Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
08A496
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: GARCIA CALEGO
Descritores: LIVRANÇA EM BRANCO
PREENCHIMENTO ABUSIVO
Nº do Documento: SJ20080417004961
Data do Acordão: 04/17/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: MANDADA AMPLIAR A MATÉRIA DE FACTO
Sumário :

O art. 10º da L.U.L.L. admite a letra em branco.
O título deve ser completado de harmonia com os acordos realizados. No caso de existir um preenchimento abusivo, como refere o mencionado art. 10º, “não pode a inobservância desses acordos ser motivo de oposição ao portador, salvo se este tiver adquirido a letra de má fé ou, adquirindo-a, tenha cometido uma falta grave”.
A má fé consistirá no conhecimento da falta de direito do alienante, já que se esse direito existe, a aquisição não pode ser impugnada.
A disposição em análise equipara a má fé, à culpa lata (ou grave). Esta culpa deve compreender a atitude do adquirente que, no momento da aquisição, revelou um comportamento de tal forma desleixado, que essa falta de cuidado não poderá ser-lhe desculpável. Por outras palavras, existirá culpa grave, quando o adquirente não possa ignorar que, quem lhe transmitiu o título não era o seu portador legítimo ou que o título padecia de irregularidade.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I- Relatório:
1-1- AA, S.A., por apenso à execução contra si instaurada por BB, veio opor-se à execução, alegando em síntese:
Que o exequente é um dos avalistas da livrança dada à execução, subscrita por si, opoente, para garantia e segurança das obrigações resultantes de um contrato de financiamento celebrado com o Banco Efisa. Este propôs contra si, opoente, uma acção executiva baseada na livrança dada à execução, bem como contra os avalistas da mesma, entre os quais o exequente. Não obstante o facto de o dito banco ter preenchido a livrança sem que tivesse existido qualquer incumprimento do contrato de financiamento por parte da opoente, violando com isso a autorização de preenchimento e não obstante ainda a circunstância de a ora opoente, na aludida acção executiva, ter deduzido embargos de executado, o exequente (e então executado) decidiu, sem o conhecimento dela, opoente, proceder ao pagamento da dívida reclamada pelo banco, facto que provocou a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide. Isto para além do facto de, sem conhecimento dela, opoente, ter celebrado com o aludido banco o acordo junto com o requerimento executivo como doc. 2. Sucede que o exequente tinha conhecimento que a opoente sempre cumpriu pontualmente as suas obrigações perante o banco Efisa., não dando azo a que este pudesse utilizar a livrança. Isto legitima a opoente a invocar perante o exequente o preenchimento abusivo da referida livrança, sendo que este último, enquanto portador da dita livrança adquiriu-a de má fé, pois sabia que a mesma fora criada exclusivamente para garantir o cumprimento pontual das obrigações do contrato de financiamento. O exequente litiga de má fé porque a execução se traduz numa pretensão cuja falta de fundamento jurídico aquele não pode ignorar.

Concluiu pedindo que, julgada procedente a oposição, se julgue extinta a execução, ou caso assim não se entendendo, se declare suspensa a presente acção até ao trânsito em julgado da acção de condenação por si instaurada contra o banco Efisa e, em qualquer caso, que seja o exequente condenado, por litigância de má fé, no pagamento de multa e de indemnização no valor de € 25.000.00.

O exequente contestou dizendo, que os subscritores da procuração forense passada pela opoente, não são os legítimos administradores da sociedade, pois foram eleitos em assembleia geral que nunca ocorreu, tendo sido a respectiva acta sido falsificada, sendo assim tal assembleia inexistente, sendo-o também as deliberações nela adoptadas, bem como as que posteriormente foram adoptadas em assembleias realizadas ulteriormente. Além disso, enquanto avalista da livrança dada à execução, não se podia eximir ao pagamento do respectivo valor ao banco Efisa, pelo que, por virtude de tal pagamento, tem direito a receber do executado tudo aquilo que pagou ao banco e ainda os juros que se venham a vencer até integral pagamento.

