Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
17/09.0TJVNF.P1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: SILVA GONÇALVES
Descritores: RECURSO DE REVISTA
RECURSO PARA O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DUPLA CONFORME
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
SUCUMBÊNCIA
ACIDENTE DE VIAÇÃO
CULPA
DESPACHO SOBRE A ADMISSÃO DO RECURSO
RECURSO SUBORDINADO
Data do Acordão: 02/13/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NÃO SE CONHECE DOS RECURSOS
Área Temática: DIREITO PROCESSUAL CIVIL - RECURSOS
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 700.º, N.º 1, AL. H), 704.º, N.º 1, 721.º, N.ºS 1 E 3, 721.º-A
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE 10-5-12, EM WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I - O DL n.º 303/2007, de 24-08, introduziu no regime de recursos uma limitação do recurso de revista nos casos em que a decisão da Relação confirme, sem voto de vencido, a decisão da 1.ª instância (dupla conforme).

II - Verifica-se a dupla conforme quando a decisão de 1.ª instância condena o réu em determinado montante (in casu, 87 471,04) e, em recurso por este interposto, a Relação reduz tal condenação (€ 61 838,80), caso em que o âmbito da decisão da Relação já se encontra compreendido na condenação prolatada em 1.ª instância.

III - Não obsta à dupla conforme – na redacção do CPC referida em I – a diferente motivação sufragada nas instâncias, designadamente quanto ao juízo na culpa sobre a produção do acidente de viação, em caso de responsabilidade civil extracontratual.

IV - A dependência do recurso subordinado à sorte do recurso principal, a que aludem os n.º 2 e 3 do art. 682.º do CPC, importa que, caso o recurso principal não seja admissível, pelas razões referidas em I e II, não pode ser conhecido o recurso subordinado.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


     AA intentou, no Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão, a presente acção, sob a forma ordinária, contra “BB -Companhia de Seguros, S. A.”, pedindo que seja condenada a pagar-lhe:

      a) Uma indemnização correspondente a todos os danos patrimoniais e não patrimoniais pela mesma sofridos em virtude do acidente melhor descrito nos autos, de montante nunca inferior a € 69 961,84;

      b) Uma indemnização, cuja quantificação se relega para posterior liquidação de sentença, a título de indemnização pelos danos, patrimoniais e não patrimoniais futuros decorrentes das várias intervenções cirúrgicas e plásticas em número indeterminado, para tratamento e correcção das lesões e sequelas a nível da coluna cervical e do pescoço  (cervicalgias agravadas com os esforços, dificuldade na mobilização do pescoço, rigidez da coluna cervical e cervicalgias residuais), vários internamentos hospitalares, várias despesas hospitalares, vários tratamentos, necessidade de ajuda medicamentosa, de ajudas técnicas, acompanhamento médico, de efectuar vários exames médicos, várias consultas, várias sessões de fisioterapia, várias deslocações a hospitais e clínicas que futuramente tenha que efectuar em consequência das lesões causadas pelo acidente;

      c) Uma indemnização referente ao tempo de paralisação/privação do uso e fruição do veículo ligeiro de passageiros de sua propriedade matrícula JO, mais concretamente na quantia de € 6 388,08 relativa ao período de tempo compreendido entre 23.10.2007 e 20.4.2008, e na quantia diária que equitativamente se fixa em € 15 calculada desde o dia 21.4.2008 e até à efectiva e integral reparação do seu veículo, cuja total quantificação relega para liquidação de sentença;

      d) Uma indemnização referente ao parqueamento do mencionado veículo nas instalações da oficina reparadora, à razão de € 6 diários, e que à presente data orça em € 2 646 e que é devida desde o dia do acidente e até à efectiva e integral reparação do veículo, cuja total quantificação se relega para liquidação de sentença; e

      e) Os juros vincendos das referidas indemnizações à taxa legal anual, a contar da citação até integral pagamento.

     Reclama estes valores a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais invocados na petição inicial (p. i.) e que diz ter sofrido em consequência do embate ocorrido pelas 08.50 horas do dia 23.10.2007, numa Estrada Municipal da freguesia de ..., Vila Nova de Famalicão, no qual intervieram as viaturas com as matrículas JO e -EJ, a primeira tripulada pela A. e a segunda por CC, imputando a A. a responsabilidade pelo sucedido ao condutor do veículo EJ, seguro na demandada.

     A Ré contestou afastando a responsabilidade do condutor do veículo EJ pela produção do sinistro e concluindo pela improcedência da acção.

     A A. replicou e concluiu como na p. i.; pediu a condenação da Ré como litigante de má fé.

     Foi proferido despacho saneador (tabelar) e seleccionada a matéria de facto (assente e controvertida), tendo a A. apresentado a reclamação de fls. 133, não atendida (fls. 156), sendo depois indeferida a ampliação do pedido requerida a fls. 204 (fls. 214).

     Realizada a audiência de discussão e julgamento, o Tribunal julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a Ré a pagar à A.(a) a indemnização de € 87 471,04 (sendo 15 000 por danos não patrimoniais), bem como as indemnizações por danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes de (b) futuras despesas hospitalares, tratamentos, necessidades de ajuda medicamentosa, ajudas técnicas, acompanhamento e exames médicos, consultas, sessões de fisioterapia e massagens e deslocações a hospitais e clínicas para tratamento das sequelas de que ficou a padecer e (c) da privação do uso e fruição do veículo JO, relativa ao período de tempo compreendido entre o dia 14.7.2012 e aquele em que entregar à A. o valor fixado para reparar o dano da perda dessa viatura, à razão de 10 euros por dia - cuja total e integral quantificação se relega para posterior liquidação -, bem como (d) uma indemnização referente ao valor que a A. vier a suportar pelo parqueamento do veículo JO nas instalações da oficina reparadora, até ao dia em que transite esta decisão, e (e) os juros de mora à taxa legal, desde 13.01.2009 (cf. art. 279º, do CC) sobre o valor de € 6 388,80, desde hoje sobre o restante valor deferido em (a), e desde a data da decisão que os fixar sobre os referidos em (b), (c) e (d), sempre até efectivo e integral pagamento. Foi julgado improcedente o pedido de condenação da Ré como litigante de má fé.

     Inconformados, A. e Ré apelaram desta sentença para a Relação do Porto que, por acórdão de 10.07.2013 (cfr. fls. 498 a 519), revogando em parte a sentença recorrida, condenou a ré a pagar à autora a indemnização de € 61 838,80 (sessenta e um mil oitocentos e trinta e oito euros e oitenta cêntimos)[1] e a indemnização pelos danos patrimoniais decorrentes dos mencionados tratamentos de medicina física e de reabilitação, mantendo-se no mais o decidido.

