Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2340/17.0T8AVR.P1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: ANA PAULA LOBO
Descritores: RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
RESPONSABILIDADE BANCÁRIA
INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
DEVER DE INFORMAÇÃO
NEXO DE CAUSALIDADE
ÓNUS DA PROVA
ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA
DANO
ERRO SOBRE O OBJECTO DO NEGÓCIO
AÇÃO DE ANULAÇÃO
LEGITIMIDADE SUBSTANTIVA
VALORES MOBILIÁRIOS
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
PRESSUPOSTOS
Data do Acordão: 07/06/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
Apesar de violado pela entidade bancária o dever de informação se a impossibilidade de reaver o capital investido, pelo menos na sua totalidade, decorre de um conjunto de factos decorrentes da oscilação dos mercados financeiros e de operações de concentração de empresas difíceis de prever, que não está demonstrado estarem, sob domínio e conhecimento do réu por forma a poder avaliá-los e informar e encaminhar o seu cliente para a actuação que lhe traria mais lucros, ou, pelos menos, menos perdas, não se mostra estabelecido o nexo de causalidade entre a omissão desse dever e os danos sofridos pelo A..
Decisão Texto Integral:
*

I – Relatório

I.1 – Questões a decidir


AA apresentou recurso de revista do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto em 14 de Dezembro de 2022 que julgou a apelação procedente, com a consequente improcedência da acção, absolvendo-se o R. Barclays Bank dos pedidos formulados, tendo, para o efeito apresentado alegações que culminam com as seguintes conclusões:

I. Entre o A. e o R. foi celebrado um contrato de intermediação financeira.

II. Para o R., enquanto intermediário financeiro, decorrem deveres de informação, antes, durante e depois da subscrição de determinado produto.

III. Ao longo do relacionamento que teve com o Barclays o A. teve vários gestores de conta, e falava quer com estes, quer com outros funcionários do Barclays, quando queria esclarecimentos ou aconselhamento sobre a aplicação do seu dinheiro de forma segura e sem risco, e confiava neles.

IV. O gestor da conta e os funcionários do Barclays ao tempo da subscrição das obrigações tinham conhecimento de que eram fatores essenciais para a subscrição das obrigações a segurança e a inexistência de risco de perda do dinheiro investido.

V. As decisões de investimento que o A. tomou foram sempre com base na informação e conselhos que os gestores da conta e os restantes funcionários do Barclays lhe deram, nunca tendo aplicado o seu dinheiro sem se aconselhar com eles.

VI. O A. não tinha experiência nem conhecimentos sobre o mercado de capitais nem capacidade para avaliar o risco associado aos investimentos, e não lhe foi feito o teste de adequação.

VII. O A. tem um perfil conservador, avesso ao risco.

VIII. Supunha, na altura, que uma obrigação, ao contrário de uma ação, garantia o retorno integral do investimento no termo do prazo.

IX. O Sr. BB, disse ao A. que não havia qualquer risco de não receber o capital que investia no termo do prazo.

X. Perante a insistência do A. em saber se receberia ou não o capital investido a 100%, o referido funcionário do Barclays garantiu-lhe que receberia em 2016 os € 47.000,00 e os juros contratados.

XI. O R. Barclays não facultou, antes da subscrição, ao A. cópia do documento informativo do produto nem indicação sobre o local onde poderia ser consultado.

XII. O R. Barclays divulgou pelos seus gestores de conta instruções internas para estes facultarem informação seletiva aos clientes, relacionada com a taxa superior do produto, quando comparada com a dos depósitos a prazo, que não existiria um problema de reinvestimento a curto prazo e que o rating era muito elevado por se tratar da empresa líder a nível nacional.

XIII. A violação dos deveres de informação por parte do R., conduziu ao erro na base do negócio, pelo que, o negócio é anulável.

XIV. Encontram-se preenchidos todos os requisitos da responsabilidade civil, nomeadamente o nexo causal.

XV. Em 2013, as atividades da PT, da Oi e outras empresas uniram-se, o que levou à alteração do risco.

XVI. O A. nunca foi informado dessa alteração.

XVII. Se o tivesse sido poderia ter transacionado as obrigações à cotação do momento.

XVIII. O R. Barclays, enquanto intermediário financeiro das Notes, sabia que tinha ocorrido substituição de emitente da Portugal Telecom, SGPS, S.A., para a Portugal Telecom International Finance, S.A., e que tinha sido antecipada a maturidade do produto de 27/07/2016 para 30/06/2015, estando o direito de antecipação do reembolso dependente da manifestação dos investidores manifestada até às 12 horas de 30/06/2015.

XIX. O A. nunca foi informado pelo R. da alteração do emitente nem da antecipação da maturidade do produto de 27/07/2016 para 30/06/2015 nem, ainda, da degradação económico financeira da Oi, S.A., e suas subsidiárias financeiras, inclusive da PTIF por forma a que o A. pudesse exercer esse direito.

XX. O A. manteve-se sempre convencido de que era credor da Portugal Telecom, SGPS, S.A., até inícios de 2016.

XXI. O A. não era conhecedor dos diversos tipos de aplicações financeiras, como as notes, os seguros e as obrigações.

XXII. O R. não informou o A. da alteração do emitente para a PTIF e da antecipação da maturidade do produto de 27.07.2016 para 30.06.2015, com a possibilidade de reembolso de todo o capital e ainda dos juros, caso manifestasse essa vontade até às 12h do dia 30 de junho de 2015.