Concluiu pedindo a improcedência da oposição.
O processo seguiu os seus regulares termos com a elaboração do despacho saneador, após o que se fixaram os factos assentes e a base instrutória, se procedeu à audiência de discussão e julgamento, se respondeu à matéria de facto controvertida e se proferiu a sentença.
Nesta julgou-se improcedente a oposição, determinando-se o prosseguimento da execução.
1-2- Não se conformando com esta decisão, dela recorreu a opoente de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo-se aí, por acórdão de 10-5-2007, julgado improcedente o recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
Não se conformando com este acórdão, dele recorreu, novamente a opoente para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo.
A recorrente alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões:
1ª- A recorrente não incumpriu o contrato que constituía a relação fundamental, como se provou.
2ª- Pelo que desde logo a execução ao tempo instaurada está ferida de ilegalidade.
3ª- O vencimento nela aposto, como elemento desencadeador de todo o processo, não se observou uma vez que inexistiam razões no quadro da relação fundamental que o permitissem.
4ª- É com a ocorrência do vencimento que nasce a obrigação, como refere o Prof. Paulo Sendin na obra citada.
5ª- O pagamento avalista/recorrido consubstancia uma falta grave, equiparável ao comportamento de má fé.
6ª- Não teve o recorrido, no quadro dos procedimentos de apropriação da livrança a observância da necessária e razoável diligência.
7ª- É lícito afirmar que o recorrido devia, no caso, ter actuado de forma diligente, uma vez que tinha conhecimento do processo, nele sendo parte.
8ª- Não ocorreu, assim, uma transmissão válida e juridicamente relevante para o recorrido da livrança.
9ª - Como referem os Profs. Vaz Serra e Pereira Coelho, o art. 16º da LULL equipara a falta grave à má fé, com as consequências de o portador, ora recorrido, não poder validamente ter instaurado a execução.
10ª- As características da literalidade, abstracção e autonomia cedem nos termos da LULL, nos casos em que há má fé ou falta grave, as consequências destas actuações culposas.
Não houve contra-alegações.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir:
II- Fundamentação:
2-1- Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes, apreciaremos apenas as questões que ali foram enunciadas (arts. 690º nº1 e 684º nº 3, ex vi do disposto no art. 726º do C.P.Civil).
Nesta conformidade serão as seguintes as questões a apreciar e decidir:
- Se ao pagar a livrança, a ora exequente agiu de má fé ou com falta grave.
2-2- Das instâncias, vem provada a seguinte matéria de facto:
1. O exequente é portador de uma livrança emitida pelo valor de 145.457,32 € (29.261.615$00), à qual foram apostas as menções “2002-04-23” e “à vista” correspondendo a primeira à data da emissão surgindo a segunda encimada pela referência à data de vencimento - alínea A) da matéria assente.

2. O exequente apôs a sua assinatura na face posterior da livrança referida em 1., surgindo tal assinatura encimada pela menção “Bom para aval à firma subscritora” - alínea B) da matéria assente.

3. Na livrança referida em 1, figuram como tomador o Banco Efisa SA. e, como subscritora, a opoente AA. SA - alínea C) da matéria assente.

4. Em Junho de 2002, o Banco Efisa SA. moveu uma acção executiva para pagamento de quantia certa contra o exequente e os executados, entre os quais a opoente AA. SA - alínea D) da matéria assente.

5. A acção executiva referida em 4. foi distribuída à 1ª Secção da 2ª Vara Cível de Lisboa, tendo corrido termos sob o nº 96/2002 - alínea E) da matéria assente.

6. Na sequência da instauração da referida acção executiva, o aqui exequente -e então executado- pagou ao Banco Efisa, SA, a quantia exequenda, compreendendo capital e juros que, em 14 de Outubro de 2002, foram contabilizados no valor de Eur. 149.639, 37 — alínea F) da matéria assente.

7. Tendo a acção executiva identificada em 5. sido declarada extinta, mediante sentença que transitou pacificamente em julgado - alínea G da matéria assente.

