Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
05B3248
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: CUSTÓDIO MONTES
Descritores: EMBARGOS DE EXECUTADO
RECONVENÇÃO
Nº do Documento: SJ200511290032487
Data do Acordão: 11/29/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL PORTO
Processo no Tribunal Recurso: 659/05
Data: 03/03/2005
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Sumário : Em embargos de executado, subsequentes a execução não baseada em sentença, o embargado não pode deduzir pedido reconvencional porque este não é meio de defesa mas de contra-ataque.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


Relatório

"A" - Empreendimentos Imobiliários, Lda.,

B e C deduziu os presentes embargos de executado contra

D - Indústria Mobiliário de Carpintaria, Lda

relativamente à execução que esta intentou contra eles

Alegando que

. a letra dada à execução visou garantir o pagamento de três facturas respeitantes à execução de um contrato de empreitada da carpintaria de um edifício, assim como das despesas bancárias resultantes da reforma de letras anteriores, e não como meio de pagamento;

. além disso, foi acordado entre a A e D que o pagamento do preço desse contrato seria efectuado com fundos provenientes da promoção e construção de um outro empreendimento num terreno na Arrifana, Santa Maria da Feira, cujo licenciamento não veio entretanto a ocorrer;

. por outro lado, surgiram defeitos nos trabalhos executados pela embargada, tendo alguns ficado por concluir, não tendo a A aceite as obras, pois em grande parte dos elementos em madeira, surgiu o chamado "bicho da madeira", havia falta de puxadores nas portas de armários e roupeiros, sendo os aplicados de "má qualidade", que ficavam na mão quando se abriam as portas dos roupeiros e dos armários das portas exteriores dos contadores;

. a embargada não procedeu à afinação das portas interiores, dos roupeiros, armários de quarto e quarto de banho ou à substituição da madeira das portas, roda pés ou janelas que apresentava o "bicho da madeira", tendo inclusivamente colocado madeira prensada nos apainelados e guarnições, em vez de colocar madeira maciça de tola, sem fazer o respectivo acerto de preço.

Pediu se julgasse extinta a execução e que

1. fosse fixado um prazo, nos termos do art. 777° do Código Civil, para que a embargada conclua a obra;

2. em alternativa, que se procedesse à avaliação prevista no art. 884, n° 2 do Código Civil, de modo a permitir a redução do preço;

3. que a embargada fosse condenada na reparação ou na substituição das peças de madeira deterioradas pelo "bicho da madeira " ou, em alternativa, no pagamento de indemnização correspondente a tal declaração, ainda não quantificada;

4. a compensação do crédito que daí advenha com a dívida exequenda.

A embargado contestou por impugnação, invocando ainda a excepção de caducidade da eliminação dos alegados defeitos da obra.

Efectuado o julgamento, foram os embargos julgados improcedentes.

Apelaram os embargantes, sem sucesso.

E, novamente inconformados, interpuseram o presente recurso de revista, cujas alegações terminaram com as seguintes:

Conclusões

1. Os pedidos efectuados pelos Recorrentes/embargantes são legalmente admissíveis em sede de embargos, considerados na perspectiva de conduzirem ao acertamento negativo da situação substantiva, como operativos da finalidade dos embargos.

2. Os pedidos de fixação de prazo para a conclusão da obra e de redução do preço, não só podem ser deduzidos por via reconvencional como também em embargos de executado,

3. Ao não referenciar qual a disposição legal que, no entender da Relação, estatui que tais pedidos apenas possam ser formulados pela via reconvencional e como tal inadmissíveis em sede de embargos de executado, estamos perante uma das nulidades previstas na alínea b) do n.º 1 do artigo 668.º do C.P.C., pelo que o Douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto é nulo.

4. Não há nada na lei que justifique que tais pedidos apenas possam ser deduzidos por via reconvencional.

5. Em processo executivo, os embargos, são, desde logo, o meio próprio para que se possam deduzir tais pedidos, o que, com toda a clareza, sucede no caso em apreço.

