerimento de interposição, com identificação dos elementos que determinam a contradição alegada e a violação imputada ao acórdão recorrido; a junção de cópia do acórdão-fundamento para demonstrar a oposição alegada (art. 690º nºs 1 e 2).

Ora, no caso, esses requisitos foram cumpridos: o requerimento de interposição foi apresentado em tempo (cfr. notificação de 03.10.2014) e o requerimento de interposição inclui a alegação da Recorrente com concreta indicação da oposição e violação imputadas ao acórdão recorrido; foi também junta cópia certificada do acórdão-fundamento, com nota do trânsito em julgado (fls. 27). Não se verificam outros motivos de rejeição do recurso (art. 641º nº 2).

Sendo patente que, apesar da natureza dos processos, estamos perante dois acórdãos proferidos pelo Supremo e não existindo, sobre a questão, jurisprudência uniformizada deste Tribunal, importa, nesta apreciação liminar (art. 692º nº 1), aferir se ocorre a oposição que serve de fundamento ao recurso.

Como se prevê no citado art. 688º nº 1, deve tratar-se de contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão-fundamento, no domínio da mesma legislação e relativamente à mesma questão fundamental de direito.

Essa contradição, como vem sendo entendido, verifica-se quando a mesma disposição legal é, num e noutro acórdão, interpretada e/ou aplicada em termos opostos, havendo identidade de situação de facto subjacente a essa aplicação; ou seja, quando um caso concreto, constituído por um similar núcleo factual, é decidido, com base na mesma disposição legal, num acórdão num sentido e no outro em sentido contrário (Acórdão deste Tribunal de 11.04.2013; também, entre outros, os Acórdãos do STJ de 06.07.2005, de 14.05.2009, de 12.05.2010, de 13.07.2010 e de 27.09.2012, todos em www.dgsi.pt).

Por outro lado, essa questão de direito deve ser essencial para a decisão proferida em cada um dos acórdãos em confronto.

Exige-se ainda que o quadro normativo que serve de fundamento às duas decisões seja substancialmente idêntico (cfr. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 43 e 386).

Pois bem, no caso, a questão fundamental de direito decidida nos dois acórdãos referidos tem a ver com o conceito da dupla conformidade e, assim, com a interpretação e aplicação da norma do art. 671º nº 3 do CPC (acórdão recorrido) e, bem assim, na versão anterior deste diploma, do art. 721º nº 3 (acórdão-fundamento).

Como se referiu, na situação analisada no acórdão recorrido, o Tribunal da Relação confirmou, de forma unânime, a sentença da 1ª instância, salvo no que respeita à condenação da recorrente no pagamento do remanescente do preço, já que, enquanto na 1ª instância se fixou o montante de € 30.000,00, a Relação, na procedência parcial da apelação, reduziu esse montante para € 27.500,00.

Entendeu-se no acórdão recorrido que não faz sentido permitir o recurso nas situações em que a decisão da 1ª instância é confirmada inteiramente na Relação e permiti-lo quando o recorrente obtém aí uma decisão mais favorável.

E acrescentou-se:

No acórdão recorrido (da Relação) operou-se uma redução, aliás pouco significativa, do montante da condenação proferida na 1ª instância.

Assim (…) o montante atribuído pela Relação «já estava, de um ponto de vista de um incontornável critério de coerência lógico-jurídica» compreendido no montante fixado na 1ª instância, devendo ter-se por verificado o requisito da dupla conformidade.

E concluiu-se, acompanhando Teixeira de Sousa:

Se a improcedência total da apelação obsta, por imposição do sistema da «dupla conforme», à interposição da revista, então também a procedência parcial dessa apelação não pode deixar de produzir, por idêntica razão, o mesmo efeito impeditivo.

Deste modo, por se entender que existia dupla conforme, foi indeferida a reclamação apresentada (art. 643º do CPC) e mantido o despacho proferido na Relação que não admitiu o recurso de revista.

Na situação analisada no acórdão-fundamento foi proferida na 1ª instância sentença que julgou parcialmente procedente a acção, decidindo-se:

a) condenar o réu a reconhecer o direito de propriedade da autora sobre o prédio aí identificado;

b) condenar o réu a restituir esse prédio à autora;

c) ordenar o cancelamento do registo da aquisição a favor do réu;

d) condenar o réu a pagar à autora a quantia de € 500,00 por danos não patrimoniais;

e) absolver o réu do pedido na parte restante.

Interposto recurso da sentença, a Relação confirmou o aí decidido, com excepção da condenação por danos morais, que revogou.

Do acórdão que assim decidiu foi interposto recurso de revista excepcional, nos termos do art. 721º-A nº 1 a) do CPC (versão anterior), no pressuposto de que se estava perante uma situação de dupla conforme.

A este respeito, acolheu-se no acórdão-fundamento um entendimento diferente do anteriormente exposto, afirmando-se que tal conformidade se caracteriza pela confirmação, pela Relação, do primeiro julgado, confirmação essa que (…) terá de ser unânime e irrestrita (…).