8. E tendo ainda o tribunal, nos embargos de executado então deduzidos pela ora opoente AA. SA., também mediante sentença que transitou pacificamente em julgado, a julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide - alínea H) da matéria assente.

9. O Banco Efisa SA, de um lado figurando como primeira outorgante, e o exequente, de outro lado, figurando como segundo outorgante, subscreveram um escrito particular datado de 14-10-2002 e denominado “Acordo de Pagamento” e cujo conteúdo é o seguinte:

(…)

Tendo em consideração que:

1. A Primeira Outorgante com a sociedade AA SA., um Contrato de Financiamento sob a forma de Conta Corrente Caucionada

1.0 Segundo Outorgante garantiu o cumprimento por parte da AA S A, do aludido contrato, mediante o aval prestado à livrança entregue como garantia;

1. Na sequência do incumprimento das obrigações assumidas no âmbito do mencionado contrato, a Primeira Outorgante e credora da quantia de 156.116,88 € (cento e cinquenta e seis mil cento e dezasseis euros e oitenta e oito cêntimos

1. A quantia referida no ponto precedente corresponde ao capital em divida, acrescido de juros de mora vencidos até dia 09.102002.

1. A Primeira Outorgante intentou contra a sociedade AA, S.A. e respectivos avalistas, incluindo o Segundo Outorgante, uma acção executiva que corre termos pela 1ª Secção da 2ª Vara do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, sob o nº 96/2002

Celebram o presente acordo, que se regerá pelos termos e condições constantes das cláusulas seguintes que os Outorgantes, entre si, livremente estipulam reciprocamente aceitam:

Primeira

A Primeira Outorgante fixa para efeitos do presente acordo, e o e Outorgante aceita e reconhece a quantia em dívida no valor total de 149.639,37 (cento e quarenta e nove mil seiscentos e trinta e nove euros e Trinta e sete cêntimos).

Segunda

Na presente data, o Segundo Outorgante procedeu à liquidação da totalidade da mencionada quantia.

Terceira

A Primeira Outorgante sub-roga o Segundo Outorgante, no direito de crédito e todos os direitos e obrigações inerentes que detém sobre a sociedade AA, SA. e respectivos avalistas nomeadamente transmite ao Segundo Outorgante a sua posição processual no âmbito da acção executiva identificada no ponto 5 dos Considerandos (…) - alínea 1) da matéria assente.

10. O Banco Efisa, SA. de um lado, e a opoente de outro lado, através de escrito particular datado de 10.4.2000, celebraram um acordo de financiamento com o seguinte conteúdo:

1. LINHA DE CRÉDITO SOB A FORMA DE CONTA CORRENTE CAUCIONADA:

1.1. MONTATE: até ao Limite máximo de PTE 20.000,000 (vinte milhões de escudos portugueses):

1.2. MUTUÁRIO: AA S.A.

1.3. TAXA DE JURO (…).

1.5. PROCEDIMENTOS:

1.5.1. O processamento deste crédito e seu reembolso obedecerá ao ‘sistema contabilístico de conta corrente, através da movimentação da sua conta à ordem junto do Banco Efisa

!.5.2. O “Mutuário” obriga-se a manter a sua conta de Depósito a Ordem junto do Banco devidamente provisionada nas datas previstas neste contrato para os diversos pagamentos, quer dos juros e demais encargos, quer do capital, de que desde já se reconhece devedor, autorizando as transferências que forem julgadas para a conta corrente para cumprimento das obrigações advenientes do presente contrato.

1.6. REEMBOLSO DE CAPITAL: O reembolso de capital efectuar-se-á na data de vencimento de cada utilização, ou seja, no máximo 90 dias após a data de cada utilização.