XXIII. Também após a subscrição, foram violados pelo R. os deveres de informação que deveria ter observado.

XXIV. Nomeadamente o disposto no nº 4 do art. 312º B CVM, onde se prevê que: “O intermediário financeiro notifica o cliente, independentemente da natureza deste, com antecedência suficiente, de qualquer alteração significativa na informação prestada ao abrigo dos artigos 312º C a 312º G, através do mesmo suporte com que foi prestada inicialmente”.

XXV. Violando os deveres de informação, o Recorrente agiu com culpa grave.

XXVI. Constitui ilicitude, à luz do art. 304.º e 312.º do CVM, a omissão pelo intermediário financeiro, de informações essenciais relativas à antecipação da maturidade das obrigações subscritas pelo cliente e emitidas por outra empresa, com a possibilidade de ser reembolsado integralmente do capital e com acréscimo de juros.

XXVII. Se tivesse sido informado dessa antecipação de maturidade e da possibilidade de optar pelo reembolso do capital investido, o Autor não teria hesitado em optar por tal possibilidade.

XXVIII. Existe conduta negligente do Banco, com omissão de prestação de informações essenciais, como seja a antecipação da maturidade e o prazo para o cliente ora Autor optar pelo reembolso com juros (30/06//2015).

XXIX. A culpa do Banco, intermediário financeiro presume-se, não tendo de resto sido ilidida, e deve-se considerar como grave não só por respeitar a elementos cruciais do negócio, como pelas consequências, a saber, o não recebimento do capital investido pelo cliente.

XXX. Não fora a imissão de informação do Banco ao seu cliente, este teria optado pelo reembolso antecipado da totalidade do capital, com juros. Não o tendo podido fazer, por falta de informação na data inicialmente prevista para o reembolso (26/07/2016), nada recebeu.

XXXI. Os deveres de informação falharam antes, durante, e depois da subscrição das obrigações em causa, pelo que, o negócio sempre seria anulável.


Nestes termos, e nos melhores de Direito que serão supridos por V. Exas., deverá o presente Recurso ser julgado procedente por provado, devendo manter-se a decisão nos termos prolatados pela primeira instância, e revogando o acórdão recorrido, fazendo V. Exas. justiça!


O recorrido contra-alegou não tendo apresentando conclusões pugnando pela confirmação do acórdão recorrido.


*

I.2 – Questão prévia - admissibilidade do recurso


Como resulta das alegações de recurso foi este interposto ao abrigo do disposto no art.º 671.º, n.º 1 do Código de Processo Civil como revista normal que é admissível tendo em conta o valor da acção, da sucumbência, ter sido proferida decisão de mérito e não se verificar dupla conforme.

A expressão “cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito” desacompanhada que se encontra dos demais requisitos para que fosse tido por apresentado recurso de revista excepcional é mera figura de retórica, sem repercussão no recurso de revista.

Sem que esteja isento de falta de rigor jurídico, o recurso de revista apresentado expressa de forma inequívoca que pretende a revogação do acórdão recorrido e a repristinação da decisão proferida pelo tribunal de 1.ª instância, delimitando de forma suficiente, na medida que compreensível, o objecto do recurso.

Quer ao longo das suas alegações, que valem como peça global dotada de conclusões, quer nas conclusões XIV a XXXIII manifesta o recorrente a sua discordância quanto ao acórdão recorrido em matéria de responsabilidade civil ainda que acrescente que “Os deveres de informação falharam antes, durante, e depois da subscrição das obrigações em causa, pelo que, o negócio sempre seria anulável”.

O recorrente intentou a presente acção, com processo comum, contra Barclays Bank, PLC, formulando os pedidos:

A) que o negócio celebrado entre o A. e o R. Barclays Bank seja anulado por erro na base do negócio e condenado o R. à devolução de € 47.000,00, acrescido de juros vencidos no montante de € 9.255,78 e juros vincendos até integral pagamento.

Se assim se não entender, deve o R. ser condenado a:

B) pagar ao R. uma indemnização no valor de € 47.000,00, acrescido de juros vencidos no montante de € 9.255,78 e juros vincendos até integral pagamento, recorrendo ao princípio geral que preside à obrigação de indemnizar que é o da reconstituição do lesado na situação em que o mesmo se encontraria se não se tivesse verificado o acto lesivo por incumprimento dos deveres a que estava obrigado, conforme os artigos 304.º, 304.º-A, 311.º, 312.º, 312.º-B, 312-C a 312-G, e 314 e seguintes, todos do CVM.

Ou, caso assim não se entenda:

C) ser o negócio celebrado entre o A. e o R. resolvido por alteração superveniente das circunstâncias e condenado o R. à devolução de € 47.000,00, acrescido de juros vencidos no montante de € 9.255,78 e juros vincendos até integral pagamento.

A decisão de 1.ª instância julgou procedente o pedido de anulação do negócio por erro sobe a base do negócio desconsiderando os demais pedidos formulados e, em consequência, condenou o R. Barclays Bank, PLC, Sucursal em Portugal, a proceder à devolução ao A. AA da quantia de € 47.000,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, a partir da citação e até integral pagamento.

O réu, aqui recorrido interpôs recurso de apelação onde pede a alteração da matéria de facto e considera que a sentença incorre em erro de direito ao declarar a nulidade do negócio seja com base em erro sobre o objeto do negócio ou, sequer, sobre as circunstâncias que constituem a base do negócio, ou, bem assim, que este eventual erro tenha sido determinado por dolo, devendo, por conseguinte, ser a decisão a fls. do Tribunal a quo revogada por outra que julgue totalmente improcedente o pedido principal de anulação, e consequente restituição, com a absolvição do Recorrente do mesmo.

