Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3589/15.6T8CSC-A.L1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: TOMÉ GOMES
Descritores: OBRIGAÇÃO DE ALIMENTOS
EX-CÔNJUGE
DIVÓRCIO POR MÚTUO CONSENTIMENTO
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
RECURSO DE APELAÇÃO
PRAZO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
PRORROGAÇÃO DO PRAZO
Data do Acordão: 06/19/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS.
DIREITO CIVIL – LEIS, INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO – DIREITO DA FAMÍLIA / ALIMENTOS / DISPOSIÇÕES ESPECIAIS / DIVÓRCIO E SEPARAÇÃO JUDICIAL DE PESSOAS E BENS / MONTANTE DOS ALIMENTOS.
Doutrina:
- Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Parte Geral e Processo de Declaração, artigos 1.º a 702.º, Almedina, 2018, p. 766.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 638.º, N.º 7 E 640.º.
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 12.º, N.º 2, 2016.º, N.º 2 E 2016.º-A, N.º 3.
ALTERA O REGIME JURÍDICO DO DIVÓRCIO, APROVADO PELA LEI N.º 61/2008, DE 31-10.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 23-10-2012, PROCESSO N.º 320/10.6 TBTMR.C1.S1;
- DE 20-02-2014, PROCESSO N.º 141/10.6TMSTB.E1.S1;
- DE 22-10-2015, PROCESSO N.º 2394/11. 3TBVCT.G1.S1;
- DE 03-03-2016, PROCESSO N.º 2836/13.3TBCSC.L1.S1;
- DE 28-04-2016, PROCESSO N.º 1006/12. 2TBPRD.P1.S1;
- DE 09-02-2017, PROCESSO N.º 471/10. 7TTCSC.L1.S1;
- DE 27-04-2017, PROCESSO N.º 1412/14.8 T8VNG.P1.S1, TODOS IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I. A aferição da tempestividade da apelação, atenta a prorrogação, por 10 dias, do prazo de interposição do recurso nos termos do artigo 638.º, n.º 7, do CPC, não deve ser feita em função da estrita observância dos requisitos de impugnação da decisão de facto previstos no artigo 640.º do mesmo Código, nem muito menos em face do demérito dessa impugnação, mas sim em função de uma impugnação efetivamente deduzida que convoque a reapreciação de concretos meios de prova constantes de gravação sobre determinados juízos probatórios, ainda que identificados de forma imperfeitamente expressa, que não se traduza, por exemplo, em mera impugnação genérica ou global.

II. No âmbito duma ação, instaurada em 2015, através da qual se pretende obter a cessação ou redução de uma prestação alimentar entre ex-cônjuges acordada em sede de divórcio por mútuo consentimento em 12/04/2007, é aplicável o regime resultante das alterações introduzidas pela Lei n.º 61/2008, de 31-10, na medida em que, à luz do disposto no artigo 12.º, n.º 2, do CC, tal regime verse sobre o conteúdo daquela relação jurídica pós-conjugal, para mais configurada por alterações surgidas já no domínio de vigência daquela Lei, cuja essencialidade se destaca das condições iniciais do acordo de alimentos anteriormente firmado.

III. A obrigação alimentar entre ex-cônjuges na decorrência de divórcio ou de separação judicial de pessoas e bens funda-se no chamado princípio da recíproca solidariedade pós-conjugal induzido pela anterior comunhão plena de vida e justificado pelo desequilíbrio que a rutura dessa comunhão possa provocar nas condições de vida de um dos ex-cônjuges em relação ao outro. 

 IV. O atual regime de alimentos entre ex-cônjuges, alicerçado como está nas regras de que “cada cônjuge deve prover à sua subsistência, depois do divórcio” e de que “o direito a alimentos pode ser negado, por razões manifestas de equidade”, assume natureza excecional, temporária e subsidiária.

  V. Sendo agora a obrigação alimentar em referência independente do tipo de divórcio (art.º 2016.º, n.º 2, do CC), para o que deixou de relevar a violação culposa dos deveres conjugais, e não assistindo ao cônjuge credor de alimentos o direito de exigir a manutenção do padrão de vida de que beneficiava na constância do matrimónio (art.º 2016.º-A, n.º 3, do CC), tal obrigação deve cingir-se ao que se mostre indispensável para a manutenção das condições essenciais de vida do alimentando, como são o sustento, a habitação e o vestuário.

  VI. Já desde a Reforma do Código Civil de 1977, introduzida pelo Dec.-Lei n.º 496/77, de 25-11, a obrigação de alimentos entre ex-cônjuges na decorrência de divórcio deixara de assegurar ao alimentando um padrão ou estilo de vida correspondente ao que usufruía na constância do casamento. 

Decisão Texto Integral:
Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:


I – Relatório

1. AA (A.) instaurou, em 01/09/2015, contra BB (R.) uma ação declarativa, sob a forma de processo especial, a pedir a cessação ou, subsidiariamente, a redução para montante insignificante da pensão de alimentos no valor mensal de € 1.500,00, atualizada para € 1.607,00, que aquele se obrigou a prestar a esta no âmbito do processo de divórcio por consentimento que levou à dissolução do respetivo casamento em 12/04/2007.

    Alega, para tanto, a superveniência de vicissitudes várias com repercussão na esfera patrimonial de cada uma das partes de que resultaram, para o A., a impossibilidade de prestar aquela pensão e, para a R., a desnecessidade da mesma, sustentando, em síntese, que:

    . Quando tal prestação foi acordada, o A. auferia um rendimento mensal de € 7.022,00, decorrente da profissão que exercia;

    . Porém, ante a iminência de despedimento coletivo em virtude da inevitável reestruturação da respetiva entidade patronal, o A. celebrou, em 30/06/2015, um acordo de cessação do seu contrato de trabalho, passando a auferir um subsídio de desemprego mensal de € 1.048,20 com a duração de 3 anos e que seria reduzido para € 943.38 a partir de janeiro de 2016;

      . Assim, o A., auferindo agora um rendimento mensal de € 1.260,70, incluindo o sobredito subsídio de desemprego e o rendimento mensal que obtém pela renda duma moradia, mas suportando despesas mensais no total de € 2.823,95, não dispõe sequer dos meios suficientes para fazer face às necessidades da sua sobrevivência e aos problemas de saúde que, entretanto, lhe sobrevieram;

    . Por outro lado, a R., com formação universitária na área da …, para além de nunca ter tentado retomar a sua atividade profissional, dissipou ainda dois imóveis que tinha em seu nome no …, abdicando da renda mensal de € 600,00 que recebia pelo arrendamento de um deles, e comprou o imóvel onde vive em …, desde 2010, no valor aproximado de € 300.000,00.

  2. Frustrada a tentativa de conciliação, a R. apresentou contestação, em que impugna a situação de insuficiência económica superveniente alegada pelo A., contrapondo-lhe a sua situação de carência da pensão em causa e concluindo pela improcedência da ação.

  3. Realizada a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 418 a 441/v.º, de 13/02/2018, a julgar a ação totalmente procedente, decretando-se a imediata cessação da obrigação alimentar devida pelo A., em especial, a cessação do pagamento da pensão de alimentos acordada entre as partes em março de 2007.             

   4. Inconformada, a R. recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, em sede de impugnação de facto e de direito, tendo sido proferido o acórdão de fls. 489 a 505/v.º, de 10/01/2019, a julgar parcialmente procedente a apelação, reduzindo a pensão mensal em causa para o valor de € 845,00, com efeitos a partir da propositura da presente ação, sujeita a atualização anual em função do índice de inflaçâo verificado no ano anterior.

         Tal acórdão foi aprovado com um voto de vencido, no sentido do não provimento do recurso e da consequente confirmação da sentença recorrida, por considerar que o mesmo deveria ser rejeitado quanto à impugnação da decisão de facto, dada a inobservância do ónus impugnativo exigido pelo artigo 640.º do CPC, e que se mantinha assim inalterada a factualidade provada de que a Recorrente fazia depender a solução de direito, para além de que tal factualidade ser de molde a implicar a cessação da obrigação alimentar impendente sobre o A..   

   5. Desta feita, vem agora o A. pedir revista para o que formulou as seguintes conclusões:

1.ª – O presente recurso versa sobre matéria de direito - erro de julgamento;

2.ª - O Recorrente não se conforma com o vertido no acórdão recorrido, em que se decidiu condenar o mesmo no pagamento vitalício de uma pensão de alimentos no valor mensal de € 845,00, com efeitos a partir da data de propositura da ação e com atualização anual em função do índice de inflação verificada no ano anterior;

3.ª - O recurso deduzido pela R. em 1ª instância foi manifestamente extemporâneo, não tendo esta cumprido, em momento algum nas suas alegações de recurso, nem sequer minimamente com o ónus que lhe é imposto pelo artigo 640.º, n.º 1, do CPC;

4.ª - A R., nesse recurso, também não cumpriu com os ónus de impugnação e de conclusão estatuídos no artigo 639.º, n.º 1, do CPC;

5.ª - Assim, o requerimento de interposição de recurso deveria ter sido indeferido, rejeitando-se o recurso quanto à impugnação da matéria de facto e de direito, mantendo-se a sentença proferida em 1.ª instância e confirmando-se a decisão que declarou a cessação da obrigação de pagamento de alimentos por parte do ora Recorrente;

6.ª - O Tribunal “a quo”, face às conclusões apresentadas pela R. em sede de recurso da 1.ª instância (pontos E3, F3, G3 e H3), considera que “estas conclusões não visam a alteração de qualquer ponto da decisão de facto, através da reapreciação de meios de prova. O que a Recorrente questiona é a valoração, que foi feita na decisão recorrida, dos factos julgados provados, em especial dos que respeitam à capacidade de o Recorrido continuar a prestar-lhe alimentos. Ou seja, não está em causa qualquer alteração adicional da matéria de facto relevante para a decisão, mas a fundamentação conclusiva da decisão”;

7.ª - Contudo, das conclusões E3, F3 e G3 referenciadas pelo Tribunal “ a quo” resulta claramente o contrário:

a) - Conclusão E3: “E3. Ora a matéria de facto dada como provada na decisão em recurso, com o devido respeito, merece censura, devendo ser alterada, revogando-se “in totum”, posto que o tribunal “a quo” faz uma errada interpretação dos factos (…)”

b) - Conclusão F3: “F3. Pelo que se requer que seja efetuada a reapreciação da matéria de facto (…)”;

c) - Conclusão G3: “G3. De acordo com o disposto no art.º 685.º-B, n.º da lei adjetiva, quando se impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, além dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, quais os concretos meios probatórios, constantes no processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham uma decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.”

8.ª - Mal andou o Tribunal “a quo” ao concluir que a R. pretendia a reapreciação da fundamentação da decisão do Tribunal de 1.ª instância;

9.ª – E também ao considerar que as circunstâncias, em especial a situação económico-financeira do A., se alteraram;

10.ª - O A. não dispõe de capacidade económica para suportar, vitaliciamente, o pagamento da quantia de € 845,00 à R. a título de pensão de alimentos;

11.ª - Dos factos assentes nos autos resulta claro que as escolhas realizadas pela R. ao longo dos anos o foram em seu estrito benefício financeiro, sem qualquer planeamento ou preocupação com o futuro:

i) - Ao longo de mais de 10 anos realizou uma poupança significativa face aos seus rendimentos e despesas efetivamente tidas;

ii) - A R. adquiriu uma casa em valor superior ao que podia, só por si, suportar,

iii) - A R. alienou património imobiliário que lhe dava um rendimento fixo e estável;

iv) - A R. recebeu e não investiu € 45.000,00 que recebeu na sequência da alienação do seu património imobiliário;

v) - A R. recusou até propostas de trabalho;

12.ª - Mal andou o Tribunal “a quo” ao não valorar devidamente estes factos;

13.ª - O Tribunal “a quo” retira ainda conclusões infundadas e ao arrepio da prova produzida nos autos, quer quanto à capacidade de o A. poder pagar as suas despesas, tal como elas se encontram, bem como uma pensão de alimentos de € 845,00 durante 113 meses, quer quanto a uma pensão de invalidez que o A. não aufere, nem sabe quando e se vai auferir, bem como quanto a um suposto complemento de reforma cujos elementos não constam dos autos e que o Tribunal “a quo” até reconhece “não terem sido melhor esclarecido”;

14.ª - As conclusões retiradas pelo Tribunal “a quo” colidem com a prova produzida e assente nos autos;

15.ª - O A. não dispõe de meios para manter o pagamento vitalício de uma pensão de alimentos de € 845,00 à R.;

16.ª - A declaração de voto é integralmente subscrita pelo A., porque da mesma resulta a correta e adequada aplicação do direito aos factos dados como provados nestes autos;

     Pede o Recorrente que seja revogada a decisão recorrida e substituída por outra que declare a cessação do pagamento da pensão alimentar em causa, desde a data da propositura da ação.

     6. A Recorrida apresentou contra-alegações a sustentar a confirmação do julgado, juntando ainda o documento de fls. 552-557, tendente a provar que o A. obteve o capital de € 233.983,27 pela venda dum imóvel mediante escritura pública outorgada em 27/11/2018.

         Cumpre apreciar e decidir.