     Irresignadas, recorrem agora para este Supremo Tribunal a ré “BB -Companhia de Seguros, S. A.” e, subordinadamente, a autora AA.

      A ré “BB-Companhia de Seguros, S. A.” apresenta as seguintes conclusões:

1. A recorrente não pode conformar-se com a douta sentença recorrida, uma vez que, tendo em conta a matéria de facto provada, entende que a responsabilidade pela ocorrência do acidente de viação descrito nos autos não pode ser imputada em exclusivo ao condutor do veículo por si seguro.

2. O condutor do veículo EJ procedeu com todos os cuidados e prudência necessários, não lhe sendo exigível ter outra actuação igualmente compatível com as regras estradais: parou junto ao sinal de STOP e apenas reiniciou a marcha após verificar que não se aproximava qualquer veículo vindo do seu lado esquerdo.

3. Aliás, é a essa a conduta que o douto acórdão recorrido defende que o condutor do veículo seguro na Ré devia adoptar, pelo que, salvo o devido respeito, acaba por existir uma contradição entre os fundamentos e a decisão final do acórdão.

     4. Não existindo culpa de nenhum dos condutores, devia ter sido decidido que foi igual a contribuição de cada um dos condutores e do respectivo veículo na produção do acidente e dos danos consequentes, nos termos do art. 506.º, n.º 1, do C. Civil.

5. Deve, pois, ser revogado o douto acórdão recorrido e proferir-se novo acórdão que considere igual a medida da contribuição de cada um dos veículos e dos respectivos condutores para os danos sofridos pela Autora.

6. De todo o modo, caso se entenda que houve responsabilidade do condutor do veículo EJ pela ocorrência do acidente, o que, conforme se referiu, apenas se considera por mera hipótese de raciocínio, a indemnização arbitrada no douto acórdão recorrido continua a ser exagerada e, atreve-se mesmo a dizer recorrente, profundamente injusta.

7. No presente caso, não se pode esquecer que a Autora não sofreu uma efectiva perda de ganho, uma vez que continua a auferir o mesmo rendimento que auferia à data do acidente. Não teve, felizmente, este acidente qualquer tipo de consequências a este nível.

8. Atendendo à idade do Autora na data da consolidação médico-legal das lesões por si sofridas, 38 anos, ao grau de IPG de 5 pontos de que ficou a padecer e à sua retribuição, o valor anual de € 22.820,00, e levando em consideração que as lesões sofridas não lhe implicaram, afortunadamente, uma real perda de ganho, nunca a compensação pelos danos patrimoniais futuros, poderia ascender a um montante superior a € 15.000,00.

9. Entende a recorrente que a quantia de € 12.500,00 atribuída a título de indemnização à Autora pelos danos morais sofridos é igualmente excessiva tendo em conta a matéria de facto provada e a jurisprudência habitual dos nossos tribunais para casos semelhantes.

10. Sem colocar em causa a gravidade que sempre reveste qualquer lesão, a Autora pôde prosseguir, com mínimos condicionalismos, a sua vida e o seu dia-a-dia com relativa semelhança ao que fazia anteriormente ao acidente, mantendo a sua actividade e não vendo alterada qualquer ocupação de tempo livre que pudesse ter.

11. Tendo em conta a matéria de facto provada, nomeadamente, as lesões sofridas pela Autora, as sequelas daí decorrentes, os efeitos provocados na sua vida e no seu dia-a-dia, a indemnização fixada a título de danos morais nunca poderia ser superior ao montante de € 5.000,00.

12. A ora recorrente também não se pode conformar com a atribuição à Autora de uma indemnização de € 6.388,80, acrescida do valor de € 15.450,00, e do valor de € 10,00, por dia, desde 14.07.2012, até ser entregue o valor fixado para ressarcir a perda e a privação do uso da viatura.

13. Nem pode a recorrente aceitar que seja fixada uma indemnização à Autora referente ao valor que esta vier a suportar pelo parqueamento do seu veículo com a matrícula JO, nas instalações da oficina onde o mesmo está depositado, até ao dia em que transite a decisão final dos presentes autos.

14. As duas condenações dão abrigo a um flagrante abuso de direito, constituindo uma profunda injustiça e permitindo à Autora e à oficina em questão enriquecer ilegitimamente à custa da ora recorrente.

15. Foi aceite por ambas as partes, e por todos os tribunais, que a reparação do veículo da Autora era económica e tecnicamente inviável, razão pela qual ambas concordaram na perda total da viatura, pelo que a Autora, desde a altura do acidente, ou, pelo menos, desde que foi aceite a perda total do veículo, teve plena consciência de que iria ter necessidade de adquirir um outro veículo e que o veículo sinistrado não teria mais qualquer outra utilidade.

16. Resulta provado, factos n.º s 16, 74, 78 e 79, que o veículo da Autora valia cerca de € 2.500,00 e que os salvados ou o que dele restou estavam avaliados entre os € 50,00 e os € 150,00, e que a reparação poderia ser conseguida por um custo, no mínimo, de € 4.227,70 00.

17. É certo que a Autora não é obrigada a zelar pêlos interesses da ora recorrente, mas tem de agir como um bonus pater familiae ou bona mater familiae, se preferirmos, atendendo aos tempos, e a sua actuação, nos termos em que decorrem, configura uma situação de claro abuso do direito ao aceitar ter um dispêndio com o aluguer de um veículo de substituição, durante mais de seis meses, uma quantia superior àquela que seria necessária para proceder à reparação do seu próprio veículo ou adquirir um com características similares (!?).

18. O dano que a Autora invoca com o aluguer do veículo é da sua responsabilidade, não sendo directamente causado pelo acidente descrito nos autos.

19. De igual modo, e atendendo a tudo o que atrás se referiu, também não se pode admitir que a Ré seja condenada a pagar à oficina onde está depositado o veículo qualquer quantia.

20. Trata-se de um veículo perdido, sem reparação, e que a Autora sempre teve plena consciência desse facto, aceitando-o, pelo que apenas se percebe o interesse no seu depósito ou guarda, ao invés de se ter diligenciado pela sua venda com o intuito de provocar à ora recorrente o máximo de prejuízos, aumentando injustificadamente o custo da sua indemnização.

21. Não pode ser admitido por um tribunal que a Autora deixe um veículo que sabe não ter reparação depositado numa garagem à qual terá que pagar uma quantia diária, certamente mais do que triplicando os seus próprios prejuízos (?!?!?).

22. Deste modo, sempre teria de ser revogado o douto acórdão recorrido na parte em que condena a recorrente no pagamento das despesas com o aluguer de uma viatura, bem como no pagamento da quantia € 10,00, por dia, a título de privação do uso, bem como no pagamento das despesas, razoáveis e proporcionais às circunstâncias ocorrentes, relativas ao reboque e recolha da sua viatura, no que se vier a liquidar, quando tais despesas não são nada razoáveis e são, desde logo, completamente desproporcionadas.

