Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
13494/15.0T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: JORGE ARCANJO
Descritores: RESOLUÇÃO BANCÁRIA
EXCEÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO
CONTRATO A FAVOR DE TERCEIRO
COLIGAÇÃO DE CONTRATOS
CARÁTER SINALAGMÁTICO
BOA -FÉ
CUMPRIMENTO
RISCO
SUCESSÃO NA POSIÇÃO CONTRATUAL
Data do Acordão: 02/27/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :
I - A excepção do não cumprimento do contrato (art. 428.º do CC) tem o seu âmbito de aplicação nas obrigações sinalagmáticas, impondo que se tome em conta o princípio da boa-fé e o apelo à ideia de abuso de direito (arts. 762.º, n.º 2, e 334.º do CC), sendo admitida no quadro da coligação contratual, entendida segundo uma “concepção unitária”.

II - O art 145.º-O, n.º 6, do RGICSF (aprovado pelo DL n.º 298/92, de 31-12, na redacção dada pelo DL n.º 31-A/2012) estabelece uma regra de salvaguarda das relações de sinalagmaticidade complexa, como a da coligação contratual.

III - A Medida de Resolução do Banco de Portugal não excluiu do perímetro de transferência para o Novo Banco os deveres de protecção que cabiam ao BES inseridos numa relação obrigacional complexa.

IV - O Novo Banco, como banco de transição, deve ser considerado como sucessor nos direitos e obrigações da instituição de crédito originária (Banco Espírito Santo) no caso de os mesmos não terem sido excluídos do perímetro de transferência por Deliberação do Banco de Portugal, traduzindo-se numa cessão da posição contratual, pelo que, nos termos do art. 431.º do CC, a exceptio é oponível aos que no contrato vierem a substituir qualquer dos contraentes nos seus direitos e obrigações.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

I - RELATÓRIO



1.1-A Autora – NOVO BANCO, SA - instaurou acções declarativas, com forma de processo comum, contra as Rés:

1ª) VALRI, SGPS, SA, pedindo:

a) A condenação da ré a pagar 17.500 000€ de capital, acrescida de 971 726,84€ de juros vencidos até 06/03/2015 e 38.869,07€ de imposto de selo (explicitado pelo autor a fls 1334 verso, na sequência do esclarecimento solicitado para o efeito na audiência prévia), bem como nos vincendos desde então até integral pagamento;

b) A condenação da ré a entregar em penhor títulos correspondentes a 25% do capital social da A..., SA.

2ª) SOTIF, SGPS, SA, pedindo:

a) A condenação da ré a pagar 17.500 000€ de capital, acrescida de 971 726,84€ de juros vencidos até 06/03/2015 e 38.869,07€ de imposto de selo (explicitado pelo autor a fls 1334 verso, na sequência do esclarecimento solicitado para o efeito na audiência prévia), bem como nos vincendos desde então até integral pagamento;

b) A condenação da ré a entregar em penhor títulos correspondentes a 25% do capital social da A..., SA.

3ª) MS – Participações Sociais, SGPS, SA, pedindo:

a) A condenação da ré a pagar 17.500 000€ de capital, acrescida de 971.726,84€ de juros vencidos até 06/03/2015 e 38. 869,07€ de imposto de selo (explicitado pelo autor a fls 1334 verso, na sequência do esclarecimento solicitado para o efeito na audiência prévia), bem como nos vincendos desde então até integral pagamento;

b) A condenação da ré a entregar em penhor títulos correspondentes a 25% do capital social da A..., SA.

4ª) LERIMO, SGPS, SGPS, SA, pedindo:

a) A condenação da ré a pagar 17.500 000€ de capital, acrescida de 971.726,84€ de juros vencidos até 06/03/2015 e 38.869,07€ de imposto de selo (explicitado pelo autor a fls 1334 verso, na sequência do esclarecimento solicitado para o efeito na audiência prévia), bem como nos vincendos desde então até integral pagamento;

b) A condenação da ré a entregar em penhor títulos correspondentes a 25% do capital social da A..., SA.

1.2. - Em cada uma destas acções, que foram apensadas, em petições iniciais iguais, a Autora alegou, em resumo:

Em 04/12/2008 o Banco Espírito Santo, SA, celebrou quatro contratos de financiamento, um com cada uma das rés, entretanto modificados em 04/12/2011, 18/01/2012 e 24/04/2012, pelos quais concedeu a cada uma das rés, crédito de 12.500.000€, posteriormente aumentados em mais 5.000.000€ pelos aditamentos de 24/04/2012, num total de 17.500 000€.

O capital, em cada um dos contratos, deveria ser restituído de uma só vez a 04/12/2014 e foi estipulado que o capital utilizado venceria juros à taxa correspondente à Euribor a 3 meses, acrescida de 4%, a pagar postecipadamente a cada três meses a partir da celebração dos contratos de financiamento e, em caso de mora, acrescia uma sobretaxa correspondente à taxa de juro para as transacções comerciais.

Por efeito da medida de resolução bancária do BES de 03/08/2012, o Novo Banco, recebeu os créditos emergentes desses quatro contratos.

As rés não procederam ao reembolso do capital de cada um dos contratos de financiamento no dia 04/12/2014, e já haviam deixado de pagar parte dos juros em 04/09/2014.

Cada uma das quatro rés apresenta um saldo devedor de 17.500 000€ de capital, 971.726,84€ de juros de mora e 38.869,07€ de imposto de selo.

Para garantia das responsabilidades resultantes de cada um dos contratos de financiamento, cada uma das rés constituiu penhor sobre acções representativas de 25% do capital social da A..., SGPS, SA.

Em 12/12/11 foi registado aumento de capital da A..., SA no valor de 27.750 000€, parte em dinheiro e parte em reservas, passando essa sociedade a ter um capital social de 30 000 000€. E em 19/12/12, foi registado novo aumento de capital, em 6.000 000€, passando a A..., SA a ter um capital social de 36.000.000€. Deste modo, a percentagem empenhada de capital passou de 25% por cada uma das rés para 1,56%.

O autor interpelou cada uma das rés em 28/07/2014 para procederem à entrega, em penhor, de títulos necessários a manterem um penhor de 25% acções, mas não o fizeram.

1.3. - Citada cada uma das Rés, apresentaram as respectivas contestações, de teor igual em cada uma das acções, defendendo-se, em síntese:

Os quatro contratos de financiamento com cada uma das holdings do grupo A..., SA, a Lerimo, a Sotif, a MS e a Valri, fazem parte de uma operação mais complexa, que incluiu quatro contratos de swap iguais e contemporâneos celebrados com a E... (E...) por indicação do BES e ordens de compra de acções daE... G ( E...G ), todos propostos pelos BES. Essas operações foram condição económica da concessão de um financiamento pelo BES ao Banco Invest do grupo A..., SA num momento em que este tinha especiais e urgentes necessidades de liquidez.

As quatro rés, holdings do grupo A..., SA - Lerimo, Sotif, MS e Valri – detêm, cada uma, 25% do capital social da A..., SGPS, SA que, por sua vez detém 100% do capital social do Banco Invest, SA.

O Banco Invest na sequência da crise do subprime careceu de liquidez para fazer face às suas obrigações designadamente o reembolso de um empréstimo obrigacionista de 50.000.000€ a vencer-se em 21/12/2008 e precisava de aceder a liquidez no montante de 100.000.000€. Procurou financiamento junto da CGD, mas a proposta desta era demasiado onerosa e não resolvia o problema. Optou então por solicitar financiamento de 50.000 000€ através do regime de concessão de financiamento com Garantia Pessoal do Estado Português e solicitou ao BES a concessão de financiamento dos restantes 50.000 000€.

O BES, através do então ... da Comissão Executiva, AA, disponibilizou-se para conceder o financiamento dos 50.000 000€, mas estava interessado que o Grupo A..., SA se envolvesse com o Grupo Espírito Santo (GES). Esses dois negócios, financiamento ao Banco Invest e Operação com o GES, foram apresentados pelo BES como interdependentes e a realizar nos mesmos montantes cada um de 50.000 000€, sendo a Operação de envolvimento com o GES condição do financiamento ao Banco Invest.

Foi explicado por BB, do BES, que a Operação de envolvimento consistiria na aquisição, pelas holdings do Grupo A..., SA, as ora rés, de 50.000 000€ em acções da E... G e que essa Operação de envolvimento com o GES seria integralmente financiada pelo BES, que assegurava a total neutralidade dessa operação para o Grupo A..., SA que não teriam de mobilizar recursos para a aquisição das acções da E...G e não suportaria os custos associados ao financiamento mas, em contrapartida, as holdings do Grupo A..., SA, ora rés, também não teriam qualquer benefício da operação, nomeadamente resultante da valorização dessas acções da E...G e distribuição de dividendos.

Mais explicou BB que a referida neutralidade financeira seria assegurada pela celebração de um contrato de equity swap por via do qual seria promovida a cobertura do risco de desvalorização das acções da E...G e também os custos de financiamento a contratar com o BES e que esse equity swap seria contratado com entidade relacionada com o BES, a E...; esse contrato de swap permitiria que as rés, independentemente da performance das acções da E...G, tivessem acesso aos fundos que lhes permitiriam fazer face aos custos da contratação e da execução da Operação e dos juros a suportar com financiamento para essa operação de aquisição das acções da E...G, bem como aos fundos necessários à cobertura de uma eventual desvalorização das acções da E...G.

Consequentemente, o BES estruturou todas as operações e minutou os contratos de financiamento, os contratos de swap e os contratos de ordens de aquisição de acções da E...G.

Assim, foram celebrados: contrato de financiamento ao Banco Invest de 50.000.000€ (30.000 000€ directamente e 20.000 000€ através da A..., dona do banco), quatro contratos de financiamento a cada uma das holdings do Grupo A..., SA, ora rés, para aquisição de 50.000.000€ em acções da E...G, ordens de compra das acções e contratos de swap; o BES solicitou ainda a prestação de garantias mediante penhor financeiro das acções da A....

Em consequência, cada uma das rés passou a deter 1.243.000 acções da E...G.

Cada um dos quatro contratos de swap teve por objecto as 1.243.000 acções da E...G e destinavam-se a garantir a neutralidade financeira da operação, promovendo a cobertura do risco inerente à detenção das acções e promovendo a cobertura de reembolso do capital bem como os custos e os encargos financeiros decorrentes dos contratos.

Posteriormente, porque se mantinham as necessidades de financiamento do Banco Invest, o BES contactou cada uma das rés para que reforçassem a sua posição na E...G no aumento de capital previsto para esta sociedade, reforço esse a ter lugar nos termos dos contratos anteriores a mantendo-se a neutralidade da Operação para as rés.

Em consequência, foram celebrados aditamentos a cada um dos contratos de financiamento do BES a cada uma das rés, aumentando o financiamento a cada uma para 17.500.000€ e simultânea aquisição, por cada ré, de mais 1.020.408 acções representativas do capital social da E...G (passando cada uma a deter 2.263.408 acções da E...G) e prorrogando os respectivos prazos e alterando as taxas de juro e, quatro contratos de swap entre a E... e cada uma das rés, nos termos dos quais as partes prorrogaram os contratos até 01/12/2014 e com a mesma finalidade de assegurarem a neutralidade financeira da operação. O BES não solicitou qualquer reforço de garantias e, à data dos aditamentos, já tinha conhecimento de ter havido aumentos de capital da A....

Os contratos foram cumpridos até Setembro de 2014, pois a E... foi declarada insolvente e deixou de cumprir os contratos de swap, não pagando o floating amount nem o equity amount, que se destinavam a permitir que cada uma das rés pagasse os juros de cada uma das operações e reembolsasse o BES, entretanto Novo Banco. Entretanto, a E...G foi igualmente declarada insolvente.

O BES assegurou a total neutralidade das operações, sem a qual as rés não os teriam celebrado. Houve uma unicidade das Operações e uma conexão funcional entre os vários negócios celebrados, pelo que as vicissitudes de um contrato se repercutem nos outros.

Não tendo o BES cumprido a obrigação de neutralidade dos contratos de financiamento, podem as rés invocar a excepção de não cumprimento para assim se recusarem a pagar ao autor os valores de capital que receberiam da E... ao abrigo dos swaps.

Ademais, exigir o pagamento dos contratos de financiamento em circunstância que contrariam a neutralidade garantida pelo BES, consubstancia uma situação de abuso de direito.

Violou ainda o BES o dever de avaliar e esclarecer as rés, aquando do reforço da operação, acerca da solvabilidade das entidades que chamou à operação, a E...G e a E.... Subsidiariamente, as rés invocam o instituto da alteração das circunstâncias, devendo ser reposto o equilíbrio substancial em que as partes fundaram a obrigação de contratar, devendo as obrigações de cada uma das rés perante o Novo Banco serem reduzidas na exacta medida do rendimento que a titularidade das acções e contratos de swap permitiriam gerar para a ré, através da dação das acções da E...G para o autor ou, através da entregar ao autor dos valores que as rés vierem a receber na insolvência da E...G.

Quanto ao penhor financeiro, dizem que nunca abrangeu quaisquer acções futuras da A..., não podendo incidir sobre as acções resultantes dos aumentos de capital.