          

II – Delimitação do objeto do recurso

Atentas as conclusões do Recorrente, em função das quais se delimita o objeto do recurso, as questões assim suscitadas são as seguintes: 

i) – Saber se o recurso de apelação padece de extemporaneidade, por não lhe aproveitar o prazo complementar de 10 dias, dada a inobservância do ónus impugnativo quanto à decisão de facto, por parte da R./apelante; 

ii) – Saber se, não obstante isso, tendo-se mantido inalterada a decisão de facto, será de manter também a decisão de direito da 1.ª instância pelo facto de a impugnação desta, então deduzida pela Apelante, estar exclusivamente dependente da procedência da impugnação daquela decisão de facto;  

iii) – Subsidiariamente, saber se a decisão ora recorrida incorreu em erro de direito na qualificação dos fatos dados como provados, no respeitante à alteração superveniente das condições económicas do A. e da R. para efeitos da pretendida cessação ou redução da pensão alimentar em causa.

Como foi referido, a R./Recorrida veio juntar com as respetivas contra-alegações o documento de fls. 552-557, sob a pretensão de que fosse tido em conta, na presente revista, que o A. obteve, entretanto, o capital de € 233.983,27 pela venda de uma moradia sita na … – lote 23, na Rua …, n.º … da freguesia e município de …, descrita sob o n.º 8…7 da respetiva Conservatória do Registo Predial, mediante a escritura pública ali reproduzida, outorgada em 27/11/2018.

Trata-se da moradia a que se refere o ponto 5 dos factos provados construída pelo A. e outro comproprietário no terreno descrito na verba n.º 3 do contrato de partilha de fls. 37-41, cujo arrendamento proporcionava ao o A. 2/5 da renda mensal.

Sucede que o facto que a R. pretende comprovar através do documento ora junto ocorreu em 27/11/2018, sendo, portanto, posterior ao encerramento da discussão em 1.ª instância, que teve lugar em 16/01/2018 (ata de fls. 414-417), não podendo, por isso, tal facto ser atendido em face do preceituado nos artigos 588.º, n.º 3, alínea c), e 611.º, n.º 1, do CPC. 

Assim sendo, não obstante o disposto nos artigos 425.º e 680.º, n.º 1, do mesmo Código, está vedado a este tribunal de revista atender àquele facto, estando como está vinculado aos factos materiais fixados pelas instâncias, nos termos do artigo 682.º, n.º 1 e 2, do referido diploma, em especial, à situação de facto existente no momento do encerramento da discussão em 1.ª instância (art.º 611.º, n.º 1, do CPC).  

Nessa conformidade, na apreciação do objeto da presente revista, não será atendido o referido facto, pelo que o documento ora junto pela Recorrida mostra-se irrelevante.

III – Fundamentação  

1. Factualidade dada por provada pelas instâncias

Vem dada como provda pelas instâncias a seguinte factualidade:

1.1. Em sede de ação de divórcio por mútuo consentimento, ocorrido na respetiva Conservatória do Registo Civil, em 12-04-2007, autor (A.) e ré (R.) outorgaram o acordo sobre pensão de alimentos conforme cópia de fls. 35 e ss. cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

1.2. Mais outorgaram o contrato-promessa de partilha junto a fls. 37 e ss. cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

1.3. Em abril de 2007, data em que os acordos referidos em 1.1 e 1.2 foram outorgados, o A. auferia, na sua entidade patronal CC, S.A., para quem trabalhava desde 09-11-1992, o salário de € 7.022,00, sendo € 5.617,60 o vencimento base, € 1.404,40 de isenção de horário, € 401,20 de subsídio de imobilização de obra e € 260,00 de ajudas de custo, sobre o qual eram descontados IRS, Taxa Social Única e ainda seguro de saúde e plano de pensão, no valor total de € 3.380,80, ficando o A. com o vencimento líquido de € 4.302,40. - recibo de vencimento de fls. 42 (doc. 2 da p.i.) e doc. de fls. 284 junto com o requerimento com a refª 21…9;

1.4. Em dezembro de 2007, o A. contraiu empréstimo bancário junto da DD para aquisição de habitação permanente (um T2) no valor de € 200.000,00, pelo período de 20 anos, com fim previsto em dezembro de 2027, sendo o valor da prestação mensal, em agosto de 2015, de € 895,64. - doc. de fls. 48 (doc. 4 da p.i.)

1.5. Em agosto de 2008, o A., juntamente com o outro comproprietário, contraiu empréstimo bancário junto da DD para construção de moradia no lote de terreno descrito como verba 3 do contrato-promessa de partilha, junto a fls. 37 e ss, no valor de € 250.000,00, pelo período de 15 anos, com fim previsto em agosto de 2023, sendo o valor da prestação mensal, em agosto de 2015, de € 1.655,74, cabendo ao A. assegurar 40% desse valor, ou seja, € 662,30 - doc. de fls. 52 (doc. 5 da p.i.) e declarações do A..

1.6. A moradia a que se refere em 1.5, entretanto construída, foi dada de arrendamento em 01-07-2013 a EE - Residência para Séniores, Lda, pelo período de 5 anos, renovável por períodos de um ano, mediante o pagamento da renda mensal de € 1.700,00, cabendo ao aqui A. 2/5 desse valor e ao outro comproprietário 3/5 - doc. de fls. 59 (doc. 6 da p.i.) e declarações do A.;

1.7. Em 12-03-2012, o A. sofreu uma hemorragia intraventricular, por rotura de aneurisma, tendo sido submetido a tratamento endovascular em 14-03-2012 - doc.s de fls. 76 e ss (doc. 9 da p.i.);

1.8. Na sequência de tal episódio, o A. esteve de baixa até 22-04-2012, tendo estado em acompanhamento médico desde então - docs de fls. 76 e ss (doc. 9 da p.i.) e declarações do A.;

1.9. Apesar de o A. não ter deixado de trabalhar por causa do AVC sofrido, a sua prestação laboral decaiu, bem como as suas capacidades, tendo a sua entidade patronal notado que houve uma degradação visível no desempenho laboral do A., e que este já não era a mesma pessoa, autónoma e com capacidades de liderança, mas passou a ser um trabalhador inseguro, necessitando o A. de pedir ajuda para desempenhar as suas funções – depoimento da testemunha FF;

1.10. O AVC sofrido pelo A., embora não lhe determinando logo uma incapacidade para o trabalho, afetou de forma percetível e grave a suas capacidades laborais, tendo o A., que era um quadro médio superior com funções de direção na área técnico-comercial, deixado de poder cumprir funções sozinho, como acontecia antes do AVC, passando a pedir ajuda à sua chefia para desempenhar tarefas que outrora conseguia fazer sozinho - depoimento da testemunha FF;

1.11. Em 2012, a entidade patronal do A., CC, S.A., começou a sofrer decréscimo no seu volume de negócios, com uma redução substancial da carteira de negócios em Portugal, o que determinou a necessidade premente de proceder a uma reestruturação, sendo que até 2012 a empresa faturava em Portugal cerca de 100 milhões de euros, tendo baixado, em 2012/2013 para 20 a 30 milhões de euros e, em 2015, passou a faturar cerca de 7 milhões de euros - depoimento da testemunha FF;

1.12. Por ser política da CC, S.A., manter os seus trabalhadores na empresa apesar das dificuldades económicas, foi proposto a alguns trabalhadores em Portugal que passassem para os escritórios em África ou nos Emirados Árabes, onde a empresa ainda tinha mercado, alternativa que, para o Requerente, não era clinicamente viável por o A., ao tempo, não poder sequer viajar de avião e por não haver garantia de receber o necessário acompanhamento médico - depoimento da testemunha FF;

1.13. Sendo que o A. teria de ser sujeito, pelo menos, a mais uma intervenção clínica;

1.14. Assim, na falta de alternativa viável, o A., que integrava mais de 100 outros trabalhadores nas mesmas condições, viu-se abrangido por um processo de reestruturação por parte da sua entidade patronal – depoimento da testemunha FF;

1.15. Pelo que, em 16-06-2015, o A. celebrou com a sua entidade patronal um acordo de cessação de contrato de trabalho pelo qual recebeu uma indemnização global no valor líquido de € 280.579,65 - doc. de fls. 69 (doc. 7 da p.i.), doc. de fls. 284 junto com o requerimento com a refª 21…9 e doc. de fls. 310 enviado diretamente pela CC e ainda depoimento da testemunha FF e declarações do A.;

1.16. Se o A. não tivesse aceite celebrar acordo de cessação do seu contrato de trabalho com a sua entidade patronal, o mesmo teria sido alvo de um despedimento coletivo que lhe traria condições menos favoráveis - depoimento da testemunha FF;

1.17. O acordo a que se refere em 1.15 foi igual para todos os trabalhadores que viram cessar os seus contratos de trabalho, tendo as respetivas indemnizações sido calculadas com base nos termos legais laborais aplicáveis ao tempo - depoimento da testemunha FF;

1.18. Desde o AVC sofrido em março de 2012 que o A. tem tido períodos de baixa clínica, tendo sido emitidos os seguintes Certificados de Incapacidade Temporária para o Trabalho: em 10-02-2016 que prevê uma incapacidade de 12 dias com início em 10-02-2016 e termo em 21-02-2016; em 24-02-2016 que prevê uma incapacidade de 90 dias com início em 22-02-2016 e termo em 21-05-2016; em 24-05-2016 que prevê uma incapacidade de 90 dias com início em 22-05-2016 e termo em 19-08-2016; em 24-08-2016 que prevê uma incapacidade de 90 dias com início em 20-08-2016 e termo em 17-11-2016; em 23-11-2016 que prevê uma incapacidade de 90 dias com início em 18-11-2016 e termo em 15-02-2017; em 15-02-2017 que prevê uma incapacidade de 90 dias com início em 16-02-2017 e termo em 16-05-2017; em 15-05-2017 que prevê um período de incapacidade de 90 dias, de 17-05-2017 a 14-08-2017 – docs. de fls. 361 e ss e doc.s 6 a 12 do requerimento com a ref.ª 25…1);

1.19. A situação clínica do A. ainda hoje não se encontra estável sendo que “o sangramento provocou umas sequelas clínicas que ainda persistem (embora melhoradas) com desequilíbrio e descoordenação motora fina. Também resulta significativo o síndroma depressivo decorrente da situação clínica descrita” - doc. de fls. 356 (doc. 5 do requerimento com a ref.ª 25…1);

1.20. O A. terá ainda que ser submetido, pelo menos, a mais uma intervenção sendo que, em maio de 2017, tal intervenção ainda não se mostrava viável, “atendendo as alterações anímicas descritas, com fases de ansiedade e labilidade emocional (prevendo-se) que o tratamento seja realizado quando estiverem reunidas as melhores condições psicológicas do doente” - doc. de fls. 356 (doc. 5 do requerimento com a refª 25…1);

1.21. Em 13-11-2017, foi emitido novo Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho, em relação ao A., estando previsto um período de baixa de 180 dias com início em 13-11-2017 e termo em 11-05-2018 - doc. de fls. 397 (junto com o requerimento com a refª 27…5);

1.22. Em 05-01-2018, foi elaborado relatório médico que atribui ao A. uma “Incapacidade Permanente Parcial” de 71,38% sendo 0.60 devido ao AVC, 0.15 resultante de problemas respiratórios e 0.20 por depressão - doc. de fls. 404 vº (doc. junto com o requerimento com a refª 27…2);

1.23. Na sequência da cessação da relação laboral entre o A. e a CC, por decisão de 02-07-2015, a Segurança Social atribuiu ao A. um subsídio de desemprego no montante diário de € 34,94 por um período de 1140 dias, com início em 01-07-2015, e com redução em 10% a partir do 181º dia - doc. de fls. 73 (doc. 8 da p.i.);

1.24. Em 2007, o A. pagou de alimentos à R. um total de € 12.950,00 - doc. de fls. 89 (doc. 10 da p.i.);

1.25. Em 2008, a título de pensão de alimentos, o A. pagou os seguintes valores mensais à R.: de janeiro a abril, € 1.500,00; de maio a dezembro, € 1.536,00 mensais - doc. de fls. 88 (doc. 10 da p.i.);

1.26. Em 2009, a título de pensão de alimentos, o A. pagou os seguintes valores mensais à R.: de janeiro a março, € 1.536,00; de abril a dezembro € 1.566,00 - doc. de fls. 87 (doc. 10 da p.i.);

1.27. Em 2010, a título de pensão de alimentos, o A. pagou o seguinte valor mensal à R.: de janeiro a dezembro € 1.566,00 - doc. de fls. 86 (doc. 10 da p.i.);

1.28. Em 2011, a título de pensão de alimentos, o A. pagou os seguintes valores à R.: de janeiro a abril, € 1.566,00; de maio a dezembro, € 1.576,00 - doc. de fls. 85 (doc. 10 da p.i.);

1.29. Em 2012, a título de pensão de alimentos, o A. pagou os seguintes valores à R.: de Janeiro a abril, € 1.576,00; de maio a dezembro, € 1.607,00 - doc. de fls. 84 (doc. 10 da p.i.);

1.30. Em 2013, a título de pensão de alimentos, o A. pagou o seguinte valor à R.: de janeiro a dezembro, € 1.607,00 - doc. de fls. 83 (doc. 10 da p.i.);

1.31. Em 2014, a título de pensão de alimentos, o A. pagou o seguinte valor à R.: de janeiro a dezembro, € 1.607,00 - doc. de fls. 82 (doc. 10 da p.i.);

1.32. O A. ainda pagou a pensão de alimentos devida à R. no ano de 2015 até agosto, inclusive - declaração da R. no âmbito da execução que fazem os autos principais;

1.33. A presente ação deu entrada em juízo em 31-08-2015 - fls. 25 da p.i.;

1.34. Por carta datada de 24-08-2015 foi comunicado formalmente à R. que o A. iria cessar o pagamento da pensão de alimentos em virtude de cessação do contrato laboral em junho - doc. de fls. 121/122 (doc. 16 da p.i.);

1.35. Em 11-11-2015, foi realizada a conferência a que alude o art.º 936.º, n.º 3, do CPC, tendo a R. sido citada para essa conferência antes de 28-10-2015 - ata de fls. 134 e A/R de fls. 132;

1.36. Em 10-11-2015, ou seja, na véspera da diligência agendada nos presentes autos, com vista a harmonizar a posição das partes no âmbito da conferência referida em 1.35, a R. interpôs em juízo a ação executiva que viria a ser os autos principais deste complexo processual.

