Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
06A1450
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: JOÃO CAMILO
Descritores: EMPREITADA
CASO JULGADO
CADUCIDADE
RECONHECIMENTO DA DÍVIDA
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
DANOS MORAIS
PEDIDO GENÉRICO
Nº do Documento: SJ200606080014506
Data do Acordão: 06/08/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA.
Sumário : I. Apurando-se que o réu empreiteiro, tendo celebrado um contrato de empreitada com o autor, dono da obra, com vista à construção de uma moradia e que no decurso da execução da mesma, o réu apresentou um orçamento para uns trabalhos devidamente discriminados, adicionais ao referido contrato em execução, a realizar no sótão daquela moradia, apurando-se ainda que o mesmo empreiteiro foi pedindo ao autor várias parcelas do preço daquele orçamento, com a promessa de completar aquelas obras em quinze dias, parcelas essas que o autor foi adiantando, tem de se concluir pela celebração do contrato de empreitada adicional em relação ao mesmo sótão entre as mesmas partes.
II. Decidindo-se no saneador que o autor dono da obra tem o ónus de prova da data em que tomou conhecimento dos defeitos da obra empreitada, sob pena de ver o seu direito à reparação daquele caducado, decisão esta que veio a ser revogada por procedência de apelação interposta onde se julgou competir ao réu a prova daquele conhecimento para se dar a caducidade mencionada e acórdão aquele onde se mandou prosseguir a acção para julgamento a fim de verificar nomeadamente se se verifica a referida caducidade, e acórdão que transitou em julgado, não pode em recurso de revista subsequente ao mesmo julgamento e apelação subsequente, ser levantada a questão de a quem compete o referido ónus de prova.
III. O reconhecimento da dívida previsto no nº 2 do art. 331º do Cód. Civil, como impeditivo da caducidade, tem de ser concreto, preciso, sem ambiguidades, não podendo ser vago ou genérico ou que deixe dúvidas sobre a aceitação pelo devedor do direito de crédito em causa. Além disso, tem de ser efectuado antes do decurso do prazo de caducidade.
IV. Tal reconhecimento não pode verificar-se se se alegou apenas que instado o empreiteiro devedor da obrigação de reparação dos defeitos da obra, a efectuar a mesma reparação, "embora com promessas animadoras", não o fez.
V. Os danos não patrimoniais são ressarcíveis em matéria de responsabilidade civil contratual, desde que tenham gravidade que façam merecer a tutela jurídica.
VI. Sendo peticionados danos não patrimoniais a liquidar em execução de sentença, não pode o tribunal condenar em indemnização líquida, sem que o autor daquele pedido tenha procedido de acordo com o preceituado no nº 2 do art. 471º do Cód. de Proc. Civil, sob pena de se violar o princípio do pedido do nº 1 do art. 661º do mesmo código.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


Em 2001.06.11, AA intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, sob a forma ordinária, no 2º Juízo Cível de Viana do Castelo, contra BB, pedindo a condenação deste a:
- Concluir as situações de incumprimento da obra enumeradas no art. 16º da petição inicial;
- Proceder à eliminação dos defeitos da obra enumerados no art. 17º da mesma peça;
- Subsidiariamente, quanto aos defeitos que não possam ser eliminados, a fazer nova construção;
- Em alternativa aos pedidos anteriores, se o Réu o preferir, a pagar ao Autor a importância que for arbitrada, a título de redução do preço da obra, e a devolver ao Autor o sinal de 1 800 000$00 sobre o sótão, em dobro;
- Em qualquer caso, a pagar ao Autor uma indemnização no montante em que for arbitrado ou vier a liquidar-se em execução de sentença, por danos patrimoniais e não patrimoniais.
Em articulado superveniente, o A. veio pedir ainda que o R. fosse condenado:
- A executar um muro novo ao longo de toda a extensão da propriedade que se encontra virada ao mar, e
- A pagar àquele € 1.500,00 de indemnização por danos não patrimoniais, sem prejuízo da indemnização que vier a ser liquidada em execução de sentença.
Para tanto, alegou o autor ter celebrado com o réu um contrato de empreitada, sendo esta realizada pelo réu para o autor e consistente na construção de uma moradia para o autor, obra essa que o réu não completou e que o que construiu apresenta danos, abrangendo o pedido as obras por realizar e as obras que apresentam defeitos.
Citado o réu, contestou alegando a ilegitimidade do autor por estar desacompanhado da mulher, também dona do prédio em causa, e a caducidade do direito de acção. Também impugna grande parte dos factos alegados pelo autor.
Replicou o autor rebatendo a verificação das excepções arguidas pelo réu.
