Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
969/17.6T8AMT.P2.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: RICARDO COSTA
Descritores: RECURSO DE REVISTA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
ARGUIÇÃO DE NULIDADES
NULIDADE DE ACÓRDÃO
INADMISSIBILIDADE
REJEIÇÃO DE RECURSO
Data do Acordão: 02/22/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NÃO SE CONHECE DO OBJECTO DO RECURSO.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
O acórdão do tribunal da Relação que se pronuncia em conferência sobre as nulidades arguidas e imputadas a anterior acórdão que reapreciou a decisão de 1.ª instância, cujo recurso de revista não foi admitido em sede de reclamação deduzida ao abrigo do art. 643.º do CPC, após devolução processual (ordenado na decisão singular proferida no âmbito dessa reclamação) para o conhecimento e julgamento das nulidades não apreciadas antes da subida da revista ao STJ, constitui decisão definitiva e não admite recurso de revista (arts. 617.º, n.os 1, 5, 2.ª parte, 6, 1.ª parte, e 666.º, n.os 1 e 2, do CPC).
Decisão Texto Integral:


Processo N.º 969/17.6T8AMT.P2.S1

Revista – Tribunal recorrido: Relação do Porto, 2.ª Secção

Acordam em conferência na 6.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça


I) RELATÓRIO

1. AA requereu em notário a abertura de inventário tendo em vista pôr termo à comunhão hereditária relativamente ao acervo hereditário deixado por óbito de seu pai BB, tendo exercido as funções de cabeça-de-casal a irmã da Requerente, CC, que substituiu a viúva do inventariado, DD.
No âmbito do referido inventário, CC e cônjuge marido EE, reclamaram: a) da relação de bens, arguindo a nulidade da peritagem efetuada; b) da ultrapassagem de prazos e prosseguimento para a conferência preparatória; c) do reconhecimento de dívida sem aprovação de todos os interessados; e) da acusação da falta de relacionamento de bens.
Todas as referidas reclamações foram objeto de indeferimento por parte da Senhora Notária.

2. Interposto recurso das referidas decisões para o tribunal da respetiva comarca, foi proferido o seguinte despacho em 25/9/2018 pelo Juízo Local Cível ... (Tribunal Judicial da Comarca ...), transitado em julgado em 31/10/2018:  