23. Ao decidir como decidiu, a douta sentença recorrida não teve na devida conta a matéria de facto provada nem o direito aplicável, tendo violado o disposto nos arts. 334.º, 562.º, 563.º, 564.º e 566.º do Código Civil.

Termina pedindo que seja revogado o acórdão recorrido e seja proferido novo acórdão nos termos atrás descritos.

Contra-alegou a recorrida invocando como questão prévia que, porque se verifica o requisito limitativo emergente da dupla conforme, não deve ser admitido o recurso e termina pedindo a sua improcedência.

    

     A autora AA apresenta as seguintes conclusões:

1. Autora/Recorrente não concorda com o valor indemnizatório que lhe foi atribuído a título de danos patrimoniais, mais concretamente a título de perda de capacidade de "ganhos"/dano biológico.

2. Autora/Recorrente não concorda com o valor indemnizatório que lhe foi atribuído a título de danos não patrimoniais.

3. Atendendo à matéria de facto dada como provada, mais concretamente nos pontos n.°s 20°, 45°, 51°, 52°, 53°, 54°, 55°, 56°, 57°, 58°, 59°, 60° e 84° da Douta Sentença e com interesse para a determinação do montante indemnizatório a atribuir à Autora/Recorrente a titulo de danos patrimoniais, mais concretamente a titulo de perda de capacidade de "ganhos"/dano biológico, deverá o mesmo ser fixado equitativamente em quantia nunca inferior a € 40.000.00 (Quarenta Mil Euros).

4. Tal montante indemnizatório, deverá ter em linha de conta, os seguintes factores:

     20. Autora que nasceu em 06/08/1969.

     46. A A. apresentou diagnóstico de politraumatizada, com múltiplas lesões traumáticas do foro ortopédico, designadamente: Traumatismo torácico com embatimento da grade costal; Contusão da parede torácica; Dificuldade de mobilização cervical: Dor na coluna torácica e esternal; Traumatismo da região cervical, pescoço e omoplata, e Dorsalgia.

     61. Apesar dos vários tratamentos e de várias sessões de fisioterapia a que se submeteu, a Autora ficou a padecer definitivamente e em função das lesões politraumáticas sofridas com o embate/colisão dos autos, das seguintes sequelas actuais, permanentes e irreversíveis: Cervicalgias, agravadas com os esforços; Dificuldade na mobilização do pescoço, sobretudo a rotação do lado esquerdo que está mais presa; alguma Rigidez da coluna cervical e pescoço; Dores ocasionais a nível da coluna cervical e do pescoço em certos movimentos que se agravam, com os esforços e/ou quando pega e/ou quando carrega e/ou transporta objectos pesados e/ou esforços físicos; Limitação de movimentos e mobilidade a nível da coluna cervical e do pescoço, e Dificuldade em praticar desportos ou atividades que necessitam de funcionalidades que envolvam as sequelas corporais acima referidas.

     62. A Autora, em consequência das lesões sofridas terá necessidade de suportar várias despesas hospitalares, a vários tratamentos, necessidade de ajuda medicamentosa, de ajudas técnicas, acompanhamento médico e de efectuar vários exames médicos, várias consultas, várias sessões de fisioterapia e massagens e de efectuar várias deslocações a hospitais e clínicas.

     63. A Autora irá sofrer de limitação de mobilidade a nível da coluna cervical e do pescoço.

     64. Em virtude das lesões sofridas e da irreversibilidade das sequelas causadas pelo acidente dos autos, a Autora padece, actualmente, de uma Incapacidade Permanente Geral de 5%, que implica esforços suplementares na sua profissão habitual e actual de Enfermeira Especialista e outras categorias profissionais semelhantes.

     65. Em consequência das lesões sofridas e da irreversibilidade das sequelas actuais e permanentes causadas pelo acidente dos autos, a Autora sente actualmente - e sentirá no futuro - dificuldades acrescidas e necessidade de realizar esforços suplementares no seu dia-a-dia laborai de Enfermeira Especialista e outras categorias profissionais semelhantes.

     66. Bem como dores e dificuldades, que até à data do embate não sentia.

     67. Que a referida atividade profissional da Autora exige mobilidade, força, resistência ao esforço e velocidade dos membros superiores, pescoço e coluna cervical, e é predominantemente efectuada de pé e manualmente.

     68. Antes e à data do acidente de viação dos presentes autos, a Autora era uma pessoa trabalhadora e era uma pessoa com alegria de viver.

     69. À data do acidente de viação descrito nos presentes autos, a Autora exercia habitualmente a categoria profissional de Enfermeira Especialista.

     70. A Autora, pelo exercício da sua categoria profissional de Enfermeira Especialista, auferia à data do acidente de viação descrito nos autos, um salário mensal ilíquido na ordem dos 1.567,47 € (mil quinhentos e sessenta e sete euros e quarenta e sete cêntimos), discriminado da seguinte forma: -1.362,69 € a título de remuneração base; - 80,60 € a titulo de subsidio de alimentação da Administração Pública - 21,52€ a titulo de subsidio familiar crianças/jovens; -€102,66 a título de encargos com saúde.

     85. Em 2009 a remuneração base da Autora passou para 1.431,66 euros.

5. Atendendo à matéria de facto dada como provada, mais concretamente nos pontos n.°s 43.º, 44.º, 45.º, 46.º, 47.º, 48.º, 49.º 50.º,51.º, 52.º,| 53.º, 81.º, 82.º e 83.º da Douta sentença e com interesse para a determinação do montante indemnizatório a atribuir ao Autor/Recorrente a titulo de danos não patrimoniais, deverá o mesmo ser fixado equitativamente em quantia nunca inferior a € 20.000.00 (Vinte Mil Euros).

6. Tal montante indemnizatório deverá ter em linha de conta os seguintes factores:

       54. Como consequência directa e necessária do descrito embate/colisão, a Autora sofreu ferimentos e lesões traumáticas infra referidas.

      55. Tendo dado entrada no Serviço de Urgência do Hospital Nossa Senhora da Oliveira em Guimarães no dia 23/10/2007, onde foi observado e teve alta hospitalar no mesmo dia.

     56. A A. apresentou diagnóstico de politraumatizada, com múltiplas lesões traumáticas do foro ortopédico, designadamente: Traumatismo torácico com embatimento da grade costal; Contusão da parede torácica; Dificuldade de mobilização cervical: Dor na coluna torácica e esternal; Traumatismo da região cervical, pescoço e omoplata, e Dorsalgia.

