Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1333/20.5T8LRA.C1.S1
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: DOMINGOS JOSÉ DE MORAIS
Descritores: DOCUMENTO
DESPEDIMENTO
EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
PRESUNÇÃO LEGAL
Data do Acordão: 10/12/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA EXCECIONAL E CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA GERAL.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I- Os documentos têm uma função representativa ou reconstitutiva do objecto, destinando-se exclusivamente a servir como meio de prova real de determinados factos.
II- As sentenças e os acórdãos constituem peças jurídicas, judicialmente elaboradas no decurso da resolução de conflitos no sistema judiciário, e não documentos nos termos definidos no artigo 362.º do CC e nos artigos 651.º, n.º 1 e 425.º, ambos do CPC.
III- A ilisão da presunção legal, prevista no artigo 366.º n.º 5 do CT para o despedimento por extinção do posto de trabalho, consubstancia-se com a devolução da totalidade da compensação, simultaneamente, com a apresentação em juízo de um dos dois procedimentos legais previstos nos artigos 386.º e 387.º, n.º 2, do Código do Trabalho.
Decisão Texto Integral:


Processo n.º 1333/20.5T8LRA.C1.S1
Origem: Tribunal da Relação de Coimbra  
Recurso de revista excepcional
Relator: Conselheiro Domingos Morais
Adjuntos: Conselheiro Mário Belo Morgado
               Conselheiro Júlio Gomes                

Acordam os Juízes na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça

I.Relatório
1. - AA apresentou o formulário a que reportam os artigos 98.º-C e 98.º-D, do Código de Processo de Trabalho (CPT).
Planitec – Moldes Técnicos, S.A., frustrada a conciliação na audiência de partes, apresentou o articulado motivador do despedimento por extinção do posto de trabalho.
2. - Notificado, o Autor apresentou contestação/reconvenção, impugnando os factos sobre o fundamento do despedimento alegados pela ré, e que seja condenada:
a) a pagar ao Trabalhador uma indemnização pela ilicitude do despedimento no valor de 165.000,00 €;
b) a pagar ao Trabalhador o valor de 4.400,00 € referentes às férias vencidas em 1 de janeiro de 2020 e não gozadas.
c) a pagar ao Trabalhador o valor de 10.000,00 € pelos danos morais sofridos;
d) a pagar ao Trabalhador as retribuições que este deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão judicial que declarar a ilicitude do despedimento;
e) a pagar ao Trabalhador os juros, à taxa legal aplicável, sobre todas as quantias reclamadas.
3. - Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
Pelos fundamentos expostos, decide-se:
a) julgar improcedente, por não provada, a presente acção com processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, considerando lícito e regular o despedimento efectuada pela Entidade Empregadora;
b) julgar totalmente improcedente a reconvenção deduzida pelo Réu/ Trabalhador e, em consequência, absolver a Entidade Empregadora do demais peticionado em sede reconvencional”.
4. - O Autor interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação de Coimbra decidido por acórdão de 21.05.2021:
a) Determinar que, em relação ao processo electrónico, não seja tomado em conta o documento junto com as alegações do apelante e em ordenar, no que toca ao processo físico, o seu desentranhamento e entrega ao apelante, indo este condenado nas custas do incidente;
a) Julgar a apelação totalmente improcedente com integral confirmação da decisão recorrida”.
5. - O Autor interpôs recurso de revista, e subsidiariamente, recurso de revista excecional, concluindo, em resumo: 
- As três questões a decidir por V. Exas. e que sumariamente se expõem, são:
a) A ordem de desentranhamento do “acórdão fundamento”;
b) A nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia;
c) A ilisão da presunção do despedimento. 
- Desde logo, quanto à questão do desentranhamento do “acórdão fundamento” que sobe a esta instância para apreciação de V. Exas., importa saber que, o propósito do recorrente ao juntar com o recurso de apelação o supramencionado acórdão de 23-09-2020, foi invocar jurisprudência que melhor explicitasse o conceito de “presunção de despedimento” ao abrigo do art. 366.º, n.º 4 e n.º 5 do CT.
- A invocação de um acórdão que é junto ao recurso interposto ou remetido para a DGSI como habitualmente é feito pelas partes, tem o mesmo objetivo: o de convocar decisões judiciais que possam contribuir para a boa decisão da causa.
- Com a junção do acórdão aos autos, o recorrente pretendeu apelar à atenção dos Mmos. Juízes Desembargadores do Tribunal a quo para a importância da decisão do STJ, de 23-09-2020 e, não juntar um documento para prova de factos ou um parecer elaborado por jurisconsulto.
- Em segundo lugar, o acórdão sob recurso incorre numa nulidade decisória ao não ter tomado conhecimento de uma questão suscitada pelo recorrente que deveria ter sido apreciada pela 2.ª instância, ao abrigo do art. 662.º, n.º 2, als. a) e b) do CPC.
- Ademais, o Tribunal a quo entendeu que os depoimentos das testemunhas visadas seriam inconclusivos e que o documento da Segurança Social seria insuficiente para alterar o ponto 6 da matéria de facto dada como não provada pela 1.ª instância, ao abrigo do art. 662.º, n.º 1 do CPC.
- Com o recurso de apelação, o recorrente apresentou um requerimento autónomo, onde expressamente pedia que o Tribunal a quo reenviasse os autos para a 1.ª instância para reexame do ponto 6 da matéria de facto dada como não provada, transcrita e reproduzida a págs. 6 e 7 do presente recurso de revista, o que para aí se remete.
- Quanto a este requerimento a 2.ª instância não proferiu qualquer decisão, situação que configura omissão de pronúncia ao abrigo dos arts. 615.º, n.º 1, al. d) e 674.º, n.º 1, al. c), ambos, do CPC.
- Aliás, como já reafirmou o Supremo Tribunal de Justiça no proc. n.º 1345/13.5TVLSB.L1.S1, de 03-05-2018, juiz relator SALAZAR CASANOVA, transcrito e citado a págs. 9 e 10 do presente recurso de revista, remetendo-se para aí a sua leitura.
- Resultando deste aresto que, há nulidade do acórdão se, o Tribunal da Relação não se pronunciar sobre o requerimento apresentado por uma das partes recorrentes para reenvio do processo à 1.ª instância, com o propósito de reexame dos pontos da matéria de facto da causa questionados.
- Devendo o acórdão recorrido ser revogado e, ordenada a baixa do processo para o Tribunal da Relação de Coimbra nos termos do art. 684.º, n.º 2 do CPC, para que possa pronunciar-se sobre o requerido reenvio à 1.ª instância para reexame do ponto 6 da matéria de facto dada como não provada, na sentença proferida pelo Juízo de Trabalho ....
- A terceira questão do recurso de revista versa sobre a presunção de despedimento por extinção do posto de trabalho e da sua ilisão (vd. arts. 366.º, n.º 4 e n.º 5 do CT), objeto de decisão pelo Tribunal a quo e pela 1.ª instância, ainda que, com fundamentação essencialmente diferente.
- Salvo douto entendimento, a interpretação e aplicação do art. 366.º, n.º 4 e n.º 5 do CT pelo acórdão sob recurso está ferida de inconstitucionalidade material.
- O julgamento proferido nestes autos quanto à ilisão da presunção do despedimento é totalmente arbitrária, pois, enquanto para um julgador 13 dias pode ser suficiente para ilidir a presunção de despedimento, para outro julgador pode ser demasiado tempo; o que é desproporcional, irrazoável, excessivo e gerador de insegurança jurídica.
- O recorrente suscita, por violar o núcleo duro dos direitos fundamentais do “Do Direito e Tutela Jurisdicional Efetiva” e a “Segurança no Emprego”, respetivamente, com assento nos arts. 20.º, n.º 1 e 53.º da Constituição da República Portuguesa, a Inconstitucionalidade Material do art. 366.º, n.º 4 e n.º 5 do Código do Trabalho, nos moldes interpretados e aplicados nestes autos.
- O mais alto Tribunal tem decidido que, para o trabalhador lograr ilidir a presunção de despedimento (art. 366.º, n.º 4 do CT) deverá praticar comportamentos consentâneos com a não conformação do despedimento e devolver a compensação de imediato ou num momento posterior, mas segundo um prazo razoável (art. 366.º, n.º 5 do CT).