6. Os factos dados como provados permitem concluir que a recorrida não concluiu a obra.

7. Dos quesitos 14° (por remissão da resposta dada ao 20.º) e 29° onde está dado como provado que a recorrida não efectuou todas as afinações das portas dos roupeiros, assim como na resposta dada aos quesitos 18° e 19°, resulta claramente que a obra não estava concluída.

8. Nesta matéria, os elementos que constam do processo - a matéria de facto dada como assente - implicam só por si decisão diversa da que foi proferida, e que por lapso manifesto, não foram tomadas em consideração - Alínea b) do artigo 669 do C.P .C.

9. No que respeita ao pedido de reparação ou substituição das peças deterioradas pelo "bicho da madeira" ou ao pagamento da indemnização, entende a Relação que se trata de matéria respeitante a defeitos ocorridos em empreitada relativa a imóvel de longa duração, e que como tal deveriam tais pedidos ser deduzidos no prazo de um ano a partir da denúncia desses defeitos, pelo que, não o tendo sido, por terem sido comunicados em 10.1.2000, e os embargos apenas terem sido deduzidos em 29.4.2002, improcederiam também.

10. Ora, tais defeitos não são abrangidos pelo artigo 1225° do Código Civil, uma vez que este artigo diz apenas respeito aos defeitos supervenientes, ou melhor, aos defeitos que surjam depois da obra ter sido concluída, entregue e aceite.

11. Resulta da matéria de facto dada como provada nos quesitos n.ºs 12.º (sobretudo estes), 16.º, 17.º, 18.º (por referência a um fax da recorrida em eu aceita a obra não está incluída), e primeira parte do art. 28.º, que a obra não se encontrava concluída.

12. E que não se deu o acto de aceitação da obra por parte da embargante/recorrente A.

13. Não estando a obra concluída, não há aceitação, e não havendo aceitação, não é de aplicar o artigo 1225° do Código Civil;

14. Assim como também há lugar à obrigação do pagamento do preço (Artigo 1211° n.º 2 do Código Civil).

15. Neste particular, entendem os recorrentes ter ocorrido lapso manifesto da Relação, na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos, prevista na alínea a) do n.º 2 do artigo 669.º e n.º 2 do artigo 721° do C.P .C.

16. Ainda relativamente à indemnização, entende a Relação que não funciona como alternativa e só se justifica a sua exigência na medida em que outros meios jurídicos não se possam efectivar ou em relação a prejuízos que não tenham ficado totalmente ressarcidos.

17. E é isso mesmo que pretendiam os recorrentes.

18. Se o Mto. Juiz da primeira instância entendeu que os restantes pedidos não poderiam proceder, então deveria ter entendido ser de dar procedência ao pedido de indemnização.

19. Neste particular, a decisão da Relação está em oposição com o fundamento invocado sendo por isso nula a sentença - Artigo 66Sº nº 1 alínea c).

20. No que concerne à questão da compensação, não se vislumbra qualquer impedimento legal, a que, depois de fixada uma indemnização prevista no 1223° C.C., não a possam os recorrentes compensar com o crédito que advém da quantia exequenda, pois estes, dívida exequenda e indemnização, são ambos obrigações pecuniárias, da mesma espécie e qualidade.

21. E sendo condenada a Recorrida no pagamento da indemnização, esta torna-se legalmente exigível em momento idêntico (sentença) que se torna exigível a dívida exequenda, podendo assim, operar a compensação.

22. Em nosso entender, neste particular, estamos perante um erro de interpretação da norma aplicável, fundamento de recurso de revista previsto no n. 2 do artigo 721° do C.P .C. :"

23. Os pedidos formulados pelos recorrentes deveriam ter sido considerados procedentes.

Normas jurídicas violadas:

Artigos: Artigos, 911°, 1211° n.º 2, 1218° a 1224°, 884°, 887°, do Código Civil.

