Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 4ª SECÇÃO | ||
Relator: | PEREIRA RODRIGUES | ||
Descritores: | PROCESSO DISCIPLINAR DESPEDIMENTO INDEMNIZAÇÃO DANOS NÃO PATRIMONIAIS | ||
Data do Acordão: | 01/25/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA | ||
Sumário : | I. Em direito laboral, para se reconhecer direito ao trabalhador a indemnização com fundamento em danos não patrimoniais, terá aquele de provar que houve violação culposa dos seus direitos por parte do empregador, causadora de danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, o que se verificará, em termos gerais, naqueles casos em que a culpa do empregador seja manifesta, os danos sofridos pelo trabalhador se configurem como objectivamente graves e o nexo de causalidade não mereça discussão razoável. II. No que concerne ao despedimento promovido pelo empregador que se venha a caracterizar de ilícito, para se aferir se o mesmo justifica, ou não, a condenação daquele por danos não patrimoniais é necessário tomar em consideração, antes de mais, que é inerente à cessação da relação laboral, indesejada pelo trabalhador, que esta cessação comporte para o mesmo a lesão de bens de natureza não patrimonial, traduzida em sofrimento, inquietação, angústia, preocupação pelo futuro, etc.. III. Por outro lado, sempre será necessário atentar em que os danos sofridos pelo trabalhador devem integrar uma lesão grave, que vá para além daquela que sempre acontece em situações similares de despedimento, porque o direito a indemnização com fundamento em danos não patrimoniais não é de admitir como regra, mas apenas no caso singular de haver uma justificação segura, que leve a concluir pela necessidade de reparar uma lesão que restaria apodicticamente não satisfeita. IV. Assim, se se verificar que esses danos não patrimoniais não têm especial relevo por se traduzirem nos que, comummente, se verificam em idênticas situações, como os do desgosto, da angústia e da injustiça, não se legitima a tutela do direito justificadora da condenação por aqueles danos. V. O facto de no caso se ter provado que o processo disciplinar provocou sofrimento e angústia ao trabalhador e agravou o seu estado de saúde, não oferece motivo bastante para fundamentar uma condenação em indemnização por danos não patrimoniais, por não se terem provado elementos concretos para aferir do relevo do sofrimento, da angústia e do agravamento da doença. | ||
Decisão Texto Integral: |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
I. OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A SOLUCIONAR. No Tribunal do Trabalho de Lisboa, AA, jornalista, intentou a presente acção declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra a Rádio e Televisão de Portugal, SA, pedindo que: a) se declare ilícito o despedimento do Autor e, em consequência, se condene a Ré a reintegrar o mesmo, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, nos termos do disposto na alínea b) do n° 1 do artigo 436.° do Código de Trabalho; b) ou, em alternativa, se condene a Ré a pagar ao Autor indemnização a fixar pelo Tribunal entre 15 a 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, contando-se, para o efeito, o tempo decorrido até ao trânsito em julgado da decisão judicial, nos termos do disposto nos n.°s 1 e 2 do artigo 439° do Código do Trabalho, de acordo com a opção que o Autor exercerá até à prolação da mesma; c) se condene a Ré a pagar todas as retribuições que o Autor deixou de auferir desde 30 dias antes da data da propositura da acção até ao trânsito em julgado da sentença; d) se condene a Ré no pagamento ao Autor de € 25.000, a título de indemnização por danos não patrimoniais, nos termos do disposto no artigo 496° do Código Civil e no artigo 436° do Código do Trabalho; e) se condene a Ré a corrigir a evolução da carreira profissional do Autor e, em função disso, reconhecer-lhe a categoria de jornalista do Grau 1, Nível 7, escalão 0, desde a admissão, com passagem para o Escalão 1 em 1 de Abril de 1999 e para o escalão 2 em Abril de 2002; f) se condene a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 7.935,42, peticionada a título de diferenças salariais; g) se condene a Ré a pagar a quantia de € 4.357,84, a título de juros de mora já vencidos, a que devem acrescer os vincendos até integral pagamento. Para tanto, alegou que: É jornalista, portador de carteira profissional, e está filiado no Sindicato dos Jornalistas desde Junho de 1990; Em