Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | OLIVEIRA MENDES | ||
Descritores: | ADMISSIBILIDADE DE RECURSO ACORDÃO DA RELAÇÃO DECISÃO QUE NÃO PÕE TERMO À CAUSA CRIME CONTINUADO PRESSUPOSTOS CONCURSO DE INFRACÇÕES CULPA CRIME FINS DAS PENAS FALSIFICAÇÃO MEDIDA CONCRETA DA PENA | ||
Nº do Documento: | SJ200609200044253 | ||
Data do Acordão: | 09/20/2006 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REC PENAL. | ||
Decisão: | PROVIDO O RECURSO. | ||
Sumário : | I - A decisão proferida pelo Tribunal da Relação na qual se entendeu negar provimento aos recursos interlocutórios não pôs termo à causa, pelo que não admite recurso para o STJ (cf. arts. 432º, al. b), e 400º, nº1, al.c), ambos do CPP). II. Na base do instituto do crime continuado encontra-se um concurso de crimes, pois que aquele se traduz objectivamente na realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico. III - Mas salienta-se uma diferença, que consiste em que, no caso de concurso heterogéneo, se limita o campo próprio do crime continuado à violação de várias normas incriminadoras que protejam essencialmente o mesmo bem jurídico, o que equivale a dizer que, por outro lado, se alarga a noção de concurso homogéneo consoante resultaria da distinção feita nas 1ª e 2ª partes do nº 1 do art. 30º do CP. IV - Na verdade, o concurso omogéneo, para efeitos do nº2 do art. 30º, compreende não só a plúrima violação da mesma norma incriminadora mas também a violação de diversas normas incriminadoras, desde que sejam da mesma espécie, isto é, protejam fundamentalmente o mesmo bem jurídico. V - Mas, como se vê da 2ª parte do nº2, do art. 30º do CP, o instituto do crime continuado exige também que aquele concurso (realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crimes) seja executado por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente: perante culpa significativamente diminuída entende o legislador apenas ser admissível um só juízo de censura, e não vários, como seria de fazer, o que alcança precisamente mediante a unificação jurídica em um só crime (continuado) de comportamento ou comportamentos que violam diversas normas incriminadoras ou a mesma norma incriminadora por mais de uma vez. VI - Para além disso, é condição prévia da possibilidade de se pôr o problema da continuação criminosa relativamente aos factos ilícitos típicos que visam tutelar bens eminentemente pessoais, a ofensa de uma só pessoa. VII - No que respeita à destrinça do crime único constituído por uma pluralidade de actos ou acções, são dois os critérios que têm sido seguidos e defendidos pela doutrina: o objectivo, que encontra na descontinuidade o critério distintivo, e o subjectivo, que tem por referência a intenção do agente - haverá crime único, com pluralidade de actos, caso ocorra unidade de desígnio e intenção criminosa; por sua vez, estaremos perante crime continuado se se verificar unidade de desígnio e pluralidade de resolução criminosa. VIII - Fazendo apelo à conjugação destes dois critérios têm-se orientado a doutrina e a jurisprudência alemãs, referindo Jescheck que «deve ter-se por verificada uma acção unitária quando os diversos actos parcelares correspondem a uma única resolução de vontade e se encontrem tão vinculados no tempo e no espaço que para um observador não interveniente são tidos como uma unidade» (Tratado de Derecho Penal, Parte General, 4ª edição, p. 648). IX - Entre nós, o Prof. Eduardo Correia parece ter-se inclinado no sentido do critério objectivo (mitigado, já que não prescinde de considerações de índole subjectiva, por certo face às dificuldades de prova sobre a intenção do agente), ao referir que «... verificado que entre as actividades do agente existe uma conexão no tempo tal que, de harmonia com a experiência comum e as leis psicológicas conhecidas, se deva presumir tê-las executado a todas sem renovar o respectivo processo de motivação, estamos em presença de uma unidade jurídica, de uma só infracção» (Unidade e Pluralidade de Infracções - Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz, p. 337). X - Por sua vez, a jurisprudência dos nossos tribunais superiores não é pacífica, enveredando-se numas decisões pelo critério subjectivo e noutras pelo objectivo. XI - Uma vez que o art. 30º do CP traduz o pensamento dp Prof. Eduardo Correia, propendemos a perfilhar o critério de distinção pelo mesmo proposto. XII - Resultando da factualidade apurada que: - o recorrente, UD, decidiu de forma livre e consciente, dedicar-se à contrafacção e à viciação de documentos e posterior venda a cidadãos estrangeiros sem autorização de permanência no espaço Schengen, com tal visando obter proventos económicos; - na concretização desse desígnio, pelo menos desde Julho de 2001, com a colaboração do co-arguido BJ, passou ao desenvolvimento material daquela actividade, contando ainda com a colaboração do arguido JR, que exercia a profissão de tipógrafo, bem como de outras pessoas que lhe forneciam documentos autênticos destinados a posterior adulteração, entre elas os arguidos BM e DT; - recebia encomendas de trabalhos de documentos contrafeitos ou viciados solicitados, entre outros, por indivíduos que se encontravam no estrangeiro, encomendas que eram dirigidas às suas residências na Damaia e Alfornelos e ao seu apartado em Lisboa, tendo fabricado e viciado inúmeros documentos (passaportes, bilhetes de identidade, cartas de condução, certificados de nacionalidade, etc.); - o núcleo daquela actividade de contrafacção e viciação de documentos processava-se na residência do recorrente sita na Idanha, local onde possuía o necessário material, designadamente impressos e carimbos - o recorrente abriu duas contas bancárias, uma na "Nova Rede", outra no "Bes", nas quais efectuou depósitos no valor de PTE 4.770.443$00 e PTE 12.475$00, respectivamente; - os arguidos UD e BJ, ao actuar como descrito, visaram e lograram desenvolver uma contínua actividade de fabrico de documentos de identificação como se autênticos fossem, actividade essa que prosseguiram desde as datas atrás mencionadas até ao momento da sua detenção à ordem destes autos, em 24-01-2001; - dúvidas não restam de que o arguido, entre Julho de 2000 e finais de Janeiro de 2001, se comportou, mediante