Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3988/05.1TTLSB.S1
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: BRAVO SERRA
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
PROPOSTA DE CONTRATO
CONDIÇÃO SUSPENSIVA
DESPEDIMENTO ILÍCITO
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 04/21/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Doutrina: - Luís Miguel Monteiro e Pedro Romano Martinez, in Código do Trabalho Anotado, 6ª edição, 311.
Legislação Nacional: - CÓDIGO DO TRABALHO : - ARTIGOS 10.º, 97º, 98.º, 99.º, N.º4, 105.º, 127.º.
- CÓDIGO CIVIL : - ARTIGO1152º.
Sumário : I - O contrato de trabalho representa o acordo negocial segundo o qual uma pessoa se obriga a prestar a sua actividade, mediante retribuição, a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta, tendo-se como elementos concretizadores do mesmo: (i) a emissão confluente de vontades entre o empregador e o trabalhador; (ii) que a vontade do trabalhador seja expressada no sentido de ele assumir a obrigação de prestar uma dada actividade a outrem, pautando esta de acordo com as ordens, instruções e indicações que lhe forem transmitidas pelo empregador, submetendo-se, assim, à autoridade deste último; (iii) que o empregador assuma a recepção da actividade prestada pelo trabalhador, segundo os parâmetros supra indicados, e se obrigue a prestar a este uma contrapartida por tal recepção.

II - O dever ou os especiais deveres de informação consagrados nos artigos 97.º e 98.º do Código do Trabalho que se acobertam no princípio da boa fé, quer nos preliminares, quer na formação dos contratos, não têm directa projecção na caracterização do contrato firmado ou firmando, em termos de, sem o seu cumprimento, se concluir que eles são necessários para o desenho dessa específica forma negocial.

III - Estando demonstrado que a R., no âmbito de um processo de selecção que levou a efeito, e após ter realizado entrevistas individuais com alguns candidatos, convocou o A para uma reunião, no dia 27 de Setembro de 2004, onde o Presidente do Conselho de Administração comunicou ao A que era o candidato escolhido e lhe apresentou uma proposta de emprego, oferecendo-lhe esta empresa, como contrapartida, um determinado vencimento mensal ilíquido; serviço gratuito de cantina; integração no plano automóvel da companhia, com acesso a viatura e plafond anual de combustível; telemóvel da empresa e integração no plano médico da companhia, tendo, então, sido acordado que o A. começaria a trabalhar na R. no dia 21 de Outubro de 2004, e que teria de realizar exames médicos, é de afirmar que se estabeleceu entre o A. e a R. um verdadeiro contrato de trabalho, embora sujeito a uma condição e a termo suspensivo inicial.

IV - O art. 127.º do Código do Trabalho/2003 quando comanda que ao contrato de trabalho pode ser aposta, por escrito, condição suspensiva nos termos gerais, não exige que esse escrito seja firmado pelo trabalhador.

V - Estando demonstrado que o A., em 8 de Outubro de 2004, efectuou testes médicos na R., efectivação que constituía condição para a sua admissão na mesma, e não tendo esta provado que desses exames resultaram condições de saúde do A. não permissoras da realização da actividade para que fora contratado, sendo assim de concluir que, aquando daquela data, o contrato se encontrava já a produzir os seus efeitos.

VI - Assim, ao comunicar a R., ao A., em reunião ocorrida entre 9 a 20 de Outubro de 2004, que a sua admissão ao seu serviço, não se podia concretizar já que a função que lhe estava destinada iria desaparecer, é de concluir que procedeu à cessação do contrato de trabalho por motivos que não foram fundados na faculdade prevista para o período experimental (art. 105º CT/2003), nem numa conduta do A. justificativa dela, pelo que, tal cessação, tem de ser considerada como um despedimento ilícito.

VII - Sendo o despedimento ilícito está a R. obrigada a indemnizar o A. pelos danos sofridos, nos termos gerais.
Decisão Texto Integral:
1. No 1º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa instaurou o Licº AA contra BB…., S.A., acção de processo comum, solicitando a condenação da ré a pagar-lhe € 48.190 e juros desde a citação.

Para tanto, invocou que: –

– em 27 de Setembro de 2004, ele, autor, foi convocado pelo presidente do conselho de administração da CC… […], S.A., o qual lhe comunicou que ele tinha sido o candidato escolhido para exercer o cargo de director financeiro daquela empresa, tendo-lhe sido apresentada uma proposta de emprego baseada em determinadas condições, entre as quais as de aceitar o lugar proposto até ao fim de Setembro daquele ano, de modo a começar a trabalhar em 21 de Outubro seguinte, proposta essa posteriormente confirmada por e-mail;
– após o autor expressar a sua anuência à proposta, cujos proventos e regalias eram superiores em cerca de mais de € 23.190 anuais relativamente aos auferidos na empresa DD…, Ldª, na qual, então, desempenhava as funções de director financeiro, apresentou a renúncia deste cargo, no qual laboraria até 20 de Outubro de 2004;
– em 13 de Outubro do referido ano, o autor foi convocado pela direcção de recursos humanos da CC, tendo-lhe, no dia seguinte, sido dito que, por se verificarem mudanças na política daquela empresa para o sector de gás, ficava sem efeito o seu processo de admissão, já que ela estava prestes a ser vendida à ré;
– a decisão, súbita e injustificada, da CC causou enormes prejuízos patrimoniais ao autor, que renunciou às funções que desempenhava no DD…, Ldª, e causou-lhe também enorme dano não patrimonial devido aos sofrimentos e angústias de que padeceu por se ver em tal situação, dano este que deve ser ressarcido por uma indemnização não inferior a € 25.000;
– o DD…, Ldª, veio a readmitir o autor, embora impondo-lhe diversas condições penosas.

Contestou a ré, que sustentou a sua absolvição, impugnando parte do articulado pelo autor e defendendo, em súmula, que na reunião para que o autor foi convocado em 27 de Setembro de 2004 foi-lhe, desde logo, transmitido que era plausível que todo o negócio do gás da CC poderia, a nível mundial, ser alienado, o que poderia influenciar o processo de admissão do mesmo autor, sendo que este, não obstante, reiterou o seu interesse na contratação, assumindo o risco e ficando sujeito a um período experimental de 180 dias, e sendo ainda que o autor não chegou a despedir-se do DD…, Ldª, e a CC propôs-lhe toda a ajuda de que carecesse, incluindo serviços de outplacement, o que foi recusado.