1.37. O imóvel descrito na verba n.º 4 do Contrato-Promessa de Partilha, junto a fls. 37 e ss. foi vendido em 2009, tendo o respetivo produto sido repartido equitativamente entre as partes, cabendo a cada uma o valor de € 155.000,00 – acordo;

1.38. Para além dos dois empréstimos bancários a cargo do A., este ainda tem as seguintes despesas mensais: eletricidade, € 114,00; água, € 28,00; gás, € 20,23; telecomunicações, € 51,00; com empregada doméstica, € 254,00, mais os descontos para a Segurança Social; com condomínio: € 39,00 - doc.s de fls. 93 e ss (doc.s 11 a 13 da p.i.);

1.39. O A. ainda tem as seguintes despesas anuais: - IMI, € 120,38; IUC, € 74,02; Seguro Automóvel, € 325,09; Seguro Habitação, € 147,72 – docs. de fls. 114 e ss (doc.s 13 a 15 da p.i.);

1.40. O A. ainda tem despesas com a sua alimentação e higiene em valor que não se conseguiu apurar mas que o próprio cifra em € 300,00 mensais.

1.41. O A. nasceu em 21 de janeiro de 1957 e é … - assento de nascimento de fls. 392 e ss (doc. junto com o requerimento com a refª 27502343) e declarações do A.;

1.42. A. e R. casaram um com o outro em 08 de março de 1980, tendo o seu casamento sido dissolvido por divórcio em 12 de abril de 2007 - assento de nascimento de fls. 392 e ss (doc. junto com o requerimento com a refª 27502343);

1.43. Ao tempo que o acordo de alimentos, junto a fls. 35 e ss, foi celebrado a R., para além do património imobiliário que lhe ficou adstrito, recebia uma pensão do … no valor de € 600,00 mensais e ainda uma renda proveniente de um imóvel sito no …, o qual se encontra descrito como verba nº 1 do “Contrato-Promessa de Partilha” junto a fls. 37 e ss, no valor de 550 reais que, deduzidos os descontos legais, se cifrava em 385 reais - acordo (art.º 4.º da p.i. e art.º 18.º da contestação e ainda doc. de fls. 167 e ss (doc. 2 da contestação) e contrato-promessa de partilha junto a fls. 37 e ss que refere que a renda é de € 600,00 mensais;

1.44. Em 08 de maio de 2008, a R. vendeu o imóvel descrito como verba n.º 1 do “Contrato-Promessa de Partilha”, junto a fls. 37 e ss, e relativamente ao qual recebia a renda referida em 1.43 pelo preço de 130.000,00 reais - doc. de fls. 172 e ss (doc. 3 da contestação);

1.45. Em maio 15 de 2008, a R., juntamente com os restantes comproprietários, vendeu o imóvel identificado na verba n.º 2 do “Contrato-Promessa de Partilha” tendo recebido um total de 88.695,00 reais - doc. de fls. 177 e ss (doc. 4 da contestação);

1.46. Em 2008, um euro valia 2,436 reais segundo o Banco Central Europeu – cotação-euro.pt (arquivo de cotações de moedas em 2008);

1.47. Com a venda dos dois imóveis sitos no …, a R. recebeu em maio de 2008 o equivalente a cerca de € 89.000,00 e posteriormente, em 2009, com a venda da casa de morada da família sita em …, identificada com verba n.º 4 do “Contrato-Promessa de Partilha”, recebeu € 155.000,00 (metade do valor da venda), totalizando o valor por si recebido com a venda dos três imóveis cerca de € 244.000,00;

1.48. Após a venda dos referidos imóveis, a R. comprou o imóvel onde atualmente habita pelo valor por si declarado de € 240.000,00, sendo que a sua habitação tem um valor patrimonial de € 216.720,28 – declarações da R. e doc. de fls. 244 (doc. 25 da contestação);

1.49. Apesar de não necessitar de recorrer ao crédito bancário para comprar a sua habitação, a Requerida preferiu fazer um empréstimo bancário no valor de € 45.000,00, pelo qual paga de mensalidade cerca de € 319,00, porque queria ter “liquidez” e não “empatar” o dinheiro todo na compra da casa - declarações da R. e doc. de fls. 239 (doc. 23 da contestação);

1.50. Apesar de a R. viver sozinha, a habitação dela tem três quartos - declarações da R..

1.51. A R. sofre de “artrite reumatóide”, o que lhe foi diagnosticado em 1987 - doc. de fls. 215 (doc. 13 da contestação);

1.52. Tal doença “evolui de forma grave e destrutiva pelo que a (R.) tem grave compromisso das articulações metacarpofalângicas e interfalângicas proximais de ambas as mãos” e “tem dor e incapacidade funcional osteoarticular de múltiplas articulações, em particular das mãos, com grandes deformações articulares e desvio cubital dos dedos que a incapacitam para a vida diária” - doc. de fls. 215 (doc. 13 da contestação) e doc. de fls. 401 junto com o requerimento com a refª 27…2;

1.53. Devido à sua doença, a R. tem necessidade de ingerir medicamentos de forma regular tendo gasto, em média, no ano de 2014, um valor mensal de € 27,65 - doc. de fls. 210 e ss (doc. 12 da contestação) -,  tendo-se contabilizado apenas os valores com IVA a 6% por só esses serem considerados medicamentos sendo certo que das faturas de farmácia apresentadas há alguns produtos de higiene que nada têm a ver com doença da R.;

1.54. A R. tem uma “Incapacidade Permanente Global” de 68% - doc. de fls. 221 (doc. 14 da contestação);

1.55. A R. é seguida na consulta de reumatologia no Hospital de … desde 2005, tendo sofrido já várias intervenções cirúrgicas através das quais lhe foram colocadas próteses totais nos joelhos, no tornozelo esquerdo e no ombro esquerdo sendo que, à data da última consulta, ocorrida em 21-09-2017, “apresentava atividade moderada da doença” - doc. de fls. 400 junto com o requerimento com a refª 27…2;

1.56. A R. tinha cerca de 30 anos quando lhe foi diagnosticada a sua doença, ainda vivia ela no … com o A. e o filho comum de ambos - declarações da R. e do A.;

1.57. A R. tem formação universitária sendo terapeuta da fala, no entanto, desde que foi diagnosticada a sua doença, em 1987, que a R. nunca mais trabalhou de forma regular, tendo sido o A. quem, durante o casamento, garantia o sustento da mesma e do respetivo agregado familiar, pagando as respetivas despesas incluindo a empregada doméstica de que o casal beneficiava - declarações da R. e do A.;

1.58. Devido à sua doença, a R. tem necessidade de ter uma empregada doméstica pela qual despende, neste momento, cerca de € 200,00 mensais - declarações da R.;

1.59. Para além do empréstimo bancário, a R. tem ainda as seguintes despesas mensais: com eletricidade, € 60,96; com gás, € 174,25; com água, € 38,62; com telecomunicações, € 59,30; com empresa de segurança, € 36,06; com seguro de vida associada ao crédito habitação, € 26,06 – doc. de fls. 226 e ss (doc. 16 a 20 e 24 da contestação);

1.60. A R. ainda tem as seguintes despesas anuais: IMI, € 845,21; Seguro Habitação, € 228,79 – doc. de fls. 114 e ss (doc.s 13 a 15 da p.i.);

1.61. A R. ainda tem despesas com a sua alimentação, vestuário e higiene em valor que não se conseguiu apurar mas que o próprio cifra em € 300,00 mensais.

1.62. Em 2015 a pensão de reforma que a R. recebia do … cifrava-se em 1.899,00 reais o que, à respetiva taxa de câmbio na altura, traduz um valor equivalente a € 604,20 - doc. de fls. 185 (doc. 5 da contestação) - e considerando que em 2015 um euro valia 3,143 reais conforme Banco Central Europeu (cotacao-euro.pt - arquivo de cotações de moedas em 2008);

1.63. Ao câmbio atual a pensão referida em 1.62 corresponde a € 469,88; atualmente um euro vale 4.0415 reais;

1.64. Apesar da sua incapacidade, a R. tem efetuado trabalhos esporádicos tendo auferido os valores documentados nas declarações de IRS juntas a fls. 192 e ss e 199 e ss cujo teor se dá por integralmente reproduzido - doc. juntos com os requerimentos com as refªs 21…5 e 21…9;

1.65. A. e R. têm um filho em comum, já maior de idade, o qual reside no estrangeiro - declarações das partes;

1.66. A R. tem familiares no … - declarações da R.;

1.67. Foi efetuada, pelo menos, uma proposta de trabalho à R. que a mesma rejeitou - depoimento das testemunhas GG e HH;

1.68. Após o divórcio, a R. participou em cursos com vista a valorizá-la profissionalmente - depoimento das testemunhas HH e II;

1.69. No âmbito da ação executiva instaurada pela R. contra o A., a qual traduz os autos principais deste complexo processual, foram já penhorados parte do subsídio de desemprego do A., a renda que o mesmo recebe na proporção de 40% referida em 1.6 e ainda o imóvel que é a habitação do A., sita na Rua …, n.º …, R/C Esquerdo - respetiva ação de execução;

1.70. Na sequência da penhora do imóvel do A. na ação executiva, o banco credor do respetivo empréstimo, munido de garantia real de hipoteca, já veio reclamar o seu crédito - respetivo apenso de reclamação de créditos.

2. Factos não provados

Foi dado como não provado que:

2.1. O A. tenha valores ou rendimentos que não estão declarados;

2.2. A pensão de alimentos, quando foi fixada em 2007, assentasse exclusivamente em necessidades básicas e prementes da R. ou que tivesse sido fixada para garantir o seu sustento;

2.3. A R. esteja de todo impossibilitada de trabalhar.

 

 3. Do mérito do recurso

3.1. Quanto à questão da alegada extemporaneidade do recurso de apelação

       

O A./Recorrente começou por sustentar que o recurso de apelação interposto pela R. deveria ter sido rejeitado, considerando não lhe ser aplicável o prazo complementar de 10 dias, dado a apelante não ter observado o ónus de impugnação da decisão de facto, o que determinou que esta decisão tivesse sido mantida pela Relação.

De resto, tal questão fora já suscitada pelo A. nas suas contra-alegações em sede de apelação, tendo sido apreciada e decidida no acórdão recorrido nos seguintes termos:   

«(…) o Apelado defende que ao presente recurso não é aplicável o alargamento do prazo de recurso previsto no art. 638.º, n.º 7 do CPC, uma vez que não se mostra adequadamente cumprido o ónus de especificação previsto no art. 640.º do mesmo Código.

Pelo que o recurso não poderia ter por objeto a reapreciação de prova gravada.

Faltando, assim, o pressuposto do alargamento do prazo de recurso.

Muito brevemente, não se reconhece razão ao Apelado nesta questão.

O pressuposto do alargamento do prazo de recurso é o facto de no seu âmbito vir suscitada a apreciação de prova gravada.

E esse pressuposto está verificado.

Saber se foi, melhor ou pior, cumprido o ónus de alegação/especificação estabelecido no art.º 640.º do CPC, apenas releva para saber se a impugnação da decisão de facto deve ser, ou não, rejeitada.

Não contendendo com a contagem do prazo de recurso.

Só assim não seria, se fosse possível concluir que a dedução de impugnação da decisão de facto teve exclusivamente em vista o alargamento do prazo de recurso.

Não sendo essa conclusão possível no presente caso.

Sendo, pois, o recurso tempestivo.»

Todavia, foi ali consignado um voto de vencido no sentido da rejeição do recurso com a seguinte consideração:

   «(…) uma vez que a recorrente nem nas conclusões das alegações de recurso nem no corpo destas fundamenta as razões da sua discordância quanto aos factos impugnados, não concretizando nem apreciando criticamente os meios probatórios que genericamente indica e que, no seu entender, implicam uma decisão diversa, não estando cumprido tal ónus estabelecido no artº 640º, do CPC.»

Vejamos.

Preceitua o artigo 638.º, n.º 7, do CPC que:

Se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada, ao prazo de interposição e resposta acrescem 10 dias.  

Significa isto que o apelante só beneficia daquele acréscimo do prazo de interposição do recurso quando tenha impugnado a decisão de facto, convocando a reapreciação da prova gravada correspetiva.

A propósito do alcance do normativo transcrito, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa[1] escrevem o seguinte:

«6. (…)

Para o efeito, é necessário que a alegação apresentada pelo recorrente contenha alguma impugnação da decisão proferida acerca da matéria de facto a partir da reponderação de meios de prova que, tendo sido prestados oralmente, tenham ficado registados, independentemente do juízo que ulteriormente seja feito acerca do cumprimento do ónus de indicação das passagens da gravação ou de qualquer outro requisito previsto no art.º 640.º.