Mas o ponto nuclear – conhecimento e decisão do(s) pedido(s) – tem de ser perfeitamente coincidente (sobreponível), não havendo dupla conforme se ocorrerem diferentes decisões quanto a alguns dos pedidos, já que o aresto recorrido tem de ser apreciado no seu todo decisório final e não visto parcelarmente (…).

Só se a sobreposição integral do julgado se verificar é que não pode lançar-se mão da revista-regra, antes tendo de fazer-se apelo à revista excepcional.

Concluiu-se, assim, que, como a Relação não confirmou em termos irrestritos a decisão da 1ª instância, não seria caso de revista excepcional, razão por que a revista não foi admitida como tal.

Desta síntese da fundamentação dos acórdãos em confronto resulta evidente que nos mesmos se adoptou um entendimento diferente sobre o conceito de dupla conforme, aí claramente enunciado:

Para o acórdão recorrido, mesmo que não haja perfeita coincidência de decisões, continuará a existir dupla conforme, se, na procedência parcial da apelação, a Relação emitir decisão que seja mais favorável para o recorrente do que a decisão da 1ª instância.

Para o acórdão-fundamento, para existir dupla conforme, terá de se verificar uma sobreposição integral de decisões, ou seja, uma total e irrestrita coincidência entre a decisão da 1ª instância e o acórdão da Relação. Portanto, naquela situação de procedência parcial da apelação, a desconformidade parcial das decisões, mesmo que em sentido favorável ao recorrente, exclui a dupla conforme.

No caso, porém, pode pôr-se a questão se saber se as situações sobre que incidiram os dois aludidos acórdãos são perfeitamente idênticas. E se, perante a alteração da norma aplicável, estaremos "no domínio da mesma legislação".

Com efeito, dispõe o art. 671º nº 3 do actual CPC:

Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte.

A redacção da correspondente norma, na versão anterior do CPC – art. 721º nº 3 –, aplicável ao caso do acórdão-fundamento, era a seguinte:

Não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e ainda que por diferente fundamento, a decisão proferida na 1ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte.

A redacção destas normas evidencia que a caracterização da figura da dupla conforme sofreu uma alteração restritiva, passando, no que ao caso interessa, a exigir-se que a confirmação da decisão da 1ª instância seja feita sem fundamentação essencialmente diferente; ou seja, se é utilizada uma tal fundamentação não se aplica o regime da dupla conforme.

Como se disse, a oposição de acórdãos, como fundamento de recurso de uniformização, pressupõe que se esteja no domínio da mesma legislação, isto é, que o quadro normativo em que assentaram as duas decisões seja substancialmente idêntico.

Compreende-se esta exigência: aquele recurso justifica-se se as divergentes decisões do Supremo se basearem em diferente interpretação e aplicação de determinada norma; mas já não se resultam de uma alteração do conteúdo dessa norma.

Na falta de disposição concretizadora do referido conceito, será de atender ao critério que provém do art. 763º nº 2 do CPC, da versão revogada pela Reforma de 1995:

Os acórdãos consideram-se proferidos no domínio da mesma legislação sempre que, durante o intervalo da sua publicação, não tenha sido introduzida qualquer modificação legislativa que interfira, directa ou indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida.

Releva, pois, que, no intervalo entre um e outro acórdão, não tenha ocorrido qualquer mudança legislativa com interferência directa ou indirecta na questão de direito controvertida (sobre o tema, cfr. J. Alberto dos Reis, CPC Anotado, Vol. VI, 268; I. Galvão Teles, Recurso para o Tribunal Pleno, CJ, X, V, 7 e segs e Lebre de Freitas, CPC Anotado, Vol. 3º, Tomo I, 2ª ed., 208).

À primeira vista, poderia parecer que a alteração legislativa acima referida não teve qualquer influência na decisão da questão de direito controvertida.

Com efeito, no regime anterior, a fundamentação das respectivas decisões era inteiramente estranha à relevância da dupla conforme; esta não estava dependente dessa fundamentação. Daí que esta não tenha sido considerada no acórdão-fundamento.

Mas, apesar da alteração da norma, na decisão do acórdão recorrido, como aí se sublinhou, não interferiu também a questão da fundamentação.

Poderia assim ser-se levado a concluir pela irrelevância da alteração introduzida na norma, por não ter interferido na resolução da questão de direito controvertida, e que se estaria "no domínio da mesma legislação", como pressuposto da relevância da oposição de acórdãos, a legitimar o recurso de uniformização, como pretende a recorrente.

Justifica-se, porém, que nos detenhamos um pouco mais sobre esta questão.

Na situação analisada no acórdão-fundamento, a decisão da 1ª instância, no que respeita aos pedidos próprios da reivindicação, foi confirmada pelo acórdão da Relação, mas no tocante ao pedido cumulado de indemnização, não houve uma mera alteração, de redução do montante da condenação: a decisão, quanto a esta, foi revogada, tendo o réu sido absolvido do pedido de indemnização.

