Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
291/09.1TCFUN-A.L2.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: ANA RESENDE
Descritores: DUPLA CONFORME
FUNDAMENTAÇÃO ESSENCIALMENTE DIFERENTE
INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
DANOS PATRIMONIAIS
EQUIDADE
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
CRITÉRIOS
Data do Acordão: 05/03/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: REVISTA IMPROCEDENTE.
Sumário :

I- O alvo da dupla conforme são as decisões proferidas por cada uma das instâncias, isto é, o resultado final declarado, e não o percurso jurídico que o antecedeu, que releva tão só para efeitos da verificação da existência ou não de fundamentação substancialmente diversa

II- Quando o cálculo de um montante indemnizatório tenha assentado em juízos de equidade, não compete ao Supremo Tribunal de Justiça a determinação do valor pecuniário, até porque a pura aplicação de tais juízos já não se consubstancia, em bom rigor, numa apreciação de uma questão de direito.

III- As atribuições do Supremo Tribunal de Justiça reportam-se a sindicar se o recurso à equidade foi indevidamente utilizado, porquanto competia ao Tribunal aplicar critérios de cariz normativo, decorrentes dos preceitos normativos atendíveis, bem como aferir se foram ultrapassados os limites do acervo fáctico apurado, pois tal constitui violação da lei, e nessa medida abrangidos pelos poderes desse Tribunal.                        

Decisão Texto Integral:


REVISTA n.º 291/09.1TCFUN-A.L2.S1

ACORDAM NA 6ª SECÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

           

I - Relatório

1. AA, enquanto sócio da extinta sociedade M..., Limitada, veio ao abrigo do disposto no artigo 358.º, e seguintes do CPC, deduzir incidente de liquidação de sentença contra APRAM-ADMINISTRAÇÃO DOS PORTOS DA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA, S.A., pedindo que a Requerida seja condenada a pagar ao Requerente 50% da quantia de 197.097,55€, acrescida de juros comerciais vencidos que ascendiam em 31.12.2018 ao montante de 440.155,65€, e os vincendos à taxa máxima legal para as transações comerciais, até integral pagamento.

1.1. Invoca para tanto que a Requerida, por sentença transitada em julgado foi condenada a pagar ao Requerente, a quantia a apurar em execução de sentença, resultante dos prejuízos que lhe causou pela permanência da embarcação “LV” no estaleiro explorado pela sociedade no período temporal compreendido entre janeiro de 2004 e 8 de maio de 2006.

A ocupação do navio em doca da Requerente correspondeu, em dias, 2004 – de 1 de janeiro a 31 de dezembro = 365 dias; 2005 – de 1 de janeiro a 31 de janeiro = 365 dias; 2006 – 1 de janeiro a 8 de maio = 97 dias, num total de 827 dias.

A Requerente consultou, para caso semelhante, dois estaleiros navais nacionais, de forma a poder encontrar um critério objetivo para a determinação de “justo valor” do preço da estadia no estaleiro.

Assim deve considerar-se justo, face ao espaço ocupado pela embarcação e aos preços fixados à data nos estaleiros semelhantes, o valor constante das faturas emitidas pela Requerente, tendo em conta o valor da docagem correspondente a 1.147,24€, acrescido de 229,45€ de estadia por cada dia útil, considerando 21 dias úteis por mês, importando a estadia do navio “LV” em 197.097,55€, a título de capital, acrescido dos juros de mora computados.

O crédito do Exequente, como sócio com 50% do capital da primitiva Autora e seu último gerente, respeita a bens não partilhados, nos termos do art.º 164, do Código das Sociedades Comerciais (CSC).

2. A Requerida veio contestar, excecionando a ilegitimidade do Requerente, e a existência de caso julgado, e por impugnação. Deduziu também reconvenção, alegando que no caso da procedência do peticionado, é titular de um crédito a liquidar contra o Requerente no montante máximo de 37.716,50€, acrescido dos juros legais, com base no processo n.º 333/09...., determinando-se que liquidado, se opere a compensação.

3. Em audiência prévia não foi admitida a reconvenção deduzida, e proferido despacho saneador, entendeu-se estar assegurada a legitimidade ativa e passiva das partes e improcedentes as exceções de violação de caso julgado e da autoridade de caso julgado, bem como conhecido o pedido, julgando verificada a exceção de ilegitimidade substantiva, com a absolvição da Ré. Mais foi fixado o valor da ação em 637.253,00€.

4. Interposto recurso de apelação pelo Requerente e subordinado pela Requerida, foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que julgou procedente a apelação (recurso principal) e em consequência revogou a decisão recorrida na parte que julgou procedente a exceção perentória de ilegitimidade substantiva do Autor e, considerada verificada positivamente tal legitimidade, determinou o prosseguimento dos autos para fixação do valor indemnizatório correspondente aos danos, tal como foram apurados, e improcedente o recurso subordinado, confirmando a decisão recorrida na parte por este impugnada, não admissão do pedido reconvencional, violação do caso julgado e da autoridade do caso julgado.