7. A apreciação do modo como foram preenchidos os ónus de alegação contidos neste preceito poderão naturalmente condicionar o conhecimento de tal impugnação, mas não colocam em crise a tempestividade do recurso de apelação que, naquelas condições, tenha sido apresentado dentro do prazo alargado (…)»

     A mesma linha de entendimento tem sido seguida pela jurisprudência deste Supremo Tribunal como se extrai dos seguintes arestos:

- Acórdão, de 22-10-2015, proferido no processo n.º 2394/11. 3TBVCT.G1.S1[2], em que se concluiu que:

«Contendo a alegação apresentada pelo recorrente uma impugnação séria, delimitada e minimamente consistente da decisão proferida acerca da matéria de facto, deve ter-se por processualmente adquirido, em ter-mos definitivos, que se verificou a prorrogação do prazo para recorrer por 10 dias, independentemente do preciso juízo que ulteriormente se faça acerca do cumprimento do ónus de exacta indicação das passagens da gravação – que naturalmente poderá condicionar o conhecimento de tal impugnação, sem, todavia, pôr em causa a tempestividade do recurso de apelação.»

- Acórdão, de 28-04-2016, proferido no processo n.º 1006/12. 2TBPRD.P1.S1[3], onde se pondera o seguinte:

«A extensão do prazo de 10 dias previsto no art. 638.º, n.º 7, do CPC, para apresentação do recurso de apelação quando tenha por objecto a reapreciação de prova gravada depende unicamente da apresentação de alegações em que a impugnação da decisão da matéria de facto seja sustentada, no todo ou em parte, em prova gravada, não ficando dependente da apreciação do modo como foi exercido o ónus de alegação.

Tendo o recorrente demonstrado a vontade de impugnar a decisão da matéria de facto com base na reapreciação de prova gravada, a verificação da tempestividade do recurso de apelação não é prejudicada ainda que houvesse motivos para rejeitar a impugnação da decisão da matéria de facto com fundamento na insatisfação de algum dos ónus previstos no art.º 640.º, n.º 1, do CPC.»

- Acórdão, de 09-02-2017, proferido no processo n.º 471/10. 7TTCSC.L1.S1[4], em que se sumaria que:

«2. A justificação para esta extensão [a do prazo de 10 dias], ou alongamento, do prazo consiste na necessidade do recorrente ter que instruir as suas alegações com as especificações dos meios de prova cuja reapreciação, na sua opinião, determinam a modificação da decisão da matéria de facto.

3. Ao impor um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, com fundamento na reapreciação da prova gravada, o legislador pretendeu evitar que o impugnante se limite a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo simplesmente a reapreciação de toda a prova produzida em primeira instância, dai que o prazo acrescido de 10 dias só seja aplicável quando o recorrente o use efetivamente para impugnar a matéria de facto.

4. Para que o recorrente/apelante possa usufruir desse acréscimo de 10 dias, a impugnação da matéria de facto efetuada deve refletir efetivamente essa reapreciação.

5. Se nas conclusões não existir, concreta ou implicitamente qualquer referência à prova gravada e nem se fizer alusão a qualquer depoimento, não beneficia o recorrente daquele acréscimo.»

         À luz destas considerações, poderemos concluir que a aferição da tempestividade da apelação, atendendo à prorrogação, por 10 dias, do prazo de interposição do recurso, nos termos do artigo 638.º, n.º 7, do CPC, não deve ser feita em função da estrita observância dos requisitos impugnativos quanto à decisão de facto, previstos no artigo 640.º do mesmo Código, nem muito menos em face do demérito dessa impugnação, mas sim em função de uma impugnação efetivamente deduzida que convoque a reapreciação de concretos meios de prova constantes de gravação sobre determinados juízos probatórios, ainda que identificados de forma imperfeitamente expressa, que não se traduza, por exemplo, em mera impugnação genérica ou global.

Assim, para tal efeito, não bastará que se conclua que a dedução de impugnação da decisão de facto teve exclusivamente em vista o alargamento do prazo de recurso, mas também não será necessário que o apelante tenha observado todos os requisitos impugnativos formais e de justificação dessa impugnação nos termos prescritos no artigo 640.º do CPC.

Será tão só suficiente que da conjugação do corpo das alegações e das respetivas conclusões resulte uma manifestação do recorrente no sentido de impugnar substancialmente determinados juízos probatórios com base em indicados meios concretos de prova constantes de gravação. 

No caso dos autos, verifica-se que a R./apelante impugnou a decisão de facto em planos diversos, tal como foi equacionado e resolvido no acórdão recorrido, nos seguintes moldes:  

   «III - A impugnação da decisão de facto.

  Contendendo com a apreciação da matéria de facto provada, a Recorrente concluiu, designadamente:

P. Recorrido e a comproprietária pretendem vender o imóvel, pelo preço em torno de € 750.000,00, dos quais € 300.000,00 caberão ao ora Recorrido.

      Q(...)

   R. Para além das contas bancárias do casal, cujos saldos se apossou, e que não dividiu com a Recorrente;

  Ora, os factos referidos nestas conclusões não foram julgados provados na decisão recorrida, nem vem invocada qualquer prova dos mesmos.

   Pelo que estas conclusões são infundadas.

  A Recorrente também formulou as seguintes conclusões, já acima transcritas:

   X. A estes valores, acresce, a pensão de reforma que o Recorrido irá auferir de 21 nos de contribuições que o Recorrido foi paralelamente fazendo no …, nos primeiros 6 anos enquanto ainda vivia no …, por conta de outrem, nos anos seguintes, por conta própria, descontando como autónomo com actividade aberta.

   Z. Esta pensão foi omitida nos autos que aqui se recorre, o Recorrido omitiu esta pensão quando estava obrigado a prestar essa informação, porque relevante, essencial para apreciação do objecto em discussão nestes autos. O Recorrido nas suas declarações, prestadas no dia 16.1.2018 (gravadas através da aplicação "Media Studio" do programa "Citius" com a duração de (00:OOs a 00:57.30s ), ao minuto 49:31, refere que teve apenas 6 anos de descontos no …, o que bem sabe não corresponder à verdade, pois 6 anos de descontos foram apenas os anos durante os quais o ora Recorrido descontou para a caixa de previdência … antes de vir viver para Portugal, por conta de outrem, continuando após tal data a efectuar descontos enquanto independente, no …, o que se prolongou por largos anos, que a Recorrente saiba durou pelo menos até 2007, posto que o Recorrido incumbia a recorrente de o fazer conforme consta do e-mail que junta sob Doc. n.° 1 o que faz ao abrigo do disposto no art.° 651.°, n.° 1 do CPC, "in fine".

   Al. O recorrido negou poder vir a receber uma pensão de reforma no …, omitindo a verdade; Minuto: 48:54 a 49:10:

   (…)

   B1. O ora Recorrido, ao agir da forma descrita no número anterior, faltou à verdade, omitiu factos relevantes, subvertendo a sua situação económica, actual e futura, e com isso, ajudou a toldar a decisão proferida pela Meritíssima "a quo", em desfavor da ora recorrente, o que é inadmissível.

   Cl. Ao agir com manifesta má-fé, de modo a, faltando esta informação relevante, prejudicar a Recorrente, o que conseguiu.

   (…)

      P3. Não é verdade o que o recorrido alega no seu depoimento de parte, ao minuto 49:48, transcrito no ponto 36. Supra, em que afirma que não terá direito a nenhuma pensão de reforma no ….

   Q3. Circunstância que o Tribunal "a quo" atendeu, avocando-a, e tendo-a como certa na fundamentação na sua Douta Sentença, a fls. 445 verso, 1.° parágrafo: "...tendo o mesmo esclarecido, nas suas declarações, que não tem direito a receber qualquer reforma no … onde trabalhou anteriormente."

   R3. Tal significa que no …, pelo menos durante 21 anos, o recorrido efectuou contribuições para o sistema de segurança social …, 6 dos quais por conta de outrem, e os restantes 15 anos individualmente.

Apesar da prova documental, nos termos do disposto no art.° 423.° do CPC deva ser  apresentada com os articulados, e excepcionalmente até 20 dias antes da realização da audiência de julgamento nos termos da já aludida norma. No entanto após a realização da Audiência de Julgamento e depois da consequente prolação de Sentença, poderá se apresentar aos autos, nova prova documental, caso não tenha sido possível obtê-la em data anterior, vide art.° 425.°, n.° 2 do CPC., ou no caso de a respectiva junção, se mostrar necessária em virtude do julgamento proferido na primeira instância. - cfr. art.° 651.°, n.° 1 do CPC, "in fine".

Ora nos presentes autos, face à fundamentação da Sentença e da própria decisão, nela baseada, de fazer cessar a pensão de alimentos até então devida à recorrente, alicerçada nas provas carreadas até então para o processo, mostra-se manifestamente necessário, ainda que nesta fase de submissão à análise do Tribunal superior, que a verdade dos factos venha ao de cima e que fique aqui comprovado que o recorrido, afinal tem vários meios de sustentos ao seu dispor, designadamente o direito a auferir uma reforma no …, acumulável com a que vier a auferir em território nacional nos termos do acordo sobre a segurança social celebrado entre Portugal e …, o que, para além de outros factos que aquele não logrou provar em sede da 1.a Instância, dos quais se aferisse que o recorrido não teria condições económicas para continuar a prestar alimentos à recorrente, na verdade, este facto ora aqui comprovado pela exibição do documento junto sob o Doc. n.° 1, vem afastar definitivamente a dúvida que eventualmente pudesse existir relativamente à falta de meios económicos, presentes e futuros, do recorrido em prover a sua subsistência e, em simultâneo ajudar a prover a subsistência económica da recorrente, mediante o pagamento mensal de uma pensão de alimentos àquela, Pela manifesta necessidade invocada, requer-se aos Exmos. Senhores Desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa, a admissão deste documento de prova, por se mostrar, relevante e superveniente a necessidade da sua apresentação nestes autos.

Nestas conclusões, a Recorrente pretendia ver julgado adicionalmente provado que o Recorrido fez descontos durante, pelo menos, 21 anos para a Segurança Social no …. Mas, nos termos já acima apreciados, o documento em causa não pode ser admitido.

Pelo que também improcede a pretensão da Recorrente nesta parte.

  

  Com relevo para a determinação da matéria de facto provada a Recorrente também concluiu:

Dl. Também omitiu o recorrido que na CC tinha um programa de pensões JJ, que lhe assegurará mais rendimento do que aquele terá declarado nos autos, o que aliás vem evidenciado nos recibos de vencimento do recorrido, designadamente o recibo referente à remuneração do mês de Abril de 2007, ali descriminada sob a rubrica 2479, documento apresentado sob o Doc. n.° 2 com a Petição Inicial, e que representava uma desconto/ contribuição de € 280,88 mensais para o plano no JJ, prova essa que não foi valorada pelo Tribunal "a quo".

Neste caso a Recorrente pretende ver julgado provado, e atendido na decisão, que o Recorrido tinha um programa de pensões JJ, para o qual contribuía com a quantia mensal de € 280,80.

   Mas este facto já consta do ponto 3 dos factos provados, do seguinte teor:

  3) Em Abril de 2007, data em que os acordos referidos em 1) e 2) foram outorgados, o Requerente auferia, na sua entidade patronal CC, S.A., para quem trabalhava desde 09-11-1992, o salário de € 7.022,00, sendo €. 5.617,60 o vencimento base, € 1.404,40 de isenção de horário, € 401,20 de subsídio de imobilização de obra e € 260,00 de ajudas de custo, sobre o qual eram descontados IRS, Taxa Social Única e ainda seguro de saúde e plano de pensão, no valor total de € 3.380,80 ficando o Requerente com o vencimento liquido de € 4.302,40. - recibo de vencimento de fls. 42 (doc. 2 da p.i.) e doc. de fls. 284 junto com o requerimento com a refa 21322789.

O montante do desconto para o plano de pensões não foi ali discriminado, estando incluído no conjunto dos descontos. Mas resulta do recibo de vencimento ali referido, que serviu de base à prova de toda essa factualidade.

   Não se justificando a alteração deste ponto da matéria de facto.

   Mais concluiu a Recorrente:

  I1. Provou-se que após o episódio do AVC o Recorrido em 22.4.2012 regressou ao trabalho, e que após o seu regresso se manteve a trabalhar enquanto arquitecto durante 3 anos consecutivos a favor da empresa Ré.

  J1. Porém, por uma razão de reestruturação da empresa, note-se, e não por qualquer apontada dificuldade de desempenho profissional note-se do Recorrido, celebrou este, à semelhança do que sucedeu com outros 275 funcionários dos 300 então ao serviço daquela empresa em 2012, passaram para 25 - facto relatado pela testemunha FF, depoimento prestado no dia 16.1.2018 (gravadas através da aplicação "Media Studio" do programa "Citius" com a duração de (00:01s a 00:32:26s ):

  Ll. Como de toda a dinâmica subjacente à restruturação da respectiva empresa e das bases subjacentes à elaboração do acordo que levou à cessação do contrato de trabalho do requerente."

Nestas conclusões, a Recorrente considera provado, com base no depoimento da testemunha que identificou, que o contrato de trabalho do Recorrido cessou por força de uma reestruturação da empresa, que envolveu uma grande redução de colaboradores, e não por dificuldade de desempenho profissional do Recorrido.

  Que, depois de AVC, voltou a desempenhar a sua atividade profissional até ao momento do acordo de rescisão do contrato. 

   Mas sobre o que se passou com o Recorrido, em termos profissionais, após o AVC, e sobre a sua atual capacidade para o desempenho da atividade de arquiteto, mostram-se assentes os factos enunciados sob os pontos 7) a 22), cujo conteúdo não é posto em causa pelas conclusões ora em apreço.

   Havendo apenas divergência quanto ao número de colaboradores da empresa CC, SA, que foram abrangidos pela reestruturação.

