Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2117/18.6T8VRL.G1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO (CÍVEL)
Relator: ABRANTES GERALDES
Descritores: CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA
INCUMPRIMENTO DEFINITIVO
INTERPELAÇÃO ADMONITÓRIA
NÃO RECEBIMENTO
CULPOSO
COMPORTAMENTO CONCLUDENTE
REQUISITOS
DECLARAÇÃO RECETÍCIA
EFICÁCIA
CARTA REGISTADA
DOMICÍLIO
CULPA
NOTIFICAÇÃO JUDICIAL AVULSA
CONDIÇÃO RESOLUTIVA
BOA FÉ
DEVER DE COLABORAÇÃO DAS PARTES
Data do Acordão: 11/11/2020
Nº Único do Processo:
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO
Sumário : I. Na falta de convenção em contrário, a resolução do contrato-promessa de compra e venda depende, em regra, da verificação de uma situação de incumprimento definitivo que, nos termos do art. 808º do CC, pode ser decorrência da verificação da falta de interesse objetivo no cumprimento do contrato ou da falta de cumprimento, depois de efetuada uma interpelação admonitória.

II. A efetivação da interpelação admonitória para verificação de uma situação de incumprimento definitivo é dispensável quando se verifique a recusa antecipada de cumprimento por parte do outro promitente, ou perante a verificação de circunstâncias que, analisadas objetivamente, revelem um comportamento concludente no sentido do incumprimento definitivo do contrato.

III. Nos termos do art. 224º, nº 2, do CC, a declaração negocial recipienda é eficaz quando não seja recebida por culpa do destinatário.

IV. Num contexto em que a promitente-compradora cortou os canais de comunicação que tinham sido acordados no contrato-promessa, recusando os contactos e, designadamente, o recebimento de cartas registadas com aviso de receção enviadas para o domicílio contratual acordado, uma a solicitar-lhe elementos informativos essenciais para o eventual acionamento de condição resolutiva e outra a notificá-la para a outorga da escritura pública, deve ser considerada eficaz, nos termos e para efeitos do art. 224º, nº 2, do CC, a notificação avulsa que foi promovida na mesma morada pela promitente-vendedora, contendo a interpelação admonitória, com indicação de uma segunda data para a celebração da escritura pública e a cominação de que a falta de comparência determinaria o incumprimento definitivo do contrato-promessa, apesar de a promitente-compradora não ter sido encontrada na mesma morada.

V. Independentemente do referido em 4., a situação de incumprimento definitivo justificativa da resolução do contrato resultaria ainda das seguintes circunstâncias:

a) O contrato-promessa de compra e venda foi outorgado em Setembro de 2010, sujeito a uma condição resolutiva dependente da emissão de um parecer desfavorável ao projeto urbanístico pretendido, mas, apesar das sucessivas prorrogações acordadas para a realização da escritura pública, até finais de 2015, a promitente-compradora, a partir de 2016, negou-se a entregar à contraparte a documentação necessária para validar a existência de um parecer desfavorável, malgrado várias insistências;

b) A promitente-compradora não recebeu nem reclamou duas cartas registadas com aviso de receção remetidas em 2017 para o domicílio contratual fixado e, no mesmo domicílio, não foi consumada a notificação avulsa requerida em 2018 e que continha uma interpelação admonitória;

c) Desde meados de 2017, a promitente-compradora deixou de contactar a promitente-vendedora e deixou de receber quaisquer notificações e interpelações, incluindo por via telefónica.

VI. O comportamento da promitente-compradora enunciado em 5., violador das regras da boa fé contratual e do dever de colaboração recíproco, revela, de forma concludente, a falta de vontade de cumprir o contrato em tempo oportuno, tornando inexigível a realização de qualquer outra diligência com vista à outorga do contrato prometido.

Decisão Texto Integral:
O BANCO COMERCIAL PORTUGUÊS, SA intentou ação declarativa com processo comum contra EUGÉNIO de SOUSA – ARQUITETO, Ldª, pedindo que declare resolvido contrato-promessa de compra e venda que celebrou com a R., por incumprimento definitivo imputável à R. e se reconheça à A. o direito a fazer seu o sinal pago pela R.

A R. contestou alegando a inexistência de fundamento para a resolução contratual, tendo em conta que o cumprimento do contrato estava dependente do deferimento do pedido de informação prévia (PIP), cujo deferimento tácito se aguarda, negando o incumprimento definitivo culposo da sua parte. Se assim se não entender, pede, subsidiariamente e em reconvenção, a condenação do A. a devolver o sinal em dobro, por incumprimento contratual ou por enriquecimento se causa.

A A. replicou e alegou a inexistência de qualquer incumprimento da sua parte.

A A. requereu a ampliação da causa de pedir, de modo que a resolução pudesse ser judicialmente declarada com fundamento na verificação da condição resolutiva contratualmente acordada, mas tal pretensão foi rejeitada, por se considerar processualmente inadmissível, nos termos do nº 1 do art. 265º do CPC.

Foi proferida sentença, na qual, depois de se constatar que não foi oportunamente invocada pela A. a verificação da condição resolutiva, concluiu que se verificava o incumprimento definitivo imputável à R., julgando a ação procedente e improcedente o pedido reconvencional.

A Ré interpôs recurso de apelação, sendo proferido acórdão pela Relação que, embora tenha considerado eficazes as notificações postais da R. tendentes à sua constituição em mora contratual, considerou que não incorrera em incumprimento definitivo, por falta de execução de uma interpelação admonitória, revogando a sentença e julgando improcedente a ação e prejudicada a apreciação da reconvenção.

O A. interpôs recurso de revista, concluindo no essencial que:

A Relação veio a julgar e bem, eficazes as notificações enviadas pela A. à R., na medida em que tais notificações foram efetuadas para a morada da R. que consta do contrato promessa, a qual nunca comunicou qualquer alteração de morada, sendo nessa morada que ainda permanece nos dias de hoje, tendo aí a sua sede.

As cartas remetidas pelo A., datadas de 9-8-17 e 30-10-17, foram enviadas para o domicílio contratualmente fixado pelas partes, tratando-se de cartas registadas com aviso de receção e vieram devolvidas por não terem sido reclamadas.

A A. discorda da conclusão quanto à eficácia da notificação avulsa, porquanto entende que terá que ser seguida a mesma linha de raciocínio defendida para a eficácia conferidas às cartas referidas, já que foi igualmente tentada no domicílio contratualmente fixado pelas partes, e que corresponde à sede da R., sendo que o local encontrava-se aberto, não tendo a A. culpa, se a R. continua a manter em tal morada a sua sede, mesmo que raramente se encontre nesse local.

A A. enviou uma primeira carta, à R., a 9-8-17, carta registada com aviso de receção, que veio devolvida com a indicação de não reclamada, na medida em que esta não procedeu ao seu levantamento em estação dos CTT e a R. só não procedeu ao levantamento da referida carta por sua exclusiva culpa.

Nova carta registada com aviso de receção foi enviada à R., em 30-10-17, uma vez mais, para o domicílio convencionado, notificando-a para a escritura pública de compra e venda a ter lugar no dia 23-11-17, pelas 15 h no Cartório Notarial do Dr. AA, mas a R. uma vez mais, não procedeu à receção da referida carta, na medida em que não a foi levantar aos correios e não compareceu no dia agendado, por culpa sua, pois se tivesse agido diligentemente e levantado a missiva em questão teria conhecimento do dia, hora e local em que a mesma tinha sido agendada.

Sabendo a R. que havia celebrado com o Banco recorrente um contrato-promessa cujo prazo para a celebração da escritura já se havia atingido, ao tomar conhecimento que o Banco recorrente, por mais do que uma vez, lhe estava a endereçar cartas registadas com aviso de receção, deveria ter encetado contactos para apurar o teor das referidas cartas e não o fez, incorrendo em mora.

A mora constitui-se não apenas quando o devedor é judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir, mas também se impedir a interpelação, considerando-se interpelado, neste caso, na data em que normalmente o teria sido – art. 805º, nº 2, al. c), do CC.

Foi convencionado que a escritura pública havia de ser marcada e comunicada pelo Banco recorrente à R., com a antecedência mínima de 8 dias, o que o Banco cumpriu com o envio da carta com a notificação para a escritura pública em 30-10-17, agendado para 23-11-17, respeitando os 8 dias de antecedência convencionados.

Perante a falta da R., o A. tentou ainda a notificação avulsa que deu entrada em tribunal em 22-2-20, admoestando-a para comparecer numa nova data, 15-3-18, sob pena de se considerar o contrato resolvido, constituindo a interpelação admonitória.

Apesar da não receção das declarações emitidas pelo Banco, solicitando a documentação para apurar se se encontrava verificada a cláus. 5ª do contrato-promessa e agendando sucessivamente datas para a escritura, nem por isso deixaram de ser eficazes, uma vez que a razão para a sua não receção só pode ser imputada a culpa da R, atento o art. 224º, nº 2, do CC.

O mesmo comportamento que o acórdão recorrido considera culposo por parte da R. para a não receção das cartas datadas de 9-8-17 e 30-10-17 foi o mesmo que a R. teve perante a notificação judicial avulsa que lhe foi dirigida.

O Banco A. diligenciou pela notificação da R., o que se veio sempre a frustrar, por culpa desta, e todas as comunicações foram remetidas para a morada convencionada.

Foi aceite que a notificação avulsa nunca poderia ser concretizada em Angola ou Cabo Verde, local onde se encontravam os legais representantes da R., discordando-se do defendido no acórdão recorrido de que a notificação avulsa tinha que ter sido concretizada à R. para se considerar eficaz.

Os legais representantes da R. não foram encontrados no local, tendo sido transmitido ao agente de execução que os mesmos se encontravam ausentes em Africa.

Quando alguém se ausenta do seu domicílio profissional ou da sede social tem obrigação de providenciar para que a correspondência seja reexpedida para outro local ou de providenciar para que alguém proceda à recolha e tratamento da correspondência. Se, em caso de ausência, não toma estas cautelas, age com culpa pois não agiu com a diligência devida, em face das circunstâncias do caso, por forma a acautelar atos expectáveis.

A R. devia ter providenciado por comunicar ao Banco recorrente que na morada contratualmente convencionada não seria possível notificá-la, pois sabia que o prazo para o agendamento da escritura já há muito se encontrava ultrapassado, e que o Banco teria que a notificar.

Apenas por culpa da R. a notificação avulsa não lhe foi entregue/concretizada, devendo esta tornar-se eficaz, considerando-se realizada a interpelação admonitória.


A R. contra-alegou referindo, no essencial, que:

A A. alegadamente enviou comunicações destinadas à R. por carta de 9-8-17, carta de 30-10-17 e notificação judicial avulsa, não tendo nenhuma delas sido rececionada pela R., uma vez que, as cartas vieram devolvidas por não terem sido reclamadas e a notificação não se realizou por não se encontrar ninguém no local.

A notificação judicial avulsa não foi realizada por o agente de execução não ter encontrado a notificanda, tendo obtido a informação de que a morada indicada serve de domicílio profissional a vários arquitetos e desenhadores, e ainda, obteve a informação através de um estagiário de arquiteto, que não pertence à notificanda, de que não vê os sócios da notificanda há várias semanas e que ouviu dizer que os mesmos estão ausentes em África, não podendo concretizar se em Angola ou em Cabo Verde.

A notificação avulsa tem como objetivo a transmissão de uma determinada mensagem ao seu destinatário e, embora se assuma como um ato judicial, não se inscreve em qualquer processo judicial pendente.

A opção por este meio de comunicação tem particular relevância nos casos em que se pretende extrair consequências jurídicas da reação (ou da ausência desta) do notificando, como será o caso em que se pretende ver definido o momento a partir do qual se poderá exercer determinado direito.

A notificação avulsa é um ato-fim e independente, já que toda a atividade judicial é exercida com vista à notificação, diferenciando-se das notificações relativas a processos pendentes, sendo estas atos/meios e dependentes, na medida em que servem de instrumento ou de meio num processo em curso.

A notificação avulsa está sujeita a um determinado formalismo, patente nos arts. 256° e 257° do CPC, dos quais resulta a necessidade de um requerimento, sobre o qual recairá um despacho que determina a notificação pretendida (cf. art. 256°, n° 1, do CPC).

Tal quer ignificar que é feita pelo agente de execução ou por funcionário de justiça, na própria pessoa do notificando, à vista do requerimento, entregando-se ao notificado o duplicado e cópia dos documentos que o acompanhem, preceituando o n° 2 do predito artigo que se lavre certidão do ato, que é assinada pelo notificado.

Os n°s 1 e 2 do art. 256° não se limitam a remeter para as regras da citação, estabelecendo, pelo contrário, um regime exclusivo da notificação judicial avulsa, o que implica não poder esta ser substituída pela citação postal (art. 228°), pela citação em domicílio convencionado (art. 229°) ou pela citação com hora certa (art. 232°).

A notificação avulsa é feita na própria pessoa do notificando, sendo requisito essencial para a sua perfeição que seja efetuada na pessoa do seu destinatário, o que não foi o caso dos presentes autos.

Se no momento em que ocorre a deslocação com vista à realização da notificação ninguém aí se encontra, não é deixado qualquer aviso que permita ao destinatário saber que se tentou notificá-lo por forma a que o mesmo possa posteriormente permitir a realização da notificação, não é possível alguém prever que vai ser alvo de uma notificação avulsa e não é exigível que uma pessoa tenha de permanecer num dado local, sem nunca se poder ausentar, sob pena de se considerar validamente notificado se alguém aí se deslocar com tal finalidade e não o encontrar.

Diversamente do que sucede com as cartas, em que é deixado um aviso para serem levantadas no correio, a notificação avulsa não concretizada não deixa qualquer rasto que permita ao notificando saber sequer da sua existência, por isso, a não realização de uma notificação avulsa por a notificanda não se encontrar na morada indicada, ainda que a mesma seja a da sua sede, não permite concluir que só por sua culpa não foi por ela oportunamente recebida.

Assim, nos termos do art. 224°, n° 2, do CC, a notificação avulsa não pode se considerada eficaz, como decidiu a Relação.