A questão a decidir – delimitada pelas conclusões da alegação dos apelantes (arts. 635º, 4 e 639, nos 1 e 3 do CPC) é a seguinte: - Recorribilidade da decisão do notário que indeferiu a nulidade da perícia; que indeferiu a nulidade por ultrapassagem de prazos e decidiu prosseguir com a conferência preparatória; que reconheceu a dívida sem aprovação de todos os interessados; que indeferiu o relacionamento de bens e, finalmente, que indeferiu o pedido de esclarecimentos.
Como justa e certeiramente diagnosticou a Exma. Notária, a fls. 3 verso “o recurso em apreço, chamado de impugnação judicial do despacho determinativo da forma à partilha, não põe em causa tal despacho, conforme se pode apurar da sua motivação. Neste recorre-se, sim, de várias decisões interlocutórias que apenas poderão ser objecto de impugnação no recurso que vier a ser interposto da decisão judicial de homologação da partilha.
então que ajuizar.
O Regime Jurídico do Processo de Inventário (RJPI) aprovado pela Lei 23/13, de 25.03 diploma a que pertencem todas as normas adiante citadas sem menção de origem – enumera taxativamente as decisões do notário que admitem recurso para o Tribunal de instância da Comarca do Cartório Notarial.
São elas: a) a decisão do notário que indeferir o pedido de remessa das partes para os meios comuns, feito ao abrigo do disposto no 3 do art. 16º (nº 4 do mesmo preceito); b) o despacho determinativo da partilha (art. 57º, 4).
Ambos os recursos sobem imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, sendo o primeiro interposto no prazo de 15 dias e sendo o segundo interposto no prazo de 30 dias (arts. 16º, nos 4 e 5 e 57º, 4).
Para além de intervir como Tribunal de recurso, naquelas duas situações, o Tribunal da instância intervém no processo de inventário apenas para proferir a sentença homologatória da partilha (art. 66º, 1).
Diz o 3 daquele art. 66º que da sentença homologatória da partilha cabe recurso de apelação, nos termos do CPC, para o Tribunal da Relação territorialmente competente, com efeito meramente devolutivo.
Repete o art. 76º, 1 que da sentença homologatória da partilha cabe recurso, dizendo ainda que se aplica, com as necessárias adaptações, o regime de recursos previsto no CPC.
Finalmente, diz o 2 daquele preceito que, salvo nos casos em que cabe recurso de apelação nos termos do CPC, as decisões interlocutórias proferidas no âmbito dos mesmos processos devem ser impugnadas no recurso que vier a ser interposto da decisão da partilha.
Resta saber a que “decisões interlocutórias” se reporta o citado preceito.
vimos que as decisões interlocutórias proferidas pelo Tribunal da instância são apenas as referidas nos arts. 16º, 4 e 57º, 4. Trata-se de decisões que, em princípio, não têm cabimento nem na al. b) do 1 nem nas diversas alíneas do 2 do artº 644º do CPC, pelo que não admitem apelação autónoma, devendo ser impugnadas no recurso de apelação que venha a ser interposto da sentença homologatória da partilha. É o que sucede no caso dos autos, em que podemos considerar que a decisão recorrida não está abarcada pelo art. 644º
do CPC, não está imbrincada na remessa para os meios comuns nem tange o despacho determinativo da forma à partilha embora se pretenda revestir dessa indumentária.
Mas persiste a questão de saber se o 2 do art. 76º se refere apenas às decisões judiciais ou também às decisões notariais. Pode entender-se que, com a desjudicialização do processo de inventário, se pretendeu tornar definitivas todas as decisões do Notário, com excepção das referidas nos citados arts. 16º, 4 e 57º, 4, não admitindo as mesmas recurso. Ou seja, seriam definitivamente decididas pelo notário questões tão relevantes como, a recusa ou deferimento da cumulação de inventários (art. 18º, 2), a determinação de arquivamento do processo (art. 19º, 2), a nomeação, substituição, escusa ou nomeação do cabeça-de-casal (art. 22º), a oposição e impugnação (art. 31º, 3), a decisão quanto à reclamação de bens e existência de sonegação (art. 35º, 3 e 4), o reconhecimento de dívidas (art. 39º) e outras.
Daí que a interpretação da norma do art. 76º, 2 no sentido de que as decisões notariais não podem ser impugnadas em sede de recurso tenha vindo a ser considerada inconstitucional, por violação do princípio do acesso ao direito consagrado no art. 20º, 1 da CRP. Por outro lado, daquelas decisões do notário não pode haver nunca lugar a recurso directo para o Tribunal da Relação, porque este Tribunal reaprecia decisões tomadas […].
De todo o exposto resulta que a única forma de ultrapassar a questão é admitir que as decisões do notário (com excepção das referidas nos arts. 16º, 4 e 57º, 4, como já vimos) possam ser impugnadas no recurso que vier a ser interposto da sentença
homologatória da partilha. Assim, no caso, a decisão da Sr.ª Notária que indeferiu a nulidade
da perícia; que indeferiu a nulidade por ultrapassagem de prazos e decidiu prosseguir com a conferência preparatória; que reconheceu a dívida sem aprovação de todos os interessados; que indeferiu o relacionamento de bens e finalmente que indeferiu o pedido de esclarecimentos, não admite recurso para o Tribunal da instância, nem admite recurso autónomo para o Tribunal da Relação, mas pode ser impugnada no recurso que vier a ser interposto da sentença homologatória da partilha e que ainda não foi proferida.
Impõe-se então, e na senda do diagnóstico notarial, não admitir o recurso de fls. 15 verso, interposto pelos interessados CC e marido EE.”

3. A Senhora Notária remeteu em 14/12/2018 ao Juízo Local Cível ... a acta da Conferência Preparatória, realizada em 23/11/2016, que colocou termo ao processo de inventário n.º ...15 por acordo das partes, para efeitos de homologação nos termos dos artigos 48º, 7, e 66.º, ambos do RJPI (Lei 23/2013, de 5 de Março, revogado pela Lei 117/2019, de 13 de Setembro, que instituiu o Regime do Inventário Notarial).
Nessa remessa consta ainda:
“Mais se junta, após sentença transitada em julgado no âmbito do processo n.º 969/17.... que não admitiu o recurso do despacho determinativo da forma de partilha, o mapa de partilha”.