Prosseguindo os autos seus termos, dispensando-se a elaboração da selecção da matéria de facto, após julgamento veio, em 14 de Agosto de 2008, a ser proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu a ré do pedido.

Inconformado, apelou o autor para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual, por acórdão de 25 de Março de 2009, julgando parcialmente procedente a apelação, condenou a ré a pagar ao autor € 16.271 e juros desde a citação até integral pagamento.


2. Desta feita, a irresignação provém da ré, que pediu revista.

Tendo ela rematado a alegação adrede produzida com mui extensas «conclusões», que, praticamente, reproduziam o que constava do «corpo alegatório», não sendo sequer feita qualquer das indicações a que se reporta o nº 2 do artº 690º do Código de Processo Civil (na redacção anterior à emergente do Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto) determinou o relator que a mesma viesse a formular «conclusões» de harmonia com o que se prescreve nos números 1 e 2 daquele artigo.

Na sequência, a ré, veio a apresentar o seguinte quadro conclusivo: –

A) Como refere Monteiro Fernandes in Direito do Trabalho, 13ª Edição, Almedina, pág. 296, ‘a formação de qualquer contrato resulta de duas declarações negociais: a proposta e a aceitação. Conforme se conclui, além do mais, do disposto nos arts, 233º e 234º do Cód. Civil, da proposta – que exprime a iniciativa de um dos sujeitos – devem constar todos os elementos do negócio, de modo que para a sua conclusão, baste a pura e simples aceitação do seu destinatário’.
B) Conforme resulta da factualidade dada como provada e que aqui se dá por integralmente reproduzida, tal como referiu a Meritíssima Juiz do Tribunal de 1ª instância, in casu, a proposta formulada pela Recorrente previa apenas as condições retributivas e a categoria profissional, não compreendendo elementos essenciais para a formação de um contrato de trabalho, como o seja, o objecto concreto da prestação de trabalho, o local de trabalho e os próprios períodos de trabalho.
C) A proposta dirigida pela Recorrente ao Recorrido não consubstanciava, portanto, uma proposta contratual completa onde estivessem contemplados todos os aspectos essenciais caracterizadores da relação laboral e que integram um contrato de trabalho.
D) Aliás, conforme bem referiu a Meritíssima Juiz do Tribunal do Trabalho de Lisboa, verifica-se que do único elemento escrito existente (email de dia 28 de Setembro) não consta a intenção incondicional da ‘CC’ celebrar o contrato definitivo e, por outro lado, não consta a manifestação de vontade por banda do próprio Recorrido.
E) Assim, na data em que a Recorrente comunicou ao Recorrido a impossibilidade da sua admissão ao seu serviço, já que a função que lhe estava destinada iria desaparecer, estava-se, ainda, numa fase de contactos preliminares, ou seja, em que depois de escolhido o candidato final, as partes procuram conhecer-se, identificar-se, manifestam as suas condições e mantém conversações tendentes a obter um consenso sobre a regulação a verter no contrato a celebrar (vide Prof. Menezes Cordeiro in Manual de Direito do Trabalho, Almedina, 1991, págs. 556 e 557).
F) Acresce que não pode a Recorrente conformar-se com o entendimento vertido no douto Acórdão recorrido segundo o qual se verificou um despedimento ilícito já que, tendo sido celebrado um contrato a termo suspensivo, ainda não se verificava a liberdade de desvinculação prevista no art. 105º do Cód. Trabalho.
G) Desde logo porque, conforme cabalmente demonstrado, não foi celebrado qualquer contrato de trabalho e, muito menos, um contrato a termo suspensivo, sendo certo que[,] para existir termo suspensivo, exige-se que a competente cláusula conste de documento escrito assinado por ambas as partes, o que no caso em apreço não acontece.
H) Por outro lado, ainda, porque a vingar tal entendimento estar-se-ia a aceitar que o contrato produziu efeitos mesmo antes de se verificar o facto futuro a cuja aplicação as partes condicionaram essa mesma produção de efeitos.
I) Assim, não tendo sido celebrado entre a Recorrente e o Recorrido qualquer contrato de trabalho, inexistiu qualquer despedimento, e muito menos ilícito, razão pela qual carece de fundamento legal a condenação da Recorrente no pagamento ao Recorrido de qualquer indemnização.
J) Ao concluir que no caso em apreço foi celebrado entre as partes um contrato de trabalho com condição e termo suspensivo inicial, por ter havido acordo quanto às condições essenciais do contrato, o douto Acórdão Recorrido fez, salvo melhor opinião, uma errada interpretação dos preceitos legais respeitantes à formação do contrato de trabalho e à aposição de condição e termo nos contratos de trabalho, nomeadamente do disposto nos arts. 97º, 98º, 102º e 127º do Cód. Trabalho, aprovado pela Lei 99/2003, de 27 de Agosto, e dos arts. 217º, 224º, 225º, 230º, 233º, 234º, 270º e 278º do Cód. Civil.
L) Por outro lado[,] importa salientar, como o fez a Meritíssima Juiz do Tribunal do Trabalho de Lisboa, que atenta a matéria provada, não pode ser assacada à Recorrente qualquer tipo de conduta violadora dos direitos do Recorrido no âmbito do processo negocial susceptível de a fazer incorrer em responsabilidade civil, seja a que título for.
M) Mais, sendo o Recorrido conhecedor do contexto existente, porque lhe foi explicado integralmente pela Recorrente, assumiu o risco de continuar o processo mau grado os factos supervenientes que o poderiam afectar.
N) Logo, os danos invocados pelo Recorrido não têm razão de ser, nomeadamente os não patrimoniais que, como resulta do factualismo dado como provado, têm na sua génese a actuação do próprio Recorrido ao assumir o risco inerente ao processo.

Respondeu o autor à alegação da ré, sustentando a improcedência do recurso, vindo ainda, após a apresentação das «novas conclusões», a manter esse ponto de vista.

A Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo emitiu «parecer» em que defendeu a improcedência da revista.

Notificado esse «parecer» às partes, sobre ele se pronunciou a recorrente, manifestando o seu desacordo relativamente ao que nele se expunha.*

Corridos os «vistos», cumpre decidir.

