Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1889/03.7TBVFR.P1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: GABRIEL CATARINO
Descritores: CONTRATO DE AGÊNCIA
REQUISITOS
EXTINÇÃO DE POSTO DE TRABALHO
EXTINÇÃO DO CONTRATO
RESOLUÇÃO DO NEGÓCIO
PRESSUPOSTOS
DEVER DE LEALDADE
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 02/14/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário : I - Constituem elementos essenciais do contrato de agência, a obrigação de o agente promover a realização de contratos por conta do principal, com durabilidade e autonomia, e de o segundo pagar ao primeiro determinada remuneração, designada comissão, bem como prestar-lhe todos os elementos necessários ao desenvolvimento da sua actividade.

II - Trata-se de um negócio oneroso, sinalagmático, mediante o qual uma das partes – o agente –, actuando por conta e em nome da outra – o principal –, em regime de colaboração estável, não necessariamente exclusiva, desenvolve autonomamente uma actividade de promoção dos bens do principal, angariando clientela e consolidando zonas de mercado, podendo, se para tal estiver devidamente mandatado, celebrar contratos em nome e no interesse do principal.

III - Provado que o autor se comprometeu a, na zona em que actuava, promover o calçado produzido pelas rés, angariando clientes e colaborando na preparação das colecções que deviam ser expostas em feiras e mercados da especialidade, sendo remunerado, por essa actividade, mediante uma percentagem aleatória e fixada casuisticamente, dependendo do volume de negócios promovido e/ou dos contratos celebrados, trata-se de um contrato de agência mercantil, regulado pelo DL n.º 178/86, de 03-07 (alterado pelo DL n.º 118/93, de 13-04).

IV - A extinção do contrato de agência, tratando-se de contrato por tempo indeterminado ou de duração indefinida, pode ser efectivada mediante denúncia (art. 28.º do DL n.º 178/86) ou resolução (art. 30.º do citado diploma legal), sendo que, neste caso, a extinção da relação contratual pode ocorrer nos contratos por tempo determinado.

V - A resolução do contrato pode ocorrer: a) por iniciativa de qualquer das partes; b) nos contratos por tempo indeterminado ou por tempo determinado; c) a qualquer momento; d) carece de pré-aviso; d) se a outra parte faltar ao cumprimento das suas obrigações, quando pela sua gravidade e reiteração, não seja exigível a subsistência do vínculo contratual.

VI - A lei exige, como causa ou razão motivadora da faculdade do exercício de resolução do contrato de agência, que a conduta assumida pelo incumpridor se revele grave e reiterada, de modo a tornar inviável a manutenção do vínculo contratual.

VII - Provado que o autor, a partir de determinado altura, começou a transferir para outra firma, concorrente das rés, modelos de calçado, para serem produzidos por essa firma a preços mais baixos, e passou a deixar de comparecer às reuniões destinadas a programar e projectar as novas colecções e as feiras onde essas colecções seriam expostas para promoção e venda, verifica-se que a passagem para firmas concorrentes dos modelos de sapatos, que viriam a ser produzidos por essas empresas em concorrência com a empresa principal, configura uma grave violação, pelo agente, do dever de confiança e lealdade, a qual justifica, pela gravidade que assume, a faculdade do exercício de resolução prevista pelo art. 30.º, al. a), do DL n.º 178/86.

VIII - Tratando-se de um contrato intuitu personae, a relação de confiança assume uma relevância acrescida, pelo que não parece razoável que o principal mantenha uma relação contratual em que as partes já não se revêem num relacionamento degradado e deteriorado pela quebra de um vinculo de recíproca e mútua confiança.
Decisão Texto Integral:

Recorrentes: AA, S.A.”   

Recorrida: “BB – Indústria de Calçado, Lda.” e “CC – Indústria de Calçado, Lda.

I. – Relatório

Irresignada com a decisão proferida na apelação que havia sido interposta da decisão prolatada na 1.ª instância [[1]] que decidiu: “Julgar improcedente o recurso da autora; Julgar procedente o recurso das RR”, e, assim, “[revoga-se] em parte a decisão apelada, retirando desta a condenação das Rés no pagamento à autora da indemnização de clientela”, recorre, de revista, a A., “AA, S.A.”, havendo a considerar para o presente recurso os sequentes: 

I.1. – Antecedentes processuais e motivação da pretensão.

AA, SA, com sede em ..., B... M... France, 44700 Orvault, França, instaurou acção declarativa (de condenação), com processo ordinário, contra BB, Indústria de Calçado, Lda.” com sede na Rua ... de M..., ..., ..., A... e CC, Indústria de Calçado, Lda.”, com sede em C... da I..., E..., peticionando que sejam a ré BB condenada a pagar à autora a quantia de € 43.529,84, de comissões em dívida e € 119.317,21 de indemnização de clientela, bem como € 49.086,66 de indemnização por falta de fundamento da resolução do contrato de agência – ou, entendendo-se que o contrato se manteve em vigor, as comissões relativas às vendas posteriores à resolução, aos clientes angariados pela autora, a liquidar em execução de sentença – e € 21.256,00 de comissões indevidamente deduzidas pela ré, tudo no total de € 264.245,08; e, ser a ré CC a pagar à A. € 14.542,73 de comissões em dívida, € 854,74 dos respectivos juros de mora, como ainda € 44.663,26 de indemnização de clientela, € 24.543,34 de indemnização por falta de fundamento de resolução do contrato de agência – ou, entendendo-se que o contrato se manteve em vigor, as comissões relativas às vendas posteriores à resolução do contrato, aos clientes angariados pela autora, a liquidar em execução de sentença –, € 7033 de comissões indevidamente deduzidas pela ré no total de € 91.637,07; a isto deverão acrescer juros à taxa legal.

Alegou que, em 30 de Janeiro de 1986, o administrador da autora celebrou um contrato de agência no sector do calçado com DD, Lda.

Os sócios daquela firma adquiriram pouco depois participações sociais no capital social das 2.ª rés. EE promoveu então por conta das rés, a venda de calçado no mercado francês, e ainda nos mercados belga e suíço.

Em 1996 EE constitui a AA SA e devido à actividade da autora as vendas das rés tiveram um grande incremento, e o seu nome e os seus produtos ficaram conhecidos nesses mercados.

Com a data de 3 de Julho de 2002 e recebidas a 7 de Julho, as rés enviaram à autora cartas semelhantes a resolver o contrato de agência com efeitos imediatos, sendo certo que a fundamentação apresentada para fazer cessar os contratos de agência é falsa e há muito por elas conhecida e certamente há mais de 30 dias.

Aponta, por fim os montantes das comissões em dívida e da indemnização de clientela.

Contestaram (em 381.º artigos), de forma conjunta, as rés, impugnando os fundamentos da acção e classificando como excepção situações factuais de difícil qualificação, dada a acrasia factual e dispersão cronológica com que a motivam, mas, seguramente, alegando que a firma DD, Lda. não teve qualquer intervenção no acto de constituição da ré BB, sendo que aquela firma e os seus sócios também não participaram na constituição da ré CC.

Mais alega que os termos do acordo celebrado entre a BB e a AA não foram reduzidos a escrito, o mesmo sucedendo no acordo celebrado entre CC e a autora.

Peroram acerca da lei aplicável para concluir que, tanto a lei francesa como a lei português, propinam o direito de resolução para os casos de grave e reiterada violação dos deveres essenciais do contrato de agência – cfr. fls. 81 a 83 - terminando por estimar que a acção deverá ser parcialmente procedente e as RR condenadas a pagar à A. as quantias a título de comissão de serviço referentes ao ano de 2002, no montante de € 43.160,00 , quanto à Ré  BB, e  € 14.542,77, quanto à ré CC. 

Em sede de pedido reconvencional, pedem a autora seja condenada a pagar à ré BB a quantia indemnizatória de € 286.689,49 e à ré CC o montante de € 257.066,31, bem como, condenar a autora a pagar às rés os montantes a apurar em execução de sentença, quanto aos ganhos ilicitamente obtidos por aquela, nos termos genéricos alegados e ainda naqueles que se vierem a apurar na fase instrutória em complemento e concretização daqueles.

Tais quantias advém de condutas levadas a cabo pela autora violadoras de deveres contratuais e que fundamentaram a declaração de resolução do contrato de agência mencionado, e das quais resultaram prejuízos avultados para cada uma das rés.

Mais pretende a condenação da ré BB o montante em dívida de € 17.095,00 pela venda de mercadorias não pagas, acrescida de juros de mora vencidos no valor de € 1674,77 e vincendos até efectivo e integral pagamento.

Por fim, pedem a condenação da autora como litigante de má fé, em multa condigna e indemnização a cada uma das rés em valor não inferior a € 7500,00.

Remata pedindo a compensação dos créditos que venham a ser declarados pela procedência parcial do pedido com o que vier a ser reconhecidos à Ré.

Replicou a autora, insistindo que os factos em que se basearam a resolução do contrato eram sabidos há mais de 30 dias, impugnando os fundamentos da reconvenção, afirmando ainda que a é a lei portuguesa que deve ser aplicada, concluindo a final pela improcedência da reconvenção.

Foi elaborado despacho saneador tendo sido relegado para final o conhecimento das excepções deduzidas – cfr. fls. 709 a 735 -, vindo a ser realizado julgamento, com decisão da matéria de facto - cfr. fls. 1307 a 1320.

Da decisão ser proferida – cfr. fls. 1322 a 1355 - interpuseram recurso de apelação, tanto a autora como as rés, tendo a Relação eleito como thema decidendum dos recursos: “A) - Do recurso da Autora: 1) - Impugnação da decisão de facto; Resolução do contrato – Ausência de motivo; B) - Do recurso das RR.: Violação do disposto no art. 33.º-3 do DL n.º 178/86, (Regime Jurídico do Contrato de Agência) – Pagamento das indemnizações de clientela à autora.

A final veio a ser prolatada decisão em que se julgou: “(…) improcedente o recurso da autora; (…) procedente o recurso das RR”, e, assim, “[revoga-se] em parte a decisão apelada, retirando desta a condenação das Rés no pagamento à autora da indemnização de clientela.”

É do assim decidido que vem interposto, pela A., o presente recurso de revista, para o que se considerarão os acervos conclusivos que a seguir quedam transcritos: 

I.2. – Quadro Conclusivo.

“A) - Os únicos factos relevantes para decidir sobre a licitude da resolução do contrato são os ocorridos nos últimos trinta dias relativamente à resolução, e esses não a justificam;

B) - Na parte final da duração do contrato, em especial após a reunião de Maio de 2002, a relação tinha-se de facto degradado, as partes estavam incompatibilizadas, já se comportavam como se estivesse irremediavelmente comprometida, as Rés já tinham inclusive enviado o Sr. FF a França visitar os clientes angariados pela A;

C) - Neste concreto contexto a menor colaboração – pois alguma foi dada, como ficou provado – da A não assume o carácter de gravidade que as Rés artificialmente lhe quiseram atribuir, e não justifica a resolução dos contratos;

D) - Acresce que as Rés não pagavam então comissões à A. que foram condenadas agora a pagar, pelo que face a esse incumprimento das Rés dessa sua obrigação principal, não estava a A. obrigada a cumprir as suas obrigações – art. 428.º do Código Civil;

E) - Não foi pois feita uma correcta aplicação do art. 30.º do citado Dec. Lei n.º 178/86, pois no caso vertente a resolução foi infundada e ilícita, devendo as Rés ser condenadas a pagar as indemnizações pedidas a esse titulo, de 49.086,66 € e 24.543,34 €.

F) - Em consequência do que ficou alegado nas alíneas anteriores, e por não haver culpa da A justificativa da resolução dos contratos, deverão as Rés ser condenadas a pagar à A. indemnização de clientela pedida, no montante de 119.317,21 relativamente à Ré BB e de 44.663,26 € relativamente à Ré CC, nos termos do art. 33.º do DL. 178/86, de 3 de Julho.

Termos em que o Recurso deve merecer provimento e revogado o douto Acórdão recorrido, sendo a Ré BB condenada a pagar a quantia de 49,086,66 € por resolução ilícita e 119.317,21 € a titulo de indemnização de clientela, e a Ré CC condenada a pagar a quantia de 24.543,34 € por resolução ilícita do contrato e 44.663,26 € a título de indemnização de clientela, com juros de mora e demais consequências legais (…),”

Contra-alegaram as recorridas, tendo condensado a fundamentação no sequente epítome conclusivo;

I) A recorrente procura justificar a sua conduta anti-negocial com a alegada falta de colaboração das recorridas, sem que lhe caiba razão. Nomeadamente:

II) procura motivar a sua conduta no alegado estado de "degradação e impasse em que as relações entre as partes se encontravam".

