Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
33943/06.8YYLSB-H.L1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: PEDRO DE LIMA GONÇALVES
Descritores: BAIXA DO PROCESSO AO TRIBUNAL RECORRIDO
MATÉRIA DE FACTO
PODERES DA RELAÇÃO
SUBSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL RECORRIDO
REAPRECIAÇÃO DA PROVA
NULIDADE DE ACÓRDÃO
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Data do Acordão: 02/27/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: ANULAR O ACÓRDÃO RECORRIDO, ORDENANDO-SE A BAIXA DOS AUTOS AO TRIBUNAL DA RELAÇÃO
Sumário :
I - Lido e interpretado o acórdão recorrido, resulta manifesto que, muito embora tenha sido determinada a devolução dos autos ao juiz da 1.ª instância, o que se retira da decisão, por via da sua interpretação, é que o tribunal da Relação utilizou o seu poder de substituição. Fê-lo para afirmar que o facto em crise se deveria considerar assente em face dos elementos dos autos, o que, indiscutivelmente, podia fazer, por força do disposto no artigo 662.º, n.º 2, al. c), do CPC.

II - O STJ tem-se pronunciado, de forma unânime, no sentido de que apenas a total ausência de fundamentação gera o vício de nulidade por omissão de pronúncia.

III - O tribunal da Relação podia suprir a nulidade da decisão da l.ª instância, o que é facto é que o deveria ter feito apelando a elementos probatórios constantes nos autos, o que, tudo visto, não sucedeu.

Decisão Texto Integral:

Acórdão


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I - Relatório

1. No âmbito de um processo executivo movido por Banco Espírito Santo contra Vilanorte, Construções, Lda., AA e BB, foi, em 13/04/2015, requerida a substituição processual do exequente pelo Novo Banco, com fundamento na Medida de Resolução do Banco de Portugal, que determinou a transferência da generalidade do ativo do BES para o Novo Banco, enquanto banco de transição.

2. Por despacho de 8/07/2020, foi a referida substituição processual admitida.

3. Interposto recurso de apelação pelos executados, no Tribunal da Relação de Lisboa, foi proferida decisão singular que decidiu nos seguintes termos: “decide-se: anular o douto, de 8 de julho de 2020, e determinar que o Exmo. Senhor Juiz a quo insira na decisão impugnada, como assente, de crédito noticiado nos autos, registado no activo do BES, S.A., em 2 de março de 2014, originário do BIC, vencido em 2006, que foi transferido para o Novo Banco, decorrente duma decisão administrativa do Banco de Portugal, e que sujeitou a transferência de créditos á avaliação independente.”.

4. A referida decisão singular foi confirmada por acórdão da Conferência.

5. Inconformados, vieram os Executados recorrer de revista para o STJ, nos termos do disposto no artigo 629.º, n.º 2, als. a) e d), do Código de Processo Civil, formulando as seguintes (transcritas) conclusões:

Nulidades da Decisão

I - Nulidades por Questões Suscitadas no recurso de Apelação e na Reclamação da Decisão Singular, Não Conhecidas

1.ª Na reclamação da decisão singular, invocou-se a respectiva nulidade, nos termos do art.º 615º, 1, al. a), do CPC., por não ter sido nela aposta assinatura electrónica, nos termos do artigo 19.º,1, da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto.

2.ª Esta matéria deveria ter sido conhecida no Acórdão em Conferência, pelo que não o fazendo, incorre o mesmo em nulidade, nos termos do art.º 615º, 1, al. d), do CPC.

3.ª Nas conclusões e) a g), do ponto II da Apelação (aleg. 8 a 10), foi invocada a nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto e de Direito.

4.ª A nulidade da sentença tem lugar, nos termos do art.º 615º, 1, al. d), do CPC. por só existir transcrição de disposições legais e decisões administrativas, não existindo a enunciação de factos assentes, nem do raciocínio lógico que conduziu à conclusão de transmissão do crédito cartular em que o tomador era o BIC, S.A., porque BES, S.A. e Novo Banco, S.A. se fundiram numa pessoa jurídica.

5.ª Nem a decisão singular, nem o Acórdão em conferência, conheceram dessa nulidade, pelo que o acórdão recorrido está também ferido dessa nulidade.

6.ª Com efeito, o Acórdão recorrido, ou a decisão singular, não indicam os factos essenciais e as provas do processo em que se funda a decisão de admitir a sucessão processual do Novo Banco, ocorrendo, também ausência de um raciocínio, quer de facto, quer de Direito, que conduzisse ao segmento que resolveu alterar.