5. Realizado julgamento foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente o incidente de liquidação, liquidando em 180.000,00€ a quantia que a Requerida foi condenada a pagar a M..., Lda., acrescida de juros de mora à taxa legal para os juros comerciais, a contar do respetivo trânsito em julgado, reconhecendo ao Requerente o direito a receber o correspondente a cinquenta por cento da quantia liquidada.

 6. Inconformada, veio a Requerida interpor recurso de apelação, julgada parcialmente procedente, alterando a decisão recorrida, reduzindo o montante liquidado para o montante de 110.000,00€, bem como dispensando a Requerente e Requerida do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida.

7. Ora inconformado, veio o Requerente interpor recurso de revista, formulando nas suas alegações, as seguintes conclusões: (transcritas)

 1.O tribunal julgará equitativamente, dentro dos limites que tiver por provados.

2. O poder de fixação equitativa do dano não é absoluto, pois o tribunal deve ponderar as circunstâncias do caso concreto e atender ao montante que normal ou ordinariamente terão atingido nessas circunstâncias os danos causados ao lesado.

3. Haverá que ter em consideração o que já se mostra provado quanto ao valor diário fixado pela Requerente, em sede de pedido inicial.

4. O objetivo da compensação é aproximar, o mais possível, o lesado da situação que viveria caso não tivesse ocorrido a ocupação de espaço pela embarcação.

5. O valor de 200,00€ por dia é um valor estimado pelo Tribunal de 1ª Instância, baseado no valor da tabela dos estaleiros navais da L..., que inclui todos os dias de calendário e não somente os dias úteis.

6. O valor de 229,45€ por dia apenas incluía dias úteis.

7. A Ré/Recorrida manteve a estrutura de preços quando tomou conta do Estaleiro Naval do ....

8. A argumentação da Ré/Recorrida baseou-se num caso específico de uma única embarcação, quando poderia ter junto dezenas de cotações.

9. A principal forma que um estaleiro naval tem de garantir que uma reparação estrategicamente importante seja competitiva na altura da cotação inicial, é reduzir o valor da estadia.

10.A tabela utilizada pela MEC era um valor utilizado para todas as reparações, onde não só se têm que manter as cotações competitivas mas também se tem a expectativa de ter lucro nos trabalhos a executar nas embarcações - não só os inicialmente cotados mas, especialmente, nos trabalhos emergentes.

11.O recurso equilibrado e proporcional à equidade é a de considerar o valor diário praticado pela MEC, de 229,45€ por dia útil.

12.É sempre o benefício económico que a MEC retiraria da utilização do espaço que está em causa.

13.Atendendo às circunstâncias do caso concreto, o cálculo que corresponde ao critério de equidade, com a adequada ponderação e proporção, não pode deixar de estar conectado com o espaço ocupado e com a utilidade ou rendimento que esse espaço ocupado pelo navio teria para a MEC.

14.Deve a Ré/Recorrida ser condenada a pagar à M..., Lda. a quantia de 136.293,30€ (cento e trinta e seis mil, duzentos e noventa e três euros e trinta cêntimos), tendo o requerente direito a receber o correspondente a cinquenta por cento da quantia liquidada, acrescida de juros à taxa devida para as transações comerciais.

15.Foi violado o artº 566º, nº 3 do Código Civil.

8. A Requerida nas suas contra-alegações formulou as seguintes conclusões: (transcritas)

A – O douto Recurso em Revista, foi interposto do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, no segmento em que, julgando parcialmente procedente a Apelação, alterou “a decisão recorrida na parte em que liquidou em 180 000,00 € a quantia que APRAM – Administração dos Portos da Região Autónoma da Madeira, S. A. foi condenada a pagar à M..., Lda., reduzindo-a para o montante de 110 000,00 € (cento e dez mil euros), tendo o requerente direito a receber o correspondente a cinquenta por cento da quantia liquidada;” [trecho a. do dispositivo do Acórdão recorrido].

B – Das conclusões do Recurso em resposta, resulta, pois, que o Recorrente postula que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, porquanto deveria ter apurado o montante indemnizatório a liquidar com base na multiplicação do valor de € 229,45 por 594 dias [i.e., os dias úteis existentes no período entre Janeiro de 2004 a 8 de Maio de 2006], o que totaliza o valor de € 136 293,30, pelo que deveria ter sido este o valor de indemnização fixado, e não o de € 110 000,00, como foi.

C – Para o caso de o Tribunal a quo ter admitido o presente Recurso ordinário de Revista, o que só hipoteticamente e à cautela se admite, e atendendo a que a este douto Supremo Tribunal cumpre apreciar da admissibilidade do recurso, e que, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 679.º, 641.º, n.º 5, e 652.º, n.º 1, alínea b), do CPC, não se encontra vinculado à decisão do tribunal a quo que admite o recurso, fixa a sua espécie e determina o seu efeito, então renovamos aqui o entendimento de que o presente Recurso não é admissível, porquanto se verifica uma situação de dupla conforme, obstativa da aceitação e conhecimento do mesmo (cf. artigo 671.º, n.º 3, do CPC).