A lei concede ao credor a faculdade de, relativamente ao devedor constituído em mora, lhe fixar um prazo razoável, perentório e suplementar, dentro do qual deverá cumprir sob pena de extinção, por resolução, do contrato, constituindo a interpelação admonitória uma expressa e formal intimação ou advertência ao devedor moroso de que, se não cumprir dentro do prazo razoável que o credor lhe fixar, incumpre definitivamente o contrato.

Em 9-8-17 a A. remeteu à R. carta pedindo o envio da documentação referente ao pedido de aprovação do PIP, tendo em 30-10-17 remetido nova carta à R. a comunicar que a escritura se encontrava agendada para 23-11-17, cartas que a R. não recebeu, mas seria necessária a existência de interpelação admonitória para conversão da mora em incumprimento definitivo.

A notificação avulsa possui as características de interpelação admonitória pois na mesma marcou-se data para a realização da escritura e advertiu-se que a sua não realização importaria incumprimento definitivo do contrato-promessa de compra e venda, com todas as consequências legais, nomeadamente, a perda do sinal a favor do requerente.

A notificação avulsa não se concretizou, razão pela qual a mesma não produziu quaisquer efeitos, e nessa sequência, não ocorreu a conversão em mora de incumprimento definitivo.

A A. não invoca em momento algum que, em consequência da mora, perdeu o interesse na prestação, inexistindo por esta via qualquer incumprimento definitivo.

Inexiste incumprimento pela R. por existência de declaração do devedor, expressa ou tácita, de que não cumprirá ou não quer cumprir, pois que, tal não resulta dos factos dados como provados.

Não existindo incumprimento definitivo do contrato-promessa imputável à R., inexiste também fundamento para a A. resolver o mesmo, devendo, assim, improceder o recurso apresentado pela A.


Importa decidir, por vencimento.


III – Factos provados (mediante a ordenação lógica e cronológica dos factos, com destaque para os factos mais relevantes para a resolução do caso):

1. A R. é uma sociedade comercial por quotas, que tem por objeto atividades de arquitetura, elaboração de projetos arquitetónicos de construção e transformação de edifícios, supervisão de obras, construção de edifícios, construção para venda, comércio por grosso e a retalho de materiais de construção, equipamento sanitário, canalização e aquecimento; compra, venda e arrendamento de bens imobiliários, possuídos pelo próprio ou arrendados; atividades marítimo transporte marítimo e fluvial; aluguer de embarcações de recreio e instalações associadas e atividades de turismo no espaço rural.

2. No âmbito da sua atividade comercial, a R. pretendeu adquirir terreno com aproximadamente 5.000 m2, sito na R. …, em …, para operação de loteamento urbano, designadamente edificação de um edifício multifamiliar.

3. O ora A. é dono e legitimo proprietário do prédio rústico denominado “M…”, situado na …, freguesia e concelho de …, descrito na 1ª CRP de … sob o nº …, e inscrito na matriz predial urbana da União das Freguesias de … e … sob o art. …, Secção 66.

4. Uma vez que o terreno em causa era propriedade do A., foram encetadas negociações entre as partes para compra, pela R., do dito terreno.

5. O A. e a R. celebraram, em 30-9-10, um contrato-promessa de compra e venda, no âmbito do qual o A. prometeu vender e a R. prometeu comprar, o prédio rústico referido em 3.

6. O preço acordado foi de € 274.800,00, tendo a R. pago ao A., no ato da assinatura do referido contrato-promessa, a quantia de € 27.480,00, a título de sinal, devendo o remanescente, no montante de € 247.320,00, ser liquidado na data da outorga da respetiva escritura pública de compra e venda, mediante cheque bancário ou visado à ordem do A.

7. De acordo com o Considerando 3º, ficou contratualmente estabelecido entre as partes que o prédio rústico objeto do contrato era prometido vender livre de ónus ou encargos, com exceção dos ónus de servidões administrativas de aqueduto público aéreo e subterrâneo que atravessa o mesmo, bem como uma rede de saneamento da Saneste, SA, tendo a R. declarado que aceitava e pretendia celebrar de imediato o respetivo contrato-promessa.

8. Conforme resulta do Considerando 4º do contrato-promessa, a R. pretendia destinar o referido prédio à construção urbana de um edifício com dois ou três pisos, numa área de construção de 1.247m2.

9. De acordo com o Considerando 5º, ficou estipulado que a celebração do contrato definitivo ficava subordinada à condição de aprovação do Pedido de Informação Prévia (PIP) para a construção do edifício identificado no Considerando 3º.

10. E de acordo com a cláus. 5ª, ficou contratualmente estabelecido que:

1. Atentos os ónus reais mencionados no terceiro considerando supra, a concretização do negócio acordado por este contrato promessa, fica subordinado à emissão de PIP favorável por parte da Câmara Municipal de … e da Saneste à construção de um edifício com as características a mencionar no referido PIP.

2. A emissão de parecer desfavorável de uma das entidades acima identificadas ao PIP, terá como consequência a resolução imediata do presente contrato-promessa de compra e venda, obrigando-se o 1º contratante a devolver, em singelo, à 2ª contratante todas as importâncias recebidas por força deste contrato, a título de sinal e princípio de pagamento do preço de venda acordado, renunciando a 2ª contratante ao direito a qualquer indemnização ou compensação.

3. A submissão do PIP às entidades supra referidas é da inteira responsabilidade da 2ª contratante”.

11. No âmbito do referido contrato-promessa ficou igualmente acordado que, a escritura pública de compra e venda seria celebrada no prazo máximo de 180 dias a contar da data da assinatura, em data, hora e local a indicar pelo A. à R., com a antecedência mínima de 8 dias (cláus. 6ª, ponto 1).

12. De acordo com o nº 3 da referida cláusula, ambos os contratantes obrigaram-se a, no prazo de 3 dias após a fixação da data da escritura pública, entregar os documentos que sejam da sua responsabilidade e necessários à outorga do contrato definitivo.

13. Acordaram ainda que:

O 1º CONTRATANTE terá direito, em caso de incumprimento definitivo do presente contrato imputável à 2ª CONTRATANTE, a fazer suas todas as quantias recebidas.” – cf. cláus. 8ª, ponto 1.

E que:

No caso de incumprimento definitivo do presente contrato imputável ao 1º Contratante, a 2ª Outorgante terá direito a exigir a restituição em dobro das quantias entregues a título de sinal” - cláus. 8ª, ponto 2.

14. Ficou igualmente acordado entre as partes que todas as notificações a realizar entre os contratantes deveriam ser expedidas para os endereços melhor identificados na cláus. 9ª e, em caso de haver alteração do endereço, o respetivo contratante ficava obrigado a comunicar ao outro essa alteração, por qualquer meio suscetível de confirmação da receção.

15. Após a celebração do contrato-promessa, a R., no ano de 2011, submeteu ao Município de … o Pedido de Informação Prévia (PIP) nº …/2011, relativo a um terreno com aproximadamente 5.000 m2, sito na R. …, em Cascais.

16. A R., em finais de Março, início de Abril de 2011, veio solicitar ao A. a prorrogação do prazo para a celebração da escritura definitiva, por um período não inferior a 6 meses, porquanto se encontrava a aguardar a aprovação do PIP, do qual dependia a celebração do contrato definitivo.

Uma vez que, havia sido estipulado que a celebração do contrato definitivo, respeitante ao contrato-promessa, ficava subordinada à condição de aprovação do PIP, e uma vez que tal aprovação ainda se encontrava em curso, as partes acordaram em fazer um aditamento ao contrato-promessa, que foi assinado em 1-4-11.

Em 1-4-11, as partes celebraram um “Aditamento ao Contrato-Promessa de Compra e Venda”, tendo acordado na prorrogação do prazo previsto no referido contrato promessa para a outorga da escritura pública de compra e venda (cláus. 1ª) por um período adicional de 6 meses, ou seja, até ao dia 30-9-11, como data limite para a outorga da escritura de compra e venda.

O prazo contratualmente estipulado para a outorga da escritura objeto do contrato promessa de compra e venda foi prorrogado por um período adicional de 6 meses, ou seja, até ao dia 30-9-11, como data limite para realização da mesma, cabendo a iniciativa para a fixação da data ao 1º Contratante.

17. O projeto de arquitetura para o pedido de PIP nº …/2011 havia sido elaborado tendo em conta as condicionantes do PDM de Cascais em vigor à data do projeto.

18. Tendo-se verificado, posteriormente, que a localização do Emissário da Costa do Estoril na planta de Condicionantes do PDM estava desfasada um metro quando comparado com a efetiva localização do mesmo nas plantas da SANEST, a R. submeteu o pedido de informação prévia com o mesmo desfasamento de um metro para a aprovação da SANEST.

19. No entanto, na resposta, o Município de Cascais alegou que, agora, o edifício proposto ficava fora da área de alta densidade desse metro de desfasamento.

20. Na altura, a R. questionou se esse desfasamento devia ser considerado nas plantas do PDM, uma vez que se tratava de um desfasamento de plantas e alheio ao requerente.

21. No parecer final desse PIP nº …/2011, consta que o parecer desfavorável do mesmo podia ser revisto mediante apresentação de novo pedido, desde que fossem observadas as disposições legais e regulamentares e sanadas as desconformidades do mesmo projeto com as condicionantes do RPDM e RUEM.

22. Posto isto, a R., em 12-3-14, dirigiu à Câmara do Município de Cascais um novo PIP para operação de loteamento urbano, designadamente edificação de um edifício multifamiliar na R. …, em Cascais, dando, assim, origem ao proc. nº …/2014, pedido este que tinha em conta as razões e as condicionantes apontadas no Parecer desfavorável do Município e constantes no PIP anterior.

23. O PIP foi alvo de saneamento e apreciação liminar, tendo os serviços do Município de Cascais indicado não haver lugar a rejeição liminar ou necessidade de corrigir ou completar o pedido.

24. Na mesma data, em 11-3-14, a R. consultou a proposta do novo PDM e solicitou o acerto do limite urbano – alta densidade para o mesmo terreno, objeto do PIP nº …/2011, solicitação para a qual não obteve qualquer resposta.

25. Entretanto, o Município de Cascais solicitou pareceres a entidades exteriores, nomeadamente à SANESTE e à ANPC, porque considerou que, face à localização, a proposta carecia de parecer vinculativo prévio.

O Município de Cascais mais informou que o terreno urbano se insere no Espaço-Canal referente à 2ª Circular, pelo que, antes da emissão de proposta do parecer final, importava consultar o DIT sobre a mesma e a SANESTE.

26. A R., sempre deu conhecimento à A., do estado e fase em que se encontrava o PIP feito pela R. junto daquele Município de Cascais, da mesma forma como a A. sempre soube que se encontrava em curso o PIP requerido pela R.

O legal representante da R. sempre o transmitiu à A. tal informação, na pessoa dos seus colaboradores.

27. Nessa sequência, uma vez que a aprovação do PIP ainda se encontrava a decorrer, as partes acordaram na celebração de novo aditamento ao Contrato-Promessa de Compra e Venda, que foi assinado em 1-6-14.

Em 1-6-14, as partes acordaram na celebração de novo “Aditamento ao Contrato Promessa de Compra e Venda”, no âmbito da qual, as partes acordaram na prorrogação do prazo contratualmente estipulado para a outorga da escritura até ao dia 31-12-14.

O prazo contratualmente estipulado para a outorga da escritura objeto do contrato promessa de compra e venda foi prorrogado até ao dia 31-12-14, como data limite para realização da mesma, cabendo a iniciativa para a fixação da data ao 1º Contratante.

A A. considerou razoável que, em Junho de 2014, a R. tenha solicitado nova prorrogação do prazo contratualmente previsto para a celebração do contrato definitivo, desta feita até ao dia 31-12-14.

28. Em 25-7-14, a SANESTE-Saneamento da Costa do Estoril, SA, emitiu parecer favorável, com condicionantes, constando do mesmo que:

De acordo com o Desenho 2 – Planta de implantação com condicionantes do PDM e SANEST – Março de 2014, e com o Desenho 1– Planta georreferenciada – Julho de 2014 (enviado por correio eletrónico em 23-07-2014) a implantação da construção projetada não interfere com a zona de proteção do Intercetor Geral da SANEST, definida no PDM de Cascais (art. 9º, nº 1) como uma área canal non-aedificandi, com servidão de rede de esgoto do tipo aqueduto subterrâneo, ao longo do traçado do Intercetor Geral e com uma largura de 8,00 m ao eixo”.

A SANEST indicou que “nada tem a opor à implantação da construção objeto do requerimento CSC2…4/00213”, mas “face à proximidade do Intercetor Geral o projeto das fundações do edifício e os métodos construtivos a utilizar nas escavações e estrutura deverão igualmente ser objeto do parecer da SANEST”.

29. Todavia, o Departamento de Intervenção Territorial (DIT) emitiu parecer desfavorável, considerando que:

De acordo com a Carta de Condicionantes do PDM, a quase totalidade do terreno em causa encontra-se inserida dentro da classe de Espaço Canal, neste caso afeta à 2ª Circular de Cascais.

Sendo esta via estruturante uma das que se encontram especialmente identificadas no art. 14º do Regulamento do PDM ainda em vigor, deverá, tal como tiver sido definido em Estudo Preliminar.

Desta forma julga-se de indeferir o pedido uma vez que não existe área útil para a sua implantação.

Não existe, nem se prevê ainda calendarização para a execução do Estudo Prévio, o qual levará à redução desta faixa non-aedificandi de 50 para 30 m ao eixo”.

O DIT emitiu parecer desfavorável por se prever naquela localização a construção de uma 2ª via (2ª Circular).

Em 21-10-14, pelo Ofício nº …, foi proposta a emissão de parecer desfavorável fundamentado por um parecer da Divisão de Obras e Vias, confirmado pelo Diretor do DIT, cujo parecer alegava o seguinte:

De acordo com a Carta de Condicionantes do PDM, a quase totalidade do terreno em causa encontra-se inserida dentro da classe de Espaço Canal, neste caso afeta à 2ª circular de Cascais (…)

Julga-se indeferir o pedido uma vez que não existe área útil para a sua implantação”.