“o crédito noticiado nos autos, registado no ativo do BES S.A., em 2 de março de 2014, originário do BIC, vencido em 2006, que foi transferido para o Novo Banco, decorrente duma decisão administrativa do Banco de Portugal, e que sujeitou a transferência de créditos á avaliação independente.”.

7.ª A decisão singular limita-se a conhecer de coisa diversa, referindo que a factualidade referente à fusão de BES, S.A. e Novo Banco, S.A. ficou prejudicada com a nova decisão. (art.º 615º, 1, al. d), do CPC).

8.ª Porém como é constatável, não foram fixados quaisquer factos relativamente ao título executivo (facto que era do conhecimento do tribunal), matéria necessária à decisão de transmissão do crédito incorporado no título. (art.º 5º, 2, do CPC).

9.ª O art.º 656º do CPC, não permite que o Relator profira decisão sem fundamentar de facto e de Direito, porquanto à Relação se aplicam as mesmas exigências na elaboração das sentenças (art.º 666,1, do CPC e art.º 663º, 2, do CPC).

10.ª No caso presente a sucessão processual, é questão fulcral a decidir, determinando se o Novo Banco, S.A. pode suceder na posição de credor no indicado título executivo (art.º 53º, 1 e 54º, 1, do CPC).

11.ª São os seguintes, os factos essenciais (art.º 5º,1 e 2, do CPC), que resultam do requerimento executivo e do indicado título executivo,

a) Em 2/6/2006, o Banco Espírito Santo, S.A., intentou execução contra os executados,

b) Indicou como título executivo, uma livrança,

c) Juntou um impresso de livrança em que era tomador o Banco Internacional de Crédito, S.A., emitida em 23/1/2001, data de vencimento em 31/5/2006, onde no campo “Valor” encontra a menção “caução”,

d) O impresso de livrança tem um campo para preenchimento em escudos e o valor preenchido é em Euros,

e) O impresso de livrança encontra-se assinado pela executada Vilanorte, Lda. e no verso, tem assinatura dos executados pessoas singulares, que foram indicados como avalistas no requerimento executivo;

f) BES, S.A. alegou que tinha tomado o lugar do Banco Internacional, S.A., inscrito como credor na livrança, por fusão por incorporação e juntou certidão onde constava registada a fusão pela Ap. 9 de 4/1/2006, com efeitos 30/12/2005;

12.ª No requerimento executivo, não foi invocada, ou provada qualquer outra causa de pedir, para além da livrança, nem junto nenhum outro título executivo.

13.ª O Novo Banco, S.A., por requerimento de 13/4/2015, defendeu ser o novo titular do crédito dos autos, por força da medida de resolução aplicada ao BES, S.A., pelo Banco de Portugal em 3/8/2014 – não juntou documentos.

14.ª Ficou também por conhecer a questão da ilegitimidade, quer do BES, S.A., quer do Novo Banco, S.A., face ao título executivo – livrança.

15.ª Esta matéria da legitimidade é do conhecimento oficioso e foi suscitada, na Apelação da sentença, nas concls. I) e m), na reclamação da decisão singular na Relação e é agora suscitada também face ao Acórdão em Conferência.

16.ª É questão oficiosa para o tribunal, verificar se existe título executivo, não em termos abstractos, mas em termos concretos, também face àquele que pretende suceder na posição de quem figura no título como credor (art.º 356º, 1, al. b – parte final, do CPC).

17.ª A sucessão processual implica sempre uma avaliação judicial de legitimidade do pretenso sucessor face ao título, como resulta

“1 - Tendo havido sucessão no direito ou na obrigação, deve a execução correr entre os sucessores das pessoas que no título figuram como credor ou devedor da obrigação exequenda; no próprio requerimento para a execução o exequente deduz os factos constitutivos da sucessão.” (art.º 54º, 1, do CPC)

18.ª Foi arguida a nulidade de falta de notificação do Novo Banco, S.A., do primeiro requerimento de intervenção no processo declarando suceder ao BES, SA. (de 13/4/2015), quer na Apelação, quer na reclamação (art.º 3º do CPC).

II- Violação das Regras da Hierarquia Judiciária

19.ª Na hierarquia dos tribunais não há um dever de imposição e obediência em todos e quaisquer casos, entre o Tribunal da Relação e os tribunais de 1.ª instância.

20.ª Os tribunais da 1ª instância e a Relação têm competências exclusivas e autónomas, regidas por um conjunto de normas que regulam a sua distribuição, pelo que só em alguns casos a Relação pode “impor-se” ao tribunal de 1ª instância. (art.º 4º, 1, da Lei n.º 62/2013, de 26/8 e art.º 203º, da CRP.

