Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
63/17.0T9LRS.L1.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO (CRIMINAL)
Relator: NUNO GONÇALVES
Descritores: RECURSO PENAL
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
DUPLA CONFORME
NULIDADE DE SENTENÇA
PRAZO DE ARGUIÇÃO
DIREITO AO RECURSO
PROCESSO EQUITATIVO
CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM
PRAZO RAZOÁVEL
VÍTIMA
Data do Acordão: 04/22/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REJEITADO
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário : I - Regulamentando o direito ao recurso, o CPP consagra o princípio da recorribilidade das decisões proferidas no processo penal – art. 399.º -, não admitindo limitações que não estejam expressamente previstas na lei.
II - As sentenças, acórdãos e despachos que não admitem recurso estão catalogadas, em diversas disposições legais e, essencialmente, no art. 400.º.

III - Resulta do disposto no art. 432.º, n.º 1, al. b) conjugado com o art. 400º, n.º 1, al. f), do CPP, que é irrecorrível perante o STJ, acórdão da Relação que confirma condenação da primeira instância em pena não superior a 8 anos de prisão.

IV - Irrecorribilidade que é extensiva a todas as questões relativas à atividade decisória que subjaz e que conduziu à condenação, sejam de constitucionalidade, substantivas ou processuais, confirmadas pelo acórdão da Relação.

V - Não é recorrível o acórdão do Tribunal da Relação que decidiu que não se verificam nulidades atinentes à factualidade provada ou à apreciação das provas que o arguido imputou à decisão da 1ª instância.

VI - O art. 379.º, n.º 2, do CPP, consagra para as nulidades da sentença um regime específico, sem reporte ao estabelecido nos art. 119.º e 120.º, do CPP.

VII - Admitindo a sentença ou acórdão recurso ordinário e pretendendo o sujeito processual impugná-la através dessa via, tem, necessariamente, de arguir as nulidades que entenda opor à decisão recorrida no requerimento de interposição de recurso, e no prazo previsto no art. 411.º, n.º 1, do CPP, -30 dias.

VIII - Interpretação diferente, ademais da letra da lei, afronta o espírito do legislador, expressado na proposta de lei, e bem assim a teleologia da norma, que visou, precisamente, “encurtar a relação temporal entre a prática do crime e a decisão judicial que o aprecie e decida” definitivamente.

IX - Aquela obrigatoriedade não é um ónus desproporcionado, em nada contendendo com a possibilidade de efetivo exercício do direito ao recurso.

X - O direito ao recurso e as mais amplas garantias da defesa não suportam interpretações que multiplicavam exponencialmente ou tornariam infinito o prazo para recorrer das decisões judiciais que, admitindo recurso ordinário, conhecem do objeto do processo.

XI - Interpretação contrária afrontava o direito dos sujeitos processuais e das vítimas “a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável” - art. 20.º, n.º 4, da CRP (também art. 6.º, n.º 1, da CEDH) – atentando gravemente contra a celeridade e a eficiência da justiça, que é um dos pilares fundamentais da arquitetura do nosso processo penal, constitucionalmente reconhecida (“a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade” – n.º 5 do art. 20.º citado).

XII - O recurso do arguido é extemporâneo, porque interposto 5 meses após a notificação do acórdão confirmatório recorrido.

Decisão Texto Integral:

O Supremo Tribunal de Justiça, 3ª secção, acorda:


A - RELATÓRIO:

1. a condenação:

No Juízo Central Criminal de ... – Juiz .., realizado o julgamento, o Tribunal coletivo, por acórdão datado de 12 de fevereiro de 2019, condenou, entre outros, também os arguidos:

- AA, de 36 anos e os demais sinais dos autos,

- pela prática, em autoria material e em concurso real de:

• um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21° n° 1 do D.L. 15/93 de 22 de janeiro, na pena de oito anos e seis meses de prisão;

• um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo artigo 86° n° 1 al. c) da Lei 5/2006 de 23/01 de fevereiro, com as alterações, introduzidas pela Lei n°50/2013 de 24 de julho, na pena de dois anos e seis meses de prisão; e

- em cúmulo jurídico destas penas parcelares, na pena única de nove anos e seis meses de prisão.

- BB, de 43 anos e os demais sinais dos autos,

- pela prática, em autor material, de:

um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21° n° 1 do D.L. 15/93 de 22 de janeiro, na pena de seis anos de prisão.

- CC, de 42 anos de idade, e os demais sinais dos autos,

- pela prática, em autoria material, de:

um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21° n° 1 do D.L. 15/93 de 22 de janeiro, na pena de seis anos de prisão.

Impugnaram o acórdão condenatório perante a Relação de … que, por acórdão datado de 26/06/2019, negou provimento aos recursos, confirmando integralmente a decisão recorrida.

Por requerimentos de 12 e 13/07/2019, arguiram a nulidade (por omissão de pronúncia) e inconstitucionalidade, do acórdão do confirmatório, nos termos do art. 379.º, n.º 1, al. c), ex vi art. 425.º, n.º 4, ambos do CPP, conjugados com o disposto nos arts. 615.º, als. b) a d), 4 e 666º, do CPC, aplicável ex vi do art. 4.º CPP.

Por acórdão de 27-11-2019, o Tribunal da Relação indeferiu a arguição das nulidades opostas ao acórdão de 26/06/2019.

Notificados deste acórdão, vieram os arguidos interpor recurso para o STJ. Que foi admitido por despacho do V.º Desembargador titular do processo, por despacho datado de 21-01-2020, a subir “de imediato, nos próprios autos e com efeito suspensivo”.

2. os recursos:

a. do arguido AA:

Inconformado com o acórdão confirmatório, recorre para o STJ, rematando a alegação com as seguintes:

- CONCLUSÕES:

II (…) o recurso do Recorrente, não foi corretamente julgado, porquanto, o douto acórdão violou o preceituado no art.º 379º e 374º, n.º 2, al. b) e n.º 3, por omissão de pronúncia. E dever de fundamentação, consagrado no art.º 97º, nº 5, todos do Código Processo Penal, a exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão deve ser completa, contendo e enunciação das provas que serviram para fundar a convicção alcançada pelo tribunal, bem como a análise crítica de tais provas. Apesar do Recorrente ter cumprido os preceitos legais e demonstrando as provas produzidas em julgamento que levariam a um sentido diferente da decisão, sendo mesmo contraditório.

III - O exame crítico não pode traduzir-se numa simples afirmação e conclusões nem por súmula o douto Tribunal transcreveu os depoimentos das testemunhas, nomeadamente, as que têm interesse para a defesa do arguido, nem as declarações de co-arguido que provam, exatamente, o contrário, dá provados sem fazer qualquer referência, ao que foi afirmado em Tribunal pelas testemunhas, ignorando por completo os seus testemunhos. condições pessoais.

IV – Ficou demonstrado a atividade profissional do arguido, a origem dos seus rendimentos e bem como as viagens ao Algarve e por vezes iam a Espanha para abastecer as viaturas de combustível, para além do trabalho na empresa de Eventos da Eng.ª DD no Algarve, a sua ajuda e do seu pai para aquisição da viatura apreendida por isso dinheiro investido por si e pelo seu pai, na aquisição da viatura apreendida nos autos, carrinha VW …. para o transporte da mãe do AA, uma vez que, utiliza cadeira de rodas, explicou ainda que no dia 12 de Janeiro de 2018, a vigilância que consta nos autos não é do AA porque esse foi o seu dia de anos e jantaram com a família, que chegaram a ser abordados e revestidos uma vez em Fevereiro e nada foi encontrado e que não conta nos autos, e mais referiu as dificuldades que o AA teve sozinho e com a sua ajuda, uma estudante universitária com dois empregos, e sem apoios sociais. E o seu desconhecimento dos consumos de haxixe por parte do arguido. e que o apoia, e aguarda até à sua liberdade.

V – O tribunal a quo limita-se a tecer considerações abstratas, não explica detalhadamente os motivos que levaram a considerar como provados factos que não se produziu qualquer prova, ou a prova produzida é contrária à que vem no douto acórdão, mesmo com todas as testemunhas de acusação a negarem ter comprado produto estupefaciente ao arguido ou que vendessem droga e aliás dando esses factos como não provados e por fim acaba por condenar por venda a terceiros, que não se sabe quem e encontros que não se sabe para quê, impossibilitando o recorrente e o tribunal de recurso de perceber e apreciar a bondade dos critérios lógicos que seguiu e inviabilizando a correta apreciação da impugnação da matéria de facto que o arguido infra irá apresentar. A falta do exame crítico das provas, imposto pelo art.º 374º, nº 2, do CPP, e a consequente insuficiência da fundamentação determina, nos termos do art.º 379º, nº 1, a), do mesmo código, a nulidade da sentença. Impõe-se que V. Exas ordenem o suprimento da nulidade verificada, com a consequente revogação da decisão e a determinação de prolação de novo Acórdão do qual conste a indicação especificada da prova testemunhal, fundamentadora da convicção e o exame crítico das provas.

Termos em que se requer seja declarado nulo o Acórdão, e em consequência, determinar a sua substituição por outro que supra a apontada nulidade.

VI – A decisão é assim ilegal, por violação do disposto na alínea d) do nº 1 e o nº 2 do art.º 374 do CPP, ilegalidade esta que acarreta a respetiva nulidade, als. a) e c) do nº 1 do art.º 379, e o reenvio do processo para novo julgamento, a efetuar pelo tribunal mais próximo, art.º 426–A, todos do CPP . Com a interpretação feita de tais preceitos, a decisão é inconstitucional por violação do disposto nos nºs 1, 1ª parte e nº 5 do art.º 32 da CRP.

VII- Existe várias contradições que nunca foram sanadas.

VIII – O produto em causa é haxixe e este tipo produto não é possível adulterar conforme vem aqui vertido. Além de ser um facto dado como provado em contradição com os factos não provados estamos perante um erro notório da apreciação da prova, não se poderá confundir e tratar haxixe da mesma forma que se trata de heroína ou cocaína em que aí sim, existe uma preparação e uma adulteração com substâncias que fazem este tipo de produto estupefaciente ser mais rentável e lucrativo, o que não é o caso em apreço. Também está em contradição com toda a prova produzida quer das testemunhas DD, EE, FF e ainda o Relatório Social que descreve a ocupação profissional do arguido, mas testemunhos omitidos, além dos pontos 119 a 130 da matéria de facto dada como provada que aqui se dá por integralmente reproduzida.

IX – Não se fez prova que o arguido fosse a Espanha buscar droga mas como refere a testemunhas de acusação foi em Tunes, Algarve, nem se provou a venda a terceiros e nem se quer se provou que as viaturas apreendidas foram adquiridas com a venda de droga ou que serviram para o transporte da mesma, assim deverão as mesmas serem restituídas aos seu proprietários.

X - Ao julgar da forma como fez e condenar por este crime violou o princípio da inocência – Art-32º da Constituição da República Portuguesa.

XI - É verdade que o arguido tem antecedentes criminais, mas foram todos praticados quando era menor de 21 anos e cumpriu todas as penas, todos ligados à delinquência juvenil; atualmente, a sua vida já está estruturada a namorada está a ser fundamental para aguentar esta sua reclusão; Assim parece-nos que deve ser dada uma oportunidade para a reintegração do arguido sendo a pena de pelo crime de detenção de arma convertido em multa que poderá ser pago através de trabalho comunitário e a pena por tráfico deverá ser diminuída e suspensa a sua execução sob regime de prova.

XII - Parece-nos ser tal condenação manifestamente exagerada, atentos os factos apurados, a culpa do agente, à ilicitude, os seus antecedentes, as suas perspetivas de reinserção social, bem como o universo de condenações em Portugal, por estes e outros crimes, forçoso será de concluir pela inadequabilidade de tal condenação;

XIII - O produto estupefaciente foi apreendido, ou seja, não entrou em circulação. O arguido está socialmente integrado, tem namorada que o apoia, assim como os seus irmãos, e à data da sua detenção tinha a seu cargo a mãe e a sobrinha, mãe totalmente dependente, acamada, cega, com necessidade de acompanhamento permanente.

XIV - Demonstrou um sincero arrependido, e exprimiu isso mesmo nas suas declarações, falou no seu consumo e da sua recaída, mas que atualmente, livrou-se do consumo.

XV - Quando restituído à liberdade voltará para junto da sua namorada, e quer retomar à sua atividade no ramo automóvel e eventos conforme foi afirmado por ele e pela testemunha DD que aguarda a sua liberdade para reintegrar na sua empresa.

XVI - Atento aos factos provados e descritos no douto acórdão, o arguido tem hábitos de trabalho, Não tem antecedentes criminais. Está arrependido. Justifica-se uma diminuição das penas parcelares a que o arguido veio a ser condenado, uma vez que a pena de 8 anos e 6 meses de prisão pelo crime de tráfico e 2 anos por detenção de arma, em cúmulo jurídico 9 anos e 6 meses se mostra manifestamente exagerada, desproporcional e desadequada, atendendo ao preceituado legal quanto à função repressiva e preventiva das penas de privação de liberdade.

XVII – Tendo ainda em consideração o que vem a ser aplicado nos nossos tribunais a titulo de exemplo Ac. 6733/07-7, de 1/10/2007, do Tribunal da Relação de Lisboa, condena na pena de 7 anos de prisão um individuo com 30 kilos de cocaína, Ac. 07P3761, de 14/11/2007, do Supremo Tribunal de Justiça, condena em 4 anos e 6 meses, pelo tráfico de heroína, Ac. 07P1610, de 11/07/2007, do Supremo Tribunal de Justiça, aplica 6 anos e 6 meses a um tráfico de 298 Kg de cocaína com um grau de pureza de 91,86% (www.dgsi.pt).

XVIII - No caso concreto estamos a falar de haxixe, houve uma notória violação da medida da pena aplicada ultrapassado em muito a medida da culpa concreta do arguido face aos factos dados como provados, tendo ainda, o acórdão em crise violado disposto nos artigos 40º, n.º 2 e 71, n.º 1 al. a), do Cod Penal;

XIX - No caso do artigo 21º a moldura penal situa-se entre os 4 e os 12 anos de prisão, justifica-se a diminuição da pena a que foi condenado e aplicação de uma pena de multa para o crime de detenção de arma. Satisfará igualmente os fins da pena de prevenção geral e especial.

Alega terem sido violadas as seguintes norma jurídicas:

- os artigos 32º da CRP, 21º do Dec-Lei n.º 15/93, 40º, n.º 2, 50º, 70º, 71º e 72º, do CP e 379º, 374º, 97º, 94º, do CPP

Peticiona que seja aplicado o principio do “in dubio pro reo”, e outra por falta de prova, caso assim não se entenda, deverá ser alterada a medida da pena em conformidade com o artigo 71, n.º 2, al. d) do Cód. Proc. Penal, e em consequência substituir-se por outra medida da pena que seja mais reduzida e que se ache mais adequada e proporcional ao caso concreto, suspensa na sua execução.

b. do arguido BB:

Inconformado com o acórdão confirmatório, recorre para o STJ, rematando a alegação com as seguintes:

- conclusões:

II – (…) o recurso do Recorrente, não foi corretamente julgado, porquanto, o douto acórdão violou o preceituado no art.º 379º e 374º, n.º 2, al. b) e n.º 3, por omissão de pronúncia. E dever de fundamentação, consagrado no art.º 97º, nº 5, todos do Código Processo Penal, a exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão deve ser completa, contendo e enunciação das provas que serviram para fundar a convicção alcançada pelo tribunal, bem como a análise crítica de tais provas. Apesar do Recorrente ter cumprido os preceitos legais e demonstrando as provas produzidas em julgamento que levariam a um sentido diferente da decisão, sendo mesmo contraditório.

III - O exame crítico não pode traduzir-se numa simples afirmação e conclusões nem por súmula o douto Tribunal transcreveu os depoimentos das testemunhas, nomeadamente, as que têm interesse para a defesa do arguido, nem as declarações de co-arguido que provam, exatamente, o contrário, dá provados sem fazer qualquer referência, ao que foi afirmado em Tribunal pelas testemunhas, ignorando por completo os seus testemunhos condições pessoais.

IV – Ficou demonstrado a atividade profissional do arguido, assim como o facto do arguido ser consumidor

V – O tribunal a quo limita-se a tecer considerações abstratas, não explica detalhadamente os motivos que levaram a considerar como provados factos que não se produziu qualquer prova, ou a prova produzida é contrária à que vem no douto acórdão, mesmo com todas as testemunhas de acusação a negarem ter comprado produto estupefaciente ao arguido ou que vendessem droga e aliás dando esses factos como não provados e por fim acaba por condenar por venda a terceiros, que não se sabe quem … impossibilitando o recorrente e o tribunal de recurso de perceber e apreciar a bondade dos critérios lógicos que seguiu e inviabilizando a correta apreciação da impugnação da matéria de facto que o arguido infra irá apresentar. A falta do exame crítico das provas, imposto pelo art.º 374º, nº 2, do CPP, e a consequente insuficiência da fundamentação determina, nos termos do art.º 379º, nº 1, a), do mesmo código, a nulidade da sentença. Impõe-se que V. Exas ordenem o suprimento da nulidade verificada, com a consequente revogação da decisão e a determinação de prolação de novo Acórdão do qual conste a indicação especificada da prova testemunhal, fundamentadora da convicção e o exame crítico das provas.

Termos em que se requer seja declarado nulo o Acórdão, e em consequência, determinar a sua substituição por outro que supra a apontada nulidade.

VI – A decisão é assim ilegal, por violação do disposto na alínea d) do nº 1 e o nº 2 do art.º 374 do CPP, ilegalidade esta que acarreta a respetiva nulidade, als. a) e c) do nº 1 do art.º 379, e o reenvio do processo para novo julgamento, a efetuar pelo tribunal mais próximo, art.º 426–A, todos do CPP . Com a interpretação feita de tais preceitos, a decisão é inconstitucional por violação do disposto nos nºs 1, 1ª parte e nº 5 do art.º 32 da CRP.

VII - Existe várias contradições que nunca foram sanadas

VIII – O produto em causa é haxixe e este tipo produto não é possível adulterar conforme vem aqui vertido. Além de ser um facto dado como provado em contradição com os factos não provados estamos perante um erro notório da apreciação da prova, não se poderá confundir e tratar haxixe da mesma forma que se trata de heroína ou cocaína em que aí sim, existe uma preparação e uma adulteração com substâncias que fazem este tipo de produto estupefaciente ser mais rentável e lucrativo, o que não é o caso em apreço.

IX – O arguido BB declarou ser consumidor de haxixe e que de forma a poder “sustentar” seu vicio, de vez em quando cedia produto estupefaciente a outros.

Não se fez prova que fizesse parte de qualquer cadeia de distribuição, não auferia lucro económicos, nem conhecia mais nenhum arguido, com exceção do arguido GG e da arguida HH, por morarem no mesmo bairro, conforme já se referiu. Não foi feita qualquer prova que o arguido BB tivesse algum negócio de produto estupefaciente, com um lucro de valor de mercado a rondar cerca de € 6.000 a € 7.200,00 (seis mil euros a sete mil e duzentos euros).

XI - A modalidade de venda efetuada e confessada pelo arguido , assenta no contacto direto com os consumidores, teve por objeto um dos menos nocivos estupefacientes (resina de cannabis), o recorrente vivia num quarto alugado, num bairro social, não tendo nem evidenciando sinais de riqueza ou de lucros económicos que resultassem do trafico, como o julgador a quo decidiu, na verdade o recorrente trata-se dum individuo que vendia canábis pequena quantidades de canábis, conforme resulta provado no Acórdão.

XII - A ilicitude do recorrente constitui tráfico de menor gravidade, punível nos termos do art. 25, do DL nº 15/93, de 22-1, a situação do arguido que vivia na indigência, necessitando do ter um quarto alugado para se recolher; vendia o estupefaciente pela forma mais comum, assumindo, diretamente, os riscos de tal atividade; sendo ainda pouco significativa, a quantidade de droga para vender.