III) Ora, sendo certo que a recorrente foi confrontada com um conjunto de factos e suspeitas que indiciavam a violação dos deveres contratuais – o que abalou a confiança essencial à boa prossecução da actividade económica em apreço,

IV. A verdade é que não poderá aceitar-se, por ser incompatível com as regras da experiência comum e a lógica negocial inerente à relação de agência, que a relação comercial mantida entre as partes cessou abrupta e imediatamente, na reunião de Maio de 2002.

V. É certo que havia conhecido melhores dias, mas é igualmente verdade que todo o esquema negocial das recorridas girava em torno da recorrente, quer ao nível da preparação e desenvolvimento das colecções, quer ao nível da prospecção do mercado.

VI. Por isso, mais do que expectável, seria exigível que a recorrente cumprisse os seus deveres contratuais, nomeadamente colaborando no desenvolvimento da colecção de Primavera/Verão 2003 e participando nas feiras de MOCAP e RIVA deI GARDA naquele ano de 2002, em representação das recorridas, tal como habitual, o que efectivamente não aconteceu.

-B –

VII. - Note-se também que a recorrente insiste ter sido substituída na sua função de agente comercial das recorridas, logo após a reunião de Maio de 2002, sem que, ainda assim, consiga fundamentar tal conclusão.

VIII. -    É que o estilista FF sempre acompanhou o René nas viagens a Portugal, colaborando e participando nas reuniões de preparação das colecções, assim como participando activamente nas feiras nacionais e internacionais, como parte da equipa comercial das recorridas.

IX. Pelo que, mais do que uma solução 'natural', a sucessão de FF como agente das recorridas, logo em Setembro de 2002, impôs-se como a única solução possível após a perda abrupta e inesperada da recorrente.

X. A alternativa surgiu aliás como um mal menor para fazer frente, no mais curto espaço de tempo, às dificuldades que se adivinhavam.

- C-

XI. Invoca ainda a recorrente a irrelevância do seu comportamento anti-negocial, pretendendo fazer crer que a sua conduta é objectivamente insignificante, atento todo o circunstancialismo inerente à relação negocial mantida com as recorridas.

XII. Não pode agora a recorrente procurar desvalorizar toda uma panóplia de circunstâncias objectivamente censuráveis e reprováveis, demonstrativas do incumprimento reiterado e grave dos seus deveres contratuais.

X III. Alude-se, nomeadamente, à i) falta de colaboração na realização dos modelos e na preparação das colecções; ii) bem como à promoção e venda de produtos concorrentes, em violação do dever de exclusividade; e iii) até, bem mais grave do que isso, à traição às recorridas, consubstanciada na colocação de modelos das suas colecções de calçado em empresas da concorrência, para aí serem produzidos a custos mais baixos e depois serem por elas vendidos aos próprios clientes das recorridas,

XIV. O que originou a perda de confiança das recorridas na recorrente, e inviabilizou a continuidade da relação comercial.

XV. A recorrente bem sabia, até pela sua experiência como agente comercial, que estavam em causa condutas proibidas por lei.

XVI. Tendo em conta os FACTOS PROVADOS e considerando a posição do Tribunal a quo em relação ao bom fundamento material das resoluções contratuais operadas, mostra-se inequivocamente prejudicada a pretensão da recorrente, no que concerne às peticionadas indemnizações de clientela (neste sentido Ac. TRL de 05-05-2008 e Ac. STJ de 20-01-2010, Proc. n.º 312/2002.C1.S1, Relator Mário Cruz).

XVII. Pelo que deverá manter-se na íntegra o acórdão recorrido (…)”.

I.3. – Questões a merecer apreciação.

A). Contrato de agência; Resolução do contrato; Indemnização (de clientela).

II. – FUNDAMENTAÇÃO.

II.A. – DE FACTO.

Após reapreciação da decisão de facto a que procedeu o Tribunal da Relação, tem-se por adquirida o sequente quadro factológico.

“A) O A. dedica-se à actividade de agente no sector de calçado.

B) As RR. dedicam-se à indústria de calçado, produzindo a R. “BB”  exclusivamente calçado de senhora e a R. “CC” exclusivamente calçado de senhora e calçado de criança.

C) Em 30 de Janeiro de 1986 o Sr. EE, administrador da A., celebrou com a firma “DD, Lda.” um contrato de agência no sector de calçado.

D) Tinha direito a uma comissão de 7%, salvo acordo daquela firma para comissão diferente.

E) Devido ao facto das RR. terem gerentes e sócios comuns era usual a A. (e antes o Sr. EE) tratarem em conjunto de todos os assuntos e problemas comuns.

F) Com a data de 3 de Julho de 2002, e recebidas a 7 de Julho, as RR. enviaram à A. cartas semelhantes a resolver o contrato de agência com efeitos imediatos.

G) As RR. acusaram a A. de ter estado praticamente ausente do stand delas na Feira de MOCAP, no Porto.

H) As RR. acusaram também a A. de não ter estado nas suas instalações a preparar a colecção da estação de Verão 2003.

I) Acusaram-na ainda de ter chegado ao conhecimento delas correspondência com encomendas para as firmas GG e HH, em que a A. seria agente.

J) Não tem a A. direito às comissões referentes aos contratos posteriores à resolução do contrato.

L) Para a estação primavera / verão 2002 a A. tinha vendido 68.000 pares da Ré BB e auferido 62.900 Euros de comissões, e tinha vendido 61.000 pares da Ré CC e auferido 33.855 Euros de comissões.

M) Quanto à R. “BB”, está em dívida o total de comissões de € 43.160,00, conforme conta-corrente abaixo descriminada:

Junho 2002 Comissão 4% (Nota de Crédito n.º L0602/01)..... 752,00 €; Junho 2002 Comissão 5% (Factura n.º L0602/02) …… 24.498,00 €; Julho 2002 Comissão 2% (Factura n.º L0702/01) …… 3.297,00 €; Julho 2002 Comissão 5% (Factura n.º L0702/02) ___ 4.783,00 €; Agosto 2002 Comissão 4% (Factura n.º L0802/01) …… 680,00 €; Agosto 2002 Comissão 5% (Factura n.º L0802/02) …… 959,00 €; Setembro 2002 Comissão 2% (Factura n.º L0902/01) ……4.709,00 €; Setembro 2002 Comissão 5% (Factura n.º L0902/02) …… 1.847,00 €; Outubro 2002 Comissão 3% (Factura n.º L1002/01) ……. 468,00 €; Outubro 2002 Comissão 4% (Nota de Crédito n.º L1002/02) …….. 11,00 €; Outubro 2002 Comissão 5% (Factura n.º L1002/03) ……… 3.529,00 €; Novembro 2002 Comissão 4% (Nota de Crédito n.º L1102/01) ….. 437,00 €; Novembro 2002 Comissão 5% (Nota de Crédito n.º L1102/02) …… 181,00 €; Dezembro 2002 Comissão 4% (Nota de Crédito n.º L1202/02) …… 229,00 €.

N) Quanto à R. “CC, está em dívida o total de comissões de € 14.542,73, conforme facturas abaixo descriminadas: Julho 2001 Comissão 3% (Factura n.º J0107/03) ……81,73 €; Julho 2002 Comissão 3% (Factura n.º J0802/01) …… 4.935,00 €; Agosto 2002 Comissão 2,5% (Factura n.º J0802/02) …… 2.832,00 €; Agosto 2002 Comissão 3% (Factura n.º J0802/02) ……. 1.533,00 €; Setembro 2002 Comissão 2,5% (Factura n.º J0902/01) …… 2.035,00 €; Setembro 2002 Comissão 3% 8Factura n.º J0902/02) …… 2.121,00 €; Outubro 2002 Comissão 2,5% (Factuar n.º J1002/01) …… 1.233,00 €; Outubro 2002 Comissão 3% (Factura n.º J1002/02) …… 53,00 €; Dezembro 2002 Comissão 2,5% (Nota de Crédito n.º J1202/02) …… 281,00 €.

O) Em 14 e 15 de Abril de 2002, o gerente das RR., II, e dois seus funcionários, JJ e LL, deslocaram-se a Nantes (França),

P) Tendo visitado diversas sapatarias para averiguar das tendências da moda, contactado com clientes e reunido com EE e FF, para iniciar todo o processo de preparação da época Primavera/Verão do ano 2003.

Q) Em 21 de Maio de 2002, EE apresentou-se nas instalações da BB.

R) No dia 13 de Julho de 2002, a AA enviou à BB e CC uma última missiva, junta, com a contestação, como Doc. 423 e que aqui se dá por integralmente reproduzida.

S) Entre 14 e 19 de Junho de 2002, teve lugar a Feira internacional de calçado RIVA SCHUH, de Riva del Garda.

T) A AA esteve presente com um stand nessa Feira RIVA SCHUH de Riva del Garda, sendo que, como todos os anos, o A. alugou, à sua custa um stand para si, nessa feira, tendo reservado um quarto no hotel para o sr. II (sócio-gerente das RR) e as RR. não lhe enviaram colecções.

U) Na feira seguinte, a MOCAP, que decorreu na Exponor de Matosinhos, de 27 a 29 de Junho, a BB e a CC, tal como aconteceu nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, estiveram presentes com um stand próprio, onde exibiram as suas colecções de calçado para a época Primavera/Verão de 2003.

V) Como foi prática constante nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, no stand BB/CC da Feira da MOCAP de Junho de 2002, além dos responsáveis e funcionários do sector comercial da BB e CC, esteve sempre presente FF.

X) Em 3 de Julho de 2002, a BB enviou à A. uma carta registada com aviso de recepção, que esta recebeu, com o seguinte teor (Docs. 424 e 425):

Arrifana, 3 de Julho de 2002

Assunto: Cessação do contrato em razão de faltas graves

Exmos Senhores,

Vimos pela presente comunicar a V. Exas. a cessação do contrato de agência, pelo qual a v/ sociedade tem desempenhado as funções de nosso agente no mercado francês, em virtude do v/ incumprimento grave e reiterado das obrigações contratuais a que se encontram adstritos, nos termos previstos pelo art. 11, § 5 da Lei n.º 91-593 du 25 Junho 1991, vigente em França, e do art. 30.º do Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de Julho, vigente em Portugal.

Os factos, de que temos provas, que de seguida motivarão a presente resolução do contrato revelam que V. Exas. violaram os deveres de lealdade, boa-fé, exclusividade e sigilo a que se encontravam obrigados e, com isso, puseram em causa irremediavelmente o interesse comum e a confiança que sustentavam o contrato que nos tem ligado.

Os seguintes factos mostram que V. Exas. têm promovido a produção e comercialização de calçado de empresas nossas concorrentes junto dos nossos clientes e, ainda mais grave, lhes têm fornecido modelos das nossas colecções para que os produzam:

É de nosso conhecimento que vários dos nossos modelos do Inverno 2001 foram produzidos pela firma PP.

Em 18-04-2002, recebemos um fax de um outro cliente em que constava uma ordem de encomenda dirigida não apenas à CC e à BB, mas também a uma empresa designada HH.

Factos mais recentes mostram ainda um desinteresse de V. Exas. na promoção dos nossos produtos e ainda a impossibilidade de V. Exas. promoverem com qualidade a nossa próxima colecção, devido à v/ ausência nos momentos essenciais da sua preparação e divulgação:

Assim, ao contrário do que foi prática corrente nos anos anteriores, entre 3 e 14 de Junho últimos, V. Exas. não compareceram nas nossas instalações para a preparação da colecção do Verão de 2003.

. Em virtude dessa ausência, no v/ stand da feira de Riva del Garda, do passado mês de Junho, pela primeira vez não se encontrava exposto nenhum produto de colecções nossas, o que pôs inevitavelmente em causa a divulgação dos nossos produtos no mercado.

. Na feira da MOCAP, dos passados dias 27 a 29 de Junho, V. Exas. estiveram praticamente ausentes do nosso stand, não realizando a actividade de promoção que lhes competia, tendo sido, além disso, notória a v/ presença regular em stands de outros fabricantes, nomeadamente no stand da fábrica de calçado GG.

A v/ conduta, espelhada nos factos enunciados, traduziu-se numa clara, grave e reiterada violação dos v/ deveres contratuais e constitui justificação bastante para a cessação do n/ contrato de agência.

Declaramos, nestes termos, não pretender continuar a manter a relação contratual que convosco desenvolvemos nos últimos anos. Solicitamos, por isso, a V. Exas. que de futuro não realizem quaisquer iniciativas de promoção dos nossos produtos, quer se refiram a colecções passadas ou futuras.

Solicitamos ainda a devolução de todo o nosso material que se encontra na v/ posse.

Com os melhores cumprimentos,

A Gerência “.