21.ª Regra geral, aos tribunais inferiores, de 1.ª instância, incumbe o julgamento de todas as causas e à Relação incumbe o reexame, por via de recurso, das decisões de 1.ª instância.

22.ª A Relação, deve substituir-se ao tribunal de 1.ª instância, julgando a causa, proferindo decisão substitutiva, que revogue, ou confirme, a sentença de 1.ª instância, (art.ºs 662º,1,665º,1, do CPC) com as limitações do princípio do dispositivo, das alegações de recurso de Apelação e das provas com força vinculada (art.ºs. 607º, 4, do CPC).

23.ª Na reapreciação da matéria de facto pela Relação, está obrigada, sempre que as provas produzidas o exijam, por existirem, factos assentes, ou provas vinculativas (art.º 607º, 4, do CPC), ou depoimentos gravados, a alterar a decisão da 1.ª instância, proferindo decisão de fundo, isto é, a decidir a causa. (art.º 662º, 1, do CPC).

24.ª Em alternativa, ao julgamento da causa pela Relação, esta, no reexame da sentença, pode concluir que há deficiente fundamentação, que existe pouca amplitude da matéria de facto considerada, que certa prova constituenda sofre de deficiência ou de insuficiência, e anular a sentença, parcial, ou totalmente (artº 662º,2, do CPC), remetendo o processo para a 1.ª instância, para colmatar os óbices e, em consequência, julgar novamente a causa (artº 662º,3, do CPC).

25.ª Este poder da Relação de anular a sentença da 1ª instância, total, ou parcialmente, não fazendo um novo julgamento da causa, mas remetendo o processo à 1.ª instância para, na parte afectada, “reparar” os óbices, fazendo novo julgamento com a prolacção de nova sentença- é um poder de cassação.

26.ª Da distribuição de competências entre a Relação e a 1ª instância, a Relação apenas tem poderes de remeter o processo à 1.ª instância, quando não julga o fundo da causa.

27.ª O objectivo da remessa do processo à 1.ª Instância, pela Relação, é o de que aquela faça novo julgamento proferindo nova sentença, sem os defeitos legais que são apontados pela Relação. (art.º 662º, 3, do CPC).

28.ª In casu, a Relação julgou a causa com factos pela mesma fixados, não se baseando em nenhuma prova, ou alegação, e ordena à 1. Instância que os introduza na sua sentença como fundamento.

29.ª Ora, tais poderes não estão fixados na lei (violando, entre outros, o art.º 662º, 3, do CPC) e põem causa a autonomia de julgamento do tribunal de 1-ª instância.

30.ª Os factos que são ordenados aditar â sentença da 1.ª instância são,

a) Que estava registado no activo do BES, S.A., em 2 de março de 2014, um crédito noticiado nos autos e originário do BIC, vencido em 2006

b) Que um crédito originário de BIC foi transferido para o Novo Banco, decorrente duma decisão administrativa do Banco de Portugal.

31.ª A Relação face aos factos que conhece e estão plenamentre provados no processo, deveria ter proferido acórdão susbtitutivo da sentença conhecendo da causa, nos termos do art.º 662º, 1, do CPC, não ordenando qualquer introdução de factos na sentença de 1.ª instância.

32.ª A solução jurídica da questão é simples, tendo o tribunal apenas de responder às questões:

- o BES, S.A. figura na livrança emitida em 2001, como seu tomador ou portador? – Resposta negativa.

- E o Novo Banco? – Resposta Negativa.

39.ª Foi no requerimento executivo, ou nestes autos, alegado e provado algum negócio de cessão de créditos a favor do BES, ou do Novo Banco? Não.

40.ª Poderá qualquer acto normativo interno derrogar as regras da convenção internacional da Lei Uniforme da Letras e Livranças? A resposta é negativa.

III - Contradição com os Acórdãos indicados

41.ª No que concerne ao Ac. da Relação de Guimarães, de 13/06/2019, aí se determina que a livrança só pode ser validamente transmitida por endosso, ou cessão ordinária de créditos (art.º 77º e 11º da LULL).

42.ª No caso em apreço, considerou-se que basta dar notícia dum crédito no processo e estar registado na contabilidade, nos activos, não é preciso invocar ou provar, nenhum acto, nem negócio, para a livrança passar para outro legítimo titular.

43.ª Também aí se defende que, no domínio do NCPC, aplicável, portanto ao 1º requerimento de Novo Banco, S.A. invocando sucessão no lugar do BES, S.A., de 13/4/2015, o sucessor processual tinha de alegar os factos constitutivos da cessão de créditos e da sua plena eficácia, tendo feito prévia notificação aos devedores. (art.º 583º,2, do CC) e havendo necessidade de juntar o contrato de cessão de créditos com o requerimento em que se pretende a substituição.