     57. A Autora, teve alta clínica, no mesmo dia 23/10/2007, cerca das 14 horas e 53 minutos, com indicação de vigilância e orientação para médico assistente, devendo regressar ao serviço de urgência em caso de agravamento de sintomatologia, sendo medicada com aine.

     58. Após ã alta hospitalar em 23/10/2007, a Autora realizou fisioterapia durante cerca 30 (trinta) dias no Serviço de Fisiatria do Hospital Nossa Senhora da Oliveira em Guimarães.

     59. Em 28.07.2008 a Autora foi examinada pelo Exmo. Senhor Doutor DD, Medico …, o qual lhe diagnosticou, em consequência do acidente de viação em causa queixas de cervicalgias, agravadas com os esforços e dificuldade na mobilização do pescoço. Segundo declaração desse médico, como sequelas a A. apresentava, então, rigidez da coluna cervical e cervicalgias residuais.

     60. A Autora, em consequência do acidente dos autos, esteve com Incapacidade Temporária Absoluta (ITA), desde a data do acidente - ocorrido em 23.10.2007 - até 30.10.2007.

     61. Data em que ficou clinicamente curada, com alta médica definitiva, embora com sequelas permanentes e irreversíveis.

     62. Apesar dos vários tratamentos e de várias sessões de fisioterapia a que se submeteu, a Autora ficou a padecer definitivamente e em função das lesões politraumáticas sofridas com o embate/colisão dos autos, das seguintes sequelas actuais, permanentes e irreversíveis: Cervicalgias, agravadas com os esforços; Dificuldade na mobilização do pescoço, sobretudo a rotação do lado esquerdo que está mais presa; alguma Rigidez da coluna cervical e pescoço; Dores ocasionais a nível da coluna cervical e do pescoço em certos movimentos que se agravam, com os esforços e/ou quando pega e/ou quando carrega e/ou transporta objectos pesados e/ou esforços físicos; Limitação de movimentos e mobilidade a nível da coluna cervical e do pescoço, e Dificuldade em praticar desportos ou atividades que necessitam de funcionalidades que envolvam as sequelas corporais acima referidas.

     63. A Autora, em consequência das lesões sofridas terá necessidade de suportar várias despesas hospitalares, a vários tratamentos, necessidade de ajuda medicamentosa, de ajudas técnicas, acompanhamento médico e de efectuar vários exames médicos, várias consultas, várias sessões de fisioterapia e massagens e de efectuar várias deslocações a hospitais e clínicas.

     64. A Autora irá sofrer de limitação de mobilidade a nível da coluna cervical e do pescoço.

     84. A Autora, em consequência das referidas lesões traumáticas sofridas com o acidente descrito nos autos, sofreu múltiplas, frequentes e dores durante todo o tempo que mediou entre o acidente, os seus tratamentos a que se submeteu, as várias sessões de fisioterapia, o período de convalescença, o período de incapacidade temporária absoluta e a sua recuperação ainda que parcial.

     85. As lesões e sequelas descritas afectarão a Autora durante toda a sua vida.

     86. Lesões e sequelas essas que a prejudicam e interferem com a mobilidade no acto sexual em certas posições, na medida do que ficou acima apurado.

7. O Douto Acórdão violou as seguintes disposições legais: artigos 483°, 496.°, n.°s 1 e 3, 562°, 563°, 564°, n.°1 n.° 2, 566.°, n.°s 1, 2 e 3, todos do Código Civil.

Termina pedindo que seja revogado o acórdão recorrido e substituído por outro que condene a ré na medida do acima assinalado.

 A recorrida não contra-alegou

  Corridos os vistos legais cumpre decidir.

   

      A 1ª instância deu como provados os seguintes factos[2]:

1. No dia 23.10.2007, cerca das 08.50 horas, na Rua …, freguesia de …, concelho e comarca de Vila Nova de Famalicão, ocorreu um acidente de viação no qual intervieram o veículo ligeiro de mercadorias, de serviço particular, com a matrícula -EJ, de propriedade da firma "EE, LDA." e conduzido por um funcionário desta de nome CC, e o veículo ligeiro de passageiros, de serviço particular, com a matrícula JO, de propriedade e conduzido pela A.. (A)

2. Entre aquela firma na qualidade de proprietária do veículo EJ e a Ré existia à data do mencionado acidente, um contrato de seguro, titulado pela apólice n.° ..., mediante o qual, havia transferido para esta companhia de seguros a responsabilidade civil pelos danos causados a terceiros, bem como a pessoas transportadas, pela sua carga e emergentes da circulação rodoviária do aludido veículo. (B)

3. O condutor CC, no dia, hora e local do aludido acidente de viação, conduzia o veículo EJ por conta, às ordens e sob a orientação da sua entidade patronal, dentro do seu horário de trabalho e seguindo itinerário que ela lhe havia determinado. (C)

4. No dia, hora e local acima mencionados, a A. conduzia o veículo JO, na Rua ..., freguesia de ..., concelho e comarca de Vila Nova de Famalicão, no sentido de marcha V. N. Famalicão/..., numa via que lhe conferia prioridade nos cruzamentos e entroncamentos, conforme sinal vertical “B9a”, existente na berma direita da Estrada Municipal por onde seguia a cerca de 100 metros de distância antes do local do embate. (D)

5. A Estrada Municipal, à data e no local onde ocorreu o acidente de viação em apreço, dispunha de uma faixa de rodagem única com dois sentidos de trânsito, com marcação de vias e com bastante iluminação pública de carácter permanente. (E)

6. A Estrada Municipal, à data e no local onde ocorreu o acidente de viação, atento o sentido de marcha da A., cruzava pela sua direita com a Travessa .... (F)

7. Também no dia, hora e local acima mencionados, o veículo EJ, conduzido pelo CC, circulava na Travessa ... no sentido de marcha Travessa .../V.N.Famalicão, aproximando-se de um sinal vertical de STOP existente na berma direita da referida Travessa ... por onde circulava e atento o seu sentido de marcha, sinal esse que lhe era então perfeitamente visível e cuja existência era do seu conhecimento pessoal. (G)

8. O veículo JO embateu com toda a sua parte frontal na parte lateral esquerda da frente (entre o farol e a porta esquerda da frente) do veículo EJ. (H)

9. O embate entre ambos os veículos ocorreu totalmente dentro e a meio da metade direita da faixa de rodagem da Estrada Municipal por onde circulava o veículo conduzido pela A. e atento o seu sentido de marcha, ficando nessa mesma metade da faixa de rodagem direita peças plásticas, vidros partidos de ambos os veículos intervenientes. (I)

10. Ambos os veículos, após o embate, ficaram imobilizados dentro da metade direita da faixa de rodagem da Estrada Municipal por onde circulava o veículo JO e atento o sentido de marcha V. N. Famalicão/.... (J)