1.4. - Cada uma das Rés deduziu pedido reconvencional, pedindo:

a) Seja declarado que o penhor financeiro – de cada uma das rés - apenas incide sobre 112.500 acções da A...;

b) Seja declarado que o autor não pode executar o penhor financeiro sem que exista incumprimento pela(s) ré(s) da obrigação de entregar(em) ao autor as quantias que eventualmente venha(m) a receber da massa insolvente da E... da venda das acções da E...G;

c) Subsidiariamente, para o caso de a(s) acção(ões) não improceder(em), seja o autor condenado a pagar à(s) ré(s) a quantia a liquidar posteriormente e montante igual ao que a(s) ré(s) seja(am) condenada(s) acrescida(s) de juros vincendos;

d) Subsidiariamente, para o caso de ocorrerem as decisões referidas em c), se declare compensado(s) o(s) crédito(s) do autor sobre a(s) ré(s) com o(s) crédito(s) desta(s) sobre a autora e esta condenada a pagar o remanescente correspondente a indemnização por danos patrimoniais acrescida de juros desde a sentença até integral pagamento;

e) Caso o autor venha a alegar a intransmissibilidade do dever de assegurar a neutralidade da Operação e as inerentes responsabilidades daí aderentes, deve considerar-se o Novo Banco parte ilegítima dada a integralidade da operação.

Alegaram, em resumo:

O penhor financeiro incide apenas sobre 112.500 acções da A... e não abrange acções futuras. Além disso, é inadmissível a execução do penhor financeiro, dado que foi constituído unicamente para garantir que no contexto interno da Operação, as rés transfeririam para o BES os fundos a receber da E... ao abrigo dos respectivos contratos de swap e do produto da venda das acções da E...G no termo da Operação e, não tendo havido incumprimento pelas rés, porque transferiram para o BES os dois upfront amounts e os floating amounts que receberam da E... para pagamento dos encargos com os respectivos contratos de financiamento.

Por outro lado, caso as rés venham a ser condenadas, têm direito a ser ressarcidas dos prejuízos que sofrearam em consequência directa do incumprimento do BES da obrigação de assegurar a neutralidade financeira de toda a Operação e do dever de informar as rés acerca da solvabilidade das entidades que chamou à operação, a E... e a E...G, cuja informação económica e financeira tinha acesso dado pertencer ao mesmo grupo empresarial e partilhar membros dos órgãos sociais, obrigações essas transferidas para o Novo Banco.

Incumpridas essas obrigações o autor incorre em responsabilidade que o constitui na obrigação de indemnizar as rés pelos prejuízos que sofreram em consequência desse incumprimento.

Caso o Novo Banco venha a defender que não se transferiu para ele a obrigação de assegurar a neutralidade da Operação, então terá de se declarar parte ilegítima dada a integralidade da Operação: não se pode apenas transferir créditos sem as inerentes responsabilidades.

1.5. O Autor Novo Banco replicou, contraditando as reconvenções, alegando, em síntese:

Refuta a tese das rés, afirmando que elas sabiam os riscos que corriam ao investir em acções da E...G, dado que contrataram um swap para minimizar esses riscos.

Impugna que a Operação – financiamento do BES a cada uma das rés – tenha sido condição do empréstimo ao Banco Invest.

Nega a invocada neutralidade da Operação por meio do swap, dado que as rés tinham uma margem (lucro) de 0,5% e a E... podia, a todo o tempo, fazer cessar o swap.

Contesta que houvesse conexão/ligação entre o financiamento ao Banco Invest e a Operação (empréstimo às rés e swap) e, por isso não é possível a invocação da excepção de não cumprimento do swap para se furtarem, as rés, a cumprirem os contratos de empréstimo. Além disso, o swap é um derivado, existindo independência relativamente ao subjacente e, por conseguinte, não pode funcionar a excepção de não cumprimento, que assenta na interdependência de prestações. Além disso ainda, aos contratos de mútuo falta o sinalagma funcional, o que impede o funcionamento da excepção de não cumprimento.

Reitera inexistir união de contratos e, por isso, não é possível invocar a excepção de não cumprimento do swap para não cumprir o contrato de financiamento às rés.

Por outro lado, a união de contratos pretendida esbarraria com a deliberação do Banco de Portugal relativa à resolução do BES e criação do Novo Banco na medida em que expressamente foram excluídas da transmissão para o autor as obrigações contraídas perante unidades que integram o GES e não se verificam os requisitos do instituto da alteração das circunstâncias.

Além do mais, quanto ao penhor de acções, ficou expressamente estabelecido que as rés não podiam praticar qualquer acto que diminuísse o valor do penhor e, no caso a garantia prestada passou de 25%, por cada uma das rés, do capital social da A... para 1,56% dessa sociedade detentora do Banco Invest, devendo entender-se que o penhor de acções contemplava os aumentos de capital realizados e não somente as 112 500 acções empenhadas originariamente

1.6. - Realizada audiência de julgamento, foi proferida (24/4/2018) sentença que decidiu:

“I-No processo em que é autor o Novo Banco e ré a Valri (processo principal):

a) -Julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, condena-se a ré Valri a entregar ao autor as acções representativa de 25% do capital social da A..., que resultaram dos aumentos de capital dessa sociedade em 2011 e em 2012. Absolver a ré Valri do restante pedido contra ela formulado.

b) -Julgar a reconvenção da Valri parcialmente procedente e, em consequência, declara-se que o autor não pode executar o penhor de acções da A... enquanto se mantiver justificada a recusa de cumprimento ao abrigo da excepção de não cumprimento.

II- No processo em que é autor o Novo Banco e ré a Sotif (apenso B):

a) -Julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, condena-se a ré Sotif a entregar ao autor as acções representativa de 25% do capital social da A..., que resultaram dos aumentos de capital dessa sociedade em 2011 e em 2012. Absolver a ré Sotif do restante pedido contra ela formulado.

b) -Julgar a reconvenção da Sotif parcialmente procedente e, em consequência, declara-se que o autor não pode executar o penhor acções da A... enquanto se mantiver justificada a recusa de cumprimento ao abrigo da excepção de não cumprimento.

III- No processo em que é autor o Novo Banco e ré a MS (apenso C):

a) -Julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, condena-se a ré MS a entregar ao autor as acções representativa de 25% do capital social da A..., que resultaram dos aumentos de capital dessa sociedade em 2011 e em 2012. Absolver a ré MS do restante pedido contra ela formulado.

b) -Julgar a reconvenção da MS parcialmente procedente e, em consequência, declara-se que o autor não pode executar o penhor de acções da A... enquanto se mantiver justificada a recusa de cumprimento ao abrigo da excepção de não cumprimento.

IV- No processo em que é autor o Novo Banco e ré a Lerimo (apenso D):

a) -Julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, condena-se a ré Lerimo a entregar ao autor as acções representativa de 25% do capital social da A..., que resultaram dos aumentos de capital dessa sociedade em 2011 e em 2012. Absolver a ré Lerimo do restante pedido contra ela formulado.

b) -Julgar a reconvenção da Lerimo parcialmente procedente e, em consequência, declara-se que o autor não pode executar o penhor de acções da A... enquanto se mantiver justificada a recusa de cumprimento ao abrigo da excepção de não cumprimento.

Atribuem-se as responsabilidades pelas custas, em cada um dos processos apensados, ao autor e à respectiva ré, na proporção de metade para cada.”

1.7.- O NOVO BANCO SA recorreu de apelação e a Relação de Lisboa, por acórdão de 24/9/2020, decidiu julgar improcedente o recurso e confirmar a sentença.

1.8.- O NOVO BANCO, S.A., interpôs recurso de revista excepcional (admitido por acórdão da Formação de 8/6/2021), com as seguintes conclusões:

1)O Tribunal a quo interpretou erradamente a Medida de Resolução, já que a aceitação da premissa de que as contingências referentes ao equity swap celebrado entre as Recorridas e a Espírito Santo International produzem um efeito de contaminação na esfera jurídica do Novo Banco – por força da aplicação da exceção de não cumprimento ao caso dos autos – contraria a finalidade declarada na Medida de Resolução de protecção do Novo Banco quanto a contingências que não se encontrassem identificadas e contabilizadas no balanço do Banco Espírito Santo.

2)Este vetor estruturante da Medida de Resolução (desconsiderado por completo no Acórdão Recorrido), de eliminação de incertezas sobre a composição do balanço do Novo Banco e de um corte definitivo com as situações de contaminação do negócio bancário do Banco Espírito Santo por actos e negócios em que intervieram entidades do Grupo Espírito Santo (nomeadamente a Espírito Santo International), tem vindo a ser reconhecido repetidamente pelos nossos tribunais superiores, que vêm aplicando a Medida de Resolução de forma correta, separando tais responsabilidades e contingências daquelas que foram as responsabilidades e contingências transmitidas para o Novo Banco.

3)Para concretização do referido vetor, previu-se na Medida de Resolução a existência de um conjunto de activos e de passivos que não seriam transmitidos do Banco Espírito Santo para o Novo Banco, criando-se, no que às responsabilidades diz respeito, o conceito de “Passivos Excluídos” previstos no Anexo 2 à Medida de Resolução.

4) O Tribunal da Relação de Lisboa não explica porque não aplica aos factos em discussão o excerto da Medida de Resolução que inclui nos Passivos Excluídos as “Obrigações contraídas relativamente qualquer tipo de responsabilidades de entidades que integrem o Grupo Espírito Santo”. Tendo ficado provada a existência de uma situação de coligação de contratos, desta resulta necessariamente a responsabilização do Banco Espírito Santo pelas vicissitudes inerentes à execução do equity swap por parte da Espírito Santo International, sendo precisamente essas responsabilidades que são direta e inequivocamente qualificadas como Passivos Excluídos na Medida de Resolução.

5)A excepção de não cumprimento considerada pelo Tribunal a quo não é oponível a contratos do Novo Banco, por contrariar a Medida de Resolução de 3 de agosto de 2014 e por defraudar um dos objetivos essenciais da Medida de Resolução: a não transferência para o Novo Banco de dívidas ou contingências associadas a entidades do Grupo Espírito Santo.

6) Por deliberação de 11 de agosto de 2014, em que se alterou a redação das subalíneas (iii), (v) e (vii) da alínea (b) do Anexo 2 à deliberação de 3 de agosto, o Banco de Portugal clarificou o teor da Medida de Resolução, tendo, com relevância para o caso dos autos, ficado absolutamente claro que as únicas

obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências resultantes da comercialização, intermediação financeira e distribuição de instrumentos de dívida do Grupo Espírito Santo transferidas para o Novo Banco eram as que decorressem de estipulações contratuais anteriores a 30 de junho de 2014 e que

pudessem ser documentalmente comprovadas – o que não sucede no caso dos

autos.

8) Por deliberação de 29 de dezembro de 2015 o Banco de Portugal reafirmou e sublinhou o objetivo de impedir a transmissão para o Novo Banco de determinadas obrigações, responsabilidades, garantias ou contingências constituídas ao nível do Banco Espírito Santo antes da resolução bancária, criando um novo anexo à Medida de Resolução, o Anexo C, onde clarificou também que “nos termos da alínea (b) do número 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto, não foram transferidos do BES para o Novo Banco quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do BES que, às 20:00 horas do dia 3 de agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos”.

9)À data da Medida de Resolução eram desconhecidas quaisquer contingências do Banco Espírito Santo referentes aos referidos contratos de equity swap, até porque só em 3 de setembro de 2014 as Recorridas informaram o Novo Banco de que não iriam proceder ao pagamento dos juros do financiamento, que se venciam nesse dia (facto provado 39º).

10) Também por deliberação de 29 de dezembro de 2015, o Banco de Portugal veio novamente esclarecer que a Medida de Resolução visava impedir a transmissão para o Novo Banco de quaisquer responsabilidades ou contingências desconhecidas, e isto independentemente de estas se relacionarem com as sociedades do Grupo Espírito Santo ou não.

11)Ao reconhecer às Recorridas o direito de opor perante o Novo Banco uma excepção de não cumprimento, o Tribunal a quo criou uma injustificada desigualdade com todos os investidores não qualificados que subscreveram papel comercial da Espírito Santo International e que, quando procuraram imputar responsabilidades ao Novo Banco, viram ser-lhes generalizada e corretamente negada tal pretensão pelos nossos tribunais superiores, em estrita aplicação da Medida de Resolução.

12)Sem prejuízo da natural possibilidade de controlo judicial, nos termos do atual artigo 145.º-O, n.º 1 cabe exclusivamente ao Banco de Portugal a competência pela determinação dos direitos e obrigações da instituição de crédito resolvida para a instituição de transição.

13)Ao decidir-se que o Novo Banco deve responder pelas contingências associadas aos contratos de equity swap celebrados entre Espírito Santo International e Recorridas está a violar-se a Medida de Resolução e, em consequência, o regime legal que determina que cabe ao Banco de Portugal a seleção dos direitos e obrigações a transmitir para a instituição de transição.

14)O Tribunal a quo interpretou incorretamente o disposto no atual artigo 145.º-O, n.º 1 do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.

15)A constatação da existência de uma coligação de contratos só poderia ter algum efeito ao nível da Medida de Resolução se e na medida em que isso resultasse dessa medida e da lei que a regula.

16)Sem prejuízo do reconhecimento de uma situação de coligação entre os contratos de financiamento e os contratos de equity swap, esses dois conjuntos de contratos não se converteram, nem constituem, uma única relação contratual, não existindo qualquer “integralidade” entre as prestações resultantes dos vários contratos.

17) A Medida de Resolução e a legislação de enquadramento não contêm nenhuma norma ou princípio que determine que no âmbito de uma resolução bancária há que garantir a inseparabilidade de posições jurídicas ativas e passivas decorrentes de relações contratuais diferentes, mas interligadas.

18) O artigo 145.º-O, n.º 6, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras é aplicável apenas a contratos em que a instituição resolvida seja parte, o que manifestamente não acontece no caso dos autos em relação aos contratos de equity swap, em que o Banco Espírito Santo não era parte.

19) O artigo 145-O, nº 6, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras deve ser interpretado conforme à Diretiva n.º 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014.