Abril de 1996, celebrou com a Ré um contrato de trabalho, tendo sido admitido com a classificação de estagiário, mas por já ser detentor da carteira profissional deveria ter sido admitido com a categoria de jornalista do grau 1, escalão 0, razão pela qual pede a condenação da Ré a corrigir a evolução da sua carreira profissional, com passagem para o escalão 1, em 1 de Abril de 1999, e para o escalão 2, em Abril de 2002, e a pagar-lhe as respectivas diferenças salariais no valor de € 7.935,42 e respectivos juros de mora estando já vencidos € 4.357,84 e vincendos até integral pagamento; O Autor veio a ser alvo de um processo disciplinar, no ano de 2007, que culminou com o seu despedimento; Porém, tal despedimento é ilícito em virtude do processo disciplinar ser nulo, por violação do disposto no n.° 1 do artigo 414° do Código de Trabalho e por inexistir justa causa para o mesmo despedimento. Reclama os direitos decorrentes da ilicitude do despedimento e a quantia de € 25.000, a título de danos morais. A Ré contestou, alegando, em suma, os factos que, em sua opinião, constituem justa causa de despedimento e afirmou a validade do processo disciplinar, pelo que entende que o despedimento deve ser declarado lícito, com a consequente absolvição da Ré de todos os pedidos formulados pelo Autor. Realizou-se a audiência preliminar, no âmbito da qual foi elaborado despacho saneador com a indicação dos factos assentes e da base instrutória. Efectuou-se a audiência de discussão e julgamento e foi proferida sentença com a seguinte DECISÃO: O Autor, notificado desta decisão, arguiu a nulidade da mesma e interpôs recurso restrito ao pedido de condenação da Ré na quantia de € 25.000, a título de danos não patrimoniais e ao pedido relativo ao seu enquadramento profissional. Tendo os autos prosseguido seus termos veio a ser proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no qual se acordou, por unanimidade, em negar provimento à apelação. Mais uma vez inconformado, o Autor interpôs recurso de Revista para este STJ, apresentando doutas alegações, com as seguintes CONCLUSÕES: A R. contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida e concluindo: A Exma. Procuradora-Geral-Adjunta emitiu douto parecer no sentido da negação da Revista. Foram colhidos os legais vistos, pelo que cumpre enunciar as questões que se colocam à apreciação, que são as relativas: a) Aos alegados danos não patrimoniais emergentes do despedimento: b) Ao enquadramento profissional do Autor e ao invocado direito a diferenças salariais.
II. FUNDAMENTOS DE FACTO. Os factos considerados provados nas instâncias são os seguintes: 1. O Autor é jornalista, portador da carteira profissional n° ... e está filiado no Sindicato dos Jornalistas desde Junho de 1990 (A). 2. A Ré é uma sociedade anónima que tem por objecto principal a prestação dos serviços públicos de rádio e televisão, nos termos das Leis da Rádio e da Televisão e dos respectivos contratos de concessão (B). 3. O Autor foi admitido ao serviço da RDP em Abril de 1996, mediante a celebração de um contrato de trabalho a termo certo e, desde a referida data, exerce, sob a autoridade, direcção e fiscalização da Ré, as funções de jornalista / redactor integrado na redacção da RDP - África (C). 4. O Autor fez a cobertura jornalística de vários acontecimentos nacionais e internacionais, como a Cimeira do Milénio, a constituição da CPLP, a visita do presidente Lula da Silva a Portugal, a reportagem com a cantora cabo-verdiana Cesária Évora e a entrevista em exclusivo com o músico brasileiro Caetano Veloso, entre outros (D). 5. O Autor foi co-autor, juntamente com o jornalista e seu colega de trabalho BB, de vários programas para a RDP - ÁFRICA, trabalhando pela madrugada fora muitas vezes (E). 6. No ano de 2005, o Autor foi alvo de um processo disciplinar, o qual culminou na aplicação de uma sanção disciplinar de 30 dias de suspensão com perda de retribuição (F). 7. Entre o dia 7 de Agosto e 6 de Novembro de 2006, o Autor gozou uma licença sem vencimento, autorizada pela Ré (G). 8. Durante a referida licença, o Autor esteve a colaborar com a PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, em Angola (H). 9. O Autor esteve em situação de baixa de 7 de Novembro a 13 de Novembro de 2006 e de 16 de Novembro a 22 de Novembro de 2006 (l). 10. No dia 14 de Novembro de 2006, o Autor esteve presente numa consulta médica, entre as 15h30 e as 16h35 (J). 