Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
118/14.2YFLSB
Nº Convencional: SECÇÃO DO CONTENCIOSO
Relator: TÁVORA VÍTOR
Descritores: JUIZ
RECURSO CONTENCIOSO
CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA
PLENÁRIO
APOSENTAÇÃO COMPULSIVA
TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
RECURSO
EFEITO DO RECURSO
EFEITO SUSPENSIVO
SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
INCONSTITUCIONALIDADE
PRINCÍPIO DA TUTELA JURISDICIONAL EFECTIVA
Data do Acordão: 10/11/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO CONTENCIOSO
Decisão: IMPROCEDENTE
Área Temática: DIREITO ADMINISTRATIVO – PROCESSO ADMINISTRATIVO
ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA - ESTATUTOS PROFISSIONAIS / MAGISTRADOS JUDICIAIS.
Legislação Nacional: CRP: ART. 20.º, ART. 205.º, N.º 2 E ART. 268.º, N.º 4
LEI N.º 28/82, DE 15/11: ARTS. 78.º, N.º 4
EMJ: ART. 170.º N.º 2
RCP: ART. 7.º, N.º 1
CPC: ART. 527.º, N.º 1
CPTA: ART. 34.º, N.º 2
Sumário :
I - Tendo o STJ mantido integralmente a deliberação recorrida que aplicou à recorrente a pena de aposentação compulsiva (trata-se, pois, de um acto com conteúdo negativo, i.e. que não introduz qualquer alteração na ordem jurídica), a fixação de efeito suspensivo ao recurso interposto para o TC daquele aresto não afecta nem impede a execução, pelo CSM, de medidas destinadas a efectivar essa decisão.
II - Posto que o recurso da decisão que aplicou a pena referida em I tem efeito meramente devolutivo, aquela mantém-se incólume e intacta, mormente quanto à respectiva execução imediata.
III - A suspensão da eficácia da deliberação recorrida (art. 170.º do EMJ) visa conciliar a rapidez na resolução dos interesses confiados à administração com a defesa dos prejudicados com a sua prática. Resultando as restrições emergentes da lei da necessidade de conciliar os interesses antagónicos em presença, não se surpreende naquele preceito qualquer inconstitucionalidade.
IV - Tendo sido apreciadas todas as questões colocadas e se concluido que não mereciam acolhimento, não tem cabimento a invocação do direito à tutela jurisdicional efectiva.
Decisão Texto Integral:


Acordam na Secção de Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça

A Dra. AA interpôs recurso contencioso da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 30 de Setembro de 2014 que considerou não provida a reclamação que apresentara da decisão da Exma. Vogal do CSM que indeferiu o requerimento por si apresentado em 15 de Julho de 2014 tendo em vista a suspensão de todos os actos de execução e operações materiais tendentes à execução da Deliberação do Plenário do CSM de 20 de Junho de 2013, que no âmbito do processo disciplinar com o nº 198/2012 lhe aplicou a pena de aposentação compulsiva.

Realizadas diligências preliminares reputadas como indispensáveis e juntos documentos pertinentes foi admitido o recurso, sendo enviadas cópias ao Conselho Superior da Magistratura para responder, o que aquela entidade veio a fazer a fls. 82.

Foi ordenando o cumprimento do artigo 176º ss do EMJ tendo apresentado alegações o CSM e o Ministério Público. Ambas estas entidades se pronunciaram no sentido do da improcedência do recurso.

A Requerente nada veio dizer.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

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2. FUNDAMENTOS.

Com interesse para a decisão da causa consideram-se provados os seguintes,

2.1. Factos.

2.1.1. Por deliberação do Plenário do CSM de 20/6/2013 foi aplicada à Senhora Juiz a pena de aposentação compulsiva;

2.1.2. A Sra. Juiz recorrente interpôs recurso dessa deliberação para este Supremo Tribunal de Justiça.

2.1.3. Por acórdão de 26/2/2014 foi negado provimento ao recurso.

2.1.4. A senhora Juiz recorrente interpôs recurso desse acórdão para o Tribunal Constitucional, tendo tal recurso sido admitido por despacho de 04/06/2014, do Exmo. Juiz Conselheiro Relator, que determinou a sua subida nos próprios autos e lhe fixou efeito suspensivo.