20) A Comissão Europeia, através do Regulamento Delegado (UE) 2017/867, de 7 de fevereiro de 2017, esclareceu, de forma precisa, os tipos de acordos abrangidos pelas salvaguardas estabelecidas na Diretiva BDDR e, também nesta sede, se conclui inexistir qualquer previsão legal que acomode o entendimento de que a instituição de transição Novo Banco possa ser responsabilizada por contingências associadas a contratos celebrados pela Espírito Santo International.

21) A situação dos autos não é objeto de nenhuma das salvaguardas previstas na Diretiva BDDR e, por identidade de razões, não é objeto da salvaguarda prevista no artigo 145.º-O, n.º 6 do RGISCF.

1.9. – As Rés contra-alegaram, em síntese:

1.Está assente um negócio jurídico unitário de aquisição e detenção de acções da E...G pelas Recorridas, por conta e no interesse do BES, com financiamento por este e neutralidade para as Recorridas, marcado por um sinalagma genético e funcional, no qual se insere o direito de crédito invocado pelo Novo Banco e em decorrência do qual as Recorridas são titulares de uma excepção de não cumprimento perante aquele.

2.Ora, a unicidade do negócio determina que o direito de crédito do BES, de que o Novo Banco se arroga, só poderá ser transmitido no âmbito do negócio jurídico unitário, e em conjunto com a totalidade das situações jurídicas que nele se integram, sob pena de se subverter aquela unicidade tal como definitivamente estabilizada pelas instâncias.

3. Por outro lado, verifica-se que, mesmo que, por abstração de raciocínio, que não se admite e apenas por mera cautela de patrocínio se conjectura, se considerasse o direito de crédito do BES por si só, analiticamente (isto é, ignorando a indissociabilidade que define o negócio jurídico unitário), sempre se teria de concluir que aquele direito de crédito se transmitiu qua tale, com todas as suas características, termos e condições e vicissitudes, incluindo, pois, a exceção de não cumprimento, que lhe é inerente e que mais não é do que um impedimento ao seu exercício.

4. Esta indissociabilidade, que é sufragada pela doutrina, decorrendo dos princípios gerais de Direito, encontra-se expressamente contemplada como regra geral, no âmbito da resolução bancária, no artigo 145.º-O, n.º 6, do RGICSF, que é aplicável ao presente caso, na medida em que tal decorre da letrada lei (“nomeadamente”) e tendo em conta que aquela norma não pode pôr em causa a unicidade e integralidade das relações contratuais. Por outro lado, verifica-se que esta regra geral é conforme à Diretiva BRRD, que consagra, ela própria, uma regra geral, nos termos da qual a transmissão de um direito de crédito não afeta a invocação da exceção de não cumprimento.

5. À luz do n.º 9 do Anexo 2 da Medida de Resolução, é também claro que podem ser exercidos pelas contrapartes da instituição resolvida, no âmbito de uma medida de resolução, os direitos que já existissem e que pudessem ser exercidos, como era o caso da exceção de não cumprimento invocada pelas Recorridas que podia ser exercida contra o BES, e que a transmissão operada pela Medida de Resolução não dá lugar à alteração de condições, direitos ou obrigações, incluindo, naturalmente, a exceção de não cumprimento que é inerente ao crédito transmitido no âmbito da cessão da posição contratual.

6. Assim, ocorrendo a transferência do direito de crédito do BES sobre as Recorridas a favor do Novo Banco, a sujeição à exceção de não cumprimento invocada pelas Recorridas tem-se também por transmitida, necessariamente, para o Novo Banco.

7. Do mesmo modo que, caso, por mera hipótese de raciocínio, mas sem conceder, se entendesse que não foi transferida para o Novo Banco a sujeição à exceção de não cumprimento invocada pelas Recorridas, ter-se-ia de concluir também, em virtude da incindibilidade do negócio jurídico unitário, que o direito de crédito invocado pelo Novo Banco não se transmitiu a favor deste, o que sempre determinaria a ilegitimidade ativa do Novo Banco, conforme referido pelas Recorridas, cautelar e subsidiariamente, nas respetivas contestações.

8. Assim, sendo o BES titular de um estado de sujeição, que se contrapõe à exceção de não cumprimento, verifica-se que não há aqui uma obrigação (passivo), não sendo aplicável a alínea (b) do Anexo 2 da Medida de Resolução, mas sim, quando muito, a alínea (d), transmitindo-se a sujeição, como elemento extrapatrimonial do BES, para o Novo Banco.

9. E ainda que, por hipótese de raciocínio, mas sem concder, a sujeição pudesse ser concebida como uma “responsabilidade” ou “passivo”, subsumindo-se à alínea (b) do Anexo 2 da Medida de Resolução – o que não é o caso –, a sujeição sempre se transmitiria para o Novo Banco, nos termos da regra geral prevista no corpo da alínea (b), na medida em que não são aplicáveis as exceções invocadas pelo Novo Banco de entre a lista de passivos excluídos da transferência, previstas nas subalíneas (iii), (v) e (vii).

10. Assim, não é aplicável a subalínea (iii), que exclui do perímetro de transferência as “[o]brigações contraídas ou garantias prestadas perante terceiros relativamente a qualquer tipo de responsabilidades de entidades que integram o Grupo Espírito Santo […]”, na medida em que não há, da parte do BES, uma “obrigação” ou uma “garantia”, mas uma posição jurídica que configura uma sujeição e que é própria do BES, no âmbito do negócio jurídico unitário, como bem entendeu o Tribunal a quo.

11. Também não é aplicável a subalínea (v), que exclui do perímetro de transferência as “responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, fiscais, penais ou contraordenacionais […]”, dado que não estão em causa responsabilidades ou contingências, muito menos resultantes de fraude ou da violação de normas legais ou regulamentares, como também entendeu o Acórdão Recorrido.

12. Por fim, não é aplicável a subalínea (vii), que exclui as “obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira, processo de contratação e distribuição de instrumentos financeiros emitidos por quaisquer entidades”, dado que não está em causa, nos autos, nenhuma das atividades previstas nesta norma, não havendo sequer um investimento por parte das Recorridas – tudo em conformidade com a decisão do Tribunal a quo.

13.Considerando que o direito de crédito do BES, que consta, enquanto ativo, no balanço do BES, se insere no âmbito do negócio jurídico unitário e tem como vicissitude inerente a sujeição decorrente da exceção de não cumprimento, a não identificação do negócio ou da exceção de não cumprimento no balanço do BES não tem qualquer relevância para efeitos da sua transmissão para o Novo Banco.

14.A segunda finalidade da Medida de Resolução seria a de exclusão de contingências associadas ao Grupo Espírito Santo do âmbito da transferência para o Novo Banco. Todavia, esta exclusão circunscreve-se às subalíneas (iii) e, na sua versão original, (vii) da alínea (b) do Anexo 2 da Medida de Resolução. Sendo o Banco de Portugal a entidade que seleciona o património a transferir para o Novo Banco, nos termos do artigo 145.º-Q, n.º 1, do RGICSF, verifica-se que, neste ato de seleção e no momento em que deliberou a Medida de Resolução – depois confirmado pelas 2.ª e 3.ª deliberações –, o Banco de Portugal restringiu a exclusão de passivos relacionados com o Grupo Espírito Santo àquelas subalíneas, que não incluem o caso dos autos e que, por isso, não revelam qualquer princípio geral no âmbito da Medida de Resolução.

15. Quanto à suposta “injustificada desigualdade” provocada pela invocação da exceção de não cumprimento, verifica-se que o Novo Banco trata por iguais situações que são integralmente desiguais, na medida em que a situação dos autos é o negócio jurídico unitário, não estando aqui em causa, como nos casos dos “lesados do BES”, a distribuição de instrumentos financeiros e ou uma atividade de intermediação financeira – não havendo sequer um investimento por parte das Recorridas, matéria que se encontra assente –, pelo que não é aplicável nem a jurisprudência dos tribunais superiores a este respeito nem, logicamente, o princípio de igualdade entre credores (visto que as Recorridas não atuam como credoras, opondo, sim, uma exceção de não cumprimento).

16.Acresce que, nos termos do princípio no creditor worse off, previsto no artigo 145.º-D, n.º 1, alínea c), do RGICSF, as Recorridas não podem receber menos do que receberiam caso o BES tivesse entrado em liquidação. Nestas circunstâncias, poderiam as Recorridas invocar a exceção de não cumprimento perante o BES, pelo que nada teriam de pagar ao BES; consequentemente, nunca as Recorridas teriam de pagar a prestação ao Novo Banco.

17. Nestes termos, a Medida de Resolução não impede o exercício da exceção de não cumprimento por parte das Recorridas; pelo contrário, nos termos do citado n.º 9 do Anexo 2, a transferência do direito de crédito do BES a favor do Novo Banco não pode resultar na alteração das condições contratuais e, naturalmente, das vicissitudes a que o direito está sujeito, podendo as Recorridas recusar a sua prestação enquanto não receberem a prestação sinalagmática a que têm direito.

1.10. Em 6/12/2017, as Rés juntaram dois pareceres jurídicos: um do senhor Prof Dr CC, com a colaboração do senhor Dr DD, e outro do senhor Prof. Dr EE.

O Autor, em 5/10/2018, juntou parecer das senhoras Professoras Dras FF e GG.


II – FUNDAMENTAÇÃO


2.1. – Delimitação do objecto do recurso

A questão submetida a recurso, delimitado pelas conclusões, consiste em saber se é legítima a invocação da excepção do não cumprimento do contrato, oposta pelas Rés ao Novo Banco, em face da Medida de Resolução do Banco de Portugal.

2.2. – Os factos provados (descritos no acórdão)

1º- As rés, Valri, Lerimo, Sotif e MS, são as quatro holdings de topo do chamado Grupo A..., SA e, cada uma delas, detém 25% do capital social da A..., SGPS, SA (A...) a qual, por sua vez, em 31/12/2008 detinha, directamente, 98,82% do capital social do Banco Invest, SA (Banco Invest) e, em 31/12/2014, detinha, directamente, 99,12% do capital social do Banco Invest.

2º- No quarto trimestre de 2008, o Banco Invest carecia urgentemente de liquidez, no montante de 100 000 000€, para fazer face a encargos com um empréstimo obrigacionista de 50 000 000€, com vencimento em 21/12/2008 e, os restantes 50 000 000€, para linhas de reporte.

3º- O Banco de Portugal, em face da situação de falta de liquidez do Banco Invest, notificou-o em 06/10/2012, para que apresentasse com urgência informação detalhada sobre as medidas que previa com vista à regularização da situação; e voltou a notificar o Banco Invest para que apresentasse projecções do rácio de solvabilidade para 2009, de base individual e consolidada.

4º- Em face da situação, os representantes do Banco Investe e das rés, tentaram negociar com a CGD um financiamento com vista a obter liquidez para o Banco Invest, mas não foi possível concretizar esse financiamento porque a CGD apenas disponibilizava 70 000 000€ dos quais reteria logo 40 000 000€ como garantia de liquidação das obrigações que detinha emitidas pelo Banco Invest e exigia garantias incomportáveis para o GrupoA..., SA.

5º- Entretanto, o Banco Invest obteve financiamento de 50 000 000€ com recurso à Garantia Pessoal do Estado Português.

6º- Neste contexto, os representantes do Banco Invest e das rés solicitaram reunião ao Dr. AA, a fim de tentarem obter o financiamento, do BES, para os restantes 50 000 000€.

6ºA- O Dr. AA disponibilizou-se para, através do BES, financiar os 50 000 000€ ao Banco Invest, mas pretendia que o Grupo A..., SA participasse no Grupo Espírito Santo (GES) por forma a definir posteriormente com o ... BB.

7º- Passados dias, os representantes das rés e do Banco Invest, reuniram com BB e HH, do BES, onde foi apresentada a operação de financiamento de 50 000 000€ ao Banco Invest e, simultaneamente, a operação de participação das rés no GES, mediante aquisição em igual montante de 50 000 000€ em acções da E...G pelas rés.

8º- Porque as rés não tinham disponibilidades financeiras para adquirirem, cada uma delas, 12500 000€ em acções do E...G, o BB disse que o BES financiava integralmente esses valores a cada uma das rés e garantiria a neutralidade financeira da operação, através da contratação de swap.

9º- A operação de financiamento para aquisição das acções da E...G era condição económica do financiamento do BES ao Banco Invest.

10º- A neutralidade financeira da Operação com cada uma das rés traduzia-se em:

i)- Os valores necessários à aquisição das acções da E...G eram integralmente financiados pelo BES;

ii)- Os custos necessários a suportar o pagamento de juros remuneratórios com os financiamentos a cada uma das rés eram suportados através dos contratos de swap, de teor igual, a concretizar com cada uma das rés;

iii)- Os valores necessários ao reembolso do capital financiado eram suportados através da venda das acções no termo do prazo acordado, igual ao do financiamento ao Banco Invest, garantindo o swap a manutenção do valor de aquisição dessas acções da E...G;

iv)- As rés não retirariam qualquer lucro da operação de aquisição das acções da E...G, quer resultante de eventuais valorizações das acções quer da distribuição de dividendos dessas acções, que deveriam ser entregues a entidade a designar relacionada com o GES, nem exerciam direitos sociais decorrentes da detenção das acções da E...G.

11º- O Banco Invest e as rés aceitaram celebrar a operação proposta pelo BES e em consequência foram celebrados os contratos que infra se discriminam, cujos termos e condições foram definidos pelo BES, quer quanto às acções a adquirir pelas rés, o preço individual e montantes totais, as condições de financiamento e dos contratos de swap e a contraparte nesses contratos de swap.