   Dúvida que não é relevante, uma vez que, em qualquer caso, foi muito significativo. Improcedendo a impugnação, também neste ponto.

   A Recorrente também concluiu, sublinhados nossos:

   B2. No caso, não se trata de uma solidariedade pós-conjugal, constitui uma solidariedade que adveio do casamento e da posição desta nessa qualidade. Posto que, durante a sua jovialidade e saúde física não foi possível que a recorrente tivesse um emprego fixo por muito tempo, face às alterações de País de residência que fez em acompanhamento do marido a nível profissional tendo aquela se dedicado à casa marido e filho – facto relatado pela Ré no seu depoimento de parte prestado nos autos.

  E2. A pensão de alimentos seria, na óptica da recorrente e do recorrido para a vida, dada a limitação da recorrente de se auto sustentar, a qual ainda assim tentou com muito esforço, trabalhar conforme a própria afirmou nas suas declarações, bem como, todas as suas testemunhas por si arroladas.

  J2. Não menos importante é de referir, e que não foi valorado pelo Tribunal "a quo", é o facto relatado pela recorrente e pelas testemunhas por si arroladas, designadamente que o T3 que a recorrente adquiriu tem características de comodidade tais como fáceis acessos, áreas amplas, rampa de acesso, elevador, estores eléctricos, etc, de modo a facilitar a vida da recorrente face á doença degenerativa de que padece, de modo a ermitir o menos desconforto possível e de modo a permitir que a recorrente se possa mobilizar sozinha enquanto consegue.

   L2. Mais foi referido pela recorrente e não devidamente valorado pelo Tribunal "a quo" que o referido T3 à data da compra em 2009, tinha um valor de aquisição mais baixo de que outro T2 na mesma zona.

  M2. Foi também referido que a necessidade dos 3 quartos se destinavam respectivamente um para a recorrente, outro para a empresada ou outra pessoa que a recorrente precise para dormir nos seus surtos de doença mais limitativos, e que o terceiro se destinaria a receber pacientes de terapia da fala, os quais, como ficou provado nos autos pouco aconteceu (facto provado ponto 64) da Douta Sentença), frustrando a vontade e tentativa de trabalhar da recorrente.

Nestas conclusões, nos segmentos acima sublinhados, a Recorrente considera provados os factos ali referidos, através das suas próprias declarações e de depoimentos das testemunhas que arrolou.

Mas não concretizou minimamente essa prova, nem procedeu à respetiva apreciação crítica.

O que, nos termos do art. 640.°, n.° 1, al. b, e n.° 2, al. a) do CPC, impõe a rejeição da impugnação nesta parte.

Finalmente, ainda na parte do recurso dedicada à impugnação da decisão de facto, a Recorrente formula as seguintes conclusões:

E3. Ora a matéria de facto dada como provada na decisão em recurso, com o devido respeito, merece censura, devendo ser alterada, revogando-se aquela in totum, posto que o tribunal "a quo" fez uma errada interpretação dos factos, relevando circunstâncias da vida do recorrido, o que fez dando uma má interpretação daquelas, em detrimento das circunstâncias de vida da recorrida que pioraram desde da data do divórcio consentânea com a data de fixação da pensão de alimentos a favor daquela, factos relevantes, aos quais a sentença foi indiferente, o que não se concebe.

  F3. Pelo que se requer que seja efectuada a reapreciação da matéria de facto, de modo a interpretar convenientemente os factos dados como provados, que correctamente feito, darão necessariamente a uma conclusão bem diferente da que chegou o tribunal "a quo", ou seja darão lugar a uma decisão precisamente em sentido contrário à decisão proferida naqueles autos, da qual aqui se recorre, devendo ser mantida a pensão de alimentos estipulada a favor da recorrente tal e qual como estava, e revogada a decisão da 1ª instância que determinou a cessação da pensão de alimentos.

  G3. De acordo com o disposto no art.° 685.°-B, n.° 1 da Lei adjectiva, quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, além dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, quais os concretos meios de probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham uma decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

   H3. Ora mais do que se mantendo as condições que existiam aquando da fixação do acordo da obrigação de alimentos, tendo aliás pelo já exposto, aquelas melhorado até, para além de não encontrar justificação na matéria de facto apurada a pretendida cessação, tão pouco se justifica a redução da prestação alimentícia abaixo do valor inicialmente fixado com as actualizações legais, a qual, por todas as razões, será de manter.

   Como se julga ser evidente, estas conclusões não visam a alteração de qualquer ponto da decisão de facto, através de reapreciação de meios de prova. O que a Recorrente questiona é a valoração, que foi feita na decisão recorrida, dos factos julgados provados, em especial dos que respeitam à capacidade de o Recorrido continuar a prestar-lhe alimentos. Ou seja, não está em causa qualquer alteração adicional da matéria de facto relevante para a decisão, mas a fundamentação conclusiva da decisão»

Desta transcrição, que reproduz bem o alegado pela apelante, extrai-se, em resumo, o seguinte:

i) – Quanto à matéria referida nas conclusões P) e R), os factos ali mencionados não foram julgados provados, mas também não foi indicada qualquer prova sobre os mesmos;

ii) – Relativamente ao constante das conclusões X), Z), A1), B1), C1), P3), Q3), R3), a A./Recorrente pretendia ver adicionalmente provado que o A. fez descontos durante, pelo menos, 21 anos para a Segurança Social no …, com base em documento apresentado com as próprias alegações, mas foi entendido que, nos termos anteriormente apreciados, o documento em causa não pode ser admitido.

iii) – No respeitante à conclusão D1), a Apelante pretendia ver provado documentalmente que o Recorrido tinha um programa de pensões JJ, para o qual contribuía com a quantia mensal de € 280,80, mas foi considerado que tal matéria já resultava incluída no ponto 3 dos factos provados;

iv) – Quanto às conclusões I1), J1, e L1, a Apelante pretendia que se considerasse provado, com base no depoimento da testemunha FF (fls. 446/v.º e 447), que o contrato de trabalho do A. cessou por força duma reestruturação da empresa onde trabalhava que envolveu uma grande redução de colaboradores e não por dificuldades de desempenho profissional dele e que este, depois do AVC, voltou a desempenhar a sua atividade profissional até à rescisão daquele contrato.

  Todavia, nesse particular, foi considerado pelo tribunal a quo que sobre o que se passou com o A. em termos profissionais, após o AVC, e sobre a sua atual capacidade para o desempenho da atividade de … se mostravam assentes os factos enunciados sob os pontos 7) a 22), cujo conteúdo não era posto em causa pelas conclusões em apreço, havendo apenas divergência quanto ao número de colaboradores da empresa CC, SA, que foram abrangidos pela reestruturação, mas que tal não era relevante, uma vez que, em qualquer caso, foi muito significativo.

v) – Quanto às conclusões B2), E2), J2), L2), M2), a Apelante pretendia que os factos ali referidos fossem considerados provados mediante as suas próprias declarações e os depoimentos das testemunhas por ela arroladas, mas não concretizou, minimamente essa prova nem procedeu à sua apreciação crítica, o que levou à rejeição dessa impugnação;

vi) – Por fim, quanto ao constante das conclusões E3), F3), G3) e H3), a Apelante apenas questionou a valoração que foi feita dos factos dados como provados, em particular no respeitante à capacidade de o A. continuar a prestar-lhe alimentos, mas sem pretender qualquer alteração adicional dessa matéria.

         De tudo isso, resulta que o referido supra em i), ii), iii), v) e vi) não implicava qualquer reapreciação, minimamente útil, dos concretos meios de prova gravados.

Apenas o referido em iv), respeitante às conclusões I1), J1, e L1, poderia relevar, na perspetiva da Apelante, no sentido de, para além dos factos dados como provados sob os pontos 7 a 22 da sentença, se poder concretizar, de algum modo, o alcance da reestruturação da empresa em que o A. trabalhava e, nessa conjugação, o facto de o AVC que o afetou não se traduzir em dificuldades no seu desempenho profissional.

Foi nesse sentido que a R./apelante afirmou no corpo das alegações o seguinte:

«47. Também ficou provado (…) que o Recorrido em 22.4.2012 regressou ao trabalho, e que após o seu regresso se manteve a trabalhar enquanto … durante 3 anos consecutivos a favor da empresa (…).

48. Porém, por uma razão de reestruturação da empresa, note-se, e não por qualquer apontada dificuldade de desempenho profissional note-se do Recorrido, celebrou este, à semelhança do que sucedeu com outros 275 funcionários dos 300 então ao serviço daquela empresa em 2012, passaram para 25 – facto relatado pela testemunha FF, depoimento prestado no dia 16.1.2018 (gravado através da aplicação “Media Studio” do programa “Citius” com a duração de (00:01 a 00:32:26s)

(…)

50. Ou seja 92% dos funcionários da empresa onde o recorrido trabalhava, a CC, cessaram a sua relação laboral, mediante acordo de revogação do contrato de trabalho. Facto provado – depoimento que foi bastante valorado pela Meritíssima juiz “a quo” – cfr. fls. 439 da sentença, 6.ª parágrafo, onde se pode ler: “A prova testemunhal mais relevada foi a da testemunha FF, por ter sido chefe do requerente na CC revelou conhecimentos directos e pormenorizados acerca, não só do desempenho profissional do requerente antes e depois do AVC, como de toda a dinâmica subjacente à reestruturação da respectiva empresa e das bases subjacentes à elaboração do acordo que levou à cessação do contrato de trabalho do requerente”      

        Deste trecho alegatório, refletido também nas conclusões I1), J1) e L1), depreende-se que a Apelante pretendia que ficasse concretizado na factualidade provada que o AVC sofrido pelo A. não afetou o seu desempenho profissional na empresa onde trabalhava e que não foi a causa da cessação do seu contrato de trabalho, mas tão só a referida reestruturação daquela empresa.     

        E, para tanto, convocou o depoimento da testemunha FF, justificando ainda o seu relevo pela importância que lhe foi dada, em 1.ª instância, na motivação da decisão de facto.

Ainda que se reconheça a pouca relevância do assim pretendido, tal como acabou por ser considerado pelo tribunal a quo, o certo é que, nesse particular, a Apelante deduziu impugnação de um aspeto específico que pretendia ver concretizado na decisão de facto com convocação de um concreto meio de prova gravado – o depoimento da testemunha FF, conforme fls. 446/v.º e 447.

Assim sendo, malgrado se ter concluído a final, pela irrelevância desse aspecto em face do já dado como provado nos pontos 7 a 22, segundo os critérios acima expostos, tanto basta para aproveitar à Apelante a prorrogação, por 10 dias, do prazo de interposição do recurso nos ter-mos do artigo 638.º, n.º 7, do CPC.

Termos em que improcedem as razões do Recorrente neste particular.

3.2. Quanto à questão sobre o não conhecimento da solução de direito por alegada dependência da impugnação de facto tida por improcedente

Alega o Recorrente, na linha do também consignado no voto de vencido do acórdão recorrido, que, uma vez mantida inalterada a decisão de facto, ficara prejudicada a apreciação de direito dependente como estava, na perspetiva da Apelante, da alteração daquela matéria.

Ora, como decorre do exposto no ponto precedente, a R./Apelante não se limitou a impugnar a decisão de facto, mas também questionou a própria valoração jurídica dada aos factos tidos como provados, sustentando, nessa base, que tais factos não consubstanciavam alteração superveniente das situações económicas do A. e da R. que determinasse a pretendia cessação ou redução da pensão em causa.   

Nesse quadro, torna-se claro que a impugnação assim deduzida não dependia exclusivamente da alteração da decisão de facto, implicando ainda a apreciação da própria solução jurídica em face de todas a factualidade tida por provada, como foi feito.

Termos em que também improcedem aqui as razões do Recorrente.

3.3. Quanto ao alegado erro de direito na qualificação dos factos dados como provados, no respeitante à alteração superveniente das situações económicas do A. e da R.

Estamos no quadro de uma ação destinada a declarar a cessação ou redução de obrigação alimentar entre ex-cônjuges, acordada no âmbito da dissolução do seu casamento em virtude de divórcio por mútuo consentimento ocorrido em 12/04/2007.

Por via desta ação, pretende o A. demonstrar as alegadas alterações quer das suas condições económicas por decorrência do AVC por ele sofrido em 12/03/2012 e, em especial, da situação de desemprego em que ficou a partir de julho de 2015, quer das condições económicas da R. que, segundo o mesmo A., passou a não carecer da pensão alimentar em causa.

A primeira questão que se colocara nas instâncias fora a de saber se, remontando o acordo de alimentos a 12/04/2007, para efeitos da sua alteração no âmbito da presente causa instaurada 01/09/2015, seria aplicável o regime de alimentos entre ex-cônjuges, na decorrência de divórcio, resultante das alterações introduzidas pela Lei n.º 61/2008, de 31-10.

Em ambas as instâncias foi assim considerado, não constituindo esta orientação matéria controvertida na presente revista.

De qualquer modo, dir-se-á que é o entendimento que se afigura mais correto, à luz do disposto no artigo 12.º, n.º 2, do CC, na medida em que tal regime verse sobre o conteúdo da relação jurídica alimentar entre ex-cônjuges emergente de divórcio, para mais configurada agora pelo quadro factual das alegadas alterações surgidas já no domínio de vigência daquela Lei, cuja essencialidade se destaca das condições iniciais do acordo de alimentos anteriormente firmado.

Ora, desde logo, em sede de disposições gerais, o artigo 2003.º do CC, no que aqui interessa, no seu n.º 1, consigna que:

Por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário.

   Seguidamente, o artigo 2004.º, dispondo sobre a medida dos alimentos, determina que:

1 – Os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los.