XIII - Ressalta ainda a conduta do arguido se caracterizar por ser um dos elos mais fracos na cadeia, isto é, o de comprar produto estupefaciente para o seu consumo e de vender algum desse produto para o sustentar o seu vicio, sem contudo ser o “dono” do negócio, ou a ele ter acesso direto.

XIV -   Pugna-se ainda pela ausência de qualquer suporte organizativo, estava fragilizado, quer por ser ele próprio consumidor de drogas, quer pelo facto de não ter fonte de rendimento, sem ser uns biscates que efetuava. Isto é, a atividade ilícita apurada, enquadra-se na chamada “venda de rua”, venda que se apurou ter como objetivo auferir proventos económicos destinados à subsistência

X - Ao julgar da forma como fez e condenar por este crime violou o princípio da inocência – Art- 32º da Constituição da República Portuguesa.

XV - Veja-se nesse sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça- Processo: 127/09.3PEFUN.S1, Data do Acordão:23-11-2011, disponível em www.dgsi.pt “ Porém, admitimos que aqueles que vendem na rua com a finalidade de, essencialmente, poderem prover o seu próprio consumo (não considerados legalmente como vendedores-consumidores para o efeito do art.º 26.º, onde se exige que essa finalidade seja exclusiva), devam gozar de uma maior condescendência quanto ao período temporal de manutenção da atividade, pois a toxicodependência é uma doença de difícil reversão, geradora de atos compulsivos. (…), a avaliação de uma atividade, seja ela qual for, obriga a uma definição prévia de critérios (ou de exemplos-padrão) e, portanto, dir-se-á que o agente do crime de tráfico de menor gravidade do art.º 25.º do DL 15/93, de 22 de Janeiro, deverá estar nas circunstâncias seguidamente enunciadas, tendencialmente cumulativas:

a) A atividade de tráfico é exercida por contacto direto do agente com quem consome (venda, cedência, etc.), isto é, sem recurso a intermediários ou a indivíduos contratados, e com os meios normais que as pessoas usam para se relacionarem (contacto pessoal, telefónico, internet);

b) Há que atentar nas quantidades que esse vendedor transmitia individualmente a cada um dos consumidores, se são adequadas ao consumo individual dos mesmos, sem adicionar todas as substâncias vendidas em determinado período, e verificar ainda se a quantidade que ele detinha num determinado momento é compatível com a sua pequena venda num período de tempo razoavelmente curto;

c) O período de duração da atividade pode prolongar-se até a um período de tempo tal que não se possa considerar o agente como “abastecedor”, a quem os consumidores recorriam sistematicamente em certa área há mais de um ano, salvo tratando-se de indivíduo que utiliza os proventos assim obtidos, essencialmente, para satisfazer o seu próprio consumo, caso em que aquele período poderá ser mais dilatado;

d) As operações de cultivo ou de corte e embalagem do produto são pouco sofisticadas.

e) Os meios de transporte empregues na dita atividade são os que o agente usa na vida diária para outros fins lícitos;

f) Os proventos obtidos são os necessários para a subsistência própria ou dos familiares dependentes, com um nível de vida necessariamente modesto e semelhante ao das outras pessoas do meio onde vivem, ou então os necessários para serem utilizados, essencialmente, no consumo próprio de produtos estupefacientes;

g) A atividade em causa deve ser exercida em área geográfica restrita

Ora, no caso em apreço, os factos provados demonstram que o recorrente está dentro dos critérios anteriormente definidos pela Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça!       Violou-se o disposto no citado dispositivo.

XVI – O arguido é primário, atualmente, a sua vida já está estruturada a namorada está a ser fundamental para aguentar esta sua reclusão; Assim parece-nos que deve ser dada uma oportunidade para a reintegração do arguido sendo que a pena pelo crime de tráfico deverá ser diminuída e suspensa a sua execução sob regime de prova.

XVII - Parece-nos ser tal condenação manifestamente exagerada, atentos os factos apurados, a culpa do agente, à ilicitude, os seus antecedentes, as suas perspetivas de reinserção social, bem como o universo de condenações em Portugal, por estes e outros crimes, forçoso será de concluir pela inadequabilidade de tal condenação;

XVIII - O produto estupefaciente foi apreendido, ou seja, não entrou em circulação. O arguido está socialmente integrado e familiarmente também, o que não acontecia á data dos factos.

XIX - Demonstrou um sincero arrependido, e exprimiu isso mesmo nas suas declarações, falou no seu consumo, mas que atualmente, livrou-se do consumo.

XX - Quando restituído à liberdade voltará para junto da sua companheira.

XXI- Atento aos factos provados e descritos no douto acórdão, o arguido tem hábitos de trabalho. Está arrependido. Justifica-se uma diminuição das penas a que o arguido veio a ser condenado, uma vez que a pena de 6 anos de prisão pelo crime de tráfico é demasiado elevada.

XXII – Tendo ainda em consideração o que vem a ser aplicado nos nossos tribunais a titulo de exemplo Ac. 6733/07-7, de 1/10/2007, do Tribunal da Relação de Lisboa, condena na pena de 7 anos de prisão um individuo com 30 Kilos de cocaína, Ac. 07P3761, de 14/11/2007, do Supremo Tribunal de Justiça, condena em 4 anos e 6 meses, pelo tráfico de heroína, Ac. 07P1610, de 11/07/2007, do Supremo Tribunal de Justiça, aplica 6 anos e 6 meses a um tráfico de 298 Kg de cocaína com um grau de pureza de 91,86% (www.dgsi.pt).

XXIII - No caso concreto estamos a falar de haxixe, houve uma notória violação da medida da pena aplicada ultrapassado em muito a medida da culpa concreta do arguido face aos factos dados como provados, tendo ainda, o acórdão em crise violado disposto nos artigos 40º, n.º 2 e 71, n.º 1 al. a), do Cód. Penal;

XIV - No caso do artigo 25º a moldura penal situa-se entre os 1 e os 5 anos de prisão, justifica-se a diminuição da pena a que foi condenado para os 3 anos, suspensa na sua execução. Satisfará igualmente os fins da pena de prevenção geral e especial.

Alega terem sido violadas as seguintes normas jurídicas:

- os artigos 32º da CRP, 21º do Dec-Lei n.º 15/93, 40º, n.º 2, 50º, 70º, 71º e 72º, do CP e 379º, 374º, 97º, 94º, do CPP

Peticiona que seja aplicado o principio do “in dubio pro reo”, e outra por falta de prova, caso assim não se entenda, deverá ser alterada deverá o recorrente ser condenado no crime de tráfico de menor gravidade, punível nos termos do art.º 25, do DL nº 15/93, de 22-1, numa pena não superior a 3 anos , suspensa na sua execução, tudo com as legais consequências, ou substituir-se por outra medida da pena que seja mais reduzida e que se ache mais adequada e proporcional ao caso concreto, suspensa na sua execução.

c. do arguido CC:

Inconformado com o acórdão confirmatório, recorre para o STJ, rematando a alegação com as seguintes:

- conclusões:

II – (…) o recurso do Recorrente, não foi corretamente julgado, porquanto, o douto acórdão violou o preceituado no art.º 379º e 374º, n.º 2, al. b) e n.º 3, por omissão de pronúncia. E dever de fundamentação, consagrado no art.º 97º, nº 5, todos do Código Processo Penal, a exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão deve ser completa, contendo e enunciação das provas que serviram para fundar a convicção alcançada pelo tribunal, bem como a análise crítica de tais provas. Apesar do Recorrente ter cumprido os preceitos legais e demonstrando as provas produzidas em julgamento que levariam a um sentido diferente da decisão, sendo mesmo contraditório.

III - O exame crítico não pode traduzir-se numa simples afirmação e conclusões nem por súmula o douto Tribunal transcreveu os depoimentos das testemunhas, nomeadamente, as que têm interesse para a defesa do arguido, nem as declarações de co-arguido que provam, exatamente, o contrário, dá provados sem fazer qualquer referência, ao que foi afirmado em Tribunal pelas testemunhas, ignorando por completo os seus testemunhos condições pessoais.

IV – Ficou demonstrado a atividade profissional do arguido como mecânico de automóvel, a origem dos seus rendimentos e bem como as viagens ao Algarve e por vezes iam a Espanha para abastecer as viaturas de combustível, para além do trabalho na empresa de Eventos da Eng.ª DD no Algarve

V – O tribunal a quo limita-se a tecer considerações abstratas, não explica detalhadamente os motivos que levaram a considerar como provados factos que não se produziu qualquer prova, ou a prova produzida é contrária à que vem no douto acórdão, mesmo com todas as testemunhas de acusação a negarem ter comprado produto estupefaciente ao arguido ou que vendessem droga e aliás dando esses factos como não provados e por fim acaba por condenar por venda a terceiros, que não se sabe quem e encontros que não se sabe para quê  impossibilitando o recorrente e o tribunal de recurso de perceber e apreciar a bondade dos critérios lógicos que seguiu e inviabilizando a correta apreciação da impugnação da matéria de facto que o arguido infra irá apresentar. A falta do exame crítico das provas, imposto pelo art.º 374º, nº 2, do CPP, e a consequente insuficiência da fundamentação determina, nos termos do art.º 379º, nº 1, a), do mesmo código, a nulidade da sentença. Impõe-se que V. Exas ordenem o suprimento da nulidade verificada, com a consequente revogação da decisão e a determinação de prolação de novo Acórdão do qual conste a indicação especificada da prova testemunhal, fundamentadora da convicção e o exame crítico das provas.

Termos em que se requer seja declarado nulo o Acórdão, e em consequência, determinar a sua substituição por outro que supra a apontada nulidade.

VI –A decisão é assim ilegal, por violação do disposto na alínea d) do nº 1 e o nº 2 do art.º 374 do CPP, ilegalidade esta que acarreta a respetiva nulidade, als. a) e c) do nº 1 do art.º 379, e o reenvio do processo para novo julgamento, a efetuar pelo tribunal mais próximo, art.º 426–A, todos do CPP. Com a interpretação feita de tais preceitos, a decisão é inconstitucional por violação do disposto nos nºs 1, 1ª parte e nº 5 do art.º 32 da CRP.

VII - Existe várias contradições que nunca foram sanadas.

VIII – O produto em causa é haxixe e este tipo produto não é possível adulterar conforme vem aqui vertido. Além de ser um facto dado como provado em contradição com os factos não provados estamos perante um erro notório da apreciação da prova, não se poderá confundir e tratar haxixe da mesma forma que se trata de heroína ou cocaína em que aí sim, existe uma preparação e uma adulteração com substâncias que fazem este tipo de produto estupefaciente ser mais rentável e lucrativo, o que não é o caso em apreço.

IX – Não se fez prova que o arguido fosse a Espanha buscar droga mas como refere a testemunhas de acusação foi em Tunes, Algarve, nem se provou a venda a terceiros e nem se quer se provou que as viaturas apreendidas foram adquiridas com a venda de droga ou que serviram para o transporte da mesma, assim deverão as mesmas serem restituídas aos seu proprietários.

X - Ao julgar da forma como fez e condenar por este crime violou o princípio da inocência – art. 32º da Constituição da República Portuguesa.

XI – O arguido é primário, atualmente, a sua vida já está estruturada a namorada está a ser fundamental para aguentar esta sua reclusão; Assim parece-nos que deve ser dada uma oportunidade para a reintegração do arguido sendo a pena de pelo crime de detenção de arma convertido em multa que poderá ser pago através de trabalho comunitário e a pena por tráfico deverá ser diminuída e suspensa a sua execução sob regime de prova.

XII - Parece-nos ser tal condenação manifestamente exagerada, atentos os factos apurados, a culpa do agente, à ilicitude, os seus antecedentes, as suas perspetivas de reinserção social, bem como o universo de condenações em Portugal, por estes e outros crimes, forçoso será de concluir pela inadequabilidade de tal condenação;

XIII - O produto estupefaciente foi apreendido, ou seja, não entrou em circulação. O arguido está socialmente integrado, tem mulher e uma filha menor que o apoiam, assim como os seus irmãos, e amigos.

XIV - Demonstrou um sincero arrependido, e exprimiu isso mesmo nas suas declarações, falou no seu consumo, mas que atualmente, livrou-se do consumo.

XV - Quando restituído à liberdade voltará para junto da mulher e da filha.

XVI- Atento aos factos provados e descritos no douto acórdão, o arguido tem hábitos de trabalho, Não tem antecedentes criminais. Está arrependido. Justifica-se uma diminuição das penas a que o arguido veio a ser condenado, uma vez que a pena de 6 anos de prisão pelo crime de tráfico;

XVII – Tendo ainda em consideração o que vem a ser aplicado nos nossos tribunais a titulo de exemplo Ac. 6733/07-7, de 1/10/2007, do Tribunal da Relação de Lisboa, condena na pena de 7 anos de prisão um individuo com 30 Kilos de cocaína, Ac. 07P3761, de 14/11/2007, do Supremo Tribunal de Justiça, condena em 4 anos e 6 meses, pelo tráfico de heroína, Ac. 07P1610, de 11/07/2007, do Supremo Tribunal de Justiça, aplica 6 anos e 6 meses a um tráfico de 298 Kg de cocaína com um grau de pureza de 91,86% (www.dgsi.pt).

XVIII - No caso concreto estamos a falar de haxixe, houve uma notória violação da medida da pena aplicada ultrapassado em muito a medida da culpa concreta do arguido face aos factos dados como provados, tendo ainda, o acórdão em crise violado disposto nos artigos 40º, n.º 2 e 71, n.º 1 al. a), do Cód. Penal;

XIX - No caso do artigo 21º a moldura penal situa-se entre os 4 e os 12 anos de prisão, justifica-se a diminuição da pena a que foi condenado e aplicação de uma pena de multa para o crime de detenção de arma. Satisfará igualmente os fins da pena de prevenção geral e especial.

Alega terem sido violadas as normas jurídicas seguintes:

- os artigos 32º da CRP, 21º do Dec-Lei n.º 15/93, 40º, n.º 2, 50º, 70º, 71º e 72º, do CP e 379º, 374º, 97º, 94º , do CPP

Peticiona que seja aplicado o principio do “in dubio pro reo”, e outra por falta de prova, caso assim não se entenda, deverá ser alterada a medida da pena em conformidade com o artigo 71, n.º 2, al. d) do Cód. Proc. Penal, e em consequência substituir-se por outra medida da pena que seja mais reduzida e que se ache mais adequada e proporcional ao caso concreto, suspensa na sua execução.

3. resposta do M.º P.º:

O Ministério Público junto do Tribunal da Relação respondeu, defendo a confirmação da decisão recorrida. Pugnando pela improcedência do recurso, culmina a motivação com as seguintes: 

- Conclusões:

1- Impõe-se concluir que o Acórdão recorrido tem fundamentação e motivação fáctica dos atos decisórios, através da exposição concisa e completa dos motivos de facto, bem como das razões de direito que justificaram a condenação dos arguidos e das penas aplicadas.

2 - O passado dos arguidos, revela personalidades malformadas, firmemente avessas ao direito, completamente indiferentes aos valores tutelados pelas normas penais violadas e à ameaça das respetivas sanções, não havendo indícios de que tenham interiorizado as respetivas culpas e a necessidade de censura penal.

3 - São razões de prevenção geral, de defesa do ordenamento jurídico, e razões de prevenção especial que impõem a manutenção das penas aplicadas, mostrando-se outras totalmente incapazes de realizar, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.

4. parecer do M.º P.º:

A Digna Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo, na vista a que alude o art.º 416º do CPP, pronuncia-se pela rejeição dos recursos dos arguidos CC e BB, com fundamento na dupla conforme, consagrada no art.º 400º n.º 1 al.ª f) do CPP, porquanto, tendo-lhes sido aplicada pena de 6 anos de prisão, a Relação confirmou integralmente a condenação da 1ª instância.

Com o mesmo fundamento, pronuncia-se pela irrecorribilidade do recurso do arguido AA na parte que visa a alteração da condenação na pena de 2 anos e 6 meses pelo crime de detenção de arma proibida, integralmente confirmada pela Relação.

No demais, pronuncia-se pela improcedência do recurso deste arguido argumentando que nos termos do art. 432º do CPP, o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça visa exclusivamente o reexame de matéria de direito, sem prejuízo do disposto nos nós 1 e 2 do art. 410º.

Aderindo à resposta do M.º P.º na Relação e aos fundamentos exposto na decisão da 1ª instância, entende que o acórdão recorrido não enferma de nulidade por omissão /insuficiência de fundamentação nem viola o princípio da inocência.

Citando a fundamentação da decisão da 1ª instância, defende a adequação e proporcionalidade da medida da pena parcelar pelo crime de tráfico e da pena única.


*


Prosseguindo o processo, colhidos os vistos, cumpre decidir.

B - OBJETO DO RECURSO:

Os sujeitos processuais suscitam as questões seguintes:

- rejeição, por dupla conforme, dos recursos dos arguidos BB e CC;

- rejeição parcial, por dupla conforme, do recurso do arguido AA;

- medida da pena para o crime de tráfico;

- dosimetria da pena única.

Oficiosamente, por determinação do disposto no art.º 417º n.º 6 al.ªs a) e b) do CPP, impõe-se ajuizar da rejeição dos recursos por extemporaneidade (apresentação muito para além do prazo legalmente estabelecido).

C - FUNDAMENTAÇÃO:

1. os factos:

Do acórdão recorrido extrai-se que a decisão condenatória assentou nos seguintes

- FACTOS PROVADOS:

1. Desde pelo menos Abril de 2017 até pelo menos 15 de Abril de 2018, o arguido AA, também conhecido por "II" ou "JJ" introduziu em Território Nacional, por via terrestre produto estupefaciente, concretamente cannabis, comummente apelidado como haxixe.

2. O arguido AA contava com o auxílio do arguido CC, nas diferentes tarefas necessárias para a introdução em Território Nacional do estupefaciente como o transporte, nomeadamente, no aluguer de viaturas automóveis, condução das mesmas transportando o estupefaciente ou fazendo a segurança do veículo que transportasse o estupefaciente, na sua posterior guarda, preparação e adulteração para revenda, distribuição entre diversos revendedores e consumidores do estupefaciente, entregando-a, mediante contrapartida monetária, cobrança das dívidas resultantes da venda do estupefaciente.

3. O arguido AA contava com o auxílio do arguido KK também conhecido por "LL", o qual disponibilizava a sua residência sita na Rua … Lote 00, …, …, para a guarda de parte do estupefaciente, entregando-o as pessoas indicadas por AA.

4. De entre os diversos revendedores de estupefaciente a quem o arguido AA entregava o estupefaciente mediante equivalente quantia monetária, figurava o arguido GG.

5. Deste modo, GG adquiria o estupefaciente a AA, diretamente ou através dos colaboradores deste, e após procedia a sua guarda e distribuição, preparação para revenda e revenda do mesmo, diretamente ou através dos seus colaboradores, nas zonas de Odivelas e Loures, entre os quais figurava o arguido BB, também conhecido pela alcunha de "MM", e a arguida HH, guardava na sua residência produto estupefaciente do arguido GG.

6. De entre os diversos revendedores de estupefaciente a quem o arguido GG entregava o estupefaciente mediante equivalente quantia monetária, figurava a arguida NN e o arguido OO, este conhecido pela alcunha de "PP", que contactava através dos cartões 91...62, 92...28, respetivamente.

7. Sendo que os arguidos NN e OO posteriormente, procediam a distribuição do estupefaciente entregue pelo arguido GG a outras pessoas, mediante a entrega de quantia monetária correspondente.

8. A atuação de distribuição de estupefaciente dos arguidos GG, OO e BB estendeu-se por diversas zonas geográficas da área metropolitana de Lisboa, nomeadamente, nos concelhos de Amadora (…), Odivelas (….) e Loures (… e …).