12º- O BES remeteu ao Banco Investe minuta do contrato de financiamento, na modalidade de Abertura de Crédito, que foi assinado em 02/12/2008, que consta a fls 389 verso e segs, pelo qual, além do mais, o BES concedeu um crédito de 30 000 000€ ao Banco Invest, com vencimento em um ano após a celebração, podendo ser renovado uma ou mais vezes. Esse contrato foi renovado em 2009 e 2010

13º- O BES remeteu à A... minuta do contrato de financiamento, que foi assinado em 04/12/2008, que consta a fls 397 verso e segs, pelo qual, além do mais, o BES concedeu um crédito de 20 000 000€ à A..., com vencimento em 04/12/2011. Neste contrato intervieram ainda cada uma das rés, como garantes, tenho cada uma dado em penhor 950 000 acções representativas de 5% do capital social e direitos de voto da A...Gestão, SA, num total de 20% do capital social desta sociedade.

14º- O BES remeteu à ré Valri o contrato de financiamento, que foi assinado 04/12/2008, que consta a fls 7 e segs, pelo qual, além do mais, o BES concedeu financiamento à Valri, no montante de 12 500 000€, com reembolso de capital a 04/12/2011, com taxa de juros correspondente à Euribor a 3 meses acrescida de três pontos percentuais; nesse contrato, consta sob a epígrafe “ (penhor de acções) ”, além do mais, que “1…a Cliente constitui a favor do BES primeiro penhor sobre 112 500 acções representativas de 25% do capital social e de direitos de voto da A..., SGPS, SA, que estão depositadas na conta de instrumentos financeiros nº ...04, de que a Cliente é titular junto do BES.(…) 4- A Cliente obriga-se a não praticar qualquer acto que diminua ou possa levar à diminuição do objecto do penhor ou do respectivo valor bem como a comunicar de imediato ao BES qualquer facto que possa ter esse efeito. (…) 11- …o BES fica mandatado a praticar todos e quaisquer acto e formalidades necessários à constituição do penhor de acções e à sua plena eficácia face à Cliente ou a terceiros, podendo nomeadamente requerer registos e averbamentos, proceder a comunicações e publicações, solicitar o levantamento das acções empenhadas e proceder ao respectivo depósito, solicitar a emissão de certidões ou certificados e tudo o mais que entender necessário ou conveniente à plena e incondicional eficácia do penhor de que é beneficiário e à conservação da coisa empenhada.”

15º- O BES remeteu à ré Lerimo o contrato de financiamento, que foi assinado 04/12/2008, que consta a fls 7 e segs do apenso D pelo qual, além do mais, o BES concedeu financiamento à Valri, no montante de 12 500 000€, com reembolso de capital a 04/12/2011, com taxa de juros correspondente à Euribor a 3 meses acrescida de três pontos percentuais; nesse contrato, consta sob a epígrafe “ (penhor de acções) ”, além do mais, que “1…a Cliente constitui a favor do BES primeiro penhor sobre 112 500 acções representativas de 25% do capital social e de direitos de voto da A..., SGPS, SA, que estão depositadas na conta de instrumentos financeiros nº ...04, de que a Cliente é titular junto do BES.(…) 4- A Cliente obriga-se a não praticar qualquer acto que diminua ou possa levar à diminuição do objecto do penhor ou do respectivo valor bem como a comunicar de imediato ao BES qualquer facto que possa ter esse efeito. (…)…o BES fica mandatado a praticar todos e quaisquer acto e formalidades necessários à constituição do penhor de acções e à sua plena eficácia face à Cliente ou a terceiros, podendo nomeadamente requerer registos e averbamentos, proceder a comunicações e publicações, solicitar o levantamento das acções empenhadas e proceder ao respectivo depósito, solicitar a emissão de certidões ou certificados e tudo o mais que entender necessário ou conveniente à plena e incondicional eficácia do penhor de que é beneficiário e à conservação da coisa empenhada.”

16º- O BES remeteu à ré MS o contrato de financiamento, que foi assinado 04/12/2008, que consta a fls 7 e segs do apenso C, pelo qual, além do mais, o BES concedeu financiamento à Valri, no montante de 12 500 000€, com reembolso de capital a 04/12/2011, com taxa de juros correspondente à Euribor a 3 meses acrescida de três pontos percentuais; nesse contrato, consta sob a epígrafe “ (penhor de acções) ”, além do mais, que “1…a Cliente constitui a favor do BES primeiro penhor sobre 112 500 acções representativas de 25% do capital social e de direitos de voto da A..., SGPS, SA, que estão depositadas na conta de instrumentos financeiros nº ...04, de que a Cliente é titular junto do BES.(…) 4- A Cliente obriga-se a não praticar qualquer acto que diminua ou possa levar à diminuição do objecto do penhor ou do respectivo valor bem como a comunicar de imediato ao BES qualquer facto que possa ter esse efeito. (…)…

17º- O BES remeteu à ré Sotif o contrato de financiamento, que foi assinado 04/12/2008, que consta a fls 13 e segs do apenso B pelo qual, além do mais, o BES concedeu financiamento à Valri, no montante de 12 500 000€, com reembolso de capital a 04/12/2011, com taxa de juros correspondente à Euribor a 3 meses acrescida de três pontos percentuais; nesse contrato, consta sob a epígrafe “ (penhor de acções) ”, além do mais, que “1…a Cliente constitui a favor do BES primeiro penhor sobre 112 500 acções representativas de 25% do capital social e de direitos de voto da A..., SGPS, SA, que estão depositadas na conta de instrumentos financeiros nº ...04, de que a Cliente é titular junto do BES.(…) 4- A Cliente obriga-se a não praticar qualquer acto que diminua ou possa levar à diminuição do objecto do penhor ou do respectivo valor bem como a comunicar de imediato ao BES qualquer facto que possa ter esse efeito. (…)

18º- O contrato celebrado com a ré Valri, referido em 14º, teve:

i)- Um aditamento em 04/12/2011, pelo qual foi alterada a taxa de juro, passando a corresponder à Euribor a 3 meses acrescida de 4% e, o prazo de reembolso passou para o dia 18/01/2012;

ii)- E esse contrato teve um segundo aditamento, em 18/10/2012, pelo qual o reembolso do capital mutuado passou para o dia 04/12/2014

iii)- Teve ainda um terceiro aditamento, em 24/04/2012, pelo qual, ocorreu um aumento do montante financiado em mais 5 000 000€, passando para 17 500 000€.

19º- O contrato celebrado com a ré Lerimo, referido em 15º, teve:

i)-Um aditamento em 04/12/2011, pelo qual foi alterada a taxa de juro, passando a corresponder à Euribor a 3 meses acrescida de 4% e, o prazo de reembolso passou para o dia 18/01/2012;

ii)- E esse contrato teve um segundo aditamento, em 18/10/2012, pelo qual o reembolso do capital mutuado passou para o dia 04/12/2014;

iii)- Teve ainda um terceiro aditamento, em 24/04/2012, pelo qual, ocorreu um aumento do montante financiado em mais 5 000 000€, passando para 17 500 000€.

20º- O contrato celebrado com a ré MS, referido em 16º, teve:

i)- Um aditamento em 04/12/2011, pelo qual foi alterada a taxa de juro, passando a corresponder à Euribor a 3 meses acrescida de 4% e, o prazo de reembolso passou para o dia 18/01/2012;

ii)- E esse contrato teve um segundo aditamento, em 18/10/2012, pelo qual o reembolso do capital mutuado passou para o dia 04/12/2014;

iii)- Teve ainda um terceiro aditamento, em 24/04/2012, pelo qual, ocorreu um aumento do montante financiado em mais 5 000 000€, passando para 17 500 000€.

21º- O contrato celebrado com a ré Sotif, referido em 17º, teve:

i)- Um aditamento em 04/12/2011, pelo qual foi alterada a taxa de juro, passando a corresponder à Euribor a 3 meses acrescida de 4% e, o prazo de reembolso passou para o dia 18/01/2012;

ii)- E esse contrato teve um segundo aditamento, em 18/10/2012, pelo qual o reembolso do capital mutuado passou para o dia 04/12/2014;

iii)- Teve ainda um terceiro aditamento, em 24/04/2012, pelo qual, ocorreu um aumento do montante financiado em mais 5 000 000€, passando para 17 500 000€.

22º- Apesar de nos contratos referidos em 14º, 15º, 16º e 17º constar que os financiamentos se “…destina(m) a ser(em) utilizado(s) pela(s) cliente(s) para a realização de investimentos no quadro da(s) sua(s) actividade(s) e ainda para fundo de maneio”, ficou estabelecido, logo de início, que os valores financiados se destinavam, exclusivamente, à aquisição de acções da E...G.

23º- Cada uma das rés assinou duas ordens de aquisição de acções, dirigidas ao BES, uma com data de 02/12/2008 para aquisição em bolsa, até 1 243 000 acções da E...G e, outra, datada de 10/12/2008 para aquisição fora de bolsa de 943 000 acções da E...G, todas ao preço de 10€ por acção e, à primeira ordem (para aquisição de 1 243 000 acções) deviam ser deduzidas as acções referidas na segunda ordem.

24º- Para assegurar a neutralidade financeira da Operação de financiamento a cada uma das rés com vista à aquisição de acções da E...G, foram celebrados contratos de equity swap com cada uma das rés, desenhados pelo BES e com a indicação por este da contraparte nesses contratos, a E..., de teor igual e na mesma data.

25º- As rés não negociaram os termos dos respectivos contratos com a E... nem os respectivos representantes se encontraram, tendo sido o BES quem promoveu os equity swap, os concebeu, elaborou as minutas e procedeu à recolha das assinaturas dos intervenientes nos contratos.

26º- Deste modo, no dia 23/01/2009, entre cada uma das rés e a E..., indicada pelo BES, foram celebrados contratos de equity swap, que integra: (i) um “Master Agreement”, (ii) um anexo designado por “Schedule” (iii) e um documento de confirmação (Confirmation), e tinham por objecto 1 243 000 acções da E...G, promovendo a cobertura do risco de desvalorização das acções da E...G e promovendo a cobertura do reembolso do capital investido (equity amount de 12 500 000€).

27º- Nesses contratos, ficavam ainda cobertos os custos da contratação dos contratos de financiamento de 04/12/2009, com cada uma das rés, através do pagamento dos denominados upfront payment no valor de 110 760,74€, correspondentes aos custos financeiros incorridos entre a data da aquisição das acções da E...G por cada ré e a data da celebração dos equity swap; do pagamento dos floating amounts, destinados a cobrir os encargos financeiros e fiscais decorrentes dos contratos de financiamento, nos dias 1 dos meses de Março, Junho, Setembro e Dezembro de cada ano; sendo esses floating amounts correspondentes ao juro resultante da aplicação da taxa Euribor a 3 meses acrescida de 3,5% sobre o notional amount de 12 500 000€, de modo a permitir que cada uma das rés pagasse ao BES os juros relativos aos contratos de financiamento para aquisição das acções da E...G. Por sua vez, cada uma das rés obrigou-se a entregar à E... os dividendos que fossem distribuídos relativos às acções da E...G.Mais foi estabelecido que a E... suportaria os encargos fiscais do financiamento e do swap; e ainda que os swap terminariam no dia 01/12/2011.

28º- As rés nunca exerceram quais direitos inerentes à detenção das acções da E...G e emitiam instrumentos de representação a explicitar os direitos de voto na E...G segundo instruções do BES.

29º- As rés entregaram os dividendos que receberam da E...G à E....

30º- Em Dezembro de 2011 o BES e o Banco Invest acordaram renovar o contrato de abertura de crédito e aumentar o limite máximo da linha para 37 300 000€, tendo esse contrato sido renovado em 2012 e em 2013.

31º- Em 15/04/2012 o BES solicitou às rés que participassem no aumento de capital da E...G e, em consequência, tiveram lugar os terceiros aditamentos aos contratos de financiamento referidos em iii) dos pontos 18º, 19º, 20º e 21º supra: um terceiro aditamento, em 24/04/2012, pelo qual, ocorreu um aumento do montante financiado, a cada uma das rés, em mais 5 000 000€, passando para 17 500 000€ o valor total de cada um dos financiamentos

32º- Esses aumentos de 5 000 000€ em cada financiamento destinaram-se à aquisição, por cada uma das rés, na sequência da solicitação do BES, de mais 1 020 408 acções representativas do capital social da E...G.

33º- Em consequência deste aumento de aquisição de acções da E...G por cada uma das rés, por indicação do BES e por minutas elaboradas por este, foram celebrados entre cada uma das rés e a E..., aditamentos aos contratos de swap, através de Confirmation(s) que alteraram o notional em mais 5 000 000€ correspondente ao valor das 1 020 408 acções da E...G, e a data de cessação para 01/12/2014, calculou o upfront fee inerente em 40 150€ e reiterou a obrigação de entregar todos os dividendos das acções da E...G no prazo de 3 dias após recebimento, bem como o pagamento dos floating amount nos mesmos termos anteriores. Contratos esses que se destinavam a garantir a neutralidade financeira do cash flow da operação de financiamento e aquisição das acções da E...G.

34º- Aquando do aumento de financiamento pelo BES a cada uma das rés, referidos em 32º,

35º- Em Dezembro de 2011 foi registado um aumento de capital da A... no valor de 27 750 000€, parte em dinheiro (6 000 000€) e parte em reservas livres (21 750 000€), passando a A... a ter um capital social de 30 000 000€ representado por 6 000 000 de acções de valor nominal de 5€ cada.

36º- Em Dezembro de 2012, foi registado um aumento de capital da A..., no montante de 6000 000€, em dinheiro e por subscrição dos accionistas, passando a A... a ter um capital social de 36 000 000€, representado por 7 200 000 acções de valor nominal de 5€ cada.

37º- A E... apresentou pedido de Gestão Controlada em 22/07/2014 e, posteriormente, em 27/10/2014 foi declarada insolvente.

38º- Ao contrário do que sucedeu até então, a E... não procedeu aos pagamentos dos floating amount que se venceram em 01/09/2014 nem os subsequentes nem pagou os equity amount, de 17 5000€ a cada ré na data de 01/12/2014.