- O acórdão sob recurso andou mal nesta sede pois, para além da referida inconstitucionalidade material, não julgou como ilidida a presunção de despedimento do recorrente, que reteve a compensação durante 13 dias, contradizendo o acórdão citado na decisão recorrida [ac. 23-09-2020, (STJ) proc. n.º 10840/19.1T8LSB.L1.S1], que julgou como ilidida a presunção de despedimento do trabalhador que reteve consigo a compensação durante 14 dias antes de a devolver.
- Salvo o devido respeito, fica por esclarecer por que critério se pautou o acórdão sob recurso quando o Supremo Tribunal de Justiça julgou como ilidida a presunção de aceitação de despedimento num hiato de tempo relativamente semelhante ao do destes autos.
- Considerando que, tanto num caso como no outro, ambos os trabalhadores não estavam resignados com o seu despedimento.
- A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem decidido que, para os trabalhadores lograrem ilidir a presunção de despedimento, deverão assumir um comportamento de boa fé consentâneo com a não aceitação do despedimento que, deve ser acompanhado por um ato de devolução da compensação em prazo razoável.
- Ora, ficou assente que o recorrente não se conformaria com o despedimento ao ter recusado receber a comunicação prévia do despedimento (a fls. 32), formulado pedido inspetivo à ACT para fiscalização da extinção do posto de trabalho (a fls. 36) ao ter apresentado oposição aos fundamentos do despedimento (a fls. 48 verso a 50) e, bem assim, por ter devolvido a compensação ao fim de 13 dias, conforme fixado pelo acórdão sob recurso.
- Fica assim por explicar a (in)coerência do Tribunal a quo com o acórdão citado no ponto 23 destas conclusões, que julgou como ilidida a presunção de despedimento num caso em que o trabalhador reteve a compensação por 14 dias.
Perante isto, e tendo ainda presente o princípio da boa fé, impõe-se neste caso a conclusão de que o recorrente manteve um comportamento coerente no sentido de se não conformar com o despedimento, considerando-se - aliás, na senda do douto acórdão já citado - que a devolução da compensação ao fim de 13 dias seja suficiente para afastar a presunção de aceitação do despedimento.
6. - A ré respondeu no sentido de ser:
a) Rejeitado o recurso; Sem conceder;
b) Julgado o recurso improcedente e, em consequência, mantido o acórdão recorrido.”.
7. - Por Acórdão Formação, de 17.03.2022, prevista no artigo 672.º, n.º 3 do CPC, foi admitida a revista excepcional, por considerados verificados os requisitos do artigo 672.º, n.º 1, alíneas a) e b).
8. - O Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser negada revista. 
9. - Cumprido o disposto no artigo 657.º, n.º 2, ex vi do artigo 679.º, ambos do CPC, cumpre apreciar e decidir.
II.Fundamentação de facto
1. - As instâncias consideram provados e não provados os seguintes factos:
1. A PLANITEC é uma sociedade que se dedica à fabricação e comercialização de moldes e acessórios para a indústria de transformação de matérias plásticas e metais e outras actividades industriais e comerciais (cfr. certidão fls. 224 verso a 233);
2. Foi constituída em 18.05.1990, sob a forma de sociedade por quotas, com o capital de 6.000.000$00, repartido em cinco quotas por cada um dos seguintes sócios, que igualmente exerciam a gerência, no valor de: 900.000$00, pertença de BB; 900.000$00, pertença de CC; 900.000$00, pertença de DD; 900.000$00, pertença de EE; 2.400.000$00, pertença de “Planimo9lde – Centro de Planeamento e Fabrico de Moldes, Limitada”, com sede em ..., ...;
3. Em 10.09.1993 (Ap.04), foi registada a divisão da quota de 900.000$00 do sócio EE em 3 quotas de 300.000$00, e a sua transmissão, por cessão, a favor dos sócios BB, CC e DD;
4. Na mesma data (10.09.1993, pela Ap. 05) foi registada a divisão da quota de 2.400.000$00 da sócia “Planimolde – Centro de Planeamento e Fabrico de Moldes, Lda.” em duas quotas, uma de 1.800.000$00 e outra de 600.000$00, e a transmissão desta última, por cessão, a favor do sócio FF, o qual, também nessa data (Ap.06), procedeu à unificação das suas quotas de 900.000$00, 300.000$00 e 600.000$00 numa quota de 1.800.000$00;
5. Os sócios BB e DD, em 10.09.1993 (Aps. 07 e 08) procederam á unificação das suas quotas de 900.000$00 e 300.000$00, numa de 1.200.000$00 para cada um;
6. Em 20.05.1999 (Ap.01) foi registadas a transmissão, por cessão, resultante da divisão da quota de 1.800.000$00 da “Planimolde – Centro de Planeamento e Fabrico de Moldes, Lda.”, em 3 quotas de 960.000$00, 480.000$00 e 360.000$00, a favor, respectivamente, de AA, BB e DD;
7. Em 20.05.1999 (Ap.02) foi registada a transmissão, da quota de 120.000$00, por cessão de CC, a favor de DD, resultante da divisão da quota de 1.800.000$00 pertença do primeiro, que reservou para si a quota de 1.680.000$00;
8. Na mesma data (20.05.1999 – pelas Aps. 03 e 04), os sócios BB e DD procederam à unificação das suas quotas de 1.200.000$00 e 480.000$00 o primeiro, e de 1.200.000$00, 320.000$00 e 120.000$00 o segundo, passando cada um a deter uma quota de 1.680.000$00;
9. Ainda em 20.05.1999 (Ap. 05), os sócios CC, BB e DD, procederam ao reforço de capital da PLANITEC para 9.036.150$00, subscrito e realizado em dinheiro no valor de 2.530.122$00 por cada um dos sócios CC, BB e DD, e de 1.445.784$00 pelo sócio AA, e à sua redenominação em euros – 75.000,00 € - passando então a deter, cada um dos sócios BB, CC e DD, uma quota no valor nominal de 21.000,00 €, correspondente cada uma a 28% do capital social, e o sócio AA uma quota no valor nominal de 12.000,00 €, correspondente a 16% do capital social, tendo todos eles sido designados como gerentes;
10. Em 28.11.2018, depois do aumento de capital, no montante de 1,00 €, pela subscrição em numerário efectuado pela nova sócia “Moldes Value Engineering V, SA”, a PLANITEC foi transformada em sociedade anónima, com o capital de 75.001,00 €, distribuído em 75.001 acções no valor nominal de 1,00 € cada, passando os anteriores sócios gerentes a exercer funções como membros do Conselho de Administração;
11. Por contrato assinado em 21.12.2018, os identificados (ex sócios) accionistas da PLANITEC, SA, procederam à venda de 90% do capital social daquela sociedade à “T..., SA”, mais se vinculando a, quatro anos depois, alienar os restantes 10% à mesma sociedade – pelo preço global de 5.000.000,00 € (cinco milhões de euros) – doc. fls. 54 a 59;
12. O preço que a T..., SA pagou aos cedentes pela aquisição dos mencionados 90% do capital social da PLANITEC, SA ascendeu a 2.800.000,00 €, repartido por aqueles, na proporção da percentagem relativa que cada um detinha no capital social da sociedade;
13. Nos termos ajustados, o diferencial de 2.200.000,00 € seria devido contra a alienação dos remanescentes 10% do capital social à T..., SA;
14. Com a alienação de 90% da sua participação social na EP, o Trabalhador recebeu a quantia de 448.000,00 €;
15. Na mesma data (21.12.2018), e para ter efeitos imediatos, AA renunciou à administração da PLANITEC, SA, mais declarando que “na presente data, seja em virtude dos cargos que desempenhei na Planitec, seja em virtude da presente renúncia, nada me é devido por esta sociedade, designadamente a título de remuneração, qualquer tipo de prémios ou gratificações, distribuição de lucros, reembolso ou comparticipação de despesas ou a qualquer outro título” (doc. fls. 60);
16. Também os ex accionistas BB, CC e DD renunciaram às funções de membros da Administração da PLANITEC, SA em 21.12.2018 (com registo efectuado em 07.02.2019 – Ap. 186), sendo designados nessa mesma data, e para fazer parte desse órgão, GG, HH e II (Ap. 187/20190207);
