Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
18321/21.7T8PRT.P1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: NELSON BORGES CARNEIRO
Descritores: RECURSO DE APELAÇÃO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
ÓNUS DE CONCLUIR
OBJETO DO RECURSO
TRANSCRIÇÃO
MEIOS DE PROVA
ESPECIFICAÇÃO
REAPRECIAÇÃO DA PROVA
CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO
REJEIÇÃO DE RECURSO
Data do Acordão: 02/06/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :

I – O recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorretamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa relativamente a esses factos e, enuncie a decisão alternativa que propõe.

II – A exigência da especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem impugnar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio tem por função delimitar o objeto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto.

III – A especificação dos concretos meios probatórios convocados e a indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova, sem prejuízo do seu poder inquisitório sobre toda a prova produzida que se afigure relevante para tal reapreciação, como decorre do preceituado no artigo 662.º/1 do CPCivil.

IV – O recorrente terá de tomar posição especifica sobre os motivos da discordância, indicando e explicitando de forma pormenorizada, individualizada e minuciosa os concretos pontos de facto que se pretendem impugnar, os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa e a decisão que entenda ser a correta, não sendo para o efeito suficiente uma genérica ou exemplificativa afirmação dessa discordância.

V – A lei comina a inobservância destes requisitos de impugnação com a sanção da rejeição imediata do recurso, sem possibilidade de suprimento, na parte afetada, nos termos do artigo 640.º/1, do CPCivil.

Decisão Texto Integral:
RECURSO DE REVISTA1,2,3,4,518321/21.7T8PRT.P1.S1


RECORRENTE6AA


RECORRIDO7BB


***


SUMÁRIO8,9


I – O recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorretamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa relativamente a esses factos e, enuncie a decisão alternativa que propõe.

II – A exigência da especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem impugnar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio tem por função delimitar o objeto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto.

III – A especificação dos concretos meios probatórios convocados e a indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova, sem prejuízo do seu poder inquisitório sobre toda a prova produzida que se afigure relevante para tal reapreciação, como decorre do preceituado no artigo 662.º/1 do CPCivil.

IV – O recorrente terá de tomar posição especifica sobre os motivos da discordância, indicando e explicitando de forma pormenorizada, individualizada e minuciosa os concretos pontos de facto que se pretendem impugnar, os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa e a decisão que entenda ser a correta, não sendo para o efeito suficiente uma genérica ou exemplificativa afirmação dessa discordância.

V – A lei comina a inobservância destes requisitos de impugnação com a sanção da rejeição imediata do recurso, sem possibilidade de suprimento, na parte afetada, nos termos do artigo 640.º/1, do CPCivil.



***

ACÓRDÃO10



Acordam os juízes da 1ª secção (cível) do Supremo Tribunal de Justiça:

1. RELATÓRIO

AA, intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra BB pedindo a condenação desta a pagar-lhe:

a) A quantia de 10 811,72€, a título de danos patrimoniais, bem como o montante que se vier a apurar dos bens cujos valores não foi possível determinar

b) A quantia de 30 000,00€, a título de danos não patrimoniais.

c) O valor que vier a ser calculado em decisão ulterior a título de danos futuros.

Foi proferida sentença em 1ª instância que absolveu a ré dos pedidos contra a mesma formulados pelo autor.

Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação do Porto proferido acórdão que, negando provimento ao recurso, confirmou a decisão recorrida.

Inconformado, veio o autor interpor recurso de revista deste acórdão, tendo extraído das alegações11,12 que apresentou as seguintes


CONCLUSÕES13:


A) O presente recurso de Revista que se interpõe do Acórdão da Relação proferido no

âmbito dos presentes autos tem por objeto a revogação da decisão proferida pelo Tribunal a quo de rejeição do recurso interposto pelo aí apelante, consubstanciado no invocado incumprimento dos ónus previstos no artigo 640º do CPC, resultando na não apreciação da prova e consequente mérito do mesmo, devendo tal decisão, por ilegal e em clara contradição com o estatuído no artigo 640º do CPC, ser revogada e substituída por outra que considere o substrato recursório e - consequentemente, leve à apreciação da prova e do mérito do recurso aí interposto.

B) Bem como a decisão de julgar improcedente o recurso do Autor, confirmando a sentença do Tribunal de 1ª Instância, que absolveu, simplesmente, a Ré.

C) Entendeu o Tribunal a quo – além do mais, não apreciar o recurso do Autor, consubstanciado – essencialmente, no incumprimento dos ónus previstos no artigo 640º do CPC.

D) Com a decisão de rejeição do recurso de apelação aqui sujeita a escrutínio, o Autor, ora Recorrente, viu-se impedido de ver sindicada a decisão de facto que culminou no julgamento da improcedência da quase totalidade do seu pedido.

E) O artigo 2.° do CPC ao dispor que: "A proteção jurídica através dos tribunais implica o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, a pretensão regularmente deduzida em juízo, bem como a possibilidade de a fazer executar" pretende que os tribunais optem e se esforcem para que profiram decisões de mérito suficientemente fundamentadas que justifiquem ao comum dos mortais o motivo pelo qual lhe foi deferido ou não determinado pedido que formulou em sede de petição inicial.

F) O artigo 202° da CRP determina que os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo. Sendo certo que na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados, devendo optar para o efeito e sempre que tal lhes seja viável pela prolação de decisões que avaliem do mérito dos litígios levados a tribunal por parte dos cidadãos.

G) É efetivamente contrária à referida disposição da CRP a interpretação do artigo 640.° do CPC no sentido de rejeitar o recurso, abstendo-se de conhecer da matéria de facto e consequentemente do mérito da decisão, por violação dos requisitos formais aí explanados, sempre que ainda assim e independentemente dessa violação, seja possível a apreciação do mérito da questão com base na sua inteligibilidade e alcançabilidade, ainda que tal corresponda a um esforço acrescido por parte desse Tribunal, designadamente no que respeita à audição das gravações dos depoimentos.

H) Em prol da dita “verdade material”, o Tribunal da Relação deve proceder às audição da íntegra dos depoimentos invocados pelas partes nos respetivos recursos, sob pena de poder ser levado a extrair conclusões fora do contexto de testemunho realizado e precipitar-se em decisões ilegais e injustas!

I) Mas mesmo que se entenda que os Tribunais não têm a obrigação de aproximar os cidadãos à justiça (processual) esforçando-se por proferir decisões de mérito, verdade é que os incumprimentos (processuais) invocados pelo Tribunal a quo, para justificar a recusa em proferir uma decisão de mérito sobre o peticionado, estão longe de se verificarem no caso em concreto ou de se mostrarem de tal forma gravosos que impedissem aquele Tribunal de julgar a matéria de facto sujeita a recurso.

J) Não se verifica a alegada violação do ónus de especificação dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, sendo que o Apelante especifica de forma bastante explícita, - utilizando inclusivamente negrito na formatação do texto, quais as questões a submeter à reapreciação dos Venerandos Desembargadores, identificando as seguintes:

1. Como motivação e quanto à matéria considerada provada, o Tribunal “a quo” sustenta - na essencialidade, como base para a decisão tomada, que a factualidade provada se deve a factos confessados e ou admitidos nos articulados, sustentando ainda que tal foi confirmado nas declarações de parte da Ré e do Autor.

2. Já quanto à matéria considerada “não provada”, o Tribunal “a quo” considerou que o Autor não realizou qualquer prova.

Ora,

3. No caso dos autos, o Autor, ora Recorrente, além de fundamentar exaustivamente o peticionado, sustentou todo o pedido em base documental que juntou minuciosamente aos autos.

4. O Tribunal “a quo”, embora reconhecendo tal facto, resolveu absolver a Ré, ora Recorrida, do pedido.

5. Considerando como essencial do probatório as “declarações/depoimentos das partes”.

“…

1. 2.3- Motivação

O tribunal teve em consideração toda a prova produzida, mormente os documentos juntos aos autos; bem como o depoimento da testemunha ouvida e declarações de parte, tudo em conjugação com as regras da experiência comum.”