39º- Face à falta de pagamento dos floating amount pela E..., as rés por carta de 03/09/2014 declararam junto do autor que não iriam proceder ao pagamento dos juros dos financiamentos vencidos nesse dia.

40º- Em 27/04/2014, a E...G apresentou pedido de Gestão Controlada e, posteriormente, por decisão de 10/10/2014, foi declarada insolvente.

41º- Em 10 de Julho de 2014, havia sido suspensa a negociação de acções e título da E...G.

42º- Por cartas de 28 de Julho de 2014, O BES notificou cada uma das rés para que procedessem à entrega de acções representativas do capital social da A..., decorrentes dos aumentos de capital de 2011 e de 2012 referidos em 35º.

2.3. - A complexa negociação da operação económica - coligação contratual e a excepção do não cumprimento no quadro da Medida de Resolução

Por sentença proferida em 24/04/2018, o Juízo Central Cível de ... – Juiz ..., (1) julgou a ação parcialmente procedente, condenando-se as RR. a entregar ao A. as açcões representativas de 25% do capital social da A..., SA (A...), que resultaram dos aumentos de capital dessa sociedade em 2011 e em 2012, absolvendo-as quanto aos demais pedidos formulados e (2) julgou o pedido reconvencional parcialmente procedente, declarando que o A. não poderia executar o penhor de acções da sociedade A... enquanto se mantivesse justificada a recusa de cumprimento ao abrigo da excepção de não cumprimento.

O Novo Banco (NB) interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou a sentença da primeira instância.

A questão que se coloca na revista é a de saber se a invocação da excepção de não cumprimento pelas Rés perante o Novo Banco, com fundamento em incumprimento contratual por parte da E...(E...) dos contratos de SWAP celebrados com as Rés, implica, ainda que indiretamente, a responsabilização do Novo Banco por passivo excluído do perímetro de transferência fixado na decisão de resolução do Banco Espírito Santo (BES) ou por contingências desconhecidas, contrariando os objetivos que presidiram à medida de resolução do Banco Espírito Santo, em concreto, com o objetivo declarado de isolar o banco de transição de activos de má qualidade e de passivo relacionado com sociedades do Grupo Espírito Santo (GES).

Esta questão surge no seguimento do entendimento das instâncias no sentido de que os financiamentos em crise nos autos foram celebrados entre as sociedades do Grupo A..., SA (G...), aqui Rés, e o BES, por conta e no interesse deste último, tendo o BES assegurado às Rés inteira neutralidade financeira.

Na verdade, decorre da factualidade apurada que o BES assegurou às Rés que estas não teriam qualquer perda, nem qualquer ganho com os financiamentos contratados. Para o efeito, e por indicação do BES, foram celebrados contratos de SWAP entre as Rés e a E..., garantindo esta sociedade os fluxos financeiros necessários à cobertura dos custos associados com os referidos contratos de financiamento.

Os contratos de SWAP foram incumpridos, na sequência do pedido de gestão controlada da E... e posterior declaração de insolvência da E... o que determinou que as Rés comunicassem ao BES a sua intenção de não cumprir o contrato celebrado com o BES.

A coligação contratual

O critério para aferir da unidade ou pluralidade negocial, isto é, para se saber se há um ou mais contratos, implica um problema de metodologia jurídica, já que cabe à ordem jurídica determinar quando determinada formação contratual se apresenta, para determinados efeitos, como unitária ou plural. Nesta medida, partindo de elementos juspositivos, a doutrina civilista distingue o contrato misto da coligação ou união de contratos (cf., por x., Vaz Serra, BMJ 91, pág.11 e segs, Antunes Varela, Das Obrigações Em Geral, 2ª ed., pág.224).

No contrato misto há uma unidade contratual, um só negócio jurídico, cujos elementos essenciais respeitam a tipos contratuais distintos. Já na coligação existe uma pluralidade de contratos, ligados entre si por um nexo funcional, de tal modo que constituem uma unidade económica, embora cada um mantenha a sua individualidade própria. Mas dada a dependência recíproca ou unilateral, ambos os contratos se completam na obtenção da finalidade económica comum, e uma subordinação que implica que as vicissitudes de um se repercutam no outro.

O fenómeno da coligação negocial, perspectivado inicialmente segundo uma concepção atomística, ao pressupor uma pluralidade jurídica, com uma unidade económica funcional, autonomizando estruturalmente cada um dos contratos, produtores dos seus próprios efeitos, tem vindo actualmente a ser abordado através de uma “concepção unitária”. Isto significa, além do mais, que “ todas as normas e institutos dirigidos directa ou indirectamente ao conteúdo “económico” do contrato ( à avaliação económica das cláusulas, prestações ou obrigações, à avaliação económica do próprio contrato ou dos singulares contratos que compõem o complexo, à correlação económica de forças, aos equilíbrios e desequilíbrios económicos gerados em conclusão do contrato e no desenvolvimento da execução contratual, à própria utilidade ou inutilidade económica de sobrevivência autónoma de contratos singulares pertencentes ao complexo, etc. ) devem ser objecto de uma aplicação unitária”, embora não de forma mecânica, mas flexível (cf., Francisco Pereira Coelho, “Coligação Negocial e Operações Negociais Complexas”, Boletim da Faculdade de Direito, Volume Comemorativo, 2003, pág.209 e segs. , 255).

Uma das consequências desta nova concepção situa-se no âmbito da interpretação, integração negocial que deve atender ao conjunto de todos os elementos, de forma complexiva, bem assim em sede de incumprimento ou de excepção do não cumprimento.

Importa acentuar que a causa do negócio, enquanto função económico-social, é primordial na qualificação da coligação contratual, na medida em que estabelece uma unidade funcional da operação económica comum. Neste contexto, os contratos, individualmente considerados, são instrumentos para a efectivação de uma operação económica supracontratual, ou seja, na coligação existe uma finalidade económica que transcende a individualidade de cada contrato e que consubstancia a razão de ser da conexão.

As instâncias qualificaram a operação económica complexa como de contratos coligados ou de coligação contratual, com proficiente argumentação, que aqui se acolhe, substancialmente enriquecida com os pareceres dos Professores CC e EE (juntos ao processo).

Podemos decompor nos seguintes contratos individualizados:

1.- contrato de financiamento de 50 milhões de euros pelo BES (mutuante) ao Banco Invest (mutuário);

2. Quatro contratos de financiamento entre o BES (mutuante) e cada uma das Rés (mutuárias), no valor global de 50 milhões de euros. Sendo 12,5 milhões pada cada uma das Ré (em 4/12/2008);

3.- Aquisição por cada uma das Rés de 1.243.000 acções da E...G

4. quatro contratos de Swap celebrados, em 23/1/2009, entre a E... e cada uma das Rés, sendo que cada um reporta-se a 1.243.000 acções E...G, em que o equity notional mount de 12,5 milhões.

Perante a factualidade apurada, sobressai, desde logo, o papel central do BES na definição da operação económica complexiva. Na verdade, os contratos de financiamento celebrados entre o BES e cada uma das Rés foram gizados unilateralmente pelo BES, com vista à aquisição de acções da E...G, condição imposta para o financiamento ao Banco Invest. De resto, as Rés não exerciam quaisquer direitos inerentes às acções da E...G e emitiram os instrumentos de representação a explicitar os direitos devoto na E...G segundo instruções do BES. Durante a negociação, estruturação e execução da Operação as Rés apenas contactaram com o BES.

Também os contratos de Swap entre a E... e cada uma das Rés foram delineados pelo BES com o objectivo de assegurar a neutralidade financeira dos contratos de financiamento e a aquisição por cada uma das Rés de acções da E...G. E os contratos de Swap visavam assegurar que o valor das vendas das ações da E...G suportaria o reembolso dos financiamentos e, se necessário, caso desvalorizassem face ao seu valor nocional, a E... entregaria a cada uma das Rés a diferença respetiva, bem como os custos contratuais e os encargos fiscais dos contractos de financiamento, de compra de ações e equity swaps; Note-se que os contratos de Swap nem sequer foram negociados pelas Rés, tendo sido o BES quem os promoveu, concebeu, elaborou as minutas e procedeu à recolha das assinaturas de todos os intervenientes nos contratos.

A sentença da 1ª instância, confirmada pela Relação, evidenciou os elementos inequívocos que concorrem para a coligação contratual em que se projectou a operação económica complexa, gizada pelo BES, ao discorrer que - “Na verdade, a relação temporal entre todos os contratos – todos na mesma ocasião – a relação funcional entre todos os contratos - de financiamento ao Banco Investe e A..., financiamento às rés, finalidade desse financiamento, ordens de compra das acções, equity swap, os mandatos de votação nas assembleias de accionistas da E...G, as entregas de dividendos sobre a E...G – a relação económica entre todos os contratos – com valores essencialmente iguais e os prazos de pagamento dos valores entre as várias partes ajustados de modo a que as entregas das rés ao autor coincidissem (diferença de três dias) com as entregas da E... às rés – a autoria/desenho dos contratos e as finalidades que visavam assegurar, designadamente a neutralidade dos cash flow e ausência de risco de variação das acções, permite afirmar que há uma interdependência e reciprocidade juridicamente relevantes entre os vários contratos”.

Pode concluir-se pela verificação de coligação contratual e, não tendo a E... cumprido o contrato de Swap , as Rés estão legitimadas a opor a excepção do não cumprimento do contrato perante o BES, pois a exceptio no quadro da coligação contratual é hoje admitida, sem controvérsia, tratando-se mesmo “de uma das manifestações da coligação negocial mais aceites pela doutrina” (…) e “sendo o fundamento próprio da exceptio a existência de uma relação de sinalagmaticidade entre duas obrigações, e podendo esta sinalagmaticidade existir nos quadros não de um mas vários contratos ( “estruturalmente”) diversos, não há naturalmente qualquer base para se negar a possibilidade de recurso à exceptio” ( II, loc cit., pág. 260).

E como é sabido, a excepção do não cumprimento do contrato tem o seu âmbito de aplicação nas obrigações sinalagmáticas, impondo que se tome em conta o princípio da boa fé e o apelo à ideia de abuso de direito ( arts.762 nº2 e 334 do Código Civil ), sendo comumente qualificada de excepção dilatória de direito material ou substantivo, excepção material porque fundada em razões de direito substantivo e dilatória por não excluir definitivamente o direito do autor, apenas o paralisa temporariamente

Importa notar que o recorrente não questiona as conclusões a que chega o Tribunal da Relação de Lisboa relativamente ao reconhecimento da existência de uma coligação entre os contratos de financiamento em que o Banco Espírito Santo (BES) foi parte e o contrato de swap em que foi parte a E... (E...). Considera, no entanto, que a excepção de não cumprimento não lhe pode ser oposta por força da Medida de Resolução, porque, além do mais, a responsabilização do BES pelas vicissitudes inerentes à execução do equity swap devem ser qualificados como “passivos excluídos” na Mediada de Resolução.

Porém, as instâncias sustentaram a “inseparabilidade dos direitos e obrigações inerentes à posição jurídica do autor nos contratos em causa em face da medida de resolução bancária do BES”, e este tópico é deveras importante, como se verá.

A Medida de Resolução do Banco de Portugal:

O Banco de Portugal é o banco central nacional (art. 102 da CRP), e integra o Sistema Europeu de Bancos Centrais (SEBC), estando sujeito aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu. Compete ao Banco de Portugal, nos termos da Lei nº 5/98 de 31/1/98 ( Lei Orgânica do Banco de Portugal (LOBP)), um conjunto de funções ( art.12), e independentemente dos poderes de supervisão financeira, compete também ao Banco de Portugal “ desempenhar as funções de autoridade de resolução nacional desempenhar as funções de autoridade de resolução nacional, incluindo, entre outros poderes previstos na legislação aplicável, os de elaborar planos de resolução, aplicar medidas de resolução e determinar a eliminação de potenciais obstáculos à aplicação de tais medidas, nos termos e com os limites previstos na legislação aplicável” ( art.17-A , introduzido pelo DL nº 142/2013 de 18/10).

O Banco de Portugal é uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, regulado pela Lei Orgânica (Lei nº5/98, de 31/1) pelos regulamentos adoptados em sua execução e, em tudo o que aí não estiver previsto, pela legislação que regula a actividade das instituições de crédito e sociedades financeiras (DL nº 298/92 de 31/12), pelas normais gerais de direito privado, ou pelas normas gerais de direito administrativo, quando actue no exercício de poderes de autoridade.

Dispõe o art.145-O do RGICSF (aprovado pelo DL n.º 298/92, de 31 de Dezembro, na redacção do DL n.º 31-A/2012, de 10 de Fevereiro) sob a epígrafe “Transferência parcial ou total da actividade para bancos de transição” que:

“1 - O Banco de Portugal pode determinar a transferência, parcial ou total, de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão de uma instituição de crédito para um ou mais bancos de transição para o efeito constituídos, com o objectivo de permitir a sua posterior alienação a outra instituição autorizada a desenvolver a actividade em causa.

2 - O Banco de Portugal pode ainda determinar a transferência, parcial ou total, dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão de duas ou mais instituições de crédito incluídas no mesmo grupo para um ou mais bancos de transição, com a mesma finalidade prevista no número anterior.

3 - O banco de transição é uma instituição de crédito com a natureza jurídica de banco, cujo capital social é totalmente detido pelo Fundo de Resolução.

4 - O capital social do banco de transição é realizado pelo Fundo de Resolução com recurso aos seus fundos.

5 - O banco de transição é constituído por deliberação do Banco de Portugal, que aprova os respectivos estatutos, não se aplicando o disposto no capítulo ii do título ii.