Z) Na mesma data, em 03 de Julho de 2002, a CC enviou à A. uma carta registada com aviso de recepção, que esta recebeu, com o seguinte teor (Docs. 426 e 427 aqui dados por integralmente reproduzidos):

“ Arrifana, 3 de Julho de 2002

Assunto: Cessation du contrat en raison de fautes graves

Exmos Senhores,

Vimos pela presente comunicar a V. Exas. a cessação do contrato de agência, pelo qual a v/sociedade tem desempenhado as funções de nosso agente no mercado francês, em virtude do v/ incumprimento grave e reiterado das obrigações contratuais a que se encontram adstritos, nos termos previstos pelo art. 11, § 5 da Loi n.º 91-593 du 25 Juin 1991, vigente em França, e do art. 30.º do Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de Julho, vigente em Portugal.

Os factos, de que temos provas, que de seguida motivarão a presente resolução do contrato revelam que V. Exas. violaram os deveres de lealdade, boa-fé, exclusividade e sigilo a que se encontravam obrigados e, com isso, puseram em causa irremediavelmente o interesse comum e a confiança que sustentavam o contrato que nos tem ligado.

Os seguintes factos mostram que V. Exas. têm promovido a produção e comercialização de calçado de empresas nossas concorrentes junto dos nossos clientes e, ainda mais grave, lhes têm fornecido modelos das nossas colecções para que os produzam:

Em 09-02-2001, foi-vos enviado meio par de um modelo para que promovessem a sua comercialização pela cadeia MM. Não obstante não nos ter sido solicitada a sua produção, viemos a verificar que esse modelo foi objecto de comercialização pela MM, na época de Inverno 2001-2002, tendo sido produzido pela indústria de calçado NN.

Em 29-08-2001, recebemos, de um cliente, um fax dirigindo uma nota de encomenda de modelos da nossa colecção a um Sr. OO, da firma GG, de M... de P..., aparecendo a v/ empresa na posição de intermediária.

Em 18-04-2002, recebemos um fax de um outro cliente em que constava uma ordem de encomenda dirigida não apenas à CC e à BB, mas também a uma empresa designada HH.

Factos mais recentes mostram ainda um desinteresse de V. Exas. na promoção dos nossos produtos e ainda a impossibilidade de V. Exas. promoverem com qualidade a nossa próxima colecção, devido à v/ ausência nos momentos essenciais da sua preparação e divulgação:

Assim, ao contrário do que foi prática corrente nos anos anteriores, entre 3 e 14 de Junho últimos, V. Exas. não compareceram nas nossas instalações para a preparação da colecção do Verão de 2003.

Em virtude dessa ausência, no v/ stand da feira de Riva del Garda, do passado mês de Junho, pela primeira vez não se encontrava exposto nenhum produto de colecções nossas, o que pôs inevitavelmente em causa a divulgação dos nossos produtos no mercado.

Na feira da MOCAP, dos passados dias 27 a 29 de Junho, V. Exas. estiveram praticamente ausentes do nosso stand, não realizando a actividade de promoção que lhes competia, tendo sido, além disso, notória a v/ presença regular em stands de outros fabricantes, nomeadamente no stand da fábrica de calçado GG.

A v/ conduta, espelhada nos factos enunciados, traduziu-se numa clara, grave e reiterada violação dos v/ deveres contratuais e constitui justificação bastante para a cessação do n/ contrato de agência.

Declaramos, nestes termos, não pretender continuar a manter a relação contratual que convosco desenvolvemos nos últimos anos. Solicitamos, por isso, a V. Exas. que de futuro não realizem quaisquer iniciativas de promoção dos nossos produtos, quer se refiram a colecções passadas ou futuras.

Solicitamos ainda a devolução de todo o nosso material que se encontra na v/ posse.

Com os melhores cumprimentos,

A Gerência”.

A1) Durante o ano 2002, a BB vendeu à AA calçado no valor de €17.095,00.

A2) Essas vendas realizadas a pronto pagamento pela BB à AA foram tituladas pelas facturas: n.º 120.337 de 23-4-2002, no valor de 2.837,50 (Doc. 454); n.º 120.358 de 21-5-2002, no valor de 12.997,5 (Doc. 455); e n.º 120.668, de 17-10-2002 no valor de € 1.260,00 (Doc. 456).

A3) Facturas essas que não foram pagas até hoje e cujo valor total de €17.095,00 é devido pela AA.

A4) De Agosto de 1997 a 3 de Julho de 2002, a AA, foi agente comercial da CC, por acordo verbal celebrado entre ambas, não reduzido a escrito, no mercado francês, cabendo-lhe promover neste mercado a comercialização do calçado da colecção CC, desenvolvida em colaboração da própria AA e de FF.

A5) O corte radical provocado pelas RR. teve como consequência que a A. tivesse uma estação praticamente perdida, porque não a pôde preparar.

A6) A comissão devia ser paga ao Sr. EE logo que os clientes pagassem o preço do calçado vendido.

A7) Os sócios da “DD, Lda.” e a própria firma, adquiriram pouco depois participações sociais no capital social das duas RR., das quais se tornaram também gerentes.

A8) O Sr. EE alargou então a sua actividade de agente às duas Rés, nas mesmas condições.

A9) A partir de então promoveu por conta das RR. a venda de calçado  essencialmente no mercado francês, mas também no belga e no suíço.

A10) Assim como promoveu, com o conhecimento das RR., a venda de calçado de outras fábricas, quer portuguesas quer estrangeiras.

A11) Em Agosto de 1996 foi constituída a “AA SA”, de que é gerente QQ, esposa de EE, tendo este cedido à A. a sua posição de agente das RR. com o acordo delas.

A12) Foi nos moldes definidos nos artigos anteriores que se iniciaram e desenvolveram as relações entre as RR. e o Sr. EE, e se mantiveram quando este sucedeu à A..

A13) Devido à actividade da A. as vendas das RR. tiveram incremento.

A14) As RR. escreveram à A. as cartas referidas em X) e Z), nas quais comunicaram à A. a cessação do contrato de agência.

A15) As RR. tiveram conhecimento dos factos por si alegados nas cartas enviadas à A., aludidas em X) e Z), nas datas referidas naquelas cartas como da ocorrência de cada caso concreto ali relatado.

A16) A feira ocorreu uma semana antes da data em que a carta de resolução do contrato foi redigida.

A17) No stand daquela feira encontrava-se o sr. FF, que trabalhava para as RR. como estilista.

A18) O sr. FF já tinha ido a França junto de clientes angariados pela A.

A19) O sr. EE esteve nas instalações das RR. em 21 de Maio de 2002 a tratar de assuntos de interesse comum à A. e às RR.

A20) Já antes, em Abril, se tinha encontrado em reunião de trabalho em França com o representante das RR.

A21) As RR. tinham um estilista que se encarregava da preparação da colecção.

A22) A A. tinha tido o cuidado de entregar às R. R. fotografias e desenhos com sugestões de modelos.

A23) Apesar de a A. não estar impedida de representar outras fábricas, nalguns casos isso aconteceu, com o conhecimento das RR., como por exemplo com a fábrica GG.

A24) As vendas em conjunto das RR, angariadas pela A., foram em 1996 de 201.000 pares e em 2001 de 429.334.

A25) A A. angariou para as RR. novos clientes, fez aumentar as vendas e as RR. tiraram e vão continuar a tirar benefícios desses clientes angariados pela A.

A26) Em relação à R. “BB”, as comissões auferidas pela A. são as seguintes:

- entre 1/6/96 e 30/09/97, € 224.763,60; - entre 1/10/97 e 30/09/98, € 139.938,33; - entre 1/10/98 e 30/09/99, € 68.895,43; - entre 1/10/99 e 30/9/99, € 85.238,21; - entre 1/10/2000 e 30/09/2001, € 101.913,14; - entre 1/10/2001 e 30/09/2002, € 173.113,16.

A27) Em relação à Ré CC, as comissões auferidas pela A. são as seguintes:

- entre 1/6/96 e 30/09/97, € 5.711,62; - entre 1/10/97 e 30/9/98, € 15.358,86; - entre 1/10/98 e 30/09/99, € 36.635,56; - entre 1/10/99 e 30/09/2000, € 68.081,44; - entre 1/10/2000 e 30/09/2001, € 78.807,20; - entre 1/10/2001 e 30/09/2002, € 73.882,88.

A28) Desde Junho de 1996 até à resolução do contrato, em 3 de Julho de 2002, a A. facturou à Ré BB pelo menos o valor de € 769.960,25, tendo a Ré BB pago à A. pelo menos a quantia de € 768.131,62.

A29) Entre 1 de Outubro de 1997 até à resolução do contrato, em 3 de Julho de 2002, a A. facturou à Ré CC pelo menos o valor de € 255.642,12, tendo a Ré CC pago à A. pelo menos a quantia de € 254.497,94.

A30) De Junho de 1996 a 3 de Julho de 2002, a AA, através de acordo verbal, não reduzido a escrito, a A. foi agente comercial da BB no mercado francês, cabendo-lhe promover neste mercado a comercialização do calçado da colecção BB, desenvolvida em colaboração da própria AA e de FF.

A31) Entre a BB e a AA não foi acordada nenhuma comissão supletiva de 7%, nem qualquer outra taxa de comissão, nem foi acordado algum prazo genérico de pagamento, estabelecendo-se antes uma prática casuística, que variava de contrato para contrato.

A32) Entre a CC e a AA não foi acordada nenhuma comissão supletiva de 7%, nem qualquer outra taxa de comissão, nem foi acordado algum prazo genérico de pagamento, estabelecendo-se antes uma prática casuística, que variava de contrato para contrato.

A33) À AA cabia promover no mercado francês a comercialização do calçado das colecções da BB e da CC, desenvolvidas em colaboração da própria AA e de FF.

A34) Essas colecções BB e CC eram desenvolvidas a partir dos modelos desenhados e propostos pelo estilista FF, com a colaboração activa da AA.

A35) Fora do âmbito do contrato de agência ficavam os modelos de calçado da BB e da CC que não tivessem resultado da colaboração com a AA e FF.

A36) Fora do âmbito do contrato de agência, no sentido de que a respectiva comercialização não seria promovida pela AA, ficavam os modelos de calçado da BB e da CC que não tivessem resultado da colaboração com a AA e FF.

A37) Foi sempre assumido pelas partes que o âmbito geográfico do contrato de agência seria o território francês, não obstante nas feiras internacionais de RIVA SHUH, em Riva Del Garda, a AA promover o calçado das colecções da BB e da CC a todos os clientes que aparecessem independentemente da nacionalidade.

A39) Os serviços que a AA se obrigou a prestar, e que efectivamente prestou nos anos 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, compreendiam uma colaboração activa no desenvolvimento das colecções de calçado, que passava por dar conta à BB e à CC das tendências do mercado, sugerindo novos modelos, colaborando na elaboração dos modelos e protótipos das colecções, e transmitindo às RR. as sugestões e críticas dos clientes, intervindo nas várias fases de desenvolvimento e comercialização da colecção.

A40) Durante os meses de Abril e Maio de cada um dos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001 era agendada e realizada uma reunião de trabalho em Portugal ou em França entre os responsáveis da BB e CC, EE e FF para delinear o plano geral da preparação da colecção Primavera/Verão do ano civil seguinte e traçar as respectivas estratégias.

A41) Durante os meses de Outubro e Novembro de cada um dos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, era agendada e realizada uma reunião de trabalho em Portugal ou em França entre os responsáveis da BB e CC, EE e FF para delinear o plano geral da preparação da colecção do Inverno do ano civil seguinte e traçar as respectivas estratégias.

A42) O sr. EE, em representação da A., participava nessas reuniões de preparação das colecções onde estavam ainda presentes II, gerente das RR., LL, director do departamento comercial, e eventualmente outros funcionários da BB e CC, e FF, estilista responsável pelo desenho e concepção dos modelos e protótipos de sapatos das colecções das RR.

A43) Nessas reuniões, FF apresentava já aos outros presentes as ideias que tinha em mente para a época respectiva, mediante esboços, desenhos e fotografias.

A44) Só nas reuniões subsequentes é que os intervenientes discutiam então a viabilidade técnica e comercial de cada modelo, os seus componentes (nomeadamente solas e peles) e escolhiam, enfim, os modelos que deveriam integrar a colecção.

A45) EE tinha um papel activo nessas reuniões de trabalho, dando sugestões, formulando críticas e emitindo opiniões sobre os modelos em particular e a colecção em geral.

A46) Terminadas as reuniões, os trabalhos de desenvolvimento da colecção continuavam com contactos frequentes entre as três partes envolvidas no desenvolvimento da colecção (BB / CC, a A., na pessoa de EE, e FF), fazendo a A retorno (feedback) da receptividade do mercado e transmitindo a predisposição dos clientes para a celebração de contratos para a época respectiva.

A47) Na duas/três semanas que antecediam a primeira feira de calçado dessa época, as partes (BB / CC, a A., na pessoa de EE, e FF) voltavam a reunir-se nas instalações da BB para ultimar as colecções da BB e da CC a apresentar nas feiras RIVA SHUH, de Riva del Garda, Itália, e da MOCAP, na Exponor de Matosinhos, que se seguiriam.