2. Considerando o Tribunal “a quo” que: …“É pacífico que as declarações de parte, porque submetidas ao princípio da liberdade de julgamento, podem e devem ser atendidas como meio de prova. Resta saber se as declarações de parte podem comprovar a realidade dos factos alegados nos articulados no caso de serem o único meio de prova disponível. Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, dizem: «Ora, não existe qualquer fundamento epistemológico para não se reconhecer nas declarações favoráveis ao depoente um meio válido de formação da vontade esclarecida e racional, isto é, uma fonte válida de convencimento racional do juiz. Questão diferente é a da suficiência das declarações favoráveis ao depoente para a formação dessa convicção. A experiência sugere que a fiabilidade das declarações em benefício próprio é reduzida. Por essa razão, compreende-se que se recuse ao depoimento não confessório força, para desacompanhado de qualquer outra prova, permitir a demonstração do facto favorável ao depoente (…) (in Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, volume I, 2014, 2.ª edição, Almedina, pág. 395). Trata-se de um depoimento prestado a pedido e por um sujeito estruturalmente interessado diretamente no desfecho do processo. Como realça Elizabeth Fernandez, mesmo que as partes não sejam desonestas, estudos psicológicos demonstram que as pessoas têm uma maior tendência a recordar factos favoráveis do que factos desfavoráveis, pelo que o depoimento delas como testemunhas nos processos em que são partes não é, sob o ponto de vista psicológico, e por via de regra, fidedigno (in Nemo Debet Esse Testis en Propria Causa? Sobre a (in) Coerência do Sistema Processual a Este propósito, in Julgar Especial, 2014, pág. 27). Inexiste qualquer motivo especial o tribunal atribuir especial credibilidade às declarações de parte, pelas razões já supra explanadas acerca da natureza deste tipo de declarações.” (sic – sublinhado nosso).

3. Como pode pois o Tribunal “a quo” sustentar grande parte da sua decisão nas declarações de parte…

4. Quando considera tal base de fundamentação carecida (…inexiste qualquer motivo…) de “especial credibilidade”…

5. Considerar como prova concretizada para a sentença quase exclusivamente a via das declarações de parte do Autor e da Ré, o Tribunal “a quo” – com o devido respeito, mal andou.

6. A decisão do Tribunal “a quo” cedeu quase integralmente por via da prova dos factos pelas declarações de parte do Autor e da Ré.

L) Em consequência a decisão de rejeição do recurso na parte em que se recusa a apreciar a factualidade posta em causa consubstanciada em tal violação, deverá ser revogada e ser o recurso aceite e submetido a julgamento quanto à matéria de facto e sobre o mérito da causa, por falta de verificação dos pressupostos processuais que justificaram tal decisão de rejeição do recurso.

M) Revogação essa que deverá ser consubstanciada na violação do disposto no artigo 640.°, n.º 1, al. a) do CPC por parte do Tribunal a quo ao determinar que o ora Recorrente não cumpriu o ónus de especificação dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados.

N) Não se verifica a alegada violação do ónus de especificação da decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, sendo clarividentes as especificações das decisões que no seu entender deveriam ser proferidas pelo Tribunal a quo, identificando-as no texto do recurso, bem como nas suas conclusões.

O) Pelo que, também aqui não se alcança que o ora Recorrente tenha incorrido no vício supra invocado, pelo que deverá a decisão de rejeitar o recurso com base no invocado incumprimento do ónus de especificação da decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, ser revogada com base na violação do disposto no artigo 640.° do CPC e substituída por outra que admita o recurso de Apelação e leve à apreciação da matéria de facto e, consequentemente, do mérito da causa.

P) Nos pontos de facto que considera incorretamente julgados, verdade é que o ora Recorrente indicou com precisão os argumentos que fundam o seu recurso e alegações de recurso, identificando objetivamente o que considera que o Tribunal a quo ignorou e ou subestimou a prova apresentada pelo Autor, sustentando a decisão de absolvição da Ré, nas suas próprias “declarações de parte”…

Q) Quando – por outro lado, coloca fundadas dúvidas na valorização das ditas “declarações de parte da Ré”…

R) Com efeito, o ora Recorrente identificou todos os pontos que considera pertinentes para uma decisão JUSTA, tendo o Tribunal a quo todas as condições de se pronunciar sobre a matéria de facto em causa e sujeita a recurso.

S) Consequentemente, ao ter decidido como decidiu - com a rejeição do recurso pelo simples facto de o Recorrente não ter - …”apelante não fez mais do que referir genericamente a prova documental que refere ter junto aos autos, deixando por identificar qualquer documento e qualquer facto a cuja prova o destinasse; e, bem assim, tratou de criticar o juízo probatório do tribunal recorrido sobre as declarações de parte da ré.”

T) O Tribunal a quo violou o disposto no artigo 640.° do CPC, por adotar uma interpretação não consentânea com a letra e o espírito da norma, devendo ser tal decisão revogada e substituída por outra que determine a aceitação do recurso e que leve à decisão sobre a matéria de facto posta em causa e consequentemente sobre o mérito da causa.

U) Atento o supra exposto, consubstanciado no facto de o Tribunal a quo não ter conhecido a matéria de facto posta em causa, toda a decisão proferida no âmbito do mérito dos recursos estará inevitavelmente inquinada, em especial no que respeita mesmo à questão das "declarações de parte da Ré” – fundamento para a decisão de mérito da causa.

V) “Declarações de parte” que o próprio Tribunal de 1ª Instância questiona, pondo em dúvida um dos suportes que relevou para a absolvição da Ré.

X) Consequentemente, ao ter decidido como decidiu, o Tribunal a quo violou as normas ínsitas na sua própria decisão, nomeadamente, o disposto no artigo 342º do C. Civil e nos artigos 466º e 640º do C. Processo Civil, devendo tal decisão ser revogada e substituída por outra que condene a Ré/Recorrida no pedido formulado em concreto nos autos.

O recorrido contra-alegou, pugnando pela improcedência da revista e a manutenção do acórdão recorrido.

Colhidos os vistos14, cumpre decidir.

OBJETO DO RECURSO15,16

Emerge das conclusões de recurso apresentadas por AA, ora recorrente, que o seu objeto está circunscrito à seguinte questão:

1.) Saber se o tribunal a quo deveria ter reapreciado a matéria de facto impugnada por se mostrarem cumpridos os ónus estatuídos no art. 640º/1/ a/b/c, do CPCivil.

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. FACTOS PROVADOS NA 1ª E 2ª INSTÂNCIA

A) - A ré é arrendatária de dois imóveis na cidade do ..., um sito na Rua ... , e outro na Rua ... (artigo 15.º da contestação – confessado).

B) - Com autorização/consentimento do senhorio, a ré presta “(…) serviços de alojamento temporário, nomeadamente a turistas, mediante remuneração (…)” (artigo 16.º da contestação – confessado).

C) - A ré explora um estabelecimento de alojamento local, na modalidade de quartos (artigo 17.º da contestação – confessado).

D) - Para o efeito, a ré publica no sítio da internet “custo justo” os anúncios com os quartos que tem disponíveis, de forma a fazer promoção do alojamento (artigo 20.º da contestação – confessado).

E) - Em janeiro de 2019 a ré publicou um anúncio relativamente a um quarto que tinha vago no imóvel sito na Rua ..., tendo recebido do autor, no dia 07 de janeiro de 2019, uma chamada telefónica quanto ao referido anúncio publicado por aquela (artigo 21.º da contestação – confessado).

F) - O autor deslocou-se ao imóvel para ver as condições do mesmo, tendo manifestado o seu interesse em ficar no quarto, em consequência do qual pagou a remuneração do mês de janeiro, no montante de €250,00 (duzentos e cinquenta euros), e a ré passou a fatura-recibo e entregou-lhe as chaves do prédio, do apartamento e do quarto (artigo 22.º da contestação – confessado).

G) - O autor residiu neste quarto (Rua ..., ...) desde janeiro de 2019 até abril de 2019, tendo a ré passado os recibos referentes aos seguintes períodos de tempo: 07/01/2019 a 07/02/2019; 07/02/2019 a 07/03/2019; 07/03/2019 a 07/04/2019 (artigo 24.º da contestação - confessado).

H) - No dia 07 de abril de 2019, o autor comunicou à ré que iria deixar o quarto, tendo entregue as chaves e levando todos os seus pertences, deixando o quarto livre (artigo 26.º da contestação – confessado).

I) - No dia 28 de junho de 2019, o autor voltou a contactar com a ré questionando se esta tinha um quarto livre para ele (artigo 27.º da contestação – confessado).