resolução previamente tomada, de forma a realizar, repetidamente, factos integrantes do crime de falsificação de documento do art. 256º do CP, o que fez com propósito sempre renovado, de forma essencialmente homogénea e sob solicitação da mesma situação exterior, a qual propiciou a repetição ocorrida, evidenciando uma diminuição sensível da sua culpa, a significar que o comportamento do recorrente deve ser qualificado como integrante de um crime continuado de falsificação de documento p. e p. pelo art. 256º, nºs 1, al. a), e 3, do CP. XIII - A partir da revisão operada em 1995 ao CP, a pena passou a servir finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial, assumindo a culpa um papel meramente limitador da pena, no sentido de que em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa, sendo que dentro desse limite máximo a pena é determinada dentro de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico, só então entrando considerações de prevenção especial pelo que, dentro da moldura de prevenção geral de integração, a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa ou de intimidação ou segurança individuais: é este o critério da Lei Fundamental - art- 18º, nº 2 -, e foi assumido pelo legislador penal de 1995. XIV - Dentro da moldura penal abstracta correspondente ao crime de falsificação p. e p. pelo art. 256º, nºs 1, al.a), e 3, do CP, ou seja, a de prisão de 6 meses a 5 anos ou multa de 60 a 600 dias, e tendo em consideração que: - o crime de falsificação de documento é um crime de perigo abstracto, formal e de mera actividade, que tutela a verdade intrínseca dos documentos enquanto tal, ou seja, a segurança no tráfico jurídico atinente aos documentos, traduzida na perpetuação da declaração nele inserta e na garantia de que o seu conteúdo é verdadeiro; - o grau de ilicitude dos factos é elevado, sendo que o recorrente os executou de forma profissionalizada, com o que obteve avultados proventos, o que acentua as necessidades de prevenção especial; - as suas consequências não podem deixar de se considerar de gravidade considerável, atenta a natureza e quantidade dos documentos falsificados, o que acentua as exigências de prevenção geral; - o dolo é intenso; - o recorrente é casado e tem 4 filhos, 2 dos quais menores; - confessou parcialmente os factos; - nunca foi objecto de censura penal; - atenta a multiplicidade e gravidade das condutas criminosas, é evidente que só a pena detentiva realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição arts. 70º e 40º, nº1, do CP); - tudo ponderado, sem esquecer que a circunstância de o facto englobar inúmeras acções criminosas constitui um factor de agravação, entende-se fixar a pena de 5 anos de prisão. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Após a realização de contraditório no âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 625/99, da 4ª Vara Criminal de Lisboa, foi proferido acórdão que condenou o arguido AA, com os sinais dos autos, pela prática de cinquenta e um crimes de falsificação de documento, previstos e puníveis pelo artigo 256º, n.ºs 1, alínea a) e 3, cinco crimes de falsificação de documento, previstos e puníveis pelo artigo 256º, n.º 1, alínea a), e cinco crimes de falsificação de documento, na forma tentada, previstos e puníveis pelos artigos 256º, n.º1, alínea a) e 3, 22º, 23º e 73º, todos do Código Penal, na pena de 10 meses de prisão por cada um dos primeiros cinquenta e um crimes, 7 meses de prisão relativamente a cada um dos cinco segundos crimes e 6 meses de prisão por cada um dos últimos cinco crimes. Em cúmulo jurídico foi o arguido condenado na pena conjunta de 8 anos de prisão (1). Desta decisão interpôs recurso o arguido, sendo do seguinte teor a parte conclusiva da respectiva motivação (2): 1. Antes de mais, e dando cumprimento ao disposto no artigo 412º, n.º 5, o recorrente refere que mantém interesse no recurso por si interposto a fls.3517 (datado de 4 de Junho de 2002), tendo sido admitido por douto despacho judicial de 14JUN2002, de fls.3557), recurso esse que se encontra retido, a aguardar o presente e com o mesmo deverá subir a este Tribunal. 2. No que ao crime continuado respeita, ensina-nos o Prof. Eduardo Correia ("Direito Criminal", vol. 2, pág. 210 e 211) que "pressuposto da continuação criminosa será verdadeiramente a existência de uma relação que, de fora, e de maneira considerável, facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comporte de maneira diferente, isto é, de acordo com o direito". 3. No caso dos autos, para além do facto do arguido ter-se apetrechado tecnicamente para a consecução de falsificações (o que facilita a continuidade criminosa), a procura incessante, por banda de cidadãos estrangeiros indocumentados a residir em território português, de documentos facilitava e até incentivava àquela continuidade. 4. Havendo claras e evidentes responsabilidades do poder político na existência de tantos e tantos cidadãos estrangeiros ilegais, que procuram melhores condições de vida! 5. Entende-se que, in casu, com o decorrer do tempo e a procura existente de documentos falsos, era cada vez menos exigível que o recorrente se comportasse de outra forma, isto é, que deixasse de falsificar documentos. 6. É entendimento do recorrente ser de aplicar à matéria de facto dada como provada o disposto no artigo 30º, n.º 2, do Código Penal. 7. O Tribunal recorrido violou tal disposição legal, não tendo interpretado e aplicado como o deveria ter feito, ou seja, no sentido agora descrito pelo recorrente. 8. Não sendo este o entendimento de V. Ex.ªs, sempre o arguido deverá ser condenado pela prática de um único crime de falsificação agravada de documento, atendendo à "unidade típica de acção em sentido amplo", designação defendida por Jescheck. 9. Sendo certo que o arguido se propôs a uma actividade de falsificação de documentos, manteve esse dolo ao longo do tempo no projecto por si inicialmente empreendido, violando sempre de forma unitária o mesmo tipo de crime - situação motivacionalmente unitária. 10. O acórdão recorrido não invoca qualquer circunstância que, não fazendo parte do tipo de crime, deponha a favor ou contra o arguido, e nomeadamente as descritas no n.º 2 do artigo 71º do Código Penal. 