17. Na mesma data referida em 11, AA (à semelhança de BB, CC e DD - ressalvadas as diferentes categorias) acordou em celebrar um contrato de trabalho sem termo com a PLANITEC, SA, com efeitos a 08 de Janeiro de 2019, comprometendo-se ao exercício, por conta e sob a autoridade e direcção da segunda, a “actividade de direcção da área de rectificação”, nas instalações da sede desta, pelo período normal de trabalho de 8 horas/dia e 40 horas/semana, mediante a remuneração base mensal ilíquida de 3.600,00 €, acrescida de subsídio de alimentação no valor diário de 6,00 €/dia de trabalho efectivo (cláusulas 1ª e 2ª do contrato de fls. 27 a 29);
18. Nos termos ajustados no referido contrato, sob a cláusula 3ª, al. b), o Trabalhador “poderá apresentar despesas (nomeadamente as despesas concernentes a utilização da viatura pessoal) com um montante máximo de 1.100,00 € mensal”, podendo ainda optar “pela incorporação de um valor no salário mensal definido na cláusula 2ª”, sem que a Planitec “tenha um custo decorrente de tal incorporação de valor superior a 1.100,00 €”, suportando o Trabalhador “todas as despesas que tenha no exercício das suas funções, nomeada, mas não exclusivamente, as despesas relativas a utilização de viatura pessoal”;
19. Nos termos ajustados no referido contrato (cláusulas 9ª e 12ª), AA obrigou-se a um período de permanência na PLANITEC, SA durante 3 anos a contar da sua celebração, durante o qual se comprometeu a desenvolver as suas funções profissionais de forma exclusiva para a EP e a não negociar por conta própria ou alheia, em concorrência com esta, declarando ainda garantir que durante 4 anos “não exercerá ou coordenará, total ou parcialmente, por si ou por interposta pessoa ou entidade, directa ou indirectamente, nomeada, mas, não exclusivamente, através de sociedades por si controladas ou consigo relacionadas, a actividade comercial que seja concorrente com a actividade da PLANITEC, SA”;
20. Por força do referido contrato, AA exercia a categoria de Director de Rectificação, incumbindo-lhe as seguintes tarefas e responsabilidades: supervisão da actividade dos trabalhadores que executam trabalhos de rectificação;
21. Antes da entrada da T..., SA no capital da Planitec, SA, a actividade desta segunda desenvolvia-se à volta das pessoas dos sócios, sendo que destes – sobretudo do CC e DD – dependia um conjunto alargado de funções operacionais nas vertentes comercial, compras e produção;
22. Com a aquisição pela T..., SA do capital da Planitec, SA, o Conselho de Administração nomeado por tal accionista, tendo em vista optimizar e profissionalizar a gestão da sociedade, passou a estruturar-se em áreas funcionais: desenvolvimento de negócio, financeira, projecto e engenharia, produção, compras, O & M (Organização e Método) e comercial;
23. Mediante a nova forma de organização, os ex (sócios-gerentes) accionistas mantiveram as responsabilidades que antes assumiam, agora sob um vínculo laboral, acumulando alguns deles competências em determinadas áreas: o CC foi nomeado Director Geral, respondendo directamente perante o CEO JJ e, adicionalmente, pela sua anterior experiência, manteve a coordenação das áreas de produção, comercial e compras; BB manteve a coordenação da área de engenharia & CAD, por virtude da sua experiência na área de projecto; DD assumiu a coordenação das áreas de produção (em conjunto com o CC) e O&M; AA continuou a prosseguir a coordenação da actividade de rectificação;
24. O acompanhamento de testes e ensaios externos - tarefa não incluída no processo de fabricação de moldes (produção) - que AA realizava enquanto gerente/acionista da Planitec, relativamente aos clientes que antes tinha angariado ou que acompanhava, foi assumido pela área de Engenharia & CAD (Projecto);
25. No organigrama da empresa, AA, enquanto coordenador da actividade de rectificação, encontrava-se integrado na área de produção, conforme gráfico de fls. 284;
26. O seu posto de trabalho encontrava-se sob a alçada da Direcção de Produção, chefiada por CC e DD;
27. A rectificação (que integra uma fase do processo produtivo a par da fresagem e da erosão), integra-se no Controlo de Produção, a cargo da trabalhadora KK;
28. A coordenação da fresagem & CAM e da erosão incumbem aos ex sócios/accionistas DD e CC (que são responsáveis da área de Produção);
29. As tarefas e responsabilidades que incumbem a AA, em face de tal organigrama, são mais limitadas que as que foram assumidas pelos ex sócios/accionistas, podendo, com ganhos de eficiência, ser assumidas por outro trabalhador;
30. Não se justificando, assim, manter um posto de trabalho de coordenação da rectificação, máxime porque as demais fases finais (fresagem e erosão) estão já sob coordenação da produção;
31. Os (agora) trabalhadores DD e CC têm experiência e capacidade (e fazem-no de facto) para manipular as máquinas de precisão (rectificadora, CNC e de erosão), contrariamente ao AA, que não opera qualquer maquinaria;
32. A PLANITEC pretende afectar a Direcção de Produção, em exclusivo, ao trabalhador DD (desafectando o trabalhado CC dessa área), que se revela apto e tecnicamente preparado para tal, procedendo à concentração do titular da área de Produção;
33. Os trabalhadores subordinados afectos à rectificação vêm exercendo as suas tarefas de modo escorreito, relativamente autónomo e rotineiro, sem necessidade de coordenação específica;
34. Por virtude do referido em 33, o AA nem sequer se mostra ocupado durante a jornada diária de trabalho de 8 horas, prevista no contrato de trabalho firmado;
35. Considerando que não opera equipamentos de rectificação, o AA tampouco pode complementar a mão de obra que se ocupa da fase final da produção (rectificação, fresagem e erosão);
36. Mostrando-se, assim, de todo desnecessário manter um posto de trabalho de mera coordenação de um processo produtivo, por tal tarefa poder ser assumida directamente pela Direcção de Produção, sem sobrecarga nem perda de eficiência;
37. Eliminando-se, desta forma, um nível de chefia/coordenação sob a Direcção de Produção (chefia intermédia), aproximando o Director de Produção dos trabalhadores fabris;
38. A coordenação da rectificação pode, assim, ser assumida por trabalhador preexistente na estrutura – o Director de Produção, o qual, mesmo na área de rectificação, revela maior polivalência que o Trabalhador;
39. O posto de trabalho do AA revela-se, por isso, destituído de real valia e por demais oneroso para a Planitec;
40. AA é o único trabalhador na estrutura da PLANITEC, SA que titula a categoria funcional de director de rectificação, inexistindo outro posto de trabalho (directivo) compatível com tal categoria;
41. Em 23.01.2020, a EP, antes de avançar para o despedimento por extinção do posto de trabalho, que nunca descartou, conforme transmitiu ao Trabalhador, propôs-lhe a revogação, por acordo, do contrato de trabalho referido em 16, conforme e-mail que lhe enviou, com o seguinte teor (fls. 75 verso e 76): “Caro AA, Conforme solicitado, vimos, pelo presente, apresentar, para sua apreciação, as condições que propomos para a revogação, por cordo, do contrato de trabalho que o vincula à Planitec. Com efeito, e como foi amplamente discutido, entende a empresa estarem verificadas as condições para a extinção do posto de trabalho que ora ocupa. Na verdade, em face da reorganização da Planitec, nos termos do qual se prevê a concentração da coordenação das áreas-chave da empresa (D..., P...), deixa de se justificar a manutenção das funções de coordenação que actualmente desenvolve, as quais poderão ser assumidas, como maior eficiência e sem sobrecarga, ao nível da Direcção de Produção. No entanto, a empresa pretende privilegiar a via negocial e acordar um acordo de revogação do contrato de trabalho actualmente em vigor. São as seguintes as condições que propomos para a pretendida revogação consensual (ficando, deste modo, liquidados e satisfeitos, de modo definitivo, todos os créditos recíprocos entre as partes). Data da desvinculação: 31.1.2020; Compensação pecuniária global: 1.877,33 € (resultante da aplicação do critério legal de cálculo da compensação devida pela cessação do contrato de trabalho: factor 12 dias/ano de antiguidade); Pagamento da retribuição integral referente ao mês de Janeiro de 2020: 4.400,00 €; Proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal: 9.966,67 €; “Waiver”/revogação do pacto de não concorrência e exclusividade (cfr. arts. 9º e 12º do contrato de trabalho): tem evidente valor económico, não computável;. Emissão de declaração destinada a ser apresentada para efeitos de candidatura a subsídio de desemprego (não garantindo a empresa, naturalmente, o preenchimento das condições respeitantes ao beneficiário, nomeadamente o prazo de garantia para acesso às prestações de desemprego). Sendo nossa intenção privilegiar a via negocial, agradecemos que nos informe, com a brevidade possível (em face da data proposta para a sua desvinculação), se concorda com os termos sugeridos. Aproveitamos para sugerir que se informe e aconselhe junto de advogado ou consultor da sua confiança, de modo a que possamos celebrar um acordo esclarecido e vantajoso para ambas as partes, agilizando os formalismos legais. Ficamos ao inteiro dispor para esclarecer o que tiver por útil ou conveniente. (…)”;