30. Notificou-se a R. para deduzir audiência prévia, sendo que foi requerida a prorrogação do prazo para a referida audiência.

31. Em 1-12-14, a R. exerceu o seu direito de audiência prévia, alegando que a 2ª Circular de Cascais, não faz parte da Planta de Condicionantes e da Planta de Ordenamento do PDM em vigor.

32. No referido exercício do direito de audiência prévia, a R. juntou documentação, designadamente o quadro urbanístico regulador com elementos em falta e ficha de segurança contra incêndios.

33. Na audiência prévia, a R. informou que a via designada como 2ª Circular de Cascais, não faz parte da planta de Condicionantes e da Planta de Ordenamento do PDM em vigor à data, no terreno em questão, para o qual se solicitou o PIP.

34. Verificando que inexistia qualquer decisão final emitida desde a data do exercício do direito de audiência prévia, nomeadamente uma deliberação da Câmara a indeferir o PIP, a R., por requerimento autónomo, com data de 7-9-15, requereu que o PIP deduzido fosse considerado tacitamente deferido, para as devidas e legais consequências.

35. Posteriormente, foi a R. notificada da informação da DLUR, de 31-8-15, onde foi proposta a emissão de parecer desfavorável à pretensão e promovida a audiência prévia de interessado, nos termos do arts. 121º e ss. do CPA.

36. A R. exerceu o seu direito de audiência prévia, por requerimento datado em 24-9-15 e enviado via CTT.

37. A R. constituíra advogado e juntara procuração a favor do seu mandatário, procuração outorgada em 17-7-15.

38. Contudo, após remessa do requerimento autónomo e da audiência prévia, os serviços do Município de Cascais, pelo ofício Ref.ª SPO-2…4-3…2, datado em 13-10-15, procederam à sua devolução, por entender aquele Município que o expediente deveria ser enviado eletronicamente.

39. A R., após o ofício supra identificado, procedeu ao envio, via on-line e através de formulário do Município de Cascais específico para o efeito, do requerimento remetido via fax e CTT, em 9-9-15, bem como todos os requerimentos, audiência prévia e documentos posteriores, porquanto só nessa data havia sido comunicado que o expediente deveria ser enviado eletronicamente.

40. No e-mail de envio dos requerimentos em causa, no dia 20-10-15, os mandatários da R., com procuração junta aos autos, informaram e requereram:

Exmos. Senhores

Sou pelo presente no âmbito do processo supra identificado, a juntar todo o expediente relativo ao presente processo, apesar de nos ter sido informado que deveria ser enviado através do portal, o certo é que não nos foi possível, pois apesar de ter sido efetuado o registo do mandatário subscritor no portal, não nos deixa ter acesso ao processo em curso, uma vez que o mesmo foi iniciado pelo próprio Requerente.

Todavia, como temos procuração junta aos autos, e não nos foi possível aceder ao processo eletronicamente, remetemos o expediente pelo correio com o formulário de pedido de junção de elementos a processos de urbanismo em curso, preenchido, bem como o enviamos pelo presente email.

Com os melhores cumprimentos”.

41.O e-mail foi enviado para atendimento.municipal@cm-cascais.pt e foi lido em 21-10-15 às 10:05.

42. Os serviços do Município de Cascais, em 21-10-15, às 13.00h, responderam que nenhum pedido relacionado com processos digitais de urbanismo pode ser efetuado por e-mail, e qualquer pedido no âmbito de um processo digital, deveria ser submetido no Portal/A Minha Área através do site da CMC, com interação ao processo.

43. Apesar do mandatário da R. ter procedido à criação de uma conta no portal do Município de Cascais, nunca foi possível aceder ao processo eletronicamente, nem enviar documentos pelo portal.

44. Não obstante, apesar da procuração junta aos autos, e apesar das comunicações enviadas ao Município de Cascais, os serviços deste procederam novamente à devolução do expediente enviado pela R., através do Ofício Ref.ª SPO-2…4-3…2, com a justificação do processo ser digital “cujas interações deverão ser efetuadas através do Portal da Câmara Municipal”, ou, “em alternativa, os documentos poderão ser enviados por via digital (e-mail), desde que obedeçam às Normas Técnicas do Urbanismo e estejam assinados digitalmente”.

45. E em 6-11-15 notificaram apenas a R. (e não o seu mandatário) da extinção do procedimento e consequente arquivamento do processo, juntando em anexo ao ofício cópias dos pareceres/informações técnicas fundamentadoras da decisão.

46. De tudo isto, a R. sempre deu conhecimento à A. que sempre soube, aceitou e nunca se opôs, isto porque, o legal representante da R., sempre o transmitiu à A. na pessoa dos seus colaboradores.

47. Tanto assim foi que as partes acordaram em fazer um novo aditamento ao Contrato-Promessa de Compra e Venda, que foi assinado em 15-1-16

48. O prazo contratualmente estipulado para a outorga da escritura objeto do contrato promessa de compra e venda referido no 1º Considerando, foi prorrogado até ao dia 16-7-16, como data limite para a realização da mesma, cabendo a iniciativa para a fixação da data ao 1º Contratante, sem prejuízo do disposto no contrato promessa de compra e venda.

O prazo contratualmente estipulado para a outorga da escritura objeto do contrato promessa de compra e venda foi prorrogado até ao dia 16-7-16, como data limite para realização da mesma, cabendo a iniciativa para a fixação da data ao 1º Contratante.

49. A Câmara Municipal não apreciou nem emitiu deliberação em 30 dias e desde a data do PIP não foi emitida qualquer deliberação da Câmara a indeferir o PIP.

50. Passou mais de um ano sem que o Município de Cascais deliberasse sobre o pedido formulado pela ora R.

51. Em 21-1-16, a R. instaurou, contra o Município de Cascais, ação administrativa especial para impugnação de atos administrativos e condenação à prática de ato administrativo devido que corre termos sob o nº 251/16.6 no TAF de … – Unidade Orgânica 3.

52. Em tal ação judicial foi peticionado pela R.:

a) Declarar-se o PIP deduzido pela R. tacitamente deferido, condenando o Município de Cascais a reconhecer tal deferimento;

b) Ainda que assim não se entenda, julgar procedente o PIP formulado pela R., pelo facto de o mesmo estar conforme à legislação aplicável, tudo com as demais consequências legais.

c) Declarar-se a nulidade absoluta, por cumulação de vícios, da decisão proferida pela Exmª Coordenadora Técnica da Divisão de Gestão Administrativa Departamento de Gestão Territorial da Câmara Mun. de Cascais, com data de 06/11/15, Refª DGT/DGEA – Licenciamentos/CP, Ofício nº …, dirigida à R.

d) Subsidiariamente, para o caso do pedido formulado em c) não ser julgado procedente, declarar-se a nulidade relativa dessa decisão.

53. Pelo TAF de … foram definidos os seguintes temas da prova: observância, pelo PIP, das disposições legais e regulamentares vigentes à data do despacho de 3-11-15, designadamente em face das disposições do RPDM revisto.

54. No entanto, tal saneador julgou improcedente os pedidos das als. c) e d) do petitório, por não assumirem autonomia, e por dele não se conformar, a R. em 3-1-17, interpôs recurso para o TCA-Sul, com subida imediata, em separado, e efeito devolutivo, recurso esse do qual a R. aguarda seja proferido acórdão.

55. De tudo isto a A. sempre soube e nunca se opôs por qualquer das formas, isto porque sempre foi transmitido à A. na pessoa dos seus colaboradores.

Em 27-12-16, a R. remeteu e-mail ao colaborador da A., Dr. BB (…@milleniumbcp.pt) no qual informou da pendência da ação administrativa e pediu que a A. aguardasse pelo prosseguimento da ação e dos seus ulteriores termos processuais.

No dia 12-12-18 realizou-se a última sessão de audiência de discussão e julgamento naquele processo nº 251/16.6…, estando o mesmo atualmente a aguardar seja proferida sentença.

56. Quer a CM de Cascais quer a Saneste emitiram pareceres desfavoráveis ao PIP ou aos PIP apresentados pela R.

57. O Banco em momento algum foi notificado, conforme contratualmente definido, por forma a ser-lhe comunicado e assim ter conhecimento das diligências encetadas pela R. junto da Câmara Municipal de Cascais e da Saneste, SA, tendo em vista a emissão de parecer favorável ao PIP apresentado.

58. A A. sempre soube, como sabe, que tal PIP havia sido efetuado e que o mesmo tinha inclusivamente sido alvo de ação judicial instaurada pela R.

59. Somente no final do ano de 2016, mais precisamente a 27-12-16, foi informalmente comunicado ao A., mediante o envio de e-mail ao S/Colaborador BB, que o procedimento administrativo relativo ao PIP requerido na Câmara Municipal de Cascais tinha parecer desfavorável.

60. No mesmo e-mail a R. comunicou ainda que “interpusemos uma ação administrativa especial contra o município, arguindo-se as nulidades do procedimento (…), a contestação do mérito da decisão e a condenação da Administração a reconhecer o deferimento tácito do PIP deduzido pelo interessado”, não tendo, contudo, juntamente com o mencionado e-mail, remetido qualquer documento que atestasse, quer a emissão do parecer desfavorável quer que havia intentado qualquer ação judicial.

61. Fazendo o A. fé no que lhe era comunicado informalmente, optou por transmitir de imediato à R. que não pretendia manter o contrato em crise, remetendo ainda a minuta do acordo de resolução do contrato-promessa.

62. Em 26-1-17, a R. recebeu e-mail do Dr. BB, colaborador da A., o qual transmitiu:

Caro Arq. Eugénio de Sousa,

Na sequência dos nossos contactos sobre o assunto, venho transmitir-lhe que o Banco não pretende manter o contrato de venda deste imóvel.

Neste sentido envio-lhe minuta de acordo de resolução do CPCV, a qual agradeço que assine em duas vias.

Mais informo termos preparado cheque para devolução das quantias já recebidas a título de sinal e princípio de pagamento, o qual lhe será entregue em conjunto com uma das vias do acordo de resolução assinada também pelo Banco. Para articulação desta situação, poderemos falar assim que o entender.

Fico, assim, a aguardar o seu contacto”.

63. Nesta sequência, a R., através de sua mandatária, remeteu e-mail para aquele Dr. BB (…milleniumbcp.pt), em 8-2-17, tendo relembrado a A. que se encontrava ainda pendente uma ação judicial ao imóvel, sendo que, por ora, não se verifica a possibilidade de o Banco resolver o contrato, por causa que não lhe seja imputável.

Para além disso, transmitiu ainda aquele mandatário que a R. não aceitava assinar qualquer acordo de resolução do contrato promessa de compra e venda, e que, caso a A. mantivesse a vontade expressa de resolver o contrato, deveria proceder à entrega do sinal pago pela R., em dobro, nos termos do art. 442º, nº 2, do CC.

64. Até hoje, a R., ou os seus mandatários, não obtiveram qualquer resposta àquele e-mail remetido à A., em 8-2-17.

65. A R. é a arrendatária do imóvel sito naquela Praça …, …, Escritório …, …-… … e continua a estar na morada constante no contrato de promessa.

66. O Legal Representante da R. constantemente se desloca a Moçambique; no entanto, toda a correspondência que chega àquela Praça …, …, Escritório 3, …., sempre foi, como é, entregue à R.

67. Assim que lhe foi transmitido, já no decorrer do ano de 2016, que a CMC havia emitido um parecer desfavorável ao PIP, o A. requereu à R. que esta, por forma a validar tal informação, lhe remetesse toda a documentação que atestasse tal decisão.

68. Pese embora as várias insistências junto da R., esta sempre manifestou desinteresse em apresentar qualquer documentação que comprovasse quais as diligências em curso para a obtenção de um parecer favorável ao PIP, e quais as respostas já obtidas.

69. Por carta registada com A/R, datada de 9-8-17 e remetida para o domicílio contratualmente fixado pelas partes, a A. notificou a R., para que, remetesse toda a “documentação referente ao pedido de aprovação do PIP à construção apresentado junto da Câmara Municipal de Cascais e junto da Saneste, SA”.

70. A R. não procedeu à receção da referida carta, tendo a mesma sido devolvida, com a indicação de “não reclamada”.

71. Nessa senda, e atenta a continuada ausência de resposta por parte da R., o A., por carta registada com A/R, igualmente remetida para o domicilio contratualmente fixado pelas partes, datada de 30-10-17, notificou a R. de que a respetiva escritura pública de compra e venda se encontrava agendada para o dia 23-11-17, pelas 15h00, no Cart. Not. do Dr. CC, sito na R. …, nº …, 1º andar, em … .

Nela se diz, além do mais:

Ficamos a aguardar. Nos termos contratualmente estipulados, o envio dos documentos da V/ responsabilidade, de forma a procedermos à sua entrega no cartório Notarial que irá proceder à respetiva celebração”.

72. A R., uma vez mais, não procedeu à receção da referida carta, tendo a mesma sido devolvida com a indicação “não reclamada”.

73. No dia e hora agendada – 23-11-17- a A. compareceu no Cart. Not. do Notário DD para a realização da escritura definitiva, de acordo com o previsto no contrato-promessa entre as partes celebrado, contudo a R. não compareceu no local e data designadas, conforme resulta do certificado de não comparência emitido pelo Cart. Not. do Dr. DD.

74. Face à continuada ausência de contacto por parte da R. e resposta às interpelações dirigidas pelo A., este notificou (ou, melhor, requereu a notificação) a R., através de notificação avulsa, que correu termos sob o nº 367/18.4T8…, no Trib. Jud. da Comarca de …, … – Juízo Local Cível - Juiz 2, para a realização da referida escritura pública de compra e venda.

75. No âmbito da referida notificação, o ora A. veio notificar (ou, melhor, requereu a notificação) expressamente a R. de que “deverá comparecer no próximo dia 15-3-18, pelas 11 h, no Cart. Not. do Dr. DD, sito na R. …, nº … – 1º e 2º andar, em …, a fim de, se celebrar a respetiva escritura pública de compra e venda, sob pena de incumprimento definitivo do presente contrato-promessa de compra e venda, com todas as consequências legais, nomeadamente, a perda do sinal a favor do Requerente”.

