Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
8781/15.0T8STB.E1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: CHAMBEL MOURISCO
Descritores: CADUCIDADE DO DIREITO DE APLICAR A SANÇÃO
DILIGÊNCIA DE INSTRUÇÃO
Data do Acordão: 11/09/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO – CESSAÇÃO DE CONTRATO DE TRABALHO / DESPEDIMENTO POR INICIATIVA DO EMPREGADOR / MODALIDADES DE DESPEDIMENTO / DESPEDIMENTO POR FACTO IMPUTÁVEL AO TRABALHADOR.
Doutrina:
-Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II, Situações Laborais Individuais, 6.ª Edição, Almedina, 839.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DO TRABALHO (CT): - ARTIGOS 356.º, N.º 5 E 357.º, N.ºS 1, 2 E 5.
CÓDIGO DE PROCESSO DO TRABALHO, APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º 480/99, DE 9 DE NOVEMBRO, E ALTERADO PELOS DECRETOS-LEIS N.ºS 323/2001, DE 17 DE DEZEMBRO, 38/2003, DE 8 DE MARÇO, 295/2009, DE 13 DE OUTUBRO, QUE O REPUBLICOU E LEI N.º 63/2013, DE 27 DE AGOSTO (CPT).
O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, NA VERSÃO CONFERIDA PELA LEI N.º 41/2013, DE 26 DE JUNHO.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 07-10-2010, PROCESSO N.º 887/07.6TTALM.L1.S1;
- DE 30-04-2013, PROCESSO N.º 1154/09.6TTLSB.L1.S1;
- DE 13-11-2013, PROCESSO N.º 196/12.9TTBRR.L1.S1;
- DE 12-01-2017, PROCESSO N.º 69/13.8TTLRS.L2.S1.
Sumário :
I - As diligências probatórias referidas no artigo 356.º, n.º 5, do Código do Trabalho, não se circunscrevem àquelas que o trabalhador haja requerido na sua resposta à nota de culpa, abrangendo quaisquer outras que, na sequência daquelas, o instrutor do processo entenda, oficiosa e justificadamente, promover.

II - Não consubstancia diligência probatória desnecessária o pedido de cópia do registo comercial de uma firma com a qual, segundo a empregadora, o trabalhador estaria a levar a cabo atividade concorrente, e que funciona no mesmo local de uma outra, da qual as testemunhas arroladas pelo trabalhador na sua resposta à nota de culpa são gerentes, pois é razoável concluir que essa diligência visou, no limite, aferir da credibilidade dos depoimentos das referidas testemunhas, inexistindo motivo válido ou bastante para a desconsiderar.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

                                                           I

1. AA intentou processo especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento contra BB, Lda, apresentando requerimento em formulário, nos termos do artigo 98.º-C do Código de Processo do Trabalho.

Frustrada a tentativa de conciliação na audiência de partes, o empregador apresentou o articulado motivador do despedimento, argumentando com a regularidade do procedimento disciplinar e com a existência de justa causa para o despedimento, sanção esta que sustenta ser proporcionada e adequada às infrações cometidas.

O trabalhador contestou invocando a caducidade do direito de aplicar a sanção de despedimento, a qual foi objeto de decisão em sede de despacho saneador, tendo sido declarada procedente e consequentemente declarado ilícito o despedimento do trabalhador, nos termos e para efeitos do disposto no art.º 389.º Código do Trabalho.

Prosseguiram os autos para conhecimento dos restantes pedidos deduzidos pelo trabalhador, que são os seguintes:

a) Diferenças salariais devidas em consequência da redução ilegal da sua retribuição base mensal, no valor global de € 52.756,20;

b) A quantia de € 2.850,00, relativa ao subsídio de Natal de 2012, bem como a quantia de € 311,60, a título de despesas de caixa cujos comprovativos foram devidamente entregues;

c) As quantias que deixou de receber desde 14/09/2015 até ao trânsito em julgado da sentença (retribuição e subsídios), tudo com referência à sua retribuição base à data do despedimento (€ 4.632,00 acrescida do respetivo subsídio de alimentação no valor mensal de € 150,26), deduzido da quantia paga em setembro de 2015, as quais, na presente data, ascendem a € 22.191,16;

d) Indemnização pelos danos causados devido à cessação da utilização da viatura automóvel que lhe estava atribuída, e nas condições que lhe estava atribuída, a fixar no valor mensal de € 400,00, e que na data em que o pedido foi formulado ascendia a € 1.600,00;

e) Indemnização pelos danos causados devido à cessação da utilização do telemóvel que lhe estava atribuído, e nas condições que lhe estava atribuído, a fixar no valor mensal de € 25,00, e que na data em que o pedido foi formulado ascendia a € 100,00;

f) Juros de mora sobre todas as quantias devidas, à taxa de 4% desde a data de vencimento de cada prestação até que ocorra o efetivo e integral pagamento;

g) A quantia de € 3.300,00, a título de danos não patrimoniais;

h) A declaração de ilicitude do seu despedimento e a condenação do empregador a pagar-lhe as retribuições de tramitação, bem como a indemnização de antiguidade.