4. Em 17/12/2018 foi proferida a seguinte sentença:

“Homologo por sentença, nos termos do art. 48 n.º 6 e 66 n.º 1 do RJPI, a partilha constante da conferência de fls. 111, no presente inventário instaurado por óbito de BB e mulher DD, no qual foi cabeça-de-casal CC.”


5. Inconformados, os interessados nos autos de inventário CC e EE interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação ... (TR…), que proferiu acórdão em 22/5/2019, julgando e decidindo “declarar a incompetência desta Relação, em razão da hierarquia, para conhecer das impugnações judiciais das decisões da Notária apresentadas pelos interessados ao longo do processo, ordenando a baixa dos autos à 1.ª instância para o efeito. Mais anulam a sentença homologatória da partilha e os actos subsequentes».

6. Baixados os autos, foi proferido despacho em 6/9/2019, que, identificadas novamente as questões (“Recorribilidade da decisão do notário que indeferiu a nulidade da perícia; que indeferiu a nulidade por ultrapassagem do prazo do art. 41 n.º 3 do NRJPI e decidiu prosseguir com a conferência preparatória; que reconheceu a dívida sem aprovação de todos os interessados; que indeferiu o relacionamento de bens e, finalmente, que indeferiu o pedido de esclarecimentos”), concluiu com o seguinte dispositivo:


“Pela recensão supra, julgo improcedente o recurso de impugnação judicial da(s) decisão notarial de fls. 15 verso, interposto pelos interessados CC e marido EE; que indeferiu a nulidade da perícia, que indeferiu a nulidade por ultrapassagem de prazos e decidiu prosseguir com a conferência preparatória; que reconheceu a dívida e ordenou a venda de bens sem aprovação de todos os interessados; que indeferiu o relacionamento de bens e finalmente que indeferiu o pedido de esclarecimentos”


7. Em 28/10/2019 foi proferida nova sentença com o seguinte teor:


“Homologo por sentença, nos termos do art. 48 n.º 6 e 66 n.º 1 do RJPI, a partilha constante da conferência de fls. 111, no presente inventário instaurado por óbito de BB e mulher DD, no qual foi cabeça-de-casal CC.”

8. Novamente inconformados, os interessados CC e EE interpuseram recurso de apelação para o TRP, que proferiu acórdão em 13/10/2020, julgando totalmente improcedente o recurso e mantendo na íntegra a sentença recorrida.

9. Notificados, os Recorrentes apresentaram requerimento junto do TRP, mediante o qual vieram:

“a) – arguir a nulidade do referido Acórdão recorrido, pois que, salvo melhor opinião, entendem que se verifica “ambiguidade ou obscuridade”, que acarreta que o acórdão recorrido seja manifestamente ininteligível e, ainda, por o mesmo não se ter pronunciado sobre questões que deveria conhecer, as invocadas pelos recorrentes e, a contrario, por se ter pronunciado por outras não invocadas – (artigo 615º, nº 1, alíneas c) e d), do CPC) designadamente: (…);
b) – interpor recurso de revista, ao abrigo da permissão conferida pelo artigo 652º, nº 5, alínea a), do Código de Processo Civil.”.


Em 24/11/2020, o Juiz Desembargador Relator proferiu Decisão singular, com a seguinte fundamentação e julgamento:


“(…) quanto ao recurso:

- A norma invocada pelos recorrentes artigo 652.º, n.º 5, alínea a), do Código de Processo Civil não prevê qualquer recurso, mas antes uma reclamação;
- Tal reclamação pode incidir sobre a decisão em conferência suscitada por uma reclamação prévia sobre o despacho singular do relator;
- A reclamação em apreço pode ter por objeto uma decisão proferida sobre competência relativa.
Ora, no caso sub judice, não houve qualquer reclamação de qualquer despacho do relator, e nos autos não de discutiu qualquer exceção de incompetência relativa.
A única exceção de incompetência discutida nos autos reportou-se a incompetência absoluta em razão da hierarquia (art. 96.º, a) do CPC), e foi decidida por esta Relação em acórdão de 22.05.2019, muito transitado em julgado.
Acresce, finalmente, que nunca o recurso poderia ser admitido [talvez por essa razão, com vista a contorná-la os recorrentes invocam o mecanismo previsto no artigo 652.º, n.º 5, alínea a), do CPC], considerando a regra da “dupla conforme” prevista no n.º 3 do artigo 671.º do Código de Processo Civil.
Decorre do exposto a absoluta inadmissibilidade legal do recurso.

No que respeita à reclamação:

O prazo para a reclamação para a conferência é de dez dias [artigo 149/1 do CPC].
Ora, como se referiu, o acórdão foi notificado aos recorrentes por via eletrónica mediante expediente elaborado em 15.10.2020, tendo sido a reclamação apresentada em 17.11.2020, pelo que se revela manifestamente extemporânea.

Com fundamento no exposto, não admito, nem a reclamação, nem o recurso, condenando os apresentantes nas custas do incidente.”

10. Notificados, os Recorrentes, revelando o correspondente inconformismo, apresentaram Reclamação para o STJ (nos termos do art. 643º CPC), sendo proferida Decisão Singular em 1/2/2021 (2.ª Secção Cível, Rel. Rijo Ferreira), que a indeferiu, nela constando a seguinte fundamentação e o consequente dispositivo:


“Verifica-se, assim, uma situação de dupla conformidade obstativa do recurso de revista nos termos gerais (aquele que se entende ter sido o intentado interpor pelos reclamantes, não obstante a deficiente formulação da norma habilitante), nos termos do art. 671°, n° 3, doCPC.
E não sendo admissível a revista, as nulidades do acórdão são insusceptíveis de ser arguidas nesse recurso, nos termos do nº 4 do art. 615º do CPC, entendendo-se que, conforme o disposto no nº 5 do art. 617º do mesmo Código, devem ser conhecidas pelo tribunal que proferiu a decisão (nesse sentido cf. acórdão do STJ de 16DEZ2020, proc. 12380/17.4T8LSB.L1.SI).
Termos em que se indefere a reclamação, sem prejuízo de caber à Relação conhecer das nulidades imputadas ao acórdão recorrido.”


12. Baixados novamente os autos ao TRP, após despacho singular pelo Senhor Juiz Desembargador Relator prolatado em 1/3/2021, foi proferido acórdão em 13/4/2021, que, em conferência, em relação ao acórdão proferido em 13/10/2020, julgou totalmente improcedente a reclamação das nulidades arguidas.  

13. Deste acórdão vieram os Recorrentes e Reclamantes interpor agora recurso de revista excepcional para o STJ, por verificação de “dupla conformidade”, invocando para o efeito o art. 672º, 1, a) e b), do CPC e visando a anulação do acórdão recorrido, “por ilegal/nulo (omissão de pronúncia e excesso de pronúncias), e substituído por outro que julgue totalmente procedente as nulidades arguidas, com todas as legais consequências”.
Alegaram ainda de forma autónoma a nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia (art. 615, 1, d), CPC).

14. Foi proferido despacho pelo aqui Relator no exercício do poder contemplado no art. 655º, 1, do CPC e foram as partes notificadas para se pronunciarem sobre a possibilidade de não conhecimento do objecto do recurso, considerando a disciplina do art. 617º, 5, 2ª parte, e 6, aplicável por força do art. 666º, 1, do CPC: (i) os Recorrentes responderam, alegando a verificação dos pressupostos gerais de admissibilidade do recurso; (ii) a Recorrida AA também se pronunciou, no sentido de não ser conhecido o objecto do recurso.


Consignados os vistos nos termos legais, cumpre apreciar e decidir.