76. Contudo, a notificação da R., mediante a notificação judicial avulsa também se frustrou, porquanto foi comunicado ao agente de execução que na morada onde se situa a sede da R. não foi possível concretizar a notificação avulsa da ora R., conforme se pode comprovar pela certidão emitida pelo Agente de Execução, Dr. EE, o qual veio comunicar o seguinte:

Na morada indicada serve de domicílio profissional a vários arquitetos e desenhadores. Tendo o Agente de Execução obtido a informação de um estagiário de arquiteto, que não pertence à notificanda, de que não vê os sócios da notificanda há várias semanas e que ouviu dizer que os mesmos estão ausentes em África, não podendo concretizar se em Angola ou em Cabo Verde”.

77. Por mera cautela, no dia 15-3-18, o A. deslocou-se ao Cart. Not. do Notário CC, a fim de, tal como comunicado à R., outorgar a referida escritura de compra e venda, contudo, uma vez mais, a R. não compareceu, conforme resulta do certificado de não comparência emitido pelo Cart. Not. do Dr. CC.

78. A R., até ao momento, não obteve a respetiva licença de construção.

79. Não obstante as mais diversas diligências efetuadas por parte do ora A., com vista a proceder à notificação da R. para a realização da escritura pública de compra e venda, até à presente data, a mesma não foi concretizada.

80. Apesar de ter sido sucessivamente interpelada para proceder à celebração do contrato definitivo, mais concretamente, no dia 23-11-17, pelas 15.00h e, posteriormente, para o dia 15-3-18, pelas 11.00h, no Cart. Not. do Notário Dr. CC, a R. não compareceu nem sequer tentou contactar o Banco A., durante todo este período.

81. A R., desde meados de 2017, deixou de entrar em contacto ou transmitido o que quer que fosse relativamente à celebração ou não do contrato definitivo e deixou de receber as notificações e interpelações várias do A.

Após Agosto de 2017, nunca mais o A. conseguiu encetar qualquer contacto com a R.

Os avisos de receção deixados na caixa de correio desta eram completamente ignorados.

82. A R. deixou de atender os contactos telefónicos que lhe eram dirigidos e ou não recebia as cartas que lhe eram endereçadas ou pura e simplesmente não respondia às mesmas.

83. O A.:

(i) Notificou a R. para a morada convencionada para fazer prova da verificação ou não da condição resolutiva prevista na cláus. 5ª do contrato-promessa, o que esta sempre recusou;

(ii) Notificou a R., mediante carta registada para a morada convencionada do agendamento da escritura de compra e venda, indicando o local dia e hora;

(iii) Notificou a R. mediante a notificação avulsa (ou melhor requereu a notificação) com o nº 367/18.4T8… para o agendamento de nova data para a celebração da escritura de compra e venda, face à não comparência na primeira data agendada.


III – Decidindo:

1. Importa apreciar, no essencial, se se verificam os pressupostos para se declarar a existência de uma situação de incumprimento definitivo por parte da R. justificativa da resolução do contrato peticionada pelo A., com reconhecimento a esta do direito a reter o sinal que foi prestado pela R.

Este é, na verdade, o eixo fundamental da lide, ou seja, a questão de direito que divide as partes e as instâncias: a A. insiste em que a R. incorreu em incumprimento definitivo, pelo facto de ter recusado as duas cartas em que lhe era comunicada a marcação da escritura pública a que deixou de comparecer e de não ter sido consumada a notificação avulsa que foi tentada no local previsto no contrato-promessa. Assim o entendeu também a 1ª instância.

Já a R. considera que não estão reunidas as condições para se afirmar a existência do alegado incumprimento definitivo, rejeitando que decorra simplesmente da não receção das cartas registadas (o que apenas revelaria uma situação de simples mora) e da não tentativa de realização da notificação avulsa contendo a interpelação admonitória. Foi esta a posição que encontrou eco no acórdão da Relação.

2. A A. sustentou o pedido de resolução do contrato-promessa de compra e venda no incumprimento definitivo por parte da R., tendo em conta que não teria diligenciado pela regularização do imóvel junto do Município nem obtido licença de construção e de, apesar de ter sido interpelada para a outorga da escritura pública de compra e venda, não ter comparecido nem ter contactado a A. (arts. 31º e 33º da petição).

Noutra configuração semelhante, para sustentar a verificação dos pressupostos do seu alegado direito potestativo de resolução, invocou o decurso do prazo acordado, a ausência de contactos com a A. e o desinteresse da R. na outorga do contrato definitivo (art. 38º da petição).

O referido pedido foi julgado procedente na sentença a partir do seguinte juízo:

a) Eficácia declarativa das duas cartas registadas com aviso de receção que foram dirigidas à A., para o seu domicílio contratual, uma a solicitar elementos relacionados com a aprovação do pedido de informação prévio (PIP) que a R. solicitara ao Município, e a segunda a convocá-la para comparecer no Cart. Notarial a fim de outorgar na escritura de compra e venda, apesar de tais cartas terem sido devolvidas com o aviso de não terem sido reclamadas, atento o disposto no nº 2 do art. 224º do CC;

b) Eficácia declarativa da notificação avulsa que foi promovida pela A. junto do tribunal judicial, através de agente de execução, apesar de a mesma não ter sido consumada, uma vez que a R. não foi encontrada no mesmo domicílio, atenta a mesma disposição substantiva.

Daqui partiu o tribunal de 1ª instância para a afirmação de que tais factos (e outros que a extensa matéria de facto contém) revelariam uma situação de incumprimento definitivo imputável à R.

A R. apelou, tendo a Relação considerado dois aspetos:

a) Confirmou a eficácia declarativa das duas cartas registadas com aviso de receção (uma para entrega de documentos e outra para comparecer no Cart. Notarial);

b) Considerou que, não tendo sido executada a notificação avulsa, o estádio do contrato-promessa não ultrapassara a fase da mora no cumprimento por parte da R., não estando preenchidas as condições para ser invocado o incumprimento definitivo necessário para fundamentar o direito de resolução;

c) Para o efeito, disse a Relação que era imprescindível a efetiva realização de uma interpelação admonitória que transformasse a situação de mora numa situação de incumprimento definitivo, o que não ocorrera com a certidão negativa exarada a respeito da notificação avulsa que foi tentada;

d) Afastou a possibilidade de a atuação da R. reunir as condições necessárias para integrar uma manifestação tácita da vontade de não cumprir o contrato prometido.

Neste contexto, o que se pede a este Supremo Tribunal de Justiça, como órgão de revista centrado na aplicação do direito, é que integre os factos apurados nas normas que regem a mora ou o incumprimento definitivo do contrato-promessa, no pressuposto pacífico de que, sem embargo de outros eventuais motivos para a extinção do contrato (v.g. verificação da condição resolutiva), a resolução do contrato por parte da promitente-vendedora, sustentada no incumprimento da promitente-compradora, exige a verificação de uma situação de incumprimento definitivo que a esta seja imputável, quer pelo facto de não ter cumprido, depois de efetuada uma interpelação admonitória, quer pelo facto de revelar, pela sua atitude, uma inequívoca recusa de cumprimento.


3. O caso que a matéria de facto retrata é bem revelador das dificuldades que rodeiam a integração jurídica de comportamentos assumidos no âmbito de uma relação jurídica que, como o contrato-promessa de compra e venda, se estende no tempo e fica sujeita a vicissitudes diversas, algumas delas imprevistas ou inesperadas. Mas revela também por que razão, não sendo possível a autorregulação prévia de todos os incidentes de um processo negocial, os promitentes devem agir reciprocamente sob os auspícios da boa fé que se deve manifestar, desde logo, através do escrupuloso cumprimento do que foi acordado e com o espírito colaborativo essencial à realização do contrato prometido.

Afinal, o contrato-promessa não preenche, por si, o objetivo de qualquer das partes, constituindo apenas um degrau do percurso contratual que, começando pelos contactos exploratórios e pelos elementos comunicados na fase pré-contratual, se precipita na assunção de um compromisso mútuo solene quanto à celebração de um contrato futuro cujas cláusulas principais nele ficam prefiguradas, ficando a sua conclusão dependente de outros eventos ou do preenchimento de outros requisitos.

Daí a necessidade de, no ínterim, cada parte cumprir aquilo a que se comprometeu a fim de facilitar e abreviar a conclusão do contrato prometido, desiderato que, como é natural, interessa a ambas as partes: ao promitente-comprador, na medida em que, com a conclusão do contrato, adquire a titularidade do direito em causa; ao promitente-vendedor que, nos mesmos termos, recebe o preço ou o seu remanescente.

Para o efeito é, desde logo, imprescindível que se mantenham os canais de comunicação que tenham sido estabelecidos ou que as circunstâncias revelem ajustados à prossecução dos objetivos.

Estas são as considerações iniciais que permitem antever que a solução encontrada pela Relação e propugnada pela R. não pode nem deve ser confirmada, impondo-se, por um juízo maioritário deste coletivo, repor a que foi adotada pela 1ª instância e que, ademais, se revela a mais justa e adequada.


4. Em sede de incumprimento contratual e designadamente de incumprimento do contrato-promessa de compra e venda é frequente a ideia, que essencialmente assenta nos arts. 442º e 808º do CC – e que vem sendo reafirmada em numerosos trabalhos doutrinários e arestos dos Tribunais Superiores e designadamente deste Supremo Tribunal de Justiça – de que à resolução do contrato não basta a situação de mora, sendo necessário que se atinja uma fase crítica do incumprimento contratual que possa qualificar-se como de “incumprimento definitivo”.

Nos casos em que não tenha sido convencionado uma cláusula de resolução expressa (art. 432º, nº 1, do CC), a situação paradigmática determinante do direito de resolução implica a transformação de uma situação de mora numa situação que traduza o incumprimento definitivo. É frequente, então, a afirmação da necessidade de efetivação de interpelação admonitória que confronte o promitente incumpridor em situação de mora com a derradeira oportunidade de reagir no sentido da outorga do contrato definitivo, sob pena de arcar com os efeitos da resolução do contrato (se acaso não se mantiverem as condições para uma eventual execução específica).

Estes casos não suscitam, por norma, dificuldades. A não ser que existam circunstâncias específicas ligadas, por exemplo, à razoabilidade do prazo para cumprir, a solução fica essencialmente dependente da demonstração dos factos reveladores de cada um dos referidos passos típicos que é comum integrar na previsão normativa do art. 808º do CC, que nos abstemos de apreciar em todos os seus pormenores, tal a quantidade e a qualidade dos arestos e dos trabalhos académicos que sobre a mesma incidem.


5. No caso concreto, a Relação não atribuiu relevo à notificação avulsa da R. que foi promovida pela A., sendo tratada de forma tabelar, sem atender ao circunstancialismo anterior e, em geral, ao facto de a certidão negativa se enquadrar numa atitude da R. de fuga a qualquer contacto, como o revela a matéria de facto.

A aludida notificação avulsa, promovida e custeada pela A., veiculava uma interpelação admonitória correspondente a uma declaração negocial emitida pela A. cujos efeitos não podem ser inferiores aos de uma notificação particular, designadamente por via postal. Obedecendo tal ato processual a requisitos e a um ritual diferente das notificações postais emitidas pelos particulares, os efeitos da não consumação dessa forma de comunicação não podem ser inferiores, antes pelo contrário, aos que decorrem de uma comunicação particular, tanto mais que uma e outra foram dirigidas para o domicílio convencionada pelas partes.

Desde logo, não pode ser descartada a seriedade da regulação antecipada do modo como se fariam as comunicações inter partes. Também não pode ser desvalorizado, nos termos em que o foi feito, o facto de a inexecução da notificação avulsa ter sido “só” o culminar do anterior comportamento da R. revelado pela desconsideração do que fora contratado e dos esforços desenvolvidos pela A. no sentido de resolver, de uma vez por todas, o impasse negocial.

A notificação avulsa (anteriormente “notificação judicial avulsa”) constitui, no entender de Alberto dos Reis, um ato-meio que tem em vista a obtenção de um certo resultado (Comentário ao CPC, vol. I, p. 587).

Na medida em que essa diligência foi tentada na mesma morada que fora indicada e para a qual já haviam sido remetidas e devolvidas duas cartas registadas com A.R., bem podemos concluir que, apesar da não consumação efetiva da mesma notificação, não deixou de produzir os efeitos que as instâncias atribuíram, com todo o acerto, às precedentes cartas registadas com A/R, tendo em conta o disposto no art. 224º, nº 2, do CC.

Trata-se de uma situação que, no contexto em que ocorreu, ou seja, atendendo às anteriores circunstâncias reveladoras da recusa pura e simples da R. de recebimento de quaisquer comunicações ou contactos a respeito do cumprimento do contrato-promessa, acaba por equivaler à situação que foi apreciada no Ac. do STJ, de 5-12-95, BMJ 452º/405, em que houve recusa de assinar a notificação avulsa que foi tentada através de funcionário judicial.

O facto de o art. 256º do CPC prever que a notificação avulsa é efetuada na pessoa do notificando não deve servir para desvalorizar essa forma solene de comunicação, antes significa, por um lado, que não se utilizará a via postal e, por outro, que, em caso de o notificando não ser encontrado na morada indicada pelo requerente, não se mostra necessário, como ocorre em matéria de citações, a realização de diligências suplementares, designadamente a marcação de hora certa ou a opção pela publicação de éditos e de anúncios. No mais, a declaração negocial recipienda emitida por essa via é suscetível de produzir os mesmos efeitos materiais que estão previstos para as declarações em geral no art. 224º, nº 2, do CC.

Ora, por razões acrescidas, tendo em conta o facto de a sua realização ser solicitada e decretada pelo tribunal e ser realizada, por opção do legislador, nos termos que figuram no art. 256º do CPC, através de agente de execução ou de funcionário judicial, sem recurso à via postal, os efeitos que da mesma deverão extrair-se serão semelhantes aos que decorreriam da eventual opção por uma outra via menos formal, como seria a carta registada com A/R ou a carta registada simples.