11. A ilicitude pode considerar-se normal para o tipo de ilícito, a motivação do crime prendeu-se com a impossibilidade do arguido poder pôr em funcionamento o estabelecimento comercial que havia trespassado (era uma mercearia - pequeno comércio que não resiste às "Grandes Superfícies") e que pretendia alterar para churrascaria. 12. As condições pessoais do arguido são-lhe favoráveis, confessou o crime, é primo delinquente, está integrado social, familiar e profissionalmente, contando agora com a legalização do referido estabelecimento comercial, para onde poderá ir trabalhar quando regressar à liberdade. 13. O acórdão recorrido, na ausência de quaisquer referências concretas, violou o disposto no artigo 71º, n.ºs 1 e 2, alíneas a), c) e d), do Código Penal. 14. Não bastando referir, de forma genérica como o fez, aquela disposição legal, antes impondo-se uma concretização relativamente ao caso do ora recorrente. 15. Deveria o Tribunal recorrido ter interpretado e aplicado no sentido por nós atrás explanado, os factos dados como provados ao normativo referido e dessa forma... 16. Condenar o recorrente AA em pena de prisão unitária que não fosse além dos 5 anos (cinco) anos de prisão, e dessa forma alcançar a plena reintegração social do mesmo. O recurso foi admitido. Na contra-motivação apresentada a Exm.ª Procuradora da República concluiu: 1. O arguido AA aceitou a matéria dada por provada nos autos em apreço. 2. Dos factos tidos por provados na decisão impugnada não se alcança que o arguido, ora recorrente, tenha actuado de forma "essencialmente homogénea" durante o período de oito meses durante o qual praticou as viciações de documentos. 3. Muito pelo contrário, extrai-se desses factos a forma como, ao longo do tempo, o arguido foi adequando a sua conduta de forma a ter sucesso com a mesma. 4. Ainda que lhe tivesse sido dito que existiria uma investigação em que tinha sido referido o seu nome, mostrou-se indiferente e invocou a protecção divina para continuar a praticar os factos que se veio a provar que praticou. 5. Dos ditos factos não de retira, também e ainda, que este arguido, ao praticar os mesmos tenha actuado a coberto de condições que lhe eram alheias, que lhe facilitaram as condutas e atenuaram a medida da sua culpa. 6. Não existem no douto acórdão censurado factos dados pro provados que suportem a integração das condutas detidas pelo arguido AA no disposto no artigo 30º, do Código Penal. 7. Daí que, e bem, no douto acórdão em causa, lhe tenha sido imputada a prática de 56 crimes de falsificação de documento, na forma consumada, e outros cinco crimes de falsificação, na forma tentada. 8. Na realidade, o arguido AA violou a norma prevista pelo artigo 256º, do Código Penal, tantas vezes quantas pôs em crise a fé pública de cada um dos 61 documentos que viciou e tentou viciar, de todas elas estando perfeitamente ciente que o fazia, defraudando o Estado e terceiros. 9. Não incorre, pois, o douto acórdão visado, em qualquer violação da norma contida no artigo 30º, do Código Penal. 10. Muito se estranha a posição tida pelo arguido ora recorrente no ponto em que, pretendendo ser condenado por um único crime de falsificação de documento, ache justa e adequada uma pena de cinco anos de prisão (máximo legal permitido). 11. O arguido tem, justiça lhe seja feita, consciência da gravidade que revestiu toda a sua conduta e sabe que a pena a alcançar para a mesma terá de corresponder a tal gravidade. 12. Mais benévolo foi o Tribunal Colectivo que, em cúmulo jurídico, lhe aplicou a pena única de oito anos de prisão. 13. E fê-lo, obedecendo, como sempre, a uma interpretação rigorosa dos artigos 70º e 71º, do Código Penal, mas valorando significativamente as condições pessoais do arguido. 14. Não violou a decisão recorrida o disposto no artigo 71º, do Código Penal, ou qualquer outro, aliás 15. A medida da pena em concreto aplicada a este arguido é justa e, por seu intermédio, se alcançam os fins que a lei quer ver preenchidos no caso em apreço. 16. Impõe-se, assim, que seja mantido, nos seus precisos termos, o douto acórdão censurado, como que farão Vossas Excelências, aliás, como sempre, Justiça. Na vista que teve nos autos o Exm.º Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal considerou nada obstar ao conhecimento do recurso. Relativamente ao recurso que incidiu sobre a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, decisão que apreciou os recursos interlocutórios interpostos pelo arguido na fase de instrução, aos quais já fizemos referência em nota de rodapé, deixou-se consignado no exame preliminar ser o mesmo de rejeitar, decisão que, por razões de celeridade e de economia processual, se relegou para audiência. Certo é que o Ministério Público, quer no Tribunal da Relação de Lisboa, quer neste Supremo Tribunal, pronunciou-se no sentido da rejeição daquele recurso. Colhidos os vistos e realizada a audiência, cumpre decidir. Questão prévia que cumpre decidir é a da rejeição do recurso interlocutório. Segundo preceito do artigo 420º, n.º 3, do Código de Processo Penal (3), em caso de rejeição do recurso, o acórdão limita-se a identificar o tribunal recorrido, o processo e os sujeitos processuais e a especificar sumariamente os fundamentos da decisão. Especificando sinteticamente os motivos da rejeição, dir-se-á. Estabelece o artigo 432º, alínea b), do Código de Processo Penal, que se recorre para o Supremo Tribunal de Justiça das decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas relações, em recurso, nos termos do artigo 400º. Por outro lado, preceitua o artigo 400º, n.º1, alínea c), que não é admissível recurso dos acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que não ponham termo à causa. A decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, na qual se entendeu negar provimento aos recursos interlocutórios e que ora se pretende seja sindicada por este Supremo Tribunal, obviamente que não pôs termo à causa. A inadmissibilidade do recurso é motivo de rejeição - artigos 420º, n.º1 e 414º, n.º 2, do Código de Processo Penal -, sendo certo que a decisão que admite o recurso, que determina o efeito que lhe cabe e o regime de subida não vincula o tribunal superior - artigo 414º, n.