2 – Na fixação dos alimentos atender-se-á, outrossim, à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência.

Por sua vez, para o caso de ocorrência superveniente de circunstâncias modificativas das condições em que os alimentos tenham sido acordadas ou fixadas judicialmente, o artigo 2012.º prescreve que:

Se, depois de fixados os alimentos pelo tribunal ou por acordo dos interessados, as circunstâncias determinantes da sua fixação se modificarem, podem os alimentos taxados ser reduzidos ou aumentados, conforme os casos (…)   

E o artigo 2013.º do CC, provendo sobre a cessação da obrigação alimentar, no que aqui releva, estatui que:

   1 – A obrigação alimentar de prestar alimentos cessa:

     (…)

 b) – Quando aquele que os presta não possa continuar a prestá-los ou aquele que os recebe deixe de precisar deles.

       Já no respeitante a alimentos entre ex-cônjuges na decorrência de divórcio, o artigo 2016.º do mesmo Código, na redação dada pela Lei n.º 61/2008, de 31-10, estabelece que:

1 – Cada cônjuge deve prover à sua subsistência, depois do divórcio.

2 – Qualquer dos cônjuges tem direito a alimentos, independentemente do tipo de divórcio.

3 – Por razões manifestas de equidade, o direito a alimentos pode ser negado.

      Por fim, o artigo 2016.º-A, aditado pela referida Lei, dispondo sobre os fatores a ter em conta na determinação do montante dos alimentos, preceitua o seguinte:

1 – Na fixação do montante dos alimentos deve o tribunal tomar em conta a duração do casamento, a colaboração prestada à economia do casal, a idade e estado de saúde dos cônjuges, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, o tempo que terão de dedicar, eventualmente, à criação de filhos comuns, os seus rendimentos e proventos (…) e, de modo geral, todas as circunstâncias que influam sobre as necessidades do cônjuge que recebe os alimentos e as possibilidades do que os presta.

(…)

3 – O cônjuge credor não tem o direito de exigir a manutenção do padrão de vida de que beneficiou na constância do matrimónio.

      Como é reconhecido pela doutrina e jurisprudência, a obrigação alimentar entre ex-cônjuges na decorrência de divórcio ou de separação judicial de pessoas e bens funda-se no chamado princípio da recíproca solidariedade pós-conjugal induzido pela anterior comunhão plena de vida e justificado pelo desequilíbrio que a rutura dessa comunhão possa provocar nas condições de vida de um dos ex-cônjuges em relação ao outro.  

      Todavia, o atual regime de alimentos entre ex-cônjuges, alicerçado como está nas regras de que “cada cônjuge deve prover à sua subsistência, depois do divórcio” e de que “o direito a alimentos pode ser negado, por razões manifestas de equidade”, assume natureza excecional, temporária e subsidiária, conforme foi considerado, entre outros, nos acórdãos deste Supremo Tribunal, de 23/10/2012, proferido no processo n.º 320/10.6 TBTMR.C1.S1[5] e, de 27/04/2017, proferido no processo n.º 1412/14.8T8 VNG.P1.S1[6].

      Acresce que, sendo agora a obrigação alimentar em referência independente do tipo de divórcio (art.º 2016.º, n.º 2, do CC), para o que deixou de relevar a violação culposa dos deveres conjugais, e não assistindo ao cônjuge credor de alimentos o direito de exigir a manutenção do padrão de vida de que beneficiava na constância do matrimónio (art.º 2016.º-A, n.º 3, do CC), tal obrigação deve cingir-se ao que se mostre indispensável para a manutenção das condições essenciais de vida do alimentando, como são o sustento, a habitação e o vestuário.[7]

      De resto, já desde a Reforma do CC de 1977, introduzida pelo Dec.-Lei n.º 496/77, de 25-11, a obrigação de alimentos entre ex-cônjuges na decorrência de divórcio deixara de assegurar ao alimentando um padrão ou estilo de vida correspondente ao que usufruía na constância do casamento.[8] 

     É pois na malha do quadro normativo acima convocado e à luz das considerações expostas que, em sede da presente revista, importa ajuizar se o acórdão recorrido padece de erro de interpretação ou de aplicação normativa em face da factualidade dada por provada.

            

Antes disso, convém reter os termos em que o litígio foi julgado pelas instâncias.

Assim, na 1.ª instância, a ação foi julgada totalmente procedente com a consequente declaração da cessação da obrigação de alimentos em causa, por se considerar, em resumo, que:

   - Ocorreu uma alteração das circunstâncias objetivas subjacentes ao acordo de alimentos firmado em 12/04/2007, involuntária por parte do A., a qual revela a impossibilidade de este continuar a pagar a pensão acordada;

   - Tal impossibilidade decorre, para além de o A. se encontrar em situação de desemprego, do facto de ter sofrido um AVC, ficando afetado duma incapacidade permanente em mais de 70%, sendo-lhe difícil, com os seus 61 anos de idade, inserir-se de novo no mercado de trabalho;

   - A indemnização no valor de € 280.000,00 recebida pelo A. no âmbito do acordo de cessação do seu contrato de trabalho, celebrado em fins de junho de 2015, no contexto de reestruturação da respetiva entidade patronal, visa garantir o sustento do mesmo tanto durante o período de desemprego como quando se reformar, já que não reuniu o número de anos de descontos suficiente para obter uma reforma completa;

   - Por isso, tal indemnização não pode ser vista como uma verba de que o A. disponha no momento e que possa gastar com a R. com o risco de já não existir quando atingir a reforma;

   - Por sua vez, o subsídio de desemprego que o A. aufere não chega para fazer face às suas despesas e obrigações, estando prestes a acabar, dada a sua duração pelo período de 1140 dias;

   - E a renda que o A. aufere pelo arrendamento de uma moradia de que é comproprietário é canalizada para pagar a sua quota-parte no empréstimo bancário contraído para a construção da mesma;

   - Por seu lado, a R., apesar da sua incapacidade permanente de 68%, para além da pensão mensal de reforma que recebe do … no valor € 469,88, dispõe de património que lhe assegure as necessidades básicas, podendo ainda, se quiser, efetuar trabalhos da sua área profissional;

   - Tendo a R. optado por vender dois prédios urbanos que possuía no … e ainda a casa de morada da família onde morava, com o que recebeu o valor total de € 244.000,00, e por comprar a casa de … onde agora mora - um T3 - pelo valor de € 240.000,00, para o que contraiu um empréstimo bancário de € 45.000,00, não pode imputar ao A. o encargo financeiro dessa opção;

   - A R. poderá assim vender essa casa – desproporcionada para as suas necessidades – por valor superior ao da sua compra, de modo a liquidar o referido empréstimo bancário e a adquirir uma casa mais pequena, sem perder o respetivo conforto e dignidade.

      Por seu lado, a Relação, divergindo desse entendimento, julgou a ação parcialmente procedente, reduzindo a prestação mensal em causa para o valor de € 845,00, com base nas seguintes considerações:

«A – Se a Recorrente tem necessidade de alimentos

Estando em causa saber se a Requerente tem necessidade de obter ajuda para fazer face ao pagamento das suas despesas essenciais, julga-se que a resposta deve ser afirmativa, como decorre da matéria de facto provada.

Uma vez que, como a decisão recorrida também reconhece, a pensão que a Recorrente recebe do …, no valor atualizado de € 469,88, é manifestamente insuficiente para fazer a todas as suas despesas essenciais, discriminadas nos pontos de facto n.ºs 53 a 61, perfazendo, salvo erro, a média mensal de € 1.331.40.

Os montantes auferidos pela Recorrente da sua atividade têm sido muito exíguos, apurando-se uma média mensal inferior a € 16,00.

Não existindo perspetivas de poderem aumentar.

Desconhecendo-se a proposta de trabalho que foi feita à ora Recorrente, referida no ponto de facto n.º 67, e as razões pelas quais a ora Recorrente a rejeitou.

A decisão recorrida valorizou especialmente o facto de a ora Recorrente, vivendo sozinha, ter comprado uma casa com três quartos, mais cara do que a adquirida pelo Recorrido, e com recurso a crédito de que não necessitava, para além de implicar maiores despesas, como a respeitante ao IMI.

Mas, como objeta a Recorrente, a mesma fez as suas opções de compra de casa e de recurso ao crédito, contando com o recebimento da pensão de alimentos, que tinha sido estabelecida por acordo com o Recorrido e que o mesmo sempre tinha cumprido. E que era insuscetível de alteração, a menos que, nos termos já referidos, se alterassem as circunstâncias determinantes da sua fixação.

Alteração com a qual, em regra, ninguém conta.

Nessas circunstâncias, aquelas opções devem ser consideradas suficientemente justificadas, posto que foram fundadas numa prestação de alimentos já estabelecida e não visando justificar a fixação de alimentos. Ou seja, a ora Recorrente não se colocou intencionalmente na situação de carecer de alimentos em medida correspondente ao custo do crédito a que recorreu para compra da sua casa.

E, na presente ação não está em causa o aumento da prestação de alimentos, mas, antes, a sua cessação ou redução.

E também não lhe pode ser recusado o direito a alimentos com a justificação de que a mesma pode vender a casa onde vive e mudar-se para uma casa de menor preço, cuja propriedade importe custos inferiores. Uma vez que não se mostra suficientemente esclarecido o saldo que podia resultar dessa operação de compras e vendas coordenadas, que sempre comportam riscos.

Para além de não ser possível prever o tempo que a sua concretização poderia demorar. Sabendo-se que é importante assegurar, entretanto, a satisfação das necessidades essenciais da Recorrente, onde se inclui o pagamento das prestações do crédito contraído para a aquisição da casa onde vive.

Julga-se, assim, que o facto de a ora Recorrente, contando com a prestação de alimentos, ter adquirido uma casa maior do que precisava, e com recurso a crédito, não permite fundar a redução da prestação de alimentos, judicialmente fixada.

Afigurando-se incontornável a conclusão de que a Recorrente carece da prestação de alimentos.

Em medida correspondente à diferença entre o montante global das suas despesas e valor dos rendimentos que aufere, da pensão e do seu trabalho, no valor mensal de € 845,00.

B – Se o Recorrido tem capacidade para prestar alimentos à Recorrente.

Está agora em causa saber se, apesar de ter visto cessado o seu contrato de trabalho, o Recorrido continua a ter capacidade para prestar os alimentos de que a Recorrente necessita. O que passa, fundamentalmente, por saber se a indemnização que o ora Recorrente recebeu pela cessação do seu contrato de trabalho, no montante de € 280.579,65, pode ser afeta ao pagamento de alimentos.

Questão que, a nosso ver, deve ter resposta afirmativa.

É certo que aquele montante, apesar de bem significativo, não é inesgotável.

Mas é suficiente para fazer face às despesas do Recorrido e à necessidade de alimentos da Recorrente durante vários anos.

E, entretanto, o Recorrido recebe subsídio de desemprego, por um período de 1140 dias, com início em 01-07-2015, no montante de € 34.94 nos primeiros cento e oitenta dias, e com redução de 10% a partir do 181º dia.

Perfazendo este subsídio o montante total de € 36.477,36.

O que somado à indemnização pela cessação do contrato de trabalho, perfaz o montante de € 317.057,00.

Por outro lado, o Recorrido tem as despesas discriminadas nos pontos de facto n.º 4, 5 e 38 a 40, que perfazem a média mensal de € 2.475,54, que, deduzida da receita de renda de € 515,50, reconhecida pelo Recorrido, dá o saldo mensal de € 1.960,14, de despesas do Recorrido a serem suportadas pelo já referido montante de € 317.057,00.

Somando a esse saldo mensal, a prestação de alimentos de que a Recorrente carece, obtém-se o valor mensal de € 2.805,00, a ser suportado por força daquele montante de € 317.057.00

O que dá para 113 mensalidades desse montante, envolvendo um período de tempo superior a nove anos.

Sendo que, entretanto, o Recorrido, em situação ininterrupta de incapacidade temporária para o trabalho desde 10-02-2016 até 11-05-2018, e com incapacidade permanente parcial de 71,38, tem condições para se habilitar a uma reforma por invalidez, na modalidade de invalidez relativa, nos termos previstos nos art. 13.º e 14.º, n.ºs 1 e 2 do DL n.º 187/2007 de 10-05.

Sendo o valor dessa pensão de reforma seguramente bem superior ao do subsídio de desemprego.

Sabendo-se ainda que, em Abril de 2007, o mesmo tinha um plano de pensão, para o qual descontava a quantia mensal de € 280,88. O que lhe proporcionará o correspondente retorno que, apesar de não terem sido melhor esclarecido, sempre melhorará a sua situação financeira.

Pelo que, nos próximos anos de vida dos dois, o ora Recorrido tem capacidade para prestar à ora Recorrente os alimentos de que a mesma efetivamente necessita.

Não tendo sido identificada outra forma de lhe assegurar a satisfação oportuna das suas necessidades essenciais.

Conclui-se, assim, que a presente ação deve ser julgada apenas parcialmente procedente, mantendo-se a prestação de alimentos a cargo do Requerente, reduzida ao montante mensal de € 845,00.

Com efeitos a partir da data de propositura da presente ação, nos termos do art. 2006.º do C. Civil.

Sendo essa prestação, para manter o seu valor de aquisição, atualizada anualmente em função do índice de inflação verificado no ano anterior.

Assim procedendo parcialmente o recurso.»       

   O Recorrente veio rebater tais considerações nos termos sumariados nas 11.ª a 15.ª conclusões recursórias.