11. No dia 15 de Novembro de 2006, foi passada ao Autor, no Centro de Saúde da Graça, um Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho por estado de doença, junto a fls. 15 do processo disciplinar (L). 12. No dia 16 de Novembro, o Autor esteve na empresa (M). 13. Após o dia 22 de Novembro de 2006, data do termo da baixa, o Autor retomou o serviço e, entre os dias 6 e 29 de Dezembro de 2006, o Autor gozou os dias de férias a que tinha direito nesse ano (N). 14. No dia 15 de Janeiro de 2007, o Autor foi notificado da instauração de um processo disciplinar e da respectiva Nota de Culpa, data em que a mesma lhe foi entregue, p.m.p., pela secretária do Sr. CC, Director da redacção da RDP - África (O). 15. A Ré comunicou ao Autor, por carta datada de 10 de Janeiro de 2007, a intenção de proceder ao seu despedimento com justa causa, enviando Nota de Culpa junta de fls. 21 a 24 do processo disciplinar, de onde consta o seguinte: 16. O Autor respondeu à Nota de Culpa em 29 de Janeiro de 2007, nos termos constantes de fls. 31 a 35 do Processo Disciplinar, […] (Q). 17. Para prova do alegado pelo Autor na Resposta à Nota de Culpa, o mesmo requereu a junção de dois documentos, protestou juntar cópia certificada do seu passaporte e arrolou duas testemunhas, o seu colega de trabalho BB e o seu médico de família, Dr. EE (R). 18. Entre a data da resposta do Autor à Nota de Culpa e 19 de Março de 2007, data em que voltou a entrar de baixa, o Autor esteve ao serviço da Ré (S). 19. O Autor esteve em situação de baixa desde 19 de Março de 2007 até 4 de Fevereiro de 2009 (T). 20. A Ré remeteu ao Autor a carta datada de 30 de Março de 2007, junta a fls. 38 do processo disciplinar […] (U). 21. A carta referida na alínea anterior foi devolvida com a menção "não reclamada", vindo posteriormente a verificar-se que, por lapso dos Recursos Humanos da Ré, tinha sido remetida para morada que não era do Autor (V). 22. A Ré remeteu à l. Mandatária do Autor, a carta datada de 12 de Abril de 2007, junta a fls. 41 do processo disciplinar […] (X). 23. A l. Mandatária do Autor remeteu à Ré a carta datada de 20 de Abril de 2007, junta a fls. 44 do processo disciplinar […] (Z). 24. No dia 27 de Abril de 2007, a Instrutora do processo notificou o trabalhador por e-mail para apresentar os documentos em falta e também as testemunhas arroladas, mas sem indicar qualquer data para o efeito (AA). 25. No dia 20 de Abril de 2007, a Ré remeteu ao Autor o e-mail junto a fls. 50 do processo disciplinar e que não foi recepcionado pelo Autor, conforme resulta de fls. 51 do processo disciplinar (BB). 26. A Ré enviou ao Autor e à sua l. Mandatária, cartas datadas de 30 de Maio de 2007, juntas aos autos a fls. 74 e 75 do processo disciplinar, notificando-o para: "...providencie pela comparência da testemunha por si arrolada, D. EE (ou junte, se achar conveniente, o respectivo depoimento escrito), bem como a junção aos autos do documento que protestou juntar). Também como lhe referi, quanto à testemunha, BB, eu própria me encarregarei da respectiva comparência. Deste modo, aguardarei até à próxima segunda-feira, dia 4 de Junho, que assegure os procedimentos referidos, dando, nessa altura, por findas as diligências probatórias solicitadas por Va Exa na sua Resposta à Nota de Culpa".(CC). 27. O Autor respondeu à Ré, por carta datada de 1 de Junho de 2007, junta a fls. 76 a 78, enviada em anexo da Declaração que consta de fls. 77 a 79 (DD). 28. No dia 4 de Junho de 2007, foi ouvida a testemunha indicada pelo Autor, BB, conforme consta do Auto de Declarações de fls. 81 do processo disciplinar, não estando presente o arguido/autor (EE). 29. A Ré remeteu à l. Mandatária do Autor, carta datada de 4 de Junho de 2007, junta a fls. 82 do processo disciplinar […] (FF). 30. O Autor remeteu à Ré, carta datada de 6 de Junho de 2007, junta a fls. 85 a 88 do processo disciplinar, […] (GG). 31. A Ré comunicou ao Autor, por carta registada com A/R, no dia 12 de Julho de 2007, a decisão disciplinar de despedimento na sequência do processo disciplinar que lhe tinha sido instaurado (HH). 32. O Autor, sem que tal lhe tenha sido solicitado, juntou os CIT a atestar o seu estado de doença nos períodos assentes nas alíneas anteriores (II). 33. Mantendo-se o estado de doença do Autor (que no dia 19 de Março de 2007 voltou a entrar de baixa), a empresa, com vista à atribuição ao Autor do complemento do subsídio de doença, ao abrigo do disposto na cl.ª 57.