Acrescenta:

 Caso o Venerando Tribunal de Recurso revogue a Sentença a fls. por considerar que, de facto, não existem fundamentos para a procedência do pedido principal de anulação do negócio de subscrição com base em erro, deixam-se também expostas infra as razões pelas quais não pode proceder o pedido de indemnização formulado pelo Recorrido”.

O ali recorrido contra-alegou defendendo a manutenção do julgado em 1.ª instância, mas não deduziu pedido de ampliação do objecto do recurso com o qual poderia ter feito apreciar os demais fundamentos da acção que apresentou, e, não haviam sido considerados pelo Tribunal de 1.ª instância para a decisão, para o caso de a apelação vir a ser julgada procedente e revogada a decisão recorrida.

O Tribunal recorrido enunciou as seguintes questões de que tomou expresso conhecimento:

1. Erro de julgamento na decisão proferida em matéria de facto;

2. Ausência de fundamento de anulação do negócio (erro-vício, erro sobre os motivos e dolo) e ilegitimidade substantiva do R;

3. Inadmissibilidade de revogação ou anulação, pelo R., da ordem e execução;

4. Caducidade da ação de anulação;

5. Os efeitos da anulação do negócio sobre os peticionados juros de mora;

6. O dever de informação a que o R. recorrente estava obrigado perante o A.;

7. Prescrição do direito a indemnização por violação dos deveres de informação; 8. Responsabilidade civil do R.;

9. Caducidade do direito a indemnização por omissão de conduta devida; 10. Concurso de culpa do A.;

11. A influência de factos alheios ao R. na produção dos danos e os limites da indemnização;

12. Oportuna liquidação do valor da indemnização; 13. Os juros remuneratórios vencidos e devidos;

14. O pedido de resolução do negócio de subscrição por alteração das circunstâncias.

Nas alegações de revista o recorrente considera que o negócio é anulável e que se encontram preenchidos os pressupostos de responsabilidade civil, pelo que ambas as questões integram o objecto do recurso.

Nos termos do disposto no art.º 671.º, n.º1 do Código de Processo Civil o recurso de revista é admissível.


*

I.3 – O objecto do recurso

Tendo em consideração o teor das conclusões das alegações de recurso e o conteúdo da decisão recorrida, cumpre apreciar as seguintes questões:

1. Anulação do contrato

2. Responsabilidade civil contratual

                                                *

I.4 - Os factos

As instâncias consideraram provados os seguintes factos:

1. Barclays Bank, PLC, tem o NIPC 980000874 e por objecto a actividade bancária – fls. 390 e segs. (A).

2. AA e a mulher CC abriram no Barclays, agência de ..., a conta colectiva solidária com o nº conta B Dynamic nº ...96 – doc. 3, a fls. 415/432 (B).

3. AA aceitou, a 04/07/2012, subscrever, na agência do Barclays de ..., 47 obrigações PT Taxa Fixa 2012/2016 no valor de € 47.000,00 – fls. 42 e 43 (C).

4. A 02/09/2015, o R. Barclays Bank, PLC, acordou com Bankinter, S.A., a venda a este e este a sua compra dos activos e passivos relacionados com a sua banca de retalho e a Wealth Management e ainda a parte do negócio de corporate banking que serve pequenas e médias empresas em Portugal ficando excluído do perímetro os activos e passivos relacionados com os cartões de crédito Barclays Card, Investment Bank e clientes Corporate multinacionais em Portugal (D).

5. Devido à necessidade de satisfazer certas condições e requisitos legais, a efectiva transmissão da unidade do negócio referida só veio a ocorrer a 01/04/2016 (E).

6. O R. Barclays enviou ao A., a 08/09/2015, a carta de fls. 434/440, tendo por “assunto transferência do nosso negócio de banca de Retalho e de Wealth Management em Portugal para o Bankinter, S.A. (“Bankinter”)”, na qual o informa que acordou vender ao Bankinter o seu negócio português de banca a retalho e de Wealth Management (F).

7. O Bankinter enviou ao A. AA a carta de fls. 443/452 a confirmar a compra, a 01/04/2016, do negócio de retalho e de Wealth Management do Barclays em Portugal e a informá-lo da possibilidade de denúncia caso não concorde com as condições do Anexo 2 junto à mesma (G).

8. O R. Barclays enviou ao A. a carta de fls. 494/495, na qual lhe comunica o lançamento a débito de € 47.000,00 de subscrição da OBR.D.PT 2016 6,25%, com a comissão de € 235,00 e imposto de selo/comissão de 9,40 (H).

9. A solicitação do A. AA, titular da conta de DO nº  ...38, o Bankinter emitiu a “DECLARAÇÃO” de fls. 44, na qual o informa que é titular de 47 OI BRB2 6,25% 072616, no valor nominal de € 47.000,00 adquiridas a 24/07/2012 (I).

10. O valor mobiliário “PT Taxa Fixa 2012/2016” corresponde a obrigações ou Notes que têm no mercado a denominação de “400.000.000,00 6,25% Notes due 2016”, de 1.000,00 cada título, com o ISIN PTPTCYOM0008 (J).