9. Com o objetivo de conseguir vantagens económicas e de assegurar para si um rendimento.

10. Era nessa atividade que os arguidos e outros indivíduos não concretamente identificados obtinham pelo menos parte dos rendimentos necessários a sua subsistência e ao seu enriquecimento.

11. Sendo que o valor de venda no mercado de cannabis-resina ronda o preço de € 1000,00 a € 1.200,00 (mil euros a mil e duzentos euros) por quilograma vendido.

12. O arguido BB, também conhecido pela alcunha de "MM", desde pelo menos Novembro de 2016 vem procedendo a aquisição, guarda, transporte, venda e distribuição de produto estupefaciente, designadamente haxixe, visando a distribuição, pela zona de Loures, Bairro …., daquele produto estupefaciente, tendo como contrapartida o recebimento de quantias monetárias, procedendo a revenda a diversos compradores de estupefaciente.

13. No dia 24.11.2016, as 12h, no restaurante C…, na cidade de Loures, na Rua ..., QQ, nascido em 00-00-2001, detinha, para consumo próprio 0,82 gramas de haxixe / liamba, o qual havia sido adquirido por si junto do arguido BB, um ou dois dias antes, pelo preço de 5 Euros, quando se encontrava no exterior do café "T….", sito na Praceta ………., 0, Lote 0, em … .

14. Nos moldes descritos QQ adquiriu ao arguido BB, pelo menos 3 vezes haxixe no valor de € 5,00, cada uma delas.

15. No dia 27 de Fevereiro de 2017, pelas 15h40, na Rua ..., em ..., o arguido BB tinha consigo, na sua mão direita vários pedaços de cannabis-resina com o peso líquido 18,612 gramas de cannabis-resina que lhe permitia obter 49 doses individuais para consumo que se preparava para entregar a pessoa não concretamente identificada, associada ao contacto 96...7, que conduzia viatura ligeiro de passageiros de marca Mercedes, modelo … com matrícula desconhecida. Bem como trazia consigo 40 euros em notas emitidas pelo Banco Central Europeu e no bolso esquerdo do casaco que trajava, no interior de uma caixa 1,126 gramas de cannabis (folhas e sumidades) que lhe permitia obter uma dose individual para consumo.

16. Na cozinha da sua residência, sita na Rua …., n.° 0, ..., ..., o arguido guardava ainda, naquela data e hora, uma placa de cannabis-resina com o peso líquido de 87,879 gramas, expondo como marca "AA", que lhe permitia obter duzentas e duas doses individuais para consumo, diversos pedaços, vulgo línguas, de cannabis-resina, com o peso líquido de 10,452 gramas que lhe permitia obter 24 doses individuais para consumo e vários pedaços de cannabis-resina acondicionados dentro de uma caixa de plástico com o peso líquido de 17,392 gramas que lhe permitia obter 36 doses individuais para consumo, uma faca e um rolo de película aderente para corte e acondicionamento do produto estupefaciente.

17. No seu quarto guardava o arguido 200 euros, em notas de vinte euros emitidas pelo Banco Central Europeu, e um papel com a inscrição de diversos nomes e quantias, representando as pessoas a quem havia vendido estupefaciente e os respetivos valores em dívida, de molde a controlar as respetivas dívidas monetárias.

18. O arguido foi sujeito a 1.° interrogatório judicial no dia ... .03.2017, tendo-lhe sido imputado um crime de tráfico de menor gravidade, pp. e pp. pelo artigo 21.°, n.° 1 e 25.°, alínea a), ambos do DL 15/93, de 22/01, por referência á Tabela I-C.

19. Por se ter considerado a existência de indícios fortes de perigo de continuação da atividade criminosa, uma vez que o arguido já foi por duas vezes condenado por crime de igual natureza, ficou sujeito á medida de coação de apresentação periódica quinzenal no OPC da sua residência.

20. No dia ... .11.2017, pelas 15:09, o Arguido guardava no banco traseiro, do lado direito, do veículo da marca Audi, modelo …., com a matrícula 00-CL-00, estacionado junto ao lote 0, da Rua … ,  …, ..., veículo que se encontrava na sua posse a mando de GG, a quem pertencia o veículo e o estupefaciente, um saco de plástico, contendo 8 (oito) embalagens de Cannabis - resina.

21. No quarto da sua residência, sita na Rua ...., n.° 0, …., . o Arguido guardava, em cima do parapeito da janela 2 (duas) placas de produto suspeito de ser haxixe.

22. Num total de 70 placas, com um peso líquido de 6.495,021 gr. (seis mil e quatrocentos e noventa e cinco, vírgula zero vinte e um gramas), quantidade de estupefaciente com o grau de pureza de 16,5% que permitia obter cerca de 21433 (vinte e um mil quatrocentos e trinta e três) doses individuais de produto para consumo e com um valor de mercado a rondar cerca de € 6.000 a € 7.200,00 (seis mil euros a sete mil e duzentos euros).

23. Em poder do Arguido foi ainda encontrado:

-1(um) telemóvel da marca Samsung, de cor azul-escuro, com o IMEI 3500000000000009.

-1(um) telemóvel da marca Alcatel Onetouch, de cor preto, com o IMEI 010000000000007.

24. O estupefaciente foi apreendido e o arguido BB foi detido nesse dia e sujeito a prisão preventiva desde o dia 08.11.2017.

25. O estupefaciente apreendido e que era guardado pelo Arguido BB a mando do Arguido GG, pertencia a este, utilizador do n.° de telemóvel 96...5, o qual lhe fora fornecido nesse dia, por volta das 12h42, na localidade de …, Amadora, pelo Arguido CC, conhecido pela alcunha "RR", por acordo com o arguido AA e instruções transmitidas por este.

26. Apesar do produto estupefaciente ter sido apreendido nos autos no dia 07.11.2017, AA exigiu a GG o pagamento integral pela venda do mesmo.

27. Muitos dos termos deste negócio de tráfico de estupefacientes eram estabelecidos e concretizados tanto através de conversas telefónicas como encontros pessoais no interior e/ou imediações do Bairro …., sito na …., Amadora.

28. GG, fazendo uso do telemóvel com o IMEI 350000000000070 e cartão 96...5, residente no Bairro ....,..., como supra referido, pelo menos desde 07.11.2017 adquiriu a AA e consequentemente a CC, deslocando-se, para tanto, em viaturas conduzidas por terceiros, à …., …., Amadora.

29. Posteriormente, com o objetivo de guardar e revender o estupefaciente, armazenava-o e guardava-o nas habitações de HH (92...048) e SS, pelo menos no mês de Dezembro de 2017 e Janeiro de 2018, respetivamente, sendo que HH, cumprindo instruções do arguido, entregava o número de placas indicado ao arguido GG, ou conforme determinado por este.

30. Já em Março e Abril de 2018, passou a fazer a guarda do estupefaciente na sua habitação e contar com a colaboração do seu irmão (TT - utilizador do número de telemóvel 96...74) ou da sua esposa (UU - utilizadora do número de telemóvel 96...30), na preparação do estupefaciente ou entregas desse produto, quando solicitado por si.

31. GG, escoava o estupefaciente a um conjunto de compradores, e revendedores nas localidades de Loures e Santo António dos Cavaleiros, nem todos concretamente identificados, designadamente e entre outros a:

32. VV e OO que apelidava de "PP".

33. No dia ... .04.2018, GG, após estabelecer conversação telefónica com a arguida NN, utilizadora do número de telemóvel 91...062, encontrou-se com esta, pelas 20.40, na Rua …., sita no Bairro ……, ... e entregou-lhe dois pedaços de cannabis-resina com o peso de 124,79 gramas.

34. Após o que, pelas 20h45 foi apreendida à Arguida NN 124,79 gr. de "haxixe", no interior do seu veículo ligeiro de passageiro de marca Renault, modelo ….. com a matrícula 00-00-ZM, quando circulava na Rua …, ..., junto à residência desta, sita no …, …, ... .

35. Como à arguida NN, em iguais circunstancias e sempre após contactos prévios, entre ambos, servindo para definir local e quantidade de estupefaciente, NN adquiriu estupefaciente a GG nos seguintes dias:

36. 12.01.2018, por volta das 20.38,  quantidade não concretamente apurada, nas imediações do Bairro ………., .... .

37. 05.03.2018, por  volta das 23.11, quantidade não concretamente apurada, nas imediações da residência do GG sita na Rua …………, Lote 0, …….., …. e por intermédio da esposa deste;

38. 01.04.2018, por volta das 18.50, quantidade não concretamente apurada, nas imediações do Bairro …, ..., por intermédio do irmão do GG

39. 06.04.2018, por volta das 17.47, quantidade entendida por ambos por "2", significando duas placas de haxixe (cerca de 200 gr.), nas imediações da residência do GG e por intermédio da esposa deste;

40. 11.04.2018, depois das 19.03, nas imediações da residência da NN, apenas para entregar ao GG, quantia monetária não concretamente apurada.

41. Ao arguido OO residente em ..., fazendo uso do telemóvel com o IMEI 30000000000088 (alvo 95...0) e cartão 92...28 (alvo 95...40), pelo menos desde 06.12.2017 a 10.03.2018, o arguido GG vendeu-lhe estupefaciente, concretamente cannabis-resina, para aquele posteriormente revender a outros adquirentes desse produto e, que o procuravam, nas imediações da sua habitação sita Rua ....° 00, …, ..., ou nas imediações do café "P…….", sito nessa qualidade, ou nas imediações do ... de ... .

42. OO revendeu o estupefaciente adquirido a GG e a outros revendedores, a diversos consumidores e revendedores do estupefaciente, entregando cada placa de cannabis- resina, a qual possui o peso aproximado de 100 gramas, pelo valor de € 120,00 (cento e vinte euros).

43. OO, a 15.04.2018, pelas 20.00, junto ao café "P……." sito na Av. …., ..., tinha na sua posse 1 (um) pedaço de cannabis-resina com o peso líquido de 1,669 gr.

44. AA, pelo menos desde Abril de 2017, introduziu em Território Nacional, a partir de Espanha, cannabis.

45. Para tanto, o arguido AA contou com colaboração de CC e KK.

46. AA, desde pelo menos Abril de 2017 até a data da sua detenção, 15.04.2018, tem como fornecedor de estupefaciente, pessoa não identificada, que residirá na província de Huelva, Ayamonte, Espanha, local onde este se deslocou durante este período, adquirindo quantidades significativas de estupefaciente e que com o auxílio de outros, transportou para o distrito de Lisboa, ... .

47. Como tal, pelo menos desde Abril de 2017, AA, com o auxílio de pelo menos CC e outros não concretamente identificados introduziu em Território Nacional e vendeu cannabis, alguns deles com as seguintes marcas: "AA", "SABATE", "2017", "REAL MADRID" e "CRICITAL".

48. Como meio de transporte do estupefaciente de Espanha para Portugal e para a área Metropolitana de Lisboa, AA e os indivíduos que o auxiliaram, utilizaram pelo menos os veículos com as matrículas 00-SQ-00, e 00-QD-00.

49. Nessas viagens e no âmbito das transações de estupefaciente, AA e CC utilizavam telemóveis para conversarem entre si, ou com os que lhes adquiriam estupefaciente, por mensagens escritas, de molde a evitarem serem intercetados numa investigação judicial.

50. AA, por intermédio de CC, alugou veículos na loja ….., na Avenida …., 0000 000 Lisboa, com as matrículas 00-TH-00 e 00-QD-00 ou usar os próprios, ou seja, e entre outros o de matrículas 00-SQ-00.

51. AA por vezes sozinho, outras vezes acompanhado por CC, ou apenas indo este com base em instruções suas, se deslocaram a Espanha/ província de Huelva, Ayamonte, onde compraram e trouxeram para Portugal montante não totalmente apurado de haxixe.

52. Registaram-se deslocações ao Algarve e/ou a Espanha nos seguintes dias:

09.04.2017 (00-00-PD),

10.04.2017 (00-SQ-00),

15.04.2017 (00-PZ-00 e 00-SQ-00),

06.05.2017 (00-00-PD),

14.05.2017 (00-00-PD)

27.05.2017 (00-SQ-00 e 00-00-PD),

29.05.2017 (00-SQ-00 e 00-PZ-00),

10.06.2017 (00-PZ-00),

15.06.2017 (00-SQ-00),

29.06.2017 (00-PZ-00),

02.07.2017 (00-PZ-00),

04.07.2017 (00-PZ-00),

11.07.2017 (00-SQ-00),

12.07.2017 (00-SQ-00),      

14.07.2017 (00-SQ-00),

21.07.2017 (00-SQ-00),

20.08.2017 (00-SQ-00),

24.08.2017 (00-SQ- 00),

25.08.2017 (00-SQ-00),

26.08.2017 (00-SQ-00),

28.08.2017 (00-SQ-00 e 00-00-PD),

29.08.2017 (00-SQ-00 e 00-00-PD),

03.09.2017 (00-SQ-00 e 00-00-PD),

20.09.2017 (00-00-PD),

21.09.2017 (00-00-PD),

23.09.2017 (00-TM-00 e 00-SQ-00),                    

01.10.2017  (00-00-PD),

06.10.2017 (00-TM-00),

09.10.2017 (00-SQ-00 e 00-00-PD),

14.10.2017 (00-TM-00),

16.10.2017 (00-00-PD),

19.10.2017 (00-00- PD, 00-SQ-00 e 00-TM-00),

01.11.2017 (00-SQ-00),

06.11.2017 (00- TM-00 e 00-SQ-00),

08.11.2017 (00-TM-00 e 00-SQ-00),

21.11.2017 (00-TM-00 e 00-SQ-00),

01.12.2017 (00-TM-00 e 00-SQ-00),

07.12.2017 (00-TM-00 e 00-SQ-00),

13.12.2017 (00-TM-00 e 00-SQ- 00),

19.12.2017 (00-TM-00 e 00-SQ-00),

03.01.2018 (00-TM-00 e 00-SQ-00),

07.01.2018 (00-TM-00 e 00-SQ-00),

15.01.2018 (00-SQ-00),

18.01.2018 (B0000E),

20.01.2018 (00-SQ-00 e B0000E),

21.01.2018 (B0000E),

24.01.2018 (00-SQ-00 e 00-00-PD),

08.02.2018 (B0000E),

13.02.2018 (B0000E),

16.02.2018 (B0000E),

17.02.2018 (00-SQ-00 e B0000E),

18. 02.2018 (00-SQ-00 e B0000E),

19.02.2018 (00-SQ-00 e B0000E),

02.03.2018 (00-TM-00 e 00-TH-00),

03.03.2018 (00-TM-00 e 00-TH-00),

05.03.2018 (00-TM-00 e 00-TH-00),

13.03.2018 (00-TM- 00),

17.03.2018 (00-TM-00 e 00-TH-37),

26.03.2018 (00-TM-00 e 00-TH-00),

11.04.2018 (00-QD-00 e 00-00-PD).

53. AA, deslocou-se a zona de Tunes, Algarve e a província de Huelva, Ayamonte, Espanha, acompanhado por CC e pelo menos em algumas destas vezes adquiriu produto estupefaciente que posteriormente com a colaboração de CC, vendeu na área metropolitana de Lisboa, designadamente ao arguido GG;

54. Tais deslocações ocorreram nos seguintes dias:

- A 20.01.2018 (sábado), utilizando as viaturas com as matrículas B 0000 e 00-SQ-00, com a colaboração de CC.

- A 18.02.2018 (Domingo), utilizando as viaturas com as matrículas B 0000 e 00-SQ-00,

- A 05.03.2018 (segunda feira), utilizando viaturas com as matrículas 00- TM-00 e 00-TH-00.

- A 17.03.2018 (sábado), utilizando, as viaturas com as matrículas 00-TM-04 e 00-TH-07, acompanhado por CC.

- A 26.03.2018, com a viatura com as matrículas 00-TM-00 e 00-TH-00, na companhia do CC.

55. Os arguidos, AA, CCo, tal como os suspeitos de lhes adquirir estupefaciente trocavam periodicamente de cartões/telemóveis.

56. Durante o período em causa, estes arguidos utilizaram os seguintes números de telemóvel e aparelhos de telemóvel com os IMEI's:

57. AA - 92...91, 96...64, 96...12, 96...65, 92...6, 96...68, 96...54, 92...77 e IMEI's com os números 30000000000053 - onde funcionaram os cartões de telemóvel com os números 96...65, 92...06, 92...77, 92...78 e 30000000000091 onde funcionou o cartão de telemóvel com o número 96...64;

58. CC -92...93, 96...09 92...78, 96...18, 91...34, 92...043, 96...78, 91...34, 92...97, 92...40, 96...24, 92...27, 96...68. 96...34, 92...50.

59. AA procedia a entregas de estupefaciente em troca da correspondente quantia monetária, no interior do Bairro ...., ...., diretamente ou através de outros, como CC ou KK.

60. Assim sendo, o arguido AA, diretamente ou através de outros que este instruía, entregou estupefaciente, em troca da correspondente quantia monetária, entre outros, a:

61. GG, residente no Bairro …./.... e …./..., utilizador do cartão SIM - 96...25;

62. O arguido AA no período entre 8.12.2017 e 1.04.2018, efetuou vários contactos telefónicos com diversos indivíduos, em que foi utilizada linguagem cifrada, a maior parte das vezes fazendo apenas referência a algarismos ou letras, marcando ainda encontros com os interlocutores em diversos lugares.

63. CC deslocava-se no veículo de matrícula 00-SQ-00 ou outros veículos alugados (00-TH-00 - 00-QD-00) e recebendo orientações do AA, através de conversações telefónicas ou pessoais, demonstrou ser a pessoa da sua confiança e nessa medida, sob a sua coordenação, deslocou-se com frequência á residência de KK, conhecido por "LL", onde guardavam o produto da sua atividade - estupefaciente e telemóveis.

64. KK, apelidado por "LL", fazendo a utilização do telemóvel com o IMEI 80000000000060 e o cartão 96...29, pelo menos desde Dezembro de 2017, passou a guardar na sua habitação parte do estupefaciente de AA e consentiu que este, ou CC, às mais variadas horas, lá se deslocassem para recolher estupefacientes.

65. Não estando em casa, por razões laborais, o arguido KK informou a sua companheira - WW (utilizadora no número de telemóvel 96...88) que alguém iria deslocar-se à sua residência.

66. No dia 10.04.2018 CC regressou a Lisboa após estadia no Algarve.

67. No dia 11.04.2018 CC, sob a coordenação de AA, pelas 11.13, na Avenida ...., 00 ….. 0000 000 Lisboa, alugou a viatura com a matrícula 00-QD-00, para o acompanhar em viatura própria (00-00-PD) e se deslocarem ao Sul do País, ou a Espanha, para adquirirem e transportar quantidade não concretamente apurada de estupefaciente no interior da viatura alugada.

68. A referida viatura alugada foi estacionada por estes arguidos, na rua …, sita nos …, com estupefaciente no seu interior.

69. No dia 13.04.2018 AA contactou com a cidadã não identificada, utilizadora do cartão 92...08, pessoa que colabora com o fornecedor de estupefaciente do AA nessa atividade, estabelecendo encontro para o dia seguinte com o objetivo de lhe adquirir produto estupefaciente.

70. Pelo que, de modo a obter o dinheiro suficiente para compra do mesmo, deu indicações a CC se encontrar com individuo apelidado por "XX", para receber deste dinheiro devido pela aquisição a estes arguidos de estupefaciente.

71. No dia 14.04.2018 os arguidos, AA e CC completaram os últimos preparativos para a viagem que iriam realizar no dia seguinte, com destino a Espanha para trazer para a área Metropolitana de Lisboa cannabis para revenda.

72. AA com a participação de CC, retirou do interior da viatura com matrícula 00-QD-00, quantidade não concretamente apurada de estupefaciente que entregou a GG e a restante que depositou no interior do Bairro ...,... .