J) - Passando a ocupar um outro quarto na (Rua ..., ...), sendo que, em 02 de setembro de 2019, o autor pediu à ré para mudar de quarto para o alojamento da Rua ..., ..., onde também reside a Ré, pelo valor de €300,00 (trezentos euros) mensais (artigo 28.º da contestação – confessado e 1.º da petição inicial).

L) - O autor encontrava-se alojado no imóvel da ré, pagando a respetiva remuneração mensal, mediante a emissão da respetiva fatura-recibo (artigo 18.º da contestação).

M) - O autor efetuou as mudanças para aquele local (artigo 2.º da petição inicial).

N) - Este quarto tem uma área de aproximadamente 12 m 2 e estava mobilado com uma cama de casal, um guarda-fatos, uma cómoda, duas mesinhas de cabeceira, duas cadeiras (artigo 29.º da contestação – confessado).

O) - O autor ficou a residir até outubro de 2019, tendo a ré emitido os recibos referentes aos seguintes períodos temporais: 28/06/2019 a 28/07/2019; 28/07/2019 a 28/08/2019; 28/08/2019 a 28/09/2019; 28/09/2019 a 28/10/2019 (artigo 30.º e doc. 4 da contestação).

P) - Em meados de outubro de 2019, a ré apercebeu-se que o autor não saía do quarto em momento algum, nunca mais o tendo visto no apartamento; então a ré resolveu bater na porta do quarto, mas ninguém respondeu (artigo 32.º da contestação).

Q) - O autor abandonou o imóvel em meados do mês de outubro de 2019 (artigo 33.º da contestação).

R) - Em outubro de 2019 a ré decidiu abrir a porta do quarto, no qual apenas encontrou os seguintes bens: édredon branco todo rasgado, poucas peças de roupa, caixa com frascos de perfume vazios, dois pratos, uma chávena, alguns shampoos, pasta de dentes, escova, toalha de banho encharcada (artigo 35.º e 95.º da contestação).

S) - A ré pegou nestes bens, colocou-os em dois sacos plásticos e guardou-os na despensa, caso o autor aparecesse e os quisesse levar consigo (artigo 36.º da contestação).

T) - O tempo foi passando e volvido um ano desde que o autor saiu do quarto sem avisar a ré, os bens continuavam guardados na despensa; no entanto, como a toalha estava toda encharcada, começou a deitar um cheiro (artigo 38.º da contestação); pelo que, a ré viu-se obrigada a deitar os sacos com os bens ao lixo (artigo 39.º da contestação).

U) - No dia 26 de fevereiro de 2020 a ré enviou uma mensagem escrita ao autor informando que iria “tirar tudo do quarto (…) para o lixo” - doc. 41 da petição inicial (artigo 10.º da petição inicial - admitido).

V) - O autor contactou o Dr. CC para entrar em contacto com a ré tendo em vista a retirada dos bens pertences àquele, mas sem sucesso (doc. 42 e artigo 12.º da petição inicial).

X) - O autor visitou o imóvel em fevereiro do corrente ano (2021), acompanhado por agentes da PSP e mais duas senhoras (artigo 77.º da contestação; confessado; doc. 46 e artigo 23.º da petição inicial).

Z) - No local, foi constatado que o quarto arrendado pelo autor à ré estava ocupado por um terceiro (artigo 24.º da petição inicial – parcialmente admitido).

A)’ - Ainda no local, o autor conseguiu entrar em contacto com a ré que o informou que os seus bens tinham sido deitados ao lixo (artigo 26.º da petição inicial).

2.2. FACTOS NÃO PROVADOS NA 1ª E 2ª INSTÂNCIA

1.º - No dia 28 de agosto de 2019, autor e ré celebraram (…) (artigo 1.º da petição inicial).

2.º - Sendo certo que no mesmo dia (artigo 2.º da petição inicial).

3.º - No decurso do contrato de arrendamento o autor adquiriu bens que detinha dentro do arrendado (artigo 3.º da petição inicial).

4.º - No dia 17 de fevereiro de 2020; pois deslocou-se ao Brasil a trabalho (artigo 4.º e doc. 1 da petição inicial).

5.º - Tendo pago à ré as rendas até ao mês de março, uma vez que era suposto o autor regressar a Portugal no dia 20/03/2020, bem como era de conhecimento daquela (artigo 5.º da petição inicial).