42. O Trabalhador, assessorado por advogado, não deu qualquer resposta ao e-mail referido em 39;
43. Na PLANITEC não existe nenhuma comissão de trabalhadores, comissão intersindical ou sindical regularmente constituída;
44. O Trabalhador não é representante sindical;
45. Em 28.02.2020, a EP pretendeu entregar ao Trabalhador, em mão, a comunicação prévia da decisão de extinção do posto de trabalho nos termos do art. 369º do CT (com o teor de fls. 32 verso-34, que damos por reproduzido);
46. O Trabalhador recusou-se a receber e a assinar o duplicado da referida comunicação (sendo que esta contemplava um espaço para este último assinar, onde constava que tal assinatura se limitava a atestar a recepção daquele documento);
47. Face a tal recusa, por carta de 03.03.2020, a EP enviou a comunicação inicial de despedimento (datada de 28.02.2020) por correio registado para o domicílio pessoal do Trabalhador, que o Trabalhador recebeu no dia 05.03.2020, após reclamação da mesma junto do posto dos Correios (doc. fls. 31-34 e fls. 35 e 35 verso);
48. Na referida comunicação, a EP aduziu os motivos justificativos da intenção de despedimento, invocando “motivos estruturais”, indicando que à data, o Trabalhador “vem titulando, até ao presente, a categoria de Director de Rectificação” e que “Atendendo à actual estrutura da PLANITEC e com vista à sua optimização, afigura-se necessária a extinção do posto de trabalho que V. Exa. ocupa, por expletivo, redundante, destituído de real valia e, em consequência, por demais oneroso para a Empregadora”, acrescentando que “é o único trabalhador na estrutura da Planitec que titula a categoria funcional de director de rectificação, pelo que não se aplicam os critérios previstos no art. 368º/2 do Código do Trabalho” – doc. fls. 31-34;
49. Por email de 09.03.2020 o Trabalhador comunicou à EP o pedido de intervenção da ACT para verificação dos requisitos do despedimento por extinção do posto de trabalho, nos termos do art. 370º, nº 2, do CT – doc. fls. 36;
50. Em 12.03.2020, a EP recebeu notificação da ACT para apresentação de documentos – doc. fls. 37;
51. Em cumprimento da solicitação da ACT, a EP, em 16.03.2020, enviou por correio electrónico a respectiva documentação – doc. fls. 36 verso;
52. Em 17.03.2020, a ACT elaborou o relatório a que se reporta o art. 370º, nº 3 CT, no sentido que a EP respeitou os requisitos da extinção do posto de trabalho, do qual notificou a EP no dia 20.03.2020 - cfr. doc. fls. 47 verso e 48;
53. A ACT notificou a EP de tal relatório no dia 20.03.2020;
54. No dia 24.03.2020, a EP recebeu o parecer do Trabalhador, a que se reporta o art. 370º, nº 1 do CT, com o teor de fls. 48 verso a 50, que damos por integralmente reproduzido;
55. Por carta de 1 de Abril 2020, a EP comunicou ao Trabalhador a decisão final de despedimento por extinção do posto de trabalho (doc. fls. 3 a 7), que este recebeu no dia 02.04.2020, comunicando a EP que o despedimento produziria efeitos a 4.05.2020, após o decurso do prazo previsto na al. b) do nº 3 do art. 371º CT, considerando um prazo adicional destinado a acautelar eventuais recepções não pontuais pelo Trabalhador, que o pagamento da compensação e dos créditos seriam pagas por transferência bancária para a conta habitualmente utilizada para processamento da remuneração até à data da cessação do contrato, convidando ainda o Trabalhador a, no prazo de 5 dias úteis, informar a EP se os montantes indicados se encontravam devidamente computados;
56. Na mesma data (01.04.2020), a EP comunicou à ACT a decisão de despedimento do Trabalhador por extinção do posto de trabalho (doc. fls. 53);
57. No dia 03.04.2020, a EP transferiu para conta do Trabalhador o montante de 13.073,19€ (fls. 30), sendo 3218,07 € de compensação, 1.200,00 € de proporcionais de retribuição de férias (6 dias) – sendo este valor resultante da diferença entre o nº de férias a vencer em Janeiro de 2021 (8 dias) e os 2 dias utilizados por conta do ano de 2020 (o Trabalhador, durante o aviso prévio, gozou as férias vencidas e não gozadas e 2 dias úteis que se venceriam em 2021), 1600,00 € de proporcionais de subsídio de férias, 2466,67 € de proporcionais de subsídio de Natal, 4.400,00 € de subsídio de férias e 1865,43 € de retribuição equivalente ao número mínimo de horas de formação profissional;
58. A EP não informou o Trabalhador da concretização da transferência bancária no dia 03.04.2020;
59. A ACT, notificada da decisão pela EP, não suspendeu o despedimento ao abrigo do disposto no art. 24º do DL nº 2-B/2020, de 02/04;
60. A quantia referida em 57 foi creditada na conta bancária do trabalhador antes de decorrido o prazo que lhe havia sido concedido pela EP para confirmar a correcção dos valores; (redacção dada pelo Tribunal da Relação)
61. A quantia referida em 57 foi creditada na sua conta (do trabalhador) no dia 06.04.2020; (redacção dada pelo Tribunal da Relação)
62. Entre o dia 06.04.2020 e 22.04.2020, o Trabalhador não reclamou perante a EP do montante recebido;
63. O Trabalhador devolveu tal quantia à EP no dia 23.04.2020, data em que apresentou o formulário de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento;
64. O Trabalhador tinha conhecimento do IBAN da conta bancária da EP;
65. Quando foi convidado para integrar a estrutura societária da EP (em 20.05.1999), o Trabalhador detinha experiência profissional na área de moldes;
66. Enquanto sócio-gerente (e accionista), o Trabalhador tinha a seu cargo a direcção do departamento de rectificação no processo produtivo da EP, auferindo uma remuneração mensal;
67. A rectificação é o departamento que tem mais trabalhadores no processo produtivo (no total de 8);
68. No decurso do ano de 2018, surgiu a possibilidade de alienação do capital social da EP à entidade gestora de capital de risco “A..., SA”;
69. Foram encetadas negociações, lideradas, do lado da gerência da EP, pelos sócios maioritários CC e BB;
70. Das negociações ocorridas, entenderam os sócios-gerentes da EP proceder à venda da maioria o capital social desta à sociedade “...”, que posteriormente cedeu a sua posição à empresa por si participada “T..., SA”;
71. Aquando da formalização da venda nas participações sociais, foi condição imposta pelos compradores a renúncia destes aos cargos de administração;
72. Na mesma ocasião, os compradores, com o acordo e interesse dos ex accionistas, acordaram na celebração do contrato de trabalho mencionado em 17;
73. Enquanto sócio-gerente/acionista, AA exercia a actividade de direção do departamento de rectificação da EP sem sujeição a quaisquer ordens, direcção e fiscalização de qualquer dos seus gerentes.
74. AA participou nas negociações para aquisição da Planitec, SA pela T..., SA e nunca manifestou qualquer oposição ao respectivo negócio.