73. AA entregou parte do estupefaciente adquirido - 10 quilogramas de cannabis, de marca "REAL MADRID", a GG, para revenda, no dia 14.04.2018, pelas 18.27.

74. Deste modo, AA e CC prepararam a viatura para a viagem.

75. Procederam ainda á recolha de diversas quantias monetárias devidas pela aquisição a estes do seu produto estupefaciente, á aquisição de novos cartões e telemóveis por intermédio de CC de molde a serem utilizados unicamente naquela viagem e para falarem entre si, contactaram a cidadã não identificada, utilizadora do número de telemóvel 92...08 de molde a combinarem a entrega por esta de cannabis em forma do comummente apelidado por "bolota" e iniciaram viagem, separados, em viaturas distintas, a movimentação da viatura com a matrícula 00-QD-00 do Bairro .... para o interior do Bairro ..., ...., ... .

76. CC, ainda no dia 14.04.2018, por volta das 23.30, iniciou a viagem no veículo com a matrícula 00-SQ-00 e,

77. AA, por volta das 00.35, de 15.04.2018, iniciou a viagem no veículo de matrícula 00-QD-00

78. Pernoitando ambos no Hotel ... em ...., Algarve.

79. No dia 15.04.2018 pelas 09.29, na localidade de ..., ..., Algarve, localizou-se o veículo com a matrícula 00-QD-00, posteriormente conduzida por AA e precedido por CC na viatura com matrícula 00-SQ-00, altura em que arrancaram para o interior da província de Huelva, Ayamonte, Espanha.

80. Os arguidos entraram em Portugal pelas 10.52/57, conduzindo os mesmos veículos com sentido Sul / Norte.

81. Nesse trajeto, pelas 11.35, AA, efetuou uma paragem na localidade de Algoz e estacionou o veículo com a matrícula 00-QD-00, na estrada dos Amendoais, passando a circular no veículo conduzido por CC (00-SQ-00).

82. Após, deslocaram-se, para junto da cidadã não identificada, utilizadora do cartão de telemóvel com o número 92...08, para se fornecerem do que se entende ter sido o estupefaciente apreendido e designado por "bolota", com o peso bruto de 10.200,00 (dez quilos e duzentos gramas).

83. Após paragem nessa localidade, pelas 16.30, iniciaram viagem com sentido a Lisboa, sendo que CC passou a conduzir o veículo que possuía o estupefaciente enquanto AA passou a conduzir a viatura com matrícula 00-SQ-00, na sua dianteira ocupando a função de "batedor" para identificar eventuais patrulhas de polícia na A2 ou viaturas que considerasse suspeitas.

84. Nesse mesmo dia, os arguidos foram abordados pelos agentes policiais, mais concretamente CC pelas 18.30 do dia 15.04.2018, nas portagens da Ponte Vasco da Gama, no sentido Sul / Norte, no interior da viatura com a matrícula 00-QD-00 e AA na Rua ...., ..., no interior da viatura com a matrícula 00-SQ-00, acompanhado pelo arguido KK, quando efetuava diligências junto deste no sentido deste lhe disponibilizar uma garagem onde pudesse colocar o estupefaciente transportado por CC.

85. Realizadas as buscas veio a ser localizado e apreendido os seguintes artigos e substancias, aos arguidos infra identificados:

86. Ao arguido CC foi apreendido:

- No interior do veículo da marca Volkswagen, modelo …., com a matrícula 00-QD-00 pelas 23H45/55, do dia 15.04.2018:

- na mala do carro, um saco do Pingo Doce contendo dez embalagens acondicionando o total de 991 (novecentas e noventa e uma) "bolotas" de haxixe / cannabis com o peso liquido de 9412,259 gramas;

- junto do pneu suplente, quatro embalagens que acondicionavam o total de 350 (trezentas e cinquenta) "placas" de haxixe / cannabis com o peso liquido de 34563,375 gramas, ostentando, cada uma, o emblema do clube Real Madrid (fls. 1588, 1589) (trinta e cinco quilos, quinhentos e cinquenta gramas);

- junto ao isqueiro auto, um telemóvel com o IMEI 30000000000071 e um telemóvel com o IMEI 30000000000089, com cartões da MEO e USO;

- No dia 15.04.2018, pelas 19h35:

-  dentro do bolso do casaco que CC trajava, um documento referente ao aluguer da viatura 00-QD-00, em seu nome, efetuado pelo próprio, na Rent-a-Car, ………., sita na Avenida ..., 00 ….. 0000 000 Lisboa, no dia 11.04.2018, pelas 11.13;

- dentro do bolso interior do mesmo casaco, a quantia monetária de € 490,00 (quatrocentos e noventa euros);

- No interior da residência de CC sita na Rua ...., n.° 0, ..., 0000 ..., nesse dia, entre as 20h05 e as 21h10 foi apreendido um telemóvel ao arguido com o IMEI 800000000000065 (alvo 97...70) e 800000000000064 com o cartão SIM/91...34 (alvo 97...0), cartão e telemóvel utilizado por CC;

87. Ao arguido AA foi apreendido a 15.04.2018, quando foi abordado pelas 18.45, no interior do veículo com a matrícula 00-SQ-00, acompanhado por KK:

- Na sua posse:

- um telemóvel com o IMEI 300000000000041 e um telemóvel com o IMEI 300000000000046, um com um cartão da Lycambile e outro com um cartão da Vodafone;

- € 495,00 (quatrocentos e noventa e cinco euros)

- No interior do veículo da marca Renault, modelo ….., com a matrícula 00-SQ-00 pelas 23h35, do dia 15.04.2018, ao arguido AA foi apreendido:

- no compartimento da porta da frente lado esquerdo (condutor):

- uma fatura da "………. Renta a Car" (Check-Out 02/03/2018 e Check-In previsto 06/03/2018, referente a aluguer da viatura ligeiro de passageiros de marca VW, modelo .... com a matrícula 00-TH-00, efetuado por, CC;

- uma fatura da Brisa com a data e hora de 2018-04-15 18:06:43 de Entrada 0222 Paderne com saída 1213 Pinhal Novo;

- um telemóvel com os IMEI's 300000000000074 (alvo 98006050/ cartões 96...34 e 92...50) e 300000000000082 (alvo 98...050/cartão 96...68, 92...97, 92...74 e 920000097), com cartões da MEO;

- um telemóvel com os IMEI's 300000000000072 e 300000000000080 com cartão da Lycamobile;

- um telemóvel com os IMEI's 300000000000035 (alvo 97...50/cartões 96...65, 92...06, 92...77, 92...78) e 300000000000043, com cartão da MEO;

- um telemóvel com o IMEI 300000000000010, com cartão da Lebara;

- na consola central junto a manete das mudanças:

- uma embalagem da MEO com o cartão de suporte respectivo ao PIN e PUK correspondente ao número 920000040 utilizado por CC (sob intercepção - alvo 90000040);

- uma embalagem da MEO com o cartão de suporte respectivo ao PIN e PUK correspondente ao número 920000027 utilizado por CC (sob intercepção – alvo 97696040);

- Na sua residência sita na Praça ...., lote 00, ….., ...., ..., entre as 19.30 e as 20.00, apreendeu-se ao arguido AA:

- no quarto de AA:

- na segunda gaveta da cómoda, do lado esquerdo, uma arma de fogo de marca Browning's Patent, de calibre 7,65 mm, com um carregador alojado na mesma, contendo sete munições de calibre 7,65 por deflagrar;

- em cima do móvel da televisão um telemóvel com o IMEI 300000000000024 (alvo 98...50) e com o número de telemóvel 96...68 (alvo 98...40), telemóvel e cartão utilizado pelo AA;

- debaixo da gaveta da cómoda, lado direito, um telemóvel com os IMEI's 350000000000069 e 300000000000077 com um cartão da Lycamobile;

- no bolso do casaco de cor preta que se encontrava no roupeiro € 300,00 (trezentos euros);

- em cima do móvel de televisão um aerossol de defesa CS, contendo clorobenzalmalononitrilo (CS), substância que possui propriedades lacrimogéneas;

- em cima do móvel de televisão, num interior de um copo, 240 (duzentos e quarenta) dinares;

- dentro do mesmo copo, uma munição de calibre 7,65 mm por deflagrar e duas embalagens de MDMA, uma com o peso líquido de 0,529 gr. e outra com o peso liquido de 0,262 gr.;

- em cima do móvel da televisão a chave suplente da viatura ligeiro de passageiros de marca VW, modelo …… com a matrícula 00-00-PD;

88. Ao arguido KK foi apreendido a 15.04.2018:

- Na sua residência sita na Rua ...., n.° ...…, …….., …...., ..... - fls. 1467/9, pelas 18h51:

- no quarto do arguido foi-lhe apreendido:

- a quantia de € 150,00 (cento e cinquenta euros);

- na gaveta superior do lado esquerdo, no interior de uma caixa, encontrava-se uma outra caixa contendo:

- vinte embalagens contendo cocaína com o peso liquido de 1.272 gr. (um virgula duzentos e setenta e dois gramas),

- quatro "placas" de haxixe / cannabis e

- um coador metálico usado na preparação da cocaína para revenda e consumo;

- na gaveta superior do lado direito, duas facas de cozinha com resíduos de haxixe, utilizadas no corte e preparação do estupefaciente para revenda;

- na sala:

-no interior de um móvel, dentro de uma caixa de papel foi localizado um pedaço de haxixe e um rolo de papel vegetal em uso, utilizado para acondicionar as doses de estupefaciente para revenda;

- na prateleira superior do referido móvel um maço de tabaco contendo cannabis;

89. Sendo que no total foi apreendido a KK, no interior da sua residência cannabis com o peso total de 220,000 (duzentas e vinte gramas).

90. Ao arguido GG, foi-lhe apreendido no dia 15.04.2018, pelas 23h20:

- no bolso da frente do lado direito do casaco que o arguido trajava um telemóvel com o IMEI 300000000000081, com o cartão de telemóvel 96...25, utilizados pelo arguido, bem como € 300,00 (trezentos euros);

- No interior da sua residência sita na Rua ..., Lote 0, ……, ..., pelas 23h20, foi apreendido ao arguido:

- no contador da electricidade, localizado no corredor a entrada da porta, um boxer, vulgarmente conhecido por soqueira - sendo o mesmo um objecto de metal composto por quatro orifícios que se encaixam nos dedos como anéis, para ser empunhado quando se desfere um soco de modo a aumentar as lesões desse soco na superfície onde embate;

- no quarto do filho, debaixo da cama, um saco de plástico contendo 100 (cem) "placas" de haxixe / cannabis com o peso liquido de 9823,679 grs. e num outro saco de plástico de cor preta contendo 28 (vinte e oito) "placas" de haxixe / cannabis com o peso liquido de 2752,834 grs.;

- no quarto do arguido, no interior de uma caixa contendo € 125,00 (cento e vinte e cinco euros);

- na sala de estar, no interior de uma caixa de cartão, em cima do móvel de televisão uma balança de precisão, um rolo de película aderente, ambos usados na preparação do estupefaciente para revenda e uma caixa de telemóvel com o IMEI 300000000000070 (alvo 955...70), utilizado pelo arguido.

- No interior da residência sita na Rua .., lote 0, ..., B, .... , em ... - fls. 1514/7, no dia 16.04.2018, pelas 00h05, foi apreendido ao arguido GG:

- no quarto:

- na secretária do computador, no interior da última gaveta cinco "placas" de haxixe / cannabis, envoltas em papel autocolante com a inscrição "cricital" com o peso liquido de 491,692 grs.;

- no interior da mesma gaveta, um saco de papel contendo dois cartuchos de calibre .12 GA, bem como doze munições de calibre.38 special, modelo hollow point (ponta oca), por deflagrar;

- debaixo da cama, no interior de um saco desportivo uma faca com vestígios de cannabis usada no corte e preparação do estupefaciente para revenda, bem como uma embalagem de estupefaciente própria para acondicionar cerca de um quilograma vazia composta por um invólucro de fita cola de cor castanha;

- no interior de um guarda-roupa, um cofre contendo duas placas de haxixe / cannabis com a inscrição "Sabata" com o peso liquido de 192,105 gramas e a quantia monetária de € 550,00 (quinhentos e cinquenta euros);

- em cima do guarda-roupa, no interior de uma caixa de papelão, uma balança de precisão medindo entre 0,1 grama e 500 gramas, usada na divisão e preparação do estupefaciente para revenda;

91. No total foi apreendido ao arguido GG haxixe / cannabis com o peso total de 13.260,31 (treze quilos, seiscentos e sessenta gramas vírgula trinta e um);

92. NN no dia 15.04.2018, pelas 20h45 foi intercetada na Rua ..., ... a conduzir a viatura de marca Renault, modelo …., de cor cinza, com a matrícula 00-00-ZM, tendo consigo uma placa e um pedaço de haxixe / canábis com o peso líquido de 121,940 (cento e vinte e um vírgula novecentos e quarenta gramas).

93. Tendo em consideração que o valor de mercado do estupefaciente cannabis vendido pelos arguidos ronda para a venda em forma de "bolota" o valor de € 40,00 (quarenta euros) cada bolota e que cada "placa" de cannabis destinava-se a ser vendida pelo preço de € 100,00 e € 120,00 cada "placa", o estupefaciente apreendido aos arguidos, no que tange á cannabis em forma de bolota, valeria o total de € 39.640,00 (trinta e nove mil, seiscentos e quarenta euros) e no que tange á cannabis em forma de "placa", valeria o total entre € 35.500,00 e € 42.600,00.

94. Os veículos apreendidos eram utilizados no âmbito da atividade de tráfico de estupefacientes.

95. Nas suas conversações telefónicas tidas por todos arguidos, entre si e com terceiros, fornecedores e compradores de produtos estupefacientes, os arguidos utilizavam uma linguagem cifrada, para se referirem ao estupefaciente e aos termos do negócio de tais produtos.

96. Não havia qualquer razão para que o arguido GG detivesse naquele local e hora o referido boxer em seu poder, nem tão pouco o arguido se aprestava para exercer alguma atividade onde tivesse necessidade de utilizar o mesmo, para além de o utilizar como meio de agressão, bem sabendo o arguido que, nessas circunstancias, era proibida a sua detenção, uso e porte.

97. O arguido GG sabia que o boxer é apto a servir como arma de agressão e causar lesões físicas a pessoas.

98. O arguido AA sabia que não tinha autorização e era proibido possuir o aerossol de defesa, com aquelas características, que lhe foi apreendido.

99. Os arguidos AA e GG sabiam que não tinham licença ou autorização para deterem e guardarem arma de fogo e respetivas munições, conhecendo as características da arma de fogo e munições supra descritas, e mesmo assim quiseram detê-las, sabendo que tal era proibido e punido por lei.

100. Todos os arguidos, ao praticar os factos acima descritos - relacionados com a importação, detenção, transporte, guarda, adulteração, preparação, divisão, distribuição, compra, venda, colocação a venda, oferecimento, cedência ou recebimento de produto estupefaciente supra mencionado, principalmente cannabis, agiram com a sua vontade livremente determinada,

101. Os arguidos tinham consciência de estarem a desenvolver essa atividade no âmbito de um grupo de pessoas, que visava a prossecução dessas atividades.

102. Tinha a consciência da natureza estupefaciente de tais produtos.

103. E sabiam que a sua detenção, transporte, compra, guarda, adulteração, preparação, divisão, distribuição, venda, colocação a venda, oferecimento, cedência ou recebimento eram proibidos por lei e criminalmente punidos.

104. Com as condutas descritas, visaram e conseguiram obter rendimento para todos estes arguidos - arguidos AA, CC e GG.

105. Os arguidos AA e GG conheciam as características das armas e munições que possuíam e guardavam e sabiam que não tinha autorização legal para tanto e que a sua guarda detenção era proibida e punida por lei e mesmo assim quiseram detê-las e guardá-las.

106. Ao agirem da forma descrita, fizeram-no sempre com a sua vontade livremente determinada.

107. Sabendo que praticavam factos proibidos e punidos por lei.

108. Os arguidos AA e NN confessaram parcialmente os factos que lhe são imputados.

109. O arguido BB confessou os factos que lhe são imputados em termos coincidentes com os tidos por demonstrados.

110. Consta do CRC do arguido BB:

- Por decisão proferida em 30.10.2009, transitada em julgado em 30.10.2009, o arguido foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 45 dias de multa. Declarada extinta em 30.10.2013,

- Por decisão proferida em 25.07.2011, transitada em julgado em 30.09.2011, o arguido foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art° 21° do DL 15/93 de 22.01, na pena de 15 meses de prisão, suspensa por igual período de tempo, sujeita a regime de prova. Declarada extinta em 04.01.2013.

111. Consta do CRC do arguido OO:  (…).

112. Consta do CRC do arguido GG (…).

113. Consta do CRC do arguido AA:

- Por decisão proferida em 04.06.02, transitada em julgado em o arguido foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art° 25° a) do DL 15/93 de 22.01, na pena de 13 meses de prisão, suspensa por 2 anos. Declarada extinta em 23.09.2008.

- Por decisão proferida em 15.06.05, transitada em julgado em 05.07.2005. o arguido foi condenado pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art° 6° da Lei 22/97 de 16.02.2005, na pena de 150 dias de multa. Declarada extinta em 19.06.2006.

- Por decisão proferida em 02.12.2003, transitada em julgado em 18.12.2003 o arguido foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art° 21° do DL 15/93 de 22.01, na pena de 5 anos de prisão.

- Por decisão proferida em 02.12.2004, transitada em julgado em 21-12.2004 o arguido foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art° 21° do DL 15/93 de 22.01, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão.

- Por decisão proferida em 06.10.2006, transitada em julgado em 23.10.2006 o arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art° 3° do DL 2/98 de 3.01, e um crime de ofensa a integridade física qualificada, p. e p. pelo art° 148° do C.Penal, na pena única de 9 meses de prisão.

- Por decisão proferida em 11.04.2008, transitada em julgado em 14.08.2008 o arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art° 3° do DL 2/98 de 3.01, na pena de 200 dias de multa.

- Por decisão proferida em 28.11.2008, transitada em julgado em 18.12.2010 o arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art° 3° do DL 2/98 de 3.01, na pena de 10 meses de prisão a cumprir em 60 períodos de prisão por dias livres. Extinta em 25.09.2011.

- Por decisão proferida em 31.05.2010, transitada em julgado em 30-06.2010 o arguido foi condenado pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art° 6° da Lei 22/97 de 16.02.2005, e um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art° 3° do DL 2/98 de 3.01, na pena 200 dias de multa a taxa diária de 5 Euros, e na pena de 14 meses de pena de prisão, suspensa, por igual período de tempo. Declarada extinta em 09.09.2010.

- Por decisão proferida em 02.04.2014, transitada em julgado em 25.02.2015, o arguido foi condenado pela prática de um crime de ameaça agravada, p. e p. pelo art° 153° e 155° n° 1 a) e c) e um crime de injuria agravada p. e p. pelo art° 181° n° 1 e 184° do C. Penal, na pena única 7 meses de prisão, suspensa, por um ano. Declarada extinta em 26.02.2016.

114.Consta do CRC do arguido KK (…).

115. Os arguidos (…) e CC, não têm antecedentes criminais.

116. AA é o terceiro filho de uma fratria de 6 irmãos e desenvolveu-se durante a sua infância e juventude, num contexto socio habitacional desfavorecido, habitando uma casa de auto construção localizada num bairro problemático da Amadora.

117. Após o falecimento do pai quando o arguido tinha 5 anos de idade, agravaram-se as condições económicas do agregado familiar, já que o sustento da família passou apenas a ser assegurado pelos rendimentos do trabalho da mãe como cozinheira, Devido a tais circunstâncias de vida, e a ocupação profissional da mãe, dois filhos mais novos ficaram entregues aos cuidados de familiares e os restantes ficaram entregues a si próprios e num quotidiano pouco normativo. Ainda assim, a família manteve forte união familiar. Dois dos irmãos tiveram contactos precoces com a Justiça.