11. Estas obrigações ou. Notes tinham como emitente, na data da subscrição, a Portugal Telecom, SGPS, S.A. (PT, SGPS), sociedade aberta, NIPC 503215058, com sede na Avenida Fontes Pereira de Melo, nº 40, Lisboa (K).

12. Foi o R. Barclays Bank PLC, Sucursal em Portugal, agência de ..., que intermediou perante o A. AA a subscrição das obrigações “PT Taxa Fixa 2012/2016” (L).

13. O A. AA era cliente do Barclays desde 2010, sendo classificado por este como investidor não qualificado ou não profissional (M).

14. O A. sempre considerou os funcionários da agência de ... do Barclays como profissionais dotados de adequadas competências, qualificações e probidade (N).

15. A relação do A. com o gestor da sua conta que lhe indicou as obrigações foi estritamente do foro profissional (O).

16. Este (gestor) informou o A. da taxa do juro do produto e da data da sua maturidade (P).

17. A DECO PROTESTE publicou, a 02/07/2012, na revista PROTESTE INVESTE, o parecer de fls. 54/55 sobre o risco de subscrição das obrigações PT 2012/2016 (Q).

18. Por documento datado de 01/10/2013, a PT, a Oi, S.A., a AG Telecom Participações, S.A. (AG), a LF TEL, S.A. (LF Tel), a PASA Participações, S.A. (PASA), a EDSP75, Participações, S.A. (EDSP75), a BRATEL Brasil, S.A., a AVISTAR, SGPS, S.A. (BES) e a NIVALIS Holding BV (ONGOING) celebraram um memorando de entendimento (MoU) por intermédio do qual se comprometiam a formalizar uma ‘Aliança Industrial’ “mediante a consumação da Operação” que visava unir as actividades e negócios desenvolvidos pela Oi e pela Portugal Telecom, nomeadamente, no Brasil, em Portugal e África (R).

19. Os títulos representativos do capital da entidade que passaria a administrar as actividades e as operações mencionadas seriam colocadas na TELEMAR PARTICIPAÇÕES, S.A. (TELPART) ou em sociedade a constituir denominada CORPCO (S).

20. As partes outorgantes acordaram executar as etapas societárias, nomeadamente, um aumento de capital a ser subscrito pela Oi em dinheiro que teria garantia de liquidação de um consórcio de bancos, enquanto que a PT subscreveria em espécie a parte que lhe competia no referido aumento por intermédio da entrega da totalidade dos bens que seriam identificados no Laudo dos Activos PT (T).

21. As partes convencionaram que a PT poderia não avançar com a combinação se, a final, a sua participação fosse igual ou inferior a 36,6% do capital na CorpCo, bem com a TELPART poderia não avançar se a participação da PT na referida CorpCo fosse superior a 39,6% do capital (U).

22. Também ficou convencionado que a PT seria extinta, por incorporação na CorpCo sendo que, aquando dessa incorporação, a PT não poderia ter activos nem passivos (V).

23. A PT avaliou os seus activos em um mínimo de 1.9 mil milhões de euros e um máximo de 2.1 mil milhões de euros (W).

24. A 20/02/2014 a PT informou o mercado que tinha assinado os acordos definitivos relativos à combinação dos seus negócios, tendo os seus activos sido avaliados, para efeitos da operação referida, em 1.750 milhões de euros (X).

25. Também para execução do previsto, foi efectuada uma Convocatória de 03/03/2014 para uma Assembleia de Noteholders “Obrigações PT taxa fixa 2012/2016”, que informava que a PT Portugal, SGPS, S.A. (que não se confundia com a PT ou Portugal Telecom, SGPS, S.A.), na sequência do negócio estabelecido, iria receber as acções representativas do capital social da Portugal Telecom International Finance (PTIF) (que eram detidas pela PT). Por sua vez, as acções representativas do capital social da PT Portugal, SGPS, S.A., seriam objecto de entrada em espécie a realizar no âmbito do aumento de capital previsto, de tal forma que estas duas últimas sociedades passariam a ser subsidiárias do Grupo Oi (Y).

26. No âmbito da execução do referido plano, a PT anunciou ao mercado que a 18 de Março, em reunião da assembleia de titulares das Notes aqui indicadas, obteve o consentimento para substituir o emitente das mesmas, deixando de ser a PT ou a Portugal Telecom, SGPS, S.A., para passar a ser a PT Portugal, SGPS, S.A. - fls. 148 (Z).

27. Além disso, foi aprovada uma alteração à cls. 18ª dos TERMOS E CONDIÇÕES DAS NOTES, que passou a ter a seguinte redacção: “O Trustee [Citicorp Trustee Company Limited] pode acordar, a todo o tempo, sem o consentimento dos obrigacionistas, dos Titulares dos Recibos ou dos Titulares dos Cupões, (a) a substituição, em lugar do Emitente relevante (ou do anterior substituto nos termos desta Cláusula), pelo (i) Garante, ou (ii) qualquer Subsidiária do Garante (sendo essa entidade substituída doravante designada por “Nova Sociedade”), como principal devedora nos termos da Trust Deed, das Notes, dos Recibos e dos Cupões; e/ou (b) a substituição, em lugar do Garante da Nova Sociedade (sendo neste caso uma Subsidiária do Garante), como garante nos termos da Trust Deed, das Notes, dos Recibos e dos Cupões (…) (AA).

28. Durante os primeiros meses de 2014 a PT deu a conhecer ao mercado que tinha aprovado o plano previsto, aprovado o aumento de capital na Oi, S.A, e liquidaria em espécie, a 5 de Maio, as acções que tinham sido emitidas para serem por si subscritas – fls. 151 (BB).