2. O empregador interpôs recurso de apelação do despacho saneador na parte em que declarou caducado o direito de aplicar a sanção de despedimento, o qual subiu apenas com o que foi interposto da sentença final.

3. Os autos prosseguiram e procedeu-se a julgamento, tendo o trabalhador optado pela indemnização em substituição da reintegração.

4. Foi proferida sentença que decidiu:

- Julgar a ação parcialmente procedente, declarando o despedimento do trabalhador ilícito;

- Condenar o empregador a pagar ao trabalhador uma indemnização de antiguidade, correspondente a € 4.632,00 por cada ano completo ou fração de antiguidade, desde 05/09/2008 e até ao trânsito em julgado da decisão final do processo;

- Condenar o empregador a pagar ao trabalhador a remuneração base mensal de € 4. 632,00 + € 150,26 (subsídio de refeição), desde a data do despedimento (14.09.2015) e até ao trânsito em julgado da decisão final do processo, incluindo subsídios de férias e de Natal, deduzindo as importâncias referidas nas alíneas a) e c) do n.º 2 do art.º 390.º do Código do Trabalho, e bem assim com dedução do montante pago pelo empregador ao trabalhador de € 1.569,88, o que será liquidado no respetivo incidente, regulado nos artigos 358.º e seguintes do Novo Código de Processo Civil;

- Condenar o empregador a pagar ao trabalhador as diferenças salariais devidas em consequência da redução da retribuição base no montante de € 52.756,20;

- Condenar o empregador a pagar ao trabalhador a quantia de € 2.850,00, relativa a subsídio de Natal de 2012;

- Condenar o empregador a pagar ao trabalhador a quantia referente ao valor dos benefícios económicos que este último retirava das prestações em espécie pelo uso da viatura e do telemóvel, desde o 30.º dia anterior à data de propositura da ação até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal a proferir em sede de incidente de liquidação de sentença;

- Condenar o empregador a pagar ao trabalhador juros de mora, à taxa a que se refere o art.º 559.º n.º 1 do Código Civil, desde a data de trânsito em julgado da decisão final do processo, sobre as quantias devidas ao trabalhador, desde a liquidação, quanto às que resultarem da liquidação em execução de sentença;

- Condenar o empregador a pagar ao trabalhador a quantia de € 2.500,00 a título de indemnização de danos morais;

- Condenar as partes em custas na proporção do decaimento;

- Fixar à ação o valor de € 94.390,20, nos termos do art.º 98.º-P do Código de Processo do Trabalho.

5. Inconformada com a decisão proferida no despacho saneador e na sentença, o empregador interpôs recursos de apelação.

6. O Tribunal da Relação proferiu acórdão com o seguinte dispositivo:

“ Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção social do Tribunal da Relação de Évora em julgar:

I - Procedente a apelação incidente sobre o despacho que declarou a verificação da exceção de caducidade do direito de aplicar a sanção de despedimento e o declarou ilícito, revogar o despacho recorrido e julgar improcedente a exceção perentória da caducidade do direito da empregadora sancionar o trabalhador, devendo ser efetuada audiência de julgamento para produção de prova relativamente aos factos integradores da nota de culpa e defesa do trabalhador, proferindo-se, após, nova decisão que aplique o direito aos factos apurados e conforme o que se decidir quanto à licitude do despedimento, assim deverá apreciar e decidir os pedidos que pressupõem esta apreciação prévia.

II – Parcialmente procedente a apelação da sentença e revogá-la na parte em que condenou a ré:

a) A pagar ao A. uma indemnização de antiguidade, correspondente a € 4.632,00 por cada ano completo ou fração de antiguidade e até ao trânsito em julgado da decisão final do processo;

b) A pagar ao A. a remuneração base mensal de € 4 632 + 150,26 (subsídio de refeição), desde a data do despedimento (14.09.2015) e até ao trânsito em julgado da decisão final do processo, incluindo subsídios de férias e de Natal, mas com dedução das importâncias referidas nas alíneas a) e c) do n.º 2 do art.º 390.º do CT, e bem assim com dedução do montante pago pela R. ao A. de € 1569,88, o que será liquidado no respetivo incidente, regulado nos artigos 358.º e seguintes do Código de Processo Civil;

c) A pagar ao A. a quantia referente aos valores dos benefícios económicos que o A. retirava das prestações em espécie pelo uso da viatura e do telemóvel, desde o 30.º dia anterior à data de propositura da ação até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal a proferir em sede de incidente de liquidação de sentença;

d) A pagar ao A. os juros de mora sobre as quantias atrás referidas;

e) A pagar ao A. a quantia de € 2.500,00 a título de compensação por danos não patrimoniais;

f) Confirmar, quanto ao mais, a sentença recorrida.