No saneador foi rejeitada a excepção de ilegitimidade e foi julgada verificada a excepção de caducidade, tendo sido absolvido o réu do pedido.
Por procedência da apelação que o autor interpôs desta decisão, foi revogada a decisão de absolvição do pedido, por não estar já apurada a matéria de facto necessária para o conhecimento da referida excepção de caducidade, cuja verificação do decurso do respectivo prazo incumbe ao réu provar, sendo elaborada a matéria assente e a base instrutória, realizando-se julgamento, com resposta à matéria de facto, prolatando-se sentença que julgou a acção parcialmente procedente, e, em consequência, condenou o Endereço-A:
- A realizar na casa referida, propriedade do A., as seguintes obras em falta:
- no sótão: executar o WC, afagar a totalidade das paredes, fazer quatro aberturas para luz, concluir os tectos em gesso e pôr o chão pronto a levar soalho, dividir, electrificar e colocar o aquecimento; cerzitar as duas caixas de saneamento e colocar novo tubo de drenagem; e montar as antenas;
- forrar a pedras o 2º muro por trás da casa, do lado nascente;
- colocar o isolamento no chão dentro da casa e as telas nas varandas; e
- preencher totalmente a caixa de ar com poliestireno nas paredes exteriores, conforme consta do projecto de isolamento térmico;
- a eliminar, na mesma obra, os defeitos enumerados nas respostas aos quesitos 21º a 25º;
- a executar novo muro ao longo de toda a extensão da propriedade do A., virada a poente; e
- a pagar ao A. a compensação por danos morais, no valor de € 10.000,00 (dez mil euros), e ainda a que se liquidasse em execução de sentença pelos danos que o A. venha a sofrer na utilização da casa até à realização das obras e correcção dos defeitos acima referidos; e
No mais se absolveu o R. do pedido formulado pelo A., relativo à colocação do piso em pedra para a entrada da garagem.
Inconformado, dela apelou o R., tendo na Relação de Guimarães sido julgado parcialmente procedente a apelação, reduzindo a indemnização concedida a título de danos não patrimoniais a € 1.500,00.
Mais uma vez inconformado, veio o réu interpor a presente revista, tendo o autor recorrido subordinadamente.
O réu recorrente apresentou as suas alegações de recurso, tendo-as finalizado com conclusões que não primam pela concisão e, por isso, não serão aqui transcritas.
Por seu lado o autor recorrente nas suas alegações formulou as seguintes conclusões:
- A norma do art. 569º do C. Civil consente que se formule pedido de indemnização em valor inferior ao devido, na perspectiva de ainda não ser quantificável por se desconhecer a sua futura gravidade e/ou extensão.
- Tratando-se de indemnização por danos de natureza não patrimonial em que se repercute o decurso do tempo, justifica-se a desconsideração do valor formulado como pedido, por forma a fixá-lo em montante que corresponda à realidade existente à data da fixação da matéria de facto.
- Na medida em que, desde a data em que o pedido de indemnização por danos de natureza não patrimonial e a sentença proferida em 1ª instância (que se seguiu à decisão da matéria de facto ) decorreram quase dois anos, a sua fixação no montante de 10.000 € afigura-se ajustada ao nível de padecimento moral sofrido, persistentemente, pelo autor.
- Foi violado o preceituado nos artºs 569º do C. Civil e 663º, nº 1 do C.P. Civil.
- Pelo exposto, o acórdão proferido pelo tribunal recorrido deve, nessa parte, ser alterado, por forma a que se fixe, a título de indemnização por danos de natureza não patrimonial devida ao autor, a importância de 10.000 €, conforme foi decidido em 1ª instância.
Além disso o autor contra-alegou defendendo a improcedência do recurso do réu.
Corridos os vistos legais, urge apreciar e decidir.
Como é sabido - arts. 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do Cód. de Proc. Civil, a que pertencerão todas as disposições a citar sem indicação de origem -, o âmbito dos recursos é delimitado pelo teor das conclusões dos recorrentes.
Antes de mais, há que ver a matéria de facto que as instâncias deram por provada e que é a seguinte:
A) O R. construiu para o A. uma moradia unifamiliar de cave (com garagem), rés-do-chão, sótão e logradouro, bem como os respectivos muros de vedação do terreno, situado em Local-A, Local-B ao Regato, Afife, Viana do Castelo, pelo preço de 18 500 000$00, sem IVA, conforme orçamento de 15.03.98.
B) A obra foi adjudicada em 21.04.98.
