Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
189/13.9TBALQ.L1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: ABRANTES GERALDES
Descritores: CONTRATO DE ARRENDAMENTO NÃO HABITACIONAL
OBRAS DE CONSERVAÇÃO
INTERPRETAÇÃO DO CONTRATO
Data do Acordão: 03/07/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / NEGOCIO JURÍDICO / DECLARAÇÃO NEGOCIAL / INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO / SENTIDO NORMAL DA DECLARAÇÃO – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / CONTRATOS EM ESPECIAL / LOCAÇÃO / ARRENDAMENTO DE PRÉDIOS URBANOS / DISPOSIÇÕES ESPECIAIS DO ARRENDAMENTO PARA FINS NÃO HABITACIONAIS / OBRAS.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / JULGAMENTO DO RECURSO / RECURSO DE REVISTA / FUNDAMENTOS DA REVISTA.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 236.º E 1111.º, N.º 1.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 662.º, N.º 4 E 674.º, N.º 3.
Sumário :

1. No contrato de arrendamento urbano não habitacional as partes podem convencionar que as obras de conservação ordinária ou extraordinária fiquem a cargo do arrendatário, nos termos do art. 1111º, nº 1, do CC.

2. Esta vinculação tanto pode resultar diretamente do contrato de arrendamento como da remissão para documento anexo, como seja um “Regulamento Interno de Gestão do Pólo Industrial” no qual se situam os imóveis arrendados.

3. A identificação das obras cuja execução fica a cargo do arrendatário será o resultado da interpretação do contrato em função das regras gerais que constam dos arts. 236º e ss. do CC, tendo em conta designadamente que, nos negócios formais, a declaração não poderá valer, em regra, com um sentido que não tenha no seu texto um mínimo de correspondência verbal.

4. Constando do Regulamento Interno de Gestão do Polo Industrial, para o qual remete o contrato de arrendamento, que “cada ocupante assegurará a conservação e manutenção das suas zonas privativas” e incidindo o contrato sobre quatro pavilhões identificados como “zona privativa” do arrendatário no referido Pólo Industrial, na falta de outra indicação, a assunção das obras pelo arrendatário, nos termos do art. 1111º, nº 1, do CC, abarca também as obras nos telhados de cobertura.

5. Nestas circunstâncias, não é possível concluir que as obras de conservação e de manutenção ficariam a cargo do arrendatário e as obras de reparação a cargo do senhorio, na medida em que umas e outras são obras de conservação, cuja classificação como ordinária ou extraordinária depende da sua natureza ou amplitude.

A.G.

Decisão Texto Integral:

I - AA, S.A., intentou contra BB, S.A., ação declarativa pedindo a condenação no pagamento da quantia de € 223.538,75 e juros sobre o capital de € 220.065,44 desde 9-2-13 até integral pagamento.

Alegou que é arrendatária da R., sendo o locado um complexo industrial com diversos pavilhões cuja cobertura carecia de reparação para evitar infiltrações de águas pluviais, obras que recaíam sobre a R. enquanto proprietária.

A R., contudo, recusou realizar tais reparações, o que motivou que a A. o tivesse feito a expensas suas, devendo ser reembolsada das despesas e dos prejuízos que as infiltrações provocaram.

A R. contestou alegando que do contrato de arrendamento e do Regulamento anexo resulta que incumbe à A. a obrigação de conservação e reparação dos telhados dos edifícios que integram a sua parte privativa.

Efetuado o julgamento, foi proferida sentença julgando a ação improcedente.

Interposto recurso de apelação, a Relação revogou a sentença e condenou a R. no pagamento da quantia de € 223.538,75 e juros de mora sobre € 220.065,44, desde 9-2-13, até pagamento.

A R. interpôs recurso de revista suscitando as seguintes questões:

- Nulidade do acórdão por obscuridade, contradição e falta de fundamentação;

- Errada apreciação dos meios de prova, devendo ser mantida a sentença da 1ª instância a respeito da matéria de facto;

- Violação quer do art. 405º do CC sobre o princípio da liberdade contratual, quer o art. 1111º sobre a responsabilidade pelas obras de conservação, devendo concluir-se, por interpretação do contrato de arrendamento e do Regulamento de Gestão do Polo Industrial, que as obras de reparação da cobertura dos pavilhões arrendados à A. são da sua responsabilidade.

Houve contra-alegações.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II - Factos provados:
1. Com data de 2-1-10, a A. celebrou com a R. um acordo denominado “contrato de arrendamento não habitacional”, o qual consta de fls. 42 a 47;
2. Nos termos desse contrato, e com a EEção de 30 anos, a contar de 30-6-09, a R. deu de arrendamento à A. 4 módulos espaciais com a área coberta de 32.301 m2, na Quinta ... (conf. planta anexa ao contrato - Anexo I);
3. Como contrapartida do gozo e fruição do espaço arrendado, a A. obrigou-se a proceder ao pagamento de uma renda mensal, inicial, de € 52.030,00;
4. O locado destina-se ao exercício da atividade comercial da A. que, para o efeito, poderia fazer as obras interiores para instalação dos seus serviços, com recurso a material de fácil desmontagem e remoção e respeitando a estrutura e segurança do imóvel, bem como proceder à alteração do posicionamento das chaminés, sempre que necessário para o desenvolvimento da sua atividade.
Nos termos da Cláus. 5ª do contrato:
A Segunda Outorgante [a ora A.] poderá fazer no local arrendado as obras interiores convenientes à instalação dos seus serviços, com recurso a material de fácil desmontagem e remoção, respeitando a estrutura e segurança do imóvel, sem prejuízo de qualquer formalidade prevista na lei, bem como proceder à alteração do posicionamento das chaminés sempre que for necessário para o desenvolvimento da sua atividade.
Todas as outras obras, ou seja, as incidentes sobre a estrutura do imóvel, dependem de prévia autorização escrita da Primeira Outorgante [a ora R.], a prestar por escrito no prazo de 60 dias a contar da receção do pedido, e depois de realizadas pela Segunda Outorgante ficarão a pertencer ao locado, sem direito a qualquer indemnização ou retenção”.
5. Nos termos da Cláus. 2ª, nº 4, “constitui parte integrante do presente contrato o «Regulamento Interno de Gestão do Polo Industrial do ...», que as Partes se obrigam a cumprir e a fazer cumprir, pelo qual são definidas as regras de funcionamento de todo o imóvel, incluindo as áreas ocupadas pela própria Senhoria, os arruamentos internos e as áreas e espaços envolventes às áreas cobertas”.
6. Como Anexo II ao contrato, a A. e a R. acordaram ainda as regras de convivência no espaço industrial e comercial no qual se insere o locado, uma vez que o mesmo é ocupado por diversas entidades, no documento intitulado “Regulamento Interno” que consta a fls. 328 a 336;
7. Diz-se nesse documento (em “1.1. - Enquadramento Geral”) que:
O Regulamento Interno destina-se a todos os ocupantes do Polo, quer sejam proprietários, inquilinos ou de qualquer forma ocupantes e/ou utentes de qualquer espaço do Polo, doravante todos designados genericamente por ocupantes.
Define e regulamenta o funcionamento e a utilização do Polo: os direitos e as obrigações dos mesmos ocupantes, os encargos e a sua forma de repartição, a administração das zonas comuns e rotinas de manutenção referentes à vigilância, limpeza e manutenção dos diversos equipamentos e espaços.”
8. Desse "Regulamento Interno" consta, para além do mais, o seguinte:
1.2. Delimitação de Áreas do Polo
O Polo divide-se em zonas privativas e em zonas comuns.
As zonas privativas são as áreas afetas ao uso exclusivo das empresas que nelas desenvolvem as suas atividades comerciais/industriais, doravante designadas ocupantes, nomeadamente a AA, a BB, a CC, a DD, a FF, a EE e a Thula.
As zonas comuns do Polo são todas as que não estejam atribuídas ao uso exclusivo dos ocupantes, designadamente, Portaria, Balneários, Central de águas quentes, Posto Médico, Central de rede de incêndios, Ecopontos, ETAR’s, Postos de Seccionamento e Postos de Transformação de Energia Elétrica e Gás, Ar Comprimido, furos de água e depósitos, arruamentos, jardins, parques de estacionamento e zonas de cargas e descargas, mata de eucaliptos, pinhal, depósito de combustível e estação de tratamento de água.
As plantas anexas identificam as zonas comuns (Anexo I) [fls. 335] e as zonas privativas (Anexo 2) [fls. 336] neste caso com a delimitação da área afeta a cada ocupante.
1.3. Uso das zonas privativas
Cada ocupante tem direito de usufruir do seu espaço privativo e dele dispor, na condição de não prejudicar os direitos dos restantes ocupantes, alterar o fim a que se destina ou prejudicar o aspeto geral do Polo.
(…)        
1.5. Gestão das zonas comuns
A gestão das zonas comuns é da responsabilidade do ocupante com a maior permilagem, adiante designado por Gestora.
Todos os custos inerentes à gestão das zonas comuns são repartidos pelos ocupantes de acordo com o princípio do «utilizador/pagador» e na exata proporção da efetiva utilização …
(…)”
9. Ainda no mesmo "Regulamento Interno", mas no capítulo sobre “Regras de Funcionamento e de Utilização Específicas das Zonas Comuns”, consta o seguinte:
“…
2.2. Circulação e segurança nas zonas comuns