6.º - Motivo pelo qual, todos os seus bens permaneceram dentro do imóvel, nomeadamente: a) peúgas no valor total de €17,70 (doc. 2); b) Veste Ext em T, no valor total de €99,95 (doc. 3); c) calças no valor total de €29,95 (doc. 4); d) camisa no valor de 19,95 (doc. 5); e) Veste Ext em T no valor de €39,95 (doc. 6); f) acessórios no valor de €19,95 (doc. 7); g)Veste Ext em T e camisola no valor total de €64,90 (doc. 8); h) camisa, polo e cinto no valor de €69,85 (doc. 9); i) desportivo no valor de €29,95 (doc. 10); j) polo e camisa no valor total de €54,90 (doc. 11); k) gabardina no valor de 89,95 (doc. 12); l) camisa no valor de €9,99 (doc. 13); m) duas camisas no valor total de €39,98 (doc. 14); n) mocassim no valor de €39.99 (doc. 15); o) t-shirt no valor de €9.99 (doc. n.º 16); p) camisa no valor de €5,99 (doc. 17); q) toalha no valor de €9.99 (doc. n.º 18); r) chinox no valor de €59.00 (doc. 19); s) morris no valor de €57.00 (doc. 20); t) track no valor de €49.50 (doc. 21); u) regent MP, M12_152 e deacon no valor total de €143,00 (doc. 22); v) três cachecóis no valor total de €11,97(doc. 23); w) duas camisas no valor de 25,98 (doc. 24); x) camisola e bermuda no valor total de €32,90 (doc. 25); y) camisa no valor de €25,95 (doc. 26); z) duas malhas no valor de €49,90 (doc. 27); aa) sobretudo e boxers no valor total de €113,99 (doc. 28); bb) calça de sarja, no valor de €39,99 (doc. 29); cc) talheres no valor total de €15,92 (doc. 30); dd) copos no valor de €7,96 (doc. 31); ee) candeeiro no valor de €39.99 (doc. 32: ff) copos e duas toalhas no valor total de 22,98 (doc. 33); gg) toalha no valor de €5,99 (doc. 34); hh) talheres, castiçal e acessórios no valor total de €17,94 (doc. nº 35); ii) chinelos de quarto e copos no valor total de €13,97 (doc. 36); jj) Smart TV LG, no valor de €279,99 (doc. 37); kk) Soundbar LG SJ3, no valor de €139,99 (doc. 38); ll) Máquina de café Krops, no valor de €39,99 (doc. 39); mm) Aparad. de nariz Phil. NT e Power Bank TP-Link, no valor de €25,98 (doc. 40); nn) Micro-ondas LG, no valor de €199,00; oo) Máquina de fritar da marca Kupse, no valor de €29,90; pp) Chaleira da marca Worten, no valor de €19,90; qq) Casaco com capucho branco Massimo Dutti, no valor de €95,00; rr) Casaco com capucho azul-marinho Massimo Dutti, no valor de €95,00; ss) Casaco azul-marinho com botões e fecho com o rebordo em couro castanho Massimo Dutti, no valor de €110,00; tt) Casaco azul com botões Massimo Dutti, no valor de €110,00; uu) Gabardine azul-marinha Zara, no valor de €85,00; vv) Gabardine azul cor claro Under Blue, no valor de €100,00; ww) cinco Camisas cor branco modelo Sport Massimo Dutti, no valor de €190,00; xx) cinco Camisas cor branco modelo slim Zarra, no valor de €150,00; yy) Três Camisas cor branco modelo classic Saccoor, no valor de €125,00; zz) quatro Camisas cor azul-marinho lion of porch, no valor de €240,00; aaa) três Camisas cor azul-marinho Zarra, no valor de €90,00; bbb) três Camisas cor Preto Primark, no valor de €60,00; ccc) uma Camisola em V cor azul-marinho just slim Massimo Dutti novo, no valor de €45,00; ddd) Uma Camisola em V cor azul-marinho Sacoor, no valor de €65,00; eee) duas Camisola com 3 botões cor azul-marinho Massimo, no valor de €80,00; ff) duas Camisola com gola redonda azul-marinho com letras transparente Lion of Porche, no valor de €95,00; ggg) uma Camisola com 3 botões cor Azul,branco,vermelho River Hoods, no valor de €45,00; hhh) um Casaco Camisola com botões cor Azul-branco Pepe Jeans, no valor de €95,00; iii) duas Camisola azul com letras vermelha e cinza Sacoor, no valor de €90,00 (noventa euros); jjj) duas T-shirt manga comprido cor branco letras azul claro PepeJeans; kkk) quatro T-shirt cor azul-marinho Massimo Dutti; lll) quatro T-shirt cor branco Zara; mmm) quatro T-shirt cor branco Primark; nnn) Três T-shirt cor preto Primark; ooo) três Calças gangas cor azul modelo slim Pepejeans, no valor de €85,00; ppp) quatro Calças cor cinzento modelo slim e veludo vários modelos Massimo Dutti, no valor de €200,00; qqq) três Calças cor azul-marinho vários modelos Massimo Dutti; rrr) duas Calças cor azul-marinho riscam quadrado branco Massimo Dutti; sss) duas Calças azul-marinho com risca branco Under Bleu, no valor de €90,00; ttt) duas Calças azul-marinho modelo algodão Massimo Dutti, no valor de €95,00; uuu) quatro Par de pijama Inverno Massimo Dutti, no valor de €180,00; vvv) Quatro Cintos pele azul marinho; www) um Cinto Branco Massimo Dutti, no valor de €20,00 (vinte euros); xxx) um Cinto verde amarelo Massimo Dutti, no valor de €20,00; yyy) um Cinto azul vermelho Massimo Dutti, no valor de €20,00; zzz) um par de luvas preto couro Massimo Dutti, no valor de €15,00; aaaa) um par azul couro Zara, no valor de €15,00; bbbb) um par azul Algodão, no valor de €12,00; cccc) dois Conjuntos de lençóis em Flanela cor branco azula com vários desenhos, no valor de €120,00; dddd) um Édredon grosso cor branco cor riscas de cor Prateada, no valor de €120,00; eeee) um Cobertor cor branco Zara, no valor de €80,00; ffff) um Cobertor cor cinzento claro, no valor de €80,00 (oitenta euros); gggg) duas Almofada cor branca Zarra, no valor de €40,00; hhhh) duas Almofada cor branca com penas, no valor de €45,00; iiii) um Tapete pequeno casa de banho cor Branco, no valor de €25,00; s) um Tapete pequeno casa de banho cor-de-rosa, no valor de €20,00; jjjj) um Tapete grande de quarta cor branco, no valor de €50,00; kkkk) um Tapete grande de quarta cor castanho, no valor de €50,00; llll) uma toalha de banho azul-marinho, no valor de €45,00; mmmm) uma toalha de rosto azul marinho, no valor de €25,00; nnnn) umas Botas cor castanha amarelo Pepejeans, no valor de €110,00; oooo) umas Botas cor castanho-escura, no valor de €67,00; pppp) dois pares Sapatilhas botam cor azul-marinho novas Massimo Dutti, no valor de €180,00; qqqq) umas Sapatilhas em tecido cor branco Azul Pepejeans, no valor de €45,00; rrrr) dois Mocassim cor preto modelo inverno Massimo Dutti, no valor de €110,00; ssss) um Sapatilhas cor branco Adidas, no valor de €38,00; tttt) um Sapatilhas cor branco Massimo Dutti, no valor de €45,00; uuuu) um par Sapatilhas cor azul branco Pepejeans, no valor de €45,00; vvvv) três Shampoo Nivea, três Shampoo dove, três Sabão líquido corporal dove, dois Sabão líquido corporal brut, dois Sabão líquido corporal demin, vinte Desodorante várias marcas em spray, tudo no valor de €30,00; wwww) dez Desodorantes em líquido; quatro Espumas de barbear gillet; duas Espumas de barbear Nivea, quatro Pastas de dentes Colgate, três after-shave demim, dois after-shave nivea, uma Caixa algodão, uma Caixa algodão limpar ouvidos, uma Caixa em plástico contendo medicamentos, dois cabo fusion 5 com laminas, tudo no valor de €40,00; xxxx) uma barra de som LG, no valor de €139.79; yyyy) uma torradeira, no valor de €15,00 (quinze euros); zzzz) uma sanduicheira , no valor de €14,00; aaaaa) uma fritadeira elétrica, no valor de €19,00; bbbbb) quatro Pratos amarelos da marca Zara Home, no valor de €16,00; ccccc) dois Pratos de sopa amarelam da marca Zara Home, no valor de €8,00; ddddd) um Prato vidro grande para bolo da marca Zara Home, no valor de €25,00; eeeee) uma Saladeira azul da marca Zara Home, no valor de €20,00; fffff) dois Garfos com madeira da marca Zara Home, no valor de €8,00; ggggg) duas facas com madeira da marca Zara Home, no valor de €8,00; hhhhh) duas Colheres café com madeira da marca Zara Home, no valor de €8,00 (oito euros); iiiii) duas Colheira de sobremesas com madeira da marca Zara Home, no valor de €8,00 (oito euros); jjjjj) uma Caixa em ferro com tampo em madeira com faca para guardar pão e cortar pão 12 da marca Zara Home, no valor de €12,00; kkkkk) uma Caixa ferro para por cápsula de café da marca Zara Home, no valor de €10,00; lllll) bens alimentares, designadamente, um Saco de arroz, uma Garrafa de azeite, um Saco de açúcar, uma Caixa de esparguete, uma Garrafa de óleo, duas Garrafas de vinho Alvarinho, uma Garrafa Vinho Porto D.ANTONIA, duas Caixa de bolacha, 30 (trinta) Capsulas de café, tudo valor de €49,00; mmmmm) dois Chariot, da marca Zara Home, no valor de €70,00; nnnnn) cem Cruzetas cor branco da marca Zara home, no valor de €95,00; ooooo) Caixa madeira com corda amarela de decoração cor branco e cinza e em tecido branco da marca Zara Home, no valor de €50,00; ppppp) um Candeeiro em Inox em forma de Curva da marca Zara Home, no valor de €70,00; qqqqq) um Candeeiro em vidro com tampo em Branco da marca Zara Home, no valor de €55,00; rrrrr) uma Sapateira branca com 1.60 da marca Zara Home, no valor de €70,00 (setenta euros); sssss) um Espelho de com leds luzes branco da marca Zara Home, no valor de €15,00; ttttt) uma caixa Madeira cinzento para colocar capsulas dolce gust da marca Zara Home, no valor de €10,00; uuuuu) uma caixa ferro branco com letras para colocar capsulas dolce gust da marca Zara Home, no valor de €10,00 (dez euros); vvvvv) um Candeeiro em vidro quadrado pequeno novo, da marca Zara Home, no valor de €45,00; wwwww) três Pratos de decoração, da marca Zara Home, no valor de €45,00; xxxxx) quatro Porta velas em vidro, da marca Zara Home, no valor de €55,00; yyyyy) dezasseis Velas grande da marca Zara Home, no valor de €25,00; zzzzz) cinco Passe-partout da marca Zara Home, no valor de €60,00; aaaaaa) duas Bandeja em vidro forma quadrada da marca Zara Home, no valor de €100,00; bbbbbb) dois Jarros de decoração em vidro finam da marca Zara Home, no valor de €125,00; cccccc) quatro Copos de vinho da marca Zara Home, no valor de €40,00; dddddd) quatro Copos de champanhe da marca Zara Home, no valor de €24,00; eeeeee) quatro Copos de agua da marca Zara Home, no valor de €20,00; ffffff) um Jarro de vinho da marca Zara Home, no valor de €35,00; gggggg) um Saco de viagem da marca Massimo Dutti; hhhhhh) um Saco de viagem da marca Lacoste; iiiiii) Casaco azul e vermelho da marca Zara no valor de €60,00; jjjjjj) Casaco azul da marca Massimo Dutti, no valor de €80,00; kkkkkk) Casaco da marca LACOSTE, no valor de €150,00; llllll) Quatro camisas Brancas da marca Primark no valor €80,00; mmmmmm) Três calças pretas da marca Primark no valor de €60,00; nnnnnn) Três papillons no valor de €90,00 (noventa euros); oooooo) Dois Coletes Cardoso da Saudades no valor de €45,00; pppppp) Três pares de sapatos Pretos no valor de €120,00; qqqqqq) Dois Smoking Pretos no valor de €300,00; (artigo 6.º da petição inicial).