Custas pelo apelado na apelação do despacho saneador.

Custas pela apelante e pelo apelado, na proporção de 5/9 para a primeira e 4/9 para o segundo, quanto à apelação da sentença.”

 

7. Inconformado com esta decisão, o trabalhador interpôs recurso de revista, tendo formulado as seguintes conclusões:

A. O presente recurso vem interposto do Acórdão de fls., que julgando procedente a Apelação, decidiu revogar o despacho saneador recorrido e julgar não verificada a caducidade do direito da Recorrida de aplicar a sanção disciplinar de despedimento ao ora Recorrente.

B. O Tribunal a quo considera que a última diligência instrutória a ter em consideração para apuramento do cumprimento do prazo de 30 dias previsto no n.º 2 do art.º 357.0 do CT consiste na obtenção, no âmbito do processo disciplinar e por iniciativa do respetivo instrutor, do registo comercial de uma sociedade denominada CC.

C. E para suportar tal conclusão invoca que “as diligências para apurar a identidade das sociedades em questão poderiam levar tempo, face ao desconhecimento da sua identidade.”

D. Porém, a par de inexistir uma total ausência de factos para suportar tal conclusão, o Tribunal “a quo” não teve em consideração que (i) tal diligência foi determinada oficiosamente pelo instrutor do processo disciplinar, o que significa que não foi requerida em sede de resposta à nota de culpa e (ii) que o processo disciplinar esteve literalmente “parado” de 28.07.2015 até 31.08.2015 uma vez que não existe qualquer
registo ou indicação do ocorrido neste período temporal de 34 dias.

E. A menção à última diligência de instrução constante do n.º 2 do art.º 357.0 do CT é feita
por referência ao n.º 5 do art. 356.º do CT, que refere “Após a conclusão das diligências probatórias, (...)".

F. As “diligências probatórias” a que se refere o citado art.º 356.º, n.º 5, do CT são as diligências requeridas na resposta à nota de culpa, face ao teor do n.º 1, que expressamente menciona "as diligências probatórias requeridas na resposta à nota de culpa”.

G. Esta interpretação é sustentada na letra do n.º 5 do art.º 356.0 do CT, que quando refere "a conclusão das diligências probatórias", ao utilizar a contração “das” se está a referir às diligências referidas no n.º 1 do mesmo artigo - ou seja, às diligências requeridas na resposta à nota de culpa - e não a outras quaisquer.

H. Aliás, se nos casos em que o trabalhador não apresenta resposta à nota de culpa é entendido que o prazo para o empregador proferir a decisão disciplinar é contado do termo do prazo do trabalhador (independentemente da realização das diligências probatórias que o empregador decida levar a cabo), é manifesto que a última diligência de instrução mencionada no n.º 2, do art.º 357.0, do CT se refere às requeridas na resposta à nota de culpa.

I. A última diligência probatória requerida pelo Recorrente na resposta à nota de culpa teve lugar em 28.07.2015, pelo que o prazo para a Recorrida proferir a decisão disciplinar terminou a 27.08.2015.

J. Tendo a mesma sido proferida em 03.09.2015 e apenas sido notificada ao Recorrente em 14.09.2015, é manifesto que foi excedido o prazo de 30 dias e caducou o direito da Recorrida aplicar a sanção.

K. O apurado pela Recorrida em 31.08.2015, data em que o instrutor do processo obteve a  “cópia não certificada do registo comercial da sociedade DD Ld.a”, não provocou a interrupção de tal prazo.

L. Isto porque, do processo disciplinar não resulta a realização de nenhuma outra diligência no decurso dos referidos 34 dias (isto é, entre 28.07.2015 e 31.08.2015).

M. No processo disciplinar não existe qualquer identificação, direta ou indireta, expressa ou disfarçada, das “alegadas diligências” efetuadas para apurar a identidade das sociedades; aliás, nem consta qualquer despacho do instrutor a determinar a realização de pesquisas e/ou existe qualquer registo, ainda que por cota, do resultado de tais pesquisas.