D – Com efeito, compulsando o teor da Sentença da Primeira Instância e o do Acórdão sob recurso, temos que, ambos, no que aqui importa, coincidem totalmente (i.) na aplicação ao caso de juízos de equidade para apuramento da indemnização liquidanda, e (ii.) no entendimento de que tal apuramento tenha por base o valor diário de ocupação de € 200,00.

E – É de notar que, conforme se retira do Requerimento Inicial deste incidente, o Recorrente pretendia que a indemnização cuja liquidação requereu, fosse apurada com base na multiplicação do valor de € 229,45, por todos os dias contidos no indicado período de 01.01.2004 a 08.05.2006, valor base de cálculo que não foi acolhido nem pela Sentença, nem pelo Acórdão proferidos neste Incidente de Liquidação.

F – E não tendo o Recorrente apelado da Sentença e tendo o Tribunal da Relação confirmado o entendimento sufragado naquela decisão (seja o da aplicação ao caso de juízos de equidade, seja o do cômputo multiplicativo do valor de € 200,00 diários para liquidação da indemnização em apreciação), parece à Recorrida que ocorre, portanto, uma situação de dupla conforme quanto à adoção daquele juízo de equidade (que o Recorrente não questiona) e quanto àquele valor base adotado de € 200,00 (que agora o Recorrente questiona), para apuramento do valor indemnizatório impugnado.

G – Significa dizer que, tendo o Tribunal recorrido se estribado naquele valor base de € 200,00, para alcançar o valor indemnizatório global que sindicou, tal como o fez a Primeira Instância, então não mais o Recorrente pode/poderia questionar recursivamente – como questiona – a aplicação daquele valor base, propondo, ao invés, que deveria ter sido/deve ser aplicado o valor que inicialmente requereu, qual seja o de € 229,45.

H – Assim sendo, quer parecer à Recorrida, salvo melhor entendimento, que o presente Recurso (ordinário) de Revista não deverá ser admitido, por, nos termos em que o mesmo se encontra moldado, atentar contra a dupla conformidade de julgados parcial decorrente da Sentença e Acórdão dos autos (cf. artigo 671.º, n.º 3, do CPC).

I – Caso assim se não entenda, o que só hipoteticamente se admite, sem conceder, sempre se dirá que a pretensão recursiva não pode ser acolhida, desde logo porque são os factos processualmente assentes nos autos que impedem que se contabilize um valor indemnizatório, apurado, equitativamente, com base no valor diário de € 229,45, por cada dia útil contido no período compreendido entre o dia 01.01.2004 e 08.05.2006.

J – Como visto, as Instâncias deram como provado que “[p]ela manutenção em doca para reparação, com ocupação de espaço semelhante ao demandado pelo L..., a Requerente obteria, pelo menos, € 200,00 diários” (ponto de facto F.).

K – Este facto, por si só, impede, cremos, que se atenda à pretensão em recurso, qual seja a de revogar o decidido no douto Acórdão recorrido, e decidir pela liquidação de indemnização global de € 136 293,30, apurada pela “multiplicação do valor de € 229,45 por cada dia útil ocorrido entre Janeiro de 2004 e 8 de Maio de 2006 (594 dias)”.

L – Quer-se dizer, se está apurado que a M... obteria, pela manutenção em doca para reparação, com a ocupação de espaço idêntico ao que foi ocupado pelo navio L... no Estaleiro Naval do ..., o valor diário de € 200,00, não se afigura consistente e producente estar a apurar o valor de indemnização em causa, ainda que segundo juízos de equidade, com base em qualquer outro valor, e menos ainda com base no valor diário de € 229,45.

M – Acresce, nesta sequência, que, igualmente de acordo com a matéria dada por provada, a indemnização em liquidação, jamais poderia ser apurada com base naquele valor diário de € 229,45.

N – Com efeito, encontra-se demonstrado que o preço de estadia/ocupação de “€ 229,45 por cada dia útil, pressupõe que as embarcações ocupem uma área de reparação efetiva do Estaleiro, aí sejam colocadas sobre berços, aí sejam mantidas em segurança e aí sejam reparadas” (facto provado B. xi.).

O – Ou seja, para que fosse aplicado aquele valor diário de € 229,45 para apuramento da indemnização liquidanda, seria necessário que todas aqueles pressupostos circunstanciais se verificassem in casu, cumulativamente, e no período versado.

P – E a verdade é que nenhum de tais pressupostos se verificou, conforme também ressalta evidente da matéria processualmente assente.

Q – De facto, o navio L... não foi reparado durante todo o tempo em que permaneceu no Estaleiro Naval do ... (facto em B. xiii.); o L... não esteve, durante todo o período entre 01.01.2004 a 08.05.2006, sobre berços, antes sobre estacas e picadeiros em ferro (facto assente em B. xv.); e a área do estaleiro onde eram colocadas as embarcações para reparação nunca esteve cheia (facto provado B. xvi.).