11. A Travessa ..., no local onde ocorreu o embate e atento o sentido de marcha do veículo segurado na Ré, constitui uma localidade densamente povoada, com grande tráfego de animais, veículos automóveis e ladeada e marginada de ambos os lados por edificações, com saídas directas para a mesma, possuindo uma placa indicativa de que se trata de uma localidade. (K)

12. A Estrada Municipal onde ocorreu o embate, à altura do acidente, tinha uma faixa de rodagem que em toda a sua largura media 5,90 metros. (L)

13. A Estrada Municipal, à data e no local onde ocorreu o embate, atento o sentido e marcha da A. apresentava uma configuração em forma de recta, com uma extensão superior a 200 metros, com boa visibilidade (vide imagem a fls. 317) e com a via devidamente sinalizada e perfeitamente nivelada. (M)

14. Na altura e no local onde ocorreu o embate, o pavimento alcatroado/betuminoso da referida Estrada encontrava-se em bom estado de conservação e seco e o tempo estava limpo. (N)

15. Como consequência directa e necessária do embate resultaram sérios danos no veículo JO, nomeadamente em toda a sua parte frontal, com inutilização e necessidade de substituição das seguintes peças e prestação de serviços: Pára-choques frente; Farol nevoeiro esquerdo; Farolim pisca esquerdo; Farolim pisca direito; Farol esquerdo; Farol direito; Grelha; Guarda lamas esquerdo; Frente chapa; Capot; Travessa inf. suporte radiador; Pára-brisas; Kit colagem; Bomba direcção assistida; Termo ventilador; Caixa fusíveis; Radiador água; Apoio motor trás; Apoio motor esquerdo; apoio motor direito; Transmissão esquerda; Braço suspensão esquerda; Amortecedor esquerdo; Chapa matrícula; Líquido radiador; Óleo direcção; Óleo travões; Lâmpadas; Serviço Chapeiro; Serviço Pintura; Serviço Mecânica; Serviço Electricista, Serviço Estofador e Alinhamento de direcção. (O)

16. Estas peças e mão-de-obra, necessárias para reparação do JO, foram orçadas em € 4 227,70 (quatro mil duzentos e vinte e sete euros e setenta cêntimos), IVA incluído. (P)

17. Desde a data da ocorrência do acidente de viação, a Ré recusou-se e recusa-se ainda ao pagamento desta quantia a título de reparação do veículo JO, não dando ordem de reparação do mesmo. (Q)

18. Bem como se recusou e se recusa, desde a data da ocorrência do acidente de viação, a fornecer ou a pagar à A. o valor diário de um veículo ligeiro de passageiros substituição sucedâneo ao seu, apesar de a A. ter reclamado um veículo de substituição para as deslocações inerentes à sua actividade profissional. (R)

19. A Ré [3] subscreveu e remeteu à A. as cartas juntas a fls. 49, 51 e 52, cujo teor aqui se reproduz. (S)

20. A A. nasceu em 06.8.1969. (T)

21. A A. seguia totalmente dentro da sua metade direita da faixa de rodagem (hemifaixa), bem junto à berma direita. (3º)

22. O veículo segurado na Ré circulava originalmente na Travessa ..., com as luzes de cruzamento (médios) desligadas. (respostas aos art.ºs 5º e 6º)

23. Quando o veículo JO se aproximava do referido entroncamento existente à sua direita e proveniente da Travessa ..., o veículo EJ era conduzido de forma distraída por CC. (resposta ao art.º 7º)[4]

24. Proveniente da Travessa ..., com o intuito de entrar na referida Estrada Municipal e dessa forma passar a circular no sentido de marcha ... / V. N. Famalicão. (resposta ao art.º 8º)

25. Sem que o seu condutor prestasse atenção à sua condução e ao trânsito existente na Estrada Municipal, designadamente do seu lado esquerdo no sentido de marcha V. N. Famalicão/..., por onde já circulava o veículo JO. (resposta ao art.º 9º)

26. Atravessando-se na Estrada Municipal, com a sua frente a pender para o lado de Famalicão, ou seja, em diagonal, em relação ao veículo J0. (resposta ao art.º 11º)

27. Dessa forma cortou e obstruiu também por completo toda a passagem e todo o sentido de marcha (linha de trânsito) ao veículo J0, impedindo-o de a continuar. (12º)

28. A A. diminuiu a sua velocidade, travando e desviou-se o mais possível para a sua esquerda atento o seu sentido de marcha. (13º)

29. O condutor do veículo EJ dispunha de visibilidade da Travessa ..., de onde saía, relativamente à Estrada Municipal e em relação ao sentido de marcha do veículo JO. (resposta ao art.º 14º)

30. O condutor do veículo EJ pretendia, no entroncamento da Travessa ... com a R. ..., mudar de direcção para passar a circular pela Rua ... no sentido de V.N. de Famalicão. (15º)

31. O condutor CC parou o seu veículo antes de entrar no entroncamento, em obediência ao sinal vertical de trânsito de STOP, existente na confluência da Travessa ... com a Rua .... (16º)

32. Essa condutora (a que se encontrava entroncamento em frente)[5] parou o seu veículo, deixando que o condutor do EJ entrasse na Rua .... (resposta ao art.º 19º)

33. A faixa de rodagem da Travessa ... tem menos de 5,9 metros de largura. (resposta ao art.º 20º)

34. É ladeada por muros na zona próxima da que entronca na Rua .... (resposta ao art.º 21º)

35. Quando o condutor do veículo EJ chegou ao local do entroncamento com a Rua ... não se aproximava qualquer veículo a circular por esta rua no sentido de Famalicão - ... que lhe fosse (então) visível. (resposta ao art.º 22º)

36. O condutor do veículo EJ reiniciou a marcha, entrando, com uma velocidade de cerca de 10 km/h, na Rua .... (resposta ao art.º 23º)

37. Quando já tinha o veículo EJ com a frente a passar a Rua ... para passar a circular pela metade direita da faixa de rodagem desta, atento o sentido ... - Famalicão, foi o veículo EJ embatido na parte lateral esquerda pela frente do veículo JO. (resposta ao art.º 24º)

38. A A. imprimia ao seu veículo velocidade de, pelo menos, cerca de 60 km/h. (resposta ao art.º 26º)

39. Quando a A. se aproximava do local do entroncamento, foi-lhe visível o veículo EJ a entrar na Rua ..., a cerca de 30 metros. (resposta ao art.º 27º)

40. A A. prosseguiu a sua marcha e apenas accionou os travões do seu veículo, quando já estava a cerca de 15 metros de distância do veículo EJ. (29º)

41. Tendo deixado rastos de travagem bem vincados no pavimento numa extensão de cerca de 12,70 metros, a anteceder o local do embate. (30º)

