Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
05B2188
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: LUCAS COELHO
Descritores: RECURSO PARA O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ALEGAÇÕES
ACÓRDÃO POR REMISSÃO
Nº do Documento: SJ200512210021882
Data do Acordão: 12/21/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL LISBOA
Processo no Tribunal Recurso: 8767/04
Data: 01/13/2005
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Sumário : I - A alegação de qualquer recurso deve fazer incidir a sua argumentação sobre os pontos concretos da decisão recorrida que no entender do recorrente sejam criticáveis;
II - Não é este o caso quando a alegação da revista para o Supremo se limita praticamente à mera reprodução literal das conclusões, bem como do próprio texto da alegação apresentada à Relação, reeditando sem especificidades a argumentação da apelação;
III - Nesta hipótese, então o recorrente não atendeu verdadeiramente ao conteúdo do acórdão recorrido, antes na realidade reiterou a sua discordância relativamente à decisão apelada, sem verdadeira originalidade ou aditamento que tivesse em conta a fundamentação do acórdão sob recurso, o que nesse conspecto justifica plenamente o uso da faculdade remissiva prevista no n.º 5 do artigo 713.º do Código de Processo Civil.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
I
1. Empresa-A, com sede em Lisboa, instaurou na 2.ª Vara Cível desta comarca, em 9 Julho de 2001, contra Empresa-B, também sediada na cidade, acção ordinária tendente a obter o pagamento de serviços telefónicos entre ambas contratados e não solvidos, atingindo o quantitativo de 21.384.871$00, acrescido de juros moratórios legais, vencidos, no valor líquido de 2.591.248$00 em 6 de Junho de 2001, e vincendos até integral pagamento.

Contestou a ré, aceitando aqueles factos, mas deduziu por via reconvencional a compensação de um crédito sobre a autora no montante de 55.500.000$00, até ao montante da dívida da ré, com a condenação daquela no remanescente.

Alegou em síntese que a pedido da demandante entabularam negociações prolongadas visando o fornecimento pela ré de cartões pré-pagos, tratos que a autora contra todas as expectativas rompeu sem justificação, incorrendo em responsabilidade pré-contratual e causando-lhe danos a indemnizar pelo valor aludido.

Prosseguindo o processo os trâmites legais, veio a ser proferida sentença final, em 26 de Abril de 2004, que julgou procedente a acção, condenando a ré a solver à autora a quantia de 106.667,28 € (21.384.869$60), acrescida de juros moratórios legais, vencidos em 6 de Junho de 2001, no montante de 12.925,09 € (2.591.247$90), e vincendos até pagamento integral.

Apelou a ré, sem sucesso, tendo a Relação de Lisboa negado provimento ao recurso, confirmando integralmente o julgado da 2.ª Vara Cível da comarca.

2. Do acórdão neste sentido proferido, a 13 de Janeiro de 2005, traz a ré inconformada a presente revista, formulando na alegação respectiva 27 conclusões que, reproduzindo à letra, com ligeiríssimas diferenças (1) ., as 28 conclusões da alegação apresentada ao tribunal de apelação - do mesmo passo que os próprios textos das duas alegações se repetem substancialmente -, nos dispensamos de transcrever.

3. Não houve contra-alegação.

E o objecto da revista, considerando a repetição de conclusões, à luz da fundamentação da decisão em recurso, coincide, por conseguinte, com o objecto da apelação, que o acórdão recorrido assim definiu: caracterização do instituto da responsabilidade pré--contratual; alegada violação pela autora do artigo 227.º, n.º 1, do Código Civil; montante dos danos e forma de os apurar.
II
1. A Relação considerou assente a matéria de facto dada como provada na 1.ª instância, para a qual, devendo aqui manter-se inalterada, desde já se remete nos termos do n.º 6 do artigo 713.º do Código de Processo Civil.

A partir dessa factualidade, considerando o direito aplicável, o acórdão em revista resolveu todas as questões de direito colocadas pela apelante, há instantes referidas.

A recorrente limita-se, porém, como se disse, a reproduzir praticamente à letra as conclusões da alegação da apelação. Verificando-se, aliás, que o próprio corpo alegatório da revista repete com exactidão parágrafos e parágrafos da mesma alegação.
2. Ora, tem o Supremo em tais situações vindo a entender «que a alegação de qualquer recurso deverá incidir o seu ataque argumentativo sobre pontos concretos da fundamentação da decisão recorrida que, no entender do recorrente, sejam criticáveis», sendo certo que «a decisão recorrida é o acórdão da Relação e não a sentença da 1.ª instância» (2) ..
Já se decidiu inclusivamente - recorda o aresto acabado de citar - «que esta prática de reprodução alegatória equivale à deserção do recurso, por falta de alegações, pois que, embora se possa dizer que, formalmente, foi cumprido o ónus de formular conclusões, já em termos substanciais é legítimo inferir que terá faltado uma verdadeira e própria oposição conclusiva à decisão recorrida, nomeadamente porque a repetição não atingiu apenas as conclusões, afectando também o corpo das alegações.» (3) ..

A jurisprudência desta Secção não vai, porém, tão longe, continuando a prevalecer o entendimento, que na espécie sub iudicio igualmente se perfilha, segundo o qual, no caso de «uma alegação de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça que não passe de uma mera reprodução da que foi apresentada perante a Relação», justifica plenamente o uso da faculdade de «remissão para os fundamentos do acórdão recorrido, ao abrigo do n.º 5 do artigo 713, ex vi artigo 726, ambos do Código de Processo Civil», posto que - «parafraseando o citado acórdão de 11 de Maio de 1999» - o recorrente «não atendeu ao conteúdo do acórdão recorrido, antes reiterou a sua discordância relativamente à primeira decisão, sem originalidade ou aditamento que tivesse em conta a fundamentação do acórdão sob recurso.»
III
Nos termos expostos, acordam no Supremo Tribunal de Justiça em negar a revista, confirmando o acórdão da Relação de Lisboa recorrido.

Custas pela ré recorrente (artigo 446.º do Código de Processo Civil).

Lisboa, 21 de Dezembro de 2005
Lucas Coelho, (Relator)
Bettencourt de Faria,
Moitinho de Almeida.
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(1) Que não custa enunciar: omitiram-se, sem qualquer significado específico, as conclusões IV e XXVI da apelação; denota-se a despicienda alteração de redacção das conclusões IV e VI da revista; sem esquecer a formulação da nova, repetitiva conclusão XXIV também do presente recurso.
(2) Assim flui com actualidade do acórdão, de 12 de Julho de 2005, revista n.º 1860/05, 2.ª Secção. Cfr. também os arestos da mesma Secção, de 17 de Março de 2005, revista n.º 1304/04, e de 2 de Dezembro de 2004, revista n.º 3463/04, entre outros nestes referenciados. E, mais recentemente ainda, os tirados em 22 de Setembro de 2005, nas revistas n.º 3727/03 e n.º 2088/05, sendo este último que ora seguimos muito de perto.
(3) Cita-se nesta linha o acórdão, de 11 de Maio de 1999, na revista n.º 257/99, 1.ª Secção, um dos representantes, entre vários, da tese aludida.