R – E estes factos provados, serão suficientes, a nosso humilde ver, para afastar a possibilidade de considerar-se o valor de € 229,45, por cada dia útil de colocação do L... no Estaleiro Naval do ..., durante o período compreendido de 01.01.2004 a 08.05.2006, para apurar o valor da indemnização liquidanda, precisamente porque está provado que não se verificaram nenhum dos pressupostos que permitam ou permitiriam atender a tal valor diário para a liquidação em questão.

S – E certamente por ter entendido não ser possível apurar a indemnização em apreço com base naquele valor diário de € 229,45, é que o Tribunal do processo principal, que julgou provado tal facto, remeteu para liquidação a Sentença proferida. De contrário, certamente não o teria feito.

T – Além de não ter suporte nos factos provados, a fixação de uma indemnização equitativa com base no indicado valor diário de € 229,45, atentaria, também por isso, contra os princípios da adequação, proporcionalidade e razoabilidade, que regulam a equidade.

U – Ora, o Recorrente, embora tenha fundado o seu Recurso na violação do artigo 566.º, n.º 3, do CC, não alegou que o Acórdão sob revista – com o montante indemnizatório que determinou segundo juízos de equidade e com base no método de cálculo de um valor de € 200,00/dia útil –, ofendeu, e de que modo, os princípios da proporcionalidade e da igualdade que estruturam e balizam aquele instituto.

V – No caso sujeito, encontrando-se arredada a possibilidade de se determinar com precisão o exato quantum indemnizatório, e não tendo sido questionada, por alegação fundamentada e demonstrada, a justeza do critério e métodos adotados pelas Instâncias, nem, mormente, tendo sido invocada pelo Recorrente a violação dos princípios que fundam a equidade, designadamente os da igualdade, proporcionalidade, razoabilidade e adequação, pensamos que o cálculo adotado pelo Tribunal a quo para apuramento do valor global ressarcitivo que fixou de € 110 000,00, deverá ser aceite e mantido por este douto Tribunal ad quem (veja-se Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 19.09.2019, Processo: 2706/17.6T8BRG.G1.S1, Relatora Conselheira Maria do Rosário Morgado, e de 10.12.2019, Processo: 1087/14.4T8CHV.G1.S1, Relator Conselheiro Assunção Raimundo, consultáveis em www.dgsi.pt).

W – De tudo quanto vem de ser expendido, decorre que o douto Acórdão recorrido não violou o disposto no artigo 566.º, n.º 3, do CC, nos termos professados pelo Recorrente, pelo que deverá ser confirmado, o que mui respeitosamente se requer.

9.  Cumpre apreciar e decidir.

*

II – Enquadramento facto-jurídico

1. da factualidade

O Tribunal da Relação, no Acórdão sob recurso, considerou como provada, a seguinte factualidade:

A. Por sentença proferida nestes autos a 2 de Dezembro de 2013, foi a Requerida condenada a pagar à “M..., Lda.” a quantia, a apurar em execução de sentença, resultante dos prejuízos que lhe causou pela permanência da embarcação “LV” no Estaleiro por ela explorado, no período temporal compreendido entre Janeiro de 2004 e 8 de Maio de 2006.

B. Na sentença referida em A. provou-se que:

i. Em Março de 1998, a Administração dos Portos da RAM, através da tutela, solicitou à “M..., Lda.” que colocasse, no seu estaleiro do Porto ..., em doca seca, o navio denominado N/M “L...”, que então se encontrava à sua guarda;

ii. O navio em causa, bem como a sucata proveniente do seu desmantelamento parcial, manteve-se no mesmo Estaleiro Naval, desde de 24 de Março de 1998 até 08 de Maio de 2006, dia da entrega desse estaleiro à RAM;

iii. O tempo previsto para a estadia do Navio nos estaleiros era de cerca de duas semanas;

iv. Apesar de a “M..., Lda.” o ter sugerido inúmeras vezes, a Requerida nunca procedeu ao desmantelamento total do navio;

v. Como consequência, o navio em causa, bem como a sucata proveniente do seu desmantelamento parcial, manteve-se no mesmo Estaleiro Naval, desde de 24 de Março de 1998 até 08 de Maio de 2006, dia da entrega desse estaleiro à RAM;

vi. Pouco tempo depois de a RAM ter tomado posse dos estaleiros, a Requerida contratou uma empresa para proceder ao desmantelamento total do navio;

vii. A “M..., Lda.” viu-se impedida, de 24 de Março de 1998 a 08 de Maio de 2006, de utilizar o espaço ocupado pelo navio para a docagem e reparação de areeiros;

viii. O navio “L...” tem 35 metros de fora a fora (LOA) e pesava cerca de 360 toneladas;

ix. A sua dimensão dificultava ainda outras manobras no Estaleiro;

x. O estacionamento em seco do “L...”, de 24 de Março 1998 a 08 de Maio de 2006, importou num montante em concreto não apurado;

xi. O preço de estadia de € 229,45 por cada dia útil, pressupõe que as embarcações ocupem uma área de reparação efetiva do estaleiro, aí sejam colocadas sobre berços, aí sejam mantidas em segurança e aí sejam reparadas.

xii. A ‘M..., Lda.’ era uma sociedade comercial que tinha por objeto o exercício de atividades próprias de estaleiro de reparação de navios, fundição, serralharia mecânica e civil, importações, exportações e representações (ponto 1.).