29. A MOODY’S veio informar a 18/06/2014 os mercados que o rating para as obrigações Portugal Telecom, SGPS, S.A., e PTIF, tinha subido de Ba2 para Baa3 porque era expectável que tinha assegurado a cobertura dos seus prazos de dívida de cerca de 1.3 mil milhões de euros nos próximos 18 meses (CC).

30. A 16/07/2014, foi enviada comunicação ao mercado informando sobre as aplicações financeiras de 847 milhões de euros efectuadas pela PT em dívida da Rioforte (empresa do grupo português Espírito Santo), sem conhecimento da Oi e contabilizados no aumento do capital da brasileira em Maio desse ano – fls. 158 (DD).

31. A Rioforte não reembolsou a PT deste investimento na altura da maturidade, num total de 897 milhões de euros (EE).

32. Como os títulos tinham sido transferidos para a PT Portugal (por serem activos da Portugal Telecom) que, por sua vez, tinham sido entregues para realização das entradas para a subscrição das acções da Oi e, ficando a Oi sem esses activos, então acordaram as intervenientes, ainda no âmbito deste memorando, uma permuta e uma opção de compra: a Oi entregaria os títulos de dívida Rioforte à PT Portugal e, por sua vez, a PT Portugal devolveria 474.348.720 acções ordinárias e 948.697.440 acções preferenciais da Oi que tinha subscrito com o aumento de capital em espécie às subsidiárias da Oi que tinham a posse desses títulos – fls. 161 (FF).

33. A PT Portugal viu assim diminuída a sua participação, de cerca de 38% para 25,6%, no capital social da Oi (GG).

34. A 28/08/2014, a MOODY’S veio informar os mercados que tinha diminuído o rating da OI, S.A., para Ba1, e diminuído a dívida não garantida da PTIF para Ba2 e de outras obrigações juniores (HH).

35. A Rioforte é uma sociedade que pertencia ao Grupo Espírito Santo (II).

36. Por comunicado de 03/08/2014, o Banco de Portugal veio informar que o seu Conselho de Administração tinha deliberado nesse dia aplicar ao Banco Espírito Santo uma medida de resolução, tendo transferido a generalidade da actividade e do património deste para o Novo Banco, S.A., devido, entre outras razões, ao aumento da exposição a outras entidades do Grupo Espírito Santo – fls. 169 (JJ).

37. A 18/01/2015, a PT Portugal veio informar os mercados que as Notes “400,000,000.00 6,25 per cent Notes due 2016” iriam permanecer no universo das empresas Oi, apesar de estar em marcha o processo de venda daquela sociedade à Altice Portugal, S.A. – fls. 173 (KK).

38. A CMVM, por carta datada de 20/01/2915, e dirigida ao Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Portugal Telecom, SGPS, S.A., veio alertar para os graves riscos para os credores da PT Portugal que seria a alteração do devedor, para a Oi, S.A., ou para qualquer uma das sociedades do Grupo Oi, sem mais1 – fls. 175/178 (LL).

39.  Na sequência do acordo para a venda da PT Portugal à Altice, após a realização de uma assembleia de noteholders, que ocorreu a 19/05/2015, a PT Portugal veio informar o mercado, a 02/06/2015, que o emitente das referidas obrigações PT Portugal tinha sido substituído pela PTIF – fls. 179 (MM).

40. A Oi veio informar, a 02/06/2015, a conclusão da venda da PT Portugal, SGPS, S.A., à Altice Portugal, S.A. – fls. 180 (NN).

41. A emitente, PTIF, anunciou ao mercado, a 03/06/2015, que “qualquer titular de uma Note é elegível para exercer o direito de solicitar o reembolso das suas Notes no trigésimo dia útil após a data da conclusão da venda, que corresponde a 14 de Julho de 2015” desde que o titular dê, até às 12 horas do dia 30/06/2015, instruções nesse sentido à entidade com a guarda dos títulos. Ainda se informava que o preço de reembolso era de 103,975% do montante do capital da Note (portanto, acima do par) (OO).

42. A negociação das obrigações em causa foi suspensa pela CMVM no dia 21/06/2016 em comunicado público (PP).

43. Aquando da subscrição das obrigações “PT Taxa Fixa 2012 – 2016”, o A. exercia actividade de rectificador de 1ª.

44. O A. tem apenas o 11º ano de escolaridade.

45.  Ao longo do relacionamento que teve com o Barclays o A. teve vários gestores de conta, e falava quer com estes, quer com outros funcionários do Barclays, quando queria esclarecimentos ou aconselhamento sobre a aplicação do seu dinheiro de forma segura e sem risco, e confiava neles.

46. O gestor da conta e os funcionários do Barclays ao tempo da subscrição das obrigações tinham conhecimento de que eram factores essenciais para a subscrição das obrigações a segurança e a inexistência de risco de perda do dinheiro investido.

47. As decisões de investimento que o A. tomou foram sempre com base na informação e conselhos que os gestores da conta e os restantes funcionários do Barclays lhe deram, nunca tendo aplicado o seu dinheiro sem se aconselhar com eles.

48. O A. não tinha experiência nem conhecimentos sobre o mercado de capitais nem capacidade para avaliar o risco associado aos investimentos.

49. O A. tem um perfil conservador, avesso ao risco.

50. Supunha, na altura, que uma obrigação, ao contrário de uma acção, garantia o retorno integral do investimento no termo do prazo.