118. Posteriormente a família mudou-se para uma habitação arrendada na .... e mais tarde para casa de um dos irmãos.

119. O arguido iniciou a escolaridade com 6 anos, evidenciando fraca motivação pela aprendizagem e uma conduta indisciplinada e rebelde sobretudo face aos professores.

120. O abandono escolar surge de forma natural após concluir o 4° ano de escolaridade, para começar a trabalhar, aos 14 anos, na construção civil, onde permaneceu durante 1 ano. Após esta experiência laboral, deixou de trabalhar ou de ter outra ocupação útil do seu tempo, passando a acompanhar indivíduos com idênticas circunstancias, sem deveres ou compromissos socio laborais.

121. Neste contexto inicia o consumo de canábis assim como um modo de vida marginal, com contactos privilegiados no meio do tráfico de estupefacientes, onde se veio a inserir e o qual motivou a sua prisão aos 18 anos e condenação, em cumulo jurídico, a 6,3 anos de prisão. Dois dos seus irmãos foram também condenados, no âmbito dos mesmos processos e de outro, por crimes de tráfico de estupefacientes, ao cumprimento de penas efetivas de prisão.

122. AA cumpriu pena entre 2003 e 2008 e durante a mesma concluiu um curso de formação na área de mecânica automóvel com duração de 6 meses e equivalência ao 6° ano de escolaridade.

123. Quando saiu da prisão tentou a colocação laboral numa oficina onde, por falta de adaptação, veio a ser dispensado ao fim de 1 mês. Começou a trabalhar na montagem e desmontagem de andaimes por conta de outrem, a par de alguns trabalhos temporários de mecânica, desenvolvidos numa oficina caseira, que manteve no bairro da ...., na ... .

124. O arguido mantem uma relação afetiva estável há já vários anos com uma companheira, estudante trabalhadora, que representa uma referência de estabilidade e ajuda no quotidiano do arguido, sobretudo nos últimos anos.

125. Há cerca de 6 anos, a mãe do arguido deixou de trabalhar e reformou- se, por problemas de saúde (………) cujas consequências, nomeadamente ...., dificuldades de mobilidade e ...., exigiram da parte do arguido maior disponibilidade pessoal e financeira para a apoiar. Paralelamente nesse período, o irmão que residia igualmente neste agregado com uma filha de 3 anos, foi preso e condenado a pena de prisão efetiva, situação que deixou o arguido com o encargo acrescido de cuidar da sobrinha.

126. Antes de detido, o arguido AA, vivia com a progenitora, entretanto acamada e dependente de terceiros para assegurar os cuidados básicos, que eram prestados por uma vizinha contratada para o efeito. Na mesma morada residia a sobrinha e desde Dezembro de 2017 o irmão do arguido, já em situação de liberdade.

127. Apesar de contar com a ajuda da companheira quer para prestar apoio á família como com algum suporte económico, AA terá tido dificuldades em suportar financeiramente os encargos familiares, sobretudo após colocar uma pessoa a cuidar exclusivamente da progenitora.

128. O arguido exercia atividade profissional por conta própria, reparando viaturas na garagem que dispunha na .... e paralelamente deslocava-se pontualmente á ... para adquirir viaturas para vender.

129. No período de Verão trabalhava sobretudo na montagem de andaimes, obtendo em geral ganhos irregulares nestas atividades que desenvolvia.

130. No EP… tem até á data revelado uma conduta ajustada aos normativos institucionais,

131. O arguido CC é o mais novo de uma fratria de três irmãos, o arguido regista um processo de desenvolvimento decorrido no seio de uma família estruturada.

132. CC teve um percurso escolar de fraco aproveitamento em parte devido ao desinteresse que viria a manifestar pelas atividades curriculares sobretudo a partir do 5° ano de escolaridade, tendo abandonado os estudos aos dezasseis anos de idade, após conclusão do 6° ano, desistência que motivada pelo interesse na inserção no mercado de trabalho.

133. As suas primeiras experiências laborais foram de carácter indiferenciado maioritariamente como empregado de balcão e de mesa em restaurantes e pastelarias, tendo nesse contexto adquirido experiência significativa, sendo que mais tarde viria a trabalhar por conta própria, abrindo um …... Após, 3 anos de atividade, o estabelecimento foi encerrado. Seguiu-se a exploração de um estabelecimento de ..., que acabou também por fechar devido a fraca rentabilidade.

134. CC permaneceu na habitação dos pais até á idade adulta, já integrado no mercado de trabalho. Autonomizou-se quando passou a viver em união de facto com a namorada. Todavia, a rutura afetiva ocorrida no ano de 2007 viria a marcar no arguido um período de algum isolamento social e de inatividade laboral que se prolongou por alguns meses, findo após o qual veio a reatar o relacionamento com a companheira, onde passaram a residir num apartamento na zona da ...., tendo nesse período estabelecido novo negócio por conta própria no sector da restauração.

135. O arguido reatou a relação afetiva e iniciou nova atividade laboral por conta de outrem, na empresa denominada ..., onde diz ter trabalhado durante cerca de 3/4 anos, na montagem de sistemas de segurança. Posteriormente refere ter optado por um outro negócio por conta própria, na compra e venda de automóveis, trabalho que contaria com deslocações à Alemanha para aquisição dos veículos. Em paralelo refere trabalhos pontuais aos fins-de semana numa empresa ligada a limpezas gerido por familiar da companheira, trabalho que avalia como economicamente gratificante, tendo vivenciado uma situação financeiramente equilibrada que se prolongou até à data da atual prisão.

136. No plano afetivo o arguido manteve uma vida em comum com a sua companheira de longa data, sendo que dessa união nasceu uma filha, hoje com cerca de …… anos de idade, que continua sob os cuidados matemos.

137. No contexto prisional o arguido tem beneficiado de visitas regulares por parte da companheira, filha, bem como de alguns dos seus familiares de origem, nomeadamente a progenitora e irmã. Ocupa parte do tempo colaborando em algumas atividades no …… da sua ala. Mantem comportamento adequado em meio prisional.

138. O processo de desenvolvimento e socialização de BB decorreu junto do agregado de origem até aos dois anos de idade. A família era composta pelos progenitores e quatro descendentes, constituindo-se como o mais velho da fratria.

139. De condição social desfavorecida, devido a dificuldades económicas familiares, o arguido foi institucionalizado na "...", onde permaneceu até aos dezassete anos de idade sem contactos com qualquer familiar, pelo que nunca veio a conhecer os progenitores e irmãos.

140. No domínio escolar, BB terá completado o sexto ano do ensino básico, com registo de várias retenções, pelo que os técnicos da "..." o encaminharam para cursos de formação profissional na área da jardinagem e serralharia civil.

141. Após ter abandonado a "..." foi residir sozinho num quarto alugado, com o apoio daquela instituição, tendo dado continuidade ao seu percurso laboral, iniciado aos dezasseis anos de idade, como ajudante de torneiro mecânico, profissão que desenvolveu durante quatro anos. Posteriormente teve várias profissões nas quais permanecia cerca de três/quatro anos com e sem vínculos contratuais, tendo justificado que a elevada mobilidade laboral ae deveria a fatores alheios a si, tais como fim de contrato e/ou fecho das empresas.

142. Aos dezoito anos iniciou consumos abusivos de álcool em contexto recreativo, predominantemente noturno, que escalaram para um processo de dependência, que veio a abandonar aos trinta anos de idade, altura em que terá dado início a consumos de haxixe de forma regular, justificando esta adição com o facto de sofrer de ansiedade, salientando que consumia quando se encontrava sozinho na sua habitação.

143. Manteve um relacionamento amoroso, do qual nasceu uma filha com quem não manteve contactos próximos durante o processo de desenvolvimento da descendente.

144. No período precedente á data da prisão BB permaneceria a residir com o amigo ZZ, num bairro social conotado com problemáticas criminais e sociais.

145. Devido a não desenvolver qualquer atividade profissional regular que lhe permitisse a subsistência com recursos próprios, recorria a realização de "biscates", contando ainda com apoio de alguns amigos.

146. Preso preventivamente no Estabelecimento Prisional de ……, o arguido tem revelado uma atitude adaptada às regras e normas institucionais, não tendo até à data registo de sanções disciplinares. Desenvolve atividade laboral como …….. de forma investida.

147 (a 150)   O processo de crescimento da arguida HH (…).

151 (a 161)     O arguido KK, (…).

- MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA:

(…) não resultou provado que:

162 AA e os demais arguidos acrescentavam produto de corte para aumentar a quantidade das respetivas doses a vender.

163. O arguido KK, (…).

164. Os arguidos obtiveram avultados lucros financeiros.

165 . Para esse efeito, os arguidos atuaram em conjunto e em grande escala, com a finalidade de prosseguirem a atividade de compra e venda de produto estupefaciente.

166. O arguido entregou o haxixe a QQ, apesar de saber que este era menor de idade, não tendo ainda dezoito anos.

167. O que o arguido GG, procedendo ao pagamento parcelar da dívida contraída junto de AA, ao mesmo tempo que foi remetendo dinheiro à família de BB como auxílio e compensação por este se encontrar preso.

168. Deste modo AA, "II" (utilizador do n.° de telemóvel 960000064), desde pelo menos 07/11/2017 até 15/04/2018 teve como modo de vida a revenda de quantidades de estupefaciente (resina de cannabis).

169. O arguido GG escoava o estupefaciente a um conjunto de compradores, designadamente a (…):

170. Entre os diversos compradores de estupefaciente do arguido OO figuram (…).

171. Deste modo, o arguido OO procedeu a venda e entrega de cannabis-resina e recebimento do valor monetário respetivos, nos seguintes dias e horas (…):

172. Bem como GG vendeu estupefaciente a outros compradores de cannabis, entregando o estupefaciente, em troca da quantia monetária respetiva, nomeadamente, nos seguintes dias e horas (…):

173. Deste modo AA, "II" (utilizador do n.° de telemóvel 96...064), desde pelo menos Abril de 2017 até 15/04/2018 teve como modo de vida a revenda de quantidades de estupefaciente (cannabis).

174. O arguido AA, direta ou por intermédio dos seus colaboradores tenha procedido a venda de produto estupefaciente, nas circunstancias de tempo modo e lugar e indivíduos referidos nos arts. 183 a 261, bem como aos indivíduos identificados nos arts. 176 a 182 da acusação.

175. 07.02.2018, pelas 15.05, após conversações decorridas entre AAA (96...16) e AA (96...64), no interior do Bairro ....,.... e porque AA detetou a presença Policial no bairro, cancelou/retardou a transação de estupefaciente.

176. No dia 07.02.2018, depois das 16.30, AA entregou a AAA estupefaciente que se encontrava na residência de KK (96...29).

177. Mais tarde, por volta das 22.30, porque AA (96...64) necessitou de mais estupefaciente coordenou KK (96...29) e CC (92...43), para chegar a sua posse.

178. 09.02.2018, depois das 21.30, após conversações entre AA (96...64) e AAA (96...16), lhe entregou quantidade não concretamente apurada de estupefaciente que guardava na residência de KK (96...29).

179. Por volta das 22.55, quando AA (960000064) no interior do Bairro ...., .... e após conversações com ind. apelidado por "BBB" (96...07), lhe entregou quantidade não concretamente apurada de estupefaciente por intermédio de CC (92...97) após produto recolhido na habitação de KK (96...29), em resultado de conversas decorrentes desde 18.01.2018,

180. No mesmo dia, por volta das 22.17, no interior do Bairro ..., ..., AA (96...64) se encontrou com GG, para lhe entregar quantidade não concretamente apurada de estupefaciente, por intermédio de CC (92...97), que este recolheu da residência do arguido KK,

181. 10.02.2018, por volta das 17.08, em lugar não apurado dos ...., ..., quantidade de estupefaciente não concretamente apurada, ao individuo apelidado por "CCC" (96...049) após conversações decorridas entre AA (96...64) e intervenção de CC (92...97) que recolheu o estupefaciente da residência de KK (96...29).

182. Sendo que desde 02.02.2018 estes arguidos vinham entregando estupefaciente a este indivíduo apelidado por "CCC".

183. 18.02.2018, pelas 22.16, quando AA (96...64) após conversações com DDD (96...70), na Praceta ..., junto ao lt 0, ...., ..., entregou-lhe quantidade não concretamente apurada de estupefacientes.

184. 19.02.2018, por volta das 19.00, em que após conversas decorridas com o apelidado por "CCC" (96...41), AA (96...64), se encontraram e este entregou-lhe quantidade não concretamente apurada de estupefaciente.

185. Pelas 19.01, no mesmo local e após conversações entre AA (96...64) e AAA (92...67), encontraram-se e o arguido entregou-lhe quantidade não concretamente apurada de estupefaciente.

186. Por volta 21.51, nas imediações das bombas de abastecimento da …, dos ..., ..., em resultado de conversas decorridas desde 12.02.2018, AA (96...64) entregou quantidade não concretamente apurada de estupefaciente a GG.

187. 26.02.2018, depois das 14.33, que após conversas decorridas com o apelidado por "CCC" (96...41), AA (96...64) encontrou-se com este e entregou-lhe estupefaciente.

188. 05.03.2018, por volta 21.45, em resultado de conversas decorrentes de 04.03.2018, AA (96...64) entregou quantidade não concretamente apurada de estupefaciente a GG, por intermédio de CC, no local designado por "...", ou seja, junto ao Complexo Desportivo ..., ... .

189. Depois das 23.19, após conversações entre AA (969953364) e AAA (96...43/96...43), entregou-lhe quantidade não concretamente apurada de estupefacientes, no interior do Bairro ...., ..., que guardava no interior do veículo com a matrícula 00-TH-00 e por intermédio de CC.

190. 06.03.2018, por volta 19.28, no interior do Bairro ……., ..., em que se encontrou com o apelidado por "CCC" (96...24/96...41) e lhe entregou quantidade não concretamente apurada de estupefaciente, o que vinha fazendo desde 01.03.2018.

191. Entre as 19.06 e as 20.20, no interior do Bairro ..., ....., AA (96...64) entregou a AAA (96...043), quantidade entendida por ambos "um", e também a EEE (92...73).

192. 08.03.2018, pelas 18.08, quando e após conversações entre AA (96...64) e DDD (92...03), se encontrou com este e entregou-lhe quantidade não concretamente apurada de estupefaciente.

193. Depois das 19.52, após conversações entre AA (960000064) e AAA (96...43), FFF (96...37) e EEE (92...073), entregou a estes quantidade não concretamente apurada de estupefaciente entendida por "19".

194. 16.03.2018, por volta 18.33, quantidade não concretamente apurada de estupefaciente ao apelidado por "CCC" (96...024) após conversações com este e intermédio de CC (96...68).

195. 19.03.2018, por volta 13.20, em que AA (92...06), envolvendo FFF (96... CC (96...34) no interior do Bairro...., ...., entregou quantidade não apurada de estupefaciente ao apelidado por "BBB" (92...08).

196. No mesmo dia, por volta 13.20, em que AA (92...06) por intermédio de CC (96...68), entregou a GG, quantidade não concretamente apurada de estupefaciente.

197. Mais tarde, depois das 19.52 e após conversações entre AA (92...06) e AAA (96...43), encontraram-se no interior do Bairro ...., ... e entregou-lhe quantidade não concretamente apurada de estupefaciente.

198. 22.03.2018, por volta 19.18, em que AA (92...06) após conversações com o apelidado por "CCC" (96...01), se encontrou com o mesmo, no interior do Bairro ...., ... .

199. 23.03.2018, por volta 16.13, quando e após conversações entre AA (92...06) e o DDD, se encontrou com este e entregou-lhe quantidade não concretamente apurada de estupefaciente.

200. 25.03.2018, pelas 15.44, quando AA (960000064) deslocou-se à residência de GGG, "HHH” (96...73), para receber quantia monetária desconhecida devida pela aquisição e entrega de estupefaciente.

201. 26.03.2018, quando, pelas 22.20, após conversações entre AA (92...06) e GGG, "HHH" (96...73), se dirigiu à residência deste e entregou-lhe quantidade não concretamente apurada de estupefaciente.

202. Pelas 22.26, AA (92...06) entregou quantidade não concretamente apurada de estupefaciente a DDD(92...06), concretamente na Praceta ..., ..., ... .

203. Por volta das 22.32, em que AA (92...06) por intermédio de CC (96...68), entregou a GG, quantidade não concretamente apurada de estupefaciente em troca de dinheiro entregue em dias anteriores.

204. 30.03.2018, quando, pelas 18.45, AA (92...077) após conversações com GGG, "HHH2 (96...73), no interior do Bairro ..., ..., lhe entregou quantidade não concretamente apurada de estupefaciente por intermédio de CC (92...50).

205. Por volta 19.15, em que AA (92...77) após conversações com o apelidado por "CCC" (96...01), se encontrou com o mesmo, no interior do Bairro ..., ... .

206. 31.03.2018, quando, pelas 16.27, AA (92...77) após conversações com GGG, "HHH” (96...73), se deslocou à sua residência e entregou-lhe quantidade não concretamente apurada de estupefaciente.

207. Por volta 17.07, em que AA (92...77) por intermédio de CC (92...50), no interior do Bairro ..., ..., entregou quantidade não concretamente apurada de estupefaciente ao apelidado por "BBB" (96...52), em resultado de conversas decorrentes de 26.03.2018.

208. 01.04.2018, por volta das 17.07, em que AA (92...77) se encontrou com GG, no interior do Bairro ....,...., para receber deste, quantia monetária não apurada, resultante do comércio de estupefaciente.

209. Igualmente envolvendo, CC, e por este ter acesso ao estupefaciente, AA, querendo menores quantidades de estupefaciente para entregar a título experimental, solicitou-lhas em código e nos seguintes dias, 18.12.2017, pelas 22h23, 19.12.2017 pelas 16h 11, 08.01.2018 pelas 21h48, 18.01.2018 pelas 19h06, 21.01.2018 pelas 14h10, 22.01.2018 pelas 14h01, 27.01.2018 pelas 15h13 tendo CC lhas entregue.

210. A deslocação de AA nos dias 03.04.2018 e a 09.04.2018, em viatura não identificada, á zona de Tunes e a Espanha, fosse o propósito de se encontrar pessoalmente com cidadã não identificada, utilizadora do cartão 92...08, pessoa que colabora com o fornecedor de estupefaciente do AA nessa atividade.

211. AA realizou essas viagens para entregar à referida cidadã quantidade não concretamente apurada de dinheiro, parte, recebida de DDD, devida pela aquisição de estupefaciente, o que fez.

Entre 3.04 e 9.04 de 2018, AA (92...77) com a participação de CC (92...50), foi escoando e entregando parte do estupefaciente que ainda possuía na residência de KK, pelo que, nos dias:

212. 06.04.2018, por volta das 21.01, em que AA (92...77) por intermédio de CC (92...50), entregou quantidade não concretamente apurada de estupefaciente, recolhida depois das 15.29 na residência de KK (96...29).

213. 08.04.2018, por volta das 19.20, em que AA (92...77) após conversações com o apelidado por "CCC" (96...80), se encontrou com o mesmo e entregou-lhe parte não concretamente apurada de estupefaciente.

214. No dia 09.04.2018, apesar de inicialmente ter ficado acordado entre ambos que CC - iria acompanhar AA, devido ao fracasso da negociação da aquisição de uma quantidade de estupefaciente, de marca REAL MADRID (RM), apenas AA dialogou com a fornecedora de estupefaciente, deslocando-se à localidade de Tunes, no Algarve.