º 3. Deste modo, há que rejeitar o recurso em apreço. Entrando no conhecimento do recurso da decisão final verifica-se que o recorrente nas conclusões que extraiu da motivação apresentada submete à apreciação e julgamento deste Supremo Tribunal as seguintes questões: a) Incorrecta qualificação jurídica dos factos; b) Desajustada dosimetria da pena. O tribunal colectivo considerou provados os seguintes factos (4) : 1.º A partir de data que não foi possível determinar, mas desde pelo menos Junho de 2000, o arguido AA decidiu, de forma livre e consciente, dedicar-se à viciação e contrafacção de documentos e posterior venda dos mesmos a terceiros, designadamente, junto de cidadãos estrangeiros sem autorização de permanência no espaço Schengen, para assim obter proventos económicos. 2.º Desde pelo menos 18 de Julho de 2000, passou a contar no desenvolvimento dessa actividade, com a colaboração do arguido ...., que inteirado dos fins e propósitos por si prosseguidos, passou a actuar em comunhão de esforços e finalidades com o 1.º arguido, coadjuvando-o na recepção de pedidos, entrega de documentos contrafeitos, na realização de contactos tendentes à aquisição de documentos para contrafacção futura, bem como nas operações materiais conducentes à sua própria adulteração física. 3.º O núcleo do desenvolvimento material da referida actividade funcionava na residência situada na Rua Doutor Egas Moniz, n.º ....º, Recuado, na Local-B, local onde para o efeito o arguido AA, e desde a data acima mencionada, aquele e o arguido ...e reuniam, guardavam e recepcionavam os dados de cada um dos indivíduos que para tanto os contactavam e efectuavam as operações de contrafacção e adulteração dos documentos. 4.º Uma vez que para a consecução de tal actividade o arguido AA necessitava de impressos oficiais em branco contrafeitos, designadamente de bilhetes de identidade, cartas de condução, autorizações de residência, contactou telefónica e pessoalmente o arguido BB no sentido de os fornecer. 5.º Este, com efeito, desenvolvia a sua actividade de tipógrafo num estabelecimento desta indústria situado no Local-C, n.º s....e..., em Lisboa, do qual é proprietário. 6.º Ciente da finalidade a que se destinavam, e da sua aplicação futura na respectiva viciação final, o arguido BB aceitou realizar e satisfazer alguns desses pedidos, tendo fornecido ao arguido AA pelo menos, impressos em branco de cartas de condução para veículos automóveis e material para plastificação de documentos. 7.º Os arguidos AA e ..., recorreriam ainda a outras pessoas, para lhes fornecerem documentos autênticos destinados a posterior adulteração, normalmente obtidos junto de indivíduos, maioritariamente, toxicodependentes, interessados na cedência de documentos, quer próprios quer de outros, em troca de quantias variáveis em dinheiro, ou ainda no "mercado" alimentado pelo furto e receptação. 8.º De entre os arguidos, foi possível apurar apenas o fornecimento de dois passaportes ao 1.º arguido por parte do CC e conversas envolvendo a eventual transacção de três passaportes àquele, por parte do arguido DD. 9.º O arguido AA recebia ainda encomendas de trabalhos de documentos contrafeitos ou viciados solicitadas por indivíduos que se encontravam fora do nosso território continental. 10.º Designadamente, dirigidas para o seu apartado com o n.º 22609 - 1146 Lisboa Codex, sediado na estação dos "CTT - Correios de Portugal", da Endereço-B, em Lisboa. 11.º A sua residência situada na Endereço-C à Latino Coelho, n.º ..., na Damaia, serviu pontualmente também para a recepção de pedidos ou documentos. 12.º O mesmo sucedendo com a residência do arguido AA situada na Rua Damião de Gois, n.... em Alfornelos. 13.º Na posse dos documentos (bilhetes de identidade, passaportes, cartas de condução, autorizações de residência, certidões) obtidos da forma que ficou descrita, e de acordo com as instruções dos arguidos que os solicitavam ou dos próprios clientes directos, o arguido AA e .... (este último coadjuvando-o nos termos consignados), procediam à substituição das respectivas fotografias originais por outras pertencentes a pessoas sem documentos e/ou sem autorização de permanência em território nacional, as quais lhes pagavam quantias em montante variável, dependendo do tipo de documento. 14.º Tais arguidos, porém, executavam igualmente contrafacções integrais de bilhetes de identidade, cartas de condução, autorizações de residência, certidões e certificados de nacionalidade. 15.º Para execução dos aludidos documentos os arguidos AA e ..... detinham carimbos, impressos e demais materiais destinados ao fabrico dos documentos pretendidos. 16.º Para o desenvolvimento da referida actividade, e sempre que necessário, os arguidos estabeleciam contacto através de telemóveis, designadamente para os números 96 506 13 30 do AA e 96 512 70 48 do ..... 17.º Para além do que abaixo melhor se irá descriminar, foi apreendido na mencionada residência situada na Rua Professor Egas Moniz, n...., ....º andar, recuado, na Idanha, um passaporte português com o n.º F 535462, em nome de FF, em que foi substituída a fotografia do seu real titular. 18.º No mesmo local foi apreendido o bilhete de identidade de cidadão Português n.º 10507790 de GG, documento este autêntico, destinado a ser utilizado pelo 1º ou 2º arguidos, em posteriores adulterações. 19.º Com efeito, no dia 24 de Janeiro de 2001, foi realizada uma busca à residência situada na Rua Professor Egas Moniz, n...., .... andar Dtº, Recuado, na Idanha, no decurso da qual se apreenderam os artigos e documentos que a seguir se descriminam: ·Máquina de escrever eléctrica de marca "Olivetti" com o n.