Deste modo somos conduzidos a atribuir a essa tentativa de notificação a eficácia de uma declaração recipienda, já que, em linhas gerais, se mantêm para a mesma as condições a que alude Antunes Varela, em anot. ao art. 224º do CC: eficácia da “declaração quando não seja recebida por culpa do destinatário”. Os exemplos que dá, como seja o caso de o destinatário “se ausentar para parte incerta ou de se recusar a receber a carta, ou de a não ir levantar à posta-restante como o fazia usualmente”, encaixam-se neste processo.

Por conseguinte, não pode aceitar-se a opção da Relação, ao supor que as diligências que a A. fez ainda eram insuficientes para se considerar verificada uma situação de incumprimento definitivo, malgrado o contexto em que ocorreram as tentativas de comunicação empreendidas e que ficam bem espelhadas na seguinte síntese:

- A R., desde meados de 2017, deixou de entrar em contacto ou de transmitir o que quer que fosse relativamente à celebração do contrato definitivo e deixou de receber as notificações e interpelações várias do A.;

- A R. deixou de atender os contactos telefónicos que lhe eram dirigidos e não recebia as cartas que lhe eram endereçadas ou pura e simplesmente não respondia às mesmas;

- Após Agosto de 2017, nunca mais o A. conseguiu encetar qualquer contacto com a R., fosse por telefone, fosse por outros meios, como ocorreu com os meios postais e com a notificação avulsa;

- Os avisos de receção deixados na caixa de correio desta eram completamente ignorados (como aconteceu com os avisos respeitantes a duas cartas registadas com A/R remetidas pela A.).


6. Tudo isto ocorreu no âmbito de um contrato no qual, a par de uma condição suspensiva que beneficiava a R., que permitiu o diferimento da outorga do contrato definitivo, existia uma condição resolutiva que poderia ser invocada pela A., a qual dependia unicamente da verificação da existência de algum parecer contrário ao pedido de informação prévia (PIP) que a R. solicitou ao Município, relacionado com um projeto urbanístico. Daí o interesse da A. em manter abertos os canais de comunicação e aceder, de forma segura, aos elementos relacionados com procedimento administrativo atinente ao projeto urbanístico que a R. pretendia aprovar.

Na ocasião, já tinham decorrido mais de 6 anos após a outorga do contrato e a passagem do primeiro prazo que fora acordado para a celebração da compra e venda, apesar de a A. ter dado o seu acordo relativamente a sucessivas prorrogações que encontravam justificação em dificuldades de natureza burocrática, administrativa ou legal com que a R. se foi defrontando.

Enfim, a notificação avulsa não constituiu o único ato de interpelação, pois, para além de outros contactos que não se realizaram, veio na sequência de um pedido formal de documentação que seria importante, por exemplo, para a A. sustentar a invocação da condição resolutiva, e de uma notificação para comparecer em cartório notarial, comunicações que exclusivamente por culpa da R. não foram recebidas.

Por conseguinte, no contexto em que foi procurada a realização da interpelação admonitória, cujo teor não foi posto em causa, para provocar uma situação de incumprimento definitivo, deve considerar-se que produziu os seus efeitos na esfera da R., encontrando-se, por isso, preenchida a situação paradigmática que costuma preceder a declaração de resolução de contratos-promessa de compra e venda.

Considera-se, pois, verificada, por este exclusivo motivo, uma situação de incumprimento definitivo.


7. Mas independentemente da resposta anterior assente nos efeitos jurídicos da interpelação admonitória, o caso sempre encontraria a mesma solução por outra via adicional que discriminaremos.

Sendo a situação paradigmática aquela em que a resolução do contrato-promessa de compra e venda supõe uma atuação complementar do promitente fiel no sentido da interpelação admonitória do outro, desde muito cedo, aliás, desde os Trabalhos Preparatórios do CC de 1966, se percecionou a necessidade de encontrar alternativas para a integração de outras realidades que, na verdade, acabam por ter o mesmo resultado e por traduzir o mesmo efeito: o incumprimento definitivo do contrato-promessa, em resultado da antecipada perceção de que o contrato prometido não será concretizado, mediante a apreciação do comportamento ativo ou omissivo da contraparte.

Efetivamente, o quotidiano judiciário revela situações para as quais de modo algum se justifica exigir do promitente fiel que percorra todos os passos do “caminho do Calvário” que traduzam aquela situação paradigmática e em que, pelo contrário, a extinção do contrato (numa espécie de “consumatum est”), por via do acionamento do direito potestativo de resolução, é legitimada pela força das circunstâncias envolventes, máxime, a partir da verificação de comportamentos da contraparte que inequivocamente revelam a vontade de não cumprir o acordado nos seus aspetos essenciais.

A análise da jurisprudência que mais de perto se confronta com as coisas da vida dá-nos numerosos exemplos, mas começaremos por aqueles que a doutrina obrigacionista vem enunciando e que de algum modo têm relação com o caso concreto.

Para o efeito recorremos aos imprescindíveis estudos de Brandão Proença que, em diversos locais, vem analisando e sintetizando a referida problemática: 1. Lições de Cumprimento e não Cumprimento das Obrigações, 3ª ed., 2. Do Incumprimento do Contrato-promessa Bilateral e 3. Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Jorge Ribeiro de Faria, “A hipótese da declaração (lato sensu) antecipada de incumprimento por parte do devedor”, pp. 358 e ss.

Na primeira das referidas obras, refere o autor que o desiderato de não cumprir o programa contratual “pode revelar-se obliquamente”, numa manifestação de “atitude de «marginalidade jurídica», de arbitrariedade, ao escorar-se numa liberdade formal que contradiz a vinculação e a fidelidade contratual” (pp. 338 e 339). Acrescenta que a “vontade negativa do devedor pode também ser retirada de factos significantes (a «repudiation by conduct») ativos ou omissivos, de natureza material ou jurídica”, dando como exemplo o facto de o devedor “negligenciar os preparativos do cumprimento”, esclarecendo, depois, que, “há de tratar-se, pois, de uma conduta que, inserida circunstancialmente, permita afastar um mero receio/incerteza e concluir seguramente e com muita probabilidade por um desejo inequívoco de querer fugir ao cumprimento” (p. 340; também em Estudos em Homenagem, cit., pp. 365 e 366).

Na outra obra intitulada Do Incumprimento do Contrato-promessa Bilateral, pp. 87 e ss., enuncia a situação mais clara traduzida numa declaração voluntária de um dos promitentes de que não irá cumprir ou não o poderá fazer, traduzindo uma posição de objetiva recusa de cumprimento que tanto a doutrina (Vaz Serra, Galvão Teles, Batista Machado, Menezes Cordeiro, etc.) como a jurisprudência fazem equivaler a uma situação (antecipada) de incumprimento definitivo, sem necessidade de qualquer interpelação admonitória, fixação de algum prazo adicional ou invocação de qualquer outro fator revelador da falta de interesse objetivo no prosseguimento do relacionamento contratual.

Porém, tal como o admite a generalidade da doutrina, não deixa de acrescentar o “«alargamento» da casuística da recusa categórica de cumprimento” a outras situações sem aquele matiz, mas que igualmente traduzem uma situação de incumprimento definitivo. Dá como exemplos a declaração de resolução ilegítima, a apresentação de uma proposta com condições inaceitáveis de cumprimento, a apresentação de uma reivindicação arbitrária, o começo de negociação com terceiro ou até a “inércia em preparar o cumprimento (não eliminando os encargos existentes ou não obtendo a documentação essencial)” (p. 89). Em qualquer caso, acrescenta, essa recusa categórica, com o significado de um incumprimento definitivo ipso facto, deve ser traduzida por um comportamento ou declaração pessoal, séria, categórica e definitiva, embora não deva ser “necessariamente expresso ou reduzido a escrito” (pp. 90 e 92).

Sem necessidade de saturar este acórdão, faz todo o sentido, especialmente no caso concreto, aludir ao que o mesmo autor refere acerca do que se espera dos tribunais nestes casos e que expressou nos seguintes termos: “… a circunscrição do tipo de incumprimento em causa, bem como a valoração do concreto inadimplemento, explica o importante papel que as instâncias judiciais aqui devem ter, valorando todos os elementos em ordem a personalizar a «quebra contratual» e sindicando a comum atitude de cada um dos promitentes em atribuir a culpa ao outro na não celebração do contrato definitivo”, sem deixar de acrescentar um ponto crítico de que “a jurisprudência nem sempre tem trilhado os melhores caminhos nessa tarefa, errando os juízos classificatórios, quedando-se nas soluções mais fáceis e deixando, por vezes, na sombra, a sua função de controlo” (pp. 96 e 97). Diagnóstico para o qual aponta como remédio verificar “a censurabilidade do comportamento, a extensão do incumprimento e a posterior graduação da culpa, são os objetivos essenciais que se deparam aos tribunais, não devendo estes fugir às possíveis dificuldades de indagação” (pp. 97 e 98).

Diga-se ainda que, se a aludida crítica acerta em alguns casos em que os tribunais revelam alguma impassividade ou complacência por determinados comportamentos, também se encontram numerosos exemplos, designadamente na mais recente jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, de uma atitude contrária em que, como deve ser, a resolução de concretos litígios se tem guiado, também, pela necessidade de proteger a parte cumpridora, cobrando do promitente incumpridor o preço por atitudes de pura desconsideração daquela ou de fuga ao cumprimento das suas obrigações, como justificadamente o impõe o caso concreto.


8. Pela sua ligação ao caso, pelo facto de se tratar de um caso recente e pela desnecessidade de elaborar de novo uma justificação completa da solução em torno da figura do comportamento concludente equivalente a uma situação de recusa de cumprimento que justifica a invocação do incumprimento definitivo, transcreve-se um segmento do recente acórdão relatado pelo ora relator e subscrito pelos mesmos adjuntos (Ac. do STJ, de 7-10-20, 341/18.0T8ABT.E1.S1, ainda inédito), no qual também são citados outros arestos onde foi trilhado semelhante caminho:

“O contrato-promessa, máxime o de compra e venda, continua a constituir uma fonte inesgotável de questões de direito civil e de direito das obrigações, fruto quer da complexidade do regime jurídico (sujeito a diversas modificações, alvo de diversos estudos e monografias e objeto de diversos acórdãos de uniformização de jurisprudência), quer da diversidade de cláusulas através das quais as partes procuram regular os seus direitos e obrigações, quer ainda da diversidade de comportamentos de cada um dos sujeitos entre a data da outorga do contrato e a sua execução.

Ora, refletindo sobre uma variedade de situações que envolvem ações ou omissões dos sujeitos vinculados através de contratos-promessa, tanto a jurisprudência como a doutrina (nacional e estrangeira) vêm extraindo das normas ligadas à verificação e qualificação das situações de cumprimento ou de incumprimento moroso ou definitivo uma solução que culmina pela afirmação da existência de incumprimento definitivo ou mora, conforme os casos, em casos de “comportamentos concludentes”.

Tal ocorre especialmente para efeitos de integração da previsão normativa do art. 808º do CC, sobre a verificação do incumprimento definitivo de contrato-promessa, como bem o ilustra o recente Ac. do STJ, de 4-6-20, ECLI 3564.18, que concluiu que “se ao longo de mais de 15 anos, os RR. não só não envidaram quaisquer esforços para adquirirem à entidade expropriante a propriedade da parcela prometida vender, por forma a conseguirem outorgar o contrato definitivo de compra e venda com o autor, como se furtaram sempre a isso, não obstante terem plena consciência de que a aquisição da parcela em causa era essencial para o autor e de, com a assinatura do contrato, já terem recebido deste a totalidade do preço acordado, impõe-se concluir que todo este comportamento evidencia, por parte dos réus, uma inequívoca e manifesta vontade de não celebrar o contrato prometido, o que os coloca em situação de incumprimento definitivo”.

Porém, semelhante juízo pode ser estabelecido a respeito da verificação ou não de uma situação de mora no cumprimento ou incumprimento moroso, nos termos e para efeitos do disposto no art. 804º do CC, com reflexos designadamente ao nível da satisfação do pressuposto legal do incumprimento necessário para o exercício de direitos configurados nos arts. 442º e 830º do CC.

A título meramente exemplificativo, tal a quantidade de acórdãos que podem ser analisados ou a diversidade e a qualidade de estudos doutrinários que sobre o tema incidiram, verificamos que no Ac. do STJ, de 25-2-14, 1987/1996, www.dgsi.pt, proferido no âmbito de uma ação de execução específica, a interposição de uma ação de reivindicação contra o outro promitente foi considerada comportamento concludente para efeitos de verificação de incumprimento de contrato-promessa de compra e venda. Depois de se afirmar que a execução específica depende da verificação do incumprimento do réu, nele se asseverou que “a interposição de uma ação de reivindicação, em que se pede aos promitentes-compradores a restituição do imóvel prometido vender e que estes ocupam desde a data da celebração do contrato-promessa, e em que se declara, simultaneamente, que não será celebrada a escritura de compra e venda, consiste numa declaração inequívoca de que os autores não têm intenção de cumprir o contrato definitivo, o que legitima os promitentes-compradores a perderem toda a esperança de que o contrato venha a ser espontaneamente cumprido e a recorrer à execução específica, como de facto fizeram na reconvenção”.

Já no Ac. do STJ, de 23-11-17, 212/12, www.dgsi.pt, a mesma conclusão foi extraída do facto de um do promitente-vendedor ter procedido unilateralmente à mudança de fechadura de um imóvel que fora objeto de contrato-promessa e que estava sob detenção legítima do promitente-comprador, nele de afirmando que, “independentemente da estipulação, ou não, de um prazo pelas partes e da sua natureza, em face de um comportamento do devedor que exprima inequivocamente a vontade de não cumprir a obrigação principal, verifica-se, desde logo, um quadro de incumprimento definitivo. A recusa tanto pode ser expressa e categórica como pode ser valorada a partir de outras atitudes inequívocas e concludentes daquele comportamento, como seja a dedução em juízo de um pedido de restituição do imóvel objeto do contrato-promessa pelos herdeiros do promitente-vendedor, o que legitima o promitente-comprador a recorrer às sanções previstas para o incumprimento do contrato-promessa, designadamente, a restituição do sinal em dobro nos termos do art. 442º do CC”.