C) O A. pagou ao R. as seguintes quantias:
i. - 2 500 000$00 por cheque de 21.04.98;
ii. - 2 208 600$00 por cheque de 01.02.99;
iii. - 1 300 000$00 por cheque de 01.03.99;
iv. - 1 500 000$00 por cheque de 24.03.99; e
v. - 600 000$00 por cheque de 30.04.99.
D) No saneamento da casa, foi reduzido o número de caixas em várias unidades e foram anulados o sumidouro e a fossa séptica.
E) Falta colocar as caleiras na casa.
F) Os muros laterais da entrada da garagem não foram forrados a pedra.
G) Posteriormente à adjudicação da obra, o A., a pedido do R., foi-lhe adiantando mais dinheiro para a obra sempre antes de concluídos os respectivos trabalhos.
H) Em data indeterminada, mas durante a execução da obra, o R. chegou a dizer ao A. que, se este não lhe adiantasse dinheiro, teria de parar os trabalhos.
I) No primeiro trimestre de 1999, o R. pediu 2 300 000$00 ao A., pelos trabalhos de dividir, electrificar e colocar o aquecimento no sótão.
J) Tais trabalhos seriam a executar pelo R.
K) Os trabalhos previstos no orçamento inicial, no sótão, consistiam na execução de um WC, paredes a massa de areia afagada, quatro aberturas para luz, tectos em gesso e chão pronto a levar soalho.
L) O A. adiantou ao R. a quantia de 1 300 000$00 referida em C), sendo 1 000 000$00 pelo resto da obra e 300 000$00 pelo sótão.
M) Em Março de 1999, o R. pediu ao A. para lhe adiantar pelo sótão mais 1 000 000$00, assumindo o compromisso de o construir logo que solicitado e que a obra seria executada em 15 dias.
N) O A. adiantou ao R. a quantia de 1 500 000$00, referida em C).
O) Em Abril de 1999, o R. exigiu ao A. o dinheiro de extras sob pena de parar a obra.
P) O A. adiantou ao R. a quantia de 600 000$00 referida em C).
Q) Depois de Dezembro de 1999, o R. não mais voltou a trabalhar na obra.
R) No sótão, não existe o WC, as paredes estão afagadas em cerca de 25%, existem uma clarabóia e um "Velux" (janela), os tectos não estão na totalidade a gesso (falta uma faixa com cerca de 4 m x 0,20 m), o pavimento não está pronto a levar soalho, não há qualquer divisão nem aquecimento e existem sete focos no tecto.
S) Há duas caixas de saneamento por cerzitar (uma à entrada do portão para peões e outra do lado norte, ao nível do 1º andar) e um dos tubos de drenagem está partido.
T) O R. não montou as antenas.
U) Falta forrar a pedras o 2º muro por trás da casa, do lado nascente.
V) Falta colocar o isolamento no chão dentro da casa e as telas nas varandas.
W) Falta preenchimento parcial da caixa de ar com poliestireno nas paredes exteriores constante do projecto de isolamento térmico.
X) O R. não executou na totalidade a colocação de piso em pedra para a entrada da garagem, tendo o A. de o mandar fazer por outras pessoas.
Y) Na garagem, há humidade e empoçamento de água, a meio e na entrada, e a clarabóia, do lado do quintal, acumula água no seu interior.
Z) As cimalhas e os telhões racharam e estes estão inclinados para dentro, dando origem à infiltração de humidade.
AA) Os passeios cederam, desligando-se da casa, e estão em perigo de ruir total ou parcialmente a qualquer momento.
BB) O muro a nascente devia ter 3 m de altura e tem 1,80 m.
CC) O muro da rua foi feito mais baixo que o previsto.
DD) À data da propositura da acção, o muro virado ao mar, em frente à casa, estava em perigo de ruir, pelo menos parcialmente.
EE) Em Janeiro e em Fevereiro de 2000, o A. contactou o R. para que este concluísse a obra, eliminasse os defeitos e terminasse a obra do sótão.
FF) O R. prometeu fazê-lo.
GG) O A. enviou ao R. a carta registada com aviso de recepção, datada de 14 de Setembro de 2000, cuja cópia está junta a fls. 31 a 33.
HH) Nessa carta, o A. enumerou os defeitos da obra e solicitou ao R. a sua correcção e a feitura do sótão no prazo de 15 dias, e referiu ainda que daria o assunto como encerrado se o R. arranjasse os muros virados ao mar, arranjasse os passeios, reparasse cimalhas e substituísse telhões e acabasse o sótão.
II) Em 28 de Março de 2001, o A., através do seu advogado, enviou ao R. a carta registada com aviso de recepção cuja cópia está junta a fls. 36.
JJ) Os factos descritos em E) e F) e nas respostas aos quesitos 14º a 25º e 27º causaram e causam transtornos ao A. na utilização da casa.