N. Por maioria de razão, o Tribunal a quo não tem factos para concluir, como o fez, que as diligências para apurar a identidade das sociedades em questão poderiam “levar tempo” porque, por um lado, se desconhece o que foi efetivamente feito pela Recorrida e, por outro, uma mera pesquisa no motor de busca “Google”, no Portal da Justiça (https://publicacoes.mi.pt/pesquisa.aspx) ou, até mesmo, no sítio www.portaldocidadao.pt. seria possível apurar que a sociedade EE não existe e tal denominação tem um score de 84,8% de confundibilidade com a empresa "CC - Unipessoal, Lda.

O. Assim, a referida diligência de 31.08.2015, da iniciativa da Recorrida, foi injustificadamente realizada somente naquela data uma vez que do processo disciplinar resulta que entre 28.07.2015 e 31.08.2015 nada foi feito.

P. O empregador não pode decidir discricionária e arbitrariamente quando realizar as diligências instrutórias no âmbito do procedimento disciplinar, designadamente quando se tratam de diligências para apurar factos que desde o início de tal procedimento são do seu conhecimento.

Q. Desde a nota de culpa que a Recorrida imputa ao Recorrente o exercício de uma atividade concorrente com a sua através de uma empresa de nome “EE”, o que significa que o instrutor tem conhecimento de tal empresa desde o início do procedimento (18.05.2015, cfr. ponto 2 dos factos assentes), pelo que não se concebe - porque não é credível para o homem médio - que só a 31.08.2015 é que tenha decidido efetuar uma pesquisa sobre a empresa.

R. A instrução do processo disciplinar levado a cabo pela Recorrida violou os deveres de diligência e zelo a que a mesma estava obrigada, pelo que a sua atuação teve como único e exclusivo fundamento a interrupção do prazo de caducidade de 30 dias.

S. Pois é claro que não está demonstrado no processo disciplinar nem foi alegado e provado pela Recorrida qualquer facto que permita justificar a razão pela qual a mesma, desde a data em que apurou os factos imputados ao Recorrente, não conseguiu obter informações sobre a sociedade em causa.

T. Admitir que no âmbito do processo disciplinar seja possível ultrapassar o prazo de 30 dias fixado legalmente sem que exista qualquer evidência das diligências levadas a cabo e que justifiquem tal situação consubstancia uma violação do disposto no n.º 2 do art.º 357.0 do CT e constitui uma diligência dilatória e infundada.

U. Neste contexto, por violadora do disposto no n.º 2, do art.º 357.0, do CT, deve o Acórdão proferido pelo Tribunal “a quo” ser revogado na parte em que julga improcedente a exceção perentória da caducidade do direito da Recorrida sancionar disciplinarmente o Recorrente.

8. O empregador contra-alegou defendendo a manutenção do acórdão recorrido, tendo formulado as seguintes conclusões:

1 - Vem o presente recurso de revista interposto do Douto Acórdão proferido por este Tribunal da Relação de Évora, Acórdão este que considerou procedente a apelação, apresentada pela recorrente e ora aqui recorrida, BB, Ld.a, incidente sobre o despacho que declarou a verificação da exceção de caducidade do direito de aplicar a sanção de despedimento e o declarou ilícito, e assim revogou o despacho recorrido e julgou improcedente a referida exceção perentória.

2- Bem andou este douto Tribunal Superior ao decidir assim, pois fez uma correta interpretação e aplicação da lei.

3 - De imediato se suscita a questão prévia da tempestividade do presente recurso de revista interposto pelo ora recorrente AA, o qual no entender da ora recorrida é extemporâneo, pois que o prazo aplicável ao mesmo é o prazo de quinze dias previsto no art.º 677.º do C.P.C e não o prazo de vinte dias previsto no art.º 80.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho.

4- Resulta do disposto no art.º 80.º do C.P.T. que o prazo normal de recurso em processo de trabalho é de 20 dias, o qual é reduzido para 10 dias nas situações previstas no n.º 2 da supracitada norma, sendo que no entanto nenhum destas situações se refere a processos urgentes, matéria esta relativamente à qual o C.P.T. é omisso.

5- E o presente processo aqui em causa é um processo especial - processo de impugnação da regularidade e licitude do despedimento - o qual vem previsto no Título VI do Código do Processo de Trabalho, título este que regula os vários processos especiais em matéria de direito de trabalho, e este tipo de processo em concreto no capítulo I do referido título, nos artigos 98.º- B a 98.º- P; e também é um processo urgente nos termos do disposto no art.º 26.º n.º 1 al. a) que assim o qualifica.