Por seu lado, no Ac. do STJ, de 29-1-14, 954/05, www.dgsi.pt, foi decidido, em sede de conversão de situação de mora em incumprimento definitivo, que “a vontade de não cumprir pode resultar de comportamentos concludentes apreensíveis pela atuação da parte inadimplente, em função dos deveres contidos na sua prestação, sendo de atender ao grau e intensidade dos atos por si perpetrados na inexecução do contrato” e que, no caso então analisado, “os factos revelam uma vontade séria e determinada, por parte dos recorrentes (promitentes-vendedores) de não quererem cumprir o programa negocial justificando-se a invocada perda do interesse contratual o que permite considerá-los inadimplentes de forma definitiva, sem necessidade de notificação admonitória”.

Efetivamente, como também se referiu no mesmo aresto:

“3.6. O relevo a atribuir a comportamentos concludentes com o significado de implicarem a constituição em mora ou mesmo o incumprimento definitivo é a lição que se extrai ainda de estudos ou monografias de diversos autores, sendo destacar, para a resolução do caso presente, o que é referido por Brandão Proença em Do Incumprimento do Contrato-Promessa Bilateral, com múltiplas menções de outros autores nacionais e estrangeiros e identificação de diversas decisões dos Tribunais Superiores.

A pp. 87 e ss. esse autor atribui relevo para extração de efeitos jurídicos da mora ou do incumprimento definitivo de contrato-promessa não apenas à declaração séria do promitente de que não irá cumprir o prometido, como ainda a outros comportamentos concludentes que se manifestem, por exemplo, através de uma declaração de resolução ou de denúncia do contrato por parte do contraente incumpridor, da apresentação de uma proposta com condições objetivamente inaceitáveis ou apresentação de reivindicações arbitrárias, assim como do estabelecimento de negociações paralelas com terceiro ou da inércia relativamente à realização de diligências preparatórias indispensáveis à celebração do contrato definitivo. Culmina com o relevo atribuído a uma “conduta declarativa séria e categórica” da outra parte que não deixa dúvidas sobre a omissão futura (p. 93), especialmente quando está em causa a resolução do contrato.


A matéria relacionada como incumprimento das obrigações em geral foi retomada e desenvolvida por Brandão Proença, em Lições de Cumprimento e não Cumprimento das Obrigações, 3ª ed., destacando em diversos passos que equivale ao incumprimento a declaração à contraparte de que não tenciona cumprir, numa manifestação de fuga ao vínculo contratual ou de recusa de cumprimento do programa contratual (pp. 334 e 335). Considera que tal efeito emerge com especial evidência, ainda que de modo oblíquo, da reação do contraente traduzida através “de alegações de inexistência ou invalidade contratual, sob a forma de manifestações subjetivas de desinteresse … ou ir implícita na atitude mais radical de repúdio ou rejeição do próprio contrato, revelada através de pretensões de anulação, resolução, denúncia ou impugnação do vínculo assumido” (p. 338), sendo relevante que o comportamento constitua uma “manifestação intencional, pessoal e unilateral” e ser “clara, unívoca e séria” (pp. 342 e 343). Em tais circunstâncias, concluiu o referido autor, “a partir do momento em que o comportamento do devedor (máxime declarativo e de repúdio ou não) provoca «a disfunção da relação, alertando o credor fiel para o perigo efetivo do incumprimento ou criando-lhe a convicção fundada do fracasso da vinculação” o mesmo credor fica legitimado “ao exercício mais racional dos direitos de indemnização e (ou) resolução do contrato, mas sem que se excluam as possibilidades de uma ação de cumprimento ou da sua execução específica” (p. 351)”.


9. Outros apoios jurisprudenciais para a solução anunciada podem encontrar-se noutros arestos deste Supremo Tribunal de Justiça, designadamente nos seguintes:

No Ac. do STJ, de 30-4-15, 1187/98, Rel. Tomé Gomes, ora adjunto, no qual, com apelo ao Ac. do STJ de 22-6-10, 6134/05, ambos em www.dgsi.pt, se concluiu que:

“A vontade inequívoca de não cumprir, para efeitos de dispensa de interpelação admonitória, pode não ser expressa, admitindo-se que possa resultar de uma declaração negocial tácita estribada em comportamentos concludentes apreensíveis pela atuação da parte inadimplente, em função dos deveres coenvolvidos na sua prestação, sendo de atender ao grau e intensidade dos atos por si perpetrados na inexecução do contrato, desde que objetivamente revelem inquestionável censura, não sendo justo que o credor esteja adstrito à vontade lassa do devedor.”

Estava em causa uma situação em que:

“… a promitente-vendedora, tendo recebido integralmente o preço acordado para a venda das indicadas frações, manteve uma inércia persistente quanto à celebração do contrato definitivo, apesar das sucessivas insistências da promitente-compradora para a outorga da escritura”.

Mais refere que:

“Não pode deixar de lhe ser imputável o facto de tais frações terem sido posteriormente penhoradas na execução aqui em referência para a satisfação de créditos que deixou de cumprir, o que se afigura de molde a comprometer, irremediavelmente, a celebração do contrato prometido com a reclamante ora recorrida.   

Neste quadro circunstancial e atentos os ditames da boa fé na integração da declaração negocial, como se preceitua no art. 239º do CC, é forçoso reconhecer, à luz do disposto no art. 217º, nº 1, que o comportamento da promitente-vendedora evidencia uma inequívoca vontade de não cumprir a obrigação assumida para com a promitente-compradora e que é inteiramente imputável àquela, dispensando assim qualquer interpelação prévia admonitória, tendo-se o contrato-promessa por definitivamente incumprido, tal como se decidiu no acórdão recorrido”. 


No Ac. do STJ 29-1-14, 954/05, www.dgsi.pt, foi aposto o seguinte sumário:

“I - O princípio do pontual cumprimento dos contratos e a confiança que os contraentes depositam no cumprimento das prestações recíprocas, justificam a resolução do contrato, por violação do princípio da boa-fé, que abrange os deveres acessórios de conduta, nos casos em que o comportamento do devedor evidencie uma clara e inequívoca vontade de não cumprir, ou seja, justificadamente determinante da perda de interesse do credor.

II - A vontade de não cumprir pode resultar de comportamentos concludentes apreensíveis pela atuação da parte inadimplente, em função dos deveres convividos na sua prestação, sendo de atender ao grau e intensidade dos atos por si perpetrados na inexecução do contrato.

III - Esses atos relevam, desde que, objetivamente apreciados, mereçam inquestionável censura, não sendo justo que o credor, por mais tolerante que tenha sido na expetativa do cumprimento, esteja atido à vontade lassa do devedor.

IV - A resolução surge, nestes casos, como um remédio para uma perturbação da estabilidade contratual e como forma de evitar efeitos perversos nos interesses postos em jogo, através da convenção contratual querida e assumida pelos intervenientes na relação contratual”.

Na respetiva fundamentação refere-se que:

“Para o que aqui releva temos como certo que para a conversão de uma situação de mora em incumprimento definitivo a interpelação admonitória não se torna necessária naqueles casos em que tenha verificado uma situação qualificável como recusa de cumprimento ou tenha ocorrido e sido justificadamente invocada a perda de interesse do credor; nestes referidos casos relevam, de forma direta ou indireta, enquanto princípios sempre presentes nas relações jurídicas os princípios da boa fé e da confiança, princípios fundamentais que impõem num plano ético-jurídico que uma parte não defraude as expectativas da outra e que o iter negocial decorra, sem exceções, com a lisura normalmente exigível às pessoas de bem.


Devemos tomar em conta que quando o devedor toma atitudes ou comportamentos que revelem inequivocamente a intenção de protelar injustificadamente o cumprimento através de atitudes que tornem justificável a perda de interesse do credor ou de não cumprir a prestação a que se obrigou, porque não quer ou não pode, o não tem, nestes casos, o credor de interpelar admonitoriamente, para ter por não cumprida a obrigação.


10. São variáveis as situações apreciadas em cada um dos citados arestos deste Supremo, mas deles flui uma forte corrente jurisprudencial que, com base na mais conceituada doutrina, permite afirmar o relevo autónomo que deve ser atribuído às ações ou omissões de cada um dos promitentes, por forma a justificar, em determinadas circunstâncias, um efeito idêntico ao que decorreria da transformação formal de uma situação de mora em incumprimento definitivo.

A exposição dos factos essenciais, sem as excrescências de outros que, pelo seu carácter marginal ou instrumental, apenas perturbam o entendimento do caso, revela bem a gravidade do comportamento adotado pela R.

Vejamos:

Assim que lhe foi transmitido, já no decorrer do ano de 2016, que a CMC havia emitido um parecer desfavorável ao PIP, a A., promitente-vendedora, requereu à R. que, por forma a validar tal informação (que, aliás, já conhecia por outra via), lhe remetesse toda a documentação que atestasse tal facto que, além do mais, era relevante para apurar as circunstâncias de que dependia o acionamento da condição resolutiva.

Pese embora as várias insistências junto da R., esta sempre manifestou desinteresse em apresentar qualquer documentação que comprovasse quais as diligências em curso para a obtenção de um parecer favorável ao PIP, e quais as respostas já obtidas.

Também não aceitou a proposta de revogação do contrato que lhe foi apresentada pela A. naquele contexto, defendendo-se com a existência de uma ação administrativa que visava obter uma decisão declarativa do deferimento tácito do PIP.

Mais concretamente, apurou-se que a remeteu à R., para a morada contratual, carta pedindo que lhe fosse remetida toda a “documentação referente ao pedido de aprovação do PIP à construção apresentado junto da Câmara Municipal de Cascais e junto da Saneste”, carta que veio devolvida.

Atenta a continuada ausência de resposta por parte da R., o A. enviou nova carta registada notificando-a de que a escritura pública de compra e venda se encontrava agendada para o dia 23-11-17, carta que a R., mais uma vez, não recebeu, não tendo comparecido no local que lhe fora indicado.

Face à continuada ausência de contacto por parte da R. e resposta às interpelações dirigidas pelo A., este tentou notificar a R., através de notificação avulsa de nova data para a outorga da escritura, sob cominação de incumprimento definitivo, notificação que não foi concretizada por não ter sido encontrada no local indicado no contrato, não tendo comparecido no local designado para a escritura.

Em suma, i) o A. notificou a R. para a morada convencionada para fazer prova da verificação ou não da condição resolutiva prevista na cláus. 5ª do contrato-promessa, o que esta sempre recusou; ii) notificou a R., mediante carta registada para a morada convencionada do agendamento da escritura de compra e venda, indicando o local dia e hora; e iii) procurou notificar a R. mediante a notificação avulsa para o agendamento de nova data para a celebração da escritura de compra e venda, face à não comparência na primeira data agendada.

Não obstante as mais diversas diligências efetuadas por parte do ora A., com vista a proceder à notificação da R. para a realização da escritura pública de compra e venda, até à presente data, a mesma não foi concretizada.

Acresce que a R., desde meados de 2017, deixou de entrar em contacto ou transmitido o que quer que fosse relativamente à celebração ou não do contrato definitivo e deixou de receber as notificações e interpelações várias do A. E, após Agosto de 2017, nunca mais o A. conseguiu encetar qualquer contacto com a R.

Os avisos de receção deixados na caixa de correio desta eram completamente ignorados e a R. deixou de atender os contactos telefónicos que lhe eram dirigidos e ou não recebia as cartas que lhe eram endereçadas ou pura e simplesmente não respondia às mesmas.


11. Ou seja:

Embora as partes se propusessem outorgar o contrato prometido dentro de um curto prazo que foi fixado, anteviram dificuldades relacionadas com o pedido de informação prévio (PIP) dirigido ao Município no sentido de clarificar o condicionalismo que rodeava o projeto urbanístico no prédio que foi objeto do contrato-promessa.

Por isso, para além de terem estabelecido uma condição resolutiva a favor da A. (que agora não conta, uma vez que não chegou a integrar o objeto da ação), para o caso de ser emitido algum parecer contrário ao pretendido pela R., foi estabelecido que todas as comunicações entre as partes seriam efetuadas nos locais referenciados.

A contemporizou com a R. durante um largo período, aguardando que esta conseguisse a almejado pedido de informação prévia (PIP) referente ao seu projeto urbanístico, enfrentando exigências legais e administrativas. Igualmente contemporizou, até certo momento, com a forma de comunicação das informações que à R. cabia prestar relacionadas com o processo urbanístico, sendo realizadas através de uma forma diversa da contratualmente prevista. Mas a partir de 2016 (seis anos depois de ter sido outorgado o contrato-promessa), a posição do A. mudou por justificadas razões: afinal, segundo informações obtidas da R., o projeto pretendido defrontava-se com obstáculos, sendo o mais visível o decorrente de pareceres negativos que entretanto foram emitidos por duas entidades administrativas (CMC e SANESTE) e que, nos termos contratuais, legitimavam o acionamento da condição resolutiva por parte do A., com resolução do contrato e restituição do sinal prestado.

Nestas circunstâncias, a A. tentou que a R. aceitasse uma proposta de extinção consensual do contrato, o que esta recusou, continuando a insistir na aprovação do projeto, malgrado existir já, entre outros fatores, a informação de que o prédio se encontrava numa área de “espaço-canal” e que nele estaria prevista a passagem de uma rodovia.

Perante a recusa da R., no referido contexto, seria de supor que não deixaria de manter a A. informada de todas as démarches relacionadas com o projeto de licenciamento e que, acima de tudo, cooperasse com o A. na execução do programa contratual que, podendo desembocar na outorga da escritura pública, poderia também legitimamente redundar na invocação pela A. da mencionada condição resolutiva, com restituição do sinal recebido da R. que, como se disse, dependia unicamente da existência de parecer contrário à aprovação do projeto urbanístico a que erspeitava o pedido de informação previa (PIP).