Nestes termos, deve o presente recurso obter total provimento, e em consequência ser revogada e alterada a douta sentença, julgando procedentes os pedidos formulados pelos recorridos/embargantes.

Não foram oferecidas contra alegações.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

FUNDAMENTAÇÃO

Matéria de facto provada

1. A embargada é portadora de uma letra de câmbio, com data de emissão de 06.07.2000 e de vencimento em 06.10.2000, na qual foi aposta a quantia de 18.185.949$00, sendo que no lugar destinado ao sacador consta a firma da embargada, com as assinatura dos seus legais representantes, no lugar destinado ao sacado consta a firma da embargante A, no lugar destinado ao aceite a firma da mesma embargante com as assinaturas dos seus legais representantes, e no seus verso a designação "por aval à firma aceitante", seguida das assinaturas dos embargantes B e C (doc. de fls. 4 da execução). - al. A);

2. Em 20.12.1997, por escrito, entre a embargante A e a embargada foi celebrado um acordo a que apelidaram de "contrato de orçamento de carpintaria", referente a trabalhos de carpintaria a efectuar pela embargada em 35 fracções, no valor de 28.660.417$00 (doc. de fls. 20). - al. B);

3. No acordado em 2. ficou estipulado que "todas as madeiras serão em tola, sendo as portas interiores para quartos, casas de banho, arrumos, roupeiros e caixas de luz em contraplacado de tolas lisas". - resposta ao n.º 22°;

4. Os trabalhos de carpintaria referidos em 2. foram efectuados pela embargada em quatro fases, iniciando-se cada nova fase após a conclusão da anterior. - al. C);

5. Em 6.04.2000, a embargante A subscreveu um documento, que consta a fls. 52 e se dá por reproduzido, assinado pelos dois outros embargantes, no qual declara, além do mais, ser devedora da embargada da quantia de 18.185.949$00 e juros relativos às facturas 161,165 e 183 e que aceitou uma letra naquele valor, com vencimento em 6.07.2000 "mais declaram que para pagamento da quantia em dívida a sua representada aceitou uma letra no valor do capital em dívida". - D);

6. Em 6.04.2000, a embargante A subscreveu um documento no qual declara, além do mais, ter a embargada lhe restituído cheques e letras de câmbio que se destinavam ao pagamento de parte da quantia em dívida referente às facturas 161, 165 e 183 e nota de lançamento 002, e que na data do seu vencimento não foram efectivamente pagos (doc. de fls. 55 que aqui se dá por reproduzido). - al. E);

7. Em 14.07.2000, a embargante A subscreveu um documento, que consta a fls. 50 e se dá por reproduzido, assinado pelos dois outros embargantes, no qual declara, além do mais, ser devedora da embargada da quantia de 18.185.949$00 e juros relativas às facturas 161, 165 e 183 e que aceitou uma letra de câmbio naquele valor, com vencimento em 06.07.2000, que não foi paga e que lhe foi restituída e substituída por outra de igual quantia com vencimento em 6.10.2000. "Mais declaram que para pagamento da quantia em dívida a sua representada aceitou uma letra no valor do capital em dívida". - F);

8. Em 2000/Ago./18 não se encontrava licenciada a construção de um prédio, no local do Cruzeiro em Arrifana, relativo ao processo nº 1058/00 existente na Câmara Municipal de Santa Maria da F eira. - resposta ao n.º 6°);

9. Na madeira de algumas gavetas dos roupeiros e de alguns rodapés, cujo número não foi possível determinar, e que foram colocados pela embargada D, por força do acordado em 2.0) - 2., surgiu o vulgarmente denominado "bicho da madeira". - n.º 11.º);

10. A embargada não procedeu à substituição de alguns dos puxadores nas portas de alguns armários e roupeiros, em número que não foi possível determinar. - 12°);

11. Alguns dos puxadores, em número que não foi possível determinar, aplicados pela embargada D nas portas exteriores de alguns armários dos contadores de gás, electricidade e água, soltavam-se quando se abriam essas portas, em virtude de estarem fixos com uns parafusos bastante curtos. - 13.0);