Os acessos às coberturas das naves e edifícios são de acesso exclusivo às equipas cuja responsabilidade de atuação é da Gestora. Nenhuma outra pode aceder a tais coberturas sem autorização expressa da Gestora e nenhum objeto pode ser colocado nas coberturas dos edifícios e de quaisquer construções no Pólo sem autorização prévia e escrita da Gestora. O mesmo se aplica relativamente á colocação de quaisquer cargas na face inferior da estrutura que suporta essas coberturas”.
(…)

E no Capítulo sobre as “Regras de Funcionamento e utilização específicas das zonas privativas” consta que:
3.1. Obras nas Zonas Privativas do Polo
Cada Ocupante poderá modificar, a seu cargo, a disposição interna dos seus espaços privativos, desde que sejam respeitadas as condições específicas de arrendamento ou qualquer outra forma de ocupação que legitimam a utilização do respetivo espaço.
A Gestora terá plenos poderes para autorizar ou impedir a realização ou a continuação de quaisquer obras, desde que se verifique que as mesmas violam as condições referidas no parágrafo anterior ou constituam, de qualquer forma, risco para a segurança, em geral, do Polo, ou para qualquer uma das suas componentes, quer privativa quer comum.
A gestora poderá realizar, ou autorizar a realização, de obras nas coberturas para viabilizar a colocação de quaisquer equipamentos, que sejam necessários ao desenvolvimento da sua própria atividade industrial/comercial, ou a mesma atividade de qualquer dos ocupantes.
3.2 Conservação e Manutenção Zonas Privativas
Cada Ocupante assegurará a conservação e manutenção das suas zonas privativas.
(…).
O Anexo I (fls. 335) do Regulamento corresponde a uma Planta na  qual surgem identificadas as “zonas comuns” e o Anexo II (fls. 336) identifica as “zonas privativas”, nele se referindo que à A. AA correspondem 32.301 m2 (88,4%) de um total de 36.527 m2 (100%), sendo que a TCAP ocupa 4.202 m2 (11,5%) e a DDbody 24 m2 (0,1%).
10. Desde a instalação da A. no locado (anterior à celebração do contrato referido no ponto 1.), a R. suportou despesas relativas às reparações das coberturas e limpeza de algerozes, de que são exemplos os docs. de fls. 59 a 63 (facto alterado pela Relação).
11. No final do ano de 2010, ocorreram diversas infiltrações de águas pluviais rias nas instalações afetas à A., nomeadamente, na zona ocupada pela subarrendatária If FF, nos escritórios centrais, na If DPAB e na If Auto.
12. Em 16-2-11, a R. fez deslocar às instalações da A. um técnico da Cosiga (o Sr. Eng. ...) para avaliar a situação reportada.
13. Em 17-5-11, ocorreu uma grande inundação das instalações da A.
14. Os eventos referidos nos pontos 11. e 13. foram reportados pela A. à R. através de várias mensagens eletrónicas.
15. Em 18-5-11, a A. enviou email à R. comunicando-lhe o seguinte:
«Reportámos a 21 de Janeiro os problemas graves que temos de infiltrações nas áreas do escritório e nas áreas das oficinas, conforme emails abaixo. A GG, Eng. ..., já veio fazer um levantamento dos problemas em Fevereiro/Março.
Até hoje e apesar de já ter solicitado, ainda não recebemos qualquer informação sobre o início das reparações sendo que as mesmas são absolutamente urgentes.
Ontem tivemos mais uma grande inundação nos nossos escritórios, ver foto abaixo. Este facto que se tem repetido algumas vezes nos últimos tempos é grave a carece de correção imediata.
Além do enorme desconforto para as pessoas com os seus postos de trabalho nestas condições, tivemos as seguintes consequências:
- Quadro elétrico disparou, com a consequente paragem do sistema informático que teve como consequência atraso na preparação de guias de remessa e envio de documentação para os nossos clientes.
- Paragem de 6 pessoas durante 2 horas.
- Vário material informático ficou molhado, havendo o risco de este se encontrar danificado.
- Impossibilidade de utilizar salas de reuniões durante a manhã.
- Tivemos que retirar água com pás, tal era a quantidade.
Como pode compreender não é possível mantermos esta situação por mais tempo.
Assim aguardamos até ao final da semana para recebermos indicação das datas de reparação dos telhados.
Findo este prazo trataremos da reparação debitando os respetivos custos à TCAP.
Cumprimentos/...»
16. Não tendo obtido qualquer resposta, em 30-6-11, a A. voltou a enviar mensagem de correio eletrónico à R., remetendo-lhe o orçamento para a reparação necessária e, em 1-7-11, voltou a insistir junto da R., com o mesmo propósito
17. Por email de 4-7-11, a R. prometeu à A. uma resposta breve para os “problemas nos telhados
18. Do mesmo modo, (a A.) informava que solicitaria orçamentos para a reparação dos telhados das naves e que os remeteria à R. para aprovação
19. No decurso do Verão de 2011, aproveitando a estação menos chuvosa, foram iniciados os trabalhos na área dos escritórios, para reparação do telhado cujo custo ascendeu a € 12.870,00, qual foi debitado pela A. à R. pela nota de débito nº ..., de 29-9-11, sendo que a R. recusou-a;
20. Em 26-10-11, a A. enviou nova mensagem de correio eletrónico à R., lamentando a falta de resposta à solicitação de reparação das coberturas no período de Verão, aludindo aos problemas com as infiltrações existentes e aos prejuízos que estas acarretavam, que já se sentiam na sequência das chuvas ocorridas e sensibilizando-a para o facto de ter sido enviado, por correio registado, orçamento para solução dos problemas;
21. No dia 7-11-11, voltou a registar-se uma grande infiltração de água nas instalações arrendadas pela R. à A., que danificou diverso material informático e causou inúmeros prejuízos.
22. Por email de 8-11-11, a A. relatou à R. o sucedido, alertou para a gravidade da situação e para a ausência de resposta por parte da R. e concedeu a esta um prazo de 5 dias para comunicar a data de início dos trabalhos, sob pena de ser forçada a salvaguardar a segurança de pessoas e bens que diariamente frequentavam o espaço.
23. Ao email de 8-11-11, a R. respondeu também por email de 9-11-11, no qual garantia uma resposta "dentro de alguns dias";
24. Após computarem os danos sofridos, as duas sublocatárias da A., EE, Ldª e FF Ldª, debitaram-lhe os respetivos custos com as infiltrações, no valor global de € 6.449,53.
25. Este valor foi deduzido às rendas pagas à A. (facto aditado pela Relação).
26. A A. remeteu à R., em 15-11-11, mensagem de correio eletrónico:
«Fazemos referência à já abundante correspondência remetida a V.Exª, na qualidade de Administrador da Senhoria, com início no presente ano de 2011 e reiterado ao longo do mesmo ano, relativamente à necessidade urgente de realização de obras no Edifício locado, sem que tenhamos obtido qualquer resposta ou informação da data prevista para a realização das obras em causa.
Dada a falta de resposta e realização das obras em causa, os prejuízos que inevitavelmente iriam produzir-se para todas as Empresas locatárias do imóvel tiveram início.
Remeto, para o efeito, correspondência com descrição de danos e imputação de prejuízos, remetida pelas sociedades sublocatárias FF e EE, factos que V. Exªs, devem tomar a devida nota, aos quais acrescem os danos e prejuízos já sofridos por esta Empresa, emergentes da persistente omissão da Senhoria no que se reporta à reparação do telhado do Edifício locado, designadamente, no atual contexto de elevada precipitação pluvial que pela sua intensidade e atual estado do telhado determina que não seja possível continuar a protelar a devida reparação.
Neste contexto, sob pena de inviabilizar-se totalmente o atividade industrial desenvolvida no local e/ou acréscimo de danas materiais, ou mesmo danos pessoas gravíssimos, cujos montantes nos dispensamos de qualificar face à potencial gravidade e relevância, informamos que, caso nada seja dito por essa Empresa no Prazo de 5 dias (ate 21-11-11), iremos proceder à reparação do citado telhado, nos termos do art. 1036º do CC, para o que ficam desde já formalmente notificados, e iremos compensar as valores despendidos no valor da rendas vincendas, logo que tais valores estejam apurados e devidamente documentados.
Neste sentido fazemos referências aos orçamentos já enviados por carta registada de 27-10-11.
Naturalmente, serão, também, imputados à V. Empresa, na qualidade de Senhoria, todos os encargos e valores que nos forem imputados pelos sublocatários assim como, naturalmente, os que sofremos ou viermos a sofrer (estamos a fazer a referido levantamento), relacionados com a omissão de reparação do telhado locado, restando-nos lamentar que a situação em causa haja permanecido por resolver EEnte todo o ano de 2011.
A presente comunicação, dada a sua natureza, segue também por via postal, sob registo e aviso de receção, remetida ao Exmº Conselho de Administração da Empresa. Com os melhores cumprimentos.
---
Direção Administrativa.»
27. Sem resposta no prazo concedido, a A. voltou a contactar a R., por meio de carta registada com aviso de receção, datada de 25-11-11, nos seguintes termos:
«Ex.mºs Senhores
Como é da melhor conhecimento de V. Exªs., os telhados de cobertura dos Edifícios do Polo do ... apresentais gravíssimas deficiências de impermeabilização, tendo-se verificado já uma série de prejuízos por paragens de produção, que tiveram origem na ocorrência de infiltrações, em equipamentos e outros bens dos empresas que aqui mantém a sua atividade. Infelizmente, alguns dos bens ficaram irremediavelmente danificadas. Parte apenas dessas deficiências foram objeto de reparação tendo importado um custo no montante de € 12.87616+IVA que vos foi debitado em 29-9-11 e que não deixaremos de reclamar, adicionado de todos os que entretanto se forem acumulando.
A AA, na qualidade de Inquilina deste Polo industrial, do qual é Senhoria a BB, SA, tem vindo a denunciar junto de Vªs Exªs a necessidade imperiosa de realização das obras de reparação que se impõem na referida cobertura do telhado, reclamando que urgente a sua adjudicação a empresa especializada, atento o contexto já bem presente na produção de danos que também já são do V. conhecimento, por deles termos dado, em devido tempo, a respetiva notícia, de forma exaustiva e documentada.