II


1. Pelo aresto em crise, e sem questionamento das partes, vem dada por apurada a seguinte factualidade: –

– 1) BB…, R.B., S.A., é a actual designação social da antiga CC […], S.A.;
– 2) o autor é economista, com o curriculum vitae que se mostra junto a fls. 16 e 17 destes autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
– 3) em Agosto de 2004, o autor desempenhava as funções de director financeiro do DD…, Ldª, desde Março de 1999;
– 4) o autor, procurando melhorar os seus proventos, concorreu, então, a um anúncio público para o lugar de responsável financeiro da CC;
– 5) a resposta ao anúncio foi enviada à empresa SDO – Consultores, uma empresa especializada à qual havia sido adjudicado o respectivo processo de triagem;
– 6) ao anúncio referido em 5) responderam 385 candidatos;
– 7) o número de candidatos foi progressivamente seleccionado e reduzido;
– 8) a EE – Consultores entrevistou, depois, um a um, os candidatos seleccionados, tendo, de seguida, encaminhado a lista dos mesmos para a CC, que, após novas entrevistas individuais com alguns candidatos, acabou por escolher o autor;
– 9) em 17 de Setembro de 2004, o autor foi entrevistado nas instalações da CC, designadamente pelo presidente do conselho de administração da CC, Engº FF, e pelos directores financeiro e dos recursos humanos;
– 10) em 27 de Setembro de 2004, o autor foi convocado, tendo-lhe sido comunicado pelo Engº FF que era o candidato escolhido para o cargo de Finance Manager da CC;
– 11) nessa reunião foi o autor informado de que a CC havia recebido por parte de uma terceira entidade uma proposta de compra do negócio do gás, a nível mundial, e de que não tinha sido tomada ainda qualquer decisão quanto a tal proposta, estando em curso um processo de análise que duraria aproximadamente 12 meses, sendo a decisão tomada findo tal processo;
– 12) nessa reunião foi apresentada ao autor a seguinte proposta de emprego: –
– vencimento mensal ilíquido de € 3.757, que, ao fim de seis meses, poderia ser aumentado em 5%, dependendo da avaliação do desempenho relativamente aos objectivos a fixar;
– serviço gratuito de cantina;
– integração no Plano Automóvel da Companhia, com acesso a viatura até € 33.100, designadamente para fins pessoais, podendo exceder o valor em mais 10%, sendo, neste caso, o valor suportado pelo colaborador;
plafond anual de combustível de € 1.250;
– telemóvel da empresa;
– integração no Plano Médico da Companhia, em que a empresa suporta os prémios respeitantes aos seus colaboradores, bem como cerca de 60% dos prémios referentes aos aderentes facultativos – cônjuges e filhos;
– 13) foi acordado com o autor que este iria começar a trabalhar na CC no dia 21 de Outubro de 2004;
– 14) no dia 28 de Setembro de 2004, a Drª GG, da CC, enviou ao autor o e-mail cuja cópia se mostra junta a fls. 15 destes autos e se dá aqui por integralmente reproduzida;
– 15) mesmo após a informação referida em 11), o autor manifestou interesse em continuar no processo;
– 16) o autor aceitou ficar sujeito a um período experimental de 180 dias;
– 17) no dia 28 de Setembro de 2004, o autor apresentou a sua demissão no DD…, Ldª;
– 18) o pedido de demissão do autor foi recebido com surpresa pelos responsáveis do DD…, Ldª;
– 19) em 8 de Outubro de 2004, o autor efectuou testes médicos nas instalações da CC, tendo sido aprovado;
– 20) tais testes eram condição para a admissão do autor na CC;
- 21) em data não concretamente apurada, situada após 8 de Outubro de 2004 e antes de 21 de Outubro de 2004, o autor foi convocado pela CC para uma reunião de emergência com o Engº FF;
– 22) na reunião referida em 21), o autor foi informado de que se verificaram mudanças relativamente ao negócio do gás da CC, o qual estava prestes a ser vendido à BB, pelo que a admissão do autor ao serviço da CC não se podia concretizar, já que a função que lhe estava destinada iria desaparecer;
– 23) essa comunicação constituiu para o autor uma surpresa;
– 24) na reunião referida em 21) foram oferecidos ao autor serviços de outplacement;
– 25) posteriormente, o autor contactou a CC, dizendo que não precisava dos serviços de outplacement, solicitando tão-só uma indemnização;
– 26) o autor sempre teve a avaliação máxima no DD…, Ldª”;
– 27) o autor era pessoa estimada no DD…, Ldª;
– 28) o vencimento mensal ilíquido do autor no DD…, Ldª, ascendia a € 3.028,50;
– 29) no DD…, Ldª, o autor recebe um prémio anual de ½, 1 ou 1½ vencimentos mensais;
– 30) na CC o autor poderia receber um prémio anual que, em média, ascende a 1 a 2 salários;
– 31) o autor é casado;
– 32) em 2004, a mulher do autor declarou um rendimento de € 3.200, resultante da prestação de serviços;
– 33) o autor paga € 546,10 a título de amortização do empréstimo que contraiu para aquisição da casa que habita;
– 34) o autor tem dois filhos, pagando cerca de € 491,86, a título de mensalidade dos respectivos colégios;
– 35) depois dos factos referidos em 21) e 22), o autor dirigiu-se ao DD…, Ldª, solicitando a sua readmissão;
– 36) a primeira resposta dos responsáveis do DD…, Ldª, foi negativa;
– 37) nessa altura, o DD…, Ldª ainda não contratara substituto para o lugar do autor;
– 38) depois de novas negociações, o DD…, Ldª, considerando os factos referido em 27) e 37), bem como o mérito e as qualificações do autor, readmitiu o mesmo ao seu serviço, continuando o mesmo a desempenhar as suas anteriores funções;
– 39) o DD…, Ldª impôs, como condição para tanto, que o autor se comprometesse a trabalhar para o DD…, Ldª, durante um período de tempo mínimo e a pagar ao DD…, Ldª, uma compensação pecuniária em caso de denúncia do contrato antes de decorrido aquele período de tempo;
– 40) Após o[s] facto[s] referido[s] em 21) e 22), o autor, perante a perspectiva de ficar desempregado, passou dias de incerteza, angústia e preocupação com o seu futuro e o futuro da sua família;
– 41) o autor tinha veículo quando se encontrava ao serviço do DD…, Ldª.