xiii. A Capitania do Porto ..., após vistoria técnica realizada ao LV, determinou a proibição de se fazer ao mar, sem que fossem efetuados os correspondentes trabalhos de reparação e beneficiação geral, o que não foi feito (ponto 35.).

xiv. Em 24 de Março de 1998, o LV foi colocado na estrema norte da parte do Estaleiro onde eram colocadas as embarcações para reparação e aí se manteve até 8 de maio de 2006 (ponto 45.).

xv. O LV foi colocado e mantido no estaleiro, primeiro sobre berços (bases em ferro sobre as quais são depositadas as embarcações a reparar) e, depois, sobre estacas e picadeiros em ferro (ponto 46.).

xvi. A área do estaleiro onde eram colocadas as embarcações para reparação nunca esteve cheia (ponto 47.).

C. Na sentença referida em A. decidiu-se condenar a ré a pagar a quantia correspondente aos prejuízos causados pelo excessivo tempo de permanência da embarcação no Estaleiro explorado, contabilizando-se para esse efeito apenas o tempo em que, “efetivamente”, essa permanência não foi consentida, ou seja, entre Janeiro de 2004 e 8 de Maio de 2006.

D. A sentença referida em A. foi integralmente confirmada por Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 19 de Junho de 2014, notificado às partes em 23 de Junho de 2014.

E. O acórdão referido em D. transitou em julgado em 23 de Setembro de 2014.

F. Pela manutenção em doca para reparação, com ocupação de espaço semelhante ao demandado pelo L..., a Requerente obteria, pelo menos, € 200,00 diários.

G. A “M..., Lda.” foi registada como sociedade por quotas, tendo como sócios AA e BB.

H. AA assumia o cargo de gerente da “M..., Lda.”.

I.Pela Ap. 1, de 11 de Dezembro de 2014, foi registada a decisão de dissolução e encerramento da liquidação da “M..., Lda.”.

J. Pelo averbamento oficioso número 1 foi registado, em 11 de Dezembro de 2014 o cancelamento da matrícula da “M..., Lda.”.

2. do Direito

2.1. da admissibilidade do recurso de revista.

2.1.1.Pretende a Recorrida que o presente recurso de revista não é admissível, porquanto nos termos em que se mostra formulado, visa colocar em causa o Acórdão recorrido, na parte em que se consagra uma dupla conformidade de julgados com a Sentença proferida em 1.ª Instância.

Entende assim que compulsando o respetivo teor, coincidem totalmente na aplicação ao caso de juízos de equidade para apuramento da indemnização liquidanda, bem como no entendimento de que tal apuramento tenha por base o valor diário de ocupação de € 200,00, divergindo apenas quanto à contabilização dos dias para o cômputo indemnizatório alcançado, sendo que a Primeira Instância contabilizou todos os dias, desde 01.01.2004 até 08.05.2006 (€ 200,00 X 858 dias), enquanto que a Segunda Instância contabilizou os dias úteis integrantes daquele período (€ 200,00 X 594 dias) e à ponderação de critérios de aumento ou de redução do montante total apurado pela multiplicação de tais fatores.

Tendo o Recorrente invocado em sede de requerimento inicial que pretendia que a indemnização fosse apurada com base na multiplicação do valor de € 229,45, por todos os dias contidos no indicado período de 01.01.2004 a 08.05.2006, não mereceu acolhimento nas Instâncias, ficando assim vencido em tal pretensão, com a mesma se tendo conformado, e desse modo ocorrendo uma situação de dupla conforme quanto à adoção de juízo de equidade, não questionado pelo Recorrente, e quanto ao valor base de cálculo adotado de € 200,00 para liquidação do valor indemnizatório, e que o Requerente agora visa que seja valor € 229,45 diário.

2.1.2. Enquanto situação processual impeditiva do recurso de revista, no que concerne à “dupla conforme”, a mesma mostra-se consignada no n.º 3 do art.º 671, do CPC, no sentido de não ser “(…) admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância (…)”.         

Em conformidade, percecionam-se três requisitos, sem dificuldade a unanimidade da decisão colegial, de forma sujeita a uma mais aprofundada análise aqui despicienda, a conformidade da decisão, no universo das situações processualmente admissíveis, bem como a fundamentação essencialmente diferente, que em termos breves e lineares, para o que agora nos interessa, se baliza pela estruturação lógica argumentativa da decisão proferida pelas instâncias, fazendo apelo a um diferente enquadramento jurídico da causa, afastados ficando aspetos secundários, caso do aditamento de outros fundamentos, que não se traduzam em percurso normativo diverso, de igual modo não relevando alterações factuais operadas pelo Tribunal da Relação sem reflexos na subsunção jurídica[1].