Recordamos que este assunto se arrasta há quase 1 ano, sublinhando que pelo menos desde Janeiro de 2011 tem sido enviada a V. Exªas toda a panóplia de mails, faxes e demais expediente que aqui damos por integralmente reproduzida. Realça-se que inclusivamente foi efetuado, logo em 16-2-11, um levantamento técnico da situação por uma empresa de construção civil designada para o efeito por V. Exªs. A título de exemplo recente, destacamos a carta registada que foi remetida à V. empresa, em 17 do corrente més. A tudo isto e depois de em 4-7-11 e em 9-11-11 terem comunicado que responderiam com brevidade, V. Exªas acabaram por responder com o silêncio e qualquer ausência de resultado, facto que para os devidos efeitos não se pode deixar de levar em devida conta e de valorizar em conformidade.
Regista, portanto, a Administração da AA, SA., a total negligência revelada pela Senhoria em promover as necessárias e urgentes obras ele reparação reclamadas, prevendo-se o inevitável avolumar de incidentes provocados por infiltrações de águas pluviais nos próximas dias e semanas de Inverno, situação passível de originar prejuízos da maior gravidade, designadamente se vierem a ocorrer em equipamentos vitais para a produção industrial sediada no Edifício, incluindo as respetivas linhas de produção ou serviços ou equipamentos de apoio, que obriguem à paragem completa ou parcial de atividade.
Se os referidos danos ocorrerem, por exemplo, em servidores informáticos, em equipamentos de fornecimento e distribuição de energia, ou em maquinaria industrial insubstituível, a paragem da produção poderá conduzir à obrigação do pagamento de indemnizações por incumprimento contratual de fornecimento de peças a OEM's em montantes ruinosos para a nossa empresa, inquilina deste Pólo, ou para as outras empresas que connosco partilham este espaço.
V. Exªs não ignoram os riscos apontados, pelo que mais se estranha a demora no resolução do problema, sendo certo que já foi também remetida toda a documentação relativa a orçamentos solicitados pela AA para a realização dos trabalhos, para possibilitar a sua adjudicação, ou a adjudicação de outros que V. Exªs reputem melhores.
Alertamos expressa e formalmente a Administração da BB, SA, para os enormes riscos envolvidos na situação com que nos vemos confrontados e gravíssimas consequências que daí podem advir que não poderão deixar de vos ser imputadas.
A responsabilidade de V Exªs. pela execução e custo dos trabalhos decorre do contrato de arrendamento não habitacional válido e plenamente em rigor entre a AA, SA, como inquilina e a BB, SA, como senhoria, face à legislação aplicável.
Com efeito, o art. 1074º do CC refere que cabe ao Senhorio executar todas as obras de conservação, ordinárias ou extraordinárias, requeridas pelas leis vigentes ou pelo fins do contrato, salvo estipulação em contrário, sendo que decorre do art. 1036º do mesmo Código que, se o senhorio estiver em mora quanto à obrigação de fazer reparações que, pela sua urgência, não se compadecerem com as delongas do procedimento judicial, tem o inquilino a possibilidade de as fazer extrajudicialmente com direito ao seu reembolso.
Pela lei geral, é ao Senhorio que compete executar todas as obras de conservação, ordinárias ou extraordinárias, em ordem a que o locado possa permitir a realização do fim a que se destina, o que inclui as necessárias à impermeabilização das coberturas.
Portanto, constitui a presente carta, no seguimento da remetida em 17-11-11, uma última e final interpelação para que a V. empresa cumpra a sua obrigação de Senhoria, procedendo à realização das obras necessárias - pois dispõem V. Exªs já, e há longo tempo, de todas as condições e elementos para poderem tomar a decisão que a lei impele.
Se a BB, SA, persistir em ignorar a reclamação apresentada - desde Janeiro de 2011, repete-se - a nossa empresa exercerá todos os direitos de inquilina que a lei lhe faculta, que incluirá a responsabilização da V. empresa por todos os danos que se vierem a verificar (alguns já reclamados a V. Exªs.) pela continuação da calamitosa situação descrita, bem como reclamará o reembolso de todas as despesas que para si resultarem da reparação da cobertura danificada, tendo em atenção os orçamentos oportunamente informados a V. Exªs., sem qualquer resultado ou efeito.
Na ausência de resposta de V. Exªs por este mesmo meio no prazo de 8 dias úteis a contar desta data, concluiremos em conformidade com o acima exposto.
Com os nossos melhores cumprimentos.
--- Administrador/CEO Administrador.»
28. A R., por sua vez, respondeu à A. por meio de carta registada datada de 28-11-11, na qual declina a responsabilidade pela reparação dos telhados, nos seguintes termos:
«Ex.mºs Senhores,
Em resposta à carta de V Exªs., de 25 do corrente mês de Novembro, vimos referir que, porque não nos podem ser imputáveis, rejeitamos quaisquer responsabilidades que nos pretendem atribuir por infiltrações de água das chuvas que dizem ser devidas a problemas no telhado da área de que a V/Empresa é arrendatária no denominado Polo Industrial do ....
Efetivamente, no respetivo Contrato de Arrendamento (Contrato) e no Regulamento Interno de Gestão do Polo Industrial do ... (Regulamento), uma vez que, como consta do n° 4 da cláus. 2ª do Contrato, o Regulamento constitui parte integrante do Contrato, está clara e rigorosamente definido o que se consideram zonas privativas e zonas comuns do Polo e, nomeadamente, a quem compete assegurar a conservação e manutenção das suas zonas privativas conforme o Contrato e o Regulamento que, face ao que consta do n° 4 da referida cláusula segunda, as subscritoras dos mesmos se obrigaram a cumprir e a fazer cumprir, as zonas privativas são assim definidas:
"As zonas privativas são as áreas afetas ao usa exclusivo das empresas que nelas desenvolvem as suas atividades comerciais/industriais, doravante designadas Ocupantes, nomeadamente a AA".
Consequentemente, o telhado do Polo de que a V/Empresa é arrendatária está abrangido por esta definição, tanto mais que, atento o que estabelece o Regulamento, o telhado não é zona comum, dado o Regulamento considerar zonas comuns todas as que não estejam atribuídas ao uso exclusivo dos ocupantes, salientando-se que isso mesmo é confirmado, designadamente pelos anexos 1 e 2 ao Regulamento.
Assim, compete a V. Exªs assegurar a conservação e manutenção das suas zonas privativas, onde se inclui o telhado, como resulta do Contrato e do Regulamento. Ou seja: no Contrato e no Regulamento ficou estabelecida, exatamente, a estipulação em contrário ao que resulta do n° 1 do art. 1074º do CC que indicam na carta a que respondemos, o que significa que essa estipulação em contrário determina que são da V/conta todas as despesas com obras de manutenção e de conservação do arrendado.
Admitimos que tenha sido o desconhecimento do teor do Contrato e do Regulamento e alguma semelhança precipitada com o que se passa na situação dos condomínios, que não é o caso do arrendamento que temos celebrado, que possam ter dado origem à carta que nos dirigiram.
Dito isto, pela presente vimos comunicar-lhes, por um lado, que deverá resolver imediata e devidamente a situação, de modo a que o Polo de que a V/Empresa arrendatária não sofra deteriorações pelas quais a AA é responsável e, por outro lado, que concedemos a autorização de que, face ao nº 2 da cláus. 5ª do Contrato, necessitam para realizar as obras que sejam necessárias e cujos custos são, como atrás demonstrámos, da V. conta.
Sem outro assunto, subscrevemo-nos com os melhores cumprimentos.
José Ramos Presidente CEO BB, SA”
29. A esta missiva, a A. respondeu por meio do envio de carta de 9-12-11, que se transcreve:
“Ex.mºs Senhores,
Reportamo-nos à vossa carta de 28-11-11.
É com a maior perplexidade que tomamos conhecimento da posição que vêm agora comunicar de se considerarem não responsáveis pelo custo das obras de reparação dos telhados e coberturas do edifício do Pólo do ..., decorridos que estão 11 meses desde que colocámos o assunto à vossa apreciação em expediente dirigido ao V. Administrador - Sr. Dr. ... - com o qual trocamos intensa e vasta correspondência que mereceu sempre como resposta desse vosso responsável que iria dar uma resposta breve ao pedido de reparação, tendo inclusive em meados de Fevereiro enviada um Técnico para fazer o levantamento dos problemas reclamados.
Essa resposta chegou agora e ao contrário da esperada calendarização das obras de manutenção necessárias, somos confrontados com a vossa recusa em suportar tais intervenções.
Se V.Exªs entendiam que não tinham obrigação de suportar a manutenção dos telhados e coberturas do imóvel que nos arrendaram, deveriam tê-lo comunicado de forma clara e imediata e não só passados quase 11 meses durante os quais se agravaram os danos originados pela ausência de manutenção e reparação adequada das infraestruturas em causa.
Impõe-se assim, antes de mais, registar para todos os efeitos a desmesurada morosidade que imprimiram a um assunto grave, que pela sua natureza exigia uma resposta urgente e clara, significando isto que, independentemente de quem é o responsável pelas obras, a vossa atitude negligente e de desprezo para com as necessidades de manutenção infraestrutural do imóvel de que são proprietários e as legítimas necessidades do inquilino, impediu a solução do problema EEnte onze meses.
Esta morosidade é ela própria uma evidência da fragilidade dos vossos argumentos. Quem não se considera realmente responsável por problemas que lhe são alheios não demora a dizê-lo, nem investe tempo e recursos a enviar técnicos seus a avaliar obras que não lhe dizem respeito.