ª do Acordo de Empresa (publicado no BTE n° 21, de 8 de Junho de 2006), solicitou-lhe que se apresentasse numa consulta de verificação da doença, da Dr.ª FF, no dia 20 de Junho, na Clínica …, no Campo Grande (JJ). 34. No dia 20 de Junho de 2007, o Autor foi visto pelo médico da empresa, que teve acesso ao processo clínico deste e confirmou o seu estado de doença (LL). 35. Por esse motivo, o complemento de doença do Autor, cujo pagamento tinha sido, entretanto suspenso, foi-lhe processado com retroactivos (MM). 36. Foram juntos pela Ré ao processo disciplinar, documentos e comunicações relativas à verificação de uma situação de baixa iniciada a 19 de Março de 2007, nomeadamente de fls. 47 a 49 e 53 a 73 do processo disciplinar (NN). 37. A Ré não juntou ao processo disciplinar as notificações e documentos relativos à Junta Médica a que o Autor compareceu e que confirmou o seu estado de doença, que ocorreu no dia 20 de Junho de 2006 (OO). 38. Foi junto ao processo disciplinar o documento de fls. 89 o qual está datado de 12 de Junho de 2007 (PP). 39. A Ré classificou o Autor como jornalista do Grau l - Nível 7 - Escalão 0 em Abril de 1998, tendo-o promovido ao Escalão 1 do mesmo Grau e Nível em Abril de 2001, e ao Escalão 2 em Abril de 2004 (QQ). 40. O documento de fls. 10 do processo disciplinar deu entrada na Direcção de Recursos Humanos da Ré no dia 15 desse mês (RR). 41. […] o teor dos documentos de fls. 10, 13 e 15 (SS). 42. O Autor esteve nas instalações da Ré nos dias 8 e 9 de Novembro (TT). 43. O processo disciplinar iniciou-se a 14 de Dezembro de 2006 (UU). 44. Do e-mail referido na alínea AA) dos factos assentes, junto a fls. 52 do processo disciplinar, consta, designadamente, o seguinte: "...solicito, mais uma vez que, nos termos da lei, providencie pela comparência da testemunha, por si arrolada, Dr. EE (ou junte, se achar conveniente, o respectivo depoimento escrito) bem como a junção aos autos do documento que protestou juntar. Também como lhe referi, quanto à testemunha BB, eu própria me encarregarei da respectiva comparência" (W). 45. O processo disciplinar foi enviado à Comissão de Trabalhadores no dia 5 de Junho de 2007 (XX). 46. […] o teor da declaração emitida pela Dr. EE, datada de 16 de Janeiro de 2007, junta a fls. 37 do processo disciplinar e onde consta designadamente o seguinte: 47. O horário de trabalho do Autor era das 13h45 às 21 h (de segunda-feira a quinta-feira) e das 12h30 às 21 h (às sextas-feiras) (AAA). 48. Na data em que foi admitido o Autor era detentor de carteira profissional (resposta ao item 1°). 49. Ao longo de mais de onze anos ao serviço da Ré, o Autor foi um profissional muito dedicado, cuja agenda de contactos e trabalhos realizados permitiram à RDP realizar iniciativas que marcaram presença no espectro das emissões radiofónicas, em Portugal e nos países membros da CPLP (resposta ao item 2°). 50. O Autor não impugnou o anterior processo disciplinar (resposta ao item 3°). 51. Até à data em que lhe foi instaurado o primeiro processo disciplinar, o Autor nunca tinha sido alvo de qualquer repreensão ou chamada de atenção por parte da Ré (resposta ao item 4°). 52. A 14 de Novembro de 2006, o Autor se dirigiu ao Centro de Saúde da Graça, onde foi visto por um médico que lhe passou o certificado de incapacidade temporária para o trabalho por estado de doença, junto ao processo disciplinar, a fls. 10 e 13 […] (resposta aos itens 8° e 9°). 53. À data da elaboração da nota de culpa a Ré sabia que o Autor era um trabalhador que com alguma regularidade se encontrava em situações de baixa médica (resposta ao item 12°). 54. A testemunha Dr. EE, médico de família do Autor, conhecia bem o estado de saúde deste (resposta ao item 13°). 55. A circunstância de voltar a enfrentar um processo disciplinar agravou o estado de saúde do Autor, tendo o Autor apresentado certificado de incapacidade temporária para o trabalho por estado de doença, junto ao processo disciplinar, a fls. 10 e 13 […] (resposta ao item 16°). 56. A sujeição a um processo disciplinar que culminou no despedimento provocou no Autor sofrimento e angústia que agravaram o seu estado de saúde (resposta ao item 17°). 57. O Autor tem vivido em estado de angústia (resposta ao item 18°). 58. Com o processo disciplinar a Ré atribuiu ao Autor factos que podem pôr em causa a sua imagem profissional (resposta aos itens 21° e 22°). 