12. A embargada não procedeu à afinação de algumas portas em madeira dos roupeiros, mas em número que não foi possível determinar - 14°);

13. A embargada D não procedeu à substituição, em número que não foi possível determinar, das madeiras dos rodapés afectados com o chamado "bicho da madeira " e de algumas das portas dos roupeiros que com o decorrer do tempo incharam ligeiramente nas suas extremidades. - 15°);

14. A embargante A enviou à embargada D os faxes de fls. 22, este datado de 2000/Jan./10, em que comunica que "Continuamos a aguardar que sejam concluídos os trabalhos de carpintaria...como sejam: puxadores e afinação nas últimas 5 portas; puxadores em falta em portas de armários, roupeiros e substituição de outros, afinação em portas interiores, roupeiros e armários, outros arranjos em armários de casa de banho", e de fls. 23, este datado de 2000/Dez./16, no qual se reitera a existência do "bicho da madeira" "nas guarnições de uma porta e armário roupeiro, na habitação do 2. o andar direito, Corpo IV. - 16°);

15. Tanto num fax como no outro a embargante A solicitava a pronta intervenção da embargada D, solicitando no último a urgente substituição da madeira que estava impregnada com o "bicho da madeira". - 17°);

16. Na sequência daquela primeira comunicação a embargada D enviou o fax de fls. 26, datado de 2000/Jan./11 , à embargante A onde se acusa a recepção daquele fax de 2000/Jan./10 e solicita-se que esta última indique " os trabalhos a realizar. . . de uma forma descriminada e por fracções ". - 18°);

17. Esses trabalhadores também tinham como tarefa proceder às reparações que fossem necessário realizar. - 19°);

18. A embargada colocou madeira prensada nos apainelados e guarnições. - 21°);

19. A embargada D - Indústria de Mobiliário e Carpintaria, Lda." a pedido do representante do embargante "A - Empreendimentos Imobiliários, Lda." executou pequenos serviços de afinação. - 28°);

20. A embargada D não efectuou todas essas afinações, como sucedeu em 2000/Jan./27, não tendo nesta data a embargada A disponibilizado as chaves daquelas fracções cujas portas necessitavam de afinações.- 29°).

O direito

Nas suas conclusões, a recorrente suscita 3 questões:

1. Nulidade do Acórdão (1) por não ter especificado os fundamentos de direito;

2. Lapso manifesto na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos.

3. Violação da lei substantiva.

Analisemos todas as questões em conjunto.

A recorrente começa por arguir de nulo o acórdão por não ter indicado a disposição legal que fundamenta a não admissão por via reconvencional nos embargos de executado do pedido por si formulado de fixação de prazo para a conclusão da obra e para o da redução do preço, o que integraria a nulidade do art. 668.º, 1, b) do CPC.

Estatui esta disposição legal que é nula a sentença "quando não se especifique os fundamentos de facto e de direito que justifiquem a decisão".

Ora, convém esclarecer que a ocorrência desta nulidade apenas se verifica quando haja total falta de fundamentação, isto é, quando o tribunal deixe de se pronunciar sobre as questões suscitadas; nesta norma pune-se a omissão de total fundamentação, não a má argumentação ou a ausência de base legal, porque a carência de base legal implica não nulidade mas erro de julgamento. (2)

Aliás, contrariamente à alegada nulidade, diz-se, e muito bem, no acórdão sob recurso, que os pedidos de fixação de um prazo para a conclusão da obra ou a redução do preço, só por via reconvencional se poderiam deduzir, o que não é admissível em embargos de executado, por não se tratar de meio de defesa mas, antes, de contra-ataque.

E, de facto, é este o entendimento que resulta do art. 816.º do CPC que permite que, se a execução se não basear em sentença, "além do fundamentos especificados no art. 814.º, ...., podem ser alegados quaisquer outros que seria lícito de deduzir como defesa (3) no processo de declaração".