º de série 9562585 e respectiva margarida - "Micron 15" da marca "CSA"; ·Seis (6) "margaridas" para a máquina de escrever acima referida; ·Lâmpada "negra" própria para detectar documentos falsos (que servia para detectar documentos falsos através da reacção ou não à luz "negra"); ·Balancé de selo branco com o cunho (falso) da "Direcção Geral de Viação"; ·Balancé de selo branco com o cunho (falso) do "Ministério da Administração Interna - SEF"; ·Cinco carimbos com o cunho (falso) do "Ministério da Administração Interna - SEF"; ·Balancé de selo branco com o cunho (falso) da "Direcção de Serviços de Identificação Civil"; ·Dois (2) numeradores metálicos, próprios para numerar documentos, que serviam para apor numerações em documentos falsos ou falsificados; ·Máquina própria para plastificar documentos de marca "Ibico" modelo "Laminator ML-4" (que servia para proceder à plastificação dos documentos falsos ou falsificados, designadamente de Bilhetes de Identidade); ·Diverso material cortante (facas; X-actos) e de desenho (réguas, compassos), que serviam para proceder aos trabalhos de falsificação dos documentos; ·Laminados (falsos) próprios para plastificar bilhetes de identidade (com filete de segurança); ·Impressos (falsos) de bilhetes de identidade de cidadão estrangeiro em branco; ·Impressos (falsos) de bilhetes de identidade de cidadão nacional em branco ou já preenchidos; ·Impressos (falsos) de carta de condução em uso em Portugal, modelo CE (em branco ou preenchidas); ·Impressos de carta de condução em uso na Guiné; ·Impressos de autorização de residência para cidadão estrangeiro a residir em Portugal (em branco e preenchidas), sendo que cinco deles são falsos, e um autêntico, embora se encontre falsificado por substituição da fotografia do seu legítimo titular; ·Impressos de Livrete de automóveis em uso em Portugal (em branco); Passaportes emitidos pelos serviços da República Portuguesa, cujas fotocópias constam de fls. 3 a 15 do Apenso ao Anexo O: Bilhetes de Identidade emitidos pelos serviços da República Portuguesa, cujas fotocópias constam de fls. 16 a 19 e 27 e 28 do Apenso ao Anexo O: Autorizações de Residência da República Portuguesa, cujas fotocópias constam de fls. 20, 21 e 23 a 25 do Apenso ao Anexo O: Cartas de Condução da República Portuguesa, cujas fotocópias constam de fls. 26 do Apenso ao Anexo O: 20.º A maior parte das fotografias apreendidas nesta residência, ainda que em número que não foi possível precisar concretamente, destinavam-se a ser utilizadas pelos arguidos AA e ..., na realização de documentos em que inseririam as menções pretendidas pelos seus "clientes", deles fazendo constar os elementos de identificação que esses mesmos "clientes" lhes forneciam. 21.º Os documentos autênticos destinavam-se a ser falsificados, v. g. através da substituição da fotografia, e posteriormente vendidos a terceiros, que não os respectivos titulares. As "notas" com identificações, correspondem a pedidos especificando as menções que se pretendiam ver apostas. 22.º Para além do mais que abaixo se descriminará, veio a ser apreendida na sequência da busca levada a cabo à residência de ..., situada no Impasse da Oca n...., no Cacém, a fotocópia do bilhete de identidade de AA34. 23.º Veio ainda a ser apreendido nesta mesma residência, um bilhete de identidade com o n.º 7132657, em nome de AA35, não tendo sido possível apurar o modo pelo qual vieram ali a surgir estes dois documentos. 24.º Com efeito, no já referido dia 24 de Janeiro de 2001, foi realizada busca domiciliária em casa pertencente ao arguido .... e respectiva arrecadação, situada no Impasse da Oca n...., no Cacém, onde foram encontrados e apreendidos os documentos que a seguir se descriminam:
Bilhetes de Identidade emitidos pelos serviços da República Portuguesa, cujas fotocópias constam de fls. 133 a 155 do Anexo D: Fotocópia do Bilhete de Identidade de AA103; Fotocópia do Bilhete de Identidade de AA104; Fotocópia do Bilhete de Identidade de AA105; Fotocópia do Bilhete de Identidade de AA106; Fotocópia do Bilhete de Identidade de AA107; Fotocópia do Bilhete de Identidade de CC; Passaportes emitidos pelos serviços da República Portuguesa, cujas fotocópias constam de fls. 2 a 20 do Anexo F: Cartas de Condução emitidas pelos Serviços da República Portuguesa, cujas fotocópias constam de fls. 156 a 167 do Anexo D: Diversos documentos titulados por AA91: 25.º No dia 06/11/1998, o arguido ... deslocou-se ao CICC e requereu a renovação do Bilhete de Identidade n.º 10005280, em nome de AA100, tendo logrado convencer os funcionários que o atenderam que se tratava do verdadeiro titular daquela identidade, razão por que foi emitido o bilhete de identidade solicitado, com a fotografia do arguido. 26.º No dia 31/03/1999, o arguido .... voltou a requerer a renovação do Bilhete de Identidade n.º 10005280, em nome de AA100. 27.º De posse do referido bilhete de identidade o arguido passou a utilizá-lo sempre que tal era necessário, exibindo-o como se tratasse do seu documento de identificação, tendo dessa forma obtido cartão de contribuinte fiscal, também este emitido a favor de AA100. 28.º A partir de data que não foi possível determinar, mas desde pelo menos o Verão do ano de 2000 e até o momento da sua detenção, o arguido AA169 passou a dedicar-se à "intermediação" na obtenção de documentos falsos por parte de pessoas que a ele recorriam para lograrem a sua obtenção, auferindo desse modo quantias monetárias variáveis, que não possível apurar. 29.º Para o efeito, contactava as pessoas que sabia efectuarem tal tipo de contrafacções, recebia os impressos para a aposição da respectiva impressão digital por parte dos interessados, quando tal era necessário, transmitia os respectivos dados identificadores e/ou fotografias, assegurava a sua entrega final a quem os pedia, recebia e pagava as quantias atinentes ao tipo de documento solicitado. 30.º No desenvolvimento de tal actividade, no período de tempo assinalado, veio a solicitar ao arguido AA a realização de pelo menos 6 (seis) bilhetes de identidade nessas condições. 31.º O que aquele arguido veio a satisfazer e a produzir. 32.º O arguido AA169 dedicou-se, igualmente, a adquirir documentos originais tendo em vista a sua venda futura a eventuais interessados em utilizá-los na sua contrafacção e viciação. 33.º Em data não concretamente determinada, mas que se situa nos anos de 1997 a 2000, o arguido AA169 adquiriu e utilizou, após substituição das respectivas fotografias originais, documentos de identificação civil e fiscal de AA170 (Bilhete de Identidade), de AA171 (Passaporte e Carta de Condução) e de AA172 (Bilhete de Identidade e Carta de Condução). 34.º 35.º Este cartão de crédito emitido em nome de AA171, titular do Bilhete de Identidade n.º 10676315, foi solicitado adicionalmente a outro cartão de crédito emitido anteriormente em nome AA170.36.º O B. I. correspondente a esta última identificação foi utilizado em condições e por pessoa que não foi possível determinar, na celebração de alguns contratos com operadores de serviços de Comunicações Móveis Terrestres (entre as quais a TELECEL e a TMN) e com entidades financeiras para adquirir financiamentos que posteriormente nunca foram amortizados, surgindo ainda numa multa respeitante a condução automóvel. 37.º Foi ainda utilizada por pessoa que não foi possível apurar, a pedido e no interesse do arguido AA169, na aquisição de uns sofás para este último. 38.º Por seu lado, na operação de busca domiciliária efectuada também no referido dia 24, na residência do arguido AA169, situada na Praceta Manuel Faria, n...., 2º Dtº, em Local-M, bem como do interior da sua viatura da marca Peugeot, foram apreendidos:
Passaportes emitidos pelos serviços da República Portuguesa, cujas fotocópias se encontram de fls. 876 a 879 dos Autos: Impressos de Bilhete de Identidade supostamente emitidos pelos serviços da República Portuguesa, cujas fotocópias constam de fls. 868 a 875 dos Autos:
Diversos papéis contendo identidades de indivíduos: Outros documentos relevantes: 39.º Estas última fotografias que estavam na sua posse, foram enviadas pelos retratados com o objectivo de serem utilizadas em documento falsos ou falsificados. 40.º Os documentos autênticos, destinavam-se a ser vendidos a terceiros interessados na sua contrafacção. 41.º 42.º Em contrapartida recebia aquele o dinheiro necessário para o seu consumo de estupefacientes, pagamento da gasolina e tabaco.43.º Tais toxicodependentes vendiam depois os seus passaporte ao referido "..." - AA191 44.º Que por sua vez veio a vender um número de passaportes que não foi possível apurar ao arguido AA.45.º Na parte final do período acima referido, mas ainda no decurso do mesmo ano de 2000, o arguido CC sabendo que alguns dos passaportes obtidos pelo "..." eram vendidos ao arguido AA, resolveu ele próprio passar a angariar por sua conta e iniciativa a obtenção dos mesmos, tendo em vista a sua venda directa por ele ao 1.º arguido ou ao .... 46.º Quando os tinha na sua posse, contactava telefonicamente, quer um, quer outro, no sentido de lhes propor a venda dos documentos e de acordarem o local onde ocorreria o encontro para a sua entrega. 47.º Nesses contactos telefónicos utilizava o nome de "AA42" e não a sua verdadeira identidade, por forma a ser mais difícil a sua identificação.48.º Assim, enquanto "trabalhou" para o "....", o arguido CC transportou ao Governo Civil, nas condições supra descritas um número não precisamente determinado de pessoas, mas situado entre as 80 e as 100, e quando passou a angariar directamente passaportes, obteve e entregou pelo menos dois destes documentos. 49.º Desde pelo menos a segunda quinzena de Julho de 2000 até meados do mês de Novembro do mesmo ano, a arguida AA192, conhecendo a actividade atrás descrita desenvolvida pelo arguido AA, a troco de quantias variáveis situadas entre os três e os cinco mil escudos, ou géneros alimentício ou fraldas, veio a solicitar-lhe a elaboração de diversos documentos contrafeitos ou adulterados, para tanto lhes endereçando o respectivo pedido, transmitindo os dados necessários ao seu preenchimento, recebendo os respectivos impressos para aposição das impressões digitais, quando necessárias, e recebendo e entregando fotografias e/ou quantias atinentes à remuneração de tais trabalhos. 50.º Por vezes tais contactos foram efectuados com o arguido ... ...., cuja actividade e actuação conjunta com o 1.º arguido conhecia perfeitamente.51.º Assim, no período compreendido entre as datas acima mencionadas, veio a arguida AA a colaborar na produção final de pelo menos seis bilhetes de identidade e três passaportes. 52.º Desde pelo menos 17 de Julho de 2000 e até 19 de Novembro do mesmo ano, a arguida AA194, conhecendo a actividade de contrafacção desenvolvida pelo arguido Ussumane, a solicitação de pessoa do sexo feminino, cuja identidade não foi possível determinar, veio a receber e transmitir-lhe o pedido de realização de uma autorização de residência, para tanto indagando e comunicando o respectivo preço, entregando as fotografias ao 1.º arguido e assegurando a recepção e entrega entre aquele e a interessada, quer do dinheiro para a respectiva remuneração, quer do documento efectuado. 53.º O mesmo tipo de conduta veio a suceder, pelo menos, em relação a pessoa do sexo masculino oriunda da Guiné, tendo nessa conformidade o arguido AA produzido mais duas outras "autorizações de residência", sendo que uma delas foi devolvida, por inexactidão dos dados por aquele apostas.54.º A solicitação desta mesma pessoa, a arguida AA194 veio a contactar o arguido AA indagando preços para a realização de documentos.55.º No já mencionado dia 24 de Janeiro, foi realizada busca na residência sita na Endereço-C à Latino EE, n.º 16, Local-E, onde morava, entre outros, o arguido ...., tendo sido encontrado: Doze (12) duplicados de envio de dinheiro via "Western Union, do "BPA" cujo remetente é .... .... e o destinatário é ....; Três (3) duplicados de envio de dinheiro via "Western Union, do "BPA" cujo remetente é .... .... e o destinatário é .... ... ....; Dois (2) duplicados de envio de dinheiro via "Western Union, do "BPA" cujo remetente é ..... e o destinatário é ....; Um (1) duplicado de envio de dinheiro via "Western Union, do "BPA" cujo remetente é .... e o destinatário é .... ....; Um (1) duplicado de envio de dinheiro via "Western Union, do "BPA" cujo remetente é .... .... e o destinatário é ... ....; Dois (2) duplicados de envio de dinheiro via "Western Union, dos "CTT" cujo remetente é .... ... e o destinatário é .... ....; 56.º A soma dos valores monetários enviados via "Western Union" referidos anteriormente totaliza a quantia correspondente a 5.104.225$00 e o envio da mesma insere-se no período temporal compreendido entre Janeiro de 2000 e Janeiro de 2001. 57.º Para além destes movimentos monetários, foram ainda apreendidos na posse do arguido ..... ..... diversos talões emitidos por estabelecimentos de câmbio de dinheiro situados na cidade de Lisboa, os quais totalizam o valor monetário correspondente a 4.224.240$00, durante o período temporal compreendido entre os meses de Março e Novembro do ano de 2000. 