59.0 Autor construiu a sua imagem a pulso, ao longo dos anos, à custa de muita dedicação e esforço pessoal, tendo conseguido obter junto dos profissionais da sua área e das pessoas e entidades que ao longo da sua carreira profissional tem entrevistado grande consideração e reconhecimento profissional (resposta ao item 23°). 60. O Autor iniciou a sua carreira em 1979 (resposta ao item 25°). 61. O Autor veio a apresentar à Ré o certificado de incapacidade temporária para o trabalho por estado de doença, junto ao processo disciplinar, a fls. 10 […] (resposta ao item 27°). 62. No dia 13 de Novembro, conforme registo de presenças, o Autor esteve na empresa, na DRH (resposta ao item 28°) 63. No dia 14 de Novembro, o Autor entrou na empresa às 17h48, tendo apresentado uma Declaração de Presença em consulta médica das 15h30 às 16h35 (resposta ao item 29°). 64. Conforme consta do Registo de Presenças, o Autor, no dia 16 de Novembro, entrou na empresa às 20h15, não havendo registo de saída (resposta ao item 30°). 65. No dia 24 de Novembro entregou um outro documento de baixa destinado a cobrir o período de 15 a 22 de Novembro (resposta ao item 31°). 66. A Direcção onde o Autor estava colocado (RDP África) tomou conhecimento da ausência do Autor, no dia 9 de Novembro de 2006, quando a DRH lhe solicitou informação sobre o jornalista e a sua eventual apresentação ao serviço na RDP África (resposta aos itens 32° e 33°). 67. O documento junto a fls. 36 do processo disciplinar, destina-se a dar conhecimento ao Serviço de Processamento de Remunerações que um trabalhador terminou a suspensão (licença sem vencimento, requisição, etc.) do respectivo contrato devendo ser-lhe abonadas as remunerações devidas (resposta ao item 34°). 68. A Ré para a admissão para a categoria de jornalista estagiário na RDP exige que o candidato tivesse a posse de carteira profissional (resposta ao item 36°).
III. FUNDAMENTOS DE DIREITO. a) Quanto aos alegados danos não patrimoniais emergentes do despedimento. Sendo o despedimento declarado ilícito o trabalhador tem direito, para além da reintegração, a indemnização por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais causados (art. 436.º do CT). A obrigação de indemnizar, em sede de responsabilidade civil por facto ilícito, tem como suposição, para além da verificação do facto, que este seja imputável ao lesante a título de culpa e que exista um nexo de causalidade entre o mesmo facto (ilícito) e um resultado (danoso) (art.s 483º e 563º do CC). O primeiro requisito para que o facto ilícito seja gerador de responsabilidade civil é, pois, que o agente tenha assumido uma conduta culposa, que seja merecedora de reprovação ou censura em face do direito constituído. Como sucederá, em termos gerais, se o agente, na situação concreta, podia, e devia, ter agido de modo a não cometer o ilícito e não o fez. O nosso Código Civil, no tocante à culpa, quer no âmbito da responsabilidade extra-obrigacional (art. 487º, n.º 2), quer no da responsabilidade obrigacional (art. 799º, n.º 2) manda apreciá-la em abstracto, isto é, segundo «a diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso». Assim, existirá culpa sempre que o agente não proceda como procederia, no caso concreto, uma pessoa normalmente diligente. O segundo requisito para que o facto ilícito seja gerador de responsabilidade civil é que exista um nexo causal entre o facto praticado pelo agente e o dano, segundo o qual ele fica obrigado a indemnizar todos os danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão (art. 563º). A obrigação de indemnizar, em qualquer dos casos, tem por finalidade reparar um dano ou prejuízo, ou seja, «toda a ofensa de bens ou de interesses alheios protegidos pela ordem jurídica, tanto de carácter patrimonial (desvantagem económica), como de carácter não patrimonial (relativos à vida, à honra, ao bem estar, etc.)» [M J. Almeida Costa, in Noções Fundamentais de Direito Civil, 4ª ed., pg. 171]. Acresce que o «obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação» (art. 562º do CC). Sucede, porém, que a reparação não abrange, indiscriminadamente, todos e quaisquer danos, mas tão-somente os que se encontrem em determinada relação causal com o evento que fundamenta a obrigação de ressarcir. Com efeito, estipula o já citado art. 563.º do CC que «a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão». A nossa lei acolheu, nesta matéria, a doutrina da causalidade adequada, segundo a qual a causa juridicamente relevante de um dano será aquela que, em abstracto, se mostre adequada à produção desse dano, segundo as regras da experiência comum ou conhecidas do agente [vd. I. G. Telles, in Direito das Obrigações, 7ª ed., pg. 404. e ss.]