Assim o exigia a boa fé contratual e foi para esse efeito que as partes estabeleceram que as comunicações deveriam ser dirigidas a um concreto local, o que supõe naturalmente que ambas assegurariam aí a receção dessas comunicações. Em qualquer caso, atentas as regras da boa fé, cada uma das partes manteria abertos os canais de comunicação, ainda que fosse por vias alternativas que fossem aceites.

Ora a R. incumpriu manifestamente este dever de conduta que, no contexto contratual, ganha um relevo especial, recusando o recebimento de comunicações, fossem as cartas registadas, fosse a notificação avulsa, fossem até outros contactos informais, não se detetando qualquer razão justificativa para tão estranha atuação.

As instâncias já afirmaram e confirma-se que, apesar de a R. não ter recebido as duas cartas registadas com aviso de receção, as respetivas comunicações se consideravam eficazes, atento o disposto no nº 2 do art. 224º do CC, o que permite afirmar com absoluta segurança, que a R., sem qualquer justificação, não remeteu à A. os documentos necessários à tomada de decisão firme sobre a evolução do contrato-promessa e que, além disso, faltou à escritura pública de compra e venda para que foi convocada.

Porém, enquanto a 1ª instância concluiu que tal comportamento (associado à inexecução da notificação avulsa) traduzia uma situação de incumprimento definitivo, a Relação considerou que a atuação da A. ainda era insuficiente, na medida em que a certidão negativa elaborada aquando da tentativa de notificação avulsa nenhum efeito projetaria na esfera da R., com a justificação de que ninguém é obrigado a estar permanentemente num determinado sítio para receber tais notificações.

Independentemente da resposta que já demos à eficácia da notificação avulsa, a realidade que emerge dos factos apurados não sustenta uma tal resposta que acaba por se traduzir num tratamento condescendente da R. totalmente injustificado e injustificável e que encontra no ordenamento jurídico uma resposta diversa.


13. Perante o quadro circunstancial pergunta-se: que mais seria preciso para se concluir que a R., pelo seu comportamento, revelou a vontade de não outorgar o contrato de compra e venda dentro dos quadros que foram assinalados no contrato?

E, ainda, de forma retórica: perante as sucessivas manifestações da R. no sentido de quebrar qualquer comunicação com a A. seria necessário, como defendeu a Relação, que a A. ainda continuasse a insistir na notificação da R. (como e aonde?) para fixação de um prazo adicional? E seria exigível que a A. continuasse a aguardar que a R. obtivesse uma decisão judicial referente ao deferimento tácito do pedido de informação prévia?

Responde-se negativamente a estas duas questões, com a perceção de que nenhum ordenamento jurídico equilibrado como é o nosso pode premiar com a persistência do vínculo contratual a parte que manifestamente não encontra merecimento em função do seu comportamento, penalizando, e penalizando gravemente, a contraparte que se considera com o direito de terminar o relacionamento contratual.

Não pode ignorar-se que a R., a partir de 2016, passou a revelar o total desinteresse e, colaborar com o A. no âmbito de um contrato cujo cumprimento não interessava apenas à R., mas também, e especialmente à A., para quem se revelaria imprescindível a colaboração da R. que negou a partir do momento em que foi confrontada com a pretensão do A. de obter informações mais precisas sobre o estado do pedido de informação prévia (PIP).

Ora, quem sonega informação contratual relevante, quem se evade à execução de notificações, quem corta cerce a possibilidade de qualquer comunicação com a contraparte revela uma grave violação de um dever de conduta que, no concreto contexto negocial de um contrato preparatório, equivale à vontade de não cumprir os termos contratuais, justificando a quebra do contrato por verificação de uma situação de incumprimento definitivo.

Tal como se decidiu no Ac. do STJ de 3-3-05, 05B002, www.dgsi.pt, equivale ao incumprimento definitivo “todo e qualquer comportamento que indique de uma maneira certa e inequívoca que o devedor não pode, ou não quer, cumprir”, conclusão que também encontra apoio em Brandão Proença quando conclui que especialmente quando estão em causa “contratos de cumprimento não instantâneo ou que apresentam uma estrutura de formação progressiva (como é o caso do contrato-promessa)”, “a prática de atos materiais ou a prática de atos jurídicos podem ser reveladores inequívocos do desejo de repudiar o compromisso assumido” (Estudos em Homenagem, cit., pp. 359 e 360).


14. Valem para o caso as observações que, num caso muito semelhante, foram exaradas no Ac. do STJ 27-5-10, 1556/03, www.dgsi.pt:

“I - Se foram goradas duas tentativas para notificar o A. (promitente-comprador) através de carta registada com A/R, e a própria notificação judicial avulsa teve o mesmo resultado, pela simples razão de que o A. não habitava no local que indicara no contrato-promessa ou mudara de residência sem ter comunicado tal facto à R. (promitente-vendedora), têm de se entender tais tentativas de notificação como havendo sido efetivamente feitas, já que endereçadas ou tentadas cumprir no lugar indicado pelo A. – art. 237º-A do CPC (de 1961).

II - Qualquer comunicação de mudança de residência, para ser eficaz como meio desculpabilizante do não recebimento das cartas registadas com A/R por parte do A. e do resultado negativo da notificação judicial avulsa, teria de ser feita pelo A. à própria R. e não ao seu mediado …

III - Com a segunda carta, a R. procedeu à marcação de nova data para a escritura; fê-lo com recurso a A/R, como estava previsto no contrato, indicando o dia e a hora, nas condições aí previstas. O A. faltou a essa escritura e só não recebeu a carta por sua culpa, já que não comunicara à ré a mudança da sua residência. A devolução da carta acabou assim por produzir os mesmos efeitos jurídicos como se tivesse sido efetivamente interpelado para comparecer, fazendo com que, pelo menos desde então, o A. incorresse em mora – art. 805º, nº 2, al. c), do CC.


V - A não recetividade das declarações emitidas pela R., marcando sucessivamente datas para a escritura, nem por isso deixaram de ser eficazes, uma vez que a razão para a sua não receção só pode ser imputada a culpa do A. – art. 224º, nº 2, do CC. Desta forma, ao não comparecer à escritura marcada para 16-6-03, com a devida interpelação admonitória depois de já estar em mora, ficou justificadamente resolvido pela R. o contrato-promessa que havia celebrado com o A. – art. 808º, nº 1, do CC.

…”

O caso dos autos é ainda paralelo ao que foi apreciado no Ac. do STJ de 2-2-17, 280/13, www.dgsi.pt, onde se conclui que:

“Tendo ficado provado que a promitente-vendedora deixou penhorar o bem imóvel que prometeu vender, sem reação e sem dar conhecimento à promitente-compradora, induzindo esta em erro acerca do desenvolvimento do processo executivo – quando, nessa data, já se encontrava marcada data para a venda judicial –, é de concluir, à luz da orientação jurisprudencial que tem sido seguida pelo STJ, que se está perante um comportamento concludente, com relevância declarativa, já que a primeira se desligou em definitivo dos compromissos assumidos perante a segunda, deixando patente que o contrato-promessa não era para cumprir”.


Seguindo a orientação jurisprudencial deste Supremo Tribunal, considera-se que a conduta da promitente vendedora, aqui 1ª R. – ao não deduzir oposição à penhora, não informar a promitente compradora da penhora e, mais ainda, ao tentar induzi-la em erro acerca do desenvolvimento do processo executivo – constitui um comportamento concludente com relevância declarativa: trata-se de uma declaração tácita, mas clara e inequívoca, da intenção de não cumprir o contrato.


Já no STJ, 24-5-07, 07A988, www.dgsi.pt, se observara, relativamente à problemática geral dos comportamentos concludentes que:

“Na determinação da concludência do comportamento em ordem a apurar o respetivo sentido, nomeadamente enquanto declaração negocial que dele deva deduzir-se com toda a probabilidade, é entendimento geralmente aceite que a inequivocidade dos factos concludentes não exige que a dedução seja forçosa ou necessária, bastando que, conforme os usos do ambiente social, ela possa ter lugar com toda a probabilidade, devendo ser aferida por um “critério prático”, baseada numa “conduta suficientemente significativa” e que não deixe “nenhum fundamento razoável para duvidar” do significado que dos factos se depreende”.


Também no Ac. do STJ 6-10-11, 2434/08, www.dgsi.pt, se concluiu, num caso com muitas semelhanças, que:

“…

III - É suscetível de determinar a perda objetiva do interesse na prestação a lesão grave e justificada da confiança do promitente-comprador na capacidade e vontade séria da contraparte na realização das prestações a seu cargo, resultante de demora claramente excessiva, segundo os padrões dominantes e as exigências de razoabilidade e da boa fé, - não apenas na conclusão, mas no simples licenciamento e arranque da obra - agravada pela assunção pelo promitente-vendedor de comportamentos evasivos, contrários às exigências da boa fé (prometendo momentos sucessivos, primeiro para a conclusão, da obra, sempre incumpridos, e esquivando-se posteriormente a qualquer contacto e prestação dos esclarecimentos devidos), reveladores de uma atuação não colaborante, demonstrativa de manifesta desconsideração pela confiança e pelos interesses legítimos da contraparte

Refere-se na fundamentação que:

“Tal quebra justificada da confiança da contraparte na capacidade e vontade do promitente vendedor para concluir a obra a seu cargo não pode deixar de tornar legítimo o ato de resolução do contrato promessa, operado através da presente ação como consequência da substancial e reiterada inércia do promitente vendedor, mantida mesmo após a notificação admonitória que lhe foi feita.

Ou seja: mesmo que se considere que a conduta reiteradamente omissiva e evasiva do promitente vendedor, mantida ao longo dos vários anos que já durava a relação contratual, não traduz uma recusa absoluta, inequívoca e clara de cumprimento, a violação dos deveres de diligência e boa fé que impendiam sobre o construtor e a lesão irremediável da confiança contratual da contraparte que despoletaram permitem que se considere definitivamente incumprido o contrato promessa , por perda objetiva do interesse dos promitentes compradores na prestação – radicando, deste modo, na violação grave e culposa dos princípios da boa fé e da confiança a consequente existência de justa causa para a resolução do negócio por parte dos promitentes compradores”.


E a respeito do dever de colaboração, veja-se o Ac. do STJ 19-5-10, 850/05, www.dgsi.pt, no qual se assumiu que:

“…

II - Reveste uma natureza não colaborante, demonstrativa de uma absoluta desconsideração pelos interesses dos promitentes-compradores AA., a atitude da promitente-vendedora R. que se eximiu, sistematicamente, a realizar as diligências que sobre si impendiam, no sentido de proceder à celebração do contrato prometido, colocando-se, inclusive, numa posição de inviabilidade absoluta relativamente a quaisquer contactos que os AA. com ela pretendessem efetuar, coartando, assim, àqueles, toda e qualquer possibilidade da obtenção de uma solução amigável relativamente ao contrato-promessa celebrado.

III - Tal atitude equivale à recusa da cooperação devida, já que, de acordo com as regras da boa fé, seria expetável para os AA. uma atitude de leal colaboração por parte da R., pelo que, perante a violação de tal princípio, com a consequente existência de uma justa causa de resolução do negócio jurídico celebrado, estão os AA. dispensados do cumprimento do art. 808º do CC”.

Esta foi a síntese da fundamentação, na qual se consignou, além do mais, que:

“Ora, dado que no cumprimento das obrigações as partes devem proceder de acordo com os princípios da boa fé – art. 762º, nº 2, do CC -, a atitude assumida pela R. reveste a natureza de uma atitude não colaborante, demonstrativa de uma absoluta desconsideração pelos interesses dos AA., atitude essa que equivale à recusa da cooperação devida, já que, de acordo com as regras da boa fé, seria expectável para estes uma atitude de leal colaboração por parte daquela, pelo que, perante a violação de tal princípio, com a consequente existência de uma justa causa de resolução do negócio jurídico celebrado, os AA. estariam dispensados do cumprimento do art. 808º do CC – vide anot. do Prof. Baptista Machado, in RLJ 118º/332”.


15. Estas múltiplas transcrições justificam-se para ilustrar o desacerto do acórdão recorrido em contracorrente relativamente ao relevo que vem sendo atribuído por este Supremo Tribunal de Justiça à materialidade no campo de relações jurídicas que perduram no tempo e que implicam para cada um dos contraentes múltiplos deveres.

Perante a torrente jurisprudencial que alinha com a doutrina mais autorizada, somos levados a concluir que o caso sub judice reúne todos os requisitos para se afirmar a existência de um comportamento concludente por parte da R. substancialmente equiparável a uma recusa de cumprimento para efeitos de despoletar o direito potestativo de resolução. Tal comportamento traduz uma quebra objetiva da confiança no futuro contratual que tornava manifestamente desnecessária qualquer outra iniciativa da A., antes de se declarar a resolução do contrato.

A situação de incumprimento definitivo nem sempre exige – nem é aconselhável que exija – que se percorram necessariamente todos os passos que tradicionalmente se destinam a transformar uma situação de mora em incumprimento definitivo, especialmente nos casos em que significantemente a parte já revelou que não pretende ser contactada. Não se pode exigir que seja “levada a carta a Garcia” se o destinatário revela total desinteresse em recebê-la.

A interpelação admonitória – que, no caso, apesar de tudo, existiu, nos termos que já foram assumidos anteriormente – corresponde a uma exigência trivial que será de exigir nos casos normais, isto é, quando não exista qualquer circunstância que qualifique negativamente o comportamento da contraparte. Pelo contrário, deve ser dispensada, para bem de todos e, em primeiro lugar, para valorização das regras da boa fé e penalização de condutas antinegociais, quando a parte revele manifesto desinteresse em receber qualquer comunicação.

Para o efeito, insista-se, aponta o facto de ter sido assinalado no contrato que as missivas seriam dirigidas a locais concretos e que, por isso, qualquer alteração substancial deveria ser comunicada. Perante uma tal convenção, a falta de receção das comunicações funciona unicamente em prejuízo da R., não apenas para caracterizar uma situação de mora relativamente ao cumprimento do contrato prometido, mas, mais do que isso, para integrar o incumprimento definitivo que a certidão negativa relacionada com a notificação avulsa veio confirmar.