1.1. Em face do que se contém no precedente item 14), convém que aqui se explicite o teor da comunicação do e-mail ali referido, o qual é o seguinte: -

Boa tarde Miguel Ribeiro,
Antes do mais gostaríamos de agradecer pelo seu interesse em integrar a nossa equipa. Na sequência da nossa reunião de ontem temos o prazer de referir, por esta via, as condições do seu ingresso nos quadros da CC a partir de 21 de Outubro de 2004.
· Ficará integrado na Divisão Financeira, com a categoria de Chefe de Divisão Financeira
· Vencimento mensal ilíquido de 3.757 €
· Ficará sujeito, após a data de admissão, a um período experimental de cento e oitenta dias
· Serviço gratuito de cantina
· Integração no Plano Automóvel da Companhia, com acesso a viatura até 33.100 € podendo exceder o valor em mais 10% (neste caso o valor é suportado pelo colaborador)
· Integração no Plano Médico da Companhia, em que a empresa suportará os prémios respeitantes aos seus colaboradores bem como cerca de 60% dos prémios referentes aos aderentes facultativos – cônjuges e filhos.
Estas condições estão sujeitas ao resultado positivo dos exames médicos de admissão a realizar em data a acordar entre a CC e o AA, antes do início da prestação de trabalho. Neste sentido, agradeço que confirme a sua disponibilidade em deslocar-se às nossas instalações para realizar os referidos exames (tem disponibilidade para amanhã da parte da tarde? Ou na próxima 6ª feira).
Com os nossos melhores cumprimentos,
GG
Human Resourses Manager
CC (…) S.A.


2. Na sentença proferida na 1ª instância, que, como se relatou, teve a acção por improcedente, entendeu-se que a proposta que consta de II 1. 12) supra, não obstante a expressão «proposta» aí empregue, não configurava, em termos jurídicos, uma proposta contratual, dado que não versava uma completude de todos os aspectos essenciais concretizadores de uma relação laboral integrantes do futuro contrato de trabalho – pois que não resultavam, desde logo, as concretas funções (e não a mera categoria) a exercer pelo autor, o seu horário de trabalho ou isenção dele e o local de trabalho – e não revelava uma intenção inequívoca de contratar (não sendo o e-mail remetido pela CC perspectivável como uma promessa de contrato de trabalho, sendo que é omitida a manifestação do autor em aceitá-la).

Face a este entendimento, concluiu a dita sentença que não chegou a ser celebrado um contrato de trabalho entre o autor e a ré, e, a haver responsabilidade deste, a mesma só se poderia fundar na culpa in contrahendo, mas que da factualidade apurada não era possível extraírem-se elementos dela fundamentadores.

Diverso posicionamento foi o seguindo pelo acórdão em sindicância.