75. O Trabalhador sente-se actualmente desmotivado para continuar a trabalhar na área dos moldes.
76. A EP sabia que o Trabalhador não se conformava com o despedimento. (facto julgado provado pelo Tribunal da Relação);
2. - Factos não provados:
Não se provaram quaisquer outros factos com interesse para a decisão, para além ou em contradição com o supra referido, designadamente que:
1) O Trabalhador, desde a cessação do contrato de trabalho com a PLANITEC, auferiu rendimentos provenientes de trabalho ou a título de subsídio de desemprego;
2) O Trabalhador, por força das limitações próprias do estado de emergência, em vigor na altura, só logrou concretizar a transferência da devolução do dinheiro que lhe havia sido transferido no dia 23.04.2020;
3) facto julgado provado pelo Tribunal da Relação;
4) O Trabalhador procedeu à devolução do montante que lhe foi transferido no dia seguinte ao dia em que tomou conhecimento por consulta do seu extracto de conta;
5) O Trabalhador foi admitido ao serviço da EP no dia .../.../1995, como chefe/director de rectificação, tendo desenvolvido a sua actividade, sob as ordens, direcção e fiscalização da EP até ao dia 04.05.2020;
6) Quando foi convidado pelos sócios fundadores da empresa para integrar a sua estrutura societária e a gerência, era trabalhador da primeira desde 02.11.1995;
7) Quando adquiriu a quota da EP, no valor de 960.000$00 e passou a integrar a gerência, AA exercia a actividade de direcção do departamento de rectificação da EP sob as ordens, direcção e fiscalização da EP, exercida por intermédio dos restantes sócios gerentes;
8) Aquando da formalização da venda nas participações sociais, os compradores impuseram aos ex accionistas a celebração formal de um contrato de trabalho;
9) O contrato de trabalho, referido em 72, destinava-se a formalizar a relação laboral que já vinha sendo exercida pelos ex-sócios gerentes;
10) O contrato de trabalho mencionado em 17 destinou-se a formalizar a relação laboral que se mantinha desde 1995;
11) A extinção do posto de trabalho do Trabalhador pela Administração da Planitec foi uma forma de sancionar o Trabalhador pela sua responsabilidade na perda de alguns clientes (como a ..., ..., ... e ... – clientes que o tinham como pessoa de referência ou contacto na empresa) e pela falta de empenhamento;
12) A atribuição, ao longo dos anos, pelo Trabalhador, de maiores responsabilidades aos trabalhadores mais jovens da equipa que liderava no departamento de rectificação, tornaram as tarefas do primeiro menos visíveis, por virtude da maior qualificação dessa equipa;
13) O DD, que irá assumir as funções do Trabalhador, não tem qualquer experiência nem competência na área da rectificação de moldes;
14) Com a extinção do posto de trabalho do Trabalhador, este poderia assumir outras funções directivas, com categoria semelhante à que detinha e para as quais tem aptidão, tal como director de produção, director de controlo de produção, director de compras, director de orçamentação, director comercial, entre outros; - A EP não pagou ao Trabalhador as férias vencidas em 01.01.2020;
15) Pelo facto de não ter vida activa, viu a sua relação matrimonial (de 35 anos) entrar em ruptura;
16) Sente-se inútil e perdeu alegria de viver.
III. - Fundamentação de direito
1. - Do objeto do recurso de revista.
- Da nulidade do Acórdão recorrido por omissão de pronúncia.
- Da inadmissibilidade da junção de Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.
2. - Do objeto do recurso de revista excepcional.
- Da (não) ilisão da presunção de aceitação do despedimento previsto no artigo 366.º, n.º 4 e 5 do Código do Trabalho.
- Da inconstitucionalidade material na interpretação e aplicação do artigo 366.º, n.º 4 e n.º 5 do CT pelo acórdão sob recurso, por violação dos artigos 20.º, n.º 1 e 53.º da CRP.
3. - Da nulidade do Acórdão recorrido por omissão de pronúncia.
3.1. – Na parte final das conclusões do recurso de apelação, o Autor consignou:
II) na hipótese de V. Exas. considerarem a falta elemento objetivos para decidir a causa atendendo à contradição de meios de prova sobre o ponto 6 da matéria da facto dada como não provada (sublinhado nosso por falta de enumeração na sentença recorrida), determine este Venerando Tribunal o reenvio do processo para renovação e reprodução de novos nos termos do art. 662.º, n.º 2, als. a) e b) do CPC ex vi art. 2.º, n.º 1 al. a) do CPT, em que ordene:
i. a renovação dos depoimentos das testemunhas CC, LL, BB e MM, sobre a entrada do Recorrente como trabalhador na Planitec, através de nova notificação para o domicílio constante nos autos;
ii. Renovação da tomada de declarações do Recorrente (AA) sobre a sua entrada na Planitec como trabalhador, através de nova notificação para o seu domicílio constante nos autos;
iii. Requisição ao Centro Distrital de Leiria do Instituto da Segurança Social, I.P., com pedido de informação sobre qual a entidade patronal que processou e declarou as remunerações do Recorrente (AA) entre 1995 e 1999.”.
No recurso de revista, o Autor alegou:
“Uma das questões decidendas apresentadas pelo recorrente na sua apelação, visava a alteração do ponto 6 da matéria de facto dada como não provada pela sentença da 1.ª instância, tendo sido aí fixado que: «Quando foi convidado pelos sócios fundadores da empresa para integrar a sua estrutura societária e a gerência, era trabalhador da primeira desde 02.11.1995».
Sem embargo, o Tribunal a quo foi confrontado com um requerimento autónomo, inserido após as conclusões da apelação, onde expressamente se pediu o reenvio dos autos para a 1.ª instância, caso considerasse não dispor de todos os elementos necessários para se pronunciar sobre o ponto 6 dos factos dados como não provados da sentença da 1.ª instância.”.
3.2. - Por Acórdão de 08.11.2021, o Tribunal da Relação de Coimbra consignou:
“Para efeitos do disposto no art. 608º nº 2 do CPC, tem-se considerado que “questões” são aquelas que se reportam aos pontos fáctico-jurídicos estruturantes das posições assumidas pelas partes, ou seja, as que se prendem com a causa de pedir, com o pedido e com as excepções porventura aduzidas.
Ora do excerto do acórdão acima referido pela recorrida que, por uma questão de economia, aqui se dá por reproduzido, resulta que esta Relação se pronunciou sobre a matéria do facto 6 cuja redacção, pelas razões que no acórdão ficaram consignadas, foi decidido manter integralmente.
Necessária e implicitamente ficou prejudicada a questão de saber se os autos deviam ser reenviados à 1ª instância para efeitos do disposto no artº 662º nº 2 do CPC, cuja desnecessidade decorre da solução alcançada relativamente à impugnação factual que teve por objecto a matéria do facto 6.
E, como é por demais sabido, “não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário”. A. Varela e outros Manual de Processo Civil, 2ª edição, págªs 686 a 691.
Termos em que se delibera julgar improcedente a requerida nulidade do acórdão.”.
3.3. - O Tribunal da Relação, ao conhecer da impugnação do ponto 6 dos factos dados como não provados, com os elementos de prova produzidos na 1.ª instância, afastou a hipótese suscitada pelo Autor: “na hipótese de V. Exas. considerarem a falta elemento objetivos para decidir a causa atendendo à contradição de meios de prova sobre o ponto 6 da matéria da facto dada como não provada”.
Dito de outra forma: o Autor não requereu “expressamente o reenvio dos autos para a 1.ª instância”, como alegou no recurso de revista, mas apenas hipotisou esse reenvio, “caso considerasse não dispor de todos os elementos necessários para se pronunciar sobre o ponto 6 dos factos dados como não provados na sentença da 1.ª instância”.
Tendo o Tribunal da Relação apreciado - bem ou mal é outra questão - a impugnação do ponto 6 dos factos dados como não provados na 1.ª instância, “Necessária e implicitamente ficou prejudicada a questão de saber se os autos deviam ser reenviados à 1ª instância para efeitos do disposto no artº 662º nº 2 do CPC”, como foi consignado no Acórdão de 08.11.2021 que apreciou e indeferiu a requerida nulidade.
Improcede, nesta parte, a revista.