Não deixaremos de extrair desta demora as conclusões que dela resultam, a primeira das quais que iremos exigir a necessária reparação de todos os prejuízos e o ressarcimento das despesas decorrentes do incumprimento da V. obrigação de Senhoria de responder diligentemente ao n/ pedido de realização de obras, demora que, só por si, gerou um agravamento dos danos sofridos, dado que aguardámos, de boa fé a V. intervenção.
Posto isto e no que se refere à posição que defendem e interpretação que fazem do Regulamento anexo ao Contrato de Arrendamento, deixamos claro que consideramos esse entendimento totalmente inconsistente e desprovido de qualquer fundamento, contrário à letra do contrato e do Regulamento, contrário ao seu espírito e finalmente contrário ao próprio histórico de todas as reparações anteriores.
Cingindo-nos a este respeito a umas brevíssimas observações, sem de modo algum pretender esgotar o tema, o que reservamos para a instância adequada, apenas nos permitimos as seguintes notas:
- No contrato de arrendamento celebrado entre as partes estipula-se desde logo no nº 1 da cláusula segunda que a senhoria dá de arrendamento à inquilina a área coberta de 31.301 m2 identificada em planta anexa. As restantes condições contratuais, nomeadamente a renda, foram fixadas tendo em conta a existência e disponibilidade dessa mesma área coberta. Não se limita a resistência, qualidade ou funcionalidade dessa cobertura nem se condiciona o desempenho da mesma a qualquer investimento futuro ou custo a suportar pela inquilina. E para usufruir dessa área coberta que a inquilina aceitou suportar uma renda de € 52.030,00 mensais.
Desde há cerca de onze meses que a utilização da área arrendada se encontra prejudicada devido a deficiências de funcionamento da cobertura, resultando em danos graves. A inquilina cumpriu sempre pontualmente o dever de pagamento da renda. Cabe à senhoria e apenas a esta a responsabilidade de repor o objeto do contrato de arrendamento e suportar os prejuízos causados pelo mau funcionamento da cobertura.
- O contrato de arrendamento e o regulamento não classifica o telhado como uma "zona privativa".
- No edifício do Polo do ..., tal como em todos os imóveis cobertos, o telhado serve todos os seus Ocupantes, indistintamente, não sendo portanto possível qualificá-lo como "privativo".
As coberturas integram a estrutura exterior do edifício, no interior do qual se desenvolvem as atividades das ocupantes, e só servem o fim de serem cobertura; é sob as mesmas coberturas que existem as “zonas privativas” definidas no Regulamento. As coberturas não têm outro fim específico para qualquer dos ocupantes do que o de servir precisamente como "cobertura" das áreas, essas sim privativas; onde são desenvolvidas as atividades industriais e comerciais destes.
Uma área privativa coberta tem um telhado, tem uma cobertura, senão não seria urna área coberta, não seria um edifício, e não teria utilidade, nem daria origem ao pagamento da respetiva renda.
- A vossa interpretação, sem qualquer fundamento e ao arrepio da lei, revela ainda um desconhecimento da verdadeira realidade do Polo Industrial do ..., já que existem diversas zonas onde o mesmo telhado cobre diretamente, pelo menos, duas zonas privativas de dois ocupantes diferentes ao nível do piso térreo e 1º andar.
- As plantas anexas identificam as zonas comuns e as zonas privativas, mas o que consta das plantas são os espaços ocupados pelas zonas privativas e pelas zonas comuns, vistos numa dimensão de projeto desenhado em papel.
As plantas de localização dos edifícios, nos quais se situam as zonas privativas, pressupõem sempre que os edifícios desenhados têm telhados, porque não há edifícios sem telhado ou qualquer outra espécie de cobertura.
Afirmar que as plantas anexas ao regulamento “confirmam” que os telhados são zonas privativas é argumentar que tais plantas poderiam ser desenhadas "excluindo-se" da área desenhada de implantação dos edifícios os telhados destes.
Mas todos os edifícios têm paredes exteriores e cobertura/telhado, ou não seriam edifícios, e não é possível desenhar as plantas que os integram de outra forma.
- O Regulamento dispõe no último parágrafo do nº 3.1. que a Gestora “poderá realizar, ou autorizar a realização de obras na cobertura” exclusivamente para viabilizar a instalação de quaisquer equipamentos “que sejam necessários ao desenvolvimento da sua própria atividade industrial/comercial ou a mesma atividade de qualquer dor ocupantes”. O que obviamente só pode ter o significado de as coberturas não serem zonas privativas, porque se fossem este último parágrafo não teria razão de ser.
Se a cobertura fosse “privativa”, não seria necessário acrescentar o esclarecimento citado, pois de acordo com os anteriores parágrafos desta mesma cláusula, qualquer ocupante poderia livremente modificar a disposição do seu espaço privativo, o que na tese de V Exªs. incluiria o telhado.
Mas, o que o Regulamento estabelece relativamente a obras na cobertura - e precisamente porque esta é comum - é que compete à Gestora autorizar a obra, e exclusivamente se esta for necessária para viabilizar a instalação de equipamento necessário ao desenvolvimento da atividade do Ocupante, que decorre na zona privativa deste situada debaixo e sob a proteção da cobertura.
- Todas as outras obras e, desde logo, a conservação e manutenção das coberturas saem fora do âmbito da suprarreferida cláusula, não cabendo à Gestora a responsabilidade ou a competência da sua execução nem da sua autorização, precisamente porque compete à senhoria fazê-las, porque esse é o uso e nunca outra coisa fui sequer imaginada, prevista e muito menos praticado. E para isso a senhoria não precisa obviamente de autorização de ninguém.
- Mas, paradoxalmente, com a vossa tese, V. Exªs vêm agora autorizar estas obras de conservação!
- Ora se no vosso entendimento os telhados são uma zuna privativa e uma vez que cada inquilino é responsável pela conservação e manutenção das suas zonas privativas, não carecendo para tal da vossa autorização (3.2. do Regulamento), e sendo as obras agora em causa precisamente desta natureza e não obras convenientes aos serviços ou atividade do inquilino (a estas e só a estas aplica-se a cláus. 5ª do contrato de arrendamento), porque acharam necessário vir autorizá-las?
Face ao exposto, concluímos que a V. Empresa, como Senhoria, se autoexclui ilicitamente do cumprimento das obrigações decorrentes do que dispõe o Regime da Arrendamento no nº 1, do art. 1074º do CC, quanto a obras de conservação ordinárias ou extraordinárias do locado, pelo que a nossa Empresa, no seguimento do que já tinha referido nas suas cartas de 17 e de 24-11-11, irá proceder à realização das obras, nos locais assinalados na planta, que se anexa e em conformidade com o orçamento, no valor de € 73.995,00, acrescido da taxa de IVA em vigor e que já vos tinha sido remetido anteriormente, e que agora se remete novamente dada a extraordinária urgência de que se revestem as obras que V. Exªs, se recusam agora a assumir. Tais obras serão realizadas designadamente ao abrigo do disposto no art. 1036º do CC, tal como as anteriormente já realizadas em 7-9-11 no montante de € 12.870,00, por nós já imputadas V. Empresa, em 29-9-11 através do documento nº 6431000256.
Logo que concluídas também estas obras e após auto de receção das mesmas, ser-vos-á remetida a respetiva fatura e caso persistam na recusa de assumirem as vossas responsabilidades enquanto Senhoria do locado, a AA, S.A., irá recorrer a todos os meios que a lei lhe permite para obter o ressarcimento de todos os danos sofridos, incluindo os decorrentes do inaceitável prolongamento por 11 meses da V. resposta, que nos era devida como Inquilina.
Nesse caso, a AA, S.A., aguardará serenamente a decisão das instâncias competentes, que saberá respeitar e acatar e que caso seja favorável ao vosso atual entendimento - hipótese teórica meramente especulativa e na qual não se acredita - clarificará em definitivo a situação permitindo à AA atuar a partir daí em conformidade desde logo face a todas as possibilidades que tal decisão não deixará de significar nomeadamente ao colocar sob responsabilidade e ao dispor do inquilino a utilização como sua zona privativa da cobertura da área arrendada,
Sem outro assunto, com os melhores cumprimentos».
30. A A. emitiu, em 13-12-11, e enviou à R. em 23-12-11, a nota de débito nº ..., no valor de € 9.138,38;
31. Em 19-12-11, a R. respondeu à missiva de 9-12-11, declinando a responsabilidade;
32. Em 5-1-12, a R. recusou liquidar a nota de débito remetida em 23-12-11;
33. Em 3-9-12, a A. enviou à R. a seguinte carta:
«Com referência à nossa correspondência anterior sobre as infiltrações retificadas nas instalações no Polo Industrial do ..., nas quais a nossa empresa é inquilina e V. Exªs senhorias, vimos, pela presente, reiterando que continuamos a entender que são V. Exªs. os responsáveis, como Senhorio, pelas obras e respetivos custos , fazer um ponto de situação da reparação dos telhados de cobertura das zonas afetadas.
Todos os trabalhos orçamentados, e que constam da nossa carta datada de 9-12-11, foram já executados, com exceção da substituição das chapas de isolamento do BCP.
Com efeito, dado que o fabricante das chapas atualmente instaladas no telhado faliu (tratava-se da empresa BLOCO), foi descontinuada a produção das referidas chapas, e por tal motivo foi impossível obter o modelo da citada chapa, pese embora todos os esforços desenvolvidos nesse sentido.
Como V. Exªs. bem sabem, a aplicação de chapa de modelo diferente da atualmente instalada implicaria que o telhado ficaria com vários remendos, a que originaria multiplicação de pontos frágeis, focos de novas entradas de água no curto prazo;
Por outro lado, a degradação dos telhados tem vindo a agravar-se nos últimos meses, o que mais desaconselha totalmente a solução de remendar os telhados com chapa diferente da original