Efectivamente, neste aresto discorreu-se do seguinte jeito: –

“(…)
Como referimos, a primeira questão suscitada no presente recurso, consiste em saber se, da matéria de facto provada, se pode concluir ter sido celebrado entre as partes um contrato de trabalho, como defende o Apelante, ou se este não chegou a existir, como se entendeu na sentença recorrida e é corroborado pela Apelada nas suas contra-alegações de recurso.
Antes de mais, importa ter presente haver-se demonstrado que a BB‘... SA’, Ré nos presentes autos, é a actual designação ou denominação social da antiga CC ‘… […], SA’.
Posto isto e com interesse para a apreciação daquela primeira questão de recurso, verificamos haver-se demonstrado que, desempenhando o Autor, desde Março de 1999, as funções de Director Financeiro da DD ‘…, Ldª’ e procurando melhorar os seus proventos, em Agosto de 2004 concorreu a um anúncio público para o lugar de Responsável Financeiro da CC ‘…’.
O Autor era e é economista, com o ‘curriculum vitae’ junto a fls. 16 e 17 dos presentes autos, cujo teor, pela sua extensão, aqui se dá por reproduzido.
Provou-se também que, tendo sido submetido, juntamente com outros 385 candidatos, a um processo de selecção levado a efeito por uma empresa especializada nessa matéria e a quem a CC ‘…’ havia adjudicado essa triagem, o Autor figurava numa lista entregue por aquela empresa à CC ‘…’, a qual, depois de efectuar entrevistas individuais a alguns candidatos, entre eles o Autor – entrevistado em 17 de Setembro de 2004, nas instalações da empresa, pelo seu Presidente do Conselho de Administração, bem como pelos seus Directores Financeiro e dos Recursos Humanos – acabou por convocá-lo para uma reunião em 27 de Setembro de 2004, data em que o Presidente do Conselho de Administração, Eng.º FF, comunicou ao Autor que era o candidato escolhido para o cargo de ‘Finance Manager’ da CC ‘…’ e lhe apresentou uma proposta de emprego oferecendo-lhe esta empresa como contrapartida:
- Um vencimento mensal ilíquido de € 3.757,00, o qual, ao fim de seis meses, poderia ser aumentado em 5%, dependendo da avaliação do desempenho relativamente aos objectivos a fixar;
- Serviço gratuito de cantina;
- Integração no plano automóvel da Companhia, com acesso a viatura até € 33.100,00, designadamente para fins pessoais, podendo exceder o valor em mais 10%, sendo, neste caso, o valor suportado pelo colaborador;
- Plafond anual de combustível de € 1.250,00;
- Telemóvel da empresa;
- Integração no Plano Médico da Companhia, em que a empresa suportava os prémios respeitantes aos seus colaboradores, bem como cerca de 60% dos prémios referentes aos aderentes facultativos – cônjuges e filhos.
Nessa reunião, o Autor foi informado de que a CC havia recebido por parte de uma terceira entidade uma proposta de compra do negócio do gás a nível mundial e que não tinha sido tomada ainda qualquer decisão relativamente a essa proposta, estando em curso um processo de análise que duraria aproximadamente 12 meses, após o qual seria tomada uma decisão.
Demonstrou-se também que, após esta informação, o Autor manifestou interesse em continuar no processo, tendo, então, sido acordado que começaria a trabalhar na CC no dia 21 de Outubro de 2004.
Demonstrou-se, por outro lado, que, no dia seguinte, ou seja, em 28 de Setembro de 2004, a Drª GG – na qualidade de ‘Human Resources Manager’ da CC – enviou ao Autor o e-mail com cópia junta a fls. 15 dos autos, no qual, para além de agradecer o interesse manifestado pelo Autor em integrar a equipa da CC, lhe referia, por essa via, as condições de ingresso nos quadros da empresa a partir de 21 de Outubro de 2004, ou seja, as mencionadas contrapartidas, e que, após aquela data, ficaria sujeito a um período experimental de 180 dias, bem como que as mencionadas condições estariam sujeitas ao resultado positivo dos exames médicos a realizar antes do início da prestação de trabalho, em data que fosse acordada entre a empresa e o Autor, agradecendo que este confirmasse a sua disponibilidade em deslocar-se às instalações da empresa para realização desses exames.
Demonstrou-se, igualmente, que o Autor aceitou ficar sujeito ao mencionado período experimental de 180 dias e no dia 8 de Outubro de 2004 efectuou testes médicos nas instalações da CC, tendo sido aprovado.
Provou-se ainda, que, no mencionado dia 28 de Setembro de 2004, o Autor apresentou a sua demissão à DD ‘…, Ldª’, pedido de demissão que foi recebido com surpresa pelos responsáveis desta empresa.
Ora, perante esta matéria de facto provada, não nos restam dúvidas de que em 27 e 28 de Setembro de 2004 se estabeleceu entre o Autor e a CC ‘… […], S.A.’ – anterior denominação da Ré como referimos – um verdadeiro contrato de trabalho, embora sujeito a uma condição e a um termo suspensivos iniciais (permitidos, já que mencionados por escrito, nos termos do art. 127º do Código do Trabalho[*] conjugado com os artigos 270º e 278º do Código Civil); aquela resultante da circunstância das condições contratuais estabelecidas ficarem dependentes da aprovação do Autor em exames ou testes médicos a realizar nas instalações da empresa – condição que se cumpriu em 8 de Outubro de 2004 – e este decorrente da circunstância das partes contratantes haverem acordado que o início da prestação de trabalho ocorreria no dia 21 de Outubro de 2004.
Na verdade, sabendo-se que o contrato de trabalho é um contrato consensual, uma vez que não dependente da observância de forma especial a não ser que se determine o contrário (art. 102º do Código do Trabalho), como qualquer outro contrato constitui o resultado de, pelo menos, duas declarações negociais convergentes, uma consubstanciada na formulação de uma determinada proposta por um dos contratantes – em regra a entidade empregadora enquanto carente da prestação de trabalho – e a outra consubstanciada na aceitação dessa proposta por parte do outro contratante – em regra o trabalhador enquanto detentor da força de trabalho bem como da vontade de o prestar –, aceitação que pode ser feita de uma forma expressa ou tácita (art. 217º n.º 1 do Cod. Civil).
Refere-se na sentença recorrida que a proposta contratual deve ser completa, no sentido de abranger todos os pontos a integrar no futuro contrato. Porém, com o respeito que nos merece este entendimento, afigura-se-nos bastar que a proposta contenha os elementos essenciais do contrato, ou seja, os elementos indispensáveis para que o destinatário possa, desde logo, concluir qual a efectiva relação contratual que se pretende estabelecer com ele e aquilatar sobre a correspondente aceitação.
Ora, no contrato de trabalho os elementos essenciais serão os que respeitam às prestações principais das partes contratantes, ou seja, o trabalho a efectuar (isto é, o objecto do contrato), e a retribuição a auferir (enquanto contrapartida da prestação do trabalho), podendo entender-se ainda como essenciais, a indicação do local da prestação do trabalho, bem como o período durante o qual este será prestado[*].
Acresce que, como bem refere Pedro Romano Martinez[*], a proposta deve revelar uma intenção inequívoca de contratar, ou seja, tem de ser firme, não podendo apresentar-se como dubitativa, de forma que, mediante simples aceitação, leve à conclusão firme do contrato.
Revertendo ao caso em apreço e tendo em consideração todos estes aspectos, não há dúvida que os mesmos resultam do conjunto da mencionada matéria de facto provada. Com efeito, a mesma revela que, após todo o desenvolvimento de um conjunto de diligências de cariz selectivo levado a cabo na sequência de um anúncio público feito pela CC, houve, por parte desta e em relação ao aqui Autor, a formulação de uma proposta de trabalho contendo um propósito firme e inequívoco de o contratar para o exercício das funções de ‘Finance Manager’ da empresa nas respectivas instalações e no período normal de laboração da mesma (já que se não indicou um horário específico), mediante uma determinada contrapartida retributiva, proposta que foi objecto de declaração de aceitação (presumindo-se que em termos expressos ou, pelo menos, tácitos) por parte do Autor, tanto assim que as partes contratantes chegaram ao ponto de estabelecer a data a partir da qual o contrato deveria começar a ser executado, e, tudo isso conduziu a que o Autor pedisse, de imediato, a demissão de funções à sua anterior entidade patronal com observância do correspondente período de aviso prévio.
Houve, pois, a concretização, em 27 e 28 de Setembro de 2004, de um verdadeiro contrato de trabalho entre as partes com as apontadas características, conclusão que afasta, naturalmente, a necessidade de apreciação da segunda questão de recurso.