A48) Deste modo, no início de Junho dos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, EE e FF apresentavam-se nas instalações da BB, onde em reuniões com os responsáveis da BB e da CC apreciavam os resultados até aí obtidos, desenvolviam os últimos trabalhos sobre os protótipos dos sapatos e faziam uma selecção final das amostras dos modelos da colecção Primavera/Verão do ano civil seguinte a expor e exibir nas feiras de calçado internacionais que se seguiriam.

A49) Da mesma forma, no início de Janeiro dos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, EE e FF apresentavam-se nas instalações da BB, onde em reuniões com os responsáveis da BB e CC apreciavam os resultados até aí obtidos, desenvolviam os últimos trabalhos sobre os protótipos dos sapatos e faziam uma selecção final das amostras dos modelos da colecção de Inverno do ano civil seguinte a expor e exibir nas feiras de calçado internacionais que se seguiriam.

A50) Nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, as colecções da Primavera/Verão da BB e da CC eram expostas no mês de Junho, em primeiro lugar, na Feira RIVA SCHUH de Riva del Garda, no stand da AA, e depois na Feira da MOCAP, na Exponor, no stand BB/CC.

A51) Nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, a colecção de Inverno da BB era exposta no mês Janeiro, em primeiro lugar, na Feira RIVA SCHUH de Riva del Garda, no expositor comercial da AA, e depois na feira da MOCAP, na Exponor de Matosinhos, no stand BB / CC.

A52) Na Feiras RIVA SHUH de Riva del Garda de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, além das colecções BB e CC do ano seguinte, eram exibidas ainda modelos de calçado das colecções BB e CC das épocas anteriores.

A53) Nas feiras da MOCAP realizadas nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001 a A. esteve presente, de forma continuada e regular, no stand da BB / CC, recebendo os clientes e outros convidados, apresentando a colecção e os respectivos preços, tomando conhecimento das preferências manifestadas pelos clientes, recebendo as suas sugestões, críticas, contrapostas de preço e quantidade, tudo com vista ao objectivo último de comercialização das colecções de sapatos das RR.

A54) Na MOCAP os stands de exposição são de acesso reservado aos clientes habituais ou potenciais clientes convidados para o efeito tendo locais apropriados e distintos de entrada e de saída, com vista a, por uma lado, impedir que os concorrentes possam copiar e imitar as amostras apresentadas e, por outro lado, criar um ambiente de calma e serenidade necessários à prossecução das finalidades referidas supra no último artigo.

A55) Uma frutuosa actividade de agência comercial e o desempenho profícuo dessa função pressupõem que o agente comercial estabeleça contactos e entabule conversações e negociações com os clientes nas feiras do sector onde se encontram expostos os produtos do seu representado.

A56) Em meados do ano de 2001, a BB e a CC tiveram, pontualmente, suspeitas de que a AA promovia calçado de empresas concorrentes.

A57) A A. entregou às fábricas de calçado portuguesas “RR & Cª. Lda.” (que produz o calçado de merca “GG”) e “HH, Calçados, Lda.” e à fábrica portuguesa que faz o calçado da marca “PP” modelo das colecções BB e CC para nelas serem produzidos.

A58) A produção desses modelos nas referidas fábricas ocorreu a preços mais baixos daqueles que são praticados pelas RR., pois essas fábricas não tiveram que suportar quaisquer custos com a concepção dos modelos respectivos, limitando-se a produzi-los.

A59) A A. produziu modelos das colecções do Inverno de 2001 da BB e da CC na firma PP – INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE CALÇADO, LDA..

A60) Em 16-1-2001, a A. enviou para a CC um pedido de envio de uma amostra do modelo P... N/B ARIB 001 para ser proposto à cliente MM por um preço entre 110 e 115 Francos Franceses.

A61) Logo depois, a CC enviou meio par desse modelo para a AA.

A62) A A. entrou posteriormente em contacto com a funcionária SS da CC, procurando saber vários pormenores sobre o modelo P... N/B ARIB 001, em especial sobre as respectivas solas, designadamente, a empresa onde seriam as mesmas produzidas.

A63) Mais tarde, a A. comunicou à CC que a MM rejeitou a proposta pelo preço que lhe foi apresentado.

A64) Quando a AA encetou relações comerciais com as RR. estas sabiam que a AA era a representante em França da sociedade RR & CA., LDA., que produz o calçado de marca GG, para a comercialização de calçado de homem que esta empresa produzia.

A65) Sucede, no entanto, que a RR & CA., LDA., cujo representante é o Sr. OO, produziu calçado de senhora, tendo a A. não só promovido a comercialização desse calçado junto dos clientes das RR., como entregue à RR & CA., LDA modelos das colecções BB e CC, para nela serem produzidos a preços mais baixos.

A66) Assim, em 29-08-2001, o cliente da BB e da CC, TT, com sede em França, realizou com a intermediação da AA uma encomenda de 3 modelos de calçado de senhora à RR & CA., LDA, do Sr. OO, num total de 275 pares, no valor de 4.192,35€.

A67) Na sequência do referido em o) teve lugar a reunião na casa de EE, no seu escritório, onde os presentes verificaram, a existência não só de sapatos das colecções BB e CC, mas também de outros sapatos de senhora e criança que não eram das colecções BB e CC, mas de concorrentes.

A68) A presença de sapatos de senhora e criança que não eram da colecção BB e CC, mas de concorrentes provocou surpresa na comitiva portuguesa acima referida, tendo II manifestado à A. reprovação e desagrado por tal facto.

A69) Em face da reprovação e censura do II o Sr. EE afirmou que tal não significava nada e tinha pouca importância.

A70) No dia 18 de Abril de 2002, foi recebido no equipamento de fax da CC um documento, junto com a contestação sob o n.º 410 e que aqui se dá por integralmente reproduzido, expedido pelo cliente francês da BB e CC, UU, tendo como destinatário EE, com conhecimento a CC, BB e HH, no qual se faz referência a uma encomenda para a época de Inverno 2002, estando a firma HH associada às firmas CC e BB e a uma encomenda para a época de Inverno 2002, estando a firma HH associada às firmas CC e BB.

A71) Poucos minutos após a recepção do fax, o representante legal da A., EE, telefonou para as instalações da CC, para falar com a funcionária SS a quem pediu que rasgasse o fax referido no artigo anterior ou que apagasse o nome da fábrica HH.

A72) Não obstante a recusa da funcionária SS em aceder aqueles pedidos de EE, este telefonou variadas vezes nesse dia insistindo para que a funcionária não mostrasse o dito fax a II.

A73) Apesar daquelas insistências, SS entregou o fax a II e deu conhecimento a EE de que tinha posto II ao corrente da situação.

A74) A A. não interagiu nem com as RR. nem com FF no desenvolvimento das colecções BB e da CC para a época Primavera/Verão de 2003.

A75) EE em 21/05/2002 esteve nas instalações da BB a tratar de um assunto relacionado com uma encomenda da “VV”, cliente das RR., tendo participado numa reunião com II e com o representante dessa firma.

A76) Nesse mesmo dia 21 de Maio de 2002, o representante das RR., II, e EE tiveram uma outra reunião, em que participaram também JJ e LL, tendo aí o II confrontado a A. com os factos acima referidos, ou seja, a recepção do fax da UU em que se fazia referência à fábrica HH (Doc. 410) e o alheamento da A. dos trabalhos preparatórios das colecções Primavera/Verão de 2003, ao qual o legal representante da A. admitiu perante os presentes, II, JJ e LL, ter entregue modelos das colecções da BB e CC à sociedade HH – CALÇADOS, LDA. para que esta os produzisse.

A77) Em face da admissão deste facto por EE, II frisou a gravidade da situação, lamentando-a e questionando até que ponto estariam ainda reunidas as condições para que BB e CC pudessem manter relações comerciais com a AA numa base de confiança, tendo EE considerado que a viabilidade de uma normal e salutar relação comercial de agência se encontrava comprometida.

A78) A partir do encontro de 21 de Maio de 2002 a A. deixou de dar apoio que as RR. necessitassem para a preparação da colecção.

A79) A A. não compareceu às sessões de trabalho decorridas entre 3 e 14 de Junho nas instalações da BB, para apreciação dos resultados até aí obtidos, realização dos últimos trabalhos sobre os protótipos dos sapatos e selecção final das amostras dos modelos das colecções da Primavera/Verão 2003 a expor e exibir nas feiras de calçado “Riva Shuh” e “Mocap” que se seguiriam.

A80) A AA enviou, com data de 3 de Junho de 2002, por fax e por carta registada com aviso de recepção, a seguinte missiva, cujo teor se reproduz parcialmente, na qual comunicou às RR. o seguinte (Doc. 411):

“Serve a presente para reclamar os pagamentos das facturas de comissões de Setembro, Dezembro 2001, Janeiro, Fevereiro, Março e Abril 2002.

Na sequência da nossa conversa de 21 de Maio de 2002, que me declararam não mais desejar a continuação da nossa colaboração, não receberão qualquer proposta da minha parte enquanto aquelas comissões não sejam regularizadas.

Tendo em conta a antiguidade das facturas supramencionadas, não desejo, em caso de não pagamento nos melhores prazos, ter de me dirigir a um serviço de contencioso.

Em anexo os mapas relativos às ditas facturas.

Sinceros cumprimentos”.

A81) Em 7 de Junho de 2002, a BB e CC enviaram à A. por fax e por carta registada com aviso de recepção, a seguinte missiva, cujo teor se reproduz, na qual comunicou às RR. o seguinte (Docs. 412, 413 e 414)

“ 1 – O débito reclamado referente ao mês de Setembro corresponde às vendas feitas a XX. Relembramos a V. Exa. que tem em seu poder os cheques que aquele emitiu a nosso favor, no valor de 18.492,10 Euros.

2 – As comissões relativas de Dezembro vão pagas em correio separado.

3 – Relativamente às comissões relativas aos meses de Janeiro a Abril, serão pagas habitualmente, não havendo quaisquer motivos para a chamada de atenção.

Aproveitamos a oportunidade para referir a situação relacionada com a ZZ, que insiste em dizer que devolveu parte da mercadoria para as vossas instalações sem que V. Exas. tivessem prestado qualquer esclarecimento acerca do paradeiro dessa mercadoria.

5 – Finalmente, não podemos deixar de sublinhar que na nossa conversa de 21 de Maio de 2002, apenas vos informamos que tivemos conhecimento de informações a respeito da vossa prática comercial, as quais constituem motivos para perda de confiança – tal não pode existir entre nós.

6 – Face à longevidade da nossa colaboração, foi abordada na aludida reunião a possibilidade da rescisão amigável, como forma de evitar situações menos agradáveis.

7 – De todo o modo, e ao contrário do que afirma no seu fax foi apenas discutida essa possibilidade.

8 – Naturalmente que, na falta de acordo, não deixaremos de agir em defesa dos nossos legítimos interesses.

Com os melhores cumprimentos.”

A82) Em 10 de Junho de 2002, a AA voltou a dirigir-se à BB e CC, enviando-lhe, por fax e carta registada com aviso de recepção, uma missiva, cujo teor se reproduz, em que lhes comunicou o seguinte (Doc. 415):

Em relação às comissões de Dezembro de 2001, V. Exas. não responderam ao meu pedido de 3 de Junho de 2002 (carta registada com aviso de recepção), a saber, o pagamento das comissões em atraso de Janeiro, Fevereiro e Março de 2002.

Em caso de as mesmas não serem pagas em oito dias, tomarei as medidas procedimentais que se imponham.

Na expectativa, recebam, minha Senhora, meu Senhor, os meus melhores cumprimentos.”.

A83) A esse fax de 10-6-2002 da AA, responderam BB e CC em 12 de Junho de 2002, por fax e por carta registada com aviso de recepção, através de missiva, cujo teor se reproduz, em que comunicaram à AA o seguinte (Doc. 416 e 417):

“Em resposta ao vosso FAX de 10 de Junho de 2002, informamos V. Exas.:

1 – Os pagamentos das comissões de Janeiro, Fevereiro e Março serão regularizados nos prazos normais e habituais e conforme à prática estabelecidas entre V. Exa. e a nossa empresa. Não compreendemos a vossa reacção.

2 – Continuamos à espera da vossa resposta a propósito da “ZZ”, como referimos já no ponto 4 do nosso último FAX.

3 – Como calcula, precisamos dessas informações para o acerto de contas.

4 – Aproveitamos a oportunidade para manifestar a nossa estranheza pela ausência de V. Exa. nas nossas instalações para acompanhar como devia – e como é hábito –a preparação da nossa colecção.

Se V. Exa. está a pensar demitir-se, lembramos que nos deverá esclarecer de imediato.

Saudações sinceras”.