215. O dinheiro apreendido aos arguidos corresponde ao produto da venda do estupefaciente pelos arguidos.

216. Os veículos apreendidos foram adquiridos com o lucro obtido na atividade de tráfico de estupefaciente.

217. Os arguidos não desenvolveram qualquer outra actividade remunerada nem têm outros rendimentos para além do obtido com a venda de produto estupefaciente que lhes permitisse ter o nível de vida em questão.

218. O arguido BB ao vender e entregar, por diversas vezes, estupefaciente a QQ e a outros amigos destes, todos menores de idade, tinha perfeito conhecimento que estes o eram e mesmo assim, apesar de saber que vender estupefaciente a menores é um acto particularmente condenável na sociedade e na lei criminal, quis o fazer, como o fez.

3. o direito:

a. direito ao recurso e graus de jurisdição:

i. instrumentos internacionais de Direitos Humanos:

O direito ao recurso está, desde logo. expressamente consagrado em instrumentos jurídicos de direito internacional sobre os direitos fundamentais, que Portugal ratificou e, assim, se vinculou a observar.

O Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos estabelece, no art. 14º: “Toda a pessoa declarada culpada de um delito terá direito a que a sentença e a pena que lhe foram impostas sejam submetidas a um tribunal superior, conforme o previsto na lei”.

A Convenção Europeia dos Direitos Humanos consagrando, no Protocolo n.º 7, artigo 2º o “direito a um duplo grau de jurisdição, estatui:

1. Qualquer pessoa declarada culpada de uma infração penal por um tribunal tem o direito de fazer examinar por uma jurisdição superior a declaração de culpabilidade ou a condenação.

Remete para a lei ordinária de cada Estado parte, a regulamentação “[d]o exercício deste direito, bem como os fundamentos pelos quais ele pode ser exercido”.

Reconhece não poder ser um direito infinito e ilimitadamente exercido. No n.º 2, enunciam-se situações que podem fundamentar a inadmissibilidade da reapreciação em 2ª instância, da culpabilidade ou da condenação, sem que daí resulte desproteção insuportável de direitos fundamentais da pessoa condenada:

2. Este direito pode ser objeto de exceções em relação a infrações menores, definidas nos termos da lei, ou quando o interessado tenha sido julgado em primeira instância pela mais alta jurisdição ou declarado culpado e condenado no seguimento de recurso contra a sua absolvição.

O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, interpretando esta norma, tem afirmado, reiteradamente, que “os Estados Contratantes, em princípio, desfrutam de uma ampla margem de apreciação ao determinar como o direito garantido pelo Artigo 2 do Protocolo nº 7 da Convenção deve ser exercido (ver Krombach v. França, nº 29731/96 96, CEDH 2001 ‑ II)”

Afirma que esta norma regula essencialmente dois aspetos: a acessibilidade à jurisdição de recurso; e o escopo do controlo que esta exerce – cfr. caso de SHVYDKA v. UCRÂNIA, (Application n.º. 17888/12), julgamento de 30 de outubro de 2014.

Tem entendido que “a revisão por um tribunal superior de uma condenação ou sentença pode dizer respeito a questões de fato e questões de direito, ou pode limitar-se apenas a questões de direito”.

“Contudo, quaisquer restrições contidas na legislação nacional sobre o direito a uma revisão mencionada nessa disposição devem, por analogia com o direito de acesso a um tribunal consagrado no artigo 6, parágrafo 1, da Convenção, buscar um objetivo legítimo e não infringir a própria essência desse direito (ver Krombach v. França, nº 29731/96, § 96, CEDH 2001-II) –cfr. caso de ROSTOVTSEV v. UCRÂNIA (Application n.º. 2728/16), julgamento de 25 de julho de 2017.

ii. regime constitucional:

O direito ao recurso é, genericamente, um corolário da garantia de acesso ao direito e aos tribunais consagrada no art. 20º n.ºs 1 e 5 da nossa «Carta Magna», que, para o processo penal está expressamente consagrado como uma das mais importantes dimensões das garantias da defesa – art.  32º n.º 1 da Constituição da República. Esta consagração particular significa que só o direito ao recurso do arguido goza de tutela constitucional efetiva. Nas restantes áreas do direito, o legislador tem margem de discricionariedade.

No Ac. n.º 429/2016, do Plenário do Tribunal Constitucional sustenta-se: “na configuração dos graus de recurso em processo penal não deve perder-se de vista que da circunstância de o arguido não poder ter menos direitos do que a acusação, não significa que não possa ter mais. Diante da desigualdade material de partida entre a acusação, apoiada no poder institucional do Estado, e o arguido, alvo de perseguição judiciária, aceita-se "'uma orientação para a defesa' do processo penal" o que "revela que ele não pode ser neutro em relação aos direitos fundamentais (um processo em si, alheio aos direitos do arguido), antes tem neles um limite infrangível" (J. J. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, Coimbra Editora, 4.ª ed. revista, 2007, p. 516)».

No Ac. n.º 595/2018, igualmente do Plenário acrescenta-se: “assim, embora o direito de recurso, "imperativo constitucional, hoje consagrado de modo expresso no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição", deva ser entendido "no quadro das 'garantias de defesa' - só e quando estas garantias o exijam" (Acórdão n.º 30/2001, n.º 7), deve-lhe ser reconhecido "um valor garantístico próprio e não 'dissolúvel' em outras garantias de defesa" (Acórdão n.º 686/2004, n.º 4).

Não decorre do art.º 32º n.º 1 da Constituição da República que o legislador esteja impedido de conceder o direito de recorrer a outros sujeitos processuais. Todavia, a esta luz, somente o direito ao recurso do arguido pode ser aferido constitucionalmente.

Enquanto direito-garantia essencial à defesa do arguido, não pode ser interpretado restritivamente, designadamente estabelecendo-se limitações que não estejam expressamente previstas na lei ao seu direito de recorrer de decisões condenatórias.

Substantivamente, implica a concessão da efetiva possibilidade de impugnar por meio de recurso, em pelo menos um grau de jurisdição, as decisões que a defesa tiver por ilegais e que afetem gravemente os direitos do arguido a uma condenação justa, ou que lhe imponham a privação ou restrições da liberdade ou de quaisquer outros direitos fundamentais.

Decorre daqui que o direito ao recurso, pelo arguido, e as restrições que pode comportar tem estatuto constitucional diferenciado – outro tanto sucede nos principais instrumentos de direito internacional -, e as normas adjetivas que o regulam devem ser interpretadas estritamente quando contendam com aspetos nucleares do direito fundamental de defesa do arguido.

A Constituição não estatui sobre os graus que o direito ao recurso pode comportar. Sendo certo que exige pelo menos um grau de jurisdição.

Contudo, o direito ao recurso em processo criminal não é um direito absoluto. Não existe nem seria praticável a recorribilidade de toda e qualquer decisão judicial. O legislador está, por isso, autorizado a traçar limites ao direito de recorrer, a estabelecer exceções à regra da recorribilidade, conquanto não atinja o núcleo essencial das garantias de defesa do arguido, e a limitação se ampare num fundamento razoável, não arbitrário ou desproporcionado.

O Tribunal Constitucional tem afirmado reiteradamente que “o direito ao recurso expressamente consignado no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, (…) não exige a possibilidade de impugnação de toda e qualquer decisão proferida ao longo do processo, impondo apenas que necessariamente se assegure um segundo grau de jurisdição relativamente às decisões condenatórias e àquelas que afetem direitos fundamentais do arguido, designadamente a sua liberdade (v., entre muitos, os Acórdãos n.º 265/94, 387/99, 430/2010, 153/2012 e 848/2013) - cfr Ac. n.º 560/2014.

Compete ao legislador ordinário dar expressão normativa àquele concreto aspeto das garantias de defesa que o processo penal não pode deixar de colocar à disposição do arguido e estabelecer as restrições convencional e constitucionalmente admissíveis.

iii. regime processual penal:

Executando o comando constitucional, o Código de Processo Penal consagra o princípio da recorribilidade das decisões proferidas no processo penal – art. 399º -, não admitindo limitações que não estejam expressamente previstas na lei.

As sentenças, acórdãos e despachos que não admitem recurso estão catalogadas, em diversas disposições legais e, essencialmente, no artigo 400º.

Ainda que no mesmo âmbito, mas já na dimensão do acesso à mais alta instância de recurso em matéria criminal, regem os art.º 432º e 434.º do CPP. Do primeiro, do seu n.º 1 al.ª b) conjugado com o art.º 400º n.º 1 al.ª f) resulta que é irrecorrível perante o STJ, acórdão da Relação que confirma condenação da primeira instância em pena não superior a 8 anos de prisão.

O Tribunal Constitucional tem afirmado repetidamente “caber na discricionariedade do legislador definir os casos em que se justifica o acesso à mais alta jurisdição, desde que não consagre critérios arbitrários, desrazoáveis ou desproporcionados” Ac. n.º 357/2017.

O legislador da Lei n.º 59/98, com a alteração do regime da admissibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, quis harmonizar objetivos de economia processual com a necessidade de limitar a intervenção do STJ a casos de maior gravidade.  Como se justifica na Proposta de Lei n.º 157/VII, que esteve na origem daquele diploma normativo “os casos de pequena e média criminalidade não devem, por norma, chegar ao Supremo Tribunal de Justiça”.

Ideário reafirmado na Proposta de Lei n.º 77/XII(1.ª) (GOV), que deu lugar à Lei n.º 20/2013. Explicitando-se os motivos da visada clarificação expende-se que “era essencial delimitar o âmbito dos recursos para o Supremo, preservando a sua intervenção para os casos de maior gravidade”.

Como se expende no Ac. n.º 49/2003 do Tribunal Constitucional: “o acórdão da relação, proferido em 2ª instância, consubstancia a garantia do duplo grau de jurisdição, indo ao encontro precisamente dos fundamentos do direito ao recurso”.

“Cumprido o duplo grau de jurisdição, há fundamentos razoáveis para limitar a possibilidade de um triplo grau de jurisdição”.

“Se o direito ao recurso em processo penal não for entendido em conjugação com o duplo grau de jurisdição, sendo antes perspetivado como uma faculdade de recorrer – sempre e em qualquer caso – da primeira decisão condenatória, ainda que proferida em recurso, deveria haver recurso do acórdão condenatório do Supremo Tribunal de Justiça, na sequência de recurso interposto de decisão da Relação que confirmasse a absolvição da 1ª instância. O que ninguém aceitará”.

Por sua vez, o art.º 434º do CPP circunscreve o recurso perante o STJ ao “reexame de matéria de direito”. Podendo conhecer, mas oficiosamente, dos vícios lógicos da decisão enunciados no art.º 410 n.º 3 do mesmo diploma legal. Assim, em sede de recurso, o STJ não tem poderes de cognição em matéria de facto. A revista alargada da matéria de facto não legitima a interposição de recurso perante a mais alta instância judicial em matéria criminal.

b. dupla conforme:

Para ajuizar da admissibilidade dos recursos dos arguidos BB e CC e, também assim, dos temas de que poderia conhecer-se do recurso do arguido AA, – primeira e decisiva questão que se impõe decidir (arts. 417º e 432º do CPP) -, ademais das normas já citadas, importa realçar a limitação do direito ao recurso consagrada no art.º 400º n.º 1 al.ª f) do CPP. Estatui esta norma que “não é admissível recurso” “de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão da 1ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos”.

Na expressão do Ac. de 19-02-2014, deste Supremo Tribunal, significa que só é admissível recurso de decisão confirmatória da Relação quando a pena aplicada é superior a 8 anos de prisão, quer estejam em causa penas parcelares ou singulares, quer penas conjuntas ou únicas resultantes de cúmulo jurídico[1].

Irrecorribilidade que é extensiva a todas as questões relativas à atividade decisória que subjaz e que conduziu à condenação, incluída a fixação da matéria de facto, nulidades, os vícios lógicos da decisão, o princípio in dubio pro reo, a escolha das penas e a respetiva medida. Em suma, todas as questões subjacentes à decisão, submetidas a sindicância, sejam elas de constitucionalidade, substantivas ou processuais, referentes à matéria de facto ou à aplicação do direito, confirmadas pelo acórdão da Relação, contanto a pena aplicada, parcelar ou conjunta, não seja superior a 8 anos de prisão.

Trata-se de jurisprudência uniforme destes Supremo Tribunal, adotada e seguida, entre muitos outros, também no Ac. de 19/06/2019, desta mesma secção, onde se decidiu: “As questões subjacentes a essa irrecorribilidade, sejam elas de constitucionalidade, processuais e substantivas, enfim das questões referentes às razões de facto e direito assumidas, não poderá o Supremo conhecer, por não se situarem no círculo jurídico-penal legal do conhecimento processualmente admissível, delimitado pelos poderes de cognição do Supremo Tribunal”.

O acórdão da Relação de que foi interposto recurso é, pois, pelo exposto, irrecorrível, quanto às penas parcelares aplicadas, com exceção da pena pelo crime de homicídio qualificado (…)”[2].

Também assim no Ac. de 4/07/2019, que decidiu: “2. Para efeitos do disposto no art. 400º, nº 1, e), do CPP, a pena aplicada tanto é a pena parcelar, cominada para cada um dos crimes, como a pena única, pelo que, aferindo-se a irrecorribilidade separadamente, por referência a cada uma destas situações, os segmentos dos acórdãos proferidos em recurso pelo tribunal da Relação, atinentes a crimes punidos com penas parcelares inferiores a 5 anos de prisão, são insuscetíveis de recurso para o STJ, nos termos do art. 432.º, n.º 1, b), do CPP. 3. Irrecorribilidade que abrange, em geral, todas as questões processuais ou de substância que (quanto a tais crimes) tenham sido objeto da decisão, nomeadamente, os vícios indicados no art. 410.º, nº 2, do CPP, as nulidades das decisões (arts. 379.º e 425.º, n.º 4, do CPP) e aspetos relacionados com o julgamento dos mesmos crimes, aqui se incluindo as questões atinentes à apreciação da prova – v.g., as proibições de prova, o princípio da livre apreciação da prova e, enquanto expressão concreta do princípio da presunção de inocência, o in dubio pro reo –, à qualificação jurídica dos factos e com a determinação das penas parcelares 4. Conexamente, a alínea f) do n.º 1 do art. 400.º, do CPP, impossibilita o recurso de decisões da Relação que confirmem decisão condenatória da 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos, pelo que, em caso de “dupla conforme”, o STJ não pode conhecer de qualquer questão referente aos crimes parcelares punidos com pena de prisão inferior a 8 anos, apenas podendo conhecer do respeitante aos crimes que concretamente tenham sido punidos com pena de prisão superior a 8 anos e da matéria relativa ao concurso de crimes, sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso” [3].

Igualmente se decidiu no recente Ac. de 11/03/2020, também desta secção e com o mesmo coletivo[4].

Nesta interpretação, que aqui se segue, não é recorrível o acórdão do Tribunal da Relação que decidiu não se verificarem nulidades que o arguido assacou à decisão condenatória da 1ª instância.

O acórdão da Relação que, apreciando as questões suscitadas nos recursos – atinentes à factualidade ou apreciação das provas, à subsunção ou qualificação jurídica dos factos, à invocação de vícios da decisão, ou à arguição de nulidades ou quaisquer outras-  confirma a decisão da 1ª instância, garante e esgota o direito ao recurso, tanto em matéria de facto como em sede de aplicação do direito. Ainda que o recurso do acórdão confirmatório da condenação se circunscreva a questões de direito, não deve ser admitido perante o STJ, que não deve reapreciar questões que já foram duplamente apreciadas e uniformemente decididas, a não ser quando e na parte em que o duplo grau de recurso está expressamente ressalvado.

Nestas situações, o acórdão da Relação de que se recorre, sindicou e confirmou a decisão condenatória da 1ª instância. Quando seja admitido mais um grau de recurso ordinário, então a decisão recorrida é a confirmatória daquela condenação. O recorrente, dissentindo do acórdão confirmatório, não deve insistir na reiteração das questões que motivaram a impugnação da decisão da 1ª instância porque, apreciadas e decididas no acórdão da Relação, relativamente a elas foi, assim aí garantido o duplo grau de jurisdição, consagrado na Constituição da República e no direito convencional universal e europeu. Essas mesmas questões, decididas sem qualquer dissonância, - isto é, sem voto de vencido e com fundamentação que não seja essencialmente diferente -, não podem, por isso, salvo disposição legal que expressamente as ressalve, legitimar mais um grau de recuso e, consequentemente, ser reapreciadas num terceiro grau de jurisdição.

E também não devem colocar-se questões novas reportadas, direta ou indiretamente, à decisão da primeira instância porque, não tendo sido suscitadas na respetiva impugnação, não puderam ser apreciadas e decididas no acórdão da Relação. “O reexame pressupõe que já anteriormente houve um exame pelo tribunal à quo. Não pode, por isso, uma questão nova ser levada ao STJ” – Ac STJ de 5/04/2000.

O recurso ordinário é um “remédio jurídico» ao dispor dos sujeitos processuais para, provocar a reapreciação do julgado, tanto na sua conformidade adjetiva, como no seu mérito substantivo, incluindo aqui o julgamento da factualidade que constitui o objeto da causa, e também a resolução dos temas de direito, ou de outros que oficiosamente se impunha conhecer. Em qualquer das situações, as questões in procedendo e/ou in judicando a sindicar têm de ser especificadamente indicadas pelo recorrente. Não o sendo, o tribunal de recurso, não pode imiscuir-se na decisão de aspetos procedimentais, problemas de facto ou de temas de direito, que os sujeitos processuais não querem ver reexaminados e corrigidos, a não ser que inviabilizem a conformidade lógica do julgado.

O CPP, no art.º 412º n.º s 2 e 3 é claro e inequívoco neste aspeto. É absolutamente insuficiente um simples e genérico pedido de reapreciação da decisão recorrida. É imprescindível que o recorrente, nas conclusões da motivação, questionando matéria de direito, indique,

-  as normas jurídicas que, no seu entendimento, foram violadas;

- o sentido com que cada norma foi interpretada e aplicada na decisão recorrida e o sentido em que devia ter sido interpretada ou com que devia ter sido aplicada; e

- em caso de erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que deve aplicar-se.

Impugnando a decisão dos factos que constituem o tema judicandum, é indispensável que, nas conclusões, especifique:

- os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

- as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;

- as provas que devem ser renovadas.

A jurisprudência deste Supremo Tribunal é pacifica e uniforme no sentido de que “O julgamento em recurso não o é da causa, mas sim do recurso e tão só quanto às questões concretamente suscitadas e não quanto a todo o objeto da causa” [5].

“O recurso, tem por escopo reexaminar, reapreciar, sindicar as questões que já foram objeto de análise e de decisão por parte do tribunal recorrido ou que, podendo e devendo ter sido por ele conhecidas, não foram com vista à deteção e correção de vícios, omissões ou à escolha da solução jurídica mais adequada ao caso concreto[6].

Assim, as questões de direito que o recorrente não incluiu no objeto do recurso para a Relação, não podem suscitar-se depois perante o Supremo Tribunal de Justiça.

c. arguição de nulidades da sentença:

Regendo sobre as nulidades da sentença ou acórdão, dispõe o art.º 379º (“nulidade da sentença”), n.º 2 do CPP:

2 - As nulidades da sentença devem ser arguidas ou conhecidas em recurso, devendo o tribunal supri-las, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 4 do artigo 414.º”.

O art.º 414º n.º 4 estabelece: “Se o recurso não for interposto de decisão que conheça, a final, do objeto do processo, o tribunal pode, antes de ordenar a remessa do processo ao tribunal superior, sustentar ou reparar aquela decisão”.

O procedimento para arguir as nulidades da sentença tem evoluído na legislação e tem merecido atenção da jurisprudência e da doutrina.

Na redação originária, o art.º 379º citado não tinha a atual alínea c) do n.º 1 nem o n.º 2.