4. - Da inadmissibilidade da junção de Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.
4.1. – Nas alegações de recurso de apelação, o autor consignou:
O presente recurso de apelação subirá com ACÓRDÃO FUNDAMENTO para resolução de conflito jurisprudencial quanto ao afastamento da presunção de aceitação do despedimento (vide art. 366.º, n.º 4 e 5 do CT), nos termos e para os efeitos do art. 81.º, n.º 3 do CPT”.
Trata-se de certidão emitida pela 4.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) do Acórdão do STJ proferido a 23 de setembro de 2020, no processo n.º 10840/19.1T8LSB.L1.S1.
4.2. - O Acórdão recorrido não admitiu “o documento junto com as alegações” e ordenou o seu desentranhamento, taxando o incidente, por considerar não verificada “nenhuma das situações a que alude o artº 651º nº 1 do CPC”.
4.3. - No recurso de revista, o Autor alegou:
O propósito do recorrente, ao juntar com a apelação o “acórdão fundamento”, foi invocar jurisprudência que melhor explicitasse o “estado da arte” da “presunção de despedimento” ao abrigo do art. 366.º, n.º 4 e n.º 5 do CT.
De resto, foi justamente ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça junto aos autos no recurso de apelação que o acórdão sob recurso recorreu para fundamentar a sua decisão – vd. acórdão 23-09-020, proc.º n.º 10840/19.1T8LSB.L1.S1 - melhor citado infra.”.
4.4. - É consabido que a junção de documentos, em sede de recurso de apelação, é excepcional, só podendo ter lugar quando a sua apresentação não tenha sido possível até então - superveniência -, ou quando a sua “junção apenas se tenha tornado necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instância”. - cf. artigos 651.º, n.º 1 e 425.º, ambos do CPC.
Os documentos são um dos meios de prova contemplados no Código do Processo Civil, a par da prova por confissão das partes, pericial, inspecção judicial e testemunhal – cf. título V, capítulos II, III, IV, V e VI do CPC.
Nos termos do artigo 362.º - Noção -, do Código Civil (CC) “Prova documental é a que resulta de documento; diz-se documento qualquer objecto elaborado pelo homem com o fim de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto.”.
Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Volume I, pág. 319, em anotação ao artigo 362.º do CC, escrevem: 
A noção de documento do artigo 2420.º do Código de 1867 é consi­deravelmente ampliada. Além dos escritos a que esse preceito se refere, são ainda documentos uma fotografia, um disco gramofónico, uma fita cinematográfica, um desenho, uma planta, um simples sinal convencional, um marco divisório, etc. (cfr.  art.  368.º).
Essencial à noção de documento é a função representativa ou reconsti­tutiva do objecto. Uma pedra, um ramo de árvore ou quaisquer outras coisas naturais, não trabalhadas pelo homem, não são documentos na acep­ção legal. Podem ter interesse para a instrução do processo, mas constituirão objecto de um outro tipo de prova (a prova por apresentação de coisas móveis ou imóveis, por inspecção judicial, etc.).”.
Assim, os documentos têm uma função representativa ou reconstitutiva do objecto, destinando-se exclusivamente a servir como meio de prova real de determinados factos.
Atento o disposto no artigo 152.º, n.º 2, do CPC. “Diz-se «sentença» o acto pelo qual o juiz decide a causa principal ou algum incidente que apresente a estrutura de uma causa”.
Com a entrada em vigor do NCPC, o artigo 152.º, n.º 2, deve ser conjugado com o artigo 607.º que materializou alterações respeitantes à “sentença”, como acto que, após a audiência final, congrega tanto a decisão da matéria de facto, como a respectiva integração jurídica, por comparação com o que anteriormente emergia dos artigos 653º (decisão da matéria de facto) e 659º (sentença).
Acórdão é a decisão de um órgão judicial colegial, tomada em sede de recurso de apelação ou de revista, que revela uma posição jurídica, baseada em argumentos sobre a aplicação de determinado direito a uma específica situação de fato – cf. artigos 152.º, n.º 3 e 657.º a 659.º, todos do CPC.
Ora, o recorrente não juntou documento definido nos termos do citado artigo 362.º do CC e artigos 651.º, n.º 1 e 425.º do CPC, mas certidão do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido a 23 de setembro de 2020, no processo n.º 10840/19.1T8LSB.L1.S1, publicado no site da DGSI, como fundamento para a resolução do conflito jurídico quanto ao afastamento da presunção de aceitação do despedimento.
Acórdão esse, diga-se, parcialmente transcrito na fundamentação de direito do Acórdão recorrido e que sustentou a admissão da revista excepcional – cf. Acórdão Formação de 17.03.2022.
Em síntese: a sentença e o acórdão constituem peças jurídicas, judicialmente elaboradas no decurso da resolução de conflitos no sistema judiciário, que uma vez transitadas em julgado podem servir de fundamento de direito em novas decisões judiciais, mas não constituem documentos nos termos definidos no artigo 362.º do CC e nos artigos 651.º, n.º 1 e 425.º, ambos do CPC.
Procede, nesta parte, o recurso de revista.
5. - Da (não) ilisão da presunção de aceitação do despedimento previsto no artigo 366.º, n.º 4 e 5 do Código do Trabalho.
5.1. - No Acórdão recorrido pode ler-se:
No caso em análise, é certo que a empregadora sabia que o recorrente não concordava com o seu despedimento por extinção do posto de trabalho; mas também sabia, por ter sido informado, que a empregadora o pretendia despedir e que iria transferir até à data da cessação do contrato (04.05.2020), a quantia relativa à compensação para a conta habitualmente utilizada para processamento da remuneração do recorrente, sendo perfeitamente expectável que essa transferência fosse efectuada a partir de 09.04.2020, data em que terminou o prazo dos cinco dias úteis facultados pela empregadora ao trabalhador para se pronunciar e informar sobre se os montantes indicados se encontravam devidamente computados.
Entre 09.04.2020 e 23.04.2020 decorreram 13 dias, lapso de tempo mais do que suficiente para operar a devolução, agindo o trabalhador de forma diligente.
É certo que a empregadora não informou o trabalhador da data da transferência e bem assim que se desconhece a data em que o ora recorrente teve conhecimento desta transferência, sendo certo que a devolução só podia ser feita após o conhecimento por parte do trabalhador de que a transferência tinha sido efectuada.
Contudo, era ao recorrente que incumbia provar a data em que ocorreu esse conhecimento para se poder aquilatar sobre a razoabilidade do seu comportamento traduzido em só ter devolvido a compensação passados 17 dias contados da data da disponibilização da compensação ou 13 dias contados da data em que terminou o prazo concedido para se pronunciar sobre o montante da compensação.
Assim, o decurso daqueles dias, considerando a exigência da lei no que toca ao momento da devolução, é demasiadamente extenso para que se possa ainda afirmar que a disponibilização da compensação e sua devolução ocorreram ao mesmo tempo, ou seja, simultaneamente.
Acresce, por outro lado, não terem resultado provados os factos alegados pelo trabalhador como justificativos da devolução tardia (decorrentes das limitações próprias do estado de emergência, em vigor na altura).
Pelo que se entende que o recorrente não logrou ilidir a presunção de aceitação do despedimento que, como decidiu a 1ª instância, constitui uma excepção peremptória que leva à absolvição da empregadora do pedido.”.
5.2. - O artigo 371.º - Decisão de despedimento por extinção de posto de trabalho – n.º 2, do CT, dispõe:
2 - A decisão de despedimento é proferida por escrito, dela constando:
a) Motivo da extinção do posto de trabalho;
b) Confirmação dos requisitos previstos no n.º 1 do artigo 368.º;
c) Prova da aplicação dos critérios de determinação do posto de trabalho a extinguir, caso se tenha verificado oposição a esta;
d) Montante, forma, momento e lugar do pagamento da compensação e dos créditos vencidos e dos exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho;
e) Data da cessação do contrato.