A84) Nesse mesmo dia, 12 de Junho de 2002, a AA enviou novo fax dirigido a BB e CC, respondendo ao fax de 7-6-2002 de BB / CC, em que comunicou a estas o seguinte (Doc. 418) :

“No seguimento da V/ carta de 7/06/2002, venho por este meio apresentar os seguintes esclarecimentos:

Parágrafo 1: XX

Lamento que não tenham contactado a AAA para este cliente . Este enviou-me 3 (três) cheques para nos assegurar. O da CC já foi creditado e aguardo ainda o acordo do cliente para vos enviar os 2 cheques que faltam. Continuo a seguir de perto o cliente.

Parágrafo 4: ZZ

Sempre vos avisei das devoluções efectuadas por ZZ e facturaram-mas. Também quererão dar-me os detalhes da mercadoria que mencionam?

Na expectativa, meu Senhor, apresento os meus melhores cumprimentos.”.

A85) Ainda no dia 12-6-2002, a AA enviou um outro fax dirigido a BB e CC, respondendo ao fax que estas haviam enviado nesse dia 12-06-2002, em que comunicou à BB e CC o seguinte (Doc. 419):

“Em resposta ao vosso fax de 12 de Junho de 2002,

Parágrafo 1:

Lembro que os prazos de pagamento das comissões dependem das entradas em caixa dos pagamentos dos clientes e não da minha boa vontade acordada ocasionalmente ou do vosso bem querer.

Exemplos:

UU 120002, de pagos a 60 dias data da recepção seja 15/03X03/01/02 de 18140.00

BBB 120003 pagos a 10 dias seja 13/01/02X03/01/02 de 5723.00

VV 120004 pagos a 60 dias seja fim de MarçoX03/01/02 de 45304.07

UU 120008, de pagos a 60 dias data da recepção seja 15/03X09/01/02 de 142250.00

VV 120010 pagos a 60 dias seja 31/03X10/01/02 de 27639.61

VV 120011 pagos a 60 dias seja fim de MarçoX10/01/02 de 6688.00

UU 120019, de pagos a 60 dias data da recepção seja 15/03X15/01/02 de 27150.00

CCC 120023 pagos a 10 dias seja 27/01/2002X17/01/02 de 20754.01

DDD 120024 pagos a 20 dias seja 07/02X17/01/02 de 34909.01

UU 120029 pagos a 60 dias seja fim de MarçoX23/01/02 de 173850.00

EEE 120030 pagos a 40 dias seja fim de FevereiroX23/01/02 de 26446.66

ZZ 120031 pagos a 10 dias seja 05/02X23/01/02 de 17484.75

UU 120034, de pagos a 60 dias data da recepção seja 31/03X30/01/02 de 77200.00

VV 120035 pagos a 60 dias seja 31/03X30/01/02 de 3344.00

VV 120036 pagos a 60 dias seja 31/03X31/01/02 de 15343.61

FFF pagos a 60 dias seja 31/03X120042 31/01/02 de 23251.61

Todas estas deram entrada em caixa entre 31 deXfacturas de um montante de 665.477,72 Janeiro e 31 de Março. Aceito um pagamento até ao fim de Abril mas estamos a 12 de Junho

– considero uma falta grave das vossas obrigações contratuais.

Não é por vos reclamar as comissões que me são devidas que devem imaginar que me demito, a menos que atrasem voluntariamente estes pagamentos para me forçarem ao contencioso.

Resposta parágrafo 4:

Para a preparação da colecção Primavera/Verão 2003 forneci elementos, fotos, ao Sr. II e estou surpreendido por não ter recebido mais do que 3 amostras até hoje.

Mantenho-me ao vosso dispor para receber esta colecção e apresentá-la como em todas as épocas na exposição RIVA SCHUH de RIVA DEL GARDA de 14 a 19 de Junho de 2002.

A partir de agora, será necessário que mas expeçam directamente ao meu Hotel em Itália.

Hotel Bristol

Viale Trento 71

38066 Riva del Garda

Nesta expectativa,

Receba, Senhor, as minhas saudações.”.

A86) No dia 13 de Junho de 2002, a BB e CC enviaram, por fax e por carta registada com aviso de recepção, um última missiva para a AA, em que comunicaram à A. o seguinte (Docs. 420, 421, 422):

Arrifana, 13 de Junho de 2002

Assunto: BB / CC Resposta ao Parágrafo 4

Estranhamos a V/ resposta, visto V. Exa. saber que no início de cada colecção tem sempre agendada uma reunião em França e Portugal com Sr. FF, o responsável pelo desenvolvimento da colecção, em colaboração com o nosso agente Sr. EE e a fábrica, com o objectivo de programar a colecção para apresentá-la directamente aos nossos clientes ou nas feiras nacionais e internacionais. Salientamos que este é o procedimento habitual. Tal situação não se verificou e vai causar certamente graves prejuízos. Onde estão os elementos e informações relativos aos clientes e mercados indispensáveis para o desenvolvimento da nossa colecção?

Pensamos que se trata de uma falta muito grave da vossa parte.

Quanto ao envio da nossa colecção para a feira de RIVA SCHUH de RIVA DEL GARDA, a decorrer nos próximos dias 14 a 19 de Junho, tal é verdadeiramente impossível, pelos motivos acima referidos.

Em relação às fotos entregues ao Sr. II, apenas uma das fotos foi objecto de tratamento para o desenvolvimento de 3 protótipos que nós vos enviamos. As restantes 6 fotos deveriam ser alvo de discussão com V. Exa. nas reuniões habituais. Entretanto, perguntamos a V. Exa. se, tendo em conta os procedimentos habituais, V. Exa. acha que estamos no bom caminho para desenvolver a colecção?

Saudações distintas.”.

A87) Ao contrário do que aconteceu nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, as colecções BB e CC não se encontravam expostas no stand da AA na Feira Internacional de Calçado Riva Shuh, de Riva del Garda.

A88) A ausência de EE dos trabalhos de preparação da colecção da Primavera/Verão de 2003 e o facto de este se ter colocado à margem desse processo atrasou o desenvolvimento da colecção e impossibilitou que a BB e CC pudessem ter os seus modelos de calçado exibidos na feira Feira RIVA SCHUH de 14 a 19 de Junho de 2002.

A89) Não obstante, II, gerente das RR., e JJ, que se deslocaram a Itália para visitar essa feira, verificaram que no stand da AA estavam expostos modelos de sapatos de senhora e criança.

A90) Modelos de sapatos esses que não faziam parte das colecções BB e  CC.

A91) Ao contrário do que sucedeu nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, a AA não exibiu no seu stand da feira RIVA SCHUH de Junho de 2002 modelos das colecções BB e CC para o ano seguinte, dado que estas colecções não estavam ainda prontas devido à falta de colaboração da A..

A92) Ao contrário também do que sucedeu nos anos de 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, a AA nem sequer exibiu no seu stand da feira RIVA SCHUH de Junho de 2002 modelos das colecções BB e CC dos anos anteriores.

A93) Desse modo poderia ter sido assegurada a visibilidade dos produtos BB e CC na feira RIVA SCHUH de Junho de 2002 e, por essa via, ter sido promovida a comercialização de modelos BB e CC.

A94) Assim, os clientes habituais da BB e CC e eventuais potenciais clientes em vez de terem oportunidade de no stand da AA, agente comercial da BB e CC, observarem amostras de calçado BB e CC, como aconteceu nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, acabaram antes por observar modelos de colecções de sapatos de senhora e criança de empresas concorrentes, cuja comercialização foi promovida pela AA.

A95) A Feira RIVA SCHUH é uma das mais importantes feiras internacionais do sector do calçado, na medida em que a ela acorrem empresas de todo o mundo, sendo nela que em muitos casos os compradores têm a oportunidade de pela primeira vez observarem as colecções futuras dos produtores de calçado, que as expõem pela primeira vez.

A96) FF esteve presente no stand BB / CC da Feira da MOCAP de Junho de 2002, como nos outros anos, na qualidade de estilista das colecções das empresas.

A97) Ao invés do que aconteceu nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, a AA, na pessoa do seu representante EE, limitou-se a passar fugaz e esporadicamente pelo stand BB / CC, com o mero propósito de cumprimentar os presentes, logo se afastando do stand.

A98) Ao contrário do sucedido nos anos de nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, a AA, na pessoa do seu representante EE, não esteve presente, de forma continuada e regular no stand da BB / CC, não recebeu os clientes e outros convidados, não apresentou a colecção e comunicou os respectivos preços, não tomou conhecimento das preferências manifestadas pelos clientes, não recebeu as suas sugestões, críticas, contrapostas de preço e quantidade, não promoveu, em suma, a comercialização das colecções de calçado das RR..

A99) Durante esta feira da MOCAP, EE passou a maior parte do tempo no stand da RR & CA., LDA., que além de calçado de homem, produz também calçado de senhora e criança.

A100) Durante a feira da Mocap EE ao circular pelos corredores e encontrar clientes da BB e CC procurou e conseguiu leval alguns desses clientes ao stand da sociedade “RR e Ca.Lda”.

A101) A pessoa que estava no stand das RR. na Feira da Mocap era FF, o qual é o estilista que há anos colaborava com as RR. e com EE no desenvolvimento e comercialização das colecções de calçado.

A102) Era por ser o estilista das RR. e não por realizar qualquer actividade comercial de vendas que FF se encontrava no stand BB / CC da MOCAP de Junho de 2002 e em França mantinha contactos, como sempre aconteceu, com os clientes das RR..

A103) As actividades levadas a cabo pela A. anteriormente dadas como provadas repercutiram-se nas vendas da BB e da CC das épocas de 2002 e 2003 no mercado francês, em termos de diminuição de facturação.

A104) O número total de pares vendidos, através da A., pelas RR., teve a seguinte evolução: - 1996, 201.000 pares; - 1997, 226.065 pares; - 1998, 201.917 pares; - 1999, 230.854 pares; - 2000, 245.568 pares; - 2001, 429.334 pares.

A105) As RR. substituíram a A. na tarefa de vender para o mercado francês.

A106) As colecções com que o A. desenvolvia a sua actividade eram criadas em Portugal.

A107) As reuniões de trabalho entre as partes tinham lugar em Portugal, na sede das RR., e também em França.”

II.B. – DE DIREITO.

II.B.1. – Contrato de agência; Resolução do contrato; Indemnização.

II.B.1.a). – Contrato de Agência.

O contrato de agência integra-se dentro de uma concepção mais ampla dos designados contratos de distribuição comercial, ou seja uma classe de contratos que têm com finalidade ou traço comum “[o] servir de via estável para lograr a distribuição de bens e serviços no mercado permitindo uma certa integração (mais ou menos intensa segundo a figura) do distribuidor na rede do fabricante.” Dentro da categoria geral de distribuição comercial, para além da designada distribuição directa, inclui-se a distribuição indirecta veiculando esta diversas formas de intermediação que os bens e os serviços percorrem entre o fabricante e o consumidor final.

O contrato de agência, que durante muito tempo, andou paredes meias com o contrato de comissão autonomizou-se, normativamente, tendo passado a constituir uma forma de o empresário “[nomear] um empresário que, em forma jurídica e economicamente independente, se dedica profissionalmente a captar clientela para o empresário principal, ou mediante a simples promoção ou por meio da conclusão de contratos por conta e em nome e no interesse daquele.” [[2]]     

O contrato de agência mercantil será definido como aquele mediante o qual um empresário independente, chamado agente, em troca de remuneração, assume de maneira permanente o encargo de preparar ou celebrar contratos com terceiros por conta e em nome de outro empresário, denominado principal.” [[3]

Como traços definidores do contrato de agência poder-se-ão escrutinar os seguintes: a) é um contrato duradouro ou de trato sucessivo na medida em que as prestações comprometidas pelas partes servem causalmente a necessidades de colaboração estável; b) configura-se com um negócio para a promoção ou celebração de outros negócios (segundo o que seja o âmbito das faculdades conferidas, se distinguirá entre o agente meramente promotor de negócios e o agente com poderes de contratação com terceiros. O primeiro ocupar-se-á de promover activamente no mercado os bens e serviços cuja gestão lhe haja sido encomendada, quedando obrigado a transmitir ao dominus os pedidos que obtenha com efeito de que aquele decida rechaçar ou celebrar por si mesmo cada um dos negócios propostos. O segundo, para além de se encarregar da tarefa anteriormente indicada, terá a faculdade de celebrar por si mesmo os negócios como representante do principal. Em ambos os casos o agente actuará por conta e em nome do principal); c) a relação estabelecida entre principal e agente não se assemelha em modo algum à que medeia entre um empresário e um auxiliar. O agente será um empresário cuja profissionalidade se caracteriza precisamente por fazer da agência a sua actividade económica habitual, pondo a sua própria empresa à disposição da colaboração com o principal; d) é um contrato intuitu personae, sendo exigível de ambas as partes uma colaboração baseada na confiança recíproca; e) é um contrato mercantil, atendendo à actividade característica dos agentes, notando-se a sua condição de empresários cujo tráfico de empresa consiste na colaboração estável com outros empresários. [[4]]

No âmbito do contrato de agência constituem obrigações do agente: a) promover e/ou concluir negócios no interesse do principal. (O agente contrai a obrigação de se esforçar em promover ou concluir, segundo os casos, todos os negócios que sejam possíveis em nome e por conta do principal); b) defender os interesses do principal. (Constitui-se ou orienta-se no sentido de garantir a prevalência do interesse do principal no desenvolvimento da gestão realizada pelo agente e que conleva projecções especificas, a saber: 1) uma obrigação positiva do agente em actuar de tal maneira que melhorem os resultados económicos do estabelecimento do principal; 2) uma obrigação negativa do agente se abster de condutas que possam acarretar danos para o principal e de modo especial abster-se de competir com o principal, dedicando-se por conta própria ao mesmo género de empresa ou, de modo indirecto, aceitando gerir interesses de um competidor do principal; c) cumprir as instruções do principal (outorgamento pelo principal da faculdade de ditar ao agente as condições das operações realizadas com terceiros); d) prestar informações ao principal, tanto informações que sejam solicitadas por este, com da sua própria iniciativa, cumprindo assim a obrigação própria de quem assume um encargo de gestão baseado na confiança que nele deposita o titular do interesse; e) de manter segredo, ou seja uma obrigação de lealdade para com o interesse empresarial do principal, devendo abster-se de utilizar ou comunicar segredos do estabelecimento representado e conhecidos pelo exercício da agência; f) desempenho pessoal da agência; g) de restituição do que haja recebido em razão do cargo; h) de cooperação na execução dos negócios celebrados.                  