51. O R. não realizou o teste de adequação ao A. para identificar quais eram os instrumentos financeiros ou operações adequadas ao seu perfil de risco e qual o âmbito desse teste.

52. O Sr. BB, funcionário da agência do Barclays em ..., telefonou ao A. insistindo para se deslocar a esta agência do Barclays porque tinham no Banco um novo produto mais rentável e com capital garantido.

53. Disse ao A. que não havia qualquer risco de não receber o capital que investia no termo do prazo.

54. Perante a insistência do A. em saber se receberia ou não o capital investido a 100%, o referido funcionário do Barclays garantiu-lhe que receberia em 2016 os € 47.000,00 e os juros contratados.

55. O R. Barclays não facultou, antes da subscrição, ao A. cópia do documento informativo do produto nem indicação sobre o local onde poderia ser consultado.

56. O R. Barclays divulgou pelos seus gestores de conta instruções internas para estes facultarem informação selectiva aos clientes, relacionada com a taxa superior do produto, quando comparada com a dos depósitos a prazo, que não existiria um problema de reinvestimento a curto prazo e que o rating era muito elevado por se tratar da empresa líder a nível nacional.

57. As informações dadas ao A. na agência de ... do Barclays, pelos funcionários desta, de que, no fim do prazo (2016) lhe seria devolvido o capital investido acrescido dos juros foram determinantes para o A. investir os € 47.000,00 nas obrigações PT.

58. Sem essa informação da garantia do reembolso, o A. não teria feito a subscrição das obrigações em causa.

59. Em 2012, o A. tinha da Portugal Telecom, SGPS, S.A., uma excelente imagem financeira e económica.

60. Em 2013, a PT, a Oi e outras empresas iniciaram um processo de união das suas actividades que levou à alteração do risco.

61. O A. nunca foi informado dessa alteração.

62. Se o tivesse sido poderia ter transaccionado as obrigações à cotação do momento.

63. O R. Barclays, enquanto intermediário financeiro das Notes, sabia que tinha ocorrido substituição de emitente da Portugal Telecom, SGPS, S.A., para a Portugal Telecom International Finance, S.A., e que tinha sido antecipada a maturidade do produto de 27/07/2016 para 30/06/2015, estando o direito de antecipação do reembolso dependente da manifestação dos investidores manifestada até às 12 horas de 30/06/2015.

64. O A. nunca foi informado pelo R. da alteração do emitente nem da antecipação da maturidade do produto de 27/07/2016 para 30/06/2015 nem, ainda, da degradação económico-financeira da Oi, S.A., e suas subsidiárias financeiras, inclusive da PTIF por forma a que o A. pudesse exercer esse direito.

65. O A. manteve-se sempre convencido de que era credor da Portugal Telecom, SGPS, S.A., até inícios de 2016.

66. O A. recebeu os documentos de fls. 454 e 457/458.

67. A actividade de intermediação financeira do Barclays foi a de execução de ordens por conta de outrem.

68.  Não foram contratados serviços de consultoria ou de gestão de carteira entre A. e R. Barclays.

69. O A. fez outros investimentos financeiros em 2010, 2011 e 2012, designadamente a 31/07/2012 € 10.000,00 em Notes denominado Retorno Europa 2016, que era um produto financeiro complexo e de elevado risco, e € 12.000,00 em Notes Retorno Tech Agosto 2018, num total de € 62.500,00, que era o valor das economias do A. que foram transferidas por este para o Barclays em 2009.

70. O A. sabia que havia no mercado diversos tipos de aplicações financeiras, como os Seguros e as Obrigações, mas desconhecia o risco a cada uma delas associado.

71. Estes produtos constituíam a maioria dos seus investimentos, por serem o que lhes eram aconselhados pelo seu gerente de conta ou outros funcionários do Barclays.

72. O R. Barclays informou mensalmente o A. da cotação referência das referidas obrigações no mercado secundário – fls. 3050/3344.

73.  A partir do extracto bancário de Março de 2015, as Notes 6,25% que o A. detinha deixaram de se designar “PT 2016 6,35%” para passarem a ser designadas “Oibrbz 6,25%” – fls. 3184.

74. Em 30 Junho de 2015, o valor da cotação das Notes subscritas pelo A. era de € € 61.267,61 – fls. 3188.

75. O A. pode, eventualmente, recuperar parte do investimento no PER da Oi, S.A., ou no da PTIFI.


*

II - Fundamentação

1.    Anulabilidade do contrato

O pedido principal formulado na presente acção foi de anulação o negócio celebrado entre o A. e o R. Barclays Bank por erro na base do negócio e condenado o R. à devolução de € 47.000,00, acrescido de juros vencidos no montante de € 9.255,78 e juros vincendos até integral pagamento. Em fundamento dessa pretensão alegou que, por informação prestada pelos funcionários do Réu da agência do Barclays de ..., 47 subscreveu obrigações PT Taxa Fixa 2012/2016 no valor de € 47.000,00, apenas por o terem convencido de que teriam reembolso de capital garantido na data de vencimento, não correspondendo tal informação à verdade.

Tal como bem analisado no acórdão recorrido, o A. pretende que seja declarada a anulação do contrato de subscrição de obrigações PT Taxa Fixa 2012/2016 no valor de € 47.000,00, numa acção movida exclusivamente contra o réu que teve nesse negócio apenas a função de intermediário financeiro prestador do serviço de execução de ordens por conta do recorrente.