Retenha-se que o alvo da dupla conforme são as decisões proferidas por cada uma das instâncias, isto é, o resultado final declarado, e não o percurso jurídico que o antecedeu, que releva tão só para efeitos da verificação da existência ou não de fundamentação substancialmente diversa[2], entendendo-se que nos casos em que a parte é confrontada com um Acórdão da Relação mais favorável que o decidido pela 1.ª Instância, sendo mantida substancialmente idêntica a fundamentação, fica-lhe vedado o acesso ao recurso de revista “normal”[3]

2.1.3. No caso sob análise, recorrendo a juízos de equidade, e no atendimento de factualidade provada nos autos, foi a Recorrida condenada em sede de Sentença ao pagamento da quantia liquidada em 180.000,00€, acrescida de juros de mora, à taxa legal, a contar do trânsito em julgado dessa decisão.

Por sua vez, no Acórdão sob recurso, o montante a satisfazer pela Recorrida foi reduzido para 110.000,00€[4], tendo em conta o juízo equitativo efetuado, considerando  o que se mostrava apurado.

Em conformidade, para além da convergência de alguns itens que levaram ao montante achado, manifesto se mostra que estamos perante decisões diversas, em termos da pretendida liquidação indemnizatória, com a redução efetuada no Acórdão recorrido, afastada ficando, a apontada dupla conforme, e assim verificada a admissibilidade do recurso de revista.

 

2.2.do valor liquidado

2.2.1. Como avulta do já enunciado, as instâncias liquidaram a quantia devida em montantes diversos, em ambos os casos recorrendo a juízos de equidade.

Conforme vem sendo entendido por este Tribunal, quando o cálculo de um montante indemnizatório tenha assentado em juízos de equidade, não lhe compete a determinação do valor pecuniário, até porque a pura aplicação de tais juízos já não se consubstancia, em bom rigor, numa apreciação de uma questão de direito, no entanto cumpre-lhe controlar os pressupostos normativos do recurso à equidade, bem como os limites dentro dos quais foi efetuado tal juízo equitativo, perante a devida ponderação da casuística no reporte à individualidade do caso concreto[5].

Resulta claro que as atribuições do Supremo Tribunal de Justiça reportam-se a sindicar se o recurso à equidade foi indevidamente utilizado, porquanto competia ao Tribunal aplicar critérios de cariz normativo, decorrentes dos preceitos normativos atendíveis, bem como aferir se foram ultrapassados os limites do acervo fáctico apurado, pois tal constitui violação da lei, e nessa medida abrangidos pelos poderes deste Tribunal.

Adiante-se, quanto esta primeira vertente que a mesma não se mostra ora questionada pela Recorrente, na admissão do recurso a  juízos de equidade, tendo em conta a exiguidade do factualismo provado, e a possibilidade de algum modo se obter mais elementos fácticos relevantes para a decisão a proferir, tal como foi entendido no Acórdão recorrido, por dificilmente aferível o quantum indemnizatório, em função do critério da teoria da diferença previsto no n.º 2 do art.º 566º do CC, isto é, a indemnização pecuniária ter como medida, a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que teria nessa data se não existissem danos[6].

Com efeito, a discordância do Recorrente prende-se com o montante achado, no atendimento do n.º 3, do acima aludido art.º 566, competindo assim ao Supremo Tribunal de Justiça, conforme o já enunciado, efetuar o possível controlo dos limites dentro dos quais foi realizado o juízo equitativo, na devida consideração da casuística da individualidade do caso concreto.

Neste âmbito, tendo em conta a tipologia dos danos, de natureza patrimonial, a fixação deverá ser realizada na obediência aos contornos da matéria de facto apurada, mas necessariamente insuficientes para tanto, por uma patente indeterminação do valor real do dano material suportado pelo lesado, complementada assim pelo apelo a juízos de equidade, que em conformidade não devem ser arbitrários, antes assentes numa base de facto com um mínimo e consistência quanto aos valores a atender, num exercício que tenha por base padrões que se possam considerar de modo suficiente consolidados face às regras da experiência, pautados pela racionalidade, afastados ficando expressões de perceções ou intuições de carácter subjetivo, e como tal discricionários.

Aliás, e na sede em que nos movemos, ao falar em equidade, em causa está, de modo necessário, o produto de uma decisão humana que visará ordenar determinados problemas perante um conjunto articulado de proposições objetivas[7], visando-se a realização da justiça abstrata no caso concreto, no encontro da solução que melhor se adaptar ao mesmo.

2.2.2. Reportando-nos aos presentes autos, em sede de sentença, considerou-se que a presença da embarcação no estaleiro dificultava as manobras no Estaleiro, determinando que a M... Lda (MEC) se visse impedida de utilizar o espaço ocupado pelo navio para a docagem e reparação de areeiros, no entanto da matéria dada como provada não permitia caracterizar os danos que se deram como provados, apenas se apurando que por cada dia que uma embarcação como a “L...” (LV) estivesse em doca aquela poderia auferir um valor de €200 diários – calculados por referência a ocupação do espaço sem qualquer prestação de serviço, ligação de cabos e seguros, bem como uma estadia no Estaleiro por força de docagem para reparação.

Tal significava que recebendo um navio para reparação, a MEC poderia receber por cada dia da manutenção em doca, pelas reparações, um valor de 200,00€, relevando não só a mera ocupação do espaço, mas também as perdas sofridas por força da impossibilidade de reparar areeiros e pelas dificuldades de manobra acrescida.