Assim, a adjudicação desta última fase foi já suspensa, em ordem a obter uma nova solução que resolva, da forma mais económica e eficaz possível o problema originado pela inexistência no mercado das chapas produzidas pela antiga BLOCO.
Neste contexto, iremos pedir orçamentos para as duas soluções que vislumbramos serem as mais adequadas:
Manter o telhado atual e as atuais chapas do tipo "sandwich", propondo-se a aplicação de chapa simples que forme um duplo telhado, exemplo já aplicado e testado na zona dos atuais serviços administrativos, trabalho realizado pela TCAP há alguns anos atrás ou substituição de chapas “sandwich” danificadas, por grandes zonas, para se evitar a multiplicação de pontos frágeis, o que aconteceria se fossem executados múltiplos remendos para casar chapas de formatos diferentes.
Os trabalhos já realizados nos telhados importaram em € 35.522,01+IVA, valor que já foi adiantado pela nossa empresa, sem prejuízo da V. responsabilidade final, ficando a AA à disposição de V. Exªs. para que os mesmos sejam verificados pela TCAP ou por quem esta indicar, trabalhos esses que eram independentes, da ponto de vista técnico e de obra, da substituição das chapas que agora se encontra suspensa.
Caso V. Exªs. procedam à verificação referida, poderão, simultaneamente, analisar no local da impossibilidade de "casar" chapas diferenciadas sem multiplicar prováveis pontos de entrada de água.
A TCAP poderá, na qualidade de senhoria, e caso o entenda, solicitar os orçamentos atrás citados, ou avançar com projeto ou solução diferente das duas que, em alternativa, se preconizam, para o que se aguardará 15 dias, prazo EEnte o qual também prosseguirá a obtenção dos orçamentos atrás referido; que serão oportunamente remetidos a V. Exªs.
Para além do valor referido no nº 7, recordamos que a N. Empresa é ainda credora de V. Exªs dos montantes de € 12.870,00+IVA devido pelo adquirente, relativo à fatura ...e de € 7.429,58+IVA, relativo à fatura ..., respeitantes a trabalhos de reparação e de compensação de prejuízos sofridos por força de infiltrações que, como é nosso entendimento reiterado, são de conta dos Senhorios, conforme já exaustivamente defendido em correspondência anterior.
A AA continua, como sempre esteve, disponível para colaborar coma TCAP na busca das melhores soluções para o problema das infiltrações.»
34. Em 26-9-12, a A. enviou nova carta à R.:
«Com referência à nossa correspondência anterior sobre as infiltrações verificadas nas instalações no Pólo Industrial do ..., que se reitera, nas quais a nossa empresa é inquilina e V. Exªs. senhorios, vimos, pela presente, dar continuidade ao assunto constante da N/ carta datada de 3 do corrente mês, rececionada por V. Exªs em 6 de Setembro, até à data sem resposta.
Recordamos que, face à descontinuidade da produção das telhas da empresa BLOCO, e assim da impossibilidade de substituir as que se encontram danificadas, informámos V. Exªs que iríamos solicitar orçamentos a empresas da especialidade para as duas soluções que vislumbramos serem as mais adequadas:
- Manter o telhado atual e as atuais chapas do tipo "sandwich", propondo-se a aplicação de chapa simples, que forme um duplo telhado, exemplo já aplicado e testado na zona dos atuais serviços administrativos, trabalho realizado potes TCAP há alguns anos atrás; ou
- Substituição de chapas "sandwich" danificadas, por grandes zonas; para se evitar a multiplicação de pontos frágeis, o que aconteceria selassem executados múltiplos remendos para "casar" chapas de formatos diferentes.
Consultado o mercado, foi possível obter os seguintes orçamentos para uma área aproximada de 6.500 m2 (cf. fls. 218 a 226).
Dada a urgência da obra ser executada antes do começo das chuvas, solicita-se que V. Exªs se pronunciem até ao dia 4 de Outubro próximo ou até à mesma data, aprovem e adjudiquem uma alternativa técnica e eficaz e sem impacto pintura de componentes para o mercado automóvel no caso TIER 1 e OEM’s.
Caso V. Exªs. não se pronunciem, a AA adjudicará o orçamento apresentado pela empresa IMP, que se anexa e optará pela opção “Montagem sobre o existente”.
A AA, SA., na qualidade de inquilina, continua a considerar que a BB, SA, como senhoria do locado, é a responsável pelas obras em causa, e remeterá à V. Empresa, para pagamento, as despesas e custos que decorrerem da adjudicação do citado orçamento.
A AA, S.A., mantém toda a disponibilidade para colaborar com V. Exªs na resolução do presente assunto, mantendo-se disponível para mostrar a técnicos que a V. Empresa mandate para o efeito as zonas afetadas e para discutir com os mesmos as soluções já encontradas e executadas, e as medidas que com esta fase dos trabalhos se pretendem executar”.
35. Em 19-10-12, a A. enviou à R. a seguinte missiva:
«Com referência à nossa correspondência anterior sobre as infiltrações verificadas nas instalações da Pólo Industrial do ..., que se reitera, nas quais a nossa empresa é inquilina e V. Exªs senhorios, retornamos ao assunto, tendo especialmente presente a nossa carta de 26 de Setembro de 2012, rececionada por V. Exªs, e sem resposta até à data.
Damos aqui por reproduzidos os pontos nºs 1, 2 e 3, dos quais constava a necessidade de substituição das telhas produzidas pela Bloco e entretanto descontinuadas por outras soluções técnicas. Foram remetidos a V. Exªs. os orçamentos entretanto recolhidos no mercado, para V. apreciação e aprovação, e solicitada uma resposta de V.  Exªs, até 4 de Outubro, data que se encontra totalmente ultrapassada.
Também foi referido no ponto 5 da nossa carta de 26 de Setembro que na falta de resposta da vossa parte, a AA adjudicaria o orçamento apresentado pela empresa IMP, na modalidade de "Montagem sobre o existente" que também ia em anexo à carta e que se volta agora a reencaminhar.
Serve, portanto, a presente para notificar V. Exªs de que, na ausência de resposta da vossa parte à carta de 26 de Setembro, esta empresa irá adjudicar o orçamento de reparação em anexo da empresa IMP, no montante de € 123.910,00, acrescido de IVA, atendendo à urgência que caracteriza a reparação das zonas de telhado danificadas e aos prejuízos que a falta de reparação trará para os utentes deste Polo.
A AA, SA, na qualidade de inquilina, continua a considerar que a BB, SA., como senhoria do locado, é a responsável pelas obrar em causa e remeterá à V. Empresa, para pagamento, as despesas e custos que decorrerem da adjudicação do citado orçamento.
A AA, SA, mantém toda a disponibilidade para colaborar com V. Exªs na resolução do presente assunto, continuando a manter-se disponível para mostrar as zonas afetadas, a técnicos que a vossa empresa mandate para o efeito enquanto as mesmas não estiverem reparadas e ou as reparações executadas na altura da visita e todos os aspetos técnicos respetivos.”
36. A A. formalizou em 22-11-12 o contrato de empreitada que havia mencionado na missiva transcrita no ponto anterior, nos termos que constam de fls. 231 a 240.
37. A A. debitou à R. os custos das reparações através das notas de débito com os nºs ..., ..., ... e ..., no valor total de € 43.692,06, as quais lhe remeteu em 5-11-12.
38. Por mensagem de correio eletrónico de 19-11-12, a sociedade EE dirigiu-se à A. reclamando das infiltrações nas instalações por si utilizadas.
39. Em 22-11-12, a A. remeteu à R. a seguinte missiva:
«Com referência à nossa correspondência anterior sobre as infiltrações identificadas nas instalações do Pólo Industrial do ..., que se reitera, nas quais a nossa empresa é inquilina e V. Exªs. senhorios vimos, pela presente, dar continuidade ao assunto constante de toda os correspondência que temos remetido a V. Exªs sobre o assunto, designadamente recordando as nossas últimas cartas de 19 de Outubro e de 26 de Setembro de 2012.
Foi detetada, entretanto, sempre nos telhados das instalações do Pólo, na zona na qual está localizada a FF, uma nova zona de infiltração, de área reduzida mas a carecer, como todas as outras já referenciadas e comunicadas a V. Exªs, de reparação urgente, em ordem a evitar maiores prejuízos que sempre ocorrerão caso a reparação não seja realizada.
Juntamos o orçamento que obtivemos para a reparação, junto da empresa IMP, Ldª, que remetemos em anexo, no valor de € 1.590,00, acrescido de IVA. Não foram solicitados outros orçamentos, dado que a zona de intervenção é pequena e limitada.
A AA ficará a aguardar a resposta de V. Exªs sobre esta reclamação até ao próximo dia 5 de Dezembro, incluindo a aceitação do orçamento junto ou a realização da obra mediante um outro ou sob direção direta da V. Empresa.
Na ausência de resposta à presente no prazo referido, a AA adjudicará o orçamento de reparação anexo à presente carta, atendendo à urgência da reparação que é característica dos problemas de infiltrações nos telhados e nos prejuízos que a falta de reparação trará para os utentes do Polo.
A AA, na qualidade de inquilina, continua a considerar que a BB, SA., como senhoria do locado, é a responsável pelas obras em causa e remeterá à V. empresa, para pagamento, as despesas e custos que decorrerem da adjudicação do citado orçamento.
A AA mantém toda a disponibilidade para colaborar com V. Exªs. na resolução do presente assunto, continuando a manter-se disponível para mostrar as zonas afetadas a técnicos que a vossa empresa mandate para o efeito enquanto as mesmas não estiverem reparadas e ou as reparações executadas na altura da visita e todos os aspetos técnicos respetivos.”
40. Concluídos os trabalhos, incluindo os do orçamento adicional, a A. enviou em 11-1-13 à R. as faturas nº ... (no valor de € 152.409,30) e nº ... (no valor de € 1.955,70), constantes de fls. 255 e 256.
41. A A. sofreu também diversos prejuízos decorrentes das infiltrações, tendo necessidade de efetuar a reparação do teto a reparação do rodapé, a substituição do parapeito e a substituição do tampo da mesa de wenge, no valor global de € 2.186,60+IVA (facto aditado pela Relação).