7.º - O que perfaz um total de, pelo menos, €8.495,70 (artigo 7.º da petição inicial).

8.º - A namorada do autor, DD, durante o mês de dezembro de 2019, fez compras na loja ZARA HOME no valor de €400,00 na loja ZARA HOME, cujos pertences se encontravam dentro de uma mala no quarto do Autor (artigo 8.º da petição inicial).

9.º - Infelizmente, e em virtude do surto de COVID-19, o autor, apesar das várias tentativas frustradas de regresso, foi impedido de retornar a Portugal, na data prevista inicialmente (artigo 9.º da petição inicial).

10.º - Durante a sua estadia forçada no Brasil (artigo 10.º da petição inicial).

11.º - Pelo que o autor tentou entrar em contacto com a ré, mas sem sucesso uma vez que aquela bloqueou o seu número de telemóvel, não tendo outro meio para de entrar em contacto com aquela (artigo 11.º da petição inicial).

12.º - A ré não lhe possibilitou a recolha dos bens do autor do local (artigo 13.º da petição inicial).

13.º - Perante tal situação, o autor, desesperado, contactou os amigos EE, FF e a namorada DD, para junto da Ré informar que aquele se encontrava retido no Brasil, mas que mantinha a intenção de manter o contrato de arrendamento e que, por isso, pretendia que a Ré lhe faltasse o nº de conta para proceder ao pagamento das rendas (artigo 14.º da petição inicial).

14.º - Ou em alternativa, proceder à retirada dos bens (artigo 15.º da petição inicial).

15.º - No entanto, a ré não facultou o nº de conta nem a oportunidade de aqueles retirarem os bens do Autor do locado (artigo 16.º da petição inicial).

16.º - Exigiu para o efeito, a entrega do valor de €5.000,00 (cinco mil euros) por parte do Autor para entregar os bens que lhe pertencem (artigo 17.º da petição inicial).

17.º - Numa tentativa desesperada de recuperar os seus bens, o autor foi obrigado a regressar a Portugal, tendo apenas conseguido viagem de regresso no dia 28 de janeiro do presente ano (artigo 19.º e doc. 43 da petição inicial).

18.º - O autor teve de pedir emprestada a um amigo, de nome GG – pai da namorada - a quantia de € 1.976,02 para efetuar o pagamento das viagens e realizar os testes à COVID-19 (doc. 44 e 45 e artigo 21.º da petição inicial).

19.º - O que provocou no autor um forte sentimento e vergonha e angústia perante todo os seus amigos, por culpa, única e exclusiva, da ré (artigo 22.º da petição inicial).

20.º - Numa tentativa de recuperar os bens que deixara no imóvel, e receando pela sua integridade física (doc. 46 e artigo 23.º da petição inicial).

21.º - E os bens pertencentes àquele (descritos na petição inicial) já não se encontravam no imóvel (artigo 25.º da petição inicial).

22.º - E dado que nenhum amigo lhe quis dar guarida por ter regressado do Brasil por medo de contágio da COVID-19, o autor permaneceu sozinho e isolado, comportando gastos de alojamento no valor de €340,00 (artigo 29.º e doc. 47 da petição inicial).

23.º - Por todos estes motivos o autor foi forçado a regressar ao Brasil, pelo que lá semantém até aos dias de hoje (artigo 32.º da petição inicial).

24.º - Para além daqueles bens, o autor deixou no seu quarto uma mala porta documentos de marca CAMEL, onde contém vários documentos pessoais pertencentes àquele, como por exemplo documentos relativos a tribunais, escrituras, documentação e, inclusive, as faturas relativas aos bens até aqui elencados (artigo 36.º da petição inicial).

25.º - A conduta da ré provocou no autor sofrimentos, angústias, mal-estar psicológico, stress, ansiedade e fundado receio de nunca conseguir recuperar os seus bens (artigo 38.º da petição inicial).

26.º - O autor terá outras despesas futuros em virtude da conduta da ré, nomeadamente de alojamento, de alimentação e testes de COVID-19 para regressar a Portugal (artigo 43.º da petição inicial).

27.º - O autor encontra-se no Brasil a viver de favor em casa da namorada estando a suportar as despesas, sentindo-se humilhado e envergonhado (artigo 45.º da petição inicial).

28.º - Sem emprego, uma vez que a sua atividade enquanto empresário se desenvolve em ambiente noturno, o que significa que é uma das áreas mais afetadas pela pandemia (artigo 46.º da petição inicial).

29.º - Vendo-se o autor obrigado a sobreviver com a ajuda de amigos no Brasil (artigo 47.º da petição inicial).

30.º - O autor sabe que por decisão livre espontânea, abandonou o quarto no imóvel da ré, sem lhe prestar qualquer tipo de informação e sem nunca mais lhe ter dado notícias, abandonando os seus bens por mais de um ano no alojamento (artigo 13.º da contestação).

31.º - E uma televisão (artigo 29.º da contestação).

32.º - Apenas trouxe consigo uma mala e uns sacos plásticos, nada mais; nestes quartos desde junho de 2019 (artigo 30.º da contestação).

33.º - Levando consigo as chaves do prédio, do apartamento e do quarto, não se dignando sequer a informar a ré que iria sair (artigo 33.º da contestação).

34.º - Nunca mais o autor deu notícias à ré, sendo certo que esta desconhecia o paradeiro daquele, não mais o tendo visto ou falado com ele, até fevereiro do corrente ano (2021) (artigo 34.º da contestação).

35.º - Chegou o dia 28 de outubro de 2019, último dia que o autor tinha pago, sem que houvesse notícias deste, pelo que (artigo 35.º da contestação).

36.º - Por diversas vezes a ré tentou entrar em contacto com o autor, seja através de chamadas telefónicas, SMS ou mensagens no WhatsApp, para que este fosse levantar os bens e entregar as chaves, mas sem lograr obter sucesso, pois o autor nunca respondeu, nem retribuiu as chamadas (artigo 37.º e 96.º da contestação).

37.º - E os restantes bens começaram a apodrecer (artigo 38.º da contestação).

38.º - Os bens foram guardados durante um ano, sem que o autor os tivesse levantado ou reclamado a sua entrega (artigo 39.º da contestação).

39.º - O quarto onde o autor estava alojado esteve desocupado desde que ele saiu, meados de outubro de 2019 até ao mês de dezembro do ano de 2020, ou seja, sensivelmente um ano e dois meses (artigo 40.º da contestação).

40.º - A ré apenas em dezembro do ano de 2020 alojou naquele quarto uma outra pessoa (artigo 41.º da contestação).

41.º - A ré sofre de ataques de pânico, medo e agorafobia, diagnosticada pelo Hospital..., sendo que, toda esta situação, sobretudo a partir do momento em que recebeu a citação para a presente ação, que a ré considera um ataque ao seu bom nome e à sua honra, tem-lhe causado várias noites sem dormir, vive constantemente em ansiedade e tem sofrido vários ataques de pânico, obrigando-a a tomar mais calmantes e antidepressivos (artigo 100.º da contestação).

2.3. O DIREITO

Importa conhecer o objeto do recurso, circunscrito pelas respetivas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e as que sejam de conhecimento oficioso17 (não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto).

1.) SABER SE O TRIBUNAL A QUO DEVERIA TER REAPRECIADO A MATÉRIA DE FACTO IMPUGNADA POR SE MOSTRAREM CUMPRIDOS OS ÓNUS ESTATUÍDOS NO ART. 640º/1/A/B/C/2/A/B, DO CPCIVIL.

O recorrente alegou que “contestou a fundamentação da decisão do Tribunal de 1ª Instância, uma vez que, por um lado, pôs em causa a questão da validade das declarações de parte como prova e, por outro lado, sustenta a matéria de facto dada como provada – precisamente, nas declarações de parte”.

Assim, concluiu que “referiu expressamente a prova produzida em audiência, impugnando a matéria de facto que entendeu contraditória com a Decisão - ainda os motivos da sua discordância e, finalmente, a errada interpretação normativa, que a decisão recorrida, haveria de julgar como procedente”.

Vejamos a questão.

A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa – art. 662º/1, do CPCivil.