Recorrendo à equidade dentro dos limites apurados, tendo como ponto de partida o valor de 200,00€ por cada dia que a embarcação se manteve no Estaleiros, por critérios matemáticos chegava à verba global de 171.600,00€ (200,00€x858dias), ponderando ainda, nem todos os dias haveria um areeiro para reparar, mas cada dia de reparação faria aumentar a verba de 200,00€ devido aos trabalhos de reparação, conclui-se ser justo liquidar o valor dos danos em 180.000,00€.

No Acórdão sob recurso por sua vez foi entendido que se devia atender, com suficiente objetividade, os segundos itens:

ü O número de dias que a embarcação LV esteve no estaleiro correspondente ao período de Janeiro de 2004 a 8 de Maio de 2006 – 858 dias contados de modo seguido; 594 dias úteis;

✓Ter a embarcação LV 35 metros de fora a fora (LOA), pesando cerca de 360 toneladas, sendo que a sua dimensão dificultava ainda outras manobras no Estaleiro;

✓O preço de estadia de € 229,45 por cada dia útil, conforme peticionado pelo requerente no seu requerimento inicial, pressupõe que as embarcações ocupem uma área de reparação efetiva do estaleiro, aí sejam colocadas sobre berços, mantidas em segurança e reparadas;

✓O LV foi colocado na estrema norte da parte do Estaleiro onde eram colocadas as embarcações para reparação e aí se manteve até 8 de Maio de 2006, tendo estado, primeiro sobre berços e, depois, sobre estacas e picadeiros em ferro;

✓A área do estaleiro onde eram colocadas as embarcações para reparação nunca esteve cheia;

✓Pela manutenção em doca para reparação, com ocupação de espaço semelhante ao demandado pelo LV, a requerente obteria, pelo menos, 200,00 € diários;

✓Era previsível que o LV permanecesse no ENC apenas cerca de duas semanas, o que se foi protelando no tempo, sendo que o seu desmantelamento, apesar das diligências efetuadas junto da requerida, só veio a ter lugar quando a MEC deixou de explorar o ENC, o que deve ser relevado na apreciação da conduta da requerida para a verificação dos prejuízos;

✓O LV não foi objeto de reparação, no período em consideração não esteve sobre berços, o que significa que este equipamento do estaleiro não deixou de ser utilizado na reparação de outras embarcações;

✓O estacionamento do LV interferiu com a docagem e reparação de outras embarcações, mas não as impediu, como decorre da fundamentação da decisão sobre a matéria de facto da sentença liquidanda, implicando apenas um retardamento;

✓Partindo de um custo diário pela manutenção em estaleiro da embarcação, sempre se terá de considerar que esse custo varia de estaleiro para estaleiro e em função da respetiva dimensão (o que se deverá ter também por válido relativamente aos areeiros), pelo que se o valor que a MEC poderia obter pela utilização de um espaço semelhante ao ocupado pelo LV seria de 200,00 € diários, mesmo tomando este valor como ponto de partida, haverá que, no valor global a encontrar, ponderar a circunstância de o estaleiro nunca ter estado integralmente ocupado e que a utilização daquele espaço poderia não implicar sempre esse custo, como se retira dos orçamentos apresentados nos autos;

✓Os danos a quantificar ocorreram entre 2004 e 2006, ou seja, há cerca de 16/18 anos e a MEC foi extinta em 2014, pelo que para o cálculo da diferença entre a situação em que se encontrava e aquela em que se encontraria se não fosse o facto gerador dos danos haverá que ter em conta a cessação da atividade;

✓Quer a MEC na petição inicial da ação, quer o próprio recorrido formularam os cálculos do valor peticionado com base num custo de diária por dia útil, sendo essa a ponderação, por via de regra efectuada, pelos estaleiros (o que se retira até do conteúdo do depoimento da testemunha CC, que disse terem a certa altura concluído que não conseguiam manter equipas no estaleiro aos fins-de-semana, pelo que terão modificado os orçamentos para considerar a estadia apenas por referência aos dias úteis e a testemunha DD, que referiu que as estadias são sempre em dias úteis).

Mais se atendeu que não houve perda de remunerações porque não foram realizadas reparações, mas retardamento na sua execução, porque o LV não foi reparado, não havendo razão para cobrar todos os dias do calendário quando havia reparação, menos razões existiam para os considerar na integra, estando em causa a compensação pelos prejuízos resultantes da estadia e não a sua remuneração, e assim achado um montante resultante da multiplicação dos dias úteis, obtendo o valor de 118.000,00€, o qual pressupondo como valor diário obtido pela MEC no período em causa levaria a admitir que em todo esse tempo estariam embarcações presentes no Estaleiro, não resultando dos autos a amplitude da sua ocupação justificava uma atenuação para 110.000,00€, de modo a indemnização ficar mais próxima de apenas uma compensação pela ocupação do espaço.