(…)
[Anote-se que, segundo o aresto de que se tem vindo a efectuar transcrição, a segunda questão que deveria ser equacionada na apelação consistia em saber se, a concluir-se no sentido de o acordo firmado entre as partes não poder ser configurado como um contrato de trabalho, esse mesmo acordo consubstanciaria uma promessa válida de contrato de trabalho].
Cabe, portanto e agora, apreciar se ao Autor assiste o direito a receber da Ré as indemnizações que reclama a título de danos patrimoniais e não patrimoniais.
Quanto aos danos patrimoniais, pede o Autor que a Ré seja condenada no pagamento do montante global de € 23.190,00 decorrente da diferença de benefícios que iria usufruir na CC em consequência do contrato de trabalho com ela estabelecido e ao qual a mesma, unilateralmente, pôs termo, quando comparados com os proventos que auferia enquanto ao serviço da DD ‘…, Ldª’.
Relativamente aos danos não patrimoniais, pede que a Ré seja condenada a pagar-lhe uma indemnização não inferior a € 25.000,00, face ao sofrimento e angústia que teve de suportar em consequência da atitude assumida, unilateralmente, pela CC ao pôr termo ao referido contrato.
Com interesse para a apreciação desta questão, demonstrou-se que, em data não concretamente apurada mas que se situa entre os dias 9 e 20 de Outubro de 2004, o Autor foi convocado pela CC para uma reunião de emergência com o Eng.º FF – Presidente do Conselho de Administração – e nessa reunião o Autor foi informado de que se haviam verificado mudanças relativamente ao negócio do gás da CC, o qual estava prestes a ser vendido à BB, motivo pelo qual a admissão do Autor ao serviço da CC não se podia concretizar, já que a função que lhe estava destinada iria desaparecer.
Esta comunicação constituiu uma surpresa para o Autor.
Por outro lado, provou-se que, depois de tais factos, o Autor dirigiu-se à DD ‘…, Ldª’ solicitando a sua readmissão e que, não obstante a primeira resposta desta ter sido em sentido negativo, depois de novas negociações e uma vez que a DD‘…, Ldª’ ainda não havia encontrado substituto para o lugar do Autor e atendendo, por outro lado, ao mérito e às qualificações deste, acabou por readmiti-lo ao seu serviço, continuando o Autor a desempenhar as suas anteriores funções, embora sob a condição de se comprometer a trabalhar para a empresa durante um período de tempo mínimo e a pagar-lhe uma compensação pecuniária em caso de denúncia do contrato antes de decorrido esse período de tempo.
Provou-se também que o vencimento mensal ilíquido que o Autor auferia ao serviço da DD ‘…, Ldª’ ascendia a € 3.028,50, recebendo ainda desta empresa um prémio anual correspondente a metade de um vencimento mensal; um vencimento mensal ou um vencimento mensal e meio, dispondo ainda de veículo quando se encontrava ao serviço da mesma.
Ora, depois de, anteriormente e pelas razões apontadas, chegarmos à conclusão de que entre as partes (a Ré sob a sua anterior denominação social de CC ‘… […], S.A’) se havia concretizado, em 27 e 28 de Setembro de 2004, um verdadeiro contrato de trabalho, embora sob a verificação de condição suspensiva inicial que se cumpriu em 8 de Outubro de 2004 e com a fixação de um termo suspensivo inicial, constatamos que a Ré (sob a sua anterior denominação), ao assumir a mencionada atitude unilateral de quebra de vínculo contratual, numa altura em que o negócio entre elas estabelecido estava perfeitamente concluído, aguardando apenas a data a partir da qual e por acordo deveria começar a ser executado, mais não fez do que despedir o Autor, despedimento que se configura ilícito na medida em que declarado num momento em que ainda se não verificava a liberdade de desvinculação a que se alude no art. 105º, n.º 1 do Código do Trabalho e levado a efeito sem a observância das condições legalmente previstas[*].
Acresce que esse despedimento se apresentava totalmente injustificado já que a Ré para além de não lograr demonstrar o facto que alegara no art. 7º da sua contestação, ou seja, que na reunião havida com o Autor em 27 de Setembro de 2004, o havia informado de que todo o negócio do gás da CC, a nível mundial, poderia ser alienado, de imediato ou a curto prazo, e que o seu processo de admissão poderia ser influenciado por essa circunstância, em termos que, naquele momento, não eram previsíveis, também não demonstrou que a função que ao Autor estava destinada, iria desaparecer na sequência ou como resultado daquela alienação.
A ilicitude de um tal despedimento, conduz a que o empregador deva indemnizar o trabalhador por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais causados. É o que resulta do disposto no art. 436º, n.º 1 al. a) do Código do Trabalho.
Quanto aos danos patrimoniais, não há dúvida que o despedimento ilícito do Autor levado a cabo pela Ré (sob a sua anterior denominação), conduziu a que aquele visse completamente gorada a legítima expectativa e, portanto, a possibilidade de passar a obter rendimentos do seu trabalho superiores aos que auferia ao serviço da sua anterior entidade patronal. Basta comparar a retribuição que auferia da DD ‘…, Ldª’ e a que acima fizemos referência, com a que iria receber da Ré e que se enuncia na alínea l) da matéria de facto provada. O dano patrimonial sofrido pelo Autor decorre, precisamente, da diferença entre as aludidas retribuições.
Contudo, desconhece-se, por não dispormos nem ser possível obter-se elementos suficientes para a poder computar, qual a concreta ou exacta extensão desse dano. Com efeito, não sabemos nem é possível saber-se se, a iniciar-se a execução efectiva do contrato de trabalho estabelecido entre ambas as partes, o mesmo iria terminar durante o período experimental de seis meses entre elas fixado – circunstância que levaria a que a desvinculação se operasse sem que o Autor tivesse direito a receber da Ré uma indemnização – ou se, a prolongar-se para além desse período experimental, tal sucederia durante quanto tempo, sendo certo que a desvinculação foi operada unilateral e ilicitamente pela Ré nas circunstâncias anteriormente expostas.
Há, pois, que usar aqui de equidade na fixação do montante devido a esse título e nesta medida, sabemos que uma das possibilidades que o legislador atribui ao trabalhador alvo de despedimento ilícito é a da reintegração no seu posto de trabalho, ou, em alternativa, a de poder pedir a atribuição de uma indemnização em substituição dessa reintegração, indemnização que não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades [artºs 436º n.º 1 b) e 439º n.ºs 1 e 3, todos do Cod. Trabalho].
É clara a vontade do Autor em receber da Ré uma indemnização pelos danos materiais sofridos, razão pela qual se nos afigura equilibrado assistir-lhe o direito a receber desta, a esse título, o montante correspondente a três meses da retribuição base (não havia diuturnidades) que iria auferir ao serviço da Ré, ou seja, o montante global de € 11.271,00 (3.757,00 x 3).
Quanto a danos não patrimoniais ou morais, sabemos que o Autor, depois de haver sido informado pela Ré (sob a sua anterior denominação) que já não se iria concretizar, na prática, o contrato de trabalho entre ambos estabelecido, perante a perspectiva de ficar desempregado – pois já havia pedido a demissão da sua anterior entidade patronal, sendo certo que o fez quando teve a confirmação do contrato de trabalho estabelecido com a Ré em todos os seus aspectos essenciais – passou dias de incerteza, angústia e preocupação com o seu futuro e o futuro da sua família, tanto mais que também se demonstrou que havia contraído um empréstimo para a aquisição da casa que habitava, com o qual despendia € 546,10 mensais, e que tinha dois filhos a frequentarem colégios, pagando uma mensalidade de € 491,86. Trata-se de danos que, sem dúvida, merecem a tutela do Direito e que apenas foram originados pela atitude injustificada e, portanto, ilícita assumida pela Ré e a que fizemos referência.
Verificamos, no entanto, que uma tal situação apenas perdurou enquanto o Autor não logrou obter a readmissão ao serviço da DD‘…, Ldª’ sua anterior entidade patronal, o que se terá verificado no final do mês de Outubro de 2004 pois a carta que esta empresa lhe dirigiu a reconsiderar o pedido de readmissão e que se mostra junta a fls. 160 dos autos, se mostra datada de 27 de Outubro de 2004. Significa isto que o Autor teve de suportar a referida situação de incerteza, angústia e preocupação durante cerca de duas semanas.
Afigura-se-nos, por isso, equilibrado fixar em € 5.000,00 a indemnização devida a título de danos morais sofridos durante aquele período de tempo.
(…)”