42. A colisão ocorreu próximo do eixo da via da Rua .... (31º)

43. Como consequência directa e necessária do descrito embate/colisão, a A. sofreu ferimentos e lesões traumáticas. (resposta ao art.º 34º)

44. Tendo dado entrada no Serviço de Urgência do Hospital Nossa Senhora da Oliveira em Guimarães no dia 23.10.2007, onde foi observado e teve alta hospitalar no mesmo dia. (35º)

45. A A. apresentou diagnóstico de politraumatizada, com múltiplas lesões traumáticas do foro ortopédico, designadamente: Traumatismo torácico com embatimento da grade costal; Contusão da parede torácica; Dificuldade de mobilização cervical: Dor na coluna torácica e esternal; Traumatismo da região cervical, pescoço e omoplata, e Dorsalgia. (36º)

46. A A. teve alta clínica, no mesmo dia, cerca das 14.53 horas, com indicação de vigilância e orientação para médico assistente, devendo regressar ao serviço de urgência em caso de agravamento de sintomatologia, sendo medicada com “aine”. (37º)

47. Após a alta hospitalar em 23.10.2007, a A. realizou fisioterapia durante cerca de 30 (trinta) dias no Serviço de Fisiatria do Hospital Nossa Senhora da Oliveira em Guimarães. (42º)

48. Em 28.7.2008 a A. foi examinada pelo Dr. DD, Médico Ortopedista e Perito Médico-legal, o qual lhe diagnosticou, em consequência do acidente de viação em causa queixas de cervicalgias, agravadas com os esforços e dificuldade na mobilização do pescoço. Segundo declaração desse médico, como sequelas a A. apresentava, então, rigidez da coluna cervical e cervicalgias residuais. (43º e 44º)[6]

49. A A., em consequência do acidente dos autos, esteve com Incapacidade Temporária Absoluta (ITA), desde a data do acidente até 30.10.2007. (45º)

50. Data em que ficou clinicamente curada, com alta médica definitiva, embora com sequelas permanentes e irreversíveis. (46º)

51. Apesar dos vários tratamentos e de várias sessões de fisioterapia a que se submeteu, a A. ficou a padecer definitivamente e em função das lesões poli-traumáticas sofridas com o embate/colisão dos autos, das seguintes sequelas actuais, permanentes e irreversíveis: Cervicalgias, agravadas com os esforços; Dificuldade na mobilização do pescoço, sobretudo a rotação do lado esquerdo que está mais presa; alguma Rigidez da coluna cervical e pescoço; Dores ocasionais a nível da coluna cervical e do pescoço em certos movimentos que se agravam, com os esforços e/ou quando pega e/ou quando carrega e/ou transporta objectos pesados e/ou esforços físicos; Limitação de movimentos e mobilidade a nível da coluna cervical e do pescoço, e Dificuldade em praticar desportos ou actividades que necessitam de funcionalidades que envolvam as sequelas corporais acima referidas. (resposta ao art.º 47º)

52. A A., em consequência das lesões sofridas, terá necessidade de suportar várias despesas hospitalares, a vários tratamentos, necessidade de ajuda medicamentosa, de ajudas técnicas, acompanhamento médico e de efectuar vários exames médicos, consultas, sessões de fisioterapia e massagens e de efectuar várias deslocações a hospitais e clínicas. (resposta ao art.º 49º)

53. A A. irá sofrer de limitação de mobilidade a nível da coluna cervical e do pescoço. (resposta ao art.º 51º)

54. Em virtude das lesões sofridas e da irreversibilidade das sequelas causadas pelo acidente dos autos, a A. padece, actualmente, de uma Incapacidade Permanente Geral de 5 %, que implica esforços suplementares na sua profissão habitual e actual de Enfermeira Especialista e outras categorias profissionais semelhantes. (resposta aos art.º 52º, 53º, 57º e 60º)

55. Em consequência das lesões sofridas e da irreversibilidade das sequelas actuais e permanentes causadas pelo acidente dos autos, a A. sente actualmente - e sentirá no futuro - dificuldades acrescidas e necessidade de realizar esforços suplementares no seu dia-a-dia laboral de Enfermeira Especialista e outras categorias profissionais semelhantes. (55º e resposta ao art.º 60º)

56. Bem como dores e dificuldades, que até à data do embate não sentia. (56º)

57. A referida actividade profissional da A. exige mobilidade, força, resistência ao esforço e velocidade dos membros superiores, pescoço e coluna cervical, e é predominantemente efectuada de pé e manualmente. (58º e 59º)

58. Antes e à data do acidente de viação, a A. era uma pessoa trabalhadora e com alegria de viver. (resposta aos art.ºs 64º e 66º)

59. À data do acidente de viação, a A. exercia habitualmente a categoria profissional de Enfermeira Especialista. (67º)

60. A A., pelo exercício da sua categoria profissional de Enfermeira Especialista, auferia à data do acidente de viação um salário mensal ilíquido na ordem dos € 1 567,47, discriminado da seguinte forma: - € 1 362,69 a título de remuneração base; € 80,60 a título de subsídio de alimentação da Administração Pública - € 21,52 a título de subsídio familiar crianças/jovens e € 102,66 a título de encargos com saúde. (resposta 68º)[7]

61. O veículo ligeiro de passageiros propriedade da A. matrícula  JO, era o único, normal e diário meio de transporte. (70º)

62. O veículo JO era e é imprescindível para a A. se deslocar diariamente da sua residência sita na Rua …, em Vila Nova de Famalicão, para o seu local de trabalho, sito a cerca de 27 km de distância, no Hospital Nossa Senhora da Oliveira em Guimarães, e no fim do trabalho para regressar a casa. (71º)

63. Para a A. diariamente levar e trazer o seu filho menor ao infantário junto do Hospital de Vila Nova de Famalicão. (74º)

64. Para a A. tratar de assuntos pessoais, designadamente para ir às compras, para ir à missa, para ir ao médico, para visitar os seus pais, para visitar os seus amigos. (75º)

65. E para as deslocações de lazer da A. e do  seu filho aos fins-de-semana. (76º)

66. A A., durante o período de tempo de paralisação e privação do uso e fruição do seu veículo, compreendido entre o dia do acidente e 20.4.2008, para efectuar as deslocações e viagens supra referidas (em II. 62 a 65) teve que recorrer ao aluguer de outros veículos automóveis de substituição sucedâneos ao seu. (77º)

67. Com os quais despendeu e liquidou a quantia total de € 6 388,80 (seis mil trezentos e oitenta e oito euros e oitenta cêntimos). (78º)