A pretensão recursiva do Recorrente aponta que a indicação do valor estimado de 200,00€ por dia inclui todos os dias do calendário, enquanto o valor de 229.45€ por dia respeita apenas aos dias úteis, importando atender ao benefício económico que a MEC retiraria da utilização do espaço em causa, pelo que o calculo em termos de equidade não poderia deixar de estar ligado ao espaço ocupado e a utilidade ou rendimento que o espaço ocupado pelo navio teria a MEC, correspondendo ao montante a liquidar em 136.293,30€.

2.2.3.Ora, como resulta do enunciado, e mostra-se amplamente explanado no Acórdão recorrido, não se evidencia que haja atropelo, como já se mencionou, aos pressupostos normativos relativos ao recurso a juízo de equidade, nem resulta do decidido que não se tenha contido nos termos definidos na sentença proferida  2 de dezembro de 2013, na qual a Recorrida foi condenada a pagar à “M..., Lda.” a quantia, a apurar em execução de sentença, resultante dos prejuízos que lhe causou pela permanência da embarcação “LV” no Estaleiro por ela explorado, no período temporal compreendido entre Janeiro de 2004 e 8 de Maio de 2006.

Por sua vez a formulação apresentada pela Recorrente neste recurso, ainda que não coincidente quanto a alguns dos vetores do juízo levado a cabo pela Relação, mostra-se marcadamente limitada em termos dos itens considerados face ao entendimento perfilhado no Acórdão recorrido, que diverge do montante que o Recorrente pretende ver liquidado, não se patenteando, contudo, que o mesmo questione a racionalidade do juízo de equidade realizado em tal Aresto.

Mais relevante, todavia, consiste em considerar que não se verificando que tenham sido desrespeitados os critérios normativos que permitem o recurso ao juízo de equidade, e encontrando-se o mesmo nos limites em que tal juízo se concretizou na ponderação do caso, nas suas características próprias, em termos equilibrados e racionais,  não cabe a este Tribunal sindicar a determinação exata do montante a liquidar, e assim, inexistindo violação de lei, cai-se fora dos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça, o que consequentemente, se traduz na improcedência do presente recurso.    

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III – DECISÃO

Nestes termos, decide-se negar a revista, confirmando o Acórdão recorrido.

Custas pelo Recorrente, mantendo-se a dispensa do pagamento de metade do remanescente da taxa de justiça devida.

Lisboa, 3 de maio de 2023

Ana Resende (Relatora)

Maria José Mouro          

Graça Amaral                        

       

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Sumário, art.º 663, n.º 7, do CPC.

                                                           

 

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[1] Cf. Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, n.º 7/2022, in DR. n.º 201/2022, I série, de 18.10.2022, com amplas referências Jurisprudenciais e Doutrinárias.
[2] Cf. Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7.ª edição, pág. 433.
[3] Cf. Abrantes Geraldes, obra citada, pág. 437.
[4] Indeferida que foi em Conferência, a retificação do valor para 118.800,00€.
[5] Cf. Acórdão do STJ de 16.11.2021, processo n.º 5097/05.4TVLSB.L2.S3, in www.dgsi, com ampla indicação jurisprudencial.

[6] Consigna-se no Acórdão sob recurso “(…)Não se trata, pois, ao invés do sustentado pela recorrente, de falta de alegação, mas antes de falta de prova do valor concretamente relevante, tendo-se apurado um valor que teria sido possível obter por via daquela utilização (cf. alínea F.), mas sem que se tivessem apurado as perdas concretamente sofridas pela impossibilidade de reparação de areeiros e pelas dificuldades de manobra, sendo certo que, quanto a estas últimas, dificilmente se poderiam especificar perdas patrimoniais, pois que está em causa uma maior dificuldade na execução da manobra, que não deixou de ser efectuada, e que sequer se apurou ter implicado um maior dispêndio de tempo, trabalho ou equipamento, remetendo antes para um acréscimo de esforço não necessariamente convertível em valor pecuniário. Por outro lado, verteram-se na decisão recorrida razões bastantes para justificar a inviabilidade de ulteriores investigações e diligências de prova, face ao longo tempo decorrido, à extinção da MEC verificada em 2014, a danos reportados aos anos de 2004 a 2006 (ou seja, decorridos que estão 16 a 18 anos sobre a sua verificação), e a mais que provável inacessibilidade a qualquer documentação contabilística - cujo prazo de conservação se mostra ultrapassado relativamente à atividade comercial da MEC nos anos de 2004 a 2006 e mais ainda relativamente ao período anterior a 1998, sendo certo que apenas por referência a esse hiato temporal seria possível delinear um panorama objetivo sobre o número anual de docagens de areeiros antes do estacionamento do LV no ENC e o número posterior –, o que denota não só a impraticabilidade de uma alegação consistente ao nível das repercussões no número anual de docagens mas também a inviabilidade de uma qualquer diligência de prova nesse sentido. (…)”
           
[7] Conforme Ac. do STJ de 17.05.2012, processo n.º 99/05.3TVLSB.L1.S1,  citando Menezes Cordeiro, in O Julgamento de Equidade, no O Direito, ano 122.º, in www.dgsi.