44.ª Na decisão tomada de que um crédito Ac. da Relação de Guimarães, de 12/10/2017 (doc. 2), defende-se que a obrigação cartular da livrança é abstracta, formal e literal e a livrança define os limites da execução, enquanto título executivo, é independente da relação subjacente.

45.ª Já na decisão singular, sustenta-se que a relação obrigação pode estar incorporada nos registos contabilísticos.

46.ª Em relação ao Ac. da Rel. de Guimarães, de 13/06/2019 ´(doc.1), contradição de,

- como os créditos incorporados em livranças podem ser transmitidos (disposições da Lei Uniforme) requisitos de prova e eficácia da cessão de créditos de livranças (legislação do Código Civil);

- que basta um Regulamento do Banco de Portugal para se provar a sucessão no direito cartular;

Em relação ao Ac. da Rel. de Coimbra, de 15/12/2021 (doc.3), contradição com a decisão de,

- que o avalista garante o pagamento da obrigação cambiária avalizada e não a obrigação da relação subjacente, pelo que na decisão recorrida ao sustentar-se que pode haver transmissão não realizada literalmente na livrança, estaria a defender que a obrigação cartular só se tinha transmitido em relação ao promitente susbcritor, mas não ao avalista, o que seria impossível.

V- O Título Executivo e a Legislação Aplicável

47.ª Em 2/6/2006, as livranças não vinham indicadas expressamente como títulos executivos no CPC, nem em qualquer outra norma, embora o art.º 46º, 1, al. c) do CPC, considerasse,

“À execução apenas podem servir de base: (…)

Os documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável por simples cálculo aritmético de acordo com as cláusulas dele constantes, (...); - aplicável por força do art.º6.°, n.º3, da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, tendo em conta a data da instauração da execução.

48.ª Tínhamos, pois dois tipos de títulos executivos previstos, no art.º 46º, 1, al. c), do CPC,

- ou eram documentos particulares que constituíam obrigações pecuniárias;

- ou eram documentos particulares que reconheciam obrigações pecuniárias, neste caso, havendo de conjugar a interpretação do preceito com o art.º 458º, do CC.

49.ª Uma vez que foi indicada uma livrança como título e as livranças não deixam de ser “documentos particulares que constituíam obrigações pecuniárias;”, se estiverem reunidos os respectivos requisitos.

50.ª Os requisitos da livrança são definidos pela Lei Uniforme referente a Letras e Livranças (LULL)5, com valor supralegal (art.º 8º, 2, da Const.), nos art.ºs 75º e 75º, da LULL.

51.ª A sustentação de que o Regime das Instituições Financeiras, criado pela lei ordinária, ou uma decisão administrativa do Banco de Portugal se pode sobrepor a uma convenção vinculativa para o Estado português, viola a Constituição.

52.ª Por outro lado, na livrança deve constar o nome da pessoa a quem a livrança deve ser paga, ou seja, neste caso o nome que consta é o do Banco Internacional de Crédito, S.A. e não o de quem requer o pagamento.

53.ª O Exequente BES, S.A. indicou à execução uma livrança emitida em 2001, não alegou qualquer negócio subjacente à livrança, mas quer ser reconhecido como legítimo portador da livrança por alegar ter-se fundido em 30/12/2005, com o BIC, S.A.

54.ª Ora tal posição não pode proceder, sendo, inclusive, questões de conhecimento oficioso, a falta de título executivo e a ausência de alegação de causa de pedir para tutelar a sua posição.

55.ª A LULL, que define um regime especial para as letras e livranças, contem normas supralegais, por derivar de convenção internacional e não pode ser afastada pelos art.ºs do CSC que dispõem sobre fusão , ou pelo art.º 56º, 1, do anterior CPC (actual 54º, 1, do CPC), pois são normas hierarquicamente inferiores.

56.ª A LULL determina a abstracção e a literalidade da obrigação cartular, isto é, da cártula (neste caso, a livrança) - significa que a causa do negócio subjacente tem autonomia do título,

57.ª A LULL prevê que é legítimo credor da livrança, quem figure na livrança como tomador, ou seja, seu legítimo portador, justificando a posse do título por uma “série ininterrupta de endossos” (art.ºs, 11º,§1, 14º,§1, 16º,§1, da LULL, ex-vi , art.º 77º da LULL), ou invoque e prove (utilizando a forma adequada), ter sido transmitida uma cessão de créditos de que a livrança seja acessória (art.º 11º, 2º §, ex-vi art.º 77º da LULL).