6 - Após a deliberação prevista no número anterior, o banco de transição fica autorizado a exercer as actividades previstas no n.º 1 do artigo 4.º

7 - O banco de transição deve ter capital social não inferior ao mínimo previsto por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, ouvido o Banco de Portugal, e cumprir as normas aplicáveis aos bancos.

8 - O banco de transição pode iniciar a sua actividade sem prévio cumprimento dos requisitos legais relacionados com o registo comercial e demais procedimentos formais previstos por lei, sem prejuízo do posterior cumprimento dos mesmos no mais breve prazo possível.

9 - O Banco de Portugal define, por aviso, as regras aplicáveis à criação e ao funcionamento dos bancos de transição.

10 - O Código das Sociedades Comerciais é aplicável aos bancos de transição, com as adaptações necessárias aos objectivos e à natureza destas instituições.

11 - Compete ao Banco de Portugal, sob proposta da comissão directiva do Fundo de Resolução, nomear os membros dos órgãos de administração e de fiscalização do banco de transição, que devem obedecer a todas as orientações e recomendações transmitidas pelo Banco de Portugal, nomeadamente relativas a decisões de gestão do banco de transição.

12 - O banco de transição tem uma duração limitada a dois anos, prorrogável por períodos de um ano com base em fundadas razões de interesse público, nomeadamente se permanecerem riscos para a estabilidade financeira ou estiverem pendentes negociações com vista à alienação dos respectivos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob a sua gestão, não podendo exceder a duração máxima de cinco anos.

13 - O banco de transição deve obedecer, no desenvolvimento da sua actividade, a critérios de gestão que assegurem a manutenção de baixos níveis de risco.

14 - A transferência, parcial ou total, de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão de uma instituição de crédito para um ou mais bancos de transição para o efeito constituídos é comunicada à Autoridade da Concorrência, bem como a eventual prorrogação do prazo previsto no n.º 12, mas atendendo à sua transitoriedade não consubstancia uma operação de concentração de empresas para efeitos da legislação aplicável em matéria de concorrência”.

O art. 145.º-H do RGICSF, subordinado ao título “Património e financiamento do banco de transição”, determina:

“1 - O Banco de Portugal selecciona os activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão a transferir para o banco de transição no momento da sua constituição.

2 - Não podem ser transferidas para o banco de transição quaisquer obrigações contraídas pela instituição de crédito originária perante:

(…)

4 - Os activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão seleccionados nos termos do n.º 1 devem ser objecto de uma avaliação, reportada ao momento da transferência, realizada por uma entidade independente designada pelo Banco de Portugal, em prazo a fixar por este, a expensas da instituição de crédito.

5 - Após a transferência prevista no n.º 1, o Banco de Portugal pode, a todo o tempo:

a) Transferir outros activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão da instituição de crédito originária para o banco de transição;

b) Transferir activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do banco de transição para a instituição de crédito originária.

(…)

9 - Após a transferência prevista no n.º 1, deve ser garantida a continuidade das operações relacionadas com os activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão transferidos, devendo o banco de transição ser considerado, para todos os efeitos legais e contratuais, como sucessor nos direitos e obrigações transferidos da instituição de crédito originária.

(…)

11 - A decisão de transferência prevista no n.º 1 produz efeitos independentemente de qualquer disposição legal ou contratual em contrário, sendo título bastante para o cumprimento de qualquer formalidade legal relacionada com a transferência.

12 - A decisão de transferência prevista no n.º 1 não depende do prévio consentimento dos accionistas da instituição de crédito nem das partes em contratos relacionados com os activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão a transferir, não podendo constituir fundamento para o exercício de qualquer direito de vencimento antecipado estipulado nos contratos em causa.

(…)”

Artigo 145.º-O (“Transferência parcial ou total da atividade para instituições de transição”)

1 - O Banco de Portugal pode determinar a transferência parcial ou total de direitos e obrigações de uma instituição de crédito, que constituam ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão, e a transferência da titularidade das ações ou de outros títulos representativos do seu capital social para instituições de transição para o efeito constituídas, com o objetivo de permitir a sua posterior alienação.

2 - O Banco de Portugal pode ainda determinar a transferência parcial ou total de direitos e obrigações de duas ou mais instituições de crédito incluídas no mesmo grupo e a transferência da titularidade de ações ou de outros títulos representativos do capital social de instituições de crédito incluídas no mesmo grupo para instituições de transição, com a mesma finalidade prevista no número anterior.

3 - A instituição de transição é uma pessoa coletiva autorizada a exercer as atividades relacionadas com os direitos e obrigações transferidos.

4 - A instituição de transição assegura a continuidade da prestação de serviços financeiros inerentes à atividade transferida, bem como a administração dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais, ativos sob gestão e ações ou outros instrumentos de propriedade transferidos nos termos do disposto nos n.os 1 e 2, com vista à valorização do negócio desenvolvido, procurando proceder à sua alienação, logo que as circunstâncias o aconselhem, em termos que maximizem o valor do património em causa.

5 - A decisão de transferência prevista nos n.os 1 e 2 produz, por si só, o efeito de transmissão da titularidade dos direitos e obrigações da instituição de crédito objeto de resolução para a instituição de transição, sendo esta considerada, para todos os efeitos legais e contratuais, como sucessora nos direitos e obrigações transferidos.

6 - A eventual transferência parcial dos direitos e obrigações para a instituição de transição não deve prejudicar a cessão integral das posições contratuais da instituição de crédito objeto de resolução, com transmissão das responsabilidades associadas aos elementos do ativo transferidos, nomeadamente no caso de contratos de garantia financeira, de operações de titularização ou de outros contratos que contenham cláusulas de compensação e de novação.

7 - A decisão de transferência prevista nos n.os 1 e 2 produz efeitos independentemente de qualquer disposição legal ou contratual em contrário, sendo título bastante para o cumprimento de qualquer formalidade legal relacionada com a transferência.

(…)

Preceitua o art.145-Q (Património e financiamento da instituição de transição)

1 O Banco de Portugal seleciona os direitos, obrigações e outros títulos representativos do capital social da instituição de crédito objecto de resolução a transferir para a instituição de transição no momento da sua constituição

(…)

4. Após a transferência previstas nos nºs 1 e 2 do artigo 145 -O, o Banco de Portugal pode, a todo o tempo:

(…)

c) Devolver à instituição de crédito objecto de resolução direitos e obrigações que haviam sido transferidos para a instituição de transição ou devolver a titularidade de acções ou títulos representativos do capital social da instituição de crédito objecto de resolução aos respectivos titulares no momento da deliberação prevista no nº1 do artigo 145 -P, não podendo a instituição de crédito objecto de resolução ou aqueles titulares opor-se a essa devolução, desde que estejam reunidas as condições previstas no número seguinte.

(…)”

O Aviso do Banco de Portugal nº 13/2012, de 8 de Outubro de 2012, veio estabelecer “as regras necessárias à criação e ao funcionamento de bancos de transição” , estipulando o art.2 nº1 ( “Regime dos bancos de transição” ) que “os bancos de transição são instituições de crédito com duração limitada, com a natureza jurídica de banco e a forma de sociedade anónima, que se regem pelos estatutos aprovados por deliberação do Banco de Portugal, pelas disposições legais e regulamentares que lhes são especialmente aplicáveis, pelas normas aplicáveis aos bancos e, subsidiariamente, pelo Código das Sociedades Comerciais, com as adaptações necessárias aos objetivos e natureza destas instituições”. E diz o nº3 que “Os bancos de transição são criados para receberem e administrarem a totalidade ou parte dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão de uma instituição originária, desenvolvendo todas ou parte das atividades dessa instituição com vista à prossecução das finalidades enunciadas no artigo 145.º-A do RGICSF”.

O Banco de Portugal, emitiu as Deliberações de 3 de Agosto de 2014, de 11 de Agosto de 2014 e de 29 de Dezembro de 2015.

Na Deliberação de 3 de Agosto de 2014, determinou:

“A criação de um banco para o qual é transferida a totalidade da actividade prosseguida pelo Banco Espírito Santo SA., bem como um conjunto dos seus activos e passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão”, mostra-se como a única medida que garante a continuidade da prestação dos seus serviços financeiros.

O Conselho de Administração do Banco de Portugal deliberou o seguinte

«Ponto Um

Constituição do Novo Banco, SA

É constituído o Novo Banco, SA, ao abrigo do n.º 5 do artigo 145.º-G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, cujos Estatutos constam do Anexo 1 à presente deliberação.

Ponto Dois

Transferência para o Novo Banco, SA, de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco Espírito Santo, SA

São transferidos para o Novo Banco, SA, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 145.º-H do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei nº 298/92, de 31 de Dezembro, conjugado com o artigo 17.º-A da Lei Orgânica do Banco de Portugal, os ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco Espírito Santo, SA, que constam dos Anexos 2 e 2A a presente deliberação».

No Anexo 2 à deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014 que determinou a transferência de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do “Banco Espírito Santo, SA.”, para o “Novo Banco, SA.”, mencionam-se os critérios para a referida transferência:

Na deliberação de 11 de Agosto de 2014 procedeu-se a ajustamentos e clarificações da deliberação de 3 de Agosto de 2014.

O Banco de Portugal, tomou nova Deliberação em 29 de Dezembro de 2015, que visou clarificar a anterior de 3 de Agosto de 2014.

Segundo a versão consolidada das deliberações do Banco de Portugal, os activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco Espírito Santo, S.A. (BES), registados na contabilidade, foram transferidos para o Novo Banco, S.A. de acordo com os seguintes critérios:

a) Todos os ativos, licenças e direitos, incluindo direitos de propriedade do BES foram transferidos, salvo as exceções lista das nas subalíneas (i) a (vii) da alínea (a) do n.º 1 do Anexo 2 da Deliberação.

b) “As responsabilidades do BES perante terceiros que constituam responsabilidades ou elementos extrapatrimoniais deste são transferidos na sua totalidade para o Novo Banco, SA, com exceção dos seguintes (“Passivos Excluídos”):

i) Passivos para com (a) os respetivos acionistas, cuja participação seja igual ou superior a 2% do capital social ou por participação igual ou superior a 2% do capital social do BES, membros dos órgãos de administração ou de fiscalização, revisores oficiais de contas ou sociedades de revisores oficiais de contas ou pessoas com estatuto semelhante noutras empresas que se encontrem em relação de domínio ou de grupo com a instituição, (b) as pessoas ou entidades que tenham sido acionistas, exercido as funções ou prestado os serviços referidos na alínea anterior nos quatro anos anteriores à criação do Novo Banco, SA, e cuja ação ou omissão tenha estado na origem das dificuldades financeiras da instituição de crédito ou tenha contribuído para o agravamento de tal situação; (c) os cônjuges, parentes ou afins em 1.º grau ou terceiros que atuem por conta das pessoas ou entidades referidos nas alíneas anteriores (d) os responsáveis por factos relacionados com a instituição de crédito, ou que deles tenham tirado benefício, diretamente ou por interposta pessoa, e que estejam na origem das dificuldades financeiras ou tenham contribuído, por ação ou omissão no âmbito das suas responsabilidades, para o agravamento de tal situação, no entender do Banco de Portugal;

ii) Obrigações contraídas perante entidades que integram o Grupo Espírito Santo e que constituam créditos subordinados nos termos dos artigos 48.º e 49.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, com exceção das entidades integradas no Grupo BES cujas responsabilidades perante o BES foram transferidas para o Novo Banco, sem prejuízo, quanto a estas entidades, da exclusão prevista na subalínea (v);

iii) Obrigações contraídas ou garantias prestadas perante terceiros relativamente a qualquer tipo de responsabilidades de entidades que integram o Grupo Espírito Santo, com exceção das entidades integradas no Grupo BES cujas participações sociais tenham sido transferidas para o Novo Banco, SA;

iv) Todas as responsabilidades resultantes da emissão de instrumentos que sejam, ou em algum momento tenham sido, elegíveis para o cômputo dos fundos próprios do BES e cujas condições tenham sido aprovadas pelo Banco de Portugal;

v) Quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, fiscais, penais ou contraordenacionais, com exceção das contingências fiscais ativas;

vi) Quaisquer responsabilidades ou contingências do BES relativas a ações, instrumentos ou contratos de que resultem créditos subordinados perante o Banco Espírito Santo, S.A.;

vii) Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira, processo de contratação e distribuição de instrumentos financeiros emitidos por quaisquer entidades, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados, cuja posição devedora não seja excluída por alguma das subalíneas anteriores, designadamente as subalíneas (iii) e (v), que (a) fossem exigíveis à data da medida de resolução em virtude de o respetivo prazo já se ter vencido ou, sendo os créditos condicionais, em virtude de a condição (desde que apenas desta dependesse o respetivo vencimento) já se ter verificado, e cumulativamente (b) resultassem de estipulações contratuais (negócios jurídicos bilaterais) anteriores a 30 de junho de 2014, que tenham cumprido as regras para a expressão da vontade e vinculação contratual do BES e cuja existência se possa comprovar documentalmente nos arquivos do BES, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas.

viii) Com efeitos a partir de 29 de dezembro de 2015, todos os direitos e responsabilidades do Novo Banco, decorrentes dos instrumentos de dívida não subordinada enumerados no Anexo 2B (excluindo os detidos pelo Novo Banco), juntamente com todos os passivos, contingências e elementos extrapatrimoniais, na medida em que estejam relacionados com os referidos instrumentos de dívida (incluindo (i) a emissão, comercialização e venda dos mesmos, e (ii) decorrentes de documentos contratuais ou outros instrumentos, celebrados ou emitidos pelo banco, e com conexão com esses instrumentos, incluindo documentos de programa ou subscrição, ou quaisquer outros atos do banco praticados em relação a esses instrumentos, em data anterior, simultânea ou posterior à data das respetivas emissões);

ix) A Responsabilidade Oak Finance.”