2. PLAFOND PARA EMISSÃO DE GARANTIAS BANCÁRIAS:

2.1. FINALIDADE: Assegurar o bom cumprimento do pagamento de fornecimentos efectuados pela.................... SPA. à AA S.A.:

2.2. BENEFICIÁRIO: ...........I, S.P.A.;

2.3. MONTANTE: Até ao montante máximo de PTE 30.000.000$00 (trinta milhões de escudos portugueses)

(…)

5. GARANTIAS: Livrança em branco subscrita pela empresa e avalizada pelos sócios e respectivos cônjuges.

(…)

8. RESCISÃO: O Banco poderá rescindir o contraio no caso de incumprimento de qualquer obrigação assumida pela AA, SA (... )- alínea J) da matéria assente).

11. O Banco Efisa. SA., de um lado e a opoente, de outro lado, subscreveram um escrito particular datado de 06-09-2000 e denominado “CONTRATO DE ADITAMENTO”. cujo conteúdo é o seguinte:

(…)

é celebrado o presente Contrato, em aditamento do Contrato de Financiamento até ao valor de PTE 30.000.000$00 (trinta milhões de escudos portugueses) celebrado no dia l0de Abril de 2000 entre a AA e o Banco (...), e que integra as seguintes cláusulas que as partes se obrigam a cumprir pontual e integralmente

1ª- Pelo presente contrito de aditamento, o Banco dá o seu acordo à emissão de garantias bancárias ao abrigo do contrato de que este é o aditamento a outras sociedades para além da referida na cláusula 2.2. do referido contrato, devendo os pedidos ser endereçados ao Banco para análise e apreciação, caso a caso, e posteriormente autorizados por este.

2ª- Em tudo o que não foi alterado pelo presente contrato de aditamento, nomeadamente no que diga respeito a garantias, mantém-se em vigor o disposto no contrato de l0 de Abril de 2000 (...)» - alínea L) da matéria assente.

12. A livrança referida em 1. foi subscrita pela opoente para garantia e segurança do cumprimento das obrigações resultantes do acordo a que se alude em 10. - alínea M) da matéria assente.

13. Tendo sido preenchida pelos representantes da opoente, que deixaram em branco a data de emissão e o valor - alínea N) da matéria assente.

14. A data de emissão e o valor da dita livrança foram preenchidos pelo Banco Efisa, SA - alínea O) da matéria assente.

15. Exequente e opoente autorizaram o Banco Efisa. SA. a preencher a livrança a que se alude em 1. - alínea P) da matéria assente.

16. A opoente e o Banco Efisa SA, acordaram um aditamento ao acordo referido em 10., pelo qual o banco aumentou o montante máximo do plafond de financiamento, fixando-o em 37.500.000S00 - resposta ao quesito 1°.

17. A opoente autorizou, em escrito datado de 14-02-2001, o preenchimento da livrança referida em 1. para garantia e segurança das obrigações assumidas nos acordos aludidos em 10. e 16, até ao valor de 37.500.000$00- resposta ao quesito 2º.

18. A data de emissão e o valor foram apostos na livrança mencionada em 1. sem que a opoente tivesse desrespeitado qualquer das responsabilidades assumidas nos acordos referidos em 10. e 16.- resposta ao quesito 3°.