58.ª No caso presente, o BES, S.A., veio no requerimento executivo apresentar uma “habilitação”, mas, além de não figurar na livrança, também não demonstrou ser legítimo portador, por uma “série ininterrupta de endossos, nem provou que ocorreu um negócio de cessão de créditos sobre a forma exigida em que a livrança era acessória.

59.ª Se a livrança foi emitida em 2001, a favor de BIC, SA., nada prova que no final de 2005, o BIC, S.A. fosse titular de qualquer negócio subjacente.

60.ª Por consequência, também o Novo Banco, não provou ser o legítimo portador da livrança, nem que lhe foi transmitida por cessão de créditos na forma adequada em que a livrança era acessória.

E concluem: “… deve o Acórdão em crise ser substituído por outro que ser revogado e substituído o da Relação considere que não há título executivo relativamente aos BES, S.A. e Novo Banco, S.A., nem os mesmos sucederam na titularidade da livrança, ou de qualquer crédito conexo.”

6. O Recorrido contra-alegou, formulando as seguintes (transcritas) conclusões:

a. Os Recorrentes não se conformam com a douta decisão recorrida que anulou o despacho de 08.07.2020 que ordenou que fosse inserido na decisão impugnada como assente “de crédito noticiado nos autos, registado no ativo do BES S.A., em 2 de março de 2014, originário do BIC, vencido em 2006, que foi transferido para o Novo Banco, decorrente duma decisão administrativa do Banco de Portugal, e que sujeitou a transferência de créditos à avaliação independente.”

b. Ou seja, o douto despacho de 08.07.2020 conheceu única e exclusivamente de uma questão “Da intervenção do Novo Banco, S.A.”.

c. Os Recorrentes extrapolam assim o objeto do recurso, trazendo à apreciação deste Tribunal, questões que não poderão ser apreciadas e que já foram inclusive definitivamente conhecidas no apenso A – oposição à execução, cujo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21.06.2023 transitou em julgado aos 06.07.2023.

d. Assim no dia 3 de Agosto de 2014, o Conselho de Administração do Banco de Portugal decidiu aplicar ao Banco Espírito de Santo S.A., uma medida de resolução, mediante a qual “a generalidade da actividade e do património do Banco Espírito de Santo S.A., é transferida, de forma imediata e definitiva, para o Novo Banco S.A.” – cfr. deliberação do Banco de Portugal de 03/08/2014, a fls., cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais (cremos assim manifesto lapso de escrita a referência a 02 de março de 2014, ao invés de 03 de agosto de 2014).

e. Nesse seguimento foi constituído o Novo Banco, S.A., nos termos do número 5 do artigo 145.º-G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei número 298/92, de 31 de Dezembro.

f. A transferência dos ativos e passivos operou-se – ope legis - por força da conjugação do art.º 145.º - G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF) com a supra citada Deliberação do Banco de Portugal.

g. Não obstante, no dia 11 de Agosto de 2014, o Conselho de Administração do Banco de Portugal adoptou uma “Deliberação sobre clarificação e ajustamento do perímetro dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco Espírito Santo, S.A. (BES), transferidos para o Novo Banco, SA. (Novo Banco)” através da qual veio concretizar qual “o conjunto de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob a gestão do Banco Espirito Santo, S.A. (…) que passaram para o Novo Banco, S.A.” – vide deliberação do Banco de Portugal de 11 de Agosto de 2014, a fls dos autos, cujo conteúdo se dá, igualmente, por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais.

h. Clarificação que veio a consolidar-se, definitivamente, no seguimento da deliberação do Banco de Portugal de 29 de Dezembro de 2015.

i. Ora, tendo em conta que - nos presentes autos -, não está em causa matéria objecto das excepções contidas nas anteditas deliberações, a responsabilidade de onde emerge o crédito exequendo transmitiu-se para a esfera jurídica do Novo Banco, S.A

j. Logo, independentemente de qualquer decisão judicial, o Novo Banco, S.A. passou a ser parte legítima, de forma automática, nos litígios respeitantes aos activos do Banco Espírito Santo, S.A. que lhe foram transferidos, onde se insere o crédito peticionado nestes autos.

k. Não restando, assim, a partir dessa data, quaisquer dúvidas quanto à integração da responsabilidade em discussão nos presentes autos nos activos que foram transmitidos para o Novo Banco, S.A.

l. O que motivou a que, por requerimento de 13/04/2015, o ora Recorrido tivesse requerido ao tribunal a substituição do Banco Espírito Santo SA, na posição de Exequente.

