Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
04S2609
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: VÍTOR MESQUITA
Descritores: ADMISSÃO DO RECURSO
SUCUMBÊNCIA
Nº do Documento: SJ200411240026094
Data do Acordão: 11/24/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL PORTO
Processo no Tribunal Recurso: 4546/03
Data: 03/08/2004
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: DECIDIDO NÃO TOMAR CONHECIMENTO.
Sumário : 1. O despacho que admite o recurso não vincula o tribunal superior (art. 687º, nº 4, do CPC, "ex vi" art. 1º, nº 2, a), do CPT) e o despacho do relator no tribunal superior é também provisório, não formando caso julgado, por ser modificável pela conferência, quer por iniciativa do relator, dos seus adjuntos e das próprias partes.
2. O art. 79º do CPT/99 veio consagrar no foro laboral o regime da sucumbência previsto no nº 1 do art. 678º do CPC.
3. Assim, e à luz do disposto neste preceito legal, a admissibilidade do recurso pressupõe a verificação cumulativa de um duplo requisito:
1º - que a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre;
2º - que a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal que proferiu a decisão de que se recorre.
4. Sendo a alçada do tribunal da Relação de € 14.963,94 (art. 24º, nº 1, da Lei 03/99, de 13 de Janeiro (LOTJ99), o valor atribuído à acção de €105.204,88, mas o montante da sucumbência de € 3.818,80, o recurso é legalmente inadmissível, pelo que dele se não pode conhecer.
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

"A", veio por carta datada de 06 de Abril de 2001, entrada no Tribunal de Trabalho de Vila Nova de Gaia em 10/4/2001, e dirigida ao "Sr. Delegado do Procurador da República do Tribunal de Trabalho de V. N. Gaia" efectuar a "participação do acidente de trabalho" relativa ao sinistrado B, ocorrido no dia 31 de Março de 2000, informando que "o sinistrado ainda se encontra em tratamento nos serviços clínicos da Seguradora" e requerendo "nos termos do art. 42º do Dec-Lei 143/99, de 30 de Abril, a prorrogação do prazo estabelecido até ao máximo de 30 meses". Indicou como entidade patronal do sinistrado C.
Juntou boletim de exame médico e um exemplar da apólice do contrato de seguro.

Em 17/5/2001 foi realizado exame médico ao sinistrado no T.T. de Vila Nova de Gaia, constando do respectivo auto (fls.15) que o sinistrado mantém-se em tratamento na Companhia Seguradora, deve voltar a novo exame após a alta definitiva: devendo "manter-se em ITA", tendo lugar, na mesma data, a tentativa de conciliação, a que se reporta o auto de fls. 17, dele constando que a seguradora "se concilia com o sinistrado mediante o pagamento de indemnização diária de 3.103$00, com início em 29/02/01, bem como aceita pagar a quantia de 600$00 de transportes".
Tal acordo foi homologado por decisão de fls. 18.

Após a junção de alguns boletins médicos, por parte da seguradora, veio ser proferido, em 06/02/2003, o despacho do seguinte teor:
"Para exame médico, seguido de tentativa de conciliação, designo o dia 27/02/03, devendo o perito médico pronunciar-se sobre a concessão da incapacidade temporária".
Efectuado o exame médico, conforme auto de fls. 54, neste deixou exarado o perito médico "...converto a ITA em IPA, desde 3179/2002, necessitando da terceira pessoa".

Posteriormente, ocorreu nova tentativa de conciliação, cujos termos constam do respectivo auto de fls. 60 a 62.

Como dele se alcança, para além da pensão anual e vitalícia a pensão suplementar por necessitar de ajuda de terceira pessoa, tratamentos clínicos que vier a necessitar, bem como a respectiva medicação e quantia despendida em transportes, o sinistrado "reclama o subsídio previsto no art. 23º da Lei 100/97, de 13/9, no montante de € 3.818,8 a pagar de uma só vez", dada a conversão da ITA em IPA e por aquela se prolongar consecutivamente por período superior a 30 meses...
A Seguradora aceita tudo "o reclamado" pelo sinistrado, com excepção do subsídio previsto no art. 23º da Lei 100/97, por entender que dele não tem direito o sinistrado.

Por decisão de 28/4/2003 (fls. 67) foi homologado " o acórdão que antecede..." e determinado que "ao abrigo do preceituado no art. 23º da Lei 100/97, de 13/9, a seguradora pagará ao sinistrado o subsídio reclamado por este no montante de 3.818,8 euros", atribuindo à acção o valor de 105.204,88 euros.

Inconformada com esta decisão dela interpôs a Seguradora recurso de agravo para o TR Porto, que, por acórdão de fls. 98 a 100, negou provimento ao agravo, confirmando "o despacho recorrido".

Ainda irresignada com este acórdão interpõe aquela o presente recurso de agravo para o STJ, logo tendo apresentado alegações, que mereceram resposta (contra-alegações) por parte do sinistrado, patrocinado pelo Ministério Público.

Colhidos os "vistos" legais, cumpre apreciar e decidir.
Importa, antes de mais, salientar que o despacho que admite o recurso não vincula o tribunal superior (art. 687º, nº 4, do CPC, "ex vi" art. 1º, nº 2, a), do CPT), sendo certo, por outro lado, e como é jurisprudência pacífica deste STJ (vide, recentes Acs. de 02/11/04, Procs. 604/04 e 2607/04, e de 17/11/04, Proc. 1741/04), o despacho do relator no tribunal superior é também provisório, não formando caso julgado, por ser modificável pela conferência, quer por iniciativa do relator, dos seus adjuntos e das próprias partes (arts. 700º a 708º, "ex vi", art 726º, todos do CPC).

Deste modo, pese embora o facto de o recurso ter sido admitido na 2ª instância, e, preliminarmente, neste STJ, pelo relator, não existe obstáculo legal a que seja proferido acórdão a julgar findo o mesmo, se, porventura, dele se não deva conhecer, por inadmissível, como efectivamente acontece.

Ao referir "sem prejuízo do disposto no art. 678º do CP Civil e independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso para a Relação" nas situações contempladas nas suas alíneas a), b) e c), do art. 70º do CPT99, veio consagrar no foro laboral o regime da sucumbência previsto no nº1 do art. 678º do CPC.

Estabelece este preceito legal que só é admissível recurso ordinário nas causas de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre desde que as decisões impugnadas sejam desfavoráveis para o recorrente em valor também superior a metade da alçada desse tribunal.

Assim, a admissibilidade do recurso, prevista neste normativo, pressupõe a verificação cumulativa de um duplo requisito:
1º - que a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre;
2º - que a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal que proferiu a decisão de que se recorre.
O valor da alçada dos Tribunais da Relação é de € 14.963,94 (art. 24º, nº 1, da Lei 3/99, de 13 de Janeiro - LOTJ99 - na redacção dada pelo art. 3º do Anexo ao Dec-Lei 323/2001, de 17 de Dezembro.

Se é certo que o valor atribuído à acção - € 105.204.88 - é muito superior ao valor da alçada da Relação, mostrando-se, consequentemente, verificado o primeiro requisito, o mesmo já não se poderá dizer quanto ao segundo requisito, pois o montante da sucumbência - 3.818,8 euros - é bastante inferior a metade da alçada da Relação.
Exigindo a lei processual a verificação cumulativa dos citados dois requisitos, não ocorrendo o segundo, o recurso é legalmente inadmissível, pelo que dele se não pode conhecer.

Termos em que se decide não conhecer do recurso.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 24 de Novembro de 2004
Vítor Mesquita,
Fernandes Cadilha,
Mário Pereira.