58.º O arguido Bubacar Saco tinha ainda em seu poder uma Carta de Condução da República da Guiné Bissau, com o n.º C 040462, emitida em nome de ... ...., a qual lhe foi apreendida, e após exame pericial efectuado pelos serviços do Laboratório de Polícia Científica foi possível concluir que se trata de um documento integralmente falso. 59.º No período compreendido entre os meses de Setembro e Novembro de 2000, o arguido AA183, conhecendo a actividade desenvolvida pelos arguidos AA e ... ...., veio a com eles contactar no sentido da obtenção de documentos contrafeitos para terceiros, para tanto endereçando os respectivos pedidos, fornecendo os dados identificativos necessários, recepcionando os impressos para aposição digital, recebendo os documentos produzidos e transmitindo as quantias correspondentes ao seu pagamento.60.º Através da sua colaboração nos termos expostos, vieram a ser produzidos pelos dois primeiros arguidos, pelo menos seis passaportes, três cartas de condução e dois bilhetes de identidade.61.º Em período de tempo que não possível apurar com precisão, mas situado entre os meses de Outubro/Novembro de 2000, a arguida AA196, já inteirada da actividade desenvolvida pelo arguido AA, desenvolveu os contactos exploratórios tendentes a saber os preços e assegurar a sua apresentação a uma pessoa sua conhecida, que para poder trabalhar em Portugal, pretendia a realização de um passaporte ou de um bilhete de identidade. 62.º O que o 1.º arguido veio a satisfazer. 63.º Igualmente, e a pedido de um amigo da pessoa atrás mencionada, veio a contactar uma vez mais o arguido AA para a "produção" de um outro bilhete de identidade, em que para além do pedido propriamente dito e da indagação do preço, forneceu ao 1.º arguido as fotografias que haveriam de ser apostas no referido documento. 64.º Em inícios de Maio do ano 2000, AA17, foi abordada pelos arguidos AA197 e AA198, os quais lhe propuseram a emissão e posterior venda do seu passaporte mediante o recebimento da quantia monetária correspondente a 15.000$00, o que esta aceitou. 65.º Estes arguidos, ao adquirirem o passaporte em causa visavam vendê-lo a terceiro. 66º O que acabaram por fazer. 67.º Admitindo que tal documento pudesse entrar no circuito da falsificação, conformaram-se com tal possibilidade. 68.º Não foi possível conhecer o destino do passaporte. 69.º No período compreendido entre Agosto e finais de Outubro de 2000, o arguido DD, conhecendo a actividade desenvolvida pelo arguido AA, solicitou-lhe a produção de um documento cuja natureza não foi possível especificar, o que aquele veio a satisfazer. 70.º De igual modo, e por duas vezes, procurou vender-lhe passaportes (pelo menos três, no total), sabendo o mesmo que aquele os pretendia para depois os adulterar e viciar, procurando, dessa forma, o arguido DD obter benefícios económicos. 71.º Na maior parte das vezes os arguidos nos contactos telefónicos que estabeleciam entre si, não utilizavam os nomes próprios. 72.º Assim o arguido AA identificava-se por vezes como "Gambia", o arguido ... por "...., o arguido CC por "AA42", o arguido ... ".... AA86", o arguido ... AA183 por "Lema", o arguido ... por "...", a arguida AA192 por "AA193", a arguida AA196 por "AA196", a arguida AA194 por "....", o arguido AA169 por "..." e o arguido DD por "....". 73.º Da mesma forma utilizavam também expressões com significado de conhecimento restrito, como sejam: "Book" - que significa passaporte; "Bombar"- que significa falsificar; "Joni" - que significa bilhete de identidade; "Amarelo" - que significa bilhete de identidade. 74.º O arguido AA é proprietário com AA19 da residência sita na Endereço-C à Latino EE, n.º ...., na Local-E. 75.º O arguido AA é proprietário da residência sita na Rua Damião de Gois, n.... em Local-F. 76.º Em Fevereiro de 2000, o arguido AA tomou de trespasse, juntamente com a arguida AA194, um salão de cabeleireiro "...", pela quantia de Esc. 2.500.000$00, tendo o arguido AA pago a quantia de Esc. 1.300.000$00 e a arguida a quantia de Esc. 1.200.000$00. 77.º Entre 1 de Janeiro de 2000 e 1 de Junho de 2001, o arguido AA, foi titular de 2 contas bancárias nas entidades: "Nova Rede" - com o n.º 034498827. Durante o período temporal referido, efectuou depósitos monetários no valor de 4 770 443$00, conforme consta de fls. 1829 a 1845 dos Autos. "BES" - com o n.º 224/59251/001.8. Durante o período temporal referido, efectuou depósitos monetários no valor de 12 475$50, conforme consta de fls. 1928 a 1830 dos Autos. 78.º O arguido .... .... durante o período temporal referido, foi titular de uma conta bancária na "Empresa-B", com o n.º 0015014902.900. Durante o período temporal referido, efectuou depósitos monetários no valor de 1 596 349$00, conforme consta de fls. 1653 a 1661 dos Autos. 79.º O arguido AA169 durante o período temporal referido, foi titular de 3 contas bancárias nas entidades: "Empresa-B" - com o n.º 069.006853.500. Durante o período temporal referido efectuou depósitos monetários no valor de 1 008 006$00, conforme consta de fls. 1652 dos Autos. "Empresa-C" - com o n.º 18359111. Durante o período temporal referido efectuou depósitos monetários no valor de 300 000$00, conforme consta de fls. 1768 a 1780 dos Autos. "Nova Rede" - com o n.º 272290932. Durante o período temporal referido efectuou depósitos monetários no valor de 115.000$00, conforme consta de fls. 1846 a 1847 dos Autos. 80.º O arguido Bubacar Saco ainda no mesmo período temporal, foi titular de uma conta bancária na "Nova Rede" - com o n.º 216586742. Durante o período temporal referido efectuou depósitos monetários no valor de 877.193$00, conforme consta de fls. 1785 a 1795 dos Autos. 81.º No decurso da busca realizada em 24 de Janeiro de 2001, na residência sita no Impasse da Oca n...., no Cacém, o arguido AA36 tinha na sua posse o bilhete de identidade de cidadão nacional com o n.º 12027344, emitido em nome de AA199. 82.º Tal bilhete de identidade não é verdadeiro, porquanto a zona de aposição da fotografia apresentava vestígios de violação, embora o respectivo impresso fosse autêntico. 83.