III – Decidindo:

1. Suscita a recorrente a nulidade do acórdão recorrido por obscuridade e contradição mas o que sob tal qualificação se coloca é a discordância quanto à argumentação que foi empregue para dar satisfação ao direito invocado pela A. recorrida.

Com efeito, o que questiona é a interpretação que a Relação fez do contrato que foi celebrado, no que concerne à responsabilidade pelas obras de reparação dos telhados, o que de modo algum se inscreve no âmbito do vício que invocou.

Invoca ainda a nulidade do acórdão com base na alegada falta de fundamentação, ao que se pode retorquir do mesmo modo, na medida em que o que a alegação da recorrente manifesta é a discordância quanto ao que foi decidido e ao caminho que foi percorrido para a reapreciação do mérito da ação.

Ademais, a falta de fundamentação não pode confundir-se também com uma alegada insuficiência da fundamentação que, aliás, nem sequer se comprova, na medida em que a Relação justificou de forma clara por que motivo atingiu a solução declarada.

2. A recorrente questiona também a alteração da matéria de facto que foi decidida pela Relação, argumentando que os meios de prova não permitiriam as conclusões que foram extraídas.

Ora, a Relação, em sede de apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto suscitada pela A. no precedente recurso de apelação limitou-se a fazer uso dos poderes de livre apreciação dos meios de prova que foram produzidos, nenhum deles com força vinculativa, e relativamente a factos que também não exigiam qualquer espécie de prova. Com efeito, relativamente aos pontos de facto impugnados, a Relação extraiu uma conclusão diversa da que fora obtida pela 1ª instância depois de proceder à ponderação de depoimentos testemunhais e de documentos sem força probatória plena e sujeitos à sua livre reapreciação.

Nesta medida, atento o disposto no art. 662º, nº 4, do CPC, tal segmento do acórdão recorrido não é sequer suscetível de recurso, tanto mais que não é alegada a violação de qualquer norma de direito probatório formal ou material, nos termos e para efeitos do disposto no art. 674º, nº 3, do CPC.

Improcede, por isso, este segmento do recurso de revista,

3. No campo do mérito da causa, a recorrente alega a violação do princípio da liberdade contratual (art. 405º do CC) e do disposto no art. 1111º do CC, no que concerne à aplicação da cláusula contratual que, na sua tese, determinaria para a A. a obrigação de realizar as obras de reparação dos danos nos telhados dos pavilhões arrendados.

Importa fundamentalmente apreciar se, em face do disposto no art. 1111º do CC e do que foi clausulado no contrato de arrendamento comercial (incluindo o que consta do Regulamento anexo), é possível concluir que as obras de reparação dos telhados dos pavilhões são encargo da A., como arrendatária, ou da R., como locadora.

3.1. Trata-se de um litígio que emerge de um contrato de arrendamento urbano não habitacional, divergindo as partes acerca da interpretação do clausulado contratual no que respeita a obras nos telhados dos pavilhões.

Perante a matéria de facto provada, a 1ª instância proferiu sentença concluindo que as obras efetuadas eram da responsabilidade da A., julgando improcedente a ação. No âmbito do recurso de apelação interposto pela A. e em que este impugnou alguns pontos da matéria de facto, a Relação introduziu alterações e aditamentos nos termos que ficaram consignados nos pontos 10., 25. e 41. E, embora não tenha ocorrido uma alteração substancial da matéria de facto relevante, inverteu aquele resultado e considerou que as obras realizadas eram da responsabilidade da R. que condenou no pagamento da quantia pedida.

A regra geral segundo a qual cabe ao senhorio a realização de tais obras (art. 1074º do CC) pode ceder mediante convenção das partes no sentido de constituírem encargo do arrendatário, nos termos previstos no art. 1111º do CC:

 “1. As regras relativas à responsabilidade pela realização das obras de conservação ordinária ou extraordinária, requeridas por lei ou pelo fim do contrato, são livremente estabelecidas pelas partes.

2. Se as partes nada convencionarem, cabe ao senhorio executar as obras de conservação, considerando-se o arrendatário autorizado a realizar as obras exigidas por lei ou requeridas pelo fim do contrato”.