. Temos, pois, que «a ideia fulcral desta doutrina é a de que se considera causa de um prejuízo a condição que, em abstracto, se mostra adequada a produzi-lo. Torna-se necessário, portanto, não só que o facto se revele, em concreto, condição “sine qua non” do dano, mas também que constitua, em abstracto, segundo o curso normal das coisas, causa adequada à sua produção» [M J. Almeida Costa, in Ob. Cit., pg. 172]. Verificada a existência de culpa e o nexo causal entre o facto praticado pelo agente e o dano, conclui-se existir obrigação de indemnizar, em sede de responsabilidade civil por facto ilícito, pelo que se impõe, então, com vista a determinar o quantitativo indemnizatório, avaliar os danos produzidos e aferir do grau de responsabilidade do autor da lesão, que terá de ser feita em função da sua maior ou menor culpabilidade, da situação económica deste e do lesado e das demais circunstâncias do caso (art. 494º). Note-se que é ao devedor que cabe provar que a falta de cumprimento ou cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua (art. 799º, n.º 1 do CPC.). E a obrigação de indemnizar é extensível aos danos não patrimoniais, pois estabelece o art. 496º/1 do CC, que «na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito», sendo que o n.º 3 do mesmo preceito, reportando-se à mesma indemnização, acrescenta que «o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso as circunstâncias referidas no art. 494º ...», ou seja, ou grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso. Como refere Galvão Telles, os danos não patrimoniais são aqueles «prejuízos que não atingem em si o património, não o fazendo diminuir nem frustrando o seu acréscimo. O património não é afectado; nem passa a valer menos nem deixa de valer mais. Há a ofensa de bens de carácter imaterial — desprovidos de conteúdo económico, insusceptíveis verdadeiramente de avaliação em dinheiro. São bens como a vida, a integridade física, a saúde, a correcção estética, a liberdade, a honra, a reputação. A ofensa objectiva desses bens tem, em regra, um reflexo subjectivo na vítima, traduzido na dor ou sofrimento, de natureza física ou de natureza moral» [In Direito das Obrigações, 7.ª edição, pg. 378]. No mesmo sentido alvitra Menezes Cordeiro que há dano moral quando a situação vantajosa prejudicada tenha simplesmente natureza espiritual [Direito das Obrigações, 1980, 2.º, pg. 285]. Dentro desta concepção, o ressarcimento por danos não patrimoniais não tem a natureza de uma verdadeira indemnização, dado não ser uma exacta contrapartida pelo dano, representando antes uma compensação a atribuir ao lesado por prejuízos por este sofridos, que não têm reparação directa através de satisfações de natureza pecuniária. Deste modo, se justifica que, no seu cálculo, se tenham em atenção, além da natureza e intensidade do dano causado, as outras circunstâncias do caso concreto que a equidade aconselha sejam tomadas em consideração [vd. Vaz Serra in R.L.J., Ano 113º, pág. 104]. Com a reparação por danos não patrimoniais tem-se em vista compensar de alguma forma o lesado, proporcionando-lhe os meios económicos que constituam, de certo modo, um refrigério para as mágoas e adversidades que sofrera e que, porventura, continue a suportar. E estes princípios respeitantes aos danos de natureza não patrimonial carecem de ser observados no âmbito do direito laboral por este nada de específico conter nesta matéria. Deste modo, em direito laboral, para haver direito à indemnização com fundamento em danos não patrimoniais, terá o trabalhador de provar que houve violação culposa dos seus direitos, causadora de danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, o que se verificará, em termos gerais, naqueles casos em que a culpa do empregador seja manifesta, os danos sofridos pelo trabalhador se configurem como objectivamente graves e o nexo de causalidade não mereça discussão razoável. No que concerne ao despedimento promovido pelo empregador que se venha a caracterizar de ilícito, para se aferir se o mesmo justifica, ou não, a condenação daquele por danos não patrimoniais é necessário tomar em consideração, antes de mais, que é inerente à cessação da relação laboral, indesejada pelo trabalhador, que esta cessação comporte para o mesmo trabalhador a lesão de bens de natureza não patrimonial, traduzida