O mesmo entendimento segue a doutrina.

Diz, de facto, Lebre de Freitas (4) que o executado se poderá defender "por impugnação e por excepção (art. 487.º, 2), mas não poderá reconvir: a reconvenção, que é não é um meio de defesa mas de contra-ataque, não é admissível em processo executivo". (5)

Para além disso, há também uma impossibilidade derivada do disposto no art. 274.º, 3 do CPC que não admite a reconvenção "quando ao pedido do réu corresponda uma forma de processo diferente do que corresponde ao pedido do autor". (6)

Tudo para concluir que inexiste a nulidade invocada pela recorrente.

Para além daqueles pedidos, formula esta também o pedido de condenação da exequente para reparar ou substituir as peças de madeira deterioradas pelo "bicho da madeira" ou, "em alternativa", no pagamento de indemnização correspondente a tal reparação, ainda não quantificada, para a compensar do crédito que daí advenha com a dívida exequenda.

Óbvio se torna que tais pedidos também não são admissíveis, por inadmissível ser a reconvenção em processo executivo, pelos fundamentos já mencionados.

E bastaria isto para demonstrar a sem razão da recorrente.

Acresce que em matéria de cumprimento defeituoso do contrato de empreitada "vigora o princípio de que a indemnização é subsidiária relativamente aos pedidos de eliminação de defeitos, de substituição da prestação e de redução do preço". (7)

Ou seja, o dono da obra terá em primeiro lugar que convencer, em acção de condenação, o empreiteiro de que existem os defeitos, obter a sua condenação a eliminá-los, permitindo-lhe que, pelos seus meios o faça (8) ou, caso os não elimine, pedir a sua prestação por outrem; se não puderem ser eliminados, o dono da obra pode exigir nova construção, tudo se não se verificar a onerosidade mencionada no n.º 2 do ar. 1221.º do CC; se não forem eliminados os defeitos ou construída de novo a obra, pode o dono desta exigir, então, a redução do preço e a resolução do contrato (9), podendo ainda ser indemnizado nos termos gerais. (10)

Ora, todo este complexo de direitos, com a necessária observância do princípio do contraditório, nunca poderia ser suscitado em embargos de executado, porque nestes o embargante apenas pode utilizar meios de defesa e não de contra-ataque.(11)

E, só depois de calcorrear todo este percurso é que, à falta da eliminação dos defeitos, poderia eventualmente nascer um crédito à recorrente para compensar o débito que confessadamente tem para com a exequente há já mais de cinco anos.

De facto, podia o executado, ao deduzir os embargos de executado, invocar em compensação um crédito que tivesse contra o exequente por falta de eliminação dos defeitos da obra, mas, para o poder fazer, teria que o discutir e tornar certo em acção declarativa e não, como o fez, em via reconvencional.

Finalmente, ponha-se em relevo o mencionado na sentença da 1.ª instância, na parte em que se chama a atenção para o facto de os embargantes nunca terem alegado o valor dos ditos vícios nem se ter provado em julgamento a sua extensão; também peticionando eles a eliminação de defeitos a compensar com a dívida, as prestações não são da mesma espécie, faltando o requisito da parte final da al. b), 1 do art. 847:º do CC.

No acórdão sob recurso, ainda se acrescentaram outros argumentos para demonstrar a sem razão dos recorrentes.

Embora de forma escusada, não podemos deixar de referir que o que ali se defendeu está correcto.

Vem demonstrado que a dívida emergente da letra dada à execução respeita à realização pela embargada da empreitada identificada nos autos.

Em 10.1.00, a embargante enviou um fax à embargada a reclamar os defeitos aqui em análise.

Posteriormente, em 6.4.00, a embargada subscreveu um documento onde declara que deve a quantia peticionada na execução, com vencimento em 6.7.00, sem qualquer referência aos mencionados defeitos.