19. As quais a opoente sempre cumpriu tempestiva pontual e integralmente - resposta ao quesito 4º

20. Opoente e exequente autorizaram o Banco Efisa. SA. por escrito, a preencher a livrança aludida em 1. até ao valor de 30.000.000$00 - resposta ao quesito 6°.-----------------------------------
2-3- Para proferir decisão, convém dar uma panorâmica, ainda que sintética, do que se discute nos presentes autos.
A base de toda a problemática ocorreu em Junho de 2002 quando o Banco Efisa SA. moveu uma acção executiva para pagamento de quantia certa contra o ora exequente e os executados, entre os quais a opoente/recorrente AA. Na sequência dessa acção executiva o ora exequente (e então executado) pagou ao Banco Efisa, SA, a quantia exequenda, tendo sido a acção declarada extinta. Em relação a essa acção executiva, a ora opoente e então executada, havia deduzido oposição (embargos de executado) com o fundamento de que a livrança, que servia de base à execução, tinha sido preenchida como garantia e segurança de um contrato de financiamento, sendo certo que não tinha existido qualquer incumprimento desse contrato, razão por que o preenchimento e a entrada em circulação da letra carecia de causa. Nesses embargos, em virtude de o ora exequente ter pago a quantia exequenda, foi julgada extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, impossibilitando a opoente de demonstrar que sempre havia cumprido as responsabilidades assumidas pelo contrato de financiamento e que, por isso, o preenchimento da livrança se não justificava. Por outras palavras, com o pagamento efectuado ao Banco exequente e com a consequente declaração da inutilidade superveniente da lide, o ora exequente impediu que a opoente se pudesse opor à execução com o fundamento de a livrança ter sido abusivamente preenchida. Refere a opoente na p.i. de oposição que o exequente sabia que o título consubstanciava uma obrigação que não era exigível, pois estava ciente do cumprimento pontual do contrato de financiamento, tendo agido em claro prejuízo da sociedade opoente e dos seus interesses patrimoniais, ao assumir o pagamento do título (vide designadamente arts. 33º a 36º dessa peça processual).

Na presente execução o exequente pretende (como avalista que pagou) exercer o seu direito de regresso em relação ao devedor principal.