       Ora, da factualidade provada colhe-se, no que aqui mais interessa, o seguinte quadro factual:

i) – O A., nascido em 21/01/1957, e a R. casaram em 08/03/1980 e divorciaram-se, por mútuo consentimento, em 12/04/2007 – pontos 1.41 e 1.42;

ii) – Em 1987, foi diagnosticada uma “artrite reumatóide” à R., quando, contando então 30 anos de idade, ainda vivia no … com o A. e o filho comum de ambos - pontos 1.51 e 1.56;

iii) -  No âmbito da ação de divórcio por mútuo consentimento, ocorrido em 12-04-2007, o A. e a R. outorgaram um acordo de alimentos, nos termos do qual aquele se comprometeu a pagar a esta uma pensão mensal de € 1.500,00, atualizável, anualmente, segundo os índices de inflação do INE - ponto 1.1 e doc. de fls. 35-36;

iv) – No mesmo âmbito, A. e R. outorgaram o contrato-promessa de partilha de bens imóveis comuns do casal, conforme o documento de fls. 37-41 – ponto 1.2;

v) – Nos termos do mesmo acordo, a R. ficou a receber a totalidade de uma pensão proveniente do … no montante aproximado de € 600,00 e ainda uma renda proveniente de um imóvel sito no …, o qual se encontra descrito como verba n.º 1 do “Contrato-Promessa de Partilha” junto a fls. 37 e ss, no valor de 550 reais que, deduzidos os descontos legais, se cifrava em 385 reais – ponto 1.1 e 1.43 e doc. de fls. 35-36;

vi) – Nessa altura, em abril de 2007, o A., como …, era empregado da sociedade CC, S.A., desde 09-11-1992, auferindo um vencimento bruto de € 7.022,00 e líquido de € 4.302,40 – ponto 1.3;

vii) - Em dezembro de 2007, o A. contraiu um empréstimo bancário junto da DD para aquisição de habitação permanente (um T2) no valor de € 200.000,00, pelo período de 20 anos, com fim previsto em dezembro de 2027, sendo o valor da prestação mensal, em agosto de 2015, de € 895,64 – ponto 1.4;

viii) - Em agosto de 2008, o A., juntamente com outro comproprietário, contraiu empréstimo bancário junto da DD para construção duma moradia em terreno descrito como verba 3 do contrato-promessa de partilha, no valor de € 250.000,00, pelo período de 15 anos, com fim previsto em agosto de 2023, sen-do o valor da prestação mensal, em agosto de 2015, de € 1.655,74, cabendo ao A. assegurar 40% desse valor, ou seja, € 662,30 – ponto 1.5;

ix) – Tal moradia, entretanto construída, foi dada de arrendamento em 01-07-2013, pelo período de 5 anos, renovável por períodos de um ano, mediante o pagamento da renda mensal de € 1.700,00, cabendo ao A. 2/5 desse valor e ao outro comproprietário 3/5 – ponto 1.6;

x) - Em 12-03-2012, o A. sofreu um AVC (ponto 1.7), em consequência do que suportou diversos tratamentos e incapacidades temporárias, acabando por ficar afetado com uma incapacidade permanente parcial de 71,38%, sendo 0,60 devido ao AVC, 0,15 resultante de problemas respiratórios e 0,20 por depressão, desde 05/01/2018 (ponto 1.22);

xi) – Apesar de não ter deixado de trabalhar por causa do referido AVC, a prestação laboral do A. decaiu, com degradação visível no seu desempenho laboral, em termos de perda de autonomia e de capacidade de liderança, passando a ser um trabalhador inseguro, necessitando de ajuda para desempenhar as suas funções – ponto 1.9;

xii) - Em face disso, sendo o A. um quadro médio superior com funções de direção na área técnico-comercial, deixou de poder cumprir funções sozinho, como acontecia antes do AVC, passando a pedir ajuda à sua chefia para desempenhar tarefas que outrora conseguia fazer sozinho – ponto 1.10;

xiii) - Em 2012, a entidade patronal do A., CC, S.A., começou a sofrer decréscimo substancial no seu volume de negócios, o que determinou a necessidade premente de proceder a uma reestruturação – ponto 1.11.

xiv) - Perante o cenário de tal reestruturação e de o A. não poder assegurar as funções que lhe pudessem vir a ser cometidas, na falta de uma alternativa viável, aquele celebrou com a sua entidade patronal, em 16-06-2015, um acordo de cessação de contrato de trabalho pelo qual recebeu uma indemnização global no valor líquido de € 280.579,65 – ponto 1.15;

xv) - Se o A. não tivesse aceite celebrar tal acordo, teria sido alvo de despedimento coletivo que lhe traria condições menos favoráveis – ponto 1.16;

xvi) - Na sequência da cessação da relação laboral entre o A. e a CC, por decisão de 02-07-2015, a Segurança Social atribuiu ao A. um subsídio de desemprego no montante diário de € 34,94 por um período de 1140 dias, com início em 01-07-2015, e com redução em 10% a partir do 181º dia – ponto 1.23;

xvii) - Em 08/05/2008, a R. vendeu o imóvel descrito como verba n.º 1 do “Contrato-Promessa de Partilha”, junto a fls. 37 e ss,, pelo preço de 130.000,00 reais, relativamente ao qual recebia a renda mensal de 385 reais – ponto 1.44;

xviii) - Em 15/05/2008, a R., juntamente com os restantes comproprietários, vendeu o imóvel identificado na verba n.º 2 do “Contrato-Promessa de Partilha”, tendo recebido um total de 88.695,00 reais, quando um euro valia 2,436 reais – pontos 1.45 e 1.46;

xix) - Com a venda dos dois imóveis sitos no …, a R. recebeu em maio de 2008 o equivalente a cerca de € 89.000,00 e posteriormente, em 2009, com a venda da casa de morada da família sita em …, identificada com verba n.º 4 do “Contrato-Promessa de Partilha”, recebeu € 155.000,00 (metade do valor da venda), totalizando o valor por si recebido com a venda dos três imóveis cerca de € 244.000,00 – ponto 1.47;

xx) – A referida casa de morada da família - verba n.º 4 do Contrato-Promessa de Partilha, junto a fls. 37 e ss. - foi vendida em 2009, tendo o respetivo produto sido repartido equitativamente entre as partes, cabendo a cada uma o valor de € 155.000,00 – ponto 1.37;

xxi) - Após a venda dos referidos imóveis, a R. comprou o imóvel onde atualmente habita pelo valor por si declarado de € 240.000,00, sendo que a sua habitação tem um valor patrimonial de € 216.720,28 – ponto 1.48;

xxii) - Apesar de não necessitar de recorrer ao crédito bancário para comprar a sua habitação, a R. preferiu fazer um empréstimo bancário no valor de € 45.000,00, pelo qual paga de mensalidade cerca de € 319,00, porque queria ter “liquidez” e não “empatar” o dinheiro todo na compra da casa – ponto 1.49;

xxiii) - Apesar de a R. viver sozinha, a habitação dela tem três quartos – ponto 1.50.

xvii) - Desde 2007 até agosto de 2015 inclusive, o A. pagou a pensão de alimentos devida à R., a qual se encontra atualizada no valor de € 1.607,00 – pontos 1.24 a 1.32;

xviii) - Para além dos dois empréstimos bancários a cargo do A., este ainda tem as seguintes despesas mensais: eletricidade, € 114,00; água, € 28,00; gás, € 20,23; telecomunicações, € 51,00; com empregada doméstica, € 254,00, com os descontos para a Segurança Social; com condomínio: € 39,00 – ponto 1.38;

xix) - O A. ainda tem as seguintes despesas anuais: - IMI, € 120,38; IUC, € 74,02; Seguro Automóvel, € 325,09; Seguro Habitação, € 147,72 – ponto 1.39;

xx) - O A. ainda tem despesas com a sua alimentação e higiene em valor que não se conseguiu apurar mas que o próprio cifra em € 300,00 mensais – ponto 1.40;

xxi) – A doença da R. evolui de forma grave e destrutiva, constituindo grave compromisso das articulações metacarpofalângicas e interfalângicas proximais de ambas as mãos” e “tem dor e incapacidade funcional osteoarticular de múltiplas articulações, em particular das mãos, com grandes deformações articulares e desvio cubital dos dedos que a incapacitam para a vida diária” – ponto 1.52;

xxii) - Devido a essa doença, a R. tem necessidade de ingerir medicamentos de forma regular, tendo gasto, em média, no ano de 2014, um valor mensal de € 27,65 – ponto 1.53;

xxiii) - A R. tem uma incapacidade permanente global de 68% - ponto 1.54;

xxiv) - À data da última consulta, ocorrida em 21-09-2017, a R. apresentava atividade moderada da doença – ponto 1.55;  

xxv) - A R. tem formação universitária sendo …, no entanto, desde que foi diagnosticada a sua doença, em 1987, que a R. nunca mais trabalhou de forma regular, tendo sido o A. quem, durante o casamento, garantia o sustento da mesma e do respetivo agregado familiar, pagando as respetivas despesas incluindo a empregada doméstica de que o casal beneficiava – ponto 1.57;

xxvi) - Devido à sua doença, a R. tem necessidade de ter uma empregada doméstica pela qual despende, neste momento, cerca de € 200,00 mensais – ponto 1.58;

xxvii) - Para além do empréstimo bancário, a R. tem ainda as seguintes despesas mensais: com eletricidade, € 60,96; com gás, € 174,25; com água, € 38,62; com telecomunicações, € 59,30; com empresa de segurança, € 36,06; com seguro de vida associada ao crédito habitação, € 26,06 – ponto 1.59;

xxviii) - A R. ainda tem as seguintes despesas anuais: IMI, € 845,21; Seguro Habitação, € 228,79 – ponto 1.60;

xxix) - A R. ainda tem despesas com a sua alimentação, vestuário e higiene em valor que não se conseguiu apurar mas que o próprio cifra em € 300,00 mensais – ponto 1.61;

xxx) - Em 2015, a pensão de reforma que a R. recebia do … cifrava-se em 1.899,00 reais, equivalente, na altura, a € 604,20, mas atualmente a € 469,88 – ponto 1.62 e 1.63;;

xxxi) - Apesar da sua incapacidade, a R. tem efetuado trabalhos esporádicos tendo auferido os valores documentados nas declarações de IRS juntas a fls. 192 e ss e 199 e ss – ponto 1.64;

xxxii) - Foi efetuada, pelo menos, uma proposta de trabalho à R. que a mesma rejeitou – ponto 1.67;

xxxiii) - Após o divórcio, a R. participou em cursos com vista a valorizá-la profissionalmente – ponto 1.68.

        

      Deste acervo factual apura-se que a R. suporta as seguintes despesas:

- As despesas mensais de: € 60,96 com eletricidade, € 174,25 com gás; € 38,62 com água; € 59,30 com telecomunicações, € 36,06 com empresa de segurança; € 200,00 com uma empregada doméstica, € 300,00 com a sua alimentação, vestuário e higiene, € 27,65 com medicamentos (por referência à média do ano de 2014), o que perfaz uma média mensal de € 896,84;  

- E ainda as despesas anuais: de IMI, € 845,21 e de Seguro Habitação, € 228,79; a despesa mensal, com seguro de vida associada ao crédito habitação, de € 26,06;

- A prestação mensal € 319,00 relativa ao empréstimo bancário de € 45.000,00 por ela contraído para a compra da casa onde mora.  

       Todas essas despesas da R. perfazem o total anual de € 15.976,80, a que corresponde o valor mensal de € 1.331,40, conforme o apurado pelo tribunal a quo.

       A mesma R. tem, como rendimento regular, uma pensão de reforma proveniente do … que, em 2015, era no valor de € 469,88. E tem auferido, por algum trabalho profissional episódico, uma média mensal que o tribunal a quo, com base nos documentos de fls. 192 e ss e 199, estimou em € 16,00. 

       Sucede que a R., em 2008, vendeu dois imóveis que possuía no … com o que recebeu o valor de € 89.000,00, e, em 2009, conjuntamente com o A., vendeu a casa de morada da família, recebendo cada um deles o montante de € 155.000,00, tendo assim a R. recebido, por tais vendas, o total de € 244.000,00. Após essas vendas, a R. comprou a casa – T3 – onde mora, em …, pelo valor de € 240.000,00, para o que contraiu um empréstimo bancário no valor de € 45.000,00, pelo qual paga a sobredita mensalidade atualmente de € 319,00.

         Por seu lado, o A. suporta as seguintes despesas:

- As despesas mensais de: € 114,00 com eletricidade; € 28,00 com água; € 20,23 com gás; € 51,00 com telecomunicações; € 254,00 com empregada doméstica; € 39,00 com o condomínio; € 300,00 com alimentação e higiene; o que equivale a uma média mensal de € 806,23, perfazendo o valor anual de € 9.674.76;

- As despesas anuais de: - IMI, € 120,38; IUC, € 74,02; Seguro Automóvel, € 325,09; € 147,72 com seguro de habitação, totalizando o valor anual de € 667,21;

- Uma prestação mensal de € 895,64 (valor referente a agosto de 2015), perfazendo o montante anual de € 10.747,68, relativa a um empréstimo bancário por ele contraído, em dezembro de 2007, para aquisição de habitação permanente (um T2) no valor de € 200.000,00, pelo período de 20 anos, com fim previsto para dezembro de 2027;

- Uma prestação de € 662,30, no montante anual de € 7.947,60, relativa a um outro empréstimo bancário contraído em agosto de 2008, por ele e terceira pessoa, para construção duma moradia no terreno descrito como verba 3 do contrato-promessa de partilha, com fim previsto para agosto de 2023.   