68. A A. e a sua família, durante o período de tempo de paralisação e privação do uso e fruição do seu veículo, compreendido desde o dia 21.4.2008 e até à efectiva e integral reparação do mesmo veículo, para efectuar as deslocações e viagens supra referidas tiveram, têm e terão que recorrer no futuro a empréstimos de outros veículos de passageiros de substituição sucedâneos ao seu de colegas seus e familiares, aos transportes públicos ou a serviços de táxis. (resposta ao art.º 79º)

69. Situação essa com a qual a A. sofreu, sofre e sofrerá incómodos. (resposta ao art.º 80º)

70. O veículo JO encontra-se ainda à presente data e desde o dia do acidente a título de parqueamento nas instalações da oficina reparadora "FF, LDA.", sita no largo do ..., n.° …, freguesia de ..., ..., Vila Nova de Famalicão. (81º)

71. A A. terá que pagar à referida oficina, a título de parqueamento pelo seu veículo, uma quantia diária indeterminada, desde o dia do acidente e até à efectiva e integral reparação do mesmo veículo. (resposta ao art.º 82º)

72. O veículo JO é da marca ..., ..., do ano de 1998, a diesel, com cinco portas e 1 527 cc cilindrada. (83º)

73. À data do acidente o JO tinha cerca de 250 000 km percorridos e estava em bom estado de conservação. (resposta aos art.ºs 84º e 89º; 85º)

74. O veículo JO, à data do acidente de viação, tinha um valor comercial aproximado de € 2 500. (resposta aos art.ºs 86º e 90º)

75. Após o referido acidente e depois de reparado, terá um valor comercial inferior a € 2500. (resposta ao art.º 87º)

76. À data do acidente, o mesmo veículo ligeiro de passageiros novo, marca ..., de modelo correspondente, custaria aproximadamente € 20 000. (resposta ao art.º 88º)

77. Devido ao embate, o veículo da A. sofreu danos na sua estrutura e órgãos de direcção e suspensão, ficando, nesse estado, afectadas as suas condições de segurança. (resposta ao art.º 91º)

78. O custo da reparação foi estimado em € 6 150. (resposta ao art.º 92º)[8]

79. O valor do salvado ou o que dele restava, após o acidente, foi avaliado entre os 50 e os 150 euros. (resposta ao art.º 93º)

80. No documento junto a fls. 72/74, recepcionado pela Ré em 30.01.2008, a única indemnização pecuniária que a A. reclamava, para além do valor do seu veículo, no montante de € 2 500, dizia respeito ao veículo de aluguer até 08.02.2008. (resposta ao art.º 96º)

81. A A., em consequência das referidas lesões traumáticas sofridas com o acidente, sofreu múltiplas e frequentes dores durante todo o tempo que mediou entre o acidente, os seus tratamentos a que se submeteu, as várias sessões de fisioterapia, o período de convalescença, o período de incapacidade temporária absoluta e a sua recuperação ainda que parcial. (resposta aos art.ºs 97º e 99º)

82. As lesões e sequelas descritas afectarão a A. durante toda a sua vida. (resposta ao art.º 103º)

83. Lesões e sequelas essas que a prejudicam e interferem com a mobilidade no acto sexual em certas posições, na medida do que ficou acima apurado. (resposta ao art.º 107º)

84. Em 2009 a remuneração base da A. passou para € 1 431,66. (resposta ao art.º 112º)[9]

     Reapreciando o julgamento da matéria de facto discutida em julgamento, a Relação manteve as respostas aos art.ºs 86.º e 91.º da BI, considerou não provada a matéria do art.º 26.º da BI e restringiu as respostas dadas aos restantes artigos 27.º, 29.º e 49.º da BI, pela forma seguinte:

     27.º - Provado apenas que quando a Autora se aproximava do local do entroncamento, apercebeu-se do veículo EJ a entrar na Rua ....

     29.º - Provado apenas o que já consta da resposta ao art.º 13º da BI.

     49.º - Provado apenas que, em consequência das lesões sofridas, a Autora necessitará de terapêutica ocasional, nomeadamente, tratamentos de medicina física e de reabilitação duas vezes por ano.


==============================

          São estas as questões postas nos recursos:

1. Saber se a responsabilidade pela ocorrência do acidente de viação descrito nos autos deve ser imputada exclusivamente ao condutor do veículo -EJ;      

2. Averiguar se há contradição entre os fundamentos e a decisão final do acórdão.

3. Indagar se estão bem avaliadas as indemnizações atribuídas à autora/lesada relativamente à perda de ganho futuro, danos morais, perda e a privação do uso da viatura, parqueamento, aluguer de veículo e pagamento à oficina onde está arrecadado o veículo interveniente no acidente.

4. Se há abuso de direito e enriquecimento ilegítimo à custa da seguradora/recorrente.


==============================

    

     I. Tendo na devida conta que a Relação reduziu, em benefício da ré/seguradora, o montante das diversificadas indemnizações fixadas na sentença da 1.ª instância, a autora AA argumenta que deve ser rejeitado o recurso da ré “BB-Companhia de Seguros, S. A.” com o fundamento em que se verifica o requisito limitativo do direito ao recurso emergente da “dupla conforme”.

     Invocando em seu favor o Ac. STJ de 10.05.2012 (Relator Lopes do Rego)[10], porque a apelante obteve procedência parcial na Relação, com uma decisão mais favorável do que a decisão recorrida, estamos perante duas decisões “conformes”, no sentido de impedirem que essa parte possa interpor recurso de revista para o STJ porquanto, se a improcedência total da apelação obsta, por imposição da dupla conforme, à interposição da revista, então também a improcedência parcial dessa apelação não pode deixar de produzir, por idêntica razão, o mesmo efeito impeditivo, conclui a recorrente/autora que estamos perante o caso da “dupla conforme”..

        Vejamos se assiste razão à recorrente/autora.

     II. Com o intuito de racionalizar a possibilidade de recurso ao Supremo Tribunal de Justiça (até aí a parte podia recorrer - recurso de revista - até ao STJ mesmo no caso de existirem duas decisões convergentes: a decisão do tribunal de 1.ª instância e a decisão da Relação), ex vi do estatuído no n.º 3 do art.º 721.º do C.P.Civil (na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24-08 e ao caso aplicável - tempus regit actum), “não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e ainda que por diferente fundamento, a decisão proferida[11].

    

     Neste contexto também poderemos afirmar, seguindo os passos delineados no acórdão do STJ, desta Secção, atrás citado, que “ocorrendo, num litígio caracterizado pela existência de um único objecto processual, uma relação de inclusão quantitativa entre o montante arbitrado na 2.ª instância e o que foi decretado na sentença proferida em 1.ª instância, de tal modo que o valor pecuniário arbitrado pela Relação já estava, de um ponto de vista de um incontornável critério de coerência lógico-jurídica, compreendido no que vem a ser decretado pelo acórdão de que se pretende obter revista, tem-se por verificado o requisito da dupla conformidade das decisões, no que respeita ao montante pecuniário arbitrado pela Relação, não sendo consequentemente admissível o acesso ao STJ no quadro de uma revista normal”.