6- Por outro lado, o art.º 1.º, n.º 2, do C.P.T. determina que nos casos omissos recorre-se sucessivamente:

a) A legislação processual comum, civil ou penal, que diretamente os previna;

c) A regulamentação dos casos análogos previstos na legislação processual comum, civil ou penal;

7- Sendo o C.P.T. totalmente omisso quanto aos prazos aplicáveis aos recursos em processo de trabalho quando o processo tem carácter urgente, como é aqui o caso, e por força do disposto no art.º 1.º, n.º 2, al. a) e c) do C.P.T., há que recorrer às normas constantes do C.P.C, que nos seus artigos 638.º, n.º 1, e 667.º estabelecem os prazos de recurso quando estamos perante processos urgentes.

8- Assim sendo, de tudo o que vem de se expor, nomeadamente da conjugação das várias normas citadas, e tendo em conta que estamos perante um processo urgente, nos termos do disposto no art.0 26.º, n.º 1, al. a), do C.P.T. o prazo do recurso de revista aplicável ao caso aqui em apreço nunca poderá ser o prazo de vinte dias constante do art.º 80.º, n.º 1, do C.P.T., mas sim o prazo de quinze dias constante do art.º 677.º do Código de Processo Civil.

9            - Ora, o presente recurso de revista foi apresentado no dia 17/05/2017, isto é muito depois de esgotado o prazo e quinze dias previsto no art.º 677.º do C.P.C e aqui aplicável.

10- E que a expedição da notificação ao ora recorrente AA foi efetuada no dia 21/04/2017 através do registo dos CTT com o n.º RE097143279PT e foi recebida no dia 24/04/2017, pelo que prazo de 15 dias para recorrer do douto Acórdão iniciou-se em 25/04/2017 e terminou no dia 09/05/2017; Se acrescentarmos os três dias posteriores ao terminus do prazo em que ainda a parte mediante o pagamento de multa, pode realizar o ato, o prazo em causa terminaria no dia 12/05/2017.

11- No entanto o presente recurso foi apresentado no dia 17/05/2017, isto é, já muito depois de esgotado o prazo de quinze dias, ainda que acrescido dos três dias de multa, o qual terminou em 12/05/2017, pelo que deverá ser liminarmente rejeitado e consequentemente não recebido o presente recurso de revista porque apresentado já depois de esgotado o prazo legal para o mesmo, sendo por isso o mesmo extemporâneo.

12- Sem prejuízo e sem conceder, sempre se dirá ainda que carece de todo e qualquer fundamento legal a motivação expendida pelo ora recorrente, que aliás deveria cingir-se apenas e somente a matéria de direito (art.º 674.º n.º 3 do C.P.C.), o que salvo melhor opinião não acontece, pois parece que o ora recorrente coloca em causa a matéria dada como provada e a apreciação dessa mesma matéria e de toda a prova que o douto Tribunal da Relação faz, pelo que também por este motivo não poderá o presente recurso proceder.

13- Mas acima de tudo não pode o presente recurso de revista proceder porque o Tribunal da Relação de Évora fez uma correta apreciação da matéria de facto e de todos os elementos constantes dos autos, e fez uma correta interpretação e aplicação da lei, nomeadamente do disposto no art.º 357.º, n.º 1, do Código do Trabalho, não merecendo qualquer reparo o douto Acórdão proferido por este Tribunal da Relação, o qual deverá ser integralmente mantido.

9. A tempestividade do recurso foi apreciada pelo relator que concluiu que o mesmo estava em tempo.

10. Neste Supremo Tribunal de Justiça, a Excelentíssima Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso de revista.

11. Nas suas conclusões o recorrente suscita a questão de saber se ocorreu a caducidade do direito de aplicação da sanção do seu despedimento.

                                                           II

Cumpre apreciar o objeto do recurso interposto.

1. As instâncias consideraram os seguintes factos provados:

1.) O autor foi contratado pela ré em 05.09.2008, através de contrato de trabalho a termo certo, para o desempenho das funções de “Diretor de Recursos Humanos”.

2.) E manteve-se a trabalhar para a ré, desempenhando as referidas funções de forma ininterrupta, até à data do seu despedimento, 14.09.2015.

3.) Não obstante, em 01.07.2011, foi celebrado entre a ré, o autor e a sociedade FF – …, Lda. um “Contrato de Cedência de Trabalhador”, através do qual a ré cedeu a posição de entidade empregadora que tinha no contrato celebrado com o autor àquela sociedade.

4.) A sociedade FF – …, Lda. é, como o próprio nome indica, uma empresa de trabalho temporário em que é gerente GG – o gerente da ré – e são sócios: GG; a mulher daquele, HH e a ré.

5.) Aliás, a FF e a ré têm sede na mesma morada: Rua … – …, n.ºs … a …, … ....