Sendo este o quadro legal da Medida de Resolução, releva aqui a norma do artº 145º O, nº 6, do DL nº 298/92, de 31/12, na redacção dada pelo DL nº 31-A/2012 (RGICSF), que adaptou a Directiva 2014/59/EU, do Parlamento e do Conselho, relativa ao enquadramento para recuperação e resolução de instituições de crédito que, em cujo considerando 95 ser declara- “A fim de preservar os acordos legítimos do mercado de capitais em caso de transferência de uma parte, mas não da totalidade, dos ativos, direitos e passivos de uma instituição em situação de insolvência, importa incluir salvaguardas para evitar a divisão de passivos, direitos e contratos associados entre si, conforme o caso. Essa restrição a determinadas práticas no que respeita aos contratos associados entre si deve ser alargada aos contratos com uma mesma contraparte abrangidos por acordos de garantia, acordos de garantia financeira com transferência de titularidade, convenções de compensação recíproca, convenções de compensação e de novação com vencimento antecipado (close-out netting agreements) e acordos de financiamento estruturado. Sempre que as salvaguardas forem aplicadas, as autoridades de resolução devem ter a obrigação de transferir todos os contratos associados no âmbito de um acordo com garantias ou de manter todos esses contratos na instituição remanescente em situação de insolvência. Estas salvaguardas deverão garantir que não seja afetado o tratamento em termos de requisitos de capital regulamentar das exposições cobertas por um uma convenção de compensação e de novação (netting agreement) para efeitos da Diretiva 2013/36/UE.

Esta Directiva estabelece salvaguardas para as transferências parciais no artº 76º nº 2 ao determinar mesmo formas de protecção adequadas aos acordos

“2. Os Estados-Membros asseguram uma proteção adequada dos seguintes acordos e das contrapartes nos mesmos:

a) Acordos de garantia nos termos dos quais o credor que recebeu a garantia tem um direito real ou potencial sobre ativos ou direitos que estão sujeitos a transferência, independentemente de essa garantia incidir sobre ativos ou direitos específicos ou constituir uma garantia flutuante (floating charge) ou mecanismo similar;

b) Acordos de garantia financeira com transferência de titularidade ao abrigo dos quais a garantia destinada a assegurar ou cobrir o cumprimento de obrigações específicas é fornecida por uma transferência da plena propriedade dos ativos do prestador da garantia para o beneficiário da garantia, devendo o beneficiário da garantia transferir ativos se as obrigações específicas forem cumpridas;

c) Convenções de compensação nos termos dos quais dois ou mais créditos ou obrigações entre a instituição objeto de resolução e uma contraparte podem ser compensados entre si;

d) Convenções de compensação e de novação;

e) Obrigações cobertas;

f) Acordos de financiamento estruturado, incluindo titularizações e instrumentos utilizados para efeitos de cobertura de risco que fazem parte integrante da garantia global (cover pool) e que, de acordo com o direito nacional, estão garantidos de forma idêntica às obrigações cobertas, que envolvem a entrega e conservação das garantias por uma parte no acordo ou por um administrador fiduciário, mandatário ou pessoa por ela designada.

A forma de proteção adequada no que respeita às classes de acordos especificadas nas alíneas a) a f) do presente número é especificada em maior detalhe nos artigos 77º a 80º e fica sujeita às restrições especificadas nos artigos 68º a 71º.”

E o legislador nacional adoptou essas salvaguardas em relação aos contratos de financiamento estruturado, contratos de garantia financeira, convenções de compensação e de novação, garantias reais das obrigações nos artºs 145º-AC, 145º-AD e 145º-AE do RGICSF.

No seu Parecer, o Prof CC defendendo este argumento, escreve o seguinte:

“O que o legislador veio fazer, no originário artigo 145.º-H, n.º 13, do RGICSF, e bem assim no seu sucessor 145.º-O, n.º 6, foi justamente estabelecer uma regra de salvaguarda desta complexidade contratual – consubstanciada na proibição da cisão indiscriminada entre ativos e responsabilidades entre si associadas. Ou, dito de uma forma mais direta: veio estabelecer uma regra de respeito pelas relações de sinalagmaticidade complexa e de acessoriedade que podem caracterizar um complexo contratual. Fê-lo como forma de proteger os créditos envolvidos, assim garantindo que nenhum credor é chamado a suportar um prejuízo superior àquele que corresponde ao risco por si assumido através da concreta conformação de um sinalagma ou nexo de correspetividade (ou de outro nexo, como o de condicionamento), tal como ele ocorrera nas relações negociais entre ele e a instituição bancária.

Deve, aliás, entender-se que, se o legislador teve em conta a necessidade de salvaguardar os nexos de sinalagmaticidade complexa e de acessoriedade (como nos referidos casos de contratos de garantia financeira, de operações de titularização ou de outros contratos que contenham cláusulas de compensação ou de novação, dados como exemplos de limite à cisão de responsabilidades associadas aos elementos do ativo transferidos), por maioria de razão não pretendeu excluir dessa salvaguarda outros nexos de sinalagmaticidade menos complexa, nem tão-pouco a própria relação jurídica unitária que podemos vislumbrar numa verdadeira operação económica complexa, como a que vimos analisando. Daí resulta que, identificado por nós o nexo funcional que desde o início caracteriza (geneticamente) e acompanha (condicional e funcionalmente) a relação contratual entre a Autora e as Rés, não podem os ativos a que correspondem os créditos pelos financiamentos às Rés ser transferidos, do BES para a Autora, sem que a integralidade da relação sinalagmática seja em simultâneo respeitada: isto é, sem que com esses ativos sejam igualmente transferidas as responsabilidades a eles associadas, que correspondem aos montantes devidos às Rés, e não pagos, no quadro dos Contratos de Swap.”

Neste sentido, já se pronunciou o STJ no Ac de 31/2/2022 ( relator Cura Mariano ) , proc nº 22793/19, disponível em www dgsi, para quem “ A cláusula genérica de exclusão de transmissão de responsabilidades contingentes e desconhecidas para o Novo Banco ( referida no nº6 do art.145-O do RGICSF ) deva ser interpretada à luz da limitação do poder do Banco de Portugal nas transmissões parciais, considerando-se que a mesma não abrange a exclusão de transmissão das responsabilidades inseridas num contrato ou em complexos contratuais em que a posição nele assumida pelo BES transitou para o Novo Banco”.

Pode concluir-se que a lei consagra a inseparabilidade entre os activos do BES e as responsabilidades associadas às relações contratuais coligadas, como as que aqui estão em causa.

A excepção do não cumprimento e a violação da Medida de Resolução:

A Medida de Resolução do Banco Espírito Santo (BES) visou prevenir a interrupção apressada da atividade do BES, dada a sua importância sistémica, bem como impedir os efeitos nefastos decorrentes de tal interrupção ao nível das poupanças, na confiança do público, no sistema bancário e na economia.

Para o efeito, o Banco de Portugal (BdP) criou um banco de transição – Novo Banco (NB) – visando a continuidade da atividade bancária até então desempenhada pelo BES, expurgando-o do que denominou de ativos de má qualidade e de passivo relacionado com a atividade do Grupo Espírito Santo (GES).

A delimitação clara e exaustiva do conjunto de passivos transmitidos e não transmitidos (perímetro de transferência), foi determinada pela necessidade imperiosa de calcular o montante necessário de capital para a atividade do Novo Banco, no sentido de que era necessário saber o que havia para pagar, evitando a criação de incertezas no balanço do NB. De resto, foi na sequência do cálculo do passivo transmitido que se chegou ao montante do capital com que aquele banco foi, inicialmente, dotado (cfr. Pontos 14 da Deliberação do Conselho de Administração do BdP tomada em 29.12.2015 – “contingências”).

Dito isto, a expressão “exposição do BES ao GES” deve ser lida e interpretada no sentido de que o BES era titular de créditos sobre empresas do grupo, em regra decorrentes de financiamentos excessivos concedidos a estas mesmas entidades (cf. considerandos n.ºs 6 e 7, da Deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal, de 11 de agosto de 2014) em violação de determinações do BdP, e não da concessão de crédito a terceiros não relacionados.

Esse objectivo encontra-se, em coerência, plasmado na resolução do Banco de Portugal, sendo de destacar a exclusão do perímetro de transferência de quaisquer créditos detidos sobre sociedades do GES e quaisquer obrigações ou garantias prestadas a terceiros relativamente a obrigações de sociedades integradas no GES (Cfr. Ponto 1. a) e b), (ii) e (iii) do anexo à deliberação do Conselho de Administração do BdP, tomada em 11.08.2014).

Vejamos se a interpretação dispensada pela primeira instância e depois pelo Tribunal da Relação importa a exposição do NB a responsabilidades emergentes da atividade levada a cabo por entidades que integram o GES.

No caso dos autos, a factualidade apurada sugere que os negócios em análise visaram contornar as exigências da supervisão tendo o BES, com tal desenho contratual, logrado injetar dinheiro na E...G. Fê-lo, pois, utilizando as RR. como meras intermediárias.

Na verdade, caso fosse considerado apenas o fluxo financeiro entre o BES e a E...G, certamente tais activos teriam sido classificados como activos de má qualidade (financiamento concedido a entidades do grupo GES) e teriam permanecido na esfera do BES.

Sucede que a natureza, aparentemente, autónoma dos contratos determinou que tais créditos fossem transmitidos ao NB, sendo certo que o BdP não tinha, à data da medida de resolução, quaisquer elementos palpáveis que permitissem concluir pela ligação entre os contratos em discussão nos autos, algo que apenas foi constatado em sede de sentença proferida pela primeira instância.

De facto, aparentemente, o negócio celebrado entre o BES e as RR. reconduz-se a um simples financiamento, pelo que a sua transferência para o NB sempre seria inevitável no quadro da medida de resolução. Ora, em face da factualidade provada, sabemos hoje que tal não corresponde à realidade, havendo, por esse motivo, que apreciar o quadro contratual na sua globalidade.

Dito isto, cumpre analisar os contratos celebrados entre o BES e as RR., por um lado, e entre as RR. e a E..., por outro.

Por força das decisões proferidas pelas instâncias quanto à existência de uma situação de coligação de contratos, a estrutura contratual desenhada em causa nos autos contém em si mesma um feixe de direitos e obrigações recíprocas, tendo ficado patente que, naquele quadro contratual, as RR. apenas teriam de pagar ao BES após a realização do pagamento por parte da E..., no âmbito dos contratos de SWAP. Neste particular salienta-se que, no âmbito dos contratos de SWAP, foi fixado como prazo de pagamento três dias úteis antes do termo do prazo para pagamento estipulado no âmbito dos contratos de financiamento, o que é particularmente revelador da ligação entre ambos os contratos.

A reciprocidade de direitos e obrigações não altera, em todo o caso, a natureza de uns e outras, sendo evidente que o BES era titular de um direito de crédito em relação às Rés que, por sua vez, eram titulares de um direito de crédito em relação à E...; a E... estava, por seu turno, adstrita a uma obrigação perante as Rés.

Como é evidente, a Medida de Resolução bancária em análise incidiu sobre direitos e obrigações do BES, única entidade objecto de resolução, razão pela qual o direito de crédito das RR. em relação à E... e a correspondente obrigação da E... em relação às RR. não foram tidas nem achadas pelo BdP aquando da definição do perímetro de transferência.

Assim, as Rés permaneceram titulares de um direito de crédito sobre a E... e esta permaneceu devedora daquelas.

Deste modo, não faz sentido discutir a responsabilização do BES pela obrigação da E..., pois que no quadro contratual a que se fez referência o BES não prestou nenhuma garantia de cumprimento da obrigação da E..., nem assumiu a obrigação da E... como sendo sua.

Ademais, como bem salientou o Tribunal da Relação de Lisboa, o BES não assumiu a qualidade de intermediário financeiro, nem qualquer responsabilidade relativamente à comercialização de instrumentos de dívida. Não se está perante, outrossim, qualquer investimento das RR., no quadro da sua relação directa com o BES.

O BES celebrou com as RR. um contrato de financiamento simples. Inexiste, neste quadro, qualquer responsabilidade do BES, contingente ou não, emergente da atividade de entidades do GES que pudesse ter sido transferido para o NB.

Impõe-se analisar se a invocação da excepção de não cumprimento contraria a medida de resolução do BdP, expondo o NB a perdas relacionadas com a atividade de entidades do GES.

Tal situação não se encontra prevista na medida de resolução do BdP. Contudo, não há qualquer lacuna, que, de resto, nunca poderia ser resolvida com recurso a analogia, dada a natureza excepcional das normas emitidas pelo BdP (cf., por ex., Ac STJ de 19/6/2018 (Relator Fonseca Ramos), proferido no proc n.º 18860/16.1T8LSB-A. L1.S2 em www dgsi), pois que a delimitação levada a cabo pelo BdP foi exaustiva e completa.

De facto, cumpre salientar que a medida de resolução elencou a título de passivo, obrigações que importavam para o BES a realização de uma prestação em benefício de uma contraparte, quer como devedor principal, quer como garante de obrigações de terceiro. Na verdade, apenas tais obrigações poderiam ser contabilizadas no respetivo balanço como passivo, tendo sido as únicas visadas pelo BdP, aquando da definição o perímetro de transferência. A delimitação foi, pois, cirúrgica.

Tal circunstância convoca a ideia de obrigação stricto sensu, i. e., obrigação com deveres primários de prestação, sendo evidente que, no âmbito da medida de resolução, se visou abranger apenas os deveres de prestação a que o BES se encontrava, à data, adstrito em relação a terceiros.