m. Com efeito, nos termos do artigo 145.º H do RGICSF, o Banco de Portugal pode, a todo o tempo, transferir activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob a gestão de banco de transição para a instituição originária.

n. Não dependendo tal decisão do prévio consentimento dos accionistas da instituição de crédito nem das partes em contratos relacionados com os activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob a gestão a transferir - cfr. n.º 12 do artigo 145.º H do RGICSF.

o. Daí que, em conformidade com o supra exposto, se impunha que fosse determinada a substituição do Banco Espírito S.A. pelo Novo Banco, S.A., - cfr. parte final do art.º 260º do CPC, sendo que do ponto de vista processual, a legitimidade do Novo Banco, S.A. decorre do disposto no artigo 54º, n.º 1 do CPC, conjugado com o artigo 269º, n.º 2 do CPC.

p. Em face do exposto, e considerando as supra citadas deliberações do Banco de Portugal e o disposto nos artigos 145º A, G e H do RGICSF e 260º, parte final, do CPC, não poderia ser outro o sentido da douta decisão recorrida, devendo, consequentemente, manter-se inalterada a douta decisão recorrida.

q. Devendo pelo exposto improceder, por manifestamente infundadas as alegações aduzidas.

E conclui: “Deverá o presente recurso ser julgado improcedente e, em consequência, manter-se o douto despacho recorrido”.

7. Por despacho do Relator o recurso de revista só foi admitido quanto à violação de regras de competência hierárquica e das nulidades que se mostram em conexão com essa matéria.

8. Cumpre apreciar e decidir.

II. Delimitação do objeto do recurso

Como é jurisprudência sedimentada, e em conformidade com o disposto nos artigos 635º, nº 4, e 639º, nºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil, o objeto do recurso é delimitado em função das conclusões formuladas pelo recorrente, pelo que, dentro dos preditos parâmetros, da leitura das conclusões recursórias formuladas pelos Recorrentes decorre que o objeto do presente recurso (na parte em que foi admitidos) está circunscrito à questão da violação de regras de competência em razão da hierarquia e das nulidades que se mostrem em conexão com essa matéria.

No caso, invocam os recorrentes as seguintes nulidades:

a) - Nulidade por omissão de pronúncia quanto à invocada nulidade do despacho da 1.ª instância por falta de especificação dos fundamentos de facto;

b) - Nulidade por falta de fundamentação de facto do acórdão da Relação ao dar como assente que “o crédito noticiado nos autos, registado no ativo do BES S.A., em 2 de março de 2014, originário do BIC, vencido em 2006, que foi transferido para o Novo Banco, decorrente duma decisão administrativa do Banco de Portugal, e que sujeitou a transferência de créditos á avaliação independente.”;

c) - Nulidade por omissão de pronúncia quanto à invocada nulidade do despacho da 1.ª instância por omissão de pronúncia quanto à exceção de ilegitimidade do Novo Banco;

d) - Nulidade por omissão de pronúncia quanto à invocada violação do princípio do contraditório;

e) - Nulidade por omissão de pronúncia quanto à verificação dos pressupostos, de facto e de direito, da sucessão do crédito cambiário;

f) nulidade do acórdão por omissão de pronúncia quanto à invocada nulidade por falta de assinatura eletrónica;

Ora, tendo em consideração o objeto do recurso supra delimitado, temos por evidente que apenas as nulidades constantes das als. a) e b) se mostram numa relação de conexão com a invocada violação de regras de competência hierárquica, pelo que serão as únicas que serão objeto de decisão no âmbito do presente recurso de revista.

De facto, está em causa o iter cognitivo que está subjacente à decisão colocada em crise nos autos e em relação à qual as demais nulidades são alheias.

As demais nulidades, constituindo um fundamento acessório do objeto de recurso que não será conhecido por este STJ, deverão ser apreciadas pelo Tribunal da Relação, nos termos do disposto na 1.ª parte do n.º 4 do artigo 615.º e n.º 6 do artigo 617.º do Código de Processo Civil.

III. Fundamentação

1. Factos relevantes:

1.1. Por despacho de 8/07/2020, foi proferida decisão a deferir a substituição processual do exequente pelo Novo Banco.

1.2. Interposto recurso de apelação pelos executados, no Tribunal da Relação de Lisboa, foi proferida decisão singular que decidiu nos seguintes termos: “decide-se: anular o douto, de 8 de julho de 2020, e determinar que o Exmo. Senhor Juiz a quo insira na decisão impugnada, como assente, de crédito noticiado nos autos, registado no activo do BES, S.A., em 2 de março de 2014, originário do BIC, vencido em 2006, que foi transferido para o Novo Banco, decorrente duma decisão administrativa do Banco de Portugal, e que sujeitou a transferência de créditos á avaliação independente.”.