3. Rebela-se a ré contra o juízo tomado pelo acórdão em apreço, esgrimindo, como resulta da alegação apresentada no vertente recurso de revista, com um argumentário de harmonia com o qual: –

– a proposta formulada pela impugnante ao autor não poderia ser considerada como uma proposta contratual de trabalho, já que nela faltavam os elementos essenciais deste tipo negocial, como sejam o objecto da prestação do trabalho, o local onde este iria ser desempenhado e os próprios períodos de trabalho;
– do e-mail remetido pela recorrente não se pode retirar uma intenção incondicional dela quanto a uma celebração definitiva de um contrato de natureza laboral, além de que inexistem nos autos elementos de onde se extraia a aquiescência do autor quanto à celebração desse negócio jurídico;
– precisamente por isso, quando a ré comunicou ao autor a impossibilidade de este ser admitido, ainda se delineava uma mera fase de contactos preliminares que implicavam, após a escolha do candidato final, conversações a haver entre uma e outro tendentes a apurar as condições a que obedeceria o celebrando contrato de trabalho;
– não havendo ainda contrato, não se pode configurar a existência de um despedimento, ao que acresce que, mesmo a entender-se ter havido uma celebração de um contrato a termo suspensivo, ainda não se verificava a liberdade de denúncia prevista no artº 105º do Código do Trabalho, tanto mais que se não lobriga a existência de cláusula escrita por ambas as partes que isso estabelecesse.
– por estes motivos, a condenação indemnizatória levada a efeito pelo aresto sob censura carece de fundamento;
– sendo o autor conhecedor das possíveis consequências que acarretavam a prossecução do processo negocial em curso, atentas as informações que lhe foram transmitidas pela ré, assumiu o risco de o aceitar, pelo que a reclamada e conferida indemnização por danos não patrimoniais não tinha razão de ser.


4. É sabido que o contrato de trabalho representa o acordo negocial segundo o qual uma pessoa se obriga a prestar a sua actividade, mediante retribuição, a outra pessoa (ou outras pessoas), sob a autoridade e direcção desta (ou destas) – cfr. artigos 1152º do Código Civil e 10º do Código do Trabalho aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto, este último aplicável à relação jurídica sub specie, atenta a temporalidade dos factos.

Perante esta vertente definitória daquele tipo de negócio jurídico, resulta claro que se hão-de ter como elementos concretizadores do mesmo os seguintes: –

- de uma banda, a emissão confluente de vontades entre o empregador e o trabalhador;
– de outra, que a vontade do trabalhador seja expressada no sentido de ele assumir a obrigação de prestar uma dada actividade a outrem, pautando esta de acordo com as ordens, instruções e indicações que lhe forem transmitidas pelo empregador, submetendo-se, assim, à autoridade deste último;
– ainda de outra, que o empregador assuma a recepção da actividade prestada pelo trabalhador, segundo os parâmetros supra indicados, e se obrigue a prestar a este uma contrapartida por tal recepção.

Neste contexto, perante uma dada situação em que se poste a antedita emissão de vontades, configurada do modo que se indicou, não se divisa, à partida, nenhum óbice a que o acordo negocial consubstanciado por tal emissão não seja caracterizado como um contrato de trabalho, sendo de assinalar que este tipo negocial, fora dos casos em que a lei determina o contrário, não está sujeito a forma especial, seja esta perspectivável como ad substantiam, seja como ad probationem.

Na senda do entendimento que fora perfilhado na sentença da 1ª instância, sustenta a ré que o acordo em apreço não poderia ser qualificado como um contrato de trabalho, por isso que a matéria de facto que se demonstrou não apontava no sentido de que a «proposta» realizada pela CC…[…] S.A., anterior denominação da ora impugnante apresentava a completude dos elementos que se tornavam mister incluir nesse contrato.

E, para tanto, aduz a recorrente que, nomeadamente, nessa «proposta» se não encontravam indicados o objecto concreto da actividade prestacional a desempenhar pelo autor, o local onde ela esta se deveria processar e os períodos durante os quais a mesma teria lugar, convocando, para o efeito, o comando ínsito no artº 98º do Código do Trabalho.

Crê-se que, neste ponto convocatório, a ré labora em manifesto equívoco.

De facto, são diversas realidades as consistentes, uma, nos elementos caracterizadores do contrato de trabalho, de harmonia com os comandos definitórios previstos na lei ou por esta exigidos especialmente para determinada categoria desses negócios jurídicos, e, outra, nos deveres que a própria lei faz impender sobre as partes outorgantes.

Ora, o dever ou os especiais deveres de informação consagrados nos artigos 97º e 98º do Código do Trabalho que, consabidamente, se acobertam no princípio da boa fé, quer nos preliminares, quer na formação dos contratos, não tem directa projecção na caracterização do contrato firmado ou firmando, em termos de, sem o seu cumprimento, se concluir que eles são necessários para o desenho dessa específica forma negocial.

Aliás, nenhuma determinação se lobriga na lei de onde decorra que, sem a efectivação de um daqueles deveres o negócio outorgado ou a outorgar não pode ser considerado como contrato de trabalho ou, numa outra visão, que para a sua formação ou para os seus preliminares deva, inelutavelmente (e não se está agora a equacionar uma específica forma deste contrato), constar (ainda que de modo não sujeito a determinado formalismo, verbi gratia pela adopção da forma escrita) alguma ou alguma das informações reportadas nos citados artigos 97º e 98º, sob pena de, inexistindo a demonstração desse constar, o negócio jurídico não poder vir a ser caracterizado como sendo um contrato de trabalho.

Efectivamente, como até decorre do nº 4 do artº 99º do Código do Trabalho (quando aí se prescreve que os documentos – de informação a que alude o anterior artº 98º – devem ser entregues ao trabalhador nos sessenta dias subsequentes ao início da execução do contrato), para a caracterização do negócio jurídico-laboral não são exigidas as especificações informativas contidas nos artigos 97º e 98º.

Neste contexto, não é merecedor de censura o juízo levado a efeito pelo aresto impugnado, em face da análise da matéria de facto apurada (nos moldes que constam da supra efectuada transcrição) no sentido de ter sido concretizado um contrato de trabalho entre os ora recorrente e recorrido.

E mesmo para quem defenda que num contrato deste jaez se devem, de modo essencial, estipular a indicação do local onde decorrerá a actividade laboral subordinada e o período durante o qual ela haverá de ter lugar, o que é certo é que o acórdão recorrido extraiu da factualidade apurada ilações de harmonia com as quais o desempenho de funções do autor na categoria de Finance Manager era efectuado nas instalações da ré e no período normal da laboração desta, ilações essas que, porque situadas no domínio da matéria de facto e não sendo questionados o suporte normativo e modo concretizador como a elas se chegou, estão fora do poder sindicante deste Supremo.