       A soma de todas essas despesas do A. perfaz o total anual de € 29.037,25 (€ 9.674.76 + € 667,21 + € 10.747,68 + € 7.947,60), a que corresponde a média mensal de € 2.419,77.

        A título de proventos, o A., logo em 2009, tal como a R., recebeu o montante de € 155.000,00 correspondente à sua quota-parte na venda da casa de morada de família (ponto 1.37 da factualidade provada). Depois, desde julho de 2007, o A., tendo deixado de auferir o vencimento líquido de € 4.302,40, em virtude da cessação do seu contrato de trabalho, obteve uma indemnização no valor líquido de € 280.579,65 e passou a receber ainda um subsídio de desemprego, pelo período de 1140 dias, com início em 01-07-2015, no montante diário de € 34,94, mas com redução de 10% a partir do 181.º dia. E tem vindo a receber ainda a quantia mensal de € 680,00 correspondente à sua quota-parte de 2/5 na renda de € 1.700,00 pelo arrendamento da moradia construída no terreno descrito como verba 3 do contrato-promessa de partilha.

No respeitante às necessidades da R., o tribunal a quo considerou o valor mensal de € 1.331,40, no qual incluiu todas as despesas dela acima discriminadas.

Todavia, salvo o devido respeito, afigura-se que a prestação mensal de € 319,00 relativa ao empréstimo bancário de € 45.000,00 por ela contraído para a compra da habitação onde mora, não deve ser aqui considerada por respeitar a um encargo financeiro que ela própria assumiu com aquele empréstimo, quando tinha à sua disposição o capital de € 244.000,00, obtido pela venda dos prédios de que então era titular ou contitular, capital esse que lhe permitia então satisfazer a compra daquela casa no valor de € 240.000,00.

É certo que a R. era livre de fazer aquela opção, querendo ter liquidez e não “empatar” o dinheiro todo na compra da casa, como se refere no ponto 1.49 dos factos provados, mas tal opção passava a ser da sua inteira responsabilidade, não se inscrevendo sequer no contexto em que fora anteriormente celebrado o acordo de alimentos em 12/04/2007. Nem consta que a aludida necessidade de liquidez da R. se devesse a qualquer incumprimento, por parte do A., no pagamento da prestação alimentar então em vigor.

De resto, não se mostrando, como se não mostra, que esse encargo financeiro, de tal modo assumido exclusivamente pela R., fosse indispensável para a aquisição de habitação própria, não poderá ser considerado compreendido na obrigação alimentar, à luz do disposto no artigo 2003.º, n.º 1, do CC.

Nem o facto de a R. manter a expetativa de continuar a dispor da acordada obrigação alimentar de € 1.500,00, com as sucessivas atualizações, torna legítimo que assumisse, unilateralmente, aquele encargo a contar que o mesmo estivesse coberto por aquela obrigação.

Pelas mesmas razões se afigura que não deve ser considerada a despesa mensal de € 26,06 com o seguro de vida associada a tal empréstimo bancário.

Mais discutível seria saber se devem ser consideradas também as despesas anuais de IMI, no valor de € 845,21, e de seguro habitação, no valor de € 228,79 – a que correspondem, respetivamente, os valores mensais de € 70,43 e € 19,06 -, atendendo ao tipo de habitação em referência (T3), aparentemente desmedido para as necessidades de quem, como a R., ali vive sozinha.

De todo o modo, desconhecendo-se qual o valor dos encargos desse tipo suportados com a anterior casa de morada da família onde a R. dantes residia, não se podem ter aqueles valores como acrescidos ou agravados em relação à situação que existia aquando da celebração do acordo de alimentos em 2007.  

Neste quadro, afigura-se que as acima discriminadas despesas da R., com exceção das prestações mensais de € 319,00 e de € 26.06 relativas ao empréstimo bancário e ao seguro de vida que lhe está associado, correspondem a necessidades indispensáveis para o essencial do seu modo de vida quotidiano, no valor médio mensal de € 986,34, (€ 1.331,40 - € 319,00 - € 26,06), nos termos do artigo 2003.º, n.º 1, do CC.

Sucede que a R. dispõe do valor mensal de € 469,88 relativo à pensão que recebe do … e ainda de proventos obtidos por via da realização de trabalho episódico, estimados na média mensal de € 16,00, perfazendo o total mensal de € 485,88.

Por sua vez, atendendo ao seu grau de incapacidade, de 68%, e à natureza da doença de que padece - artrite reumatóide -, desde 1987, quando contava então 30 anos de idade, não se divisa que ela se encontre em condições de inserção regular e estável no mercado de trabalho, mormente no âmbito das suas aptidões profissionais de …, como é disso bem sintomático o facto de só conseguir auferir a módica quantia mensal de € 16,00 por realização de trabalho episódico, não obstante se ter provado que rejeitou, pelo menos, uma proposta de trabalho cujos contornos se desconhecem.  

Nem tão pouco parece que o próprio A., dantes, tenha encarado tal possibilidade, nomeadamente quando acordou, em 12/04/2007, em pagar a prestação alimentar em causa, altura em que a R. já padecia, desde 1987, da referida doença.

Também o simples facto de a R. ter vendido os três imóveis de que era titular ou contitular, optando por comprar a casa onde vive atualmente, não revela que com isso tenha agravado a seu nível de despesa corrente ou dissipado as suas fontes de rendimento, existentes à data em que fora acordada a pensão alimentar em causa.

Com efeito, a venda dos dois prédios que a R. possuía no … ocorreu em 2008 e a venda da casa de morada da família – supostamente com o acordo do A. – verificou-se em 2009, com o que obteve um capital no valor total de € 244.000,00, que lhe permitiu adquirir habitação própria em Portugal pelo preço de € 240.000,00, sendo que o A. também beneficiou da venda dessa casa de morada de família, recebendo a quota-parte de € 155.000,00.

E não parece que o A. tenha sequer questionado tal opção da R., continuando, como continuou, a pagar a prestação alimentícia acordada até agosto de 2015, só o fazendo por via da presente ação.

Nestas circunstâncias, é de concluir que a venda daqueles imóveis e a compra da casa onde a R. atualmente vive - afora o empréstimo bancário de € 45.000,00 contraído por ela para esta aquisição -, não se traduziram em maiores despesas nem em perda relevante de rendimentos, por parte da mesma R., de modo a alterar o quadro das suas condições económicas subjacente ao acordo da alimentos firmado em 2007 e subsequentemente estabilizado, com cumprimento deste acordo pelo A., pelo menos, até agosto de 2015.

Nem se afigura, por isso, razoável exigir que a R. opte agora pela venda daquela casa onde mora desde 2009, sob o pretexto de ser porventura desproporcionada para as suas necessidades, para, sem mais, fazer face a tais condições económicas. Neste particular, temos por mais sensata a ponderação feita pela Relação em detrimento da orientação sustentada pela 1.ª instância.       

Posto isto, impõe-se concluir que a R., dispondo de um rendimento mensal médio de € 485,88 (€ 469,88 + € 16,00), para satisfazer a sua despesa mensal média de € 986,34 acima considerada com exclusão das prestações relativas ao empréstimo bancário e ao seguro de vida que lhe está associado, necessita de um complemento mensal da ordem dos € 500,00.

Este é, pois, o limite quantitativo da necessidade alimentar da R. nos termos e para os efeitos dos artigos 2003.º, n.º 1, e 2004.º, n.º 1, 2.ª parte, e n.º 2, do CC.

Resta saber se o A. revela disponibilidade financeira para satisfazer tal importância mensal.

Do acima consignado resulta que, excetuada a prestação mensal de € 662,30 relativa ao empréstimo bancário contraído em agosto de 2008, que é satisfeita pela quota-parte de € 680,00 na renda que o R, recebe pelo arrendamento da moradia construída no terreno descrito como verba 3 do contrato-promessa de partilha, aquele tem uma despesa anual de € 21.089,65 (€ 29.037,25 – 662,30 x 12), equivalente a € 1.757,47 mensais.

Por outro lado, tendo o A. deixado de auferir, desde julho de 2015, o rendimento líquido mensal de € 4.302,40 em consequência da cessação do seu contrato de trabalho, recebeu uma indemnização no valor total líquido de € 280.579,65 - ponto 1.15 da factualidade provada com referência ainda aos documentos de fls. 284 e, em especial, de fls. 310/v.º.

É também configurável, tal como se refere no acórdão recorrido, que o mesmo venha a obter uma pensão de reforma, mormente por invalidez, embora não completa, dada a insuficiência do número de anos de descontos. 

Por isso, é de admitir como legítimo que o A. reserve uma parcela daquele capital recebido, em cerca de 1/3, para lhe servir de complemento em futura situação de reforma, ficando com a parcela de € 187.053,10 (€ 280.579,65 - € 280.579,65 x 1/3) desse capital disponível para fazer face às suas despesas e à satisfação da prestação alimentar em causa.

Além disso, desde 01/07/2015, o R. passou a receber também um subsídio de desemprego, pelo período de 1140 dias, no montante diário de € 34,94, com redução de 10% a partir do 181.º dia, o que perfaz o total de € 36.477,36, conforme foi apurado pelo tribunal a quo.

Assim, sem contar com o capital de € 155.000,00 que o A. recebeu em 2009 pela sua quota-parte no preço da venda da casa de morada da família (ponto 1.37 da factualidade provada), o mesmo obteve, desde julho de 2015, com o capital recebido pela cessação do seu contrato de trabalho e com o subsequente subsídio de desemprego, proventos que se têm aqui por disponíveis no total de € 223.530,46 (€ 187.053,10 + € 36.477,36).

Considerando um horizonte temporal máximo de 8 anos desde a data da propositura da presente ação até à idade da reforma do A., o sobredito capital de € 223.530,46 equivale a frações anuais de € 27.941,30, das quais, deduzido o valor anual de € 21.089,65 das suas despesas, sobrará a parcela de € 6.851,65, equivalente a € 570,97 mensais, sendo estes os parâmetros da alteração superveniente dos proventos do A. a considerar desde a referida propositura da ação em 01/09/2015.

Em face disso, tendo em conta, nos termos do artigo 2016.º-A, n.º 1, do CC, a duração do casamento (cerca de 27 anos – de 08/03/1980 a 12/ 04/2007), a idade dos ex-cônjuges (cada um deles com 62 anos), os graus de incapacidade parcial permanente de que estão afetados (o A. com 71,38% e a R. com 68%), mas a inviabilidade de qualquer deles encontrar inserção regular e estável no mercado de trabalho, nomeadamente nas suas áreas profissionais, e os respetivos níveis de rendimentos ou proventos e despesas acima ponderados, tem-se por mais ajustada a redução da prestação alimentar mensal devida pelo A. à R. para o valor de € 500,00, a partir da data da instauração desta ação em 01/09/2015, a ser atualizada, anualmente, segundo os índices de inflação do INE.

Por fim, importa salientar que esta correção em relação ao decidido no acórdão recorrido decorre apenas da parcial divergência de enquadramento dos factos tidos por provados pelas instâncias no quadro normativo aplicável, no respeitante ao limite quantitativo da necessidade alimentar da R. e aos parâmetros da alteração superveniente dos rendimentos ou proventos do A., conforme o acima considerado, apreciação esta que se inscreve no âmbito dos poderes de cognição deste tribunal de revista configurado nos artigos 674.º, n.º 1, alínea a), e 682.º, n.º 1, do CPC.  

IV - Decisão

Pelo exposto, acorda-se em conceder parcialmente a revista, alterando-se a decisão recorrida no sentido de reduzir a prestação alimentar mensal em causa para o valor € 500,00 (quinhentos euros), desde a data da propositura da presente ação, atualizável segundo os índices de inflação do INE.  

As custas nas instância são devidas pelas partes, na proporção de 1/3 para o A. e 2/3 para a R. e, na presente revista, na proporção de 1/2 para cada parte, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia o A..

Lisboa, 19 de junho de 2019

        

Manuel Tomé Soares Gomes (Relator)

Maria da Graça Trigo

Maria Rosa Tching

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[1] In Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Parte Geral e Processo de Declaração, artigos 1.º a 702.º, Almedina, 2018, p. 766, nota 6 e 7.
[2] Relatado pelo Juiz Cons. Lopes do Rego, acessível na Base de Dados da DGSI.
[3] Relatado pelo Juiz Cons. Abrantes Geraldes, acessível na Base de Dados da DGSI.
[4] Relatado pelo Juiz Cons. Ferreira Pinto, acessível na Base de Dados da DGSI.
[5] Relatado pelo Juiz Cons. Hélder Roque, acessível na Base de Dados da DGSI.
[6] Relatado pela Juíza Cons. Maria da Graça Trigo, aqui 1.ª adjunta, acessível na Base de Dados da DGSI.
[7] Vide, a este propósito, os já citados acórdãos do STJ, de 23/10/2012, proferido no processo n.º 320/10.6 TBTMR.C1.S1 e, de 27/04/2017, proferido no processo n.º 1412/14.8 T8VNG.P1.S1, e ainda o de 03/03/ 2016, proferido no processo n.º 2836/13.3TBCSC.L1.S1, relatado pela Juíza Cons. Fernanda Isabel Pe-reira, também acessível na Base de Dados da DGSI.
[8] Vide, neste sentido, além do já citado acórdão do STJ de 23/10/2012, proferido no processo n.º 320/10.6 TBTMR.C1.S1, também o acórdão do STJ relatado pelo Juiz Cons. Granja da Fonseca, de 20/02/2014, proferido no processo n.º 141/10.6TMSTB.E1.S1, acessível na Base de Dados da DGSI.