Perante este preceito, depende essencialmente da interpretação do contrato apurar se as obras que estão em causa nesta ação (reparação dos telhados dos pavilhões arrendados à A., implicando a substituição de material em certos locais com o objetivo de evitar as infiltrações de águas pluviais) são da responsabilidade da R. ou da A.

3.2. De essencial decorre do texto do contrato o seguinte (cláus. 5ª):

A Segunda Outorgante [ora A. recorrida] poderá fazer no local arrendado as obras interiores convenientes à instalação dos seus serviços, com recurso a material de fácil desmontagem e remoção, respeitando a estrutura e segurança do imóvel, sem prejuízo de qualquer formalidade prevista na lei, bem como procederá alteração do posicionamento das chaminés sempre que for necessário para o desenvolvimento da sua atividade.

Todas as outras obras, ou seja, as incidentes sobre a estrutura do imóvel, dependem de prévia autorização escrita da Primeira Outorgante [ora R. recorrente] a prestar por escrito no prazo de 60 dias a contar da receção do pedido, e depois de realizadas pela Segunda Outorgante ficarão a pertencer ao locado, sem direito a qualquer indemnização ou retenção”.

A 1ª parte da cláus. 5ª é inócua para o caso, respeitando a obras necessárias à instalação dos serviços da A. ou dos respetivos subarrendatários (note-se que o subarrendamento dos pavilhões foi expressamente autorizado pela R.). A 2ª parte também é irrelevante, limitando-se a condicionar a realização de obras na estrutura dos pavilhões a uma autorização escrita da senhoria, sem que daí se possa inferir que obras de natureza diferente ficariam necessariamente por conta da A.

Ou seja, ainda que fosse natural que o acordo de vontades relacionado com a responsabilidade pela realização de obras nos telhados fosse integrado no texto do contrato de arrendamento, dele não resulta, de forma direta, que tenha sido transferida para a A. a referida obrigação.

Mas a cláus. 2ª, nº 4, do contrato de arrendamento prevê a aplicação remissiva do que consta do respetivo Anexo, nos seguintes termos:

Constitui parte integrante do presente contrato o “Regulamento Interno de Gestão do Polo Industrial do ...”, que as Partes se obrigam a cumprir e a fazer cumprir, pelo qual são definidas as regras de funcionamento de todo o imóvel, incluindo as áreas ocupadas pela própria Senhoria, os arruamentos internos e as áreas e espaços envolventes às áreas cobertas”.

Não há qualquer obstáculo a que a regulação dos interesses das partes seja feita por via remissiva para um outro documento assinalado no contrato. E é fundamentalmente na remissão para o “Regulamento Interno de Gestão do Polo Industrial do ...” que a R. recorrente sustenta a sua pretensão, por entender que dele resulta a assunção da responsabilidade de cada ocupante das instalações realizar as obras nas respetivas “zonas privativas”, expressão que abarcaria também a cobertura dos pavilhões arrendados.

3.3. O referido Regulamento referido no contrato é bastante extenso e dele emerge com especial interesse para o caso o seguinte:

Em “1.1. - Enquadramento Geral” consta que:

O Regulamento Interno destina-se a todos os ocupantes do Polo, quer sejam proprietários, inquilinos ou de qualquer forma ocupantes e/ou utentes de qualquer espaço do Polo, doravante todos designados genericamente por ocupantes.

Define e regulamenta o funcionamento e a utilização do Polo: os direitos e as obrigações dos mesmos ocupantes, os encargos e a sua forma de repartição, a administração das zonas comuns e rotinas de manutenção referentes à vigilância, limpeza e manutenção dos diversos equipamentos e espaços.”

Consta ainda do Regulamento o seguinte:

1.2. Delimitação de Áreas do Polo

O Polo divide-se em zonas privativas e em zonas comuns.

As zonas privativas são as áreas afetas ao uso exclusivo das empresas que nelas desenvolvem as suas atividades comerciais/industriais, doravante designadas ocupantes, nomeadamente a AA, a BB, a CC, a DD, a FF, a EE e a Thula.

As zonas comuns do Polo são todas as que não estejam atribuídas ao uso exclusivo dos ocupantes, designadamente, Portaria, Balneários, Central de águas quentes, Posto Médico, Central de rede de incêndios, Ecopontos, ETAR’s, Postos de Seccionamento e Postos de Transformação de Energia Elétrica e Gás, Ar Comprimido, furos de água e depósitos, arruamentos, jardins, parques de estacionamento e zonas de cargas e descargas, mata de eucaliptos, pinhal, depósito de combustível e estação de tratamento de água.

As plantas anexas identificam as zonas comuns (anexo I) [fls. 335] e as zonas privativas (anexo 2) [fls. 336] neste caso com a delimitação da área afeta a cada ocupante.

1.3. Uso das zonas privativas

Cada ocupante tem direito de usufruir do seu espaço privativo e dele dispor, na condição de não prejudicar os direitos dos restantes ocupantes, alterar o fim a que se destina ou prejudicar o aspeto geral do Polo.

(…)

1.5. Gestão das zonas comuns

A gestão das zonas comuns é da responsabilidade do ocupante com a maior permilagem, adiante designado por Gestora.

Todos os custos inerentes à gestão das zonas comuns são repartidos pelos ocupantes de acordo com o princípio do «utilizador/pagador» e na exata proporção da efetiva utilização …

(…)”.

Do capítulo sobre “Regras de Funcionamento e de Utilização Específicas das Zonas Comuns” consta o seguinte:

2.2. Circulação e segurança nas zonas comuns

Os acessos às coberturas das naves e edifícios são de acesso exclusivo às equipas cuja responsabilidade de atuação é da Gestora. Nenhuma outra pode aceder a tais coberturas sem autorização expressa da Gestora e nenhum objeto pode ser colocado nas coberturas dos edifícios e de quaisquer construções no Pólo sem autorização prévia e escrita da Gestora. O mesmo se aplica relativamente á colocação de quaisquer cargas na face inferior da estrutura que suporta essas coberturas”.

(…).

E do capítulo sobre “Regras de Funcionamento e utilização específicas das zonas privativas”:

3.1. Obras nas Zonas Privativas do Polo

Cada Ocupante poderá modificar, a seu cargo, a disposição interna dos seus espaços privativos, desde que sejam respeitadas as condições específicas de arrendamento ou qualquer outra forma de ocupação que legitimam a utilização do respetivo espaço.

A Gestora terá plenos poderes para autorizar ou impedir a realização ou a continuação de quaisquer obras, desde que se verifique que as mesmas violam as condições referidas no parágrafo anterior ou constituam, de qualquer forma, risco para a segurança, em geral, do Polo, ou para qualquer uma das suas componentes, quer privativa quer comum.

A gestora poderá realizar, ou autorizar a realização, de obras nas coberturas para viabilizar a colocação de quaisquer equipamentos, que sejam necessários ao desenvolvimento da sua própria atividade industrial/comercial, ou a mesma atividade de qualquer dos ocupantes.

3.2 Conservação e Manutenção Zonas Privativas

Cada Ocupante assegurará a conservação e manutenção das suas zonas privativas.

(…).

O Anexo I (fls. 335) do Regulamento corresponde a uma planta na qual se identificam as “zonas comuns” e o Anexo II (fls. 336) identifica as “zonas privativas”. Quanto às zonas privativas, cabe à A. a área correspondente a 88,4% (32.301 m2) do total de 36.527 m2.

3.4. Trata-se de um contrato de arrendamento de quatro pavilhões que estão inseridos num espaço maior (um Polo Industrial), com serviços e com áreas comuns, envolvendo espaços de circulação ou destinados a equipamentos ou serviços de uso comum.

A matéria de facto apurada nada refere quanto a eventuais negociações preliminares relevantes para a interpretação da vontade real das partes. Os factos posteriores, designadamente os que emergem das comunicações que as partes estabeleceram a respeito da responsabilidade pelas obras nos telhados, também não se mostram decisivos, refletindo a mesma divergência matricial.

De nada serve o facto de a R. anteriormente ter realizado algumas obras nos telhados, como consta ponto 10. [“desde a instalação da A. no locado (anterior à celebração do contrato referido no ponto 1.)], a R. suportou despesas relativas às reparações das coberturas e limpeza de algerozes, de que são exemplos os docs. de fls. 59 a 63”)), uma vez que tais obras ocorreram num período em que ainda nem sequer estava em vigor o contrato de arrendamento dos autos.

O facto de o contrato ter sido celebrado para durar 30 anos constitui um argumento reversível: tanto pode sustentar a tese da R. como a da A. relativamente a obras que qualquer estrutura implica num período tão dilatado.

Por isso, resta fundamentalmente o confronto com o clausulado contratual, incluindo o Regulamento em Anexo, numa análise que deve privilegiar a sua globalidade, sem necessária acentuação de um ou de outro pormenor que não se revele, por si, inteiramente decisivo.