5. Sustenta igualmente a impugnante que, mesmo a sufragar-se a tese que estava concretizado um contrato de trabalho, a sua cessação operada por ela não podia configurar um despedimento ilícito, pois que, a tratar-se de um contrato sujeito uma condição suspensiva inicial, “ainda não se verificava a liberdade de desvinculação prevista no art. 105º do Código do Trabalho”.

Volvendo ao que se contém no corpo alegatório, verifica-se que a recorrente explicita a sua ideia quando refere que, a entender-se ter havido lugar à formação de um contrato de trabalho, este ficou sujeito uma condição futura (crê-se que a realização de exames médicos do autor e, do seu resultado, a demonstração de condições de saúde permissoras do exercício de actividade), pelo que, enquanto essa condição se não efectivasse, o contrato não produzia efeitos, razão pela qual a sua cessação, na altura, não podia ser considerada como despedimento.

E adianta que, de qualquer modo, como essa condição suspensiva inicial não constava de escrito assinado pelo autor, isso conduziria a que se entendesse estar já em vigor um contrato de trabalho sujeito a um regime experimental, pelo que era lícito à impugnante denunciá-lo.

Em primeira linha assinala-se que o artº 127º do Código do Trabalho, quando comanda que ao contrato de trabalho pode ser aposta, por escrito, condição suspensiva nos termos gerais, não exige que esse escrito seja firmado pelo trabalhador.

A exigência da aposição, por escrito, da condição suspensiva (inicial, in casu) repousa em razões de segurança jurídica (cfr. anotação de Luís Miguel Monteiro e Pedro Romano Martinez, in Código do Trabalho Anotado, 6ª edição, 311), não impondo, pois, a redução a escrito do contrato nos moldes estabelecidos no artº 103º do compêndio laboral a que nos temos vindo a referir, em que, aí sim, o respectivo conteúdo tem de ser firmado por ambas as partes da relação jurídico-laboral (cfr. nº 2 desse artigo).

Sendo assim, e encontrando-se reduzida a escrito a cláusula acessória da condição suspensiva inicial, não se nos afigura que a essa condição se não confira validade.

Porém, como deflui da factualidade provada, em 8 de Outubro de 2004, o autor efectuou testes médicos na CC, efectivação que constituía condição para a sua admissão na recorrente, não tendo esta sequer alegado (e, consequentemente, provado) que desses exames – e antes da data situada entre as indicações temporais a que alude o item 21) de II 1. – não resultaram condições de saúde do autor não permissores da sua realização da actividade para que fora contratado.

Por isso, é de concluir que, aquando daquela data, o contrato se encontrava já a produzir os seus efeitos.


5.1. Esgrime a ré que, a postar-se em causa um contrato de trabalho dotado de eficácia, então ele, porque foi celebrado de modo a no mesmo se ter estipulado um período experimental, era livremente denunciável, sem necessidade de invocação de justa causa ou aviso prévio.

Simplesmente, olvida a recorrente que não foi com esteio na faculdade de denúncia prevista nos artigos 105º e seguintes do Código do Trabalho que ela fez cessar o contrato de trabalho que firmara com o autor, como bem decorre do item 22) de II 1., aditando-se ainda que a matéria ínsita no subsequente item 24) aponta no sentido de que não foi por motivos relacionados com uma não satisfação do desempenho do labor do autor que a ré fez cessar o contrato.

Assim, essa cessação, por motivos que não foram fundados naquela faculdade nem numa conduta do autor justificativa dela, não pode ser considerada que não como um despedimento ilícito.

Soçobram, desta arte, as «conclusões» B) a J) da alegação de recurso da impugnante.


6. Pelo que tange aos montantes indemnizatórios conferidos pelo acórdão sindicado, este Supremo anui ao que no mesmo se ajuizou no respeitante aos danos patrimoniais sofridos pelo autor e à fundamentação carreada ao efectivado juízo, sendo de sublinhar que essa questão, directamente, não foi equacionada pela recorrente, mesmo prevenindo a hipótese de vir a ser considerada a existência de um contrato de trabalho aprazado entre as partes e de a sua cessação se não ter fundado na faculdade de denúncia durante o seu período experimental.

Dada a forma como se encontra redigida a «conclusão» N) da minuta alegatória formulada pela ré nesta revista, poder-se-ia ser levado a concluir que, mesmo naquela prevenida hipótese, a impugnante criticava o acórdão sub specie pelo facto de ter conferido indemnização ao autor por danos não patrimoniais.

Todavia, essa conclusão não tem respaldo no teor da alegação.

De facto, neste específico particular, o que se pode ler em tal teor é o seguinte, após ter equacionado, em jeito de contra-argumentação, uma possível situação de culpa in contrahendo: –

“(…)
Na verdade, a responsabilidade pré-negocial e a obrigação de indemnizar por ‘culpa in contrahendo’ pressupõe a existência de uma conduta fortemente censurável por parte do incumpridor e, por outro, que a parte não incumpridora não tenha contribuído também, com culpa, para o insucesso negocial.
Ora, atenta a matéria de facto provada é inquestionável, precisamente, a vontade séria de contratação por parte da Recorrente, afastando qualquer ideia de propósito formado de não levar a contratação a bom termo.
(…)
Assim, os danos invocados pelo Recorrido não têm razão de ser, nomeadamente os danos não patrimoniais que, como resulta do exposto, têm na sua génese a actuação do próprio Recorrido ao assumir o risco inerente ao processo, conforme atrás ficou referido.
Contrariamente, portanto, ao entendimento vertido no douto acórdão recorrido, inexiste fundamento para ressarcir os alegados danos não patrimoniais.
(…)”

Isto significa que a perspectiva impugnatória da ré quanto à decisão atinente à indemnização quanto aos danos não patrimoniais não se cifrou na conferência dessa indemnização no ajuizado despedimento ilícito, mas sim porque ela não seria devida pela inexistência de factos que suportassem uma responsabilidade pré-contratual.

Perante essa postura, não se pode dizer que esteja em crítica o juízo formulado pelo acórdão recorrido quanto à indemnização por danos não patrimoniais advindos da cessação ilícita do contrato de trabalho.

III


Em face do que se deixa dito, nega-se a revista.

Custas pela recorrente.

Supremo Tribunal de Justiça
Lisboa, 21 de Abril de 2010,
Bravo Serra (Relator)
Mário Pereira
Sousa Peixoto