Se assim é, não faz sentido discutir se a “excepção de não cumprimento” foi transmitida ou não para o NB, porquanto não se trata de passivo a ser excluído ou, dito de outro modo, a sua invocação não impõe ao NB a realização de quaisquer disposições patrimoniais em benefício de outrem, donde resulta que a sua invocação não importa a responsabilização do NB pela atividade de entidades integradas no GES.

A exceptio é um meio de defesa destinado a assegurar o respeito pelo princípio do cumprimento simultâneo, pelo que a condenação do réu fica subordinada à condição de cumprimento por parte do autor; uma vez feito o cumprimento pelo autor, dispensa-se uma nova acção a pedir a condenação do réu, ficando desde logo o autor com uma sentença que o legitima a tornar efectiva a obrigação do réu; a aplicação analógica do art.662 do CPC. Nesta medida, o direito de crédito do BES/NB não sofre qualquer alteração por força da invocação da excepção de não cumprimento. Permanece, pois, na sua esfera jurídica intacto, ainda que, temporariamente, paralisado. Trata-se de um meio de defesa/contradireito que emerge do princípio da boa-fé e que prossegue a dupla função de compelir ao cumprimento do contrato e de garantir esse cumprimento. Não se vê, pois, em que medida a sua invocação poderá implicar a responsabilização do NB.

Cumpre apreciar se tal excepção de não cumprimento (meio de defesa) podia, antes da medida de resolução, ser invocada pelas RR. em relação ao BES e, na afirmativa, se, após a medida de resolução, pode ser invocada perante o NB.

A resposta à questão convoca a problemática da responsabilidade pela confiança e dos deveres de protecção.

Entre as duas modalidades clássicas de responsabilidade – obrigacional/ delitual -, existe um espaço para situações de responsabilidade que não se enquadram neste sistema dualista. É aqui que entra a chamada “responsabilidade pela confiança”, como “terceira via”, desenvolvida por determinado sector da doutrina alemã, destacando-se, de forma mais proeminente, o Prof. Claus Canaris.

A responsabilidade pela confiança situa-se no âmbito mais vasto da tutela jurídica das expectativas, cuja frustração da confiança de outrem é susceptível de conduzir à obrigação de indemnização, e não há um tratamento unitário e sistemático para a responsabilidade pela confiança, embora o Código Civil Português contenha apoios juspositivos, sendo o mais importante o constituído pela culpa in contrahendo (art.227), como responsabilidade sui generis, não tipicamente contratual, nem delitual. Tanto a culpa in contrahendo, como as situações de “auto-vinculação sem contrato” ou “acordos de facto”, em que existe uma solidariedade assumida, determinadas práticas negociais modernas (especialmente nos sectores bancários e comerciais) reclamam a intervenção da responsabilidade pela confiança. É precisamente a tutela da confiança que justifica a regra do art.227 do Código Civil onde se configura uma relação obrigacional sem dever primário de prestação, e que serve de arquétipo para a resolução de outros casos problemáticos ( Na doutrina portuguesa destacam-se as obras de João Baptista Machado, “ Tutela da Confiança e Venire Contra Factum Proprium “ e A Cláusula do Razoável, in Obra Dispersa, vol.I, 1991; Sinde Monteiro, “Responsabilidade Por Conselhos, Recomendações ou Informações”, 1989, e Carneiro da Frada, “Uma “Terceira Via” no Direito da Responsabilidade Civil?” 1997, e “Teoria da Confiança e Responsabilidade Civil”, 2004).

Os deveres de protecção, surgindo no contexto de um contrato, no âmbito da relação obrigacional complexa, distinguem-se do dever de prestar (dever primário de prestação) porque se destinam a proteger posições pessoais ou patrimoniais que possam ser afectadas no desenvolvimento e execução do contrato. São autónomos dos deveres de prestação, qualificados como deveres acessórios, verdadeiros “deveres de consideração”, e podem emergir sem que exista um dever de prestar, caso em que se está perante uma “relação obrigacional sem dever primário de prestação” (cf. Carneiro da Frada, Contratos e Deveres de Protecção, 1994, pág. 101 e segs.).

Ora, no caso dos autos, não é possível escamotear a circunstância de o BES ter garantido às Rés neutralidade financeira da operação ( cf. pontos 8, 9, 10 dos factos provados ) incutindo a confiança nas Rés de que não assumiriam quaisquer custos com a operação, situação que motivou a aceitação pelas Rés, e gerou na esfera jurídica do BES/NB um dever de proteção sem qualquer dever de prestação em relação às Rés e que torna razoável que se conclua pela eficaz invocação da excepção de não cumprimento.

E é inegável que este dever de protecção no quadro da relação contratual assente nos autos tem uma importância de tal ordem que torna legítima e proporcional a invocação da excepção de não cumprimento pelas RR. em relação ao BES/NB.

Neste contexto, a invocação da excepção de não cumprimento é admissível no quadro contratual em análise, não só força da existência de uma coligação de contratos, mas também, e em especial, por imperativo dos deveres de protecção (do património das Rés) que impendiam sobre o BES.

Por seu turno, evidencia-se que a violação é objectivamente grave, dado que as RR. apenas aceitaram o financiamento proposto porque o BES garantiu neutralidade financeira, ou seja, o interesse no negócio fundou-se naquela “garantia”, tendo o BES assumido o risco do negócio ou, melhor dizendo, o BES aceitou que só receberia mediante o pagamento da E... às RR.

Não se confunda esta “garantia” com a garantia prestada a terceiro por responsabilidade de entidades do GES prevista na medida de resolução. Trata-se antes de uma obrigação acessória, autónoma e própria do BES perante as RR. e não perante a E... ou outra sociedade do grupo. E, conforme já referido, esta obrigação, ainda que acessória e sem deveres primários de prestação, não foi excluída do perímetro de transferência, pelo que se considera que a mesma se encontra abrangida pela regra geral, nos termos da qual se determinou a transferência de todos os ativos, passivos e elementos extrapatrimoniais (cfr. Ponto 1, b), do Anexo à Deliberação do Conselho de Administração do BdP tomada em 29.12.2015).

Por outro lado, a Medida de Resolução não visou, nem poderia visar, a exclusão do perímetro de transferência de eventuais deveres de proteção sem deveres primários de prestação que, porventura, onerassem o BES, até porque não configuram, de per se, passivo, conhecido ou desconhecido, a contabilizar e, por esse motivo, a excluir. São deveres que emergem do princípio da boa-fé, não raras vezes não são reduzidos a escrito, como é o caso, e que podem gerar, quando muito, uma pretensão indemnizatória própria e exclusiva do BES/NB em relação às RR, e não uma responsabilidade do NB decorrente de entidades integradas no GES.

Pois bem, esse dever de protecção não poderá deixar de considerar-se um elemento extrapatrimonial transmitido para o NB, não tendo sido, de resto, excluído do perímetro de transferência, pelo que tem plena aplicação aqui a norma do nº6 do art.145 -O do RGICSF, sendo evidente que o legislador visou evitar o fracionamento do programa contratual que chocasse com os princípios gerais de direito contratual (cf. Mafalda Miranda Barbosa, Nótula a propósito do caso BES, pág. 87 e segs.).

E como se decidiu no Ac STJ de 18/1/2018 (Relator Roque Nogueira), proc nº18084/15., disponível em www dgsi - “Na verdade, nada na disciplina legal da medida de resolução obsta a que o regime privatístico seja convocado no quadro de actuação de uma instituição bancária objecto de uma medida de resolução (cfr. Mafalda Miranda Barbosa, in Boletim de Ciências Económicas, FDUC, vol. LIX, pág.104). Assim, podem ser impugnados negócios que se integrem no perímetro de transferência determinada pelo Banco de Portugal, desde que para isso haja fundamento. (…) Os deveres de esclarecimento e aconselhamento em relação ao potencial investidor emergem como uma decorrência da boa-fé, dependendo a sua intensidade das idiossincrasias do investidor. Como é evidente, os deveres de informação serão diferentes consoante os sujeitos envolvidos, requerendo especial atenção os investidores não qualificados, a quem deve ser prestada toda a informação necessária para proporcionar uma decisão de investimento esclarecida. (…) Poderá, assim, questionar-se um eventual direito a uma indemnização com fundamento em responsabilidade pela confiança, com base na prestação de informações incorrectas ou contraditórias, geradoras de uma confiança normativamente justificada.”.

A este propósito, Mafalda Miranda Barbosa deixou escrito que “A eficácia da medida de resolução fica dependente da capacidade que a entidade responsável pela sua aplicação tenha de poder conformar livremente o seu conteúdo. No tocante à transferência de parte dos ativos e passivo para uma instituição de transição, é fundamental que tal entidade possa selecionar com base da determinação do valor do passivo e do ativo os créditos e obrigações a transferir. Simplesmente, essa liberdade não é absoluta, devendo respeitar não só a teleologia do regime da resolução, como também os princípios normativos e a conformação das relações privadas que, antes da intervenção, se estabeleceram entre o banco e os diversos sujeitos que com ele interagiam” (Os Limites da medida de Resolução (Boletim de Ciências Económicas, Setembro de 2016).

Ora, o dever de assegurar a neutralidade financeira emerge como uma responsabilidade associada ao direito de crédito invocado pelo NB, sendo, de resto, dele indissociável em face da factualidade que resultou demonstrada. No entanto, para que não subsistam dúvidas, reitera-se que esta responsabilidade é própria e autónoma do BES/NB, fundando-se no dever de protecção, nos termos já mencionados, não emergindo de qualquer obrigação de uma entidade do GES, razão pela qual se rejeita o argumento de que que a invocação eficaz da excepção de não cumprimento importa uma responsabilização do NB por responsabilidades de entidades do GES.

Neste contexto, e em face do enquadramento contratual que resultou demonstrado, o NB não pode pretender apenas ser titular de um direito de crédito, fazendo tábua rasa de todas as negociações existentes entre as partes, negociações essas que não podem deixar de relevar para efeitos de criação de deveres de protecção entre as partes. Das duas uma: ou o NB se arroga titular do direito de crédito, aceitando os deveres de proteçção que para si emergem, ou não poderá comportar-se como sendo titular do direito de crédito, sob pena de claro abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.

Ainda que no limite a invocação da excepção de não cumprimento importe a existência de uma perda para o recorrente, a verdade é que tal perda não emerge da obrigação por parte do NB de pagamento a terceiros, mas tão só do eventual não recebimento de quantias.

Ora, não se pode ignorar que a transmissão de activos determinada pela Medida de Resolução consubstancia uma cessão da posição contratual, do que resulta que o NB assumiu a posição do BES naqueles contratos de financiamento.

Assim, há que salientar que o cedente não garante ao cessionário o cumprimento dos contratos, estando estes sujeitos às regras gerais, e, naturalmente, a vicissitudes. Deste modo, a transmissão de direitos de crédito para o NB não implica que este os venha a cobrar de todo ou na sua integralidade. Há sempre a possibilidade de perdas, sendo, de resto, tal circunstância conatural à atividade bancária.

De facto, ainda que cause estranheza a celebração de financiamentos bancários que não importem, no final do dia, custos para os mutuários, a verdade é que é esse o caso que nos ocupa. O BES propôs um negócio às RR. garantindo-lhes os fluxos financeiros necessários ao seu cumprimento, devendo o NB honrar o negócio celebrado.

Um banco de transição deve ser considerado como sucessor nos direitos e obrigações da instituição de crédito originária, no caso de os mesmos não terem sido excluídos da transferência deste para aquele, por Deliberação do Banco de Portugal, entidade competente para determinar essa medida de resolução (cf., por ex., Ac STJ de 26/9/2017 (Relatora Ana Paula Boularot), proc nº 3499/16, em www dgsi).

Sendo assim, e em face do explicitado, impõe-se a aplicação da regra do art.431 do CC, em que a excepção de não cumprimento é oponível aos que no contrato vierem a substituir qualquer dos contraentes nos seus direitos e obrigações.

Conclui-se, então, ser legal a invocação da excepção de não cumprimento pelas RR. em relação ao NB, sem que haja violação da Medida de Resolução.

Improcede a revista, confirmando-se o douto acórdão recorrido.

2.4. - Síntese Conclusiva

1. A excepção do não cumprimento do contrato (art.428 do Código Civil) tem o seu âmbito de aplicação nas obrigações sinalagmáticas, impondo que se tome em conta o princípio da boa fé e o apelo à ideia de abuso de direito (arts.762 nº2 e 334 do Código Civil), sendo admitida no quadro da coligação contratual, entendida segundo uma “concepção unitária”.

2. O art. 145.º-O, nº 6 do RGICSF (aprovado pelo DL nº 298/92, de 31/12, na redacção dada pelo DL nº 31-A/2012) estabelece uma regra de salvaguarda das relações de sinaglamaticidade compexa, como a da coligação contratual.

3. A Medida de Resolução do Banco de Portugal não excluiu do perímetro de transferência para o Novo Banco os deveres de protecção que cabiam ao BES inseridos numa relação obrigacional complexa.

4. O Novo Banco, como banco de transição, deve ser considerado como sucessor nos direitos e obrigações da instituição de crédito originária (Banco Espírito Santo) no caso de os mesmos não terem sido excluídos do perímetro de transferência por Deliberação do Banco de Portugal, traduzindo-se numa cessão da posição contratual, pelo que, nos termos do art.431 do Código Civil, a exceptio é oponível aos que no contrato vierem a substituir qualquer dos contraentes nos seus direitos e obrigações.


III – DECISÃO


Pelo exposto, decidem:

1)


Julgar improcedente o recurso e confirmar o acórdão recorrido.

2)


Condenar o recorrente nas custas.

Lisboa, Supremo Tribunal de Justiça, 27 de Fevereiro de 2024.

Jorge Arcanjo (Relator)

Manuel Aguiar Pereira

António Magalhães