     Os princípios projetados neste aresto, que acabamos de expor e ao qual damos o nosso pleno assentimento, têm cabal correspondência com a situação recursória que ora estamos a ajuizar.

     Na verdade, confrontando o entendimento professado pela Relação com a sentença decretada na 1.ª instância, a divergência que destas decisões sobressai e contra a qual se manifesta a ré/recorrente, circunscreve-se apenas aos montantes parcelares das indemnizações fixados por aquele tribunal superior e relativamente às quais a ré obteve parcial êxito; e, nessa medida, se compararmos os parcelares montantes indemnizatórios fixados pela Relação - no total de € 61.838,80 (€ 25.000 + 12.500 + 2.500 +6.388,80 + 15.450) com aqueles em que a 1.ª instância assentou - total de € 87.471,04 (€ 70.000 + 15.000 + 2.500 +6.388,80 + 15.450 x 80%) - segue-se que a indemnização concedida pela Relação já estava integrada na sentença do Tribunal da 1.ª instância.

     Se tivermos na devida conta que a seguradora/recorrente pretende, no recurso ora interposto para o STJ, que aquelas parcelares indemnizações se reduzam ainda mais, de ambas as condenações havemos de deduzir, lógica e racionalmente, que a especificada indemnização atribuída pela Relação à autora/lesada se inclui, inexoravelmente, no âmbito da indemnização concedida à autora pela sentença prolatada em 1.ª instância, desta coincidência se operando a dupla conforme que aquele n.º 3 do art.º 721.º do C.P.Civil consagra.

   

     Esta “dupla conforme” só não se verificaria se na revista se pretendesse que fosse amplificado o montante da indemnização fixado pelas instâncias - porém, nas hipóteses de substancial ampliação do montante da condenação, o acórdão da Relação contém um segmento ou parcela inovatória, que se não pode ter por compreendido ou incluído no valor reconhecido na sentença proferida em 1.ª instância (excerto retirado do sumário do falado Ac. STJ de 10.05.2012).

     A soma indemnizatória fixada pela Relação (€ 61.838,80) está também abrangida pelo numerário, a este propósito indicado, na sentença da 1.ª instância (€ 87.471,04); elas tão só divergem na parte em que excede aqueles € 61.838,80, circunstância jurídico-factual que a recorrente “BB-Companhia de Seguros, S. A.” não infirma na revista.

     Não sendo este, naturalmente, o objetivo da recorrente/seguradora, pelas razões acima deduzidas não vamos conhecer do recurso de revista interposto por a isso obstar a lei processual atrás enunciada.

     A isso não obsta a circunstância de o dissentimento das instâncias se estender ao juízo sobre a culpa na produção do acidente[12], pois que à dupla conforme não estorva o diferente motivo que aprova a decisão.

     III. A lei distingue entre recurso independente e recurso subordinado, para dizer que o recurso subordinado é interposto no prazo de 10 dias, a contar da notificação do despacho que admite o recurso da parte contrária e que se o recorrente principal desistir do recurso ou este ficar sem efeito, caduca o recurso subordinado (n.º 2 e 3 do art.º 682.º do C.P.Civil[13]).

Esta denunciada caracterização do recurso, designado de subordinado, tem apenas a justificar a sua subsistência duas circunstâncias, quais sejam, a de que não desista do recurso o recorrente principal ou que, efectivamente, se não mostrem razões capazes de justificar que dele se não conheça.

     Acabamos de demonstrar que o recurso principal (da ré/seguradora) não pode ser conhecido; e, sendo assim, deixou também de se poder conhecer o recurso subordinado da autora

          Nestes termos,

     Julgamos findos os recursos (principal interposto pela ré e subordinado deduzido pela autora) pelo não conhecimento do seu objecto.

                  Custas pela recorrente “BB -Companhia de Seguros, S. A.”.

       Supremo Tribunal de Justiça, 13 de Fevereiro de 2014.

Lisboa, 13 de Fevereiro de 2014

Silva Gonçalves (Relator)

Pires da Rosa

Maria dos Prazeres Beleza

_________________________
[1] Soma das seguintes parcelas: € 25 000 + € 12 500 + € 2 500 + € 6 388,80 e € 15 450.
[2] Simplificou-se a redacção dalguns pontos da matéria de facto assente e dada como provada.
[3] Rectifica-se lapso manifesto.
[4] A 2ª parte da alínea integra uma conclusão, pois não se mencionam os FACTOS que indiciam ou corporizam a “distracção”…, embora tais factos estejam porventura indicados, nomeadamente, em II. 25. a 27., infra…
[5] Reproduz-se o texto da sentença sob censura e que acrescentou o parêntesis à resposta de fls. 325.
  Constava dos art.ºs 17º e 18º da base instrutória (Não Provados) o seguinte:
   - Até porque, na altura, circulava um veículo automóvel pela Rua ..., no sentido ... – Famalicão? (17º)
   - A condutora deste veículo pretendia, nesse mesmo entroncamento, mudar de direcção para o seu lado esquerdo, para passar a circular pela Travessa ...? (18º)
[6] Cf. o documento de fls. 40.
[7] De acordo com a informação da entidade patronal de fls. 189, de 10.12.2009, este último componente retributivo foi pago apenas nos meses de Fevereiro [€ 20], Junho [€ 308,45], Agosto [€ 344,08] e Setembro [€ 102,66] de 2007; Janeiro [€ 20,45], Fevereiro [€ 40,90] e Maio [€ 205,11] de 2008 e Fevereiro [€ 40,90] de 2009.
   Compulsados os documentos de fls. 259 e seguintes, verifica-se que nos anos de 2007, 2008 e 2009 a A. declarou o rendimento bruto anual de € 19 448,28; € 19 353,23 e € 19 939,61, respectivamente.
[8] Valor encontrado no relatório pericial de fls. 219 (bem como os valores a seguir indicados).
[9] Subjaz a esta resposta o teor do documento de fls. 189.
[10] Disponível em www.dgsi.pt.

[11] Artigo 721º (decisões que comportam revista).

3 - Não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e ainda que por diferente fundamento, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte.

[12] Neste ponto a ré decaiu já que, tendo considerado a sentença da 1.ª instância que a justa repartição da culpa se satisfará com 20% para a autora e 80% para o condutor do EJ, a Relação veio agravar a posição da demandada, ao considerar que o acidente se deveu, única e exclusivamente, à conduta do condutor do veículo segurado da ré.

[13] Na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24-08, ao caso aplicável.