Por conseguinte, o ora recorrente, opoente à execução, deduziu a sua oposição por entender, em síntese, que o Banco (primitivo portador do título) preencheu abusivamente a livrança, que ora exequente, por isso, pagou erradamente ao exequente e que esse pagamento inviabilizou a oposição que moveu contra essa (primitiva) execução, sendo que esse mesmo exequente tinha conhecimento, não só de que o Banco não podia utilizar o título, mas que ao pagá-lo agia em prejuízo dela, opoente.
A opoente justifica juridicamente a sua oposição, dizendo que lhe é lícito invocar perante o ora exequente o preenchimento abusivo da livrança por parte do Banco, de harmonia com o disposto nos arts. 10º e 77º da L.U. (vide p.i., designadamente o art. 48º)
Vejamos:
A execução de que esta oposição é dependente, funda-se no pagamento da livrança dos autos pelo avalista, em acção executiva proposta pelo anterior portador do título (o aludido Banco).
Como resulta do disposto no art. 32º (último parágrafo) da L.U.L.L. (aplicável ex vi do art. 77º), o dador do aval que paga a letra, fica sub-rogado nos direitos emergentes da letra contra a pessoa a favor de quem foi dado o aval e contra os obrigados para com este em virtude da letra. “Pagando pelo signatário garantido, o avalista, ao mesmo tempo que adquire o direito que tinha contra o avalizado, o portador ou a pessoa a quem pagou –o que é próprio da sua qualidade de fiador – fica investido nos próprios direitos cambiários que o garantido tinha, dada a sua posição na letra” (in Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças, Abel Pereira Delgado, 3ª edição, pág. 162).
Quer dizer, o avalista que paga o título, adquire, por esse facto, o direito de regresso contra o avalizado e também os direitos cambiários que ao avalizado pertenciam contra os obrigados anteriores (vide a este propósito Pinto Coelho Lições de Direito Comercial, 5º, pág. 88).
Estabelece, por sua vez, o art. 47º da mesma Lei (aplicável à livrança ex vi do art. 77º), que “os sacadores, aceitantes, endossantes ou avalistas de uma letra são todos solidariamente responsáveis para com o portador”, sendo que “o portador tem direito de accionar todas essas pessoas, individualmente ou colectivamente, sem estar adstrito a observar a ordem por que elas se obrigaram. Acresce que “o mesmo direito possui qualquer dos signatários de uma letra quando a tenha pago”.
Significa isto, para o que aqui importa, que o avalista que tenha pago o título, fica com o direito (cambiário) de accionar todos os outros obrigados, individualmente ou colectivamente, sem estar adstrito a observar a ordem por que elas se obrigaram. Daqui decorre que ao exequente, como avalista, é lícito demandar cambiariamente o obrigado (principal), subscritor da livrança.
O subscritor do título, o ora opoente, não coloca na presente acção em dúvida, abstractamente, esse direito. Mas diz que ao adquirir o título o portador actual (o avalista que pagou) agiu de má fé, com consciência do preenchimento abusivo da livrança e que o estava a prejudicar, ao inviabilizar a oposição que deduzira à anterior execução. Defende-se, pois, por excepção.
O art. 10º da L.U.L.L. (Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças) estabelece que “se uma letra incompleta no momento de ser passada tiver sido completada contrariamente aos acordos realizados, não pode a inobservância desses acordos ser motivo de oposição ao portador, salvo se este tiver adquirido a letra de má fé ou, adquirindo-a, tenha cometido uma falta grave”.
Admite abertamente esta disposição a letra em branco. Deste artigo resulta que não é indispensável que a letra contenha, logo de princípio, todos os requisitos a que alude o art. 1º da L.U.. Do confronto entre os arts. 1º e 2º da L.U. (em que, respectivamente, se estabelecem os elementos que a letra deve conter e em que se demarcam os requisitos, cuja falta determina a invalidade do título como letra), por um lado, e o art. 10º, por outro, concluiu-se que o momento decisivo para se determinar a validade da letra não é o da emissão, mas sim o do vencimento(1)
. Depois da emissão, poderá o título vir a ser dotado dos elementos necessários para que possa produzir efeitos como letra, sendo necessário, porém, que esses requisitos constem nela na altura do seu vencimento. Se, neste momento, a letra se não encontrar preenchida, então, nos termos dos arts. 1º e 2º da mesma L.U., não poderá produzir efeitos como letra (livrança).
Por outro lado, o título deve ser completado de harmonia com os acordos realizados. No caso de existir um preenchimento abusivo, como refere o mencionado art. 10º, “não pode a inobservância desses acordos ser motivo de oposição ao portador, salvo se este tiver adquirido a letra de má fé ou, adquirindo-a, tenha cometido uma falta grave”.
Quer dizer, ao portador de boa fé não será possível opor a excepção do preenchimento com inserção de elementos não convencionados. Pretende-se salvaguardar o desígnio do respeito pela convicção legítima do portador, com o intuito de facilitar a circulação da letra, a que se refere, também, o art. 16º do mesmo diploma. A má fé, para esse efeito, consistirá no conhecimento ou na ignorância indesculpável (negligente) do preenchimento abusivo.
A doutrina (2) costuma distinguir, no que diz respeito à excepção do preenchimento abusivo da letra, os casos em que o título foi preenchido pelo primeiro adquirente, dos casos em que o documento foi completado por terceiro. Trata-se de saber quais os meios de defesa que a lei concede ao subscritor, em relação ao portador, no caso de inobservância da convenção de preenchimento.