KK) Por causa de tais factos, o A. evita fazer visitas a casa de amigos porque se sente constrangido a retribuí-las.
LL) O R. executou na obra, a pedido do A., os seguintes trabalhos extra: construção da caixa para colocação de depósito de gás, construção da caixa para filtro de água, construção do muro de suporte em betão ciclópico com material, abrir roços e tapar a chaminé da caldeira com mão-de-obra do picheleiro até ao sótão, construção do muro para o tanque de lavar roupa e colocar azulejo, 60 m de tubo PVC de 110 mm e colocação.
MM) Aqueles trabalhos ascenderam ao valor de 586 800$00 mais 15 000$00 de lenha, que o A. pagou com o cheque de 600 000$00 referido em C).
NN) O R. executou ainda, a pedido do A., como trabalhos extra, uma terceira chaminé, e respectivo forro a pedra, criação de duas divisões na lavandaria, com nichos para a colocação de duas máquinas, alteração da instalação eléctrica e de água para a caldeira do aquecimento central, com abertura de novos roços e tapagem dos inicialmente previstos, criação e instalação de mais duas tomadas eléctricas e de mais uma tomada de telefone, por cada quarto.
OO) O aproveitamento e criação de divisões no sótão não estavam previstos no projecto inicial e nem vieram a ser contempladas em nenhum aditamento ao mesmo.
PP) Por isso, os trabalhos de aproveitamento do sótão só deveriam ser feitos depois de passar a vistoria da Câmara Municipal para atribuição da licença de habitabilidade.
QQ) O referido em D) foi feito a solicitação expressa do A., porque, no decurso da obra, este resolveu requerer a ligação do saneamento ao colector público.
RR) O A. ia à obra várias vezes por semana.
SS) Em meados de 2003, ruiu parte do muro virado ao mar, da casa do A.
TT) A parte restante do muro encontra-se em perigo de ruína iminente.
UU) A parte do jardim que se encontra junto ao muro poderá aluir a qualquer momento.
VV) Em consequência da ruína do muro, o A. não pode tratar do jardim junto à parte que ruiu, e receia tratar do jardim junto à parte restante do muro.
WW) Os factos descritos nos quesitos anteriores causam ao A. receio, desgosto e vergonha.

Vejamos agora cada um dos recursos a começar pelo principal interposto pelo réu.
I. Revista do réu.
Das conclusões formuladas pelo réu nas suas alegações se deduz que este, para conhecer no recurso, levanta as seguintes questões:
a) Não existe nos autos matéria suficiente para se dar como apurada a existência de contrato de empreitada que abrangesse as obras no sótão da casa do autor, nomeadamente, no tocante aos trabalhos de dividir, electrificar e colocar aquecimento naquele ?
b) Denunciados os defeitos pelo autor em Janeiro e Fevereiro de 2000, mas não tendo sido alegado ou provado o momento em que aquele teve conhecimento dos mesmos defeitos, na data de propositura da acção estava já caducado o direito do autor ?
c) O reconhecimento pelo réu do direito do autor não foi alegado e nem aquele resulta provado ?
d) Os danos não patrimoniais não são ressarcíveis em matéria de responsabilidade civil contratual ?
e) E de qualquer modo os danos apurados não merecem a tutela do direito ?

Vejamos agora cada uma das questões acabadas de enunciar.
a) Nesta primeira pretende o recorrente que se não apurou a celebração do contrato de empreitada sobre o acabamento do sótão. Adianta que se provou apenas que o recorrente fez um orçamento sobre aquele, mas não que os trabalhos tenham sido entregues ou adjudicados.
Ora tal como as instâncias concluíram, parece-nos que não tem aqui o recorrente razão.
Com efeito resulta dos factos provados que em 21.04.98, foi adjudicado pelo autor ao réu a construção de uma moradia, conforme orçamento de 15.03.98 e pelo preço de 18.500.000$00. Mais foi apurado que no primeiro trimestre de 1999, o réu pediu 2.300.000$00 ao autor pelos trabalhos de dividir, electrificar e colocar o aquecimento no sótão, obras estas a executar pelo réu e que não estavam previstas no orçamento inicial.
Mais se apurou que o autor adiantou ao réu várias importâncias em dinheiro sendo que 300.000$00 pelo sótão, sendo pedido pelo réu mais 1.500.000$00 de adiantamento pelo mesmo sótão, com a promessa de executar esta obra em quinze dias, pedido este que o autor satisfez, adiantando-lhe essa importância.