2.1.5. Entretanto, em 24/07/13, a senhora Juiz Recorrente requereu a este Supremo Tribunal de Justiça a suspensão da eficácia da deliberação do Plenário do CSM de 20/06/2013;

2.1.6. Por acórdão de 12/09/2013, foi indeferido o pedido de suspensão de eficácia;

2.1.7. Após arguição de nulidade, recurso e reclamação para o Pleno dessa decisão, a senhora Juiz interpôs recurso para o Tribunal Constitucional. 

2.1.8. Por decisão sumária de 3/6/2014, a Senhora Conselheira Relatora decidiu não conhecer do objecto do recurso.

2.1.9. Em 15/07/2014 a senhora Juiz recorrente apresentou ao CSM, requerimento tendo em vista a suspensão de todos os actos de execução e operações materiais tendentes à execução da deliberação do plenário do CSM de 20/06/2013, que lhe aplicou a pena de aposentação compulsiva:

2.1.10. Requerimento que foi objecto de inicial indeferimento pela Exma. Vogal de turno e, depois, face à reclamação apresentada de deliberação de 30-9-2014 requereu a suspensão de eficácia dessa deliberação.

2.1.11. Simultaneamente impugnou a mesma através do presente recurso contencioso:

2.1.12. Por acórdão de 16/12/2014 foi indeferida a suspensão de eficácia.

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2.2. O Direito.

Da análise do processo resulta estar essencialmente em causa a seguinte questão:

- O efeito suspensivo atribuído ao recurso para o Tribunal Constitucional do Acórdão deste Contencioso que confirmou a pena de aposentação compulsiva aplicada pelo CSM à Recorrente é impeditivo da prática dos actos tendentes a executar a aludida decisão?

Sustenta a Recorrente que tendo interposto recurso para o Tribunal Constitucional do Acórdão de 26-12-2014 desta Secção de Contencioso que por seu turno negara provimento ao recurso da deliberação do CSM que lhe havia aplicado a pena de aposentação compulsiva, este Tribunal fixou efeito suspensivo ao recurso. Assim sendo entende que tal recurso impede a prática de quaisquer actos que se traduzam em execução imediata do decidido no processo disciplinar sendo certo que a tal não obsta o indeferimento de suspensão de eficácia de tal acto que não contende com o efeito suspensivo do recurso.

Considera a ilustre Recorrente que o acto impugnado violou as disposições do artigo 78º nº 4 da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, bem como o artigo 205º nº 2 da CRP, referindo que a interpretação do artigo primeiramente citado bem como do artigo 170º nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais - segundo a qual a suspensão dos efeitos de uma deliberação sancionatória só seria possível com o deferimento da suspensão de eficácia - infringe o artigo 205º nº 2 da CRP.

A questão que vem trazida a este Supremo Tribunal de Justiça já foi ventilada e traduz-se em indagar da projecção do efeito suspensivo conferido ao recurso do Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça para o Tribunal Constitucional. O acórdão em crise julgara improcedente o recurso do decidido.

Vejamos:

A tese da Recorrente labora num equívoco; o de que o efeito suspensivo fixado ao recurso para o Tribunal Constitucional pode afectar a execução do decidido pelo CSM desde logo determinando a suspensão das medidas com vista a tornar efectiva a decisão tomada. Isto porque julgando improcedente o recurso da decisão do CSM este Supremo Tribunal de Justiça em nada alterou o que ali havia sido deliberado; eis porque o efeito suspensivo atribuído não tem o condão de alterar o decidido,

A este propósito lembremos que os actos administrativos se classificam quanto aos seus efeitos em positivos ou negativos; os primeiros são os que produzem uma alteração na ordem jurídica produzindo uma modificação do status quo existente (é o caso de uma nomeação ou uma demissão); já os actos negativos não introduzem qualquer modificação no status quo. No caso em análise, ao recurso interposto do Acórdão do CSM que aplicou à requerente a pena de aposentação compulsiva constituiu um acto positivo… só que ao mesmo foi atribuído efeito meramente devolutivo; por seu turno o Acórdão deste Contencioso que recaiu sobre tal acto em nada alterou o que o CSM havia decidido. Mas se é assim o recurso interposto pela Exma. Requerente para o Tribunal Constitucional, mau grado o efeito suspensivo que lhe foi atribuído, não tem o condão de alterar o acto que se mantém incólume na sua fisionomia e efeitos, nomeadamente quanto à respectiva execução imediata. Como se diz no Acórdão proferido no processo de suspensão de eficácia nº 114/14.0YFLSB “A decisão do Supremo Tribunal de Justiça teve por objecto o recurso de uma deliberação do CSM com conteúdo positivo, a aposentação compulsiva da Recorrente, mas não é a esta, mas antes à decisão do Supremo Tribunal de Justiça, de cariz negativo pois que negou provimento ao recurso que vai referido o efeito suspensivo. Quanto à primeira, do CSM, não obstante a sua impugnação para o STJ o recurso interposto não só não teve efeito suspensivo, com ainda não foi paralisada pelo anterior pedido de suspensão de eficácia que foi indeferido. Daqui decorre que o efeito suspensivo fixado ao recurso da decisão do STJ não tem alguma potencialidade para retirar eficácia à deliberação do CSM, pois que lhe é inócua, indiferente”.