II) APRECIAÇÃO E FUNDAMENTOS


Questão prévia da admissibilidade do recurso

15. O acórdão agora recorrido resulta da apreciação por parte da Relação das nulidades arguidas pelos Recorrentes, relativas ao acórdão proferido pelo TRP em 13/10/2020, depois de não ter sido admitido o conhecimento do objecto da revista desse mesmo acórdão nos termos de Reclamação deduzida ao abrigo do art. 643º do CPC e ordenada (pela Decisão Singular proferida nessa impugnação junto do STJ) a devolução do processo à Relação para o julgamento dessas nulidades, uma vez (de acordo com o arts. 617º, 1, e 666º, 2) não conhecidas e apreciadas antes de subirem os autos ao STJ – nos termos do art. 617º, 5, ex vi arts. 666º, 1, 679º, e 666º, 2, do CPC.  

16. O art. 617º, 5, 2.ª parte, aplicável ao caso por força do art. 666º, 1, do CPC, determina: «(…) se não puder ser apreciado o objeto do recurso e houver que conhecer da questão da nulidade ou da reforma, compete ao juiz, após a baixa dos autos, apreciar as nulidades invocadas ou o pedido de reforma formulado (…).». Sendo certo que a apreciação de nulidades arguidas em relação ao acórdão primeiramente recorrido (o prolatado em 13/10/2020) constitui fundamento acessório e dependente da admissibilidade e conhecimento da revista interposta desse acórdão (arts. 615º, 4, 666º, 1, CPC) e, em concreto, não admitida (com trânsito).
Pelo que o acórdão agora recorrido, com data de 13/4/2021, foi proferido nos exactos termos da tramitação e legitimação processuais conferidas por tal normativo para julgar e decidir a improcedência das nulidades de decisão arguidas para o anterior acórdão que reapreciara em apelação decisão de 1.ª instância.

17. Por seu turno, a parte final do art. 617º, 5, 2ª parte, determina: «aplicando-se, com as devidas adaptações, o previsto no n.º 6» desse mesmo art. 617º.
Esse n.º 6 prescreve, na sua 1ª parte: «Arguida perante o juiz que proferiu a sentença alguma nulidade, nos termos da primeira parte do n.º 4 do artigo 615º, (…) por dela não caber recurso ordinário, o juiz profere decisão definitiva sobre a questão suscitada (…).»

18. O interposto recurso de revista excepcional (para a dupla conformidade decisória entre duas decisões das instâncias), enquanto modalidade (ainda que com pressupostos limitados) do recurso ordinário de revista (não sendo admissível pela referida “dupla conforme”), apenas se admite se o recurso de revista incidir sobre acórdão da Relação, proferido sobre decisão proferida na 1.ª instância, que possa ser enquadrado nas previsões recursivas do art. 671º (decisões finais e, se assim for de entender, decisões interlocutórias “velhas”), do CPC e/ou não seja obstaculizado por previsões legais de irrecorribilidade e definitividade decisória.

19. A aplicação ao caso do art. 617º, 6, 1ª parte, com as devidas adaptações (“é igualmente aplicável nos casos em que, tendo sido arguida nulidade ou pedida reforma da sentença, na pressuposição de que o processo admitia recurso, o tribunal superior acaba por decidir que não pode ser apreciado o objeto do recurso, com a inerente baixa dos autos”[1]), não deixa dúvidas sobre a definitividade decisória do decidido pelo acórdão agora recorrido, restrito na sua decisão à apreciação das nulidades invocadas pelos Recorrentes, uma vez não admitida anteriormente a revista do acórdão a que se imputavam tais nulidades. Configura-se, por isso, uma decisão insusceptível de qualquer impugnação em sede de revista para o STJ sobre essa apreciação.

III) DECISÃO

Em conformidade, acorda-se em não tomar conhecimento do objecto do recurso, atenta a sua manifesta inadmissibilidade.

Custas pelos Recorrentes.

STJ/Lisboa, 22 de Fevereiro de 2022

Ricardo Costa (Relator)

António Barateiro Martins

Luís Espírito Santo

SUMÁRIO DO RELATOR (arts. 663º, 7, 679º, CPC).



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[1] ABRANTES GERALDES/PAULO PIMENTA/LUÍS PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil anotado, Vol. I, Parte geral e processo de declaração, Artigos 1.º a 702.º, Almedina, Coimbra, 2018, sub art. 617º, pág. 741.