º Com efeito, em data indeterminada que apenas se pode situar em momento anterior a 24 de Janeiro de 2001, o arguido AA36 em circunstâncias e a pessoa que não foi possível determinar, pediu que lhe arranjasse um bilhete de identidade de nacional português, para o efeito entregando previamente uma fotografia, sendo essa a que se encontra no referido bilhete de identidade. 84.º No dia 14 de Dezembro de 1999, o arguido ....realizou com a arguida AA200, como adquirentes, a escritura de compra e venda do imóvel sediado no Impasse da Oca n.... B. 85.º Para a aquisição do referido imóvel os arguidos solicitaram ao "Empresa-D" um empréstimo no valor de 14 000 000$00 (catorze milhões de escudos) cujos encargos de amortização ficaram a cargo dos adquirentes do imóvel e mutuários do empréstimo, ou seja AA100 e AA200. 86.º O arguido .... utilizou igualmente a identificação civil e fiscal de AA100 para abertura da conta n.º 059/01583/000.4, do BES, conjuntamente com a arguida AA200. 87.º E ainda a identidade de AA100 na abertura de uma conta no Empresa-E, bem como na celebração de contratos com a "Portugal Telecom", com a "EDP", com os "Serviços Municipalizados de Água e Saneamento de Sintra", e na prestação de serviços de comunicações móveis terrestres com a "Optimus" e a "TMN". 88.º O arguido ....utilizou ainda aquela identidade para obter diversos cartões de débito e de crédito titulados por AA100 e por AA200, nomeadamente dois cartões "BES" de débito, ambos titulados por AA100, sendo um de débito com a designação "Multibes" e outro de crédito, com a designação "Besritmo" e um cartão também de débito afecto ao "Empresa-E, assim deles fazendo constar o nome e outros elementos de identificação da pessoa referida, cidadão português. 89.º Os arguidos AA e ...., ao actuar como descrito, visaram e lograram desenvolver uma contínua actividade de fabrico de documentos de identificação como se autênticos fossem, actividade essa que prosseguiram desde as datas atrás mencionados até ao momento da sua detenção à ordem destes autos, em 24 de Janeiro de 2001. 90.º Na concretização de tal propósito, sabiam e queriam os referidos arguidos elaborar e alterar documentos cuja emissão é da competência de autoridades estaduais, sabendo que assim colocavam em crise a fé pública que merecem tais documentos. 91.º Os arguidos BB, AA169, DD, CC, AA193, AA194, AA183 e AA196, sabiam que com as suas assinaladas condutas estavam a colaborar para a realização e produção de documentos contrafeitos e não verdadeiros nas suas menções, mas ainda assim quiseram a produção de tal resultado, cientes que, desse modo, colocavam em crise a fé pública pelos mesmos merecida e causavam prejuízos ao Estado. 92.º Os arguidos ..., AA169 e AA36 ao solicitarem a elaboração de documentos para sua identificação pessoal - respectivamente, AA100 (AA36); AA175, AA171, AA173 (AA169); AA199 (...), fornecendo os seus dados identificativos e os necessários registos fotográficos, sabiam e queriam colaborar na sua realização, bem sabendo que a emissão dos mesmos compete a entidades estaduais e que, dessa forma, colocavam em crise a fé pública de tais documentos. 93.º Ainda assim não o deixaram de fazer, utilizando-os depois na forma acima deixada descrita. 94.º Os arguidos ....e AA200 ao abrirem a mencionada conta bancária, e ao realizarem a escritura pública de contrato de compra e venda de imóvel e contrato de empréstimo, sabia que a identidade que aquele se arrogava não era a verdadeira e que, dessa forma, contribuíam para a elaboração de documentos que não reproduziam a verdade dos factos. 95.º Os arguidos ...., AA169, AA36 e AA200 ao actuarem da forma acima descrita sabiam que punham em crise a credibilidade e a confiança que os referidos documentos merecem quando genuinamente obtidos e que com a sua actuação prejudicavam o Estado. 96.º Os arguidos AA197 e AA198 agiram em comunhão e concertação de esforços e visavam, com a sua conduta a obtenção de proveitos económicos para si, ainda que admitindo que da sua conduta pudesse vir a resultar a futura falsificação do passaporte de AA17. 97.º Cada um dos arguidos agiu sempre com vontade livre e determinada sabendo a respectiva conduta proibida e punida por lei. Mais se provou que: 99.º O arguido CC ao ter passado a angariar por si mesmo documentos para vender os dois primeiros arguidos, fê-lo como forma de poder manter o seu consumo de produtos estupefacientes. 100.º Em momento não totalmente precisado, situado entre os anos de 1999 e 2000, arguido AA contactou o arguido BB tendo em vista a elaboração de publicidade para o seu estabelecimento de cabeleireiro "Empresa-F". 101.º Mandou elaborar também em circunstância temporal que não foi possível determinar, prospectos para a compra de carrinhas. E ainda que: O arguido AA veio para Portugal em 1990, na procura de melhores condições de vida. Trabalhou primeiro na construção civil. Actividade que deixou por alegados problemas respiratórios, em 1995, tendo adquirido então uma mercearia na zona da Mouraria. Ao tentar passá-la para o ramo de churrascaria, veio a deparar-se com diversos problemas de licenciamento, que só há pouco tempo vieram a ser ultrapassados. Cursou, com efeito, o 3.º ano do curso de gestão de empresas no Polo de AA201. Mostra-se condenado na pena de 5 meses de prisão, por cheque sem provisão. O arguido DD, encontra-se em Portugal desde 1993. Homem de "mil profissões", trabalhou na compra e venda de veículos acidentados, aluguer de automóveis, em entretenimento em "play-back", como grelhador, como vendedor ambulante, para além de uma actividade menos clara de "casamenteiro". Tem um filha de 12 anos. Encontra-se separado da sua mulher. Sofreu condenação por roubo em 07/06/2000, no Proc. n.º 1102/98.7SFLSB da 3.ª Secção da 2.ª Vara Criminal de Lisboa, na pena de dois anos de prisão cuja execução foi suspensa pelo período de 4 anos. No Proc. n.º 116/00.9PANZR, do Tribunal Judicial da Nazaré, sofreu condenação por falsificação de documentos em de 01/06/2001, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensos por 3 anos. Tem trabalhado sobretudo na construção civil como carpinteiro.
A arguida AA196, frequenta o 3.º ano do Curso de Relações Internacionais. Vive em Portugal com a sua mãe e um irmão. |