Pretendeu a Reforma de 2013, “reforçar” os poderes da 2ª instância em sede de reapreciação da matéria de facto impugnada. Assim, a Relação, para além de manter os poderes cassatórios (ou de anulação) da decisão recorrida decorrente de uma fundamentação indevida, insuficiente, obscura ou contraditória, passou a ver substancialmente incrementados os poderes-deveres de reapreciação fáctica, ordenado, quer a renovação (repetição) dos meios de prova pessoal, quer a produção de novos meios de prova”. Poderes esses (de utilização oficiosa), não só de caracter inquisitório, como também de carácter instrutório, em ordem ao proclamado e aludido desideratrum do alcance da verdade material18.

A reapreciação, por parte do tribunal da 2.ª instância, da decisão de facto impugnada não se deve limitar à verificação da existência de erro notório, mas implica uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, pelo tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir, para só, em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do erro invocado, mantendo ou alterando os juízos probatórios em causa19.

No âmbito dessa apreciação, dispõe o Tribunal da Relação de margem suficiente para, com base na prova produzida, em função do que for alegado pelo impugnante e pela parte contrária, bem como da fundamentação do tribunal da 1.ª instância, ajustar o nível de argumentação probatória de modo a revelar os fatores decisivos da reapreciação empreendida20.

Porque necessariamente gravados os depoimentos prestados na audiência final (art. 155º), bem como (gravados e/ou registados os prestados antecipadamente ou por carta – art. 422º/1/2), pode a Relação reapreciar e reponderar a prova produzida sobre a qual haja assentado a decisão impugnada, atendendo aos elementos indicados, em ordem a formar a sua própria e autónoma convicção sobre o material fáctico (resultado probatório) processualmente adquirido21.

Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos meios probatórios que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de factos impugnadas – art. 640º/1/a/b/c, do CPCivil.

No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes e, independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes – art. 640º/2/a/b, do CPCivil.

A não satisfação destes ónus por parte do recorrente implica a rejeição imediata do recurso22.

Ele tem de especificar obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da adotada pela decisão recorrida23,24,25,26, 27,28,29,30,31,32,33, 34,35.

A apreciação do erro de julgamento da decisão de facto é circunscrita aos pontos impugnados, embora, quanto à latitude da investigação probatória, o tribunal de recurso tenha um amplo poder inquisitório sobre a prova produzida que imponha decisão diversa, como decorre do preceituado no artigo 662.º/1, do CPCivil, incluindo os mecanismos de renovação ou de produção dos novos meios de prova, nos exatos termos do n.º 2, alíneas a) e b), do mesmo artigo, sem estar adstrito aos meios de prova que tiverem sido convocados pelas partes e nem sequer aos indicados pelo tribunal recorrido3637.

Não cumprindo o recorrente os ónus do artigo 640º/1 do CPCivil, dever-se-á rejeitar o seu recurso sobre a matéria de facto, uma vez que a lei não admite aqui despacho de aperfeiçoamento, ao contrário do que sucede quanto ao recurso em matéria de direito, face ao disposto no art. 639º/3 do mesmo código38,39,40,41,42.

Tendo a impugnação da matéria de facto por fundamento prova gravada, vejamos, no caso, se o recorrente no seu recurso de apelação cumpriu os ónus de especificação/ identificação que se referem no art. 640º/1/2, do CPCivil.

No recurso de apelação, o recorrente alegou quanto “à matéria de facto provada que o Tribunal – por um lado, põe em causa a questão da validade das declarações de parte como prova, mas… Por outro lado, sustenta a matéria de facto dada como provada – precisamente, nas declarações de parte”.

Mais alegou quanto “à matéria de facto não provada que juntou aos autos toda a prova de aquisição de bens – basta ver a panóplia de faturação/recibos de pagamento de todos esses bens.”.

Ora, pretendendo o recorrente que o tribunal a quo proferisse decisão sobre matéria de facto, teria que indicar os pontos de facto que considerava incorretamente julgados, bem como os concretos meios probatórios constantes do processo que, em sua opinião, impunham tal decisão sobre os indicados pontos da matéria de facto.

Assim, no recurso de apelação, o recorrente não cumpriu os ónus de especificação/ identificação que se referem no art. 640º/1/2, do CPCivil, pois ao alegar que “o tribunal sustenta a matéria de facto dada como provada – precisamente, nas declarações de parte e, juntou aos autos toda a prova de aquisição de bens”, não indicou os concretos pontos de facto que considerava incorretamente julgados, nem os concretos meios probatórios que, em sua opinião, impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto adotada pela decisão recorrida.

Temos, pois, que o recorrente, nas alegações da apelação (e nem o fez nas suas conclusões), não só não especificou os concretos pontos de facto que considerava incorretamente julgados, como também não indicou os concretos meios probatórios constantes do processo que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (e nem o fez nas conclusões do recurso de apelação), como também não indicou a decisão que, no seu entender, deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (e nem o fez nas conclusões de recurso de apelação).

Assim, não especificando o recorrente os concretos pontos de facto que considerava incorretamente julgados, nem os concretos meios probatórios constantes do processo, que em sua opinião, impunham decisão diversa da recorrida, nem a decisão que, no seu entender, deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, não cumpriu com os ónus de especificação/identificação que se referem no art. 640º/1/a/b/c/2/a/b, CPCivil43.

Conforme entendimento do tribunal a quo, que subscrevemos, “No que toca à especificação da matéria de facto, no corpo das alegações, o apelante limita-se a reproduzir os factos qualificados como provados e não provados na sentença e a dizer que dela discorda e, no que toca à especificação dos meios de prova a merecerem outra avaliação, justificando então outra decisão, o apelante não fez mais do que referir genericamente a prova documental que refere ter junto aos autos, deixando por identificar qualquer documento e qualquer facto a cuja prova o destinasse; e, bem assim, tratou de criticar o juízo probatório do tribunal recorrido sobre as declarações de parte da ré. Porém, quanto a estas, nem sequer curou de isolar qualquer segmento dessas declarações, a fim de viabilizar o seu reexame, pois que se aprestou a citar doutrina e jurisprudência a propósito do valor a conferir a um tal meio de prova”.

Não especificando o recorrente os concretos pontos de facto que considerava incorretamente julgados, nem os concretos meios probatórios constantes do processo, que em sua opinião, impunham decisão diversa da recorrida, nem a decisão que, no seu entender, deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, não podia o Tribunal da Relação reponderar a prova produzida em que assentou a decisão impugnada44,45,46.

Como entendimento do tribunal a quo, que subscrevemos, “Resta, assim, concluir pela inevitabilidade da rejeição do recurso no que respeita à impugnação da matéria de facto, em cumprimento do disposto no art. 640º/1 do CPC, que não consente outro tratamento para um tal grau de incumprimento do regime ali estabelecido” 47,48,49,50,51.

Concluindo, tendo o recorrente impugnado a decisão relativa à matéria de facto, mas não tendo cumprido os ónus estatuídos no art. 640º/1/a/b/c/2/b, do CPCivil, o tribunal a quo teria de rejeitar, como rejeitou, o recurso nessa parte.

Destarte, improcedendo as conclusões do recurso de revista, há que confirmar o acórdão recorrido.

3. DISPOSITIVO

3.1. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível (1ª) do Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente a revista e, consequentemente, em confirmar-se o acórdão recorrido.

3.2. REGIME DE CUSTAS

As custas não são devidas, por beneficiar o recorrente do regime de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo52.