3.5. As regras de interpretação das declarações negociais são as que decorrem do Cód. Civil, cujo art. 236º aponta para o sentido que um declaratário normal possa extrair, preceito que deve ser complementado pelo art. 238º, já que, tratando-se de um negócio formal, qualquer declaração, em regra, apenas pode valer com um sentido que tenha correspondência no texto, ainda que imperfeitamente expresso, sem embargo do disposto no nº 2 quando as razões determinantes da forma não se apliquem.

Importa ter ainda em conta a natureza onerosa do contrato. Afinal, de acordo com o art. 237º, suscitando-se dúvidas sobre o sentido das declarações negociais que não possam ser resolvidas pelas anteriores regras, a interpretação deve tender para o maior equilíbrio das prestações.

O contrato revela-nos que, sendo a R. proprietária de um prédio correspondente a um Polo Industrial, entregou de arrendamento à A., com possibilidade de subarrendar, quatro dos pavilhões nele existentes, sendo específico o facto de a gestão do referido Polo não ser feita, como seria normal, pela locadora, mas pela entidade que ocupasse a maior percentagem das zonas privativas (cargo que, por via disso, está atribuído à A., arrendatária de 88,4% das zonas privativas).

Tratando-se de um prédio que integra outros pavilhões ou áreas ocupadas por outras empresas a diversos títulos, o Regulamento gizado revela uma divisão essencial dos espaços em duas categorias fundamentais: uma correspondente às “zonas comuns” e outra às “zonas privativas” de cada ocupante.

Esta divisão precedeu, aliás, a outorga do presente contrato de arrendamento e permite concluir que aquilo que não constituir “zona comum” será “zona privativa”, nos termos que as plantas anexas ilustram. É, aliás, nesta categoria que se inscrevem os “pavilhões” arrendados à A. sem qualquer distinção relativamente à sua estrutura.

3.6. A A. pretende fazer do Regulamento para o qual o contrato remete uma leitura restritiva para justificar que as “zonas privativas” que lhe estão arrendadas e sobre as quais existiria a obrigação de efetuar as obras não abarcam os telhados dos pavilhões. Considera que todas as obras que realizou nos telhados de cobertura eram da responsabilidade da R., independentemente da sua natureza ordinária ou extraordinária, nisso fundando o seu pedido de reembolso.

Nada obstaria a que tal fosse convencionado pelas partes, embora pareça mais evidente para um declaratário normal que a singela qualificação dos quatro pavilhões arrendados como “zona privativa” e a sua identificação através da Planta anexa não permita estabelecer tão especiosa distinção de que resultaria a exclusão dos respetivos telhados. Considerando a responsabilidade que a A. assumiu pelas suas “zonas privativas”, a solução oposta é a que no texto contratual encontra melhor sustentação, tanto mais que o conceito de “pavilhões”, como edifícios implantados num terreno e delimitados quer por paredes, não pode deixar de abarcar as respetivas coberturas, pois é este conjunto que cria um espaço no qual a A. e os respetivos subarrendatários podem exercer as suas atividades que, atenta a sua natureza, não poderiam ser exercidas em espaços a céu aberto.

A integração dos telhados dos pavilhões na” zona privativa” de cada ocupante acaba por resultar do ponto 3.1. do Regulamento que, reportando-se explicitamente a “obras nas zonas privativas do Polo”, prescreve que “a Gestora (função que, em face da área arrendada, pertence agora à A.) poderá realizar ou autorizar a realização de obras nas coberturas para viabilizar a colocação de quaisquer equipamentos que sejam necessários ao desenvolvimento da sua própria atividade industrial/comercial ou a mesma atividade de qualquer dos ocupantes”.

O facto de, relativamente às obras nos telhados dos pavilhões arrendados, se prever na cláus. 5ª do contrato a autorização prévia da R.. proprietária do prédio (“todas as outras obras, ou seja, as incidentes sobre a estrutura do imóvel, dependem de, de  “prévia autorização escrita da Primeira Outorgante [a ora R.], a prestar por escrito no prazo de 60 dias a contar da receção do pedido, e depois de realizadas pela Segunda Outorgante (a ora A.) ficarão a pertencer ao locado, sem direito a qualquer indemnização ou retenção”) não contradiz aquela conclusão, tendo em conta a natureza estrutural dessas coberturas que tornam naturalmente compreensível que as alterações que nelas sejam introduzidas sejam acompanhadas pela mesma.

3.7. Na presente ação, trata-se de apurar se houve ou não convenção acerca da atribuição à arrendatária das obras de conservação ordinária e extraordinária, nos termos e para efeitos do art. 1111º do CC.

A este respeito, não é admissível que se estabeleça uma subdistinção artificial (ou artificiosa) como aquela que a A. pretende, tratando de forma isolada as chamadas obras de reparação dos telhados (que alegadamente seriam da conta da R.) e outras obras de manutenção ou de conservação (que caberiam à A.).

Tal distinção não é sequer acolhida pelo art. 2º, al. f), do DL nº 555/99, de 16-12, para onde remete o art. 2º do DL nº 157/06, de 8-8 (regime jurídico das obras em prédios arrendados).

Aliás, a este respeito, não passa despercebida uma certa flutuação do sentido que a própria A. veio atribuindo ao clausulado contratual a respeito das suas obrigações perante obras em “zonas privativas”.

Com efeito, na petição inicial, a A. começou por alegar que a sua “zona privativa” era limitada aos “espaços cobertos, excluindo as coberturas, de modo que no ponto 3.2. do Regulamento seria de aplicar exclusivamente ao espaço interior privativo, não sendo aplicável ao telhado” (arts. 76º a 78º da petição). Não tendo alegadamente qualquer obrigação relativamente à realização de obras nos telhados, concluiu, então, que sua responsabilidade estava limitada ao “espaço interior privativo” (art. 78º).

Depois de ter sido confrontada com a sentença que divergiu daquele entendimento, a A., no precedente recurso de apelação, acabou por aceitar a obrigação de efetuar as “obras de conservação e de manutenção” dos telhados, embora excluindo aquelas que considerou de “reparação” (fls. 477 e 478 e conclusões QQ) e RR)). Referiu, para tanto, que “quando o julgador a quo concluiu e bem … que «é a ela (A.) que compete conservar e manter as estruturas, desde que contidas na sua zona privativa», deixou de fora» reparar, pois essa tarefa cabe à R. e é exatamente o que está em causa e dela vem reclamando” (ponto 41., a fls. 477). Para justificar a revogação da sentença, aduziu ainda que “no Regulamento Interno as partes clarificaram que a A. «conservava» e «mantinha» a estrutura contida na sua zona privativa, mas se nessas estruturas houvesse a necessidade de proceder a «reparações», como foi o caso, então, e na falta de indicação em contrário, o senhorio (a R.) tinha – tem – de as assumir” (ponto 42.). E acrescentou que, “in casu, já vimos que, para as partes, o regime de «manutenção» das partes privativas ficou definido, nada tendo dito relativamente ao regime das de «reparação», aplicando-se, assim, o regime do nº 2 do art. 1111º do CC” (ponto 44.).

Ou seja, a própria A. admitiu em peça processual anterior um sentido que agora nega.

3.7. Enfim, referindo-se no Regulamento (que integra o contrato de arrendamento) que “cada ocupante assegurará a conservação e manutenção das suas zonas privativas”, sem distinção alguma a partir da natureza ordinária ou extraordinária das obras, e identificando-se no Anexo como “zonas privativas” da A. os 4 pavilhões, em face do teor do contrato não encontra justificação, a exclusão absoluta de quaisquer obras nos telhados dos pavilhões (que a A. agora defende, depois de no recurso de apelação ter defendido coisa diversa).

As obras de reparação de telhados de pavilhões industriais que foram efetuadas pela A. e que esta imputa à R. foram obras de conservação, variando apenas a sua qualificação como ordinária ou extraordinária em função da sua natureza ou da sua dimensão, não sendo defensável uma distinção entre obras de conservação e de manutenção e obras de reparação, já que todas elas são obras de “obras de conservação” ordinária ou extraordinária.

Acresce ainda que, em situações de dúvida e sem embargo das especiais exigências no que concerne aos negócios formais, as declarações negociais devem valer com o sentido que, nos negócios onerosos, importe um maior equilíbrio contratual (arts. 237º e 238º do CC), desiderato que não parece prejudicado por uma interpretação, no sentido defendido pela R., de se considerar isenta de qualquer responsabilidade a respeito das obras de reparação dos telhados dos pavilhões privativos da A., como resulta dos termos do contrato globalmente apreciado.

IV – Pelo exposto, acorda-se em julgar procedente a revista, revogando-se o acórdão recorrido e absolvendo a R. do pedido.

Custas da revista e nas instâncias a cargo da A.

Notifique.

Lisboa, 7-3-19

Abrantes Geraldes

Tomé Gomes

Maria da Graça Trigo