6.) Apesar da mencionada cedência, o autor continuou, após 01.07.2011, a desempenhar as mesmas funções que vinha desempenhando até então, por conta e ordem da ré, no mesmo local de trabalho.

7.) Como única alteração os recibos de vencimento do autor passaram a ser emitidos pela aludida FF.

8.) Em 21.03.2015, foi celebrado entre a ré, o autor e a FF um novo “Contrato de Cedência de Trabalhador”, através do qual a FF cedeu à ré a posição de entidade empregadora que tinha no contrato celebrado com o autor.

9.) Com efeitos reportados a julho de 2011, o autor e a ré acordaram que esta pagaria àquele uma retribuição mensal que deveria corresponder à quantia líquida de € 2.850,00 correspondentes a € 4.337,00 ilíquidos.

10.) Em dezembro de 2012, o valor da retribuição base do autor ascendia à quantia ilíquida de € 4 458,54.

11.) Por imposição da R., em 31.12.2012, o autor celebrou com a aludida FF um “Acordo para Alteração da Retribuição Base”, nos termos do qual “Com efeitos a contar de 01.01.2013 a retribuição base mensal líquida atual do segundo contraente no valor de € 2.850,00 passará a ser de € 1.500,00 líquidos”.

12.) Da cláusula sexta do mencionado acordo, consta que a redução da retribuição seria pelo período de 12 meses, ou seja, até 31.12.2013.

13.) Durante todo o ano de 2013, o autor auferiu, a título de retribuição base, a quantia ilíquida de € 2.261,60.

14.) Em janeiro de 2014, a retribuição base mensal do autor foi reposta e atualizada para a quantia ilíquida de € 4.509,00;

15.) A partir de fevereiro de 2014, a ré passou a atribuir ao autor “cheques creche” e “cheques estudante”, no valor mensal de € 860,00.

16.) Na sequência do que a retribuição base mensal do autor foi reduzida para € 3. 772,00.

17.) Entre fevereiro e junho de 2014, o autor auferiu de uma retribuição base mensal ilíquida de € 3.772,00 a que acresciam os referidos cheques creche e educação no valor mensal de € 860,00 totalizando assim um valor mensal ilíquido de € 4.632,00.

18.) Por imposição da ré, em 01.07.2014, o autor celebrou com a FF um novo “Acordo para Alteração da Retribuição Base”, nos termos do qual “Com efeitos a contar de 01.07.2014 a retribuição base mensal líquida atual do segundo contraente, no valor de € 3.365,84, passará a ser de € 2.461,22 líquidos”.

19.) A partir de 01.07.2014, o autor passou a auferir (i) a retribuição base mensal ilíquida no montante de € 2.397,06; (ii) os cheques creche e cheque estudante no valor mensal de € 860,00 no valor global mensal ilíquido de € 3.257,06.

20.) Situação que se manteve até à data da cessação do contrato de trabalho.

21.) Aos valores acima referidos acrescia, ainda, mensalmente a quantia de € 150,26, a título de subsídio de alimentação.

22.) O autor tinha, ainda, direito à utilização total de viatura automóvel marca … 1.7ctdi, sendo o custo da respetiva manutenção, utilização e combustível suportados totalmente pela ré, sem limitação do valor mensal de gasóleo.

23.) A utilização da viatura automóvel em causa pelo autor era total na medida em que estava autorizado a utilizar a mesma em todas as deslocações pessoais, designadamente, casa-trabalho-casa, fins de semana e férias.

24.) O autor tinha, ainda, atribuído um telemóvel para utilização total, sem plafond pré-fixado para chamadas pessoais e profissionais.

25.) Em setembro de 2015, a ré procedeu ao pagamento ao autor da quantia líquida de € 1.569,88.

26.) Por não compreender a que respeitava o referido valor, e como o mesmo havia sido obtido, por email de 12.10.2015, solicitou esclarecimentos sobre a que respeitava a referida quantia, os quais nunca foram prestados.

27.) O autor sempre desempenhou as suas funções com elevado brio e profissionalismo, dedicando-se ao cumprimento das suas obrigações.

28.) Inexistindo qualquer registo ou incidente disciplinar em mais cerca de 7 anos de relação laboral.

29.) Com a suspensão preventiva em maio de 2015, o A. vivenciou tristeza e angústia, sentindo-se injustiçado.

30.) O autor evidenciou após o processo disciplinar sentimentos de desânimo, desconforto existencial, tensão interior, pessimismo.

31.) Após o despedimento de que foi alvo, o autor isolou-se em termos sociais.

32.) Ao ficar sem a sua única fonte de rendimento, o autor ficou impedido de satisfazer as suas despesas mensais e as do seu agregado familiar, contraídas em função da sua remuneração mensal.