A anulação de tal contrato de subscrição seja com que fundamento for, só pode ser obtida judicialmente entre o A. e a entidade emitente das obrigações, ou quem a represente na actualidade.

Por outro lado, a declaração de anulação de um negócio jurídico, em princípio tem os efeitos previstos no art.º 289.º do código civil – devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado – e não apenas aquilo que o recorrente prestou, envolvendo também a restituição do que lhe foi prestado.

Apesar da persistente menção por parte do recorrente da anulação do dito contrato, face à prova produzida nestes autos e aos respectivos intervenientes processuais apenas podemos reafirmar o que foi já dito no acórdão recorrido:

Independentemente da caraterização que seja atribuída às ordens de execução, a verdade é que, pelo menos na ordem de execução por conta de outrem, o intermediário se limita a receber a ordem do investidor e a transmiti-la ao emitente, daí resultando a produção dos efeitos do negócio diretamente na esfera jurídica do emitente e do investidor: este recebe daqueles os respetivos títulos ou direitos (ações, obrigações, etc.), e a entidade emitente dos mesmos recebe deste o valor pelo qual são transacionados no mercado financeiro sob a proposta que efetuou. Pese embora a mediação do intermediário financeiro, esta é realizada em nome e por conta do adquirente, ou seja, em sua representação, como ocorre na relação de mandato.

A existir, o erro em que o investidor seja induzido pelo intermediário financeiro situa-se na relação contratual entre eles estabelecida, seja no contrato-quadro ou mesmo no âmbito da execução de ordem, pode influenciar a decisão de emitir ou não essa ordem de compra das ações ou das obrigações por conta do investidor, mas é, em princípio, um vício estranho à entidade emitente e ao contrato de aquisição dos produtos financeiros.

No caso, a entidade emitente das obrigações, a Portugal Telecom, SGPS, S.A., não é parte na ação e também é alheia à relação concreta que o R. estabeleceu com o A. no âmbito do contrato de mediação financeira. E se àquela foi destinada a contrapartida das obrigações PT que vendeu ao A., por direito próprio, pela quantia de € 47.000,00, mal se compreenderia que sobre o Banco R. (e não sobre a emitente) pudesse recair agora a obrigação da sua restituição por força da anulação daquele contrato e do efeito da aplicação do art.º 289º, nº 1, do Código Civil.

Não pode proceder contra o R. um pedido de anulação de um negócio em que não é parte, com condenação na restituição de uma quantia que, por essa razão, também nunca entrou na sua esfera jurídica.

O R. não tem legitimidade substantiva para efeito daquele pedido.”

Se o que o A. pretende é a anulação do contrato de intermediação financeira, único que estabeleceu com o réu não alegou nem provou factos que permitam a sua declaração de nulidade.

Improcede, pois, o recurso quanto à anulação do contrato.

 


*

2.   Responsabilidade civil contratual

 

Enquanto o A. considera que o R., através dos seus funcionários, omitiu o cumprimento do seu dever de informação sobre as características do produto financeiro que recomendou que o A. comprasse para investir os seus rendimentos e, assim, conseguiu que ele adquirisse um produto financeiro que não adquiriria se soubesse que corria o risco de não reembolso do capital investido no fim da maturidade do produto, omitindo igualmente a informação sobre a possibilidade de o A. ter obtido esse reembolso um ano antes da data inicial de maturidade do produto financeiro, entende o R. que cumpriu os seus deveres de informação e que por não ter contratado com o A. a prestação de serviços de consultadoria ou gestão de carteira de títulos não estava obrigado a prestar-lhe informações específicas sobre as alterações de solvabilidade da entidade emitentes das obrigações posteriormente até àquela data de maturidade.

A matéria de facto provada demonstra que o R. não cumpriu nem o dever de informação pré-contratual legalmente exigível em face do A. nem, posteriormente, o aconselhou à venda antecipada das obrigações, sendo certo que, mensalmente, o informou seja da cotação referência das referidas obrigações no mercado secundário seja das alterações de denominação de que foi alvo em virtude dos negócios das alterações societárias ocorridas quanto à entidade emitente inicial das obrigações.

A este propósito fez-se no acórdão recorrido uma exposição e análise detalhada da legislação aplicável à situação sub judice para a qual remetemos expressamente.

A jurisprudência tem vindo a cristalizar-se no sentido de que este dever de informação tem de verificar-se na fase pré-contratual, por ser informativo da vontade de investir, mas permanece durante a execução do contrato de subscrição do produto financeiro com a profundidade e extensão compatíveis com o grau de conhecimentos e experiência do cliente bancário enquanto investidor, de que o banco se deve previamente informar. Cremos que esta é a melhor interpretação da lei, em termos abstractos sem, contudo, poder olvidar-se que são disponibilizados pelos bancos serviços específicos de consultadoria e gestão de carteira de títulos, remunerados, livremente contratáveis por qualquer cliente, mesmo os de elevado grau de iliteracia financeira que não podem ter-se por incluídos naquele dever de informação, a dar aos clientes que querem fazer investimentos cujos contornos não conhecem com fundamento na sua iliteracia financeira, mas sem celebrarem aqueles contratos.

Os deveres de informação acessórios à execução do negócio relativos a factos ou circunstâncias de que tome conhecimento, não sujeitos a segredo profissional, que possam justificar a modificação ou a revogação das ordens ou instruções dadas pelo cliente, constavam do art.º 323.º, c) do Código dos Valores Mobiliários aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de Novembro, na data da subscrição das obrigações, e não foram cumpridos pelo réu.