Daqui se tem de concluir que o réu apresentou ao autor o orçamento para as obras extras no sótão e que o autor aceitou-o, iniciando o réu a realização das mesmas obras, pedindo dinheiro adiantado ao autor pelas mesmas, tendo o autor procedido ao pagamento adiantado de importâncias que o réu lhe ia pedindo no tocante àquela obra aditada ao contrato inicial, com a promessa de a completar em quinze dias, o que só pode levar a concluir que as partes acordaram na realização daquelas obras como extra ou aditamento ao contrato inicial, nos termos propostos pelo réu.
Por isso, soçobra, este fundamento do recurso.

b) Nesta segunda questão pretende o recorrente que a denúncia dos defeitos da obra pelo autor se tem de considerar caduca por o mesmo não ter alegado ou provado a data do conhecimento dos mesmos defeitos.
Trata-se aqui de saber a quem incumbe o ónus de prova relativamente à data do conhecimento dos defeitos, ou seja, pretende o recorrente que o autor tem de alegar e provar a data do conhecimento dos defeitos, sob pena de a referida denúncia ser considerada extemporânea.
Tal como doutamente entendeu o douto acórdão da Relação de Guimarães de fls. 103 e segs., não tem o recorrente razão nesta pretensão.
E tendo a questão de saber a quem incumbe este ónus de prova no despacho saneador de fls. 67 e segs. sido decidida no sentido de que este incumbia ao autor, foi a mesma decisão revogada pelo acórdão de fls. 103 e segs., onde foi decidido que esse ónus de prova pertence ao réu como integrador dos factos constitutivos da excepção alegada de caducidade.
Este acórdão transitou em julgado, pelo que nos termos do art. 673º, não pode aqui se reapreciada a mesma questão que ficou já decidida definitivamente neste processo.
Improcede, desta forma, este fundamento do recorrente.

c) Pretende nesta terceira questão, o recorrente que o reconhecimento pelo réu do direito do autor não foi alegado e provado pelo autor.
Está aqui em causa a aplicação ao caso do disposto no art. 331º do Cód. Civil.
Alega o recorrente que o recorrido não alegou e nem provou o referido reconhecimento e que este não está preenchido pelos factos provados nos autos.
Vejamos.
Na contestação, o réu, além do mais, alegou a caducidade do direito do autor, por ter proposto a acção em 11-06-2001, apesar de saber dos defeitos desde Dezembro de 1999, data a partir da qual passou a viver na casa.
Perante esta alegação, na réplica, o autor limitou-se a dizer que a partir de Dezembro de 1999 a casa foi, praticamente, abandonada pelo réu, tendo sido contactado pelo autor por várias vezes para eliminar os defeitos e executar a obra em falta, nomeadamente em Janeiro e Fevereiro de 2000 e que o réu embora " com promessas animadoras, nada fez ". Daqui concluiu pela não verificação da alegada caducidade.
Já na petição inicial, o autor tinha feito igual alegação no seu art. 12º.
Segundo o art. 1224º, nº 1 do Cód. Civil, em matéria de contrato de empreitada, os direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização caducam, se não forem exercidos dentro de um ano a contar da recusa da aceitação da obra ou aceitação com reserva, sem prejuízo da caducidade prevista no art. 1220º - prazo de denúncia dos defeitos.
Por seu lado, o nº 1 do mesmo art. 1224º prescreve que se os defeitos eram desconhecidos do dono da obra e este a aceitou, o prazo de caducidade conta-se a partir da denúncia, não podendo exceder nunca o prazo de dois anos sobre entrega da obra, prazo este que para as obras de imóveis de longa duração, como é o caso dos autos, passa a ser de cinco anos.
Ora daqui resulta que, no caso dos autos, tendo os defeitos sido denunciados em Janeiro e Fevereiro de 2000, se tem de contar o início do citado prazo de caducidade dessa mesma denúncia, pois sempre então o autor se tem de considerar conhecedor do direito de pedir a correcção dos defeitos que lhe assiste.
E o autor apenas propôs a presente acção mais de um ano decorrido desde essa denúncia, pelo que o pedido de reparação se tem de considerar caducado na data da mesma propositura.
As instâncias consideraram verificar-se a excepção à excepção de caducidade decorrente do disposto no art. 331º nº 2 do Cód. Civil que consiste no reconhecimento pelo réu do direito do autor.
Segundo o nº 1 do art. 331º citado, só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei ou convenção atribuía efeito impeditivo. E o seu nº 2 acrescenta que quando, porém, se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal relativa a direitos disponível, impede também a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido.