Matéria de facto não provada:

- O uso de viatura pelo A. corresponde ao valor mensal de € 400,00.

- A média do custo mensal associado às chamadas pessoais efetuadas pelo autor ascendia a cerca de € 25,00.

- O autor registou, decorrente da ansiedade vivenciada, alterações ao nível do sono e da alimentação.

- Após o despedimento o A. dependia da ajuda de familiares e amigos.

- O A. apresentou comprovativos referentes a despesas de caixa no montante de € 311,60.

Factos provados referentes à exceção da caducidade do direito de aplicar a sanção disciplinar:

a. Em 18.05.2015, a ré procedeu à abertura de procedimento disciplinar contra o autor e a última testemunha inquirida na instrução, arrolada pelo autor, ocorreu em 28.07.2016.

b. A ré efetuou diligências instrutórias no sentido de averiguar da existência ou não da firma DD – …, Lda., na sequência dos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pelo autor, que alegaram desconhecer esta firma.

c. A ré apurou, em 31.08.2015, a denominação correta da firma referida no ponto anterior e neste dia requereu cópia não certificada do seu registo comercial, como consta de fls. 166 a 172, tendo apurado que a firma DD – …, Lda., funciona no mesmo local da firma II, da qual as testemunhas JJ e KK arroladas pelo autor são gerentes. 

d. Em 03.09.2015, foi elaborado relatório final, proposta de decisão, e nesta mesma data proferida decisão no sentido do despedimento com justa causa do autor. 

2. Os presentes autos respeitam a uma ação de processo especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento instaurada em 20 de outubro de 2015, tendo o acórdão recorrido sido proferido em 20 de abril de 2017.

Assim sendo, o regime processual aplicável é o seguinte:

- O Código de Processo do Trabalho, na versão operada pela Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto;

- O Código de Processo Civil, na versão conferida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho.

3. Como já se referiu, a questão que se coloca no presente recurso de revista consiste em saber se ocorreu a caducidade do direito de aplicação da sanção de despedimento, com base na ultrapassagem do prazo de 30 dias previsto no art.º 357.º do Código do Trabalho.

A referida disposição legal estatui nos seus números 1 e 2:

1. Recebidos os pareceres referidos no n.º 5 do artigo anterior ou decorrido o prazo para o efeito, o empregador dispõe de 30 dias para proferir a decisão de despedimento, sob pena de caducidade do direito de aplicar a sanção;

2. Quando não exista comissão de trabalhadores e o trabalhador não seja representante sindical, o prazo referido no número anterior conta-se a partir da data da conclusão da última diligência de instrução.

Maria do Rosário Palma Ramalho (Tratado de Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 6.ª edição, Almedina, pág. 839.) referindo-se a esta norma escreve:

A ultrapassagem do prazo para proferir a decisão de despedimento determina a caducidade do direito de aplicação da sanção do despedimento (art.º 357.º n.º 1).

Este prazo relativamente curto para a emissão da decisão de despedimento é uma projeção do princípio da celeridade, que domina a matéria disciplinar em geral e o processo disciplinar em especial, e resulta também do fundamento do próprio despedimento no conceito de justa causa, que pressupõe, como já se referiu, a impossibilidade imediata de subsistência do vínculo laboral. Naturalmente, o carácter imediato desta impossibilidade não se compadece com uma excessiva dilação da decisão final de despedimento.”

No presente caso, é ponto assente que não ocorre o circunstancialismo do n.º 1, do art.º 357, do Código do Trabalho, pelo que o prazo de 30 dias para a prolação da decisão de despedimento a ter em conta na situação presente conta-se a partir da data da última diligência instrutória (n.º 2 da mencionada disposição legal).

Os factos provados relevantes para a apreciação da questão suscitada são os seguintes:

1. Em 18.05.2015, a ré procedeu à abertura de procedimento disciplinar contra o autor e a última testemunha inquirida na instrução, arrolada pelo autor, ocorreu em 28.07.2016.

2. A ré efetuou diligências instrutórias no sentido de averiguar da existência ou não da firma DD – …, Lda., na sequência dos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pelo autor, que alegaram desconhecer esta firma.

3. A ré apurou, em 31.08.2015, a denominação correta da firma referida no ponto anterior e neste dia requereu cópia não certificada do seu registo comercial, como consta de fls. 166 a 172, tendo apurado que a firma DD – …, Lda., funciona no mesmo local da firma II, da qual as testemunhas JJ e KK arroladas pelo autor são gerentes. 

4. Em 03.09.2015, foi elaborado relatório final, proposta de decisão, e nesta mesma data proferida decisão no sentido do despedimento com justa causa do autor. 