1.3. A referida decisão singular foi confirmada por acórdão da Conferência.

2. Apreciação do recurso

Por razões de ordem lógica, analisaremos em primeira linha a invocada violação de normas de competência hierárquica.

A. Da violação da competência hierárquica

Invocam os Recorrentes a violação de regras de competência hierárquica por entenderem, em suma, que não podia o Tribunal da Relação determinar que o juiz de 1.ª instância desse como provado determinado facto.

Consideram os Recorrentes que o Tribunal da Relação podia determinar a introdução de um facto, caso dispusesse de todos os elementos necessários para o efeito, ou determinar que o juiz de 1.ª instância o fizesse, não podendo neste último caso determinar o sentido decisório a propugnar.

Vejamos se assim é.

Ora, no caso que nos ocupa, lido e interpretado o Acórdão recorrido, resulta manifesto que, muito embora tenha sido determinada a devolução dos autos ao juiz da 1.ª instância, o que se retira da decisão, por via da sua interpretação, é que o Tribunal da Relação utilizou o seu poder de substituição.

Fê-lo para afirmar que o facto em crise se deveria considerar assente em face dos elementos dos autos, o que, indiscutivelmente, podia fazer, por força do disposto no artigo 662.º, n.º 2, al. c), do Código de Processo Civil.

Como se explica no Acórdão do STJ, de 17/10/2019 (processo n.º 3901/15.8T8AVR.P1.S1), “As patologias da sentença previstas no art. 662.º, n.º 2, al. c), do CPC, apenas dão lugar à anulação da decisão proferida quando do processo não constem todos os elementos probatórios necessários ao seu suprimento pelo tribunal da Relação; ao invés, se estes estiverem acessíveis, a Relação deve proceder, enquanto tribunal de substituição, à sua apreciação e introduzir na decisão da matéria de facto as modificações que forem consideradas oportunas.”

Aceita-se que a decisão em crise seja objeto de dúvidas interpretativas geradas, sobretudo, pela circunstância de o Tribunal da Relação ter, a um só tempo, utilizado a expressão “anular” e fixado um determinado sentido decisório.

Consideramos, em todo o caso, que o sentido útil a extrair da decisão em crise é o de que o Tribunal da Relação, em face dos elementos dos autos, considerou demonstrado que o crédito noticiado nos autos, registado no ativo do BES S.A., em 2 de março de 2014, originário do BIC, vencido em 2006, que foi transferido para o Novo Banco, decorrente duma decisão administrativa do Banco de Portugal, e que sujeitou a transferência de créditos á avaliação independente e que este segmento de facto deveria ser aditado, devendo a decisão jurídica manter-se exatamente a mesma.

Bem vistas as coisas, o Tribunal da Relação acabou por dar razão aos Recorrentes, afirmando que a decisão da 1.ª instância era nula por falta de segmento de facto relevante, tendo concluído que se impunha tal aditamento.

Como é evidente, o Tribunal da Relação atuou ao abrigo da sua competência decisória, não se vislumbrando qualquer violação de normas de competência hierárquica.

Nas palavras de Rui Pinto (Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2018), “a hierarquização dos tribunais exprime-se, antes do mais, num duplo plano de competência excludente e de competência revogatória. Assim, sempre que o processo é remetido ao tribunal hierarquicamente superior é devolvida (devolução de subida) com ele a competência decisória: o tribunal recorrido perde competência e o tribunal de recurso ganha competência. Mas o que define esta última como competência superior é a circunstância de esta ser, além disso, uma competência de revogação de decisão alheia (…). Esta qualificação implica que a regra pela qual na contradição de julgados prevalece o mais antigo (cf. 625.º, n.º 1) valha entre decisões da mesma hierarquia, não valha entre decisões ligadas por uma relação de recurso: a segunda prevalece sobre a primeira e suprime a primeira”.

No caso presente, o Tribunal da Relação atuou na sequência de recurso interposto pelos Recorrentes e ao abrigo das competências atribuídas pela nossa lei processual, no que à matéria de facto diz respeito.

Não se vislumbra, assim, qualquer violação de regras de competência hierárquica.

B) Das nulidades invocadas pelos Recorrentes

Invocam os Recorrentes a nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia quanto à invocada nulidade do despacho da 1.ª instância por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito e por falta de fundamentação de facto do Acórdão da Relação ao dar como assente que “o crédito noticiado nos autos, registado no ativo do BES S.A., em 2 de março de 2014, originário do BIC, vencido em 2006, que foi transferido para o Novo Banco, decorrente duma decisão administrativa do Banco de Portugal, e que sujeitou a transferência de créditos á avaliação independente.”.