3 - O empregador comunica a decisão, por cópia ou transcrição, ao trabalhador, às entidades referidas no n.º 1 do artigo 369.º e, bem assim, ao serviço com competência inspectiva do ministério responsável pela área laboral, com antecedência mínima, relativamente à data da cessação, de:
a) 15 dias, no caso de trabalhador com antiguidade inferior a um ano;
b) 30 dias, no caso de trabalhador com antiguidade igual ou superior a um ano e inferior a cinco anos;
c) 60 dias, no caso de trabalhador com antiguidade igual ou superior a cinco anos e inferior a 10 anos;
d) 75 dias, no caso de trabalhador com antiguidade igual ou superior a 10 anos.”.
E o artigo 372.º determina que “Ao trabalhador despedido por extinção do posto de trabalho aplica-se o disposto no n.º 4 e na primeira parte do n.º 5 do artigo 363.º e nos artigos 364.º a 366.º”.
O artigo 366.º estipula:
1 - Em caso de despedimento coletivo, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a 12 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.
2. - (…).
3 - O empregador é responsável pelo pagamento da totalidade da compensação, sem prejuízo do direito ao reembolso, por aquele, junto do fundo de compensação do trabalho ou de mecanismo equivalente e do direito do trabalhador a acionar o fundo de garantia de compensação do trabalho, nos termos previstos em legislação específica.
4 - Presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe do empregador a totalidade da compensação prevista neste artigo.
5 - A presunção referida no número anterior pode ser ilidida desde que, em simultâneo, o trabalhador entregue ou ponha, por qualquer forma, a totalidade da compensação paga pelo empregador à disposição deste último.”. (negrito nosso)
Por sua vez, o artigo 387.º -
Apreciação judicial do despedimento
- do mesmo diploma estatui:
1 - A regularidade e licitude do despedimento só pode ser apreciada por tribunal judicial.
2 - O trabalhador pode opor-se ao despedimento, mediante apresentação de requerimento em formulário próprio, junto do tribunal competente, no prazo de 60 dias, contados a partir da recepção da comunicação de despedimento ou da data de cessação do contrato, se posterior, (…).”.  (negritos e sublinhado nossos)
O artigo 98.º-C - Início do processo - estabelece:
1 - Nos termos do artigo 387.º do Código do Trabalho, no caso em que seja comunicada por escrito ao trabalhador a decisão de despedimento individual, seja por facto imputável ao trabalhador, seja por extinção do posto de trabalho, seja por inadaptação, a ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento inicia-se com a entrega, pelo trabalhador ou por mandatário judicial por este constituído, junto do juízo do trabalho competente, de requerimento em formulário eletrónico ou em suporte de papel, do qual consta declaração do trabalhador de oposição ao despedimento, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
2 - Caso tenha sido apresentada providência cautelar de suspensão preventiva do despedimento, nos termos previstos nos artigos 34.º e seguintes, o requerimento inicial do procedimento cautelar do qual conste que o trabalhador requer a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento dispensa a apresentação do formulário referido no número anterior.”. (negrito nosso)

 5.3. - Dos factos dados como provados consta:
55. Por carta de 1 de Abril 2020, a EP comunicou ao Trabalhador a decisão final de despedimento por extinção do posto de trabalho (doc. fls. 3 a 7), que este recebeu no dia 02.04.2020, comunicando a EP que o despedimento produziria efeitos a 4.05.2020, após o decurso do prazo previsto na al. b) do nº 3 do art. 371º CT, considerando um prazo adicional destinado a acautelar eventuais recepções não pontuais pelo Trabalhador, que o pagamento da compensação e dos créditos seriam pagas por transferência bancária para a conta habitualmente utilizada para processamento da remuneração até à data da cessação do contrato, convidando ainda o Trabalhador a, no prazo de 5 dias úteis, informar a EP se os montantes indicados se encontravam devidamente computados;
57. No dia 03.04.2020, a EP transferiu para conta do Trabalhador o montante de 13.073,19€ (fls. 30), (…).
61. A quantia referida em 57 foi creditada na sua conta (do trabalhador) no dia 06.04.2020; (redacção dada pelo Tribunal da Relação)
63. O Trabalhador devolveu tal quantia à EP no dia 23.04.2020, data em que apresentou o formulário de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento;”. (negritos nossos)
Decorre da transcrita factualidade que o autor impugnou judicialmente o despedimento em 23 de abril de 2020 e, em simultâneo, devolveu à ré quantia por ela depositada no dia 06 do mesmo mês e ano, ou seja, o autor impugnou o despedimento comunicado pela ré em 01 de abril de 2020 e devolveu a quantia depositada no prazo dos 60 dias previsto no n.º 2 do citado artigo 387.º do CT.
Neste caso, estão preenchidos os requisitos da ilisão da presunção prevista no artigo 366.º, n.º 5, do CT?
Desde já adiantamos que a resposta é positiva.
5.4. - A doutrina e a jurisprudência vêm debatendo a questão de saber qual é o outro acto - além da devolução total da compensação ao empregador - a praticar, “em simultâneo”, pelo trabalhador para efeitos do disposto no artigo 366.º, n.º 5, do CT.
Bernardo da Gama Lobo Xavier, in Compensação por despedimento, Revista de Direito e de Estudos Sociais, Ano LIII - XXVI da 2.ª série - n.º 1-2, pág. 91 e 92, entende que “Em juízo, o trabalhador poderá devolver a compensação conjuntamente com o procedimento de suspensão, com a ação de impugnação de despedimento coletivo, ou com a contestação ao articulado do empregador, no primeiro destes momentos que ocorrer. Não parece indispensável que o trabalhador devolva em simultâneo com a entrega do requerimento/formulário de impugnação, pois a iniciativa da ação será do empregador (art.º 98.º-J do CPT) e as coisas podem ficar por aí (art.º 98.º-J, 3, do CPT). E não podemos excluir que o trabalhador apenas faça a devolução no articulado a que responda à invocação pelo empregador por ação ou exceção da presunção da aceitação. De qualquer modo, a elisão da presunção é fundamentalmente judicial e a posse do quantitativo da compensação é apenas algo que obsta que o trabalhador ponha em marcha - através de articulado – os meios que permitem roubar significado à presunção de aceitação». (negritos nossos)
António Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 19.ª edição, pág. 513 e 514), escreve “Assim, a nosso ver, o alcance da exigência legal da devolução da compensação localiza-se na admissibilidade da impugnação judicial do despedimento: a iniciativa do trabalhador tem de ser liminarmente rejeitada se não demonstrar ter devolvido a compensação”. (negrito nosso)
Diogo Vaz Marecos, in Código do Trabalho, anotado, pág. 906, salienta que “A expressão “em simultâneo” referida no n.º 5 é suscetível de levantar dúvidas interpretativas. Para ilidir a presunção de aceitação o trabalhador terá de entregar ou pôr à disposição do empregador a totalidade da compensação recebida do empregador por efeito do despedimento coletivo, e ainda declarar expressamente que não aceita o despedimento. Só assim se poderá retirar qualquer efeito útil à expressão “em simultâneo”. Tendo o trabalhador o prazo de seis meses, contados da data da cessação do contrato de trabalho, para impugnar o despedimento coletivo, cfr. n.º 2 do art.º 388.º, nada obsta a que o trabalhador só coloque à disposição do empregador ou lhe entregue a totalidade da compensação no momento em que apresente, em tribunal, a petição inicial”. (sublinhado nosso).
Pedro Furtado Martins, in Cessação do Contrato de Trabalho, 3.ª edição, págs. 362 e segs., considera que “Não obstante a relevância do esclarecimento efetuado em 2009, a redação do preceito não é inteiramente conseguida. Desde logo, porque fica por saber qual o ato que deve ser praticado “em simultâneo” com a devolução da compensação. Julga-se que só poderá ser a comunicação do trabalhador ao empregador da não aceitação do despedimento que terá de ser feita “em simultâneo” com a devolução da compensação”.  
Mais adiante, o mesmo Autor acrescenta: “Mais problemático é não se ter esclarecido quando (ou até quando) pode o trabalhador afastar a presunção, devolvendo a compensação”, e conclui: “Não há, portanto, um prazo para o trabalhador expressar a não-aceitação do despedimento e devolver a compensação, de modo a evitar a atuação da presunção legal. O simples recebimento da compensação tem associada a presunção que, uma vez constituída, não será fácil de ilidir”.