O Tribunal da primeira instância considerou que entre a data de inquirição da última testemunha, que ocorreu em 28.07.2015, e a data da última diligência instrutória, que teve lugar em 31.08.2015, decorreu muito tempo, pelo que esta diligência foi um expediente dilatório para alargar artificialmente o prazo de caducidade de 30 dias.

Nessa linha, desconsiderou a referida diligência instrutória para efeitos de contagem do início do prazo de 30 dias, acabando depois por concluir que este prazo foi excedido.

O Tribunal da Relação não acolheu o entendimento da primeira instância, com a seguinte argumentação:

“Lendo a nota de culpa, verificamos que aí são referidos telefonemas para duas pessoas que têm o nome dos gerentes da sociedade II, que a empregadora considera como sendo as pessoas com quem o autor violou os deveres de lealdade e com quem estava conluiado para prejudicar a apelante.

O fundamento para diligenciar pelo apuramento da identificação das sociedades que as testemunhas indicadas pelo autor diziam desconhecer, parece-nos importante para que a ré pudesse decidir com justiça sobre a decisão a tomar.

Contrariamente ao decidido no despacho recorrido, entendemos que as diligências para apurar a identidade das sociedades em questão poderiam levar tempo, face ao desconhecimento da sua identidade. Esta diligência poderia ser importante para o desfecho do procedimento disciplinar, pelo que não são infundadas ou dilatórias as diligências terminadas em 31.08.2015.

Acrescente-se que a empregadora proferiu a decisão passados apenas 3 dias após o termo destas diligências, o que indicia que estas não eram meramente dilatórias, mas importantes para a decisão de mérito.”

Tem vindo a ser decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça que as diligências probatórias referidas no artigo 356.º, n.º 5, do Código do Trabalho, abrangem, não só as requeridas pelo trabalhador na sua resposta à nota de culpa, como também quaisquer outras que, na sequência daquelas, o instrutor do processo entenda, oficiosa e justificadamente, promover (Acórdão de 12/1/2017, Processo n.º 69/13.8TTLRS.L2.S1, Revista – 4.ª Secção, Acórdão de 13/11/2013, Processo n.º 196/12.9TTBRR.L1.S1 - 4.ª Secção, Acórdão de 30/04/2013, Processo n.º 1154/09.6TTLSB.L1.S1 - 4.ª Secção, Acórdão de 7/10/2010, Processo n.º 887/07.6TTALM.L1.S1 - 4.ª Secção).

No caso dos autos, a última diligência instrutória ordenada pela empregadora consistiu no apuramento da existência e da denominação correta da firma DD – …, Lda., na sequência dos depoimentos prestados pelas testemunhas JJ e KK arroladas pelo trabalhador na resposta à nota de culpa, que alegaram desconhecer esta firma.

Na nota de culpa vêm referidos telefonemas para duas pessoas que têm o nome dos gerentes da sociedade II, que a empregadora considera como sendo as pessoas através as quais o trabalhador violou os deveres constantes das alíneas c), f) e h), do art.º 128.º, n.º 1, do Código do Trabalho e com quem estava conluiado para prejudicar a empregadora. Aquelas pessoas são justamente o referidos JJ e KK.

Em face disto, não se reputa de dilatória, inútil ou desnecessária a diligência probatória levada a cabo pela empregadora em 31.08.2017, data em que esta requereu cópia não certificada do registo comercial da firma DD – …, Lda., com a qual, segundo a empregadora, o trabalhador estaria a levar a cabo atividade concorrente, e que funciona no mesmo local da firma II, da qual as testemunhas JJ e KK arroladas pelo autor são gerentes, uma vez que é razoável concluir que essa diligência visou, no limite, aferir da credibilidade dos depoimentos das testemunhas arroladas pelo trabalhador na sua resposta à nota de culpa, inexistindo motivo válido ou bastante para a desconsiderar.

Tão pouco se reputa de excessivo o hiato temporal que mediou entre a obtenção desta informação e a inquirição da última testemunha arrolada, sendo de assinalar, como fez de resto o Tribunal da Relação, a circunstância de a decisão de despedimento ter sido proferida apenas 3 dias depois da última diligência, o que julgamos pôr em causa a alegada natureza dilatória da mesma.

           

                                                           III

            Pelos fundamentos expostos, decide-se negar o recurso de revista, mantendo na íntegra o acórdão recorrido.

Custas pelo recorrente.

Anexa-se sumário do acórdão.

Lisboa, 09/11/2017

Chambel Mourisco (Relator)

Pinto Hespanhol

Gonçalves Rocha