Do mesmo passo constituem como obrigações típicas do principal: a) a de pagar a retribuição ao agente (que pode revestir uma retribuição fixa ou variável, sendo esta a mais corrente por representar a forma de remunerar o agente de acordo ou em proporção dos resultados da sua actividade de promoção ou de celebração de negócios); b) a de facilitar ao agente os elementos necessários para o desempenho da sua gestão ou obrigação de assistência que comporta a exigibilidade da entrega ao agente de todos os elementos necessários para o exercício eficaz da sua actividade empresarial. [[5]]

Para além destes elementos caracterizadores e definidores do contrato e das correspectivas obrigações do agente e do principal podem ser adidas clausulas especiais, como sejam a agência de zona, a agência com exclusividade a favor do agente, a agência a favor do principal e a agência com pacto de garantia. Quanto á primeira – agência de zona – por ter alguma atinência com o caso em questão verificava-se, segundo “[a] doutrina mais autorizada, inspirando-se no HGB alemão, (…) quando o agente tinha reconhecido o direito a duas categorias de comissão: i) comissões por negócios em cuja realização tivesse intervindo (“comissões directas”); ii) comissões por negócios em cuja realização não tivesse intervindo directamente com clientes estabelecidos na sua zona (“comissões indirectas”). Na agência de zona assim caracterizada o principal conservava a faculdade de celebrar directamente negócios com clientes estabelecidos na zona ao preço a abonar a quem era seu agente nela das comissões indirectas estipuladas. A sua funcionalidade económica residiria na necessidade de compensar “o prévio labor de introdução dos produtos na zona realizada indiscutivelmente pelo representante e que engendra a seu favor um direito económico que se estende sobre todas as operações ulteriores que são consequência daquela actividade. Quando o agente permanecesse inactivo , limitando-se a desfrutar a renda das comissões indirectas, incorreria em incumprimento do contrato, com as conhecidas consequências.” [[6]

Na doutrina indígena o contrato de agência é caracterizado como sendo um contrato bilateral e oneroso que comporta como elementos essenciais: a) a obrigação de o agente promover a celebração de contratos; b) por conta de outrem; c) dotado de autonomia relativamente ao principal; d) com carácter de estabilidade; e) e prestado mediante retribuição. [[7]]

Na normação indígena o contrato de agência é regulado pelo Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de Julho, tendo sofrido uma alteraçãopelo Decreto-Lei n.º 118/93, de 13 de Abril.

De harmonia com o artigo 1.º, n.º 1 do citado diploma legal a agência é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover por conta da outra a celebração de contratos, de modo autónomo e estável e mediante retribuição, podendo ser-lhe atribuída certa zona ou determinado círculo de clientes. Nos termos do artigo 2.º do mencionado diploma legal o agente só pode celebrar contratos em nome da outra parte se esta lhe tiver conferido, por escrito, os necessários poderes.

Constituem-se, pois, elementos essenciais do contrato de agência, a obrigação de o agente promover a realização de contratos por conta do principal, com durabilidade e autonomia, e de o segundo pagar ao primeiro determinada remuneração, designada comissão, bem como prestar-lhe todos os elementos necessários ao desenvolvimento da sua actividade.

Trata-se, pois, de um negócio oneroso, sinalagmático, mediante o qual uma das partes – o agente –, actuando por conta e em nome da outra – o principal –, em regime de colaboração estável, não necessariamente exclusiva, desenvolve autonomamente uma actividade de promoção dos bens do principal, angariando clientela e consolidando zonas de mercado, podendo, se para tal estiver devidamente mandatado celebrar contratos em nome e no interesse do principal. [[8]]

Em face da matéria adquirida para os autos, maxime os enunciados fácticos indicados sob os n.ºs A30, A33 e A39 – anota-se que da decisão de facto relatada supra constam diversos itens repetidos ou de sentido similar que deveriam ter sido objecto de um melhor joeiramento e selecção – não quedam dúvidas de que estamos perante um contrato de agência. Na verdade, de acordo com os supra enunciados fácticos, a autora comprometeu-se a, na zona em que actuava, a promover o calçado produzido pelas rés, angariando clientes e colaborando na preparação das colecções que deviam ser expostas em feiras e mercados da especialidade. Por essa actividade a Autora era remunerada, mediante uma percentagem aleatória e fixada casuisticamente, dependendo do volume de negócios promovido e/ou os contratos celebrados.

Tratava-se assim de um contrato de agência mercantil cuja regulação se encontra estabelecida no diploma supra indicado.      

II.B.1.b). - Resolução do Contrato.

A autora pede, em síntese apertada, que seja considerada ilícita a resolução do contrato que lhe foi comunicada pelas Rés através das missivas que lhe enviaram datadas de 3 de Julho de 2002.

Para a A. a relação negocial tinha-se deteriorado a partir de Maio de 2002 pelo que o desfecho fatal da relação e a sua consequente ruptura se tornava inevitável, atento o comportamento conflituante que estava a ser adoptado e assumido nos contactos que entretanto estavam a ser estabelecidos entre os dois contraentes. A existir culpa na extinção da relação contratual ela deverá ser assacada a ambas as partes e não só à demandante, como decidiu o acórdão revidendo.

A extinção do contrato de agência, para além dos contratos com tempo de duração pactuado, podem, no caso de não ter sido convencionado tempo de duração, ou seja tratando-se de contrato por tempo indeterminado ou de duração indefinida, pode ser efectivado mediante denúncia (artigo 28.º do Dec. Lei 178/86) ou resolução (artigo 30.º do citado diploma legal), sendo que neste caso a extinção da relação contratual pode ocorrer nos contratos por tempo determinado.

A resolução do contrato pode ocorrer: a) por iniciativa de qualquer das partes; b) pode ocorrer tanto no caso dos contratos por tempo indeterminado como por tempo determinado; c) carece (ao contrario do que acontece com a denúncia) de pré-aviso; d) pode ocorrer a qualquer momento (enquanto o contrato se mantiver vigente); d) o pressuposto habilitante para o exercício da resolução ocorrerá “quando a outra parte faltar ao cumprimento das suas obrigações, quando pela sua gravidade e reiteração, não seja exigível a subsistência do vínculo contratual”. “A legitimação para o exercício da faculdade resolutória corresponderá à parte que tenha padecido com o incumprimento e que pelo seu lado não tenha incumprido o que lhe estava incumbido; em principio, procederá o exercício da faculdade resolutória frente ao incumprimento de uma obrigação de carácter principal ou frente a uma obrigação de carácter acessório (por exemplo em matéria de informação) que possua relevância suficiente na economia da relação para justificar o uso deste remédio definitivo; (…) que o incumprimento adquira um carácter grave, ainda que pareça mais a acertada a posição que prefere examinar, em cada caso concreto, “se pode falar-se de incumprimento e de acção resolutória contra os princípios ditados pela boa fé.” [[9]]     

 A lei exige com causa ou razão motivadora da faculdade ou do exercício de resolução do contrato de agência que a conduta assumida pelo incumpridor se revele grave e reiterada de modo a tornar inviável a manutenção do vínculo contratual.

Ficou provado que o Autor a partir de determinado altura – cfr. enunciados fácticos sob os n.ºs A65; A66; A68; a76; A77; A78; A79; A89 a A94 [[10]] – passou a violar de forma grave, com seja o caso de transferir para outra firma concorrente das Rés na área do calçado, modelos de calçado para serem produzidos pela firma concorrente a preços mais baixos, passando a deixar de comparecer às reuniões para programarem e projectarem as novas colecções e as feiras onde essas colecções seriam expostas para promoção e venda.

Resulta provado que a A. não exercia em exclusividade a actividade promotora para as Réus, mas se assim era, afigura-se-nos não revelar um comportamento adequado e correcto promover, dentro da mesma área de produção e venda, produtos de outras empresas concorrentes. Ainda assim esta não seria a violação de obrigações mais gravosa no amplexo ou na economia da relação contratual. Aquela que se nos afigura ser efectivamente, uma grave violação do dever de confiança e lealdade é a passagem para firmas e empresas concorrentes dos modelos de sapatos de senhora e criança que viriam a ser produzidos por essas empresas em concorrência com a empresa principal. Esta violação dos deveres da agente justifica, em nosso juízo, pela gravidade que assume, a faculdade do exercício de resolução previsto pelo artigo 30.º, al. a) do Dec. Lei 178/86.

Acresce que tratando-se, como se caracterizou supra de um contrato intuitu personae a relação de confiança assume uma relevância acrescida, pelo que não parece razoável que o principal mantenha uma relação contratual em que as partes já não se revêem num relacionamento degradado e deteriorado pela quebra de um vinculo de recíproca e mútua confiança. [[11]]     

II.B.1.c). - Indemnização (de clientela).
Nos termos do artigo 31.º do Dec. Lei 178/86, a declaração resolutiva deve fazer-se mediante declaração escrita à outra parte – cfr. ainda art. 436º nº 1 do C. Civil.
A resolução, como resulta do já exposto, é causa extintiva da relação contratual ou nas palavras do Professor Antunes Varela “a resolução é a destruição da relação contratual, operada por um dos contraentes, com base num facto posterior à celebração do contrato”. [[12]]

O direito à indemnização surge, em caso de incumprimento, e independentemente do direito à resolução do contrato – cfr. artigo 32.º do Dec. Lei n.º 178/86. Não sendo a resolução imputável a qualquer das partes – cfr. al. b) do artigo 30.º do citado diploma legal - é conferível uma indemnização segundo a equidade.

 O direito à indemnização, segundo juízos de equidade, só é atribuível se não ocorrer causa justificativa para a resolução, nos termos da alínea a) do artigo 30.º do Dec. Lei 178/86. Ocorrendo causa justificativa cessa o direito a uma indemnização com base no citado numero 2 do artigo supra citado (artigo 32.º) e por imposição do n.º 3 do artigo 33.º que reza “não é devida indemnização de clientela se o contrato tiver cessado por razões imputáveis ao agente (…)”. “”Em definitivo, a indemnização por clientela não procederá quando o contrato se haja extinguido por resolução promovida pelo principal fundando-se em incumprimento do agente, resultando provado por aquele tanto o próprio incumprimento quanto o seu carácter de fundamento da resolução. […] Verificado o incumprimento do agente que tenha relevância resolutória o artigo 30.º, a) da LCA configura a extinção do contrato pelo principal como uma espécie de carga que lhe será exigível quando queira beneficiar-se do efeito de exclusão indemnizatória. Esta parece ser a interpretação mais fundada. Contudo, convém alguma matização: i) o principal, conhecido suficientemente o incumprimento do agente e desde esse mesmo momento em que se encontre, razoavelmente, em condições de o crer, fará proceder a resolução do contrato. Portanto, não resultará licito que, dando-se as condições indicadas, se omita a resolução, prosseguindo as relações com o agente (…); ii) este critério deverá valer para os supostos nos quais, sendo o vínculo por tempo indeterminado, o principal haja denunciado o contrato (…)”. [[13]]       

Este direito só surge quando se verifiquem os requisitos contidos nas alíneas a) a c) do artigo 33.º do Dec. Lei n.º 178/86 e desde que não resulte excluída pela actuação culposa do agente. Quanto à temática da indemnização de clientela vejam-se os acórdãos deste Supremo Tribunal, tirados nesta secção. [[14]

Tendo ficado provada a licitude da resolução, por culpa imputável ao agente, queda excluído direito a qualquer indemnização, nomeadamente pela angariação ou incremento de clientela, nos termos ao artigo 33.º do Dec. Lei 178/86. [[15]/[16]

III. - DECISÃO.

Na defluência do exposto, acordam os juízes que constituem este colectivo na 1.ª secção, em:

- Negar a revista;

- Condenar o recorrente nas custas.