Pedro Romano Martinez, in Código do Trabalho anotado, 2020, 13.ª edição, pág. 862, no comentário ao n.º 5 do art.º 366.º do CT da nota: “Na revisão de 2009, como referido, foi acrescentado o n.º 5, permitindo que a presunção de aceitação do despedimento seja ilidida desde que o trabalhador devolva a compensação recebida. Esta regra suscita duas dúvidas.
Atendendo ao disposto no n.º 5, parece que a presunção do n.º 4 não pode ser ilidida por outra forma que não mediante a devolução da compensação percebida.
Por outro lado, a expressão “em simultâneo” pode ser entendida como devolução imediata, no próprio momento em que é recebida, afastando a hipótese de uma devolução posterior”.
O Supremo Tribunal de Justiça já se pronunciou sobre esta temática, entre outros, nos acórdãos: de 03.04.2013, proc. n.º 1777/08.0TTPRT.P1.S1; de 27.03.2014, proc. n.º 940/09.1TTLSB.L1.S1; de 16.06.2015, proc. n.º 962/05.1TTLSB.L1.S1; de 13.10.2016, proc. nº 2567/07.3TTLSB.L1.S1; de 17.03.2016, proc. n.º 1274/12.0TTPRT.P1.S1 e de 16.11.2017, proc. n.º 9224/13.0T2SNT.L1.S1, sendo o acórdão de 17.03.2016, proferido no proc. n.º 1274/12.0TTPRT.P1.S1, no sentido de “Não aceitando o despedimento e querendo impugná-lo, o trabalhador deverá recusar o recebimento da compensação ou proceder à devolução da compensação imediatamente após o seu recebimento, ou no mais curto prazo, sob pena de, assim não procedendo, cair sob a alçada da presunção legal a que se reporta o n.º 4 do art.º 366.º, traduzida na aceitação do despedimento.
Não lhe bastará, assim, que se limite a declarar perante a entidade patronal que não aceita o despedimento nem a compensação, sendo necessário que assuma um comportamento consentâneo com aquele propósito, nomeadamente diligenciando pela devolução da compensação paga pela entidade empregadora, logo que a receba, caso o pagamento lhe seja oferecido diretamente em numerário ou cheque ou, pelo menos, logo que tome conhecimento de que o valor da compensação lhe foi creditado na respetiva conta bancária, caso o pagamento se realize mediante transferência bancária”.  
5.5. - Ao intérprete cabe, na medida do possível, esclarecer as “dúvidas” sobre qual o acto a praticar pelo trabalhador, “em simultâneo”, com a entrega da totalidade da compensação pecuniária recebida do empregador.
A expressão em simultâneo significa coincidente com, ao mesmo tempo, diz-se de duas ou mais acções que se realizam ao mesmo tempo, mas não “de imediato, directo, sem intervalo de tempo, urgente, que actua instantaneamente.
[cf. Dicionário Enciclopédico de Língua Portuguesa].
A interpretação dos n.ºs 4 e 5 do citado artigo 366.º, no que respeita à presunção aí estabelecida e à sua ilisão, deve respeitar as regras consagradas no artigo 9.º do C. Civil, com relevo para a letra da lei, a sua razão de ser e a unidade do sistema jurídico, tendo sempre como escopo fulcral o “evitar arbitrariedade das decisões em concreto com vista a uma maior segurança jurídica e confiança no sistema judiciário”, dado que “a questão da presunção do despedimento do trabalhador ou, afastamento dessa presunção, insere-se na temática da segurança do emprego e proibição dos despedimentos sem justa causa
[cf. Acórdão Formação do STJ de 17.03.2022].
Desígnios estes, diga-se, de relevância constitucional.
Assim, importa convocar as normas do Código do Trabalho que dispõem sobre os meios processuais de reação em juízo pelo trabalhador e os respetivos prazos - o procedimento cautelar de suspensão preventiva do despedimento e a impugnação do despedimento -, meios processuais e prazos esses que o legislador considerou razoáveis numa ponderação dos interesses do trabalhador e do empregador com vista à pacificação social - cf. artigos 386.º e 387.º, ambos do CT e artigo 98.º-C do CPT.
Dos citados normativos do Código do Trabalho e do Código de Processo do Trabalho, decorre que a declaração expressa de não aceitação do despedimento, por parte do trabalhador, se consubstancia com a apresentação em juízo do (i)procedimento cautelar de suspensão preventiva do despedimento e (ii)da declaração de oposição ao despedimento: a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento. 
E fixando a lei laboral apenas dois procedimentos de reacção em juízo do trabalhador à comunicada decisão de despedimento por parte do empregador, incluindo o despedimento por extinção do posto de trabalho, não pode o intérprete considerar qualquer outro, não só porque os elementos gramatical e racional da lei não o permitem, mas ainda para garantir as necessárias certeza e segurança jurídicas e a confiança no sistema judiciário, e, assim, evitando arbitrariedade das decisões no concreto, que a “tese do conhecimento pelo trabalhador” poderá causar, a avaliar pelas dúvidas doutrinais e jurisprudenciais supra exemplificadas.
Além disso, a expressão “em simultâneo” significa que o fim prosseguido pelo legislador ao elaborar a norma - a “ratio legis” -, se concretiza na prática simultânea de dois actos: a devolução da totalidade da compensação e outro acto associado, e não no imediatismo dessa devolução, como alguma doutrina defende. 
5.6. - No caso em apreço, o Autor optou pela impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento por extinção do posto de trabalho, apresentando o respectivo formulário - a declaração de oposição ao despedimento -, no dia 23.04.2020 e, em simultâneo, devolveu à Ré a quantia que lhe creditara na sua conta, em 06.04.2020.
Dito de outro modo: o Autor opôs-se ao despedimento por extinção do posto de trabalho, mediante a apresentação do formulário próprio, junto do tribunal competente, no prazo de 21 dias, contados a partir da recepção da comunicação do despedimento, em 02.02.2020, ou seja, dentro do prazo de 60 dias estabelecido no citado artigo 387.º, n.º 2, do CT. Mas o autor ainda podia opor-se ao mesmo despedimento nos 60 dias após a cessação do contrato, fixada pela ré em 04 de maio de 2020 (cf. ponto 55.º dos factos provados), como decorre, expressamente, do segundo segmento do n.º 2 do citado artigo 387.º do CT.
Caso o Autor tivesse optado pela suspensão preventiva do despedimento e, em simultâneo, pela devolução da compensação, o prazo seria reduzido a cinco dias úteis a contar da data da recepção da comunicação de despedimento, como determina o artigo 386.º do CT.
5.7. - Em conclusão: atentos os elementos (i)textual da lei - “a letra da lei” -; (ii)teleológico – “a ratio legis” - e (iii)sistemático - “a unidade do sistema jurídico” -, a devolução da totalidade da compensação conjuntamente com o procedimento de suspensão de despedimento ou a declaração de oposição ao despedimento por extinção do posto de trabalho, respeitando os respectivos prazos processuais, consubstancia a ilisão da presunção, nos termos previstos no artigo 366.º, n.º 5 do CT.
Procede, assim, o recurso excepcional do Autor.
6. - Da inconstitucionalidade material na interpretação e aplicação do artigo 366.º, n.º 4 e n.º 5 do CT pelo acórdão sob recurso, por violação dos artigos 20.º, n.º 1 e 53.º da CRP.
Procedendo o recurso de revista excepcional, nos termos supra expostos, fica prejudicado o conhecimento da questão da inconstitucionalidade material na interpretação e aplicação do artigo 366.º, n.º 4 e n.º 5 do CT dada pelo Acórdão recorrido.
III. - Decisão
Atento o exposto, acórdão os Juízes que compõem a Secção Social:
1. - Julgar a revista geral parcialmente procedente e revogar o Acórdão recorrido na parte em que ordenou o desentranhamento do Acórdão do STJ de 29.03.2022 e condenou o Autor nas custas do incidente, sendo substituído pelo presente acórdão que o absolve do pagamento de tais custas.
2. – Julgar a revista excepcional procedente e revogar o Acórdão recorrido, devendo os autos baixar ao Tribunal da 1.ª instância para a apreciação do mérito da causa, caso a tal nada obste.   
Custas a cargo da Ré.  

Lisboa 2022.10.12.       

Domingos José de Morais (Relator)
Mário Belo Morgado
Júlio Gomes