Por outro lado, independentemente de qualquer interpelação, a R. falhou por completo ao cumprimento do seu dever de informação a partir de 2016, a partir do qual a A. poderia ficar a saber, com absoluta segurança, se estava ou não verificada a condição suspensiva (que favorecia a R.) ou se havia ou não condições para invocar a condição resolutiva (que beneficiava a A.).

Além disso, sempre as regras da boa fé, que também ficaram assinaladas no contrato e que sempre resultariam da lei (art. 762º do CC), implicavam que a R. mantivesse a A. a par de todas as vicissitudes do processo negocial.

O que não podia fazer, por implicar o tal comportamento equivalente ao incumprimento definitivo, era, designadamente:

a) Recusar a entrega da documentação relativa ao PIP;

b) Recusar a receção das cartas e de contactos telefónicos ou outros;

c) Omitir qualquer informação relevante.

Mesmo a inviabilidade da concretização da notificação avulsa é de imputar à R., já que tal não pode desligar-se da sua conduta adotada a respeito das anteriores démarches que a A. executou.

Repare-se ainda que, estando fixado no contrato que a R. deveria no prazo de 3 dias a partir da notificação para a escritura entregar à A. os documentos necessários, no caso concreto, a R. falhou esse dever contratual, sendo certo que não era a A. que tinha que investigar se existia ou não existia algum PIP positivo ou negativo ou algum parecer desfavorável ao projeto.

Se alguém recusa receber comunicações importantíssimas da outra parte relacionadas com o cumprimento do contrato e se, além disso, sonega informações imprescindíveis, não pode esperar do ordenamento jurídico que percorra todos os passos tradicionais para a constituição de uma situação de incumprimento definitivo por via de uma interpelação admonitória (que, repita-se, apesar de tudo, existiu), devendo ser tratado de forma equivalente aos casos em que existe uma recusa categórica de cumprir o acordado, por forma a justificar a resolução do contrato.

Quem outorga um contrato-promessa de compra e venda no qual se convenciona que a outorga da escritura, embora em determinado prazo, possa ser diferida tendo em conta a evolução do processo administrativo de natureza urbanística, conseguindo da contraparte a sua colaboração para sucessivos diferimentos do prazo, não pode deixar de corresponder com semelhante comportamento quando se trata de abrir mão de informações que são relevantes ou, ainda mais, quando se mostra necessário manter abertos canais de comunicação que as partes convencionaram para efeitos de regulação dos seus interesses.

A falta de recebimento das cartas registadas e até a não consumação da notificação avulsa por agente de execução revelam da parte da R. um corte praticamente absoluto com a A. que contraria uma séria vontade de outorgar em tempo útil o contrato prometido.


16. Não serve de justificação mínima o facto de a R. manter um litígio com o Município acerca do deferimento tácito do PIP, fator que, ademais, se apaga quando se verifica que o processo administrativo já revelava diversos impedimentos ao projeto urbanístico pretendido para o prédio que foi objeto do contrato-promessa.

Com efeito, na perspetiva da A., não era o resultado do pedido de informação prévia (PIP) que interessava, fosse ele conferido pelo Município ou obtido – ao fim de um longo percurso - através do reconhecimento por via judicial da existência de deferimento tácito.

Pelo contrário, bastava que no procedimento administrativo em curso ocorresse a emissão de um parecer negativo ao PIP para que a A. pudesse legitimamente invocar a condição resolutiva estabelecida a seu favor.

O cerne do presente litígio está, pois, no incumprimento dos deveres de informação e no corte radical injustificado e prolongado de toda e qualquer comunicação, porventura com o objetivo de colocar a A. perante dificuldades no que concerne ao acionamento da condição resolutiva ou à análise de outras opções que mais lhe interessavam.

Era a informação segura sobre o que ocorrera no processo administrativo referente ao pedido de informação prévia (PIP) que poderia conferir à A. a possibilidade, a todos os títulos razoável, de, ao fim de 7 anos após a celebração do contrato-promessa, retomar o controlo da situação perante o prédio que continuava a integrar o seu ativo imobiliário (sendo que o cerne da atividade de uma instituição financeira não é a gestão de ativos imobiliários que constitui). Era a partir da certeza quanto à existência de parecer ou de pareceres desfavoráveis à aprovação do PIP, que a A. poderia acionar a condição resolutiva do contrato ou reagir de outra forma que melhor correspondesse aos seus interesses patrimoniais, sem ficar amarrado ao futuro longínquo e incerto de um processo urbanístico enredado numa teia administrativa e judicial.

Neste contexto, é inadmissível o argumento apresentado pela R. no sentido de impor à A. que aguardasse pela resolução definitiva da ação que a R. interpusera no Trib. Administrativo de Círculo, quando estava em causa um contrato-promessa outorgado em 2010, que se foi arrastando até 2016 e que, a partir de 2017, entrou em estado de letargia total e injustificadamente imputável à R.

Pelo contrário, a resolução do contrato com base no juízo de concludência quanto ao incumprimento definitivo encontra justificação num princípio de justiça que, em razão da gravidade da conduta da R., impõe o reconhecimento ao credor da faculdade de se libertar imediatamente do vínculo contratual por quebra da relação de confiança. E encontra ainda justificação num princípio de racionalidade e de eficiência económica, na medida em que está em causa a venda de um ativo imobiliário, tendo em vista minimizar os prejuízos que o arrastamento da situação determinava.

Estes os motivos acrescidos que reforçam a conclusão de que a R. incorreu em incumprimento definitivo do contrato-promessa justificando a invocaão pela A. do seu direito potestativo de resolução, com retenção do sinal recebido da R.


IV – Face ao exposto, acorda-se em julgar procedente a revista, revogando-se o acórdão recorrido e passando a subsistir a sentença da 1ª instância.

Custas da revista e nas instâncias a cargo da R.

Notifique.

Nos termos do art. 15º-A do DL nº 10-A, de 13-3, aditado pelo DL nº 20/20, de 1-5, declaro que o presente acórdão tem o voto de conformidade do Sr. Cons. Tomé Gomes e voto de vencido do Sr. Cons. Rijo Ferreira, primitivo relator, que compõem este coletivo.

Lisboa, 11-11-20


Abrantes Geraldes (Relator)

Tomé Gomes

Rijo Ferreira (vencido, conforme declaração anexa)


DECLARAÇÃO DE VOTO

Fiquei vencido porquanto entendo que não se verificam os pressupostos da resolução contratual.

Com efeito, e desde logo, não vislumbro como se possa concluir pela existência de incumprimento (expresso ou por comportamento concludente) de um contrato cujo cumprimento não é exigível. Tendo as partes estipulado que a concretização do negócio acordado ficava subordinada à emissão de PIP favorável e sendo inequívoca a inexistência desse PIP favorável não é exigível a celebração do negócio prometido; e a eventual recusa da sua realização não é incumprimento injustificado, que é o pressuposto da resolução por incumprimento.

Por outro lado, não aceito que uma notificação avulsa de uma declaração negocial receptícia não conseguida pela singela circunstância de o notificando não ter sido encontrado na morada indicada (ainda que convencionada) seja tida por eficaz porquanto isso pressupõe fazer incidir sobre o notificando o ónus de estar permanentemente disponível (24 sobre 24 horas) para receber tal tipo de notificação; ónus esse que se apresenta como manifestamente excessivo e, consequentemente, desproporcionado. Ao contrário da notificação postal que deixa sinal (a carta no receptáculo postal ou o aviso para a ir levantar ao posto de correio) que permite ao destinatário, no uso da diligência devida, aceder à comunicação, a notificação judicial avulsa não deixa qualquer sinal. Não pode, pois, considerar-se que nessa circunstância o destinatário foi posto na posição de, actuando com a diligência devida, poder aceder e conhecer a declaração que lhe é dirigida.

Sendo que o acórdão do STJ (de 5DEZ95, BMJ 452/405) invocado em defesa da posição assumida no acórdão diz respeito a situação bem diversa: a recusa de assinatura da notificação.

Em consequência não acompanho a conclusão de que, no caso, ocorreu eficaz interpelação admonitória. Além de que, como já referido não vislumbro que fosse exigível a realização da escritura por se encontrar vigente a condição suspensiva.

Não ponho em causa a posição doutrinária e jurisprudencial, amplamente referida no acórdão, segundo a qual o incumprimento pode resultar de um comportamento concludente, ainda que originado na violação de deveres acessórios. A minha discordância advém de, ao contrário da maioria, não encontrar nas concretas circunstâncias do caso concludência no sentido de a Ré não querer cumprir o contrato-promessa, de “não outorgar em tempo útil o contrato prometido”.

As partes, no uso da sua liberdade de estipulação, estabeleceram um específico condicionalismo (o contrato prometido não é devido enquanto não houver informação favorável do PIP e a ocorrência de informação desfavorável desse PIP acarreta a resolução do contrato), que dá ao negócio entre si celebrado uma especificidade que não pode deixar de ser tida em conta na apreciação dos comportamentos de execução do plano contratual; em particular que essa ‘bizarra’ condição acarreta uma forte probabilidade (que se tem vindo a concretizar) de prolongamento temporal e indefinição da execução contratual.

As partes sabiam, e a isso fizeram expressa referência no contrato, que a aquisição do imóvel só interessava à Ré se nele pudesse levar a cabo uma operação urbanística (e não terá sido alheia a esta possível utilização o valor do preço acordado), a qual, dadas as contingências da situação desse imóvel se apresentava como problemática; e aceitaram condicionar os efeitos do contrato a essa aleatoriedade, que implicava a possibilidade de uma longa e indefinida execução contratual, até que se consolidasse ou não a aptidão edificativa do terreno em causa

E o comportamento subsequente do Autor foi para além da aleatoriedade prevista no contrato porquanto aquiesceu sucessivamente na prorrogação do prazo para a realização do contrato prometido, fazendo irrelevar (abdicando de invocar a verificação da condição resolutiva, com a consequente ablação desse direito ou, no mínimo, sufragando o entendimento de que só a decisão administrativa firme – não judicialmente impugnável ou moldada por decisão judicial -  relevava para o preenchimento da condição) a informação desfavorável do PIP já verificada.

Nesse quadro comportamental a tentativa do Autor de se desligar do contrato quando pela necessidade, para cumprimento da obrigação de diligenciar pela obtenção de legalização da operação urbanística almejada, de recurso à via judicial, mais aumentaram as dificuldades da execução contratual para a Ré e as perspectivas de prolongamento temporal do prazo de execução do contrato, surge contraditória com a sua conduta anterior e com a indução de confiança que ela provocou na Ré.

Nessa conformidade não se me afigura que o Autor seja de considerar como um contratante totalmente honesto, leal, fiel e cumpridor, como é considerado no acórdão; e que, se encontre numa posição de perpetuação de uma situação de indefinição a que seja alheio; pelo contrário, essa condição resulta da forma como moldou o contrato e do seu próprio comportamento.

Ademais essa ‘perpetuação’ da indefinição resulta não da actividade das partes, mas das contingências da pendência de uma acção administrativa, não se me afigurando admissível a perspectiva do acórdão na afirmação de que os cidadãos não têm de ficar sujeitos à espera das decisões judiciais.

Por outro lado, o que resulta da factualidade apurada é uma reiterada, persistente e diligente actividade (quer junto da autarquia quer dos tribunais) no sentido de obter a informação favorável ao PIP permissora da outorga do contrato prometido.

Divirjo da maioria naquilo que deve ser entendido como como informação desfavorável do PIP. No meu entender o que releva nesse quadro é a decisão da Câmara Municipal relativamente ao PIP, legalmente designada por ‘informação favorável’ ou informação desfavorável’ (nºs 1, 3 e 4 do art.º 16º do DL 555/99) e não os pareceres ou informações emitidos ou apresentados no âmbito do respectivo procedimento, elaborados pelos serviços municipais ou por outras entidades que devam ser consultadas (cf. artigos 15º e 16º, nº 2, do DL555/99).

E nessa perspectiva o conteúdo essencial, o ‘núcleo duro’, dos deveres de informação é o condizente à emissão ou não da deliberação da Câmara Municipal e o seu conteúdo. E relativamente a esse conteúdo essencial o dever de informação afigura-se-me minimamente cumprido pois que ao Autor foi dado conhecimento da emissão das informações desfavoráveis e da instauração da acção administrativa. A evasiva a dar mais pormenorizada informação não assume, a meu modo de ver, a gravidade susceptível de atingir a subsistência do projecto contratual; até porque se encontra já suprida com a junção, ocorrida nos autos, de cópia quer do procedimento do PIP quer da acção administrativa.

Por outro lado, e relativamente ao invocado corte dos canais de comunicação enquanto manifestação de violação dos deveres de boa-fé, igualmente se não me afigura uma violação susceptível de tornar inviável o vínculo contratual. Desde logo porquanto esse corte se encontra insuficientemente caracterizado na medida em que, para além de genéricas referências a ter deixado de entrar em contacto, de concreto apenas se refere as duas cartas não recepcionadas e a uma notificação judicial avulsa não conseguida. A esse corte de comunicações não é estranho o contraditório comportamento do Autor, uma vez que esse corte surge na sequência e como consequência daquele comportamento; com efeito, depois de aceitar mais uma prorrogação do prazo para a celebração do contrato-prometido irrelevando a emissão de informação desfavorável ao PIP e de ter conhecimento da instauração da acção administrativa o Autor comunica o seu desinteresse pela manutenção da vigência do contrato, propondo o correspondente distrate, o que não foi aceite pela Ré, que reafirmou estar a verificação da condição dependente do desfecho da acção administrativa. Ou seja, tendo o Autor tomado a iniciativa de invocar que intentava dar por extinto o contrato, a Ré contrapõe-lhe que não tem fundamento para tal uma vez que haverá de aguardar pelo desfecho da acção administrativa para aferir da verificação ou não da condição resolutiva; sendo esta dissensão a causa do referido corte comunicacional. E nesse circunstancialismo o corte comunicacional surge mais como prevenção de conflitualidade continuada em face da posição afirmada – há que esperar pelo desfecho da acção administrativa - do que insuportável violação dos deveres de boa-fé.

                                                                                                            (Rijo Ferreira)