No caso do acórdão recorrido, a decisão da Relação confirmou a decisão da 1ª instância sobre os pedidos respeitantes à execução específica, mas quanto à condenação do remanescente do preço, a decisão foi alterada, sendo o montante reduzido de € 30.000,00 para € 27.500,00.

Considerou-se aí, também, que as decisões impugnadas não assentaram em fundamentação essencialmente diferente.

Mas pode dizer-se o mesmo no que respeita à situação apreciada no acórdão-fundamento?

Como parece evidente, não se está aí perante uma mera redução do montante da condenação em benefício do recorrente: a decisão, no que respeita à condenação na indemnização, foi revogada e o réu absolvido do respectivo pedido, o que pressupõe uma fundamentação necessariamente diferente, no que concerne à verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual.

Quer dizer: apesar do diferente entendimento, quanto ao conceito da dupla conforme, seguido nos acórdãos em confronto, verifica-se que as situações sobre que se debruçaram estes acórdãos não são nuclearmente idênticas e que a alteração da norma que prevê o regime restritivo da dupla conforme interfere na resolução da questão controvertida.

Para vingar a oposição, as situações apreciadas deveriam, com efeito, ter a referida identidade e as soluções teriam de ser divergentes, independentemente da alteração legislativa ocorrida entre os acórdãos.

Não é isto, porém, o que se verifica no caso.

Perante o quadro normativo anterior, sem interferência da fundamentação das decisões, operaria a contradição entre os acórdãos, porque limitada apenas, no fundo, ao diferente entendimento sobre a dupla conformidade.

À luz da norma actual, mesmo no entendimento mais amplo assumido no acórdão recorrido, a decisão deste quanto a tal questão, fruto da diferente fundamentação, não seria, perante a situação apreciada no acórdão-fundamento, diferente da decisão adoptada neste acórdão, ou seja, não existiria dupla conforme.

Conclui-se, pois, que, apesar do diferente entendimento dos dois aludidos acórdãos sobre o conceito da dupla conforme, as situações apreciadas num e noutro não são nuclearmente idênticas, assim como não é substancialmente idêntico o quadro normativo neles considerado e aplicado, razão por que se entende que não se verificam todos os pressupostos do recurso para uniformização de jurisprudência, previsto no art. 688º nº 1 do CPC.

Em face do exposto, não admito o recurso para uniformização de jurisprudência interposto por AA – Empresa de Construção Civil, Lda. (...)"

Perante esta fundamentação, a Recorrente argumenta que a questão fundamental de direito a dirimir é a de saber se há ou não dupla conforme, quando a decisão do tribunal de recurso foi mais favorável para o recorrente não obstante o decaimento. Defende que esta questão teve tratamento diferenciado nos dois acórdãos em análise e acrescentou:

"A subtil alteração do quadro normativo apontado pelo Senhor Juiz Conselheiro Relator em nada toca no objecto da pretensão da recorrente ou na apreciação, para o caso concreto, dos requisitos do artigo 688º nº 1 do CPC, uma vez que, como resulta das suas conclusões, limita o recurso àquela questão independentemente da fundamentação dos acórdãos ser idêntica ou não, mantendo-se a mesma solução objecto do dissenso assinalado independentemente da alteração legislativa ocorrida. Não é, pois, relevante para que se aprecie o recurso tal como interposto saber qual a fundamentação dos acórdãos do processo em que interveio a recorrente mas apenas aferir o resultado decisório dos mesmos".

Com o devido respeito, estas razões não infirmam o que se disse na aludida fundamentação.

Desde logo, não pode afirmar-se que tenha apenas ocorrido uma "subtil" alteração do quadro normativo e que não releva a fundamentação das decisões sobre que incidiram os aludidos acórdãos.

Na verdade, o regime actual (art. 671º nº 3) é claramente mais restritivo que o anterior (art. 721º nº 3) e tem este cariz, justamente, por se ter passado a exigir, para a existência da dupla conformidade, que a fundamentação das decisões não seja essencialmente diferente.

Assim, como se salientou no despacho reclamado, para a oposição proceder as situações apreciadas teriam de ser nuclearmente idênticas e as soluções teriam de ser divergentes independentemente da alteração legislativa ocorrida entre os acórdãos.

Mas não é essa a situação com que deparamos no caso: como se crê ter ficado demonstrado, à luz do regime actual, a solução do acórdão recorrido não seria diferente da encontrada no acórdão-fundamento; não existiria também dupla conformidade por a fundamentação das decisões não ser essencialmente idêntica.

Em face do exposto, mantém-se a decisão reclamada de não admitir o recurso para uniformização de jurisprudência interposto por AA – …, Lda.

Custas pela recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 3 (três) UCs.

                                             

Lisboa, 14 de Abril de 2015

Pinto de Almeida (Relator)

Júlio Gomes

Nuno Cameira

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[1] Proc. nº 2098/11.7TBPBL.C1-A.S1-A