Na sequência do dissenso que grassava na jurisprudência sobre o prazo e o modo de arguir as nulidades da sentença, este Supremo Tribunal no Acórdão (AUJ) n.º 1/94, fixou jurisprudência no sentido de que “as nulidades de sentença enumeradas de forma taxativa nas alíneas a) e b) do artigo 379.º do Código de Processo Penal não têm de ser arguidas, necessariamente, nos termos estabelecidos na alínea a) do n.º 3 do artigo 120.º do mesmo diploma processual, podendo sê-lo, ainda, em motivação de recurso para o tribunal superior[7].

Para estabelecer esta interpretação, - a ser seguida pelos tribunais judiciais em matéria criminal -, entendeu-se que aquelas nulidades “não têm de ser arguidas em prazo e pela forma geral do artigo 120.º, n.º 3, alínea a), do mesmo Código, já que podem sê-lo, ainda, em via de recurso, sendo possível, no entanto, dizer que o mesmo acontece, por força do artigo 410.º, n.º 3, do diploma, em relação a quaisquer outras nulidades de atos judiciais recorríveis (…)”

A conclusão de que a arguição de nulidade de sentença se não esvai sem o esgotamento do prazo do recurso e pode fazer-se na sua motivação resulta da equilibrada conciliação do conteúdo dos artigos 120.º, n.º 3, alínea a), e 410.º, n.º 3, com o do artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, com certo apelo à disponibilidade dos poderes de arguir nulidades e de interpor recurso”.

Pouco depois, o Governo nomeia uma Comissão de revisão, cujos trabalhos sustentaram a Proposta de Lei n.º 157/VII, em que se baseou a Lei n.º 59/98 de 25/08 que reformou o CPP. Da exposição de motivos desse diploma legal consta expressamente que a reforma foi informada pela “preocupação de reforçar a economia processual numa ótica de celeridade e eficiência”, com vista a adequar “devidamente a lei em ação à law in book”.

Entre outras modificações mais ou menos profundas, destinadas a “encontrar as formas adequadas de encurtar a relação temporal entre a prática do crime e a decisão judicial que o aprecie e decida” definitivamente, alterou-se também o art.º 379º de modo que ao n.º 1 se acrescentou a vigente alínea c) e se aditou o n.º 2 já transcrito.

No essencial transpôs-se para o texto da lei àquela jurisprudência uniformizadora e os comentários mais seguidos[8], conferindo uma redação equivalente a parte do disposto no art.º 668º n.ºs 3 e 4 do CPC de então[9], correspondente ao vigente art. 615º n.º 4 do mesmo diploma legal ora vigente.

Sustentou-se no Ac. STJ de 12/09/2007: “cotejando o art. 379º CPP com o art. 668º CPC, é óbvio o paralelismo entre eles, como ocorre mais concretamente entre a nova alínea c) do nº1 do art. 379º e a alínea d) do nº 1 do art. 668º CPC.

O novo nº 2 do art. 379º CPP corresponde a uma transposição parcial do nº 3 do art. 668º CPC e à adoção da doutrina contida no Acórdão 1/94, indo, porém, mais longe.

Enquanto nas suas fontes, a arguição poderia ser feita em sede de motivação de recurso, no nº 2 do artigo 379º, impõe-se essa arguição nessa altura (as nulidades da sentença devem ser arguidas). Mas mais do que isso. A letra da lei (artigo 9º, nº 2 e 3 do Código Civil) vai mais além. As nulidades da sentença devem ser conhecidas em recurso e secção.[10]

É, pois, evidente e assente que o nº 2 do artigo 379º CPP consagra para as nulidades da sentença um regime específico, sem reporte ao estabelecido nos art. 119º e 120º do CPP.

Está, pois, expressamente legislado e vem sendo pacificamente aceite que aquela alteração consagrou um regime especial de arguição das nulidades da sentença, previstas no n.º 1 do artigo 379.º e só para estas.

Não sendo admissível recurso (ordinário) da sentença ou acórdão, ou não querendo impugna-la através dessa via, o sujeito processual terá de arguir as nulidades que imputa à decisão, necessariamente perante o próprio tribunal que proferiu a sentença, sendo o prazo de arguição, o prazo-regra para a prática de qualquer ato processual – n.º 1 do artigo 105.º -, dez dias a contar da notificação.

Quando a sentença ou acórdão admite recurso e o sujeito processual quer servir-se deste, tem de arguir as nulidades que imputa à decisão recorrida no requerimento de interposição de recurso. Aliás, as nulidades da decisão podem. “mesmo que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito” (como sucede, em regra, com o STJ), ser fundamento único do recurso – cfr. art.º 410º n.º 3 do CPP.

Realça-se e sublinha-se a imperatividade do comando normativo - “As nulidades da sentença devem ser arguidas (…) em recurso”. Expressão que só admite a leitura (cfr art.º 9º, nº 2 e 3 do Código Civil) de que as nulidades previstas no art.º 379º do CPP têm de arguir-se, obrigatoriamente, no recurso ordinário, sempre que a sentença ou acórdão admita impugnação em mais um grau de jurisdição.

Interpretação diferente, ademais da letra da lei, afronta o espirito do legislador, expressado na já citada proposta de lei, e bem assim a teleologia da própria norma, que visou, expressamente, repete-se, “encurtar a relação temporal entre a prática do crime e a decisão judicial que o aprecie e decida” definitivamente.

O legislador, expressando clara e inequivocamente o seu pensamento e a teleologia que informa o regime vigente, expendeu Exposição de Motivos do Código de Processo Penal que, a procura da celeridade e da eficiência não obedeceu a uma lógica puramente economicista de produtividade pela produtividade. A rentabilização da realização da justiça é apenas desejada em nome do significado direto da eficiência para a concretização dos fins do processo penal: realização da justiça, tutela de bens jurídicos, estabilização das normas, paz jurídica dos cidadãos”.

“A celeridade é também reclamada pela consideração dos interesses do próprio arguido, não devendo levar-se a crédito do acaso o facto de a Constituição, sob influência da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, lhe ter conferido o estatuto de um autêntico direito fundamental. Há, pois, que reduzir ao mínimo a duração de um processo que implica sempre a compressão da esfera jurídica de uma pessoa que pode ser - e tem mesmo de presumir-se - inocente. Como haverá ainda que prevenir os perigos de uma estigmatização e adulteração irreversível da identidade do arguido, que pode culminar no compromisso com uma carreira delinquente. De resto, a aceleração processual redundará tanto mais em favorecimento do arguido quanto mais ela tiver por reverso - como sucede no presente Código - um reforço efetivo da sua posição processual.

Deste modo, quando a sentença ou acórdão admitir recurso ordinário e o sujeito processual pretender impugna-la através dessa via, tem necessariamente que interpor recurso, arguindo as nulidades que entenda opor à decisão recorrida no requerimento de interposição de recurso. Neste caso, o prazo para o efeito é o prazo geral do recurso previsto no art.º 411º n.º 1 do CPP -30 dias.

Evidentemente, o tribunal recorrido “pode, antes de ordenar a remessa do processo ao tribunal superior, sustentar ou reparar” as nulidades de que a sentença ou acórdão possa realmente enfermar. O Tribunal recorrido deve, sempre e em qualquer caso em que tenham sido arguidas, autonomamente, no requerimento de interposição de recurso, nulidades da decisão que conheceu do objeto do processo ou do mérito do recurso, pronunciar-se especificadamente sobre as nulidades deduzidas, indeferindo a arguição ou, se as reconhecer, suprindo-as.

Interpretação estabilizada na doutrina e na jurisprudência e que permite  “eliminar o abuso que se generalizou de arguir as pretensas nulidades da sentença ou do acórdão, no mero intuito de atrasar o andamento do processo ou protelar o trânsito da decisão[11]

Assim, Oliveira Mendes[12], sustenta: “no n.º 2 regula-se o regime de conhecimento e de arguição de nulidades da sentença. De acordo com aquele dispositivo, as nulidades da sentença devem ser arguidas no recurso; caso a decisão não admita recurso (recurso ordinário) as nulidades deverão ser arguidas perante o próprio tribunal que proferiu a sentença – n.º 1 do art. 120.º do CPP – sendo o prazo de arguição o prazo-regra para a prática de qualquer ato processual – n.º 1 do art. 105.º - qual seja o de 10 dias. É esta também a solução expressamente consagrada em processo civil – n.º 4 do art. 615.º. […]”.

E mais adiante: “de acordo com a parte final do n.º 2, o tribunal recorrido, pode, mesmo em caso de recurso, proceder ao suprimento das nulidades da sentença. É o sentido a retirar do segmento final do referido dispositivo «aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 4 do art. 141.» (É aliás, o que sucede em processo civil, segundo preceito do n.º 1 do art. 617.º, ao estabelecer que se a questão da nulidade da sentença ou da sua reforma for suscitada no âmbito do recurso dela interposto, compete ao juiz apreciá-la no próprio despacho em que se pronuncia sobre a admissibilidade do recurso, não cabendo recurso da decisão de indeferimento. Dever-se-á ter em atenção, porém, que o suprimento das nulidades da sentença pelo tribunal recorrido deve ser efetuado com muita prudência, sem prejuízo do princípio elementar de direito adjetivo constante do n.º 1 do art. 613.º do CPC, princípio aplicável em processo penal ex vi art. 4.º do CPP, segundo o qual a prolação do ato decisório fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa. […]”

Naturalmente que com a exigida cautela imposta pela profunda diversidade da filosofia que informa os respetivos regimes e, particularmente pela importância do direito de defesa do arguido no processo penal, todavia, atenta o modelo que informou a alteração legislativa assinalada, dá-se conta de que comentadores do CPC[13], em anotação ao vigente art.º 615, n.º 4, sustentam “Ademais, no que respeita às nulidades decisórias, as mesmas apenas podem ser suscitadas perante o tribunal que proferiu a decisão nos casos em que esta não admita recurso, já que na situação inversa deverão ser inseridas nas alegações de recursos de apelação.”

E mais adiante; “Acresce ainda uma frequente confusão entre nulidade da decisão e discordância quanto ao resultado, entre a falta de fundamentação e uma fundamentação insuficiente nu divergente da pretendida ou mesmo entre a omissão de pronúncia (relativamente a alguma questão ou pretensão) e a falta de resposta a algum argumento dos muitos que florescem nas alegações de recurso.

Porventura esta tendência encontrará a sua raiz num modelo processual em que o decurso do prazo para a interposição de recurso apenas se iniciava depois de serem apreciadas pelo tribunal a quo eventuais nulidades decisórias que eram autonomamente arguidas. Porém, há muito que foi ultrapassado esse quadro normativo, de modo que o prazo para interposição de recurso e apresentação de alegações é contado a partir da notificação da sentença (art. 638.º, n.º 1), sem que haja a possibilidade de a parte dilatar (artificialmente) o exercício desse direito através da dedução de incidentes de arguição de nulidade ou de reforma da sentença, questões que, quando surjam, devem ser necessariamente integradas nas alegações de recurso, como claramente o prescreve o n.º 4. Seguro é que os resultados que se observam através da leitura dos acórdãos são reveladores da generalizada falta de consistência das nulidades que são frequentemente arguidas, tendo como reflexo justificado a sua apreciação sumária que, na maior parte das vezes, é inteiramente merecida.

No que concerne à arguição das nulidades da sentença, importa distinguir os casos em que a mesma admite ou não recurso ordinário. Naquela primeira situação, as nulidades apenas podem ser suscitadas em sede do recurso de apelação (ou, depois, em sede recurso de revista), como fundamentos autónomos da sua impugnação.

Nos casos em que a sentença não admita recurso ordinário, as nulidades devem ser arguidas incidentalmente, sendo apreciadas pelo juiz, depois de cumprido o contraditório. A lei não deixa margem para tergiversações, sendo a solução legal sustentada no anterior uso abusivo do incidente de arguição de nulidades que, por esta via radical, se procurou sancionar.”

A jurisprudência deste Supremo Tribunal tem sustentado[14] que “proferida a sentença, fica esgotado o poder jurisdicional do juiz, devendo as nulidades de que aquela padeça ser arguidas ou conhecidas em recurso se for processualmente admissível a impugnação da decisão. Caso o recurso não for admissível, as eventuais nulidades da decisão [deve] ser arguidas e conhecidas no próprio tribunal que proferiu a decisão. É este o regime que decorre do artigo 379.º, n.º 2, do CPP.

“Por isso as nulidades da sentença só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu tal decisão se esta não admitir recurso ordinário.[15].

No Ac. STJ de 18-04-2012, sustentou-se: “Tendo o recorrente interposto recurso do acórdão da relação que conheceu de mérito, devia ter arguido, na motivação e no prazo do recurso, as nulidades do acórdão (art. 379.º n.º 2, do CPP). As nulidades da sentença só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário.

VI - O segundo acórdão recorrido não é substancialmente autónomo do acórdão que conheceu, a final, do objeto do processo, pois naquele não se conhece ex novo de uma questão processual, reconduzindo-se ao indeferimento dos requerimentos de arguição de nulidades por se encontrar esgotado o poder jurisdicional da relação com a prolação do acórdão que conheceu, a final, do objeto do processo[16].

No Ac. de 25-01-2006, sustentou-se que “o regime de arguição das nulidades da sentença resulta, em processo penal, do art. [379].º, n.º 2, do CPP: devem ser arguidas em recurso.

Daqui resulta que o prazo para interposição de recurso começou a correr com a notificação, irrelevando para tal começo de contagem o que a seguir se tramitou (um requerimento para “correção” da sentença, indeferido, a posterior arguição de nulidade do acórdão da Relação, desatendida por deliberação em conferência”[17].

Por sua vez, o Tribunal Constitucional, em recente acórdão, assinalando que “a modelação legislativa do processo penal, mesmo no que tange o exercício do direito ao recurso, não pode deixar de obedecer a exigências de racionalização e celeridade que igualmente decorrem da Constituição e «encontra[m] justificação, não apenas na necessidade de garantir proteção rápida e eficaz aos bens jurídicos tutelados pelo direito penal (artigo 40.º do Código Penal), como no próprio princípio da presunção de inocência do arguido (artigo 32.º, n.º 2, primeira parte, da Constituição), que é naturalmente incompatível com o atraso ou prolongamento indefinido de um processo que visa determinar a sua responsabilidade criminal em face da acusação formal da prática de um ou mais crimes (…).» (v. o Acórdão n.º 584/2016)”, reafirma: “tal como se afirmou no Acórdão n.º 659/2011, pode em regra dizer-se que:

«Com uma reapreciação jurisdicional, independentemente do seu resultado, revela-se satisfeito esse direito de defesa do arguido, pelo que a decisão do tribunal de recurso já não está abrangida pela exigência de um novo controle jurisdicional. E o facto de, na sequência dessa reapreciação, terem sido arguidas nulidades do acórdão do Tribunal da Relação não constitui motivo para se considerar que estamos perante uma primeira decisão sobre o thema decidendum, relativamente à qual é necessário garantir também o direito ao recurso.

Com efeito, a circunstância de os recorrentes terem arguido nulidades do acórdão do Tribunal da Relação não modifica o objeto do processo uma vez que, tal como a decisão da 1.ª instância, o acórdão do Tribunal da Relação que sobre ela recai limita-se a verificar se o arguido pode ser responsabilizado pela prática do crime que estava acusado e, na hipótese afirmativa, a definir a pena que deve ser aplicada, o que se traduz num reexame da causa”[18].

Tribunal Constitucional que no Ac. n.º 390/2004 entendeu que “a consagração de um duplo grau de jurisdição em matéria penal decorre essencialmente da exigibilidade constitucional de se conferir um grau elevado de asseguramento, de concretização e de realização aos direitos e garantias fundamentais da liberdade e segurança dos cidadãos (sendo igualmente invocável relativamente a outros direitos e garantias fundamentais), dado que estes são diretamente atingidos pelas decisões condenatórias e outras decisões judiciais que limitem ou restrinjam a liberdade. A existência de um segundo grau de reexame jurisdicional das medidas de privação, limitação ou restrição desses direitos fundamentais corresponde assim ao patamar que a Constituição tem como minimamente tolerável para que se possam haver por arredados os perigos de uma ofensa inconsistente de tais direitos”. “A apreciação de nulidades de acórdão condenatório não postula a necessidade de existência de mais um grau de recurso”. “Não se vislumbram suficientes razões que justifiquem a alteração da posição tomada quanto à matéria só porque o fundamento do recurso é constituído por nulidades do acórdão”.

A leitura que se faz no sentido da obrigatoriedade de incluir no requerimento de interposição do recurso as nulidades que os sujeitos processuais pretendam arguir de sentença ou de acórdão que conhece do objeto do processo ou do mérito do recurso, não só não suscita duvidas pelas razões aduzidas, como, com as necessárias cautelas resultantes da autonomia e diversidade de regimes, até pode confortar-se com o declaração de conformidade à Constituição “da interpretação dos artigos 380.º e 411.º, nº 1, do Código do Processo Penal, com o sentido de que o prazo para interposição do recurso começa e continua a correr a partir do termo inicial previsto no referido artigo 411.º, n.º 1, mesmo quando o arguido, ao abrigo do disposto no artigo 380.º, n.º 1, b), tenha requerido a correção da sentença” firmada pelo Plenário do Tribunal Constitucional no acórdão n.º 253/2014[19], publicado no Diário da República n.º 81/2014, Série II de 2014-04-28.

À semelhança do que ali se motivou, o dever legal de arguir as nulidades que o sujeito processual e, designadamente o arguido, imputar à sentença ou ao acórdão recorrido, no requerimento de interposição do recurso, sempre que a decisão o admita e o recorrente a pretenda impugnar, não é um ónus desproporcionado, que em nada contende com a possibilidade de efetivo exercício do direito ao recurso, de forma consentânea com a funcionalidade que constitucionalmente lhe está atribuída, pelo artigo 32.º, n.º 1. O recorrente que pretenda arguir nulidades da sentença ou acórdão recorrido não se vê colocado numa posição de indefesa, perante a ocorrência de uma nulidade da decisão relativamente ao qual não lhe foi possível antecipar-se nem defender-se.

Bem vistas as coisas, quando a decisão admitir impugnação perante outra instância superior, a necessária invocação das nulidades da decisão recorrida no requerimento de interposição do recurso, alarga substancialmente – de 10 para 30 dias -. o prazo para a respetiva arguição, permitindo, naturalmente, que sejam deduzidas com mais tempo e melhor estudo, portanto, mais fundamentadamente e sem que resulte preterido o conhecimento pelo próprio tribunal recorrido, ou também pelo tribunal ad quem, quando para tanto tiver mandamento legal.

Não se ignora que subliminar à pugna por fazer coincidir com a notificação da decisão que indefere a arguição das nulidades da sentença, o termo inicial do prazo para recorrer da sentença ou acórdão que conhece do objeto do processo - ou do mérito do recurso quando for o caso -, poderá estar o expediente de protelar, também por esta via, a obtenção de uma decisão definitiva do caso.

Como se deu conta, a alteração da norma foi comandada pelo escopo de combater semelhantes expedientes que mais não visam que arrastar indefinidamente a resolução do caso, a obtenção de uma decisão exequível e o encerramento dos procedimentos. Expediente que não pode tolerar-se, e que não tem, nem podia razoavelmente ter, amparo em qualquer norma ou princípio constitucional ou do direito penal convencional europeu e universal.

d. no caso:

Os recorrentes, notificados do acórdão da Relação de 26-06-2019, que conheceu do objeto dos respetivos recursos, confirmando integralmente a decisão condenatória recorrida, vieram, em requerimento dirigido àquele Tribunal, apresentado nos autos em 12 e em 13-07-2019, arguiram a nulidade desse acórdão argumentando que não conheceu questões que tinham suscitada nas alegações de recurso (cf. art. 379.º, n.º 1, al. c) ex vi art. 425.º, n.º 4, do CPP).