  

Lisboa, 14 de Fevereiro de 2012.

Gabriel Catarino (Relator)              

António Piçarra                   

Sebastião Póvoas

 

_________________________________

 [1] Queda transcrito o dispositivo da decisão proferida em 1.ª instância.

“a) - Julga-se a presente acção procedente, por provada, e consequentemente:

a. Condeno a Ré BB no pagamento à A. das quantias de € 43.160,00 a que acrescem juros vencidos à taxa legalmente prevista para os juros comerciais desde as datas apostas nas facturas correspondentes até efectivo e integral pagamento; e ainda na quantia de € 119.317,21 a que acrescem juros à taxa legalmente prevista para os juros comerciais desde a citação (conforme peticionado) até efectivo e integral pagamento.

b.  Condeno a Ré CC no pagamento à A. das quantias de € 14.542,73 a que acrescem juros vencidos à taxa legalmente prevista para os juros comerciais desde as datas apostas nas facturas correspondentes até efectivo e integral pagamento; e ainda na quantia de € 44.663,26 a que acrescem juros à taxa legalmente prevista para os juros comerciais desde a citação (conforme peticionado) até efectivo e integral pagamento.

b) - Absolvo as RR. dos demais pedidos contra si formulados.

c) - Condeno a A. no pagamento a cada uma das RR. as quantias indemnizatórias que resultarem do incidente de liquidação a intentar oportunamente, por força das condutas daquela, dadas como provadas de A57) a A 79) e de A)88 a A) 1 02, e que se repercutiram negativamente na facturação destas.

d) - Mais se condena a A. no pagamento à Ré BB da quantia de € 17.905,00 pela venda de mercadorias não pagas, a que acresce juros de mora vencidos no montante de € 1674,77 até à propositura da acção e nos juros vencidos desde essa data e vincendos, até efectivo e integral pagamento, calculados à taxa legalmente prevista para os juros comerciais.

e) - Mais se determina que, se opere, oportunamente, a compensação de créditos entre os montantes devidos à A. e os montantes que se vieram a apurar serem devidos a cada uma das RR. pela A.
f) - No mais, absolve-se a A. do demais peticionado a título reconvencional.”
[2] Cfr. Broseta Pont, Manuel e Martinez Sanz, Fernando, “Manual de Derecho Mercantil. Contratos Mercantiles. Derecho de los Títulos-Valores. Derecho Concursal”, Vol. II, 18.ª Edição, Tecnos, Madrid, 2011, pág. 120-121.    
[3] Cfr. Mercadal Vidal, Francisco, “El Contrato de Agencia Mercantil”, Publicaciones del Real Colégio de España, Bolonia 1998, pág. 104.
[4] Cfr. Mercadal Vidal, Francisco, in op. loc. cit. págs. 105-111. Cfr. ainda Broseta Pont, Manuel e Martinez Sanz, Fernando, “Manual de Derecho Mercantil. Contratos meecantiles. Derecho de los Títulos-Valores. Derecho Concursal”, Vol. II, 18.ª Edição, Tecnos, Madrid, 2011, págs. 122 a 126.
[5] Cfr. Mercadal Vidal, Francisco, in op. loc. cit. págs. 131 a 138.
[6] Cfr. Mercadal Vidal, Francisco, in op. loc. cit. págs. 138 e 139.e Garrigues, Tratado de Derecho Mercantil, Tomo III, vol. 1.º, pág. 565 (citado pelo autor).
[7] Cfr. Pinto Monteiro, António, “Contrato de Agência”, Almedina, Coimbra, 5.ª edição, 2004, págs. 44-52.

[8] Cfr, a este propósito os acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça de 23-02-2010 (Sebastião Póvoas): “A agência – “nomen juris” da representação comercial — é “o contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover por conta da outra a celebração de contratos, de modo autónomo e estável e mediante retribuição, podendo ser-lhe atribuída certa zona ou determinado circulo de clientes” (n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de Julho – alterado pelo DL n.º 118/93, de 13 de Abril). São elementos essenciais a obrigação que o agente tem de, por conta de outrem, promover a celebração de contratos, promoção que, ao contrário do mandato não implica a ulterior outorga, já que, sem mais, o contrato de agência não envolve a prática de actos jurídicos (cf., o artigo 1157.º do Código Civil), ressalvada a situação do artigo 2.º (agente com representação). 5) A indemnização de clientela destina-se a compensar o agente pelos lucros, ou benefícios, que o principal continua a auferir, após a cessação do contrato, com a clientela por aquele angariada. 6) Só é devida se verificados cumulativamente os requisitos do n.º 1 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 178/86 de 3 de Julho (alterado pelo Decreto-Lei n.º 118/93 de 13 de Abril). 7) Tais requisitos são constitutivos do direito à indemnização de clientela, devendo o agente, que quer ser ressarcido daquele dano contratual, alegar e provar os factos que os integram, nos termos do n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil. 8) Constitui matéria de facto da exclusiva competência das instâncias a criação de presunção judicial consistente no afirmar de que a parte beneficiou consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente (alínea b) do n.º 1 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 178/86) quando se lance mão de um juízo de prognose ou verosimilhança para chegar a essa conclusão. 9) A demonstração do requisito da alínea c) do n.º 1 daquele artigo 33.º não implica a prova de um “pagamento” como facto extintivo da obrigação mas a demonstração do “não recebimento” como facto constitutivo de direito à indemnização pelo dano de clientela. 10) A compensação legal (ou unilateral) é uma causa potestativa de extinção de créditos exigindo-se a verificação de três requisitos: reciprocidade de créditos; sua validade, exequibilidade e exigibilidade; homogeneidade (traduzida em idêntica natureza) das prestações.” de  18-03-1996: I- São elementos tipificadores do contrato de agência a obrigação do agente de promover a celebração do contrato, a actuação do agente por conta da outra parte (este contrato integra-se na categoria dos contratos de cooperação, pois o agente defende os interesses do principal), essa actuação numa certa zona geográfica ou num determinado círculo de pessoas, a autonomia do agente (embora integrado na rede de distribuição do principal, tem a possibilidade de organizar livremente a sua própria actividade e o seu próprio trabalho), o carácter de estabilidade da relação contratual entre as parte (é um contrato duradouro e a actividade por si desenvolvida tem natureza empresarial) e a remuneração paga pelo principal ao agente (é contrato oneroso). II- individualizam o contrato de concessão comercial o seu carácter duradouro, a actuação do concessionário em nome próprio e por conta própria, ter como objecto bens produzidos ou distribuídos pelo concedente, a obrigação do concessionário de promover a revenda dos produtos que constituem o objecto do contrato na zona a que o mesmo se refere, a obrigação deste de celebrar, no futuro, sucessivos contratos de compra e do concedente celebrar, no futuro, sucessivos contratos de venda, a obrigação do concessionário de orientar a sua actividade empresarial em função da finalidade do contrato e do concedente de fornecer àquele os meios necessários ao exercício da sua actividade. III – No contrato de comissão, o comissário é um mandatário sem representação, não obstante praticar os actos no interesse e por conta do mandante, actuando em seu nome próprio - executa o mandato mercantil sem menção ou alusão alguma ao mandante, contratando por si e em seu nome, como principal e único contraente. IV – No contrato de mandato, uma das partes obriga-se a praticar um ou mais actos no interesse e por conta do mandante, actuando em seu nome próprio – executa o mandato mercantil sem menção ou alusão alguma ao mandante, contratando por si e em seu nome, como principal e único contraente. IV – No contrato de mandato, uma das partes obriga-se a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra.” e de 03-02-1999: I – Um contrato em que uma das partes, agindo sem autonomia, se obriga à celebração de acordos entre a outra parte e potenciais clientes desta, no ramo de comércio de certo tipo de mercadorias mediante retribuição calculada, fundamentalmente, sobre o montante das vendas da última, competindo-lhe a prospecção do mercado, a difusão dos produtos e a angariação de clientes, é um contrato de prestação de serviços inominado ou atípico, ao qual, de harmonia com o disposto no artigo 1156 do C.Civil, são aplicáveis, com as necessárias adaptações, as regras do mandato, em tudo o que se não encontre especialmente previsto no próprio clausulado e constitua matéria de livre contratação. II - Tal como no "mandato" como contrato matriz, a prestação de serviços, uma vez finda, implica uma relação posterior de liquidação, na qual se insere, com propriedade, a remuneração pelas vendas celebradas antes da extinção do contrato e executadas pela entrega da coisa e pelo recebimento do preço, quer antes quer depois dessa extinção. III – O "nomen juris" do contrato de agência legalmente tipificado e sujeito à disciplina dos Decretos-Lei 178/86 de 3 de Julho e 118/93 de 13 de Abril não se adequa à hipótese negocial configurada em I e II.”
[9] Cfr. Mercadal Vidal, Francisco, in op. loc. cit. págs. 562 a 566.

[10] Quedam transcritos os respectivos enunciados fácticos. “A65) Sucede, no entanto, que a RR & CA., LDA., cujo representante é o Sr. RR, produziu calçado de senhora, tendo a A. não só promovido a comercialização desse calçado junto dos clientes das RR., como entregue à RR & CA., LDA modelos das colecções BB e CC, para nela serem produzidos a preços mais baixos.

A66) Assim, em 29-08-2001, o cliente da BB e da CC, TT, com sede em França, realizou com a intermediação da AA uma encomenda de 3 modelos de calçado de senhora à RR & CA., LDA, do Sr. OO, num total de 275 pares, no valor de 4.192,35€.

A68) A presença de sapatos de senhora e criança que não eram da colecção BB e CC, mas de concorrentes provocou surpresa na comitiva portuguesa acima referida, tendo II manifestado à A. reprovação e desagrado por tal facto.

A76) Nesse mesmo dia 21 de Maio de 2002, o representante das RR., II, e EE tiveram uma outra reunião, em que participaram também JJ e LL, tendo aí o II confrontado a A. com os factos acima referidos, ou seja, a recepção do fax da UU em que se fazia referência à fábrica HH (Doc. 410) e o alheamento da A. dos trabalhos preparatórios das colecções Primavera/Verão de 2003, ao qual o legal representante da A. admitiu perante os presentes, II, JJ e LL, ter entregue modelos das colecções da BB e CC à sociedade HH – CALÇADOS, LDA. para que esta os produzisse.

A77) Em face da admissão deste facto por EE, II frisou a gravidade da situação, lamentando-a e questionando até que ponto estariam ainda reunidas as condições para que BB e CC pudessem manter relações comerciais com a AA numa base de confiança, tendo EE considerado que a viabilidade de uma normal e salutar relação comercial de agência se encontrava comprometida.

A78) A partir do encontro de 21 de Maio de 2002 a A. deixou de dar apoio que as RR. necessitassem para a preparação da colecção.

A79) A A. não compareceu às sessões de trabalho decorridas entre 3 e 14 de Junho nas instalações da BB, para apreciação dos resultados até aí obtidos, realização dos últimos trabalhos sobre os protótipos dos sapatos e selecção final das amostras dos modelos das colecções da Primavera/Verão 2003 a expor e exibir nas feiras de calçado “Riva Shuh” e “Mocap” que se seguiriam.

A89) Não obstante, II, gerente das RR., e JJ, que se deslocaram a Itália para visitar essa feira, verificaram que no stand da AA estavam expostos modelos de sapatos de senhora e criança.

A90) Modelos de sapatos esses que não faziam parte das colecções BB e CC.

A91) Ao contrário do que sucedeu nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, a AA não exibiu no seu stand da feira RIVA SCHUH de Junho de 2002 modelos das colecções BB e CC para o ano seguinte, dado que estas colecções não estavam ainda prontas devido à falta de colaboração da A..

A92) Ao contrário também do que sucedeu nos anos de 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, a AA nem sequer exibiu no seu stand da feira RIVA SCHUH de Junho de 2002 modelos das colecções BB e CC dos anos anteriores.