Tal como no acórdão recorrido só podemos concluir pela violação do dever de informação pré-contratual, e pelo dever de informação acessório à execução do negócio.

Invoca o recorrente que sofreu danos derivados do não cumprimento do referido dever de informação a cargo do R. de que pretende ser ressarcido.

Na análise dos pressupostos da responsabilidade civil constantes do art.º 798.º do código civil concluiu o acórdão recorrido pela verificação de conduta ilícita e culposa por parte do R. causadora de danos na esfera jurídica do A. na medida em que apenas se admite a possibilidade de vir a recuperar parte do investimento no PER da Oi, S.A. ou no processo de recuperação da PTIFI, de forma absolutamente coincidente com a matéria de facto provada que, nessa medida acompanhamos.

Seguindo a posição adoptada Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 8/2022, publicado em 3 de Novembro de 2022

“1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos artigos 7.º, nº 1, 312º nº 1, alínea a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, e 342.º, nº 1, do Código Civil, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano.

2. Se o Banco, intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em “produtos de risco” – informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o “reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco”), sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no artigo 7.º, n.º1, do CVM.

3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.

4. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir. “importa, pois, definir se, no caso concreto, está provado o nexo de causalidade.

Invocando e provando embora o A. que se tivesse sido informado que o produto financeiro que adquiriu não tinha garantido o reembolso do capital investido no fim do período de maturidade, não teria investido, o certo é que o dano que prova de actualmente estar numa situação em que é provável que apenas tenha a possibilidade de recuperar parte do capital investido, não tem como causa adequada a omissão dos deveres de informação já analisados.

Não está provado nos autos que a boa decisão a tomar, isto é, a que melhor acautelava os interesses financeiros do A., era em Junho de 2015, com os conhecimentos dessa altura sobre a situação económica e financeira detidos pelo R., era solicitar o reembolso das Notes até 30/06/2015, pelo preço de reembolso de 103,975% do montante do capital da Note prescindindo do rendimento que era devido durante o ano seguinte até atingir a maturidade.

Olhada a situação com os dados ora disponíveis da subsequente ruína financeira da emitente das obrigações é. Mas não está provado que um intermediário financeiro competente, naquele momento, inequivocamente, tivesse feito a recomendação de venda das Notes.

Por outro lado, a este propósito está em causa a omissão de informação por parte do R. que todos os cidadãos portugueses recebiam pelos meios de comunicação social, o A. também, emanados da emitente dos títulos e da Comissão de Valores mobiliários, sobre a sucessão de negócios realizados com e em volta da PT, tido por uma das empresas mais sólidas do país. Juntou-se nesta conjuntura o desmoronar do Grupo Espírito Santo com efeitos devastadores para os seus credores, a que se juntou a queda financeira da empresa Oi, S.A. brasileira.

No caso concreto, a impossibilidade de reaver o capital investido, pelo menos na sua totalidade, decorre de um conjunto de factos decorrentes da oscilação dos mercados financeiros e de operações de concentração de empresas difíceis de prever, mesmo por peritos financeiros que não está demonstrado estarem, nessa altura, sob domínio e conhecimento do réu por forma a poder avaliá-los e informar e encaminhar o seu cliente para a actuação que lhe traria mais lucros, ou, pelos menos, menos perdas.

Para a situação em que se encontra o A. concorreu ele, também, decisivamente ao não ler as informações que recebia e indicavam a mudança da empresa emitente das acções, ao não atentar nas informações que diariamente enchiam os meios de comunicação social sobre os negócios da PT, ao não ter inquirido o banco sobre se era ou não aconselhável requerer o reembolso antecipado das “Notes”, tudo como se a tranquilidade de receber um rendimento muito elevado comparado com aquele que receberia num depósito a prazo do mesmo valor, o tornasse absolutamente insensível a qualquer notícia por mais próxima que estivesse desses produtos financeiros que subscrevera.

Um cidadão de diligência média, um operário que precisa de uma vida inteira de apertada poupança para com o seu salário constituir uma poupança de 47 000,00€, teria seguramente procurado uma ou outra vez confirmação junto do banco sobre se todas as alterações societárias em que andava envolvida a PT poderiam ter qualquer influência no seu produto. Talvez se o fizesse tivesse obtido uma informação errada que poderia ser, quem sabe, a causa adequada para a produção do dano cuja indemnização aqui peticiona, ou uma informação condizente com a que actualmente conhecemos.

O acórdão recorrido que concluiu que “(…) a ação do Banco Barclays junto do A. na negociação das obrigações não favoreceu especialmente o dano produzido, nem era então provável segundo o curso normal das coisas; antes resultou da evolução anormal e imprevisível da vida económica da emitente e da inobservância, pelo A., de elementares deveres de diligência na obtenção de informação sobre a evolução daquela sua aplicação financeira.” e, que na falta do nexo causal entre o facto praticado pelo R. e o dano sofrido pelo A., não pode aquele ser responsabilizado pela sua reparação, por não estarem reunidos todos os pressupostos da responsabilidade civil fez uma adequada interpretação da matéria de facto e aplicação do direito, a determinar a sua confirmação.


* * *

III – Deliberação

Pelo exposto, nega-se a revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

Custas pelo recorrente.


*

Lisboa, 6 de Julho de 2023

Ana Paula Lobo (relatora)

Afonso Henrique Cabral Ferreira

Isabel Manso Salgado