Tribunal que, também por acórdão datado de 27-11-2019 indeferiu as nulidades que os arguidos apontavam àquele seu aresto.

Notificados desse acórdão, os arguidos, em 2/01/2020, interpuseram os vertentes recursos.

i. recurso de BB e CC:

Os recursos destes arguidos em segundo grau, perante uma terceira jurisdição criminal, o STJ, são inadmissíveis e por duas diferentes determinações legais.

ª. dupla conforme:

São inadmissíveis desde logo pela dupla conforme consagrada no art.º 400º n.º 1 al.ª f) do CPP.

Cada um deles, foi condenado na 1ª instância pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art.º 21º n.º 1 do DL n.º 15/93 de 22/01, na pena de 6 anos de prisão. Impugnaram a decisão condenatória, recorrendo para o Tribunal da Relação. Tribunal de 2ª instância que pelo acórdão de 26-06-2019, confirmou integralmente a decisão recorrida, incluindo a medida da pena de prisão aplicada aos recorrentes.

Estabelece a norma citada que “não é admissível recurso” “de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão da 1ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos”.

Por sua vez, do disposto no art.º 432º n.º 1 al.ª b) resulta que só pode recorrer-se para o Supremo Tribunal de Justiça “de decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas relações, em recurso, nos termos do artigo 400.º

Da conjugação deste preceito com o disposto no art. 400º n.º 1 al. do CPP resulta, pois, que não se admite que estes arguidos impugnem perante o STJ, o acórdão da Relação que confirmou a decisão condenatória da 1ª instância –art. 432.º, n.º 1, b), do CPP.

Assim e desde logo, na procedência da questão prévia suscitada pela Procuradora-Geral Adjunta, rejeita-se, por inadmissibilidade legal – ao abrigo do disposto no art.º 400º n.º 1 al.ª f) e 432´n.º 1 al.ª b) do CPP -, o recurso do arguido BB e o recurso do arguido CC.

.

Rejeição que, em conformidade com as disposições conjugadas do art. 420º n.ºs 1 al.ª b) e do art. 414.º n.º 2 do CPP, implica a condenação dos recorrentes na sanção processual a que alude o art. 420º n.º 3. Do CPP.

b. extemporâneos:

E os recursos dos arguidos BB e CC sempre haveriam de rejeitar-se por terem sido interposto muito para além do prazo estipulado no art.º 411º n.º 1 do CPP. Prazo de 30 dias, em que o termo inicial é desencadeado pela notificação do acórdão confirmatório. No caso, os recorrentes, foram notificados desse acórdão, através da sua ilustre defensora, em 2 de julho de 2019 (notificação postal expedida em 26/06/2019).

É certo que arguiram nulidades em requerimento - autónomo –, (nos termos do disposto nos art. 615.º, n.º 4 (1.ª parte) e art. 617.º, n.º 6, ambos do CPC ex vi art. 4.º do CPP), apresentado nos autos em 12 (o arguido BB) e em 13 (o arguido CC) de julho de 2019. Todavia, a arguição de nulidades não suspendeu o decurso do prazo legal para interpor recurso. Sem prejuízo de obstar ao trânsito em julgado da decisão, uma vez que, quanto a eles, o acórdão confirmatório não o admite em razão da dupla conforme.

Querendo recorrer dessa decisão, como realmente vieram a fazer, mas somente em 2 de janeiro de 2010 (5 meses depois da notificação do acórdão recorrido) tinham de arguir as nulidades que lhe atribuíam (nas quais insistem), no requerimento de interposição do recurso, em obediência ao estabelecido no art.º 379º n.º 2 do CPP.

O acórdão que indeferiu a arguição das nulidades, é uma decisão definitiva, interlocutória, não suscetível de recurso ordinário, conforme resulta do art.º 617.º, n.º 6, do CPC, e de acordo com a jurisprudência deste Supremo Tribunal, de que acima se deu nota.

É certo que o Tribunal da Relação, admitiu, erroneamente, (como vem de demonstrar-se e em desrespeito do disposto no art.º 414º n.º 2 do CPP), o recurso destes dois arguidos. Contudo, essa decisão não vincula o tribunal ad quem, conforme estabelece o art.º 414º n.º 3 do CPP.

Por isso, ademais da dupla conforme, também a extemporaneidade obstava à admissão dos recursos dos arguidos BB e CC

i. recurso do arguido AA:

Este recorrente está condenado nos autos pela prática, em autoria material e em concurso real, de 1 crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21°, n.º 1, do D.L. 15/93 de 22-01, na pena parcelar de 8 anos e 6 meses de prisão, e de 1 crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86°, n.º 1, al. c), da Lei n.º 5/2006 de 23-02, com as alterações, introduzidas pela Lei n°50/2013 de 24 de Julho, na pena parcelar de 2 anos e 6 meses de prisão. E, em cúmulo jurídico daquelas penas parcelares, na pena única de 9 anos e 6 meses de prisão.


ª dupla conforme parcial:

Alegando que o acórdão apreciou erradamente as provas, enferma de nulidade por omissão de pronúncia, - por inobservância do dever de fundamentação e por insuficiente exame crítico das provas -, pretende que se anule o julgamento e o processo seja reenviado para novo julgamento por outro tribunal.

Constata-se que era esse o argumentário do recurso interposto perante a Relação. Aliás, com pequenos cortes e a eliminação da vasta referência aos depoimentos e ao sentido que entende ter sido o de algumas provas, o vertente recurso reproduz a motivação daquele e repete, praticamente ipsis literis, as correspondentes conclusões, ainda que mais agrupadas. Em suma, o recorrente limita-se a reiterar na impugnação da decisão da 1ª instância, sem argumentos distintos dos que esgrimiu no recurso perante a Relação.

Inovatoriamente pretende agora que a pena de prisão aplicada pela prática do crime de detenção de arma proibida seja convertida em multa, substituída (“que poderá ser paga através!) por trabalho (“comunitário”).

Como se assinalou, a confirmação da decisão condenatória ou dupla conforme é integral ou perfeita, quando, em sede de recurso, a Relação, mantém a sentença da 1ª instância, designadamente confirmando a qualificação jurídica dos factos, a forma de realização dos factos e da imputação ao arguido, a escolha e medida da pena aplicada.

Também se verifica dupla conforme, in mellius, quando o tribunal ad quem concedendo parcial provimento ao recurso, alivia a condenação do arguido, nomeadamente desagravando ou desqualificando o crime, diminuindo o número de crimes, modificando a forma de comparticipação do arguido nos factos em sentido favorável, aplicando pena não privativa ou menos restritiva da liberdade, ou diminui a medida da pena ou da condenação.

Há dupla conforme parcial quando a Relação, confirmando uma parte da decisão impugnada, modifica, em sentido desfavorável ao arguido, a parte restante.

Ainda que se verifique confirmação em qualquer das modalidades assinaladas da decisão da 1ª instância, a dupla conforme não impede recurso em 2ª grau, perante 3ª jurisdição, perante o STJ, sempre que a Relação aplique pena de prisão parcelar ou pena conjunta superior a 8 anos.

Sublinhou-se que a dupla conforme, tem a relevâncias que lhe conferem as normas das alíneas d) e f) do n.º 1 do art.º 400º e 432º n.º 1 al.ª b) do CPP. Impedem a admissão de recurso perante o STJ de acórdãos:

- absolutórios proferidos, em recurso, pelas relações, exceto no caso de decisão condenatória em 1.ª instância em pena de prisão superior a 5 anos;

- condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos.

No caso, o Tribunal de 2ª instância, a Relação, no acórdão recorrido, ademais do julgamento da matéria de facto, apreciou, especificadamente, as seguintes questões apresentadas pelo recorrente na impugnação da decisão condenatória da 1ª instância:

a) nulidade por falta de fundamentação;

b) impugnação da matéria de facto;

c) existência dos vícios elencados no artigo 410º nº2 do CPP e renovação da prova;

d) medida da pena.

E decidiu pela improcedência de todas as pretensões recursórias, confirmando, integralmente, a decisão condenatória do tribunal coletivo do juízo central criminal de Loures.

Especificadamente quanto à nulidade que o recorrente atribuía à decisão da 1ª instância, “concluiu que o Acórdão recorrido se não mostra ferido da nulidade invocada e consequentemente inexiste base factual para a alegação de inconstitucionalidade invocada”.

Repete-se que os termos das nulidades ora arguidas são exatamente os mesmos, decalcados através da reprodução praticamente literal da alegação daquele seu primeiro recurso, sem que adite novos argumentos ou enuncie especificadamente que concretas questões deixou o acórdão recorrido de conhecer e, quanto ao decidido, de fundamentar.

Verifica-se, por isso, dupla conforme relativamente às questões apreciadas e decididas, especificadamente, no acórdão confirmatório recorrido. Incluindo-se nesta - a dupla conforme -, as nulidades que o recorrente insiste em arguir. Outro tanto sucede com a questão respeitante à escolha e à medida da pena – 2 anos e 6 meses de prisão -, em que foi condenado pela prática do crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos art.ºs 86º nº 1, al.ª c), e 3º, nºs 1 e 4, al.ª a), da Lei nº 5/2006, de 23/02.

Pelo que, nestes segmentos do recurso, anteriormente colocados perante a Relação, e por esta decididos no acórdão confirmatório recorrido, não é admissível sindicância através de recurso em segundo grau, para um triplo grau de jurisdição, isto é, perante o STJ.

Também não admite recurso perante o STJ a escolha e a medida da pena de prisão aplicada pela prática do crime de detenção ilegal de arma, atenta a respetiva medida, muito inferior a 8 anos de prisão, integralmente confirmada pela Relação no acórdão recorrido.

 Assim e em conformidade com o exposto, à luz das disposições conjugadas dos art.º 432º n.º 1 al.ª b) e 400º n.º 1 al.ª f) do CPP, por não ser legalmente admissível recurso do acórdão da Relação que, apreciando as questões suscitadas pelo recorrente e quanto à pena parcelar de 2 anos e 6 meses (quanto a esta pena seria também inadmissível por força do disposto na al.ª e) do n.º 1 do art.º 400º do CPP), confirmou a decisão condenatória da 1ª instância, impõe-se rejeitar, nesta parte, o recurso do arguido AA  – art.s. 420.º n.º 1 alínea b) e 414.º n.º 2 do CPP.

Rejeição, em parte, que não é inviabilizada pela decisão de admissão do recurso no Tribunal da Relação –art, 414.º, n.º 3 do CPP.

c. extemporaneidade:

Em razão da medida concreta da pena aplicada ao arguido AA pela prática do crime de tráfico de estupefacientes - 8 anos e 6 meses de prisão -, e bem assim da medida da pena conjunta – 9 anos de prisão -, o seu recurso seria admissível - cfr. art. 400.º, n.º1, f), do CPP -, e, consequentemente, seriam conhecidas as questões que suscita referentes à medida da pena judicial em que vem condenado pelo crime de tráfico de estupefacientes e à dosimetria da pena conjunta.

Sendo o acórdão recorrido suscetível de recurso ordinário, devia o recorrente arguir as nulidades, quaisquer nulidades que entendesse imputar-lhe, incluindo a invocada omissão de pronúncia, no requerimento de interposição do recurso, tal como impõe o disposto no art.º 379º n.º 2 do CPP.

Não foi assim que procedeu. Ao invés, notificado em 2/07/2019 do acórdão confirmatório, datado de 26/06/2019, que conheceu do mérito da respetiva pretensão recursória, por requerimento apresentado em 13-07-2019, arguiu perante o próprio Tribunal da Relação, enfermar de nulidades.

Dispõe, desde logo de todos os elementos indispensáveis à elaboração do seu recurso – incluindo, evidentemente a arguição das nulidades que entendesse atribuir ao acórdão confirmatório -, não o interpôs no prazo de 30 dias contados da notificação do acórdão confirmatório. Entendeu aguardar pela decisão daquele seu requerimento.

O Tribunal da Relação, por acórdão de 27/11/2019, indeferiu as nulidades arguidas pelo recorrente.

Conforme se expôs, esta decisão da Relação, que indeferiu as nulidades suscitadas, é insuscetível de recurso ordinário, - cfr. art. 617.º, n.º 6, do CPC.

E como também se sustentou, a interpretação da norma do art.º 379º n.º 2 do CPP com o sentido de considerar inadmissível o recurso nestas situações, não padece de desconformidade com a norma da Constituição que consagra o direito ao recurso.

Sublinha-se, o direito ao recurso e as mais amplas garantias da defesa não suportam interpretações que multiplicavam exponencialmente ou tornariam absolutamente infinito o prazo para recorrer das decisões judiciais que, admitindo recurso ordinário, conhecem do objeto do processo. De arguição de nulidade da decisão que conhece do mérito da causa, em arguição de nulidade da decisão que indefere as nulidades anteriormente arguidas, e assim repetidamente em cadeia para a condenação em 1ª instância e depois e se lá chegasse também para o recurso em 2ª instância, estava descoberto o expediente procedimental para que nenhuma condenação transitasse em julgado antes de o procedimento criminal prescrever. Tal interpretação, se acolhida, afrontava o direito dos sujeitos processuais e das vítimas “a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável” – art.º 20 n.º 4 da Constituição da República (cfr. também art.º 6º n.º 1 da Convenção Europeia dos Direitos Humanos) – atentando gravemente contra a celeridade e a eficiência da justiça, que é um dos pilares fundamentais da arquitetura do nosso processo penal, constitucionalmente reconhecida (“a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade” – n.º 5 do art.º 20º citado).

Não resta senão concluir que o recurso do arguido AA é extemporâneo, porque interposto 5 meses após a notificação do acórdão confirmatório recorrido. Foi apresentado fora do prazo legal, muito para além do termo dos 30 dias estabelecido e contados nos termos do disposto no art.º 411º n.º 1 al.ª a) do CPP.

O arguido não recorre do acórdão que indeferiu a arguição das nulidades que imputava ao acórdão confirmatório, certamente ciente de que aquele não é recorrível porque não é uma decisão que conheça, a final, do objeto do processo – cfr art.º 400º n.º 1 al.ª c) do CPP. Não é um acórdão que tenha decidido sobre a prova dos factos narrados e imputados na acusação, a qualificação jurídica dos factos provados, a responsabilidade do arguido e a determinação das inerentes consequências jurídicas.

Sustentou-se no Ac. STJ de 21/03/2018: “Decisão que não conheça, a final, do objeto do processo, nos termos do art. 400.º, n.º 1, al. c), do CPP, é toda a decisão interlocutória, bem como a não interlocutória que não conheça do mérito da causa, sendo que ao aludir ao objeto do processo, refere-se, aos factos imputados ao arguido, aos factos pelos quais o mesmo responde, ou seja, ao objeto da acusação (ou da pronúncia), visto que é esta que define e fixa, perante o tribunal, o objeto do processo, condicionado o se da investigação judicial, o seu como e o seu quantum, pelo que contempla todas as decisões que não conheçam do mérito da causa.

“O traço distintivo entre a redação atual e a anterior à entrada em vigor da Lei n.º 48/07, de 29-08 é que agora são irrecorríveis as decisões proferidas pelas relações, em recurso, que ponham termo à causa por razões formais, quando na versão pré-vigente o não eram, ou seja, o legislador alargou a previsão da al. c) do n.º 1 do art. 400.º do CPP, ampliando as situações de irrecorribilidade relativamente a acórdãos proferidos, em recurso, pelo Tribunal da Relação[20].

Conforme se assinalou, a interpretação que considera inadmissível o recurso nestas situações, não padece de inconstitucionalidade.

Assim e em consonância com o exposto, por ter sido apresentado para além do prazo estabelecido no art.º 411º n.º 1 do CPP, contado nos termos da respetiva alínea a), rejeita-se, ao abrigo do disposto nos art.ºs 414.º, n.º 2 e 420.º, n.º 1, al. b), ambos do CPP, o recurso do arguido AA, (incluindo a parte que não era abrangida pela dupla conforme).

A rejeição do recurso com os fundamentos indicados obriga, nos termos do art.º 420º n.º 3 citado, ao pagamento da importância aí prevista.


D - DECISÃO:

Em conformidade com o exposto, o Supremo Tribunal de Justiça, 3ª secção criminal, decide:

a) rejeitar, por não ser legalmente admissível, o recurso do arguido BB e o recurso do arguido CC, por dupla conforme consagrada no art.º 400º n.º 1 al.ª f), mas também porque apresentados para além do prazo estipulado no art.º 411º n.º 1 al.ª a), ambas as disposições citadas do CPP;

b) rejeitar, por extemporâneo, o recurso do arguido AA, porque apresentado para além do prazo de 30 dias previsto e contado nos termos do art.º 411º n.º 1 al.ª a) do CPP; e

c) condenar, nos termos do art.º 420º n.º 3 do CPP, os recorrentes BB e CC, cada um ao pagamento, cada um de 7UCs;

d) condenar, nos termos do art.º 420º n.º 3 do CPP, o recorrente AA ao pagamento de 5UCs.


*


Custas pelos recorrentes – art.º 513º n.º 1 do CPP -, fixando-se a taxa de justiça em 5 UCs - art.º 8º n.º 9 e tabela III anexa ao Regulamento das Custas Processuais.


Lisboa, 22 de abril de 2020.


Nuno Gonçalves (relator)

Paulo Ferreira da Cunha (Adjunto)

_____

[1] Proc. 9/12.1SOLSB.S2, in www.dgsi.pt
[2] Proc.  881/16.6JAPRT-A.P1.S1, in www.dgsi.pt
[3] Proc. 461/17.9GABRR.L1.S1, in www.dgsi.pt
[4] Proc. 753/18.0JABRG.G1.S1.
[5] Ac. STJ de 11/10/2007, proc. 07P3330, in www.dgsi.pt.
[6] Ac. STJ de 13/12/2018, proc. 293/17.4JACBR.C1.S1, in www.dgsi.pt.
[7] Diário da República –I série-A, n.º 35, de 11-02-1994.
[8] Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado e Comentado, Almedina 12 Ed., pag. 723.
[9] Estabeleciam: “3 - As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário; no caso contrário, o recurso pode ter como fundamento qualquer dessas nulidades. A nulidade prevista na alínea a) do mesmo número pode ser sempre arguida no tribunal que proferiu a sentença.
4 - Arguida qualquer das nulidades da sentença em recurso dela interposto, é lícito ao juiz supri-la, aplicando-se, com as necessárias adaptações e qualquer que seja o tipo de recurso, o disposto no artigo 744.º”.
[10] 3ª sec., proc. 07P2583, www.dgsi.pt.
[11] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª Ed. (reimpressão), Coimbra Editora, Coimbra, 2004, pag. 692.
[12] Código Processo Penal Comentado, 2016 – 2.ª Edição revista, Almedina, em anotação ao art. 379.º, do CPP, pag. 1133/1134.
[13] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Pereira de Sousa in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I. Parte Geral e Processo de declaração, Artigos 1.º a 702.º, 2018, Almedina, em anotação ao art. 615.º do CPC, pag. 736/737:
[14] No mesmo sentido Ac. de 09-08-2017, Proc. n.º 2210/12.9TASTB-AB.S1; Ac. de 04-01-2006, Proc. n.º 3795/05 - 3.ª Secção.
Ver ainda Ac. de 06-06-2007, Proc. n.º 143/07 - 5.ª Secção
[15] Ac. STJ de 10-05-2017, proc. 122/13.8TELSB-AH.L1.S1, in www.dgsi.pt.
[16] Proc. 547/04.0JDLSB.L1.S1, www.dgsi.pt
[17] Proc. n.º 3468/05 - 3.ª Secção, www.dgsi.pt.
[18] Ac. nº 186/2019, in www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos.
[19] Confirmando a decisão tirada no Ac. n.º 403/2013.
[20] 3.ª sec. Proc. 736/03.4TOPRT.P2.S1, ECLI:PT:STJ:2018:736.03.4TOPRT.P2.S1.8.