Em 14.7.00, a embargante subscreveu novo documento a reconhecer a dívida que não pagou no prazo acordado, estipulando-se novo prazo de cumprimento para 6.10.00, também se não fazendo qualquer referência aos agora denunciados defeitos.

A dívida não foi paga e a embargante, em 16.12.00, voltou a reclamar os defeitos da obra.

Até à dedução dos embargos (29.4.02) decorreram mais de dois anos sobre a data da primeira reclamação dos defeitos (10.1.00).

Ora, o bicho da madeira é defeito não aparente e, mesmo que o não fosse, depois da sua denúncia, a embargante tinha 1 ano para intentar a respectiva acção para convencer a embargada a reparar os alegados defeitos, como, claramente, flui do art. 1225.º, 2 do CC, prazo que sempre seria aplicável à eliminação dos defeitos - art. 1225.º, 3.

Estaria, pois, prescrito o direito de exigir a eliminação dos defeitos, prescrição que a embargada invocou na sua contestação.

Por isso, não vemos como pode defender-se, como o faz a recorrente, que a Relação incorreu em manifesto lapso na determinação da norma aplicável e que violou a lei substantiva.

Finalmente, diga-se que, sendo os demais embargantes avalistas da letra dada à execução, nunca podiam eles invocar as excepções pessoais do avalizado, isto porque é uniforme o entendimento de que o aval é uma garantia autónoma, embora formalmente dependente da do avalizado, subsistindo mesmo que nula a obrigação garantida. (12)

Do exposto, vê-se que os recorrentes não têm qualquer razão nem qualquer fundamento para continuar a arrastar a dívida que têm para com a embargada há já mais de cinco anos.

Decisão

Pelo exposto, nega-se a revista, conformando-se o acórdão recorrido.

Lisboa, 29 de Novembro de 2005
Custódio Montes,
Neves Ribeiro,
Araújo Barros.
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(1) Refere sentença, mas, certamente, por mero lapso.
(2) Ac. deste STJ de 8.5.97, Revista n.º 694/96, 2.ª secção, in STJ Sumários de Acórdãos, n.º 11, pág. 43; ver também o de 11.1.00, citado por Fernando Luso Soares e Outros, CPC anot. 12.ª ed., pág. 520.
(3) Sublinhado nosso.
(4) Direito Processual Civil II, Lições ao 5.º Ano da Faculdade de Direito de Lisboa, pág. 113.
(5) Doutrina que mantém mais recentemente em A Acção Executiva, 2.ª ed., pág. 157; também Amâncio Ferreira, em Curso de Processo de Execução, 5.ª ed., pág. 50 é da mesma opinião: "donde poder a oposição conter não só matéria de impugnação como de excepção (...), mas já não de reconvenção por esta não ser um meio de defesa mas de ataque"; ver também Castro Mendes, Direito Processual Civil Vol. III, págs. 328 e segts.
(6) Ver, a propósito, A. Reis, Comentário, Vol. 3.º, pág. 117.
(7) Martinez, Cumprimento Defeituoso em Especial na Compra e Venda e na Empreitada, pág. 347.
(8) "Exigir do empreiteiro a sua eliminação" - art. 1221, 1 do CC.
(9) Art. 1222.º do mesmo Cód.
(10) Art. 1223.º.
(11) Veja-se o ac. destes STJ de 3.12.92, in dgsi.pt./jstj, n.º 082588: "são, ..., de rejeitar os embargos em que o executado pede a condenação do exequente a reparar, ..., a máquina que lhe vendeu..." porque tal pedido tem "manifesto cariz reconvencional".
(12) Ver, entre muitos outros, os Acs. deste STJ de 24.4.03, revista 886/03; de 1.7.03, revista 1942/03; de 15.5.01, revista 1248/01; de 27. 4.99, revista 274/99; de 4.5.04, revista 371/04; todos em Dgsi.pt.; ver também o ac. deste STJ de 7.4.05, proferido na revista 510/05 7.ª, de que fomos relator.