Tal como tem sido pacificamente entendido, o reconhecimento previsto no citado dispositivo não é a simples admissão genérica de um direito de crédito, mas consiste num reconhecimento concreto, preciso, sem ambiguidades ou de natureza vaga ou genérica, pois só, assim, se torna certo e equivale a uma sentença com valor, idêntico ao acto impeditivo previsto no nº 1 do citado art. 331º.
E seguindo a terminologia do acórdão deste Supremo Tribunal de 25/11/98, in BMJ 481º- 430, esse reconhecimento deve ser expresso, correcto e preciso, de modo a não subsistirem dúvidas sobre a aceitação pelo devedor do direito de crédito.
Ora no tocante a esta matéria o único "facto" alegado consistiu na expressão constante da réplica de fls. 51, sob o nº 7 "Contactado várias vezes pelo A. para concluir a obra, eliminar os defeitos e executar a obra do sótão, também em Janeiro de 2000 e em 14/02/2000, embora com promessas animadoras, nada fez".
Daqui resulta claramente que o referido reconhecimento não foi alegado em temos de factos bastantes, antes com uma mera conclusão equivoca e imprecisa sobre o seu conteúdo fáctico que não chega para integrar aquela excepção à excepção, que incumbia ao autor provar perante a alegação e prova do decurso do prazo de caducidade, nos termos do art. 342º , nº 2 do Cód. Civil.
É certo que o julgador que elaborou a base instrutória traduziu a referida alegação na forma "o réu prometeu fazê-lo", no quesito 29º, referindo-se ao contacto do autor ao réu para que este completasse a obra e eliminasse os defeitos da obra, previsto no quesito anterior, tendo sido aquele quesito dado por provado.
Porém, por um lado, tal alegação extravasa a matéria de facto alegada e por outra forma o reconhecimento é muito vago e genérico para produzir o efeito impeditivo da verificação da caducidade.
É que, por um lado, não se sabe quais os concretos defeitos que foram denunciados em Janeiro e Fevereiro de 2000 e por, outro lado e, sobretudo, nada foi alegado ou provado sobre o momento do reconhecimento e aquele para relevar tinha de ter ocorrido antes do decurso do prazo da caducidade e a ausência de prova da tempestividade do reconhecimento era do autor como elemento constitutivo da sua excepção à excepção de caducidade, nos termos do referido art. 342º.
Desta forma se tem de considerar que está caducado o direito do autor de pedir a eliminação dos defeitos alegados na petição inicial, ficando apenas de pé, no tocante a defeitos, os que foram alegados no articulado superveniente, aos quais o réu não arguiu a excepção de caducidade.
Procede, desta forma parcelar, este fundamento do recurso.

d) Nesta quarta questão pretende o recorrente que os danos não patrimoniais não são indemnizáveis em matéria de responsabilidade civil contratual, como é o caso dos autos.
Também aqui o recorrente não tem razão, tal como resulta das decisões das instâncias.
Esta questão tem sido objecto de controvérsia, pois o saudoso e ilustríssimo mestre Prof. Antunes Varela sempre defendeu a não ressarcibilidade dos danos não patrimoniais em matéria de responsabilidade contratual - cfr. "Das Obrigações em Geral ", 4ª ed., I, pág. 531.
Porém a generalidade da doutrina e da jurisprudência tem seguido a opinião contrária, remetendo por brevidade a análise desta controvérsia para o acórdão deste Supremo de 9-12-93, in C.J. I. III, pág. 174.
Em resumo, diremos que sendo a matéria da responsabilidade civil prevista nos arts. 483º e segs. do Cód. Civil, aplicável, em geral, às duas formas de responsabilidade civil - contratual ou extracontratual -, nada na lei há que claramente exclua a ressarcibilidade dos danos não patrimoniais prevista no art. 496º do mencionado Código Civil, à responsabilidade contratual.
Por isso e remetendo para mais alongado fundamento para a decisão recorrida, improcede este fundamento do recurso.

e) Por último, resta conhecer da questão de os danos não patrimoniais não terem relevância para serem ressarcíveis.
Também esta questão improcede.
Com efeito, segundo o art. 496º, nº1 do Cód. Civil, os danos não patrimoniais serão ressarcidos sempre que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito.
Tal como ensinam os Professores A. Varela e P. de Lima, no seu Cód. Civil, anotado, a lei não enumera os casos em que se justifica a indemnização, deixando ao tribunal, em cada caso concreto, dizer se o dano é ou não merecedor de tutela jurídica.
De qualquer modo, "a gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo ( conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos ( de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada); por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito; o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado" - in "Das Obrigações em Geral, I vol., 2º ed., pág. 486.