Lisboa, 2024-02-0653,54

(Nelson Borges Carneiro) – Relator

(Manuel Aguiar Pereira) – 1º adjunto

(Jorge Leal) – 2º adjunto

_____________________________________________

1. As decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos – art. 627º/1, do CPCivil.↩︎

2. Recursos, «em sentido técnico-jurídico, são os meios específicos de impugnação das decisões judiciais, através dos quais se obtém o reexame da matéria apreciada pela decisão recorrida» – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 463.↩︎

3. No nosso sistema processual (no que à apelação e à revista) predomina o «esquema do recurso de reponderação»: o objeto do recurso é a decisão impugnada, encontrando-se à partida, vedada a produção defeitos jurídicos ex-novo. Através do recurso, o que se visa é a impugnação de uma decisão já ex-ante proferida que não o julgamento de uma qualquer questão nova. Uma relevante exceção ao modelo de reponderação é a que se traduz nas questões de conhecimento oficioso: o tribunal superior pode sempre apreciar qualquer dessas questões ainda que não suscitadas perante o tribunal a quo – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 468.↩︎

4. Os recursos são ordinários ou extraordinários, sendo ordinários os recursos de apelação e de revista e extraordinários o recurso para uniformização de jurisprudência e a revisão – art. 627º/2, do CPCivil.↩︎

5. A lei estabelece uma divisão entre recursos ordinários e recursos extraordinários a partir de um critério formal ligado ao trânsito em julgado da decisão. Enquanto os recursos ordinários pressupõem que ainda não ocorreu o trânsito em julgado, devolvendo-se ao tribunal de recurso a possibilidade de anular, revogar ou modificar a decisão, os recursos extraordinários são interpostos depois daquele trânsito – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 777.↩︎

6. Aquele que interpõe o recurso – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 477.↩︎

7. Aquele contra quem se interpõe o recurso – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 477.↩︎

8. O juiz que lavrar o acórdão deve sumariá-lo – art. 663º/7, do CPCivil.↩︎

9. O sumário não faz parte da decisão, consistindo tão só numa síntese daquilo que fundamentalmente foi apreciado com mero valor de divulgação jurisprudencial. Por tais motivos, o sumário deve ser destacado do próprio acórdão, sendo da exclusiva responsabilidade do relator – ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, p. 301.↩︎

10. O acórdão principia pelo relatório, em que se enunciam sucintamente as questões a decidir no recurso, expõe de seguida os fundamentos e conclui pela decisão, observando-se, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 607.º a 612.º – art. 663º/2, do CPCivil.↩︎

11. Para além do dever de apresentar a sua alegação, impende sobre o recorrente o ónus de nela concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – ónus de formular conclusões (art. 639º/1) – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 503.↩︎

12. As conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art. 639º/3. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 795.↩︎

13. O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar, as normas jurídicas violadas; o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, e invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada – art. 639º/1/2 ex vi do art. 679º, ambos do CPCivil.↩︎

14. Na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo, acompanhado com o projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias, ou, quando tal não for tecnicamente possível, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto da apelação – art. 657º/2 ex vi do art. 679º, ambos do CPCivil.↩︎

15. Todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas, não podendo de elas conhecer o tribunal de recurso.↩︎

16. Vem sendo entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.↩︎

17. Relativamente a questões de conhecimento oficioso e que, por isso mesmo, não foram suscitadas anteriormente, deve ser assegurado o contraditório, nos termos do art. 3º/3, do CPCivil.↩︎

18. FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, pp. 535/36.↩︎

19. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2017-09-07, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

20. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2017-09-07, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

21. FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, pp. 537/38.↩︎

22. AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, 4ª ed., Revista e Atualizada, Almedina, p. 157, nota (333).↩︎

23. LEBRE DE FREITAS – ARMINDO RIBEIRO MENDES, Código de Processo Civil Anotado, Artigos 676º a 943º, Vol. 3º, Coimbra Editora, 2003, p. 53.↩︎

24. No recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorretamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa, relativamente a esses factos, e enuncie a decisão alternativa que propõe – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-10-01, Relatora: ANA GERALDES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

25. O ónus atinente à indicação exata das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, pelo que a falta de indicação, com exatidão, só será idónea a fundamentar a rejeição liminar se dificultar, de forma substancial e relevante, o exercício do contraditório, ou o exame pelo tribunal, sob pena de ser uma solução excessivamente formal, rigorosa e sem justificação razoável – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-05-26, Relator: HÉLDER ROQUE, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

26. A exigência da especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem impugnar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio tem por função delimitar o objeto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-02-19, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

27. A especificação dos concretos meios probatórios convocados e a indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova, sem prejuízo do seu poder inquisitório sobre toda a prova produzida que se afigure relevante para tal reapreciação, como decorre do preceituado no n.º 1 do artigo 662.º do CPC – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-02-19, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

28. O ónus de indicação exata das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não sendo justificada a imediata e liminar rejeição do recurso quando – apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exata e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento - como ocorre nos casos em que, para além de o apelante referenciar, em função do conteúdo da ata, os momentos temporais em que foi prestado o depoimento complemente tal indicação é complementada com uma extensa transcrição, em escrito dactilografado, dos depoimentos relevantes para o julgamento do objeto do recurso – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-10-29, Relator: LOPES DO REGO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

29. A alínea b), do nº 1, do art. 640º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados, exige que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respetivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos – Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2018-09-05, Relator: GONÇALVES ROCHA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

30. Numa impugnação da decisão da matéria de facto deve constar das conclusões a indicação dos concretos pontos de facto tidos por incorretamente julgados. Não se impõe que se indiquem os números dos pontos impugnados, mas que, com clareza, resulte identificada a matéria que se quer pôr em causa – Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2021-11-17, Relator: TIBÉRIO NUNES DA SILVA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

31. O art. 640.º do CPC exige a quem pretende impugnar a decisão quanto à fixação do elenco factual que tome posição especifica sobre os motivos da discordância, indicando e explicitando de forma pormenorizada, individualizada e minuciosa os concretos pontos de facto que se pretendem impugnar, os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa e a decisão que entendem ser a corretas, não sendo para o efeito suficiente uma genérica ou exemplificativa afirmação dessa discordância – Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2021-10-28, Relator: TIBÉRIO NUNES DA SILVA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

32. A lei adjetiva impõe à recorrente que impugna a decisão de facto que individualize os factos que estão mal julgados, que especifique os meios de prova concretos que impõem a modificação da decisão, que indique o sentido da decisão a proferir, e, inclusivamente, tratando-se de depoimentos de testemunhas gravados, que concretize as passagens do depoimento que tal há de permitir, sendo que a violação deste ónus, preciso e rigoroso, conduz à rejeição imediata do recurso na parte afetada – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-10-19, Relator: OLIVEIRA ABREU, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

33. Se não se exige a transcrição dos excertos da gravação que se considere importantes, já é necessário que os apelantes indiquem com exatidão as passagens da gravação que consideram relevantes ou pertinentes para que o tribunal de recurso possa reapreciar todas e cada uma das decisões de facto com que não concordam – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-03-25, Relator: BERNARDO DOMINGOS, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

34. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, tem o recorrente obrigatoriamente que especificar, sob pena de rejeição, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-12-15, Relator: JOSÉ RAÍNHO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

35. O dever de impugnação não se basta com a alusão genérica e indiscriminada a determinados meios de prova (v.g. “a prova testemunhal” ou “a prova pericial”), mas pode ser individualizada relativamente a cada facto ou factos que entre si formem um bloco – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-11-17, Relator: JORGE DIAS, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

36. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-10-22, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

37. Na apreciação da (in)observância dos ónus previstos no art. 640.º do CPC, há que levar em devida linha de conta que a impugnação da matéria de facto não se destina a reiterar um julgamento na sua totalidade, mas antes a corrigir determinados aspetos que o recorrente entenda não terem merecido um tratamento adequado por parte do tribunal a quo – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-11-03, Relatora: MARIA JOÃO VAZ TOMÉ, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

38. A não satisfação destes ónus por parte do recorrente implica a rejeição imediata do recurso – AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, 4ª ed., Revista e Atualizada, Almedina, p. 157, nota (333).↩︎

39. Como resulta claro do art. 640º, nº 1, do CPCivil, a omissão de cumprimento dos ónus processuais aí referidos implica a rejeição da impugnação da matéria de facto. O que denega, de todo em todo, a ideia da possibilidade de prolação de um despacho de aperfeiçoamento. Manifestamente que a lei não quis impasses e tergiversações em matéria de impugnação do julgamento dos factos, impondo neste domínio rigor e autorresponsabilidade à parte recorrente. Aliás, só pode ser aperfeiçoado o ato processual da parte que, tendo sido praticado, se apresente como deficiente, obscuro ou complexo. Não o ato processual que pura e simplesmente não foi praticado – Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2016-10-27, Relator: JOSÉ RAÍNHO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

40. A cominação da rejeição do recurso, prevista para a falta das especificações quanto à matéria das alíneas a), b), e c), do n.º 1, ao contrário do que acontece quanto à matéria do n.º 2 do art. 640.º do CPCivil (a propósito da «exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso»), não funciona automaticamente, devendo o Tribunal convidar o recorrente a suprir a falta de especificação daqueles elementos ou a sua deficiente indicação – Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2015-05-26, Relator: HÉLDER ROQUE, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