em sofrimento, inquietação, angústia, preocupação pelo futuro, etc. E isto independentemente, da licitude ou ilicitude do despedimento e de a entidade empregadora ter usado de maior ou menor precaução para obviar à lesão destes bens do trabalhador. Note-se que, independentemente da lesão destes bens da natureza espiritual, assiste direito à entidade empregadora de fazer cessar a relação laboral com um seu trabalhador, quando levada a efeito dentro do condicionalismo imposto pela lei, sendo que em tal situação dificilmente poderá ter cabimento uma indemnização por danos morais, a menos que se use, sem necessidade, de procedimento lesivo daqueles bens. Acresce que mesmo no caso de a entidade empregadora promover um despedimento ilícito do trabalhador, que, numa relação de adequada causalidade, produza danos não patrimoniais ao mesmo trabalhador, sempre haverá que indagar se, pelo grau de culpabilidade do empregador e pelo valor ou relevância dos danos, estes são dignos da tutela do direito. É que pode suceder que apesar de a entidade empregadora ter promovido um despedimento ilícito não patenteie um comportamento gravemente culposo, consideradas as circunstâncias envolventes desse despedimento. Por outro lado, sempre será necessário atentar em que os danos sofridos pelo trabalhador devem integrar uma lesão grave, que vá para além daquela que sempre acontece em situações similares de despedimento, porque o direito a indemnização com fundamento em danos não patrimoniais não é de admitir como regra, mas apenas no caso singular de haver uma justificação segura, que leve a concluir pela necessidade de reparar uma lesão que restaria apodicticamente não satisfeita. Assim, se se verificar que esses danos não patrimoniais não tenham especial relevo por se traduzirem nos que, comummente, se verificam em idênticas situações, como os do desgosto, da angústia e da injustiça, não se legitima a tutela do direito justificadora da condenação por danos não patrimoniais. Ora, no caso vertente e no que concerne aos alegados danos não patrimoniais, resultou provado o seguinte: A sujeição do Autor a um processo disciplinar que culminou no despedimento agravou o seu estado de saúde e provocou no mesmo sofrimento e um estado de angústia em que viveu. Com o processo disciplinar a Ré atribuiu ao Autor factos que podem pôr em causa a sua imagem profissional, sendo que o Autor construiu a sua imagem a pulso, ao longo dos anos, à custa de muita dedicação e esforço pessoal, tendo conseguido obter junto dos profissionais da sua área e das pessoas e entidades que ao longo da sua carreira profissional tem entrevistado grande consideração e reconhecimento profissional. Ora, em face da facticidade que resultou assente, é de concluir que não tem relevância bastante nem a culpa por parte da Ré nem os danos não patrimoniais sofridos pelo Autor, com vista a fundamentar uma condenação daquela em indemnização a favor do segundo. Antes de mais não se vislumbra que a Ré tenha instaurado o processo disciplinar de forma arbitrária e sem qualquer fundamento, quando é certo que no seu termo até veio a proferir o despedimento, no pressuposto de ter justa causa para o efeito. Não se evidencia, pois, a sua culpa. Por outro lado, o facto de o processo disciplinar ter provocado sofrimento e angústia ao Autor e agravado o seu estado de saúde, não oferece motivo bastante para fundamentar uma condenação em indemnização por danos não patrimoniais, por não se terem provado elementos concretos para aferir do relevo do sofrimento, da angústia e do agravamento da doença. Acresce que do facto de o Autor ser um profissional dedicado e com boa imagem junto dos profissionais da sua área e desta imagem poder ser colocada em causa pelo processo disciplinar, também não justifica uma condenação por danos não patrimoniais, por se estar perante uma mera eventualidade que, com o decorrer do tempo, não deixará de esmorecer, tanto mais sabendo-se que o despedimento foi declarado ilícito. Do que se conclui, sem necessidade de outros considerandos, que a Revista é de negar nesta parte, por a acção dever improceder quanto ao pedido de condenação por danos não patrimoniais. b) Quanto ao enquadramento profissional do Autor e ao invocado direito a diferenças salariais. Defende o Recorrente que se à data em que foi contratado pela Recorrida, em Abril de 1996, já era titular da carteira profissional de jornalista e desempenhando já as funções de jornalista desde 