Ora no caso em apreço, e tendo em conta que o direito à reparação dos defeitos alegados na petição inicial está caducado, não releva aqui a existência dos mesmos defeitos, sendo a matéria factual apurada relevante quanto a este aspecto a seguinte:
O autor deu em empreitada a construção de uma moradia ao réu que desde Dezembro de 1999, a abandonou, sem concluir a obra, ficando essencialmente em falta os acabamentos do sótão: executar uma WC, afagar a totalidade das paredes, fazer quatro aberturas para luz, concluir os tectos em gesso e por o chão pronto a levar soalho, dividir, electrificar e colocar o aquecimento, e, ainda, cerzitar as duas caixas de saneamento e colocar novo tubo de drenagem; montar as antenas; forrar a pedras o muro por detrás da casa, do lado nascente; colocação de isolamento no chão da casa e das telas nas varandas, preencher totalmente a caixa de ar com poliestireno nas paredes exteriores.
Por outro lado, parte do muro do lado do mar da obra ruiu, estando a parte restante em perigo de ruína iminente, o que impossibilita tratar do jardim próximo daquele muro, causando ao autor receio, desgosto e vergonha.
Estes factos e nomeadamente o decurso do tempo decorrido sem que as obras em falta sejam completadas e os defeitos sejam eliminados leva a concluir que os mesmos danos têm a gravidade bastante para serem merecedores da tutela do direito.
Com efeito, tendo o autor pretendido uma moradia para viver e decorrido o citado lapso de tempo sem poder usufruir plenamente da mesma moradia, com o jardim no estado referido: muro em ruínas e impossibilidade parcial de tratar do mesmo jardim, o sótão incompleto e as demais obras em falta são de molde a provocar um desgosto assinalável que deve merecer a protecção jurídica.
Soçobra, assim, este fundamento do recurso.

II. Recurso subordinado do Autor.
Das conclusões deste recorrente se vê que este, para conhecer neste recurso, levanta a seguinte questão:
Os danos não patrimoniais devem ser fixados em € 10.000, como fixou a 1ª instância ?
Vejamos.
Na petição inicial, o autor alegando a situação de incumprimento da empreitada referida e de cumprimento defeituoso, pede a condenação do réu no pagamento de uma "indemnização no montante que for arbitrada ou vier a liquidar-se em execução de sentença, por danos patrimoniais e não patrimoniais".
Posteriormente no articulado superveniente de fls. 288 e segs. o autor veio alegar que no dia 30 de Junho de 2003, o muro do lado do mar da casa objecto da empreitada aqui em causa ruiu em parte, encontrando-se a parte restante em perigo de ruir e ameaçando aluir também a parte do jardim junto àquele, com o que impossibilita o autor de utilizar a parte do jardim junto ao mesmo. Destes factos alega que o prédio do autor ficou com aspecto lastimável documentado em fotografias que junta e provocando desgosto no autor e vergonha em convidar os amigos ou familiares a visitá-lo em casa, o que irá perdurar até à execução de novo muro necessário à reparação do defeito alegado.
Por isso, além do pedido de condenação do réu a executar novo muro, pede uma indemnização por danos não patrimoniais de montante não inferior a € 1.500,00, "sem prejuízo da indemnização que vier a ser liquidada em execução de sentença ".
Na sentença de 1ª instância foi considerado que apenas se prova danos de natureza não patrimonial, fixa-se a indemnização pelos mesmos já sofridos no montante de € 10.000,00 e ainda condena o réu no montante a liquidar em execução de sentença pelos danos que o autor venha a sofrer na utilização da casa até à realização das obras e correcção dos defeitos referidos na sentença.
Na apelação do réu, foi na Relação considerado que os danos não patrimoniais peticionados foram liquidados em 1.500 euros pelo que a decisão que os fixou na 1ªinstância excedeu o peticionado e reduziu a este montante a condenação do réu a este título.
Parece-nos que houve aqui uma série de equívocos.
Por um lado, o autor quando no articulado superveniente pediu o montante de € 1.500 referia-se aos danos não patrimoniais referente à ampliação do pedido aí formulado, pois aí se refere sem prejuízo da indemnização que vier a ser liquidada em execução de sentença que não poderá ser outra senão a peticionada na petição inicial.
Por isso, na decisão do litígio, ter-se-ia de tomar em conta o pedido de indemnização a liquidar em execução de sentença decorrente dos danos cuja reparação foi peticionada na petição inicial e decorrentes do não acabamento das obras contratadas. Mas ter-se-ia de considerar o pedido de indemnização no mínimo de € 1.500 pelos danos decorrentes dos defeitos descritos no articulado superveniente e objecto da ampliação do pedido ali formulado.