No caso de preenchimento pelo primeiro adquirente (a pessoa a quem o subscritor a entregou) e sendo este que reclama o pagamento, é evidente que a excepção lhe poderá ser oposta. Se é, porém, um terceiro que reclama o pagamento, mas que recebeu a letra já preenchida, caso esteja de boa fé e não lhe seja imputável culpa grave na respectiva aquisição, não será possível ao subscritor opor a excepção. No caso de preenchimento por um terceiro, se este recebeu a letra por tradição ou sucessão mortis causa, sendo um mero cessionário ou representante de quem recebeu o título, a excepção pode-lhe ser oposta. Se, todavia, esse terceiro recebeu a letra já preenchida, não poderá o subscritor opor-lhe a excepção, a não ser no caso desse terceiro estar de má fé ou de, na altura da aquisição, ter cometido uma falta grave. Será esta hipótese, a directamente contemplada, na disposição em análise3(3) .e(4)
f ).. No caso dos autos a situação a atender, será a do preenchimento (abusivo) pelo primeiro adquirente, sendo um terceiro que reclama o pagamento. Nestas circunstâncias, caso esteja de boa fé, não será possível ao subscritor opor a excepção. Este poderá, porém, opor a excepção se o portador, aquando da aquisição, agiu de má fé ou se, nessa altura, cometeu uma falta grave.
E qual é o alcance a dar às expressões «má fé» e «falta grave»?
Sobre o alcance a atribuir à má fé se debruçaram as delegações dos diversos países à Conferência de Genebra, que elaborou o texto da L.U. Inclusivamente, uma delegação (a delegação alemã) apresentou uma proposta com o intuito de precisar o entendimento de má fé, tendo sido repudiada com o fundamento essencial de se ter considerado impossível dar uma definição de má fé que satisfizesse a noção que em cada país se tem sobre esse conceito. Qualquer tentativa de delimitar o conceito, como refere Pinto Coelho, sublinhando a posição do delegado francês Percerou55 (5)
, “acarretaria o grave risco de deixar de fora do seu âmbito de aplicação casos que, na realidade, devessem nela ser abrangidos”. Por isso se entendeu adoptar o texto do projecto sem qualquer emenda, competindo a cada país precisar o respectivo conteúdo.
A discussão essencial centrou-se então no facto de se saber se a má fé do adquirente se deveria referir apenas ao cedente imediato ou se poderia, igualmente, respeitar a um portador antecedente.
No entender de Pinto Coelho, atendendo às considerações de Percerou e às observações feitas pelo presidente da conferência66 (6) deve concluir-se que a expressão em causa, “respeita apenas à aquisição do crédito cambiário pelo cedente, isto é, incide apenas sobre as condições em que a letra foi adquirida por aquele que agora a entrega ao novo adquirente; não atinge o conhecimento que este tenha do vício que afectasse uma transferência anterior, pois como se diz no Relatório da Comissão de Redacção, a boa fé do que adquiriu a letra das mãos de um possuidor ilegítimo, purgou o título do vício dessa transmissão(7).
No mesmo sentido vai o entendimento de Vaz Serra(8)
, que diz que “a má fé parece ser o conhecimento da falta de direito do alienante, já que se esse direito existe, a aquisição não pode ser impugnada”.
A disposição em análise equipara a má fé, à culpa lata (ou grave)(9)
. Somos em crer que esta culpa deve compreender a atitude do adquirente que, no momento da aquisição, revelou um comportamento de tal forma desleixado, que essa falta de cuidado não poderá ser-lhe desculpável. Por outras palavras, existirá culpa grave, quando o adquirente não possa ignorar que, quem lhe transmitiu o título não era o seu portador legítimo ou que o título padecia de irregularidade. Como refere Gonçalves Dias “a culpa grave revela-se na ignorância indesculpável, proveniente da falta de necessária e razoável diligência que a lei reclama de todos aqueles que operam no mundo jurídico. Há falta grave quando o possuidor devia saber que quem lhe endossou o título não era portador legítimo”(10)
0. No mesmo sentido diz Pinto Coelho que na disposição em análise “considera-se a hipótese de o adquirente ignorar, de facto, os vícios da sua aquisição, ou desconhecer qualquer irregularidade que afectasse o direito daquele que lhe transmitira o título, mas em circunstâncias tais que seja lícito afirmar que devia tê-la conhecido, isto é, que, se tivesse usado um mínimo de diligência para se inteirar das condições em que a letra fora adquirida pelo seu endossante, teria podido conhecer a irregularidade da tal aquisição(11).
1.
No caso dos autos provou-se que opoente autorizou, em escrito datado de 14-02-2001, o preenchimento da livrança para garantia e segurança das obrigações assumidas nos acordos aludidos em 10 e 16, até ao valor de 37.500.000$00. A data de emissão e o valor foram apostos na livrança mencionada em 1 sem que a opoente tivesse desrespeitado qualquer das responsabilidades assumidas nos acordos referidos em 10. e 16, as quais a opoente sempre cumpriu tempestiva pontual e integralmente.

Quer dizer, estes factos demonstram que a livrança, na realidade, foi preenchida em violação do acordo de preenchimento, visto que a responsabilidade derivada das obrigações que a mesma garantia, não foi desrespeitada. Existiu, por conseguinte, preenchimento abusivo do título, por parte