41. Dever-se-á usar de maior rigor na apreciação da observância do ónus previsto no n.º 1 do art. 640.º (de delimitação do objeto do recuso e de fundamentação concludente do mesmo), face ao ónus do n.º 2 (destinado a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes, que tem oscilado em exigência ao longo do tempo, indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização exata das passagens da gravação relevantes) – Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 29-10-2015, Relator: LOPES DO REGO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

42. Limitando-se o impugnante a discorrer sobre os meios de prova carreados aos autos, sem a indicação/separação dos concretos meios de prova que, relativamente a cada um desses factos, impunham uma resposta diferente da proferida pelo tribunal recorrido, numa análise crítica dessa prova, não dá cumprimento ao ónus referido na al. b) do n.º 1 do art. 640.º do CPC. IV - Ou seja, o apelante deve fazer corresponder a cada uma das pretendidas alterações da matéria de facto o(s) segmento(s) dos depoimentos testemunhais e a parte concreta dos documentos que fundou as mesmas, sob pena de se tornar inviável o estabelecimento de uma concreta correlação entre estes e aquelas Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 14-07-2021, Relator: FERNANDO BAPTISTA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

43. É que expostas pelo recorrente, no corpo da alegação, as razões de facto e de direito da sua discordância com a decisão impugnada, deve ele, face à sua vinculação ao ónus de formular conclusões, terminar a sua minuta pela indicação resumida, através de proposições sintéticas, dos fundamentos, de facto e/ou de direito, por que pede a alteração ou anulação da decisão - FERNANDO AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, 4ª ed., abril de 2003, pp. 154/5.↩︎

44. O recorrente não aduziu argumentos no sentido de infirmar diretamente os termos do raciocínio adotado pelo tribunal a quo, evidenciando que o mesmo é injustificado e consubstancia um exercício incorreto da hierarquização dos parâmetros de credibilidade dos meios de prova produzidos, ou seja, que é inconsistente – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 797.↩︎

45. Não cumpre aquele ónus o apelante que, nas alegações e nas conclusões, divide a matéria de facto impugnada em vários blocos de factos e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna – Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2018-09-05, Relator: GONÇALVES ROCHA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

46. Não observa tal ónus o recorrente que identifica os pontos de facto que considera mal julgados, mas se limita a indicar os depoimentos prestados e a listar documentos, sem fazer a indispensável referência àqueles pontos de facto, especificando os concretos meios de prova que impunham que cada um desses pontos fosse julgado provado ou não provado – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-02-19, Relatora: MARIA PRAZERES BEELZA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

47. A falta de especificação dos requisitos enunciados no artigo 640.º/1 implica a imediata rejeição do recurso na parte infirmada – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-02-19, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

48. A sanção prescrita no art.º 640.º/2/a, do CPC deverá ser aplicada com algum tempero, em termos de só se justificar quando, perante extensos depoimentos a abarcar matéria bastante diversificada - a maior parte dela não impugnada -, a omissão ou inexatidão na indicação das passagens tidas por relevantes dificulte, gravemente, o exercício do contraditório pela parte contrária e/ou o exame por banda do tribunal de recurso – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-02-19, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

49. Os ónus primários previstos nas als. a), b) e c) do art. 640.º do CPC são indispensáveis à reapreciação pela Relação da impugnação da decisão da matéria de facto. O incumprimento de qualquer um desses ónus implica a imediata rejeição da impugnação da decisão da matéria de facto, não sendo legalmente admissível a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-02-02, Relator: FERNANDO SAMÕES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

50. Omitindo o recorrente o cumprimento do ónus processual fixado nas als. a) e c) do n.º 1 do art. 640.º do CPC, impõe-se a imediata rejeição da impugnação da matéria de facto, não sendo legalmente admissível a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-03-25, Relator: BERNARDO DOMINGOS, Revista: 756/14.3TBPTM.L1. S1, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

51. Omitindo o recorrente o cumprimento do ónus processual fixado na al. c) do n.º 1 do art. 640.º do CPC, impõe-se a imediata rejeição da impugnação da matéria de facto, não sendo legalmente admissível a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-03-25, Relator: BERNARDO DOMINGOS, Revista: 1595/15.0T8CSC.L1.S1, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

52. A base do regime geral da responsabilidade pelo pagamento das custas relativas aos recursos consta no artigo 527.º do Código de Processo Civil, estruturada na envolvência do princípio da causalidade e, subsidiariamente, no princípio do proveito. Dele resulta que dá causa às custas a parte vencida, na respetiva proporção, em termos de presunção iuris et de iure, ou seja, em termos absolutos. O conceito de custas a que se reporta cinge-se ao seu sentido estrito, ou seja, o abrangente dos encargos e das custas de parte, previstos no artigo 529.º/3/4, do mencionado Código. Não abrange a taxa de justiça, porque a responsabilidade pelo respetivo pagamento pelas partes em geral deriva do impulso processual, nos termos do artigo 529.º/2 e do disposto no artigo 530.º/1 do mesmo Código. Sendo o recorrente responsável pelo pagamento das custas atinentes ao recurso, não pode, no entanto, ser condenado no pagamento de encargos, cujo âmbito consta no artigo 532.º do aludido Código, porque não os houve no recurso. Nesse caso só devia ser condenado no pagamento de custas de parte, nos termos dos artigos 533.º/1/2/3, do aludido Código e 26.º/3, do Regulamento das Custas Processuais. Mas como o recorrente beneficia do apoio judiciário na modalidade de assistência judiciária – dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo – nos termos do artigo 16.º/1/a, da Lei n.º 34/2004, importa equacionar sobre se isso exclui ou não a sua responsabilização pelo pagamento das custas do recurso. O conceito de encargos a que o referido normativo do artigo 16.º/1/a, da Lei n.º 34/2004 está utilizado em sentido amplo, abrangendo, por um lado, os encargos tal como são definidos no artigo 529.º/3 e, por outro, as custas de parte, previstas no artigo 533.º/1/2, ambos do supramencionado Código. Isso mesmo, no que concerne às custas de parte, decorre implicitamente do disposto no artigo 26.º/6 do Regulamento das Custas Processuais, segundo o qual, se a parte vencida gozar do benefício de apoio judiciário na modalidade de assistência judiciária, a parte vencedora só pode exigir ao Instituto de Gestão Financeira e dos Equipamentos da Justiça, I.P. o reembolso das taxas de justiça que ela tenha pagado. Em suma, decorre das referidas normas que a parte vencida que goze do benefício de apoio judiciário na aludida modalidade não está sujeita à obrigação de pagamento de encargos ou de custas de parte à parte vencedora. Vejamos, pois, a responsabilidade pelo pagamento das custas relativas a este recurso de revista em que o recorrente ficou vencido. A dispensa de pagamento da taxa de justiça e dos demais encargos com o processo decorrente da concessão do apoio judiciário sem qualquer condição ou limite a que o artigo 16.º/1/a, da Lei n.º 34/2004, já aponta no sentido de que a parte beneficiária daquele apoio, enquanto o for, está dispensada do pagamento das custas, seja as das ações, seja as dos recursos. Concedido o referido apoio judiciário em qualquer das suas espécies, se não for cancelado no decurso do processo em função do qual tenha sido concedido, pelos fundamentos previstos no artigo 10.º/1, da Lei n.º 34/2004, mantém-se eficaz até ao trânsito em julgado da decisão final. Decorre, pois, implicitamente, das referidas normas que as partes beneficiárias do apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo à data das sentenças e dos acórdãos, vencidas nas ações ou nos recursos, não estão sujeitas ao pagamento de custas lato sensu. Esta solução legal é, aliás, confirmada pelo disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 29.º do Regulamento das Custas Processuais, segundo o qual, é dispensado ato de contagem sempre que o responsável pelas custas beneficie do apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo – SALVADOR DA COSTA, Condenação do recorrente no pagamento das custas do recurso no caso de beneficiar de apoio judiciário, Blogue do IPPC, publicado em 2020-10-20.↩︎

53. A assinatura eletrónica substitui e dispensa para todos os efeitos a assinatura autógrafa em suporte de papel dos atos processuais – art. 19º/2, da Portaria n.º 280/2013, de 26/08, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 267/2018, de 20/09.↩︎

54. Acórdão assinado digitalmente – certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.↩︎