Das considerações expendidas deduz-se sem margem para dúvidas que não se mostram violadas as normas apontadas como tal pela Recorrente. Destarte se é certo que o artigo 78º nº 4 da Lei 28/82 da LOTC refere que o recurso para o Tribunal Constitucional tem [neste caso] efeito suspensivo, o certo é que a atribuição de tal efeito é inócua para alterar o cariz meramente devolutivo do decidido pelo CSM. E como se pode ver a não suspensão do efeito do recurso já várias vezes reiterada, encontra-se devidamente fundamentada, pelo que não se mostram igualmente violados os artigos 170º do EMJ e 205º nº 1 da CRP. O primeiro destes normativos estatui que “1 – A interposição do recurso não suspende a eficácia do acto recorrido, salvo quando, a requerimento do interessado, se considere que a execução imediata do acto é susceptível de causar ao recorrente prejuízo irreparável ou de difícil reparação”. Este tem sido um tema versado em vários recursos que a recorrente tem apresentado em Juízo, onde tem visto negada tal pretensão. A lei confere ao Juiz a possibilidade de suspensão da eficácia do acto, ponderando os elementos referidos no preceito em causa, sem que possa assacar-se qualquer inconstitucionalidade à interpretação que é dada ao preceito em causa. A Administração, na prossecução do interesse público, dispõe de meios para uma rápida resolução dos interesses que lhe estão confiados; todavia, a lei que a rege procura conciliar tal escopo com a defesa dos prejudicados directamente com a prática dos actos em análise. É neste contexto que se insere o artigo 170º do EMJ; as restrições que dele constam resultam, como sempre, da necessidade de conciliar os interesses antagónicos em presença; mas não é possível surpreender qualquer inconstitucionalidade nessa actuação.

 Como corolário de tudo o que vimos expondo, diremos que não se verifica qualquer ofensa ao princípio da tutela jurisdicional efectiva a que se reportam os artigos 20º e 268º nº 4 da CRP.

Estatui o artigo 20º que:

“1. A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.

 2. Todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade.

 3. A lei define e assegura a adequada protecção do segredo de justiça.

 4. Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo.

 5. Para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos.

Por seu turno o artigo 268º nº 4 do Diploma Fundamental estatui que “É garantido aos administrados tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer actos administrativos que os lesem, independentemente da sua forma, a determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos e a adopção de medidas cautelares adequadas”.

Confrontados com a problemática em análise, não vemos que tenham sido postergados os princípios expendidos nos comandos supra-apontados. Isto porque apreciadas todas as questões que nos foram colocadas chegámos à conclusão fundamentada que as mesmas não mereciam acolhimento, sendo certo que a problemática abordada já o tinha sido antes, em termos no essencial idênticos, como referimos, nomeadamente por este Supremo Tribunal de Justiça em outros processos conexionados com o presente.

Assim sendo o recurso em análise improcede.

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3. DECISÃO.

Pelo exposto acorda-se em julgar improcedente o recurso.

Custas a cargo da Recorrente, conforme art. 527.º, nº 1, do Novo Código de Processo Civil, com taxa de justiça que se fixa em 6 Ucs, nos termos do disposto na Tabela I-B, anexa ao Regulamento das Custas Judiciais, e art. 7.º, nº 1 deste mesmo diploma, sendo o valor da presente acção de 30.000,01 €, atento o disposto no art. 34.º, nº 2 do CPTA.

Távora Vítor (Relator)

- Fernando Bento

- Santos Cabral

- Melo Lima

- Souto de Moura

- Sebastião Póvoas (Presidente da Secção do Contencioso)