1979, não poderia a Recorrida ter-lhe atribuído a categoria profissional de jornalista estagiário, pois que Jornalistas Estagiários, nos termos do Estatuto dos Jornalistas, são as pessoas que ainda não são titulares da carteira de jornalista. Por entendimento contrário se bate a Recorrida na sua contra-alegação. Sobre esta matéria vem provado que: O Autor foi admitido ao serviço da RDP em Abril de 1996, mediante a celebração de um contrato de trabalho a termo certo e, desde a referida data, exerce, sob a autoridade, direcção e fiscalização da Ré, as funções de jornalista / redactor integrado na redacção da RDP – África; O Autor iniciou a sua carreira em 1979 e na data em que foi admitido ao serviço da Ré era detentor de carteira profissional, sendo que a Ré para a admissão para a categoria de jornalista estagiário na RDP exigia que o candidato fosse possuidor de carteira profissional; A Ré classificou o Autor como jornalista do Grau l - Nível 7 - Escalão 0 em Abril de 1998, tendo-o promovido ao Escalão 1 do mesmo Grau e Nível em Abril de 2001, e ao Escalão 2 em Abril de 2004. Como decorre dos factos o Autor sendo já possuidor da carteira profissional de jornalista foi admitido ao serviço da Ré como jornalista estagiário e apenas dois anos depois foi classificado como jornalista do Grau 1. Sucede, porém, que independentemente da experiência profissional do candidato à carreira ou da data em que o mesmo tenha obtido a sua carteira profissional, para a admissão na carreira/categoria profissional de jornalista a Recorrida exigia que o candidato fosse titular da carteira profissional de jornalista e a admissão na categoria fazia-se, sempre, no grau designado por jornalista estagiário. Sobre a questão em apreço pronunciou-se o Tribunal da Relação do seguinte modo: Ora, sufraga-se o entendimento perfilhado pelo tribunal recorrido. Com efeito, pelo simples facto de o Recorrente ser titular da carteira profissional de jornalista aquando da sua admissão ao serviço da Recorrida não lhe conferia o direito a um diferente enquadramento profissional, ou seja, ao de ser classificado como jornalista de Grau I. Na verdade, como vem provado, a Recorrida exigia para a admissão para a categoria de jornalista estagiário na RDP que o candidato fosse detentor de carteira profissional e esta exigência não conflituava com as normas do Estatuto dos Jornalistas vigente à época (Lei n.° 62/79, de 22.09) que se limitava a estipular os requisitos para o exercício da profissão de jornalista, não traçando quaisquer normas quanto ao enquadramento profissional do jornalista enquanto ao serviço de determinada empresa. Como salienta a Recorrida, o facto de alguém poder, nos termos das normas legais que regulam o acesso à profissão, exercer a profissão de jornalista não comporta o significado de ter direito a ser integrado numa certa categoria profissional, uma vez que a entidade empregadora no exercício do seu direito, constitucionalmente consagrado de livre iniciativa económica, é livre de exigir requisitos acrescidos para que um determinado trabalhador exerça a respectiva profissão na sua estrutura organizativa, integrado numa concreta categoria profissional. São, na verdade, realidades distintas as que se traduzem nas condições de acesso ao exercício de uma profissão de jornalista (reguladas no Estatuto dos Jornalistas) e as que consubstanciam as condições de acesso à categoria de jornalista na estrutura organizacional da empresa Recorrida. Enquanto de acordo com o Estatuto dos Jornalistas o jornalista estagiário é o candidato que frequenta um estágio com vista à obtenção da carteira profissional de jornalista e à concessão do direito de exercer a respectiva profissão, nos termos da relação laboral dos autos, jornalista estagiário é o trabalhador que se prepara, durante dois anos, para ingresso na categoria profissional de jornalista. Conclui-se, pois, que o Recorrente não tem direito ao enquadramento profissional que reclama, nem, consequentemente, às diferenças salariais peticionadas nos autos, pois que a admissão do Recorrente foi feita de acordo com as normas convencionais vigentes na Recorrida. Improcedem, por isso, as conclusões do recurso, sendo de manter a decisão recorrida. IV. DECISÃO: Em conformidade com os fundamentos expostos, nega-se a Revista e confirma-se a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.
Lisboa, 25 de Janeiro de 2012.
Pereira Rodrigues (Relator) Pinto Hespanhol Fernandes da Silva |