Vejamos, separadamente, cada uma destas questões.

De facto, no que concerne à invocada nulidade por omissão de pronúncia, o STJ tem-se pronunciado, de forma unânime, no sentido de que apenas a total ausência de fundamentação gera o vício de nulidade por omissão de pronúncia.

Pela sua clareza, cita-se o acórdão deste STJ, de 20/02/2020 (processo n.º 713/12.4TBBRG-B.G1.S1), que concluiu que “é corrente e unânime o entendimento segundo o qual só a falta absoluta de fundamentação de facto ou de direito gera a nulidade por falta de fundamentação, com o que se não pode confundir a fundamentação medíocre ou insuficiente que, repercutindo-se no mérito da decisão, podendo comprometê-lo, não produz nulidade.”.

No caso presente, é manifesto que o Tribunal da Relação se pronunciou sobre a invocada falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito, tendo considerado que a inexistência de um segmento de facto da decisão de 1.ª instância importava a sua nulidade.

Deixou, a este propósito, escrito que “neste particular, é incontornável a referência feita de que não consta um segmento de facto na douta decisão impugnada, de que existia um crédito registado no ativo do BES, S.A., em 2 de março de 2014, originário do BIC, vencido em 2006, para daí afirmar que o mesmo foi transferido para o Novo banco, decorrente duma decisão administrativa do Banco de Portugal. De uma verificação de todo o processado, não vislumbramos indicação do que acima se menciona, pelo que, tendo sido suscitada esta questão, está a decisão em apreciação flagelada de nulidade por ausência de segmento de facto relevante (art. 615.º, n.º 1, do C. P. Civil).”

Efetivamente, neste âmbito, o Tribunal da Relação acabou por considerar que a falta de fundamentação de facto implicava a nulidade da decisão da 1.ª instância, o que declarou.

Não se vislumbra, aqui, qualquer nulidade por omissão de pronúncia.

No que concerne à invocada nulidade por falta de fundamentação, cumpre consignar que, como tem sido jurisprudência deste STJ, só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil.

Como se afirma no acórdão deste STJ, de 20/02/2020 (atrás citado), “é corrente e unânime o entendimento segundo o qual só a falta absoluta de fundamentação de facto ou de direito gera a nulidade por falta de fundamentação, com o que se não pode confundir a fundamentação medíocre ou insuficiente que, repercutindo-se no mérito da decisão, podendo comprometê-lo, não produz nulidade.”.

No caso presente, lido e interpretado o Acórdão recorrido, não se descortina, em parte alguma, as razões que suportam a decisão tomada pelo Tribunal da Relação de dar como assente o facto já mencionado (“o crédito noticiado nos autos, registado no ativo do BES S.A., em 2 de março de 2014, originário do BIC, vencido em 2006, que foi transferido para o Novo Banco, decorrente duma decisão administrativa do Banco de Portugal, e que sujeitou a transferência de créditos á avaliação independente”.).

Efetivamente, não sendo, como vimos, discutível que o Tribunal da Relação podia suprir a nulidade da decisão da 1.ª instância, o que é facto é que o deveria ter feito apelando a elementos probatórios constantes nos autos, o que, tudo visto, não sucedeu.

Como é evidente, o Acórdão da Relação, sendo totalmente omisso quanto às razões que sustentam a sua decisão, tornam inalcançável o caminho que guiou o Tribunal da Relação a concluir nos termos que constam dos autos.

Resulta, assim, que o Acórdão recorrido padece de nulidade por falta de fundamentação de facto, quanto ao segmento de facto aditado, o que se declara.

Devem, assim, os autos baixar ao Tribunal da Relação para dar como assente o referido facto apelando aos elementos probatórios constantes dos autos (nos termos da al. c), do n.º 2, do artigo 662.º do Código de Processo Civil) ou mandar baixar à 1.ª instância para que esse facto seja apurado, em função da prova constante dos autos.

IV. Decisão

Posto o que precede, acorda-se em anular o Acórdão recorrido, ordenando-se a baixa dos autos ao Tribunal da Relação para dar como assente o referido facto apelando aos elementos probatórios constantes dos autos (nos termos da al. c), do n.º 2, do artigo 662.º do Código de Processo Civil) ou mandar baixar à 1.ª instância para que esse facto seja apurado, em função da prova constante dos autos.

Custas pelo vencido a final.

Lisboa, 27 de fevereiro de 2024

Pedro de Lima Gonçalves (Relator)

Manuel Aguiar Pereira

Maria João Vaz Tomé