A93) Desse modo poderia ter sido assegurada a visibilidade dos produtos BB e CC na feira RIVA SCHUH de Junho de 2002 e, por essa via, ter sido promovida a comercialização de modelos BB e CC.
A94) Assim, os clientes habituais da BB e CC e eventuais potenciais clientes em vez de terem oportunidade de no stand da AA, agente comercial da BB e CC, observarem amostras de calçado BB e CC, como aconteceu nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, acabaram antes por observar modelos de colecções de sapatos de senhora e criança de empresas concorrentes, cuja comercialização foi promovida pela AA
[11] Cfr. Pinto Monteiro, António, “Contrato de Agência”, Almedina, Coimbra, 5.ª edição, 2004, pág. 128.
[12] Cfr. Antunes Varela, João, in “Das Obrigações em Geral”, 7ª edição, II Volume, pág. 275.
[13] Mercadal Vidal, Francisco, “El Contrato de Agencia Mercantil”, Publicaciones del Real Colégio de España, Bolonia 1998, págs. 593 a 624 (maxime pág. 614-618)

[14] Cfr. Ac. do STJ de 23-02-2010 (Sebastião Póvoas): “5) A indemnização de clientela destina-se a compensar o agente pelos lucros, ou benefícios, que o principal continua a auferir, após a cessação do contrato, com a clientela por aquele angariada. 6) Só é devida se verificados cumulativamente os requisitos do n.º 1 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 178/86 de 3 de Julho (alterado pelo Decreto-Lei n.º 118/93 de 13 de Abril). 7) Tais requisitos são constitutivos do direito à indemnização de clientela, devendo o agente, que quer ser ressarcido daquele dano contratual, alegar e provar os factos que os integram, nos termos do n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil. 8) Constitui matéria de facto da exclusiva competência das instâncias a criação de presunção judicial consistente no afirmar de que a parte beneficiou consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente (alínea b) do n.º 1 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 178/86) quando se lance mão de um juízo de prognose ou verosimilhança para chegar a essa conclusão. 9) A demonstração do requisito da alínea c) do n.º 1 daquele artigo 33.º não implica a prova de um “pagamento” como facto extintivo da obrigação mas a demonstração do “não recebimento” como facto constitutivo de direito à indemnização pelo dano de clientela. 10) A compensação legal (ou unilateral) é uma causa potestativa de extinção de créditos exigindo-se a verificação de três requisitos: reciprocidade de créditos; sua validade, exequibilidade e exigibilidade; homogeneidade (traduzida em idêntica natureza) das prestações.” Ac. do STJ de 14-06-2011 (Garcia Calejo): “- Num contrato de agência, a indemnização de clientela destina-se, essencialmente, a compensar o agente dos proveitos de que, após a cessação do contrato, poderá continuar a usufruir a outra parte, como decorrência da actividade desenvolvida por aquele. Trata-se de uma indemnização que não tem qualquer relação com o incumprimento contratual do principal, não emergindo de tal incumprimento, traduzindo-se numa forma de evitar um enriquecimento injustificado do principal à custa do agente, na medida em que o seu resultado apenas se reflecte nos contratos que o principal vem a negociar ou concluir com os clientes angariados pelo agente, após a cessação do contrato de agência. II – A indemnização de clientela depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: Ter o agente angariado novos clientes para a outra parte ou aumentado substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente (a); a outra parte poder vir a beneficiar consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente (b); ter o agente deixado de receber qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato, com os clientes referidos nas als. a) e c) do art. 33.º do DL n.º 176/86, de 03-07, na redacção introduzida pelo DL n.º 118/93, de 13-04. III - Uma declaração resolutiva deve fazer-se mediante declaração escrita à outra parte, como resulta do 31.º do referido DL n.º 178/86. A resolução segue o regime geral definido no CC, pelo que se deve entender que se trata de declaração receptícia que se torna eficaz logo que chega ao destinatário, ou é dele conhecida (art. 224.º, n.º 1), tornando-se, então, irrevogável (art. 230.º, n.º 1). IV - No caso a declaração resolutiva realizada através de carta, tornou-se eficaz logo que a ré recebeu o escrito e se inteirou do respectivo conteúdo. Com esta declaração a ré destruiu ou extinguiu a relação contratual. V - A resolução contratual coloca as partes na situação que teriam se o contrato não tivesse sido celebrado, visto que, em princípio, produz os mesmos efeitos da nulidade ou da anulabilidade do negócio (art. 433.º). Só assim não será, se a retroactividade contrariar a vontade das partes ou a finalidade da resolução, não abrangendo, também, esses efeitos as prestações já efectuadas nos contratos de execução continuada ou periódica, excepto se entre estas e a causa da resolução existir um vínculo que legitime a resolução de todas elas (art. 434.º, n.ºs 1 e 2). A resolução, igualmente, ainda que expressamente convencionada, não abrange os direitos de terceiros (art. 435.º). VI - A colocação das partes na situação que teriam se o contrato não tivesse sido celebrado, origina a obrigação de restituição do prestado, sem prejuízo de indemnizar os danos que a parte culpada causou. VII - Reconhece a doutrina tradicional e a jurisprudência maioritária que, em caso de resolução do contrato, a indemnização a considerar será a decorrente do interesse contratual negativo. Existem, porém, autores que defendem que a resolução contratual pode gerar, uma indemnização pelos danos derivados do interesse contratual positivo. VIII - No caso dos autos não será necessário embrenharmo-nos na discussão teórica que este assunto suscita, dado que a solução da questão passa pela não retroactividade da resolução, determinada pela própria lei (art. 434.º, n.º 2), nos contratos de execução continuada ou periódica. IX - O recorrente pede a condenação da ré no pagamento de uma quantia a título de indemnização pelo dano resultante da diminuição da retribuição e aumento dos custos da sua actividade durante o período temporal que indicou, valor que integra o interesse contratual positivo, pois visa colocar o autor na situação em que estaria se o contrato fosse pontualmente cumprido, isto é, sem que a ré efectuasse as alterações contratuais ilícitas referenciadas. X - O contrato de agência, dada a sua natureza, deve ser integrado na categoria de contrato de execução continuada, visto que a prestação (actividade de agente) se prolonga ininterruptamente durante um período mais ou menos longo. Assim, de acordo com o disposto no art. 432.º, n.º 2, a respectiva resolução não abrange as prestações já efectuadas (com a excepção se entre estas e a causa da resolução existir um vínculo que legitime a resolução de todas elas, situação sem aplicação no caso). Decorre, assim, que neste tipo de contratos não devem ser submetidas ao regime da retroactividade, as prestações já realizadas. Estas prestações devem ter-se como subsistentes, pese embora a extinção do negócio. XI - Mantendo-se subsistentes as prestações das partes e provando-se que a prestação da ré foi incorrecta, deverá aplicar-se o regime do cumprimento defeituoso da obrigação pelo que, de harmonia com o princípio geral definido no art. 798.º, todos do CC, o pedido de indemnização que o autor que realizou, terá de proceder. XII - Como o valor do prejuízo não está determinado, o respectivo montante deverá ser calculado em liquidação de sentença, como decorre do disposto no art. 661.º, n.º 2, do CPC. Ac do STJ de 15-04-2004 (Salvador da Costa): 4. O contrato de agência é aquele em que uma das partes - o agente -, actuando por conta e em nome da outra - o proponente ou principal - em regime de colaboração estável, desenvolve, em determinada zona geográfica ou em algum círculo de clientes, uma actividade de prospecção de mercado, captação de clientela, promoção de produtos e ou, com base em poderes especiais conferidos pelo principal, celebra os próprios contratos. 5. A similitude dos contratos de concessão comercial e de agência justifica que ao primeiro se apliquem algumas das normas ao último atinentes, designadamente as relativas à indemnização de clientela e à violação do pré-aviso de denúncia. 6. O direito à indemnização de clientela traduz-se na remoção do ganho obtido pelo principal por virtude do incremento de clientela proporcionado pelo agente e que a este se destinava, na vigência do contrato, a título remuneratório. 7. A relação comercial duradoura de uma dezena e meia de anos, em que uma das partes comprava à outra de vinho por esta produzido, com desconto, e as vendia aos seus clientes, embora em alguns anos sob acordo de preços mínimos, é insusceptível de ser qualificada como contrato de concessão comercial ou de agência. Ac. do STJ de 18-03-2002 “1. O agente tem direito, após a cessação do contrato, a uma indemnização de clientela, desde que estejam preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos. a) o agente tenha angariado novos clientes para o principal ou aumentado substancialmente o volume dos negócios com a clientela já existente; b) o principal venha a beneficiar consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente. c) o agente deixa de receber qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato, com os clientes referidos na alínea a). 2. A indemnização de clientela, é fixada em termos equitativos, dentro dos limites fixados no artigo 34, DL. 178/86, de 3/7, mas se não se apurarem, na acção declarativa, os elementos necessários ao cálculo equitativo, o mesmo deve ser relegado para liquidação em execução de sentença, nos termos do artigo 661, 2, C.P.C..
[15] Cfr. a este propósito o Acórdão deste supremo Tribunal relatado pelo Conselheiro Alves Velho (parte final). “Ac. do STJ de 07-03-2006 (Alves Velho): - O direito à indemnização de clientela nasce após a extinção do contrato, independentemente de qualquer outra indemnização de que o agente seja titular, com a qual será cumulável, desde que concorram os requisitos enunciados no n.º 1 do art. 33º do DL n.º 178/86; - Como do regime da sua atribuição e aquisição resulta, não se trata propriamente de proceder à reparação de danos sofridos pelo agente, mas, antes, de o compensar pelos benefícios ou vantagens que, extinto o contrato, o principal vai continuar a obter com a clientela angariada ou desenvolvida por aquele, seja mediante a transferência directa dessa clientela, seja através de terceiro ou até por via de contrapartidas pecuniárias recebidas pela alienação ou encerramento do negócio; - A indemnização de clientela surge, assim, como que uma "retribuição diferida" destinada a repor o equilíbrio contratual interrompido: - as vantagens, que na vigência do contrato eram comuns a ambas as partes, passam a ser, após a sua cessação, atribuídas apenas ao principal quando e na medida em que este tenha efectivo acesso a clientela angariada pelo agente; - A lei não exige que tenha havido efectiva verificação dos benefícios no património do principal, bastando-se com um juízo de prognose sobre a verosimilhança da respectiva ocorrência; - Mas, por outro lado, não se contenta com a formulação desse juízo de obtenção de benefícios a partir da prova da angariação de novos clientes ou do aumento do volume de negócios; é necessário que se demonstre que os benefícios muito provavelmente auferíveis sejam consideráveis, conceito a preencher ou densificar com recurso a elementos como a natureza e quantidade dos benefícios e ganhos que previsivelmente obterá o principal atribuíveis à actuação do agente; - Exigível, pois, e sempre, para a atribuição da indemnização, a demonstração de factos atinentes à prognose relativa à manutenção dos benefícios e ao seu carácter considerável, demonstração que cabe naturalmente ao agente como matéria constitutiva do direito que reclama. - A resolução contratual deve assentar em convenção ou decorrer de um poder unilateral vinculado, em virtude da verificação de determinadas circunstâncias frustrantes do interesse na execução contratual (incumprimento) ou desequilibradoras das prestações, obrigando-se o autor da declaração resolutiva a alegar e provar o fundamento da destruição unilateral do contrato (arts. 432º, 801.º e 802º C. Civil). O preceituado nos arts. 30º e 31º do Dec.-Lei n.º 178/86 não se afasta desse regime. - Para os efeitos previstos no art. 33º-3 (exclusão da indemnização de clientela se "o contrato tiver cessado por razões imputáveis ao agente"), a lei não distingue a forma de cessação do contrato - por resolução ou por denúncia -, relevando apenas saber se a extinção teve lugar "por razões imputáveis ao agente"; - Assim, a denúncia com justa causa integra, tal como a resolução, fundamento de exclusão do direito à indemnização de clientela.
[16] Cfr. ainda no mesmo sentido o recente acórdão desta secção de 15-12-2011 relatado pelo Conselheiro Paulo Sá, onde se doutrinou que: “I - São elementos típicos do contrato de agência: a obrigação do agente promover a celebração de contratos; a actuação do agente por conta da outra parte; a actuação do agente numa certa área geográfica ou num determinado círculo de pessoas; a autonomia do agente; o carácter de estabilidade da relação contratual entre as partes; a remuneração paga pelo principal do agente. II - Assente que autora e réu mantinham o compromisso de o segundo incentivar, de acordo com o seu critério, mas por conta da primeira, a realização de negócios de venda dos produtos da autora, tendo estabelecido a remuneração e o respectivo prazo de vigência, traduzindo-se o conteúdo da obrigação do réu numa prestação de facto, que consiste na prática dos actos necessários à conquista e desenvolvimento do mercado do principal e à conclusão de contratos, actuação esta que é feita por conta do principal, tendo os actos por si praticados por efeito a esfera jurídica da autora, encontram-se preenchidos os elementos típicos do contrato de agência. III - Tendo ocorrido violação grave do contrato de agência pelo réu, dando desse modo origem à cessação do contrato, fica excluído o direito à indemnização de clientela, nos termos do art. 33.º, n.º 3, do DL n.º 178/86, de 03-07.”