Perante isto, a sentença de 1ª instância extravasou o pedido, pois tal como entende o Conselheiro Jacinto R. Bastos, in Notas ao Cód. de Proc. Civil, em anotação ao art. 661º, sem a liquidação prevista no nº 2 do art. 471º, não pode o tribunal a quem foi formulado um pedido genérico proferir uma condenação específica, sob pena de violar o princípio do pedido mencionado, concedendo coisa diversa do peticionado.
A mesma sentença apenas podia ter condenado na indemnização de € 1. 500 referente aos defeitos objecto do pedido do articulado superveniente, único pedido de indemnização que foi formulado em pedido específico, além de poder e dever conhecer do pedido ilíquido e ser concedido, eventualmente, como tal.
Por outro lado, o douto acórdão em apreço ao entender que o pedido inicial genérico foi liquidado no referido articulado superveniente errou igualmente, pois o autor ali apenas formulou um novo pedido de indemnização líquido a acrescer ao pedido ilíquido inicial.
Daí que tenha de proceder este fundamento do recurso no sentido de se deferir a condenação ilíquida do réu no pagamento da indemnização por danos não patrimoniais referentes às obras incompletas objecto da condenação. Por outro lado, a indemnização fixada no acórdão só pode versar os defeitos da obra acusados no articulado superveniente, indemnização essa liquidada pelo autor.
Tal como é pacificamente entendido, a reparação dos danos não patrimoniais, não visa uma reparação directa dos danos sofridos, porque estes são insusceptíveis de serem contabilizados em dinheiro.
Com o ressarcimento da referida classe de danos, visa-se viabilizar um lenitivo ao lesado, já que tirar-lhe o mal que lhe foi causado não é possível.
Trata-se de pagar a dor com prazer, através da satisfação de outras necessidades com o dinheiro atribuído para compensar aqueles danos não patrimoniais, compensando aquelas dores, desgostos, contrariedades com o prazer derivado da satisfação das necessidades referidas.
Segundo o art. 496º nº 3 do Cód. Civil manda aplicar a equidade e atender ao grau de culpa do agente, à situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.
A equidade traduz-se na observância das regras de boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas, da criteriosa ponderação das realidades da vida, dos parâmetros de justiça relativa e dos critérios de obtenção de resultados uniformes.
Ora ponderando que os danos em causa são os decorrentes de o autor ter o muro de suporte do jardim, do lado do mar em ruínas, numa parte já caído e noutra a ameaçar ruir, impossibilitando o tratamento do jardim contíguo, o que causa receio, desgosto e vergonha ao autor, e tendo em conta que tal defeito se arrasta desde meados de 2003, parece-nos bastante para compensar estes males a quantia de 500 euros, sendo, assim, de fixar o montante de danos não patrimoniais decorrentes da ruína do muro do lado do mar da casa do autor nesse quantitativo.
Além disso, há que considerar os danos não patrimoniais decorrentes da obra inacabada pedidos na petição inicial como ilíquidos.
Como já dissemos na decisão da revista do réu, estes danos merecem a tutela do direito, sendo de atribuir em montante a liquidar em execução de sentença - como fora peticionado.
Desta forma procede, em parte, este fundamento do recurso.

Pelo exposto, julga-se:
- A revista do réu, em parte, procedente e, por isso, se julga procedente a excepção de caducidade do direito do autor a ver reparar os defeitos da obra peticionados na petição inicial - constantes dos factos das respostas dadas aos quesitos 21º a 25º como se refere na sentença de 1ª instância -, por não verificação do reconhecimento da dívida prevista no nº 2 do art. 331º do Cód. Civil, pedido este de que se absolve o réu, mantendo-se o mais decidido na 1ª instância e confirmado no acórdão, salvo no tocante à indemnização abaixo apreciado.
- A revista do autor também parcialmente procedente e, por isso, se altera o decidido no acórdão em apreço, no tocante ao pedido de indemnização por danos não patrimoniais, sendo o réu condenado no pagamento a este título e referente aos danos decorrentes da ruína do muro da casa do lado do mar, a pagar ao autor o montante de quinhentos euros e, ainda, no tocante às obras inacabadas peticionadas na petição, na indemnização a liquidar em execução de sentença.

Custas na 1ª instância, na apelação e na revista do réu, na proporção de dois terços pelo réu e o restante terço pelo autor.
Na revista do autor as custas ficam repartidas provisoriamente em 5% pelo réu e os restantes 95% pelo autor, sendo este montante reapreciado de acordo com a liquidação da indemnização ilíquida.

Lisboa, 8 de Junho de 2006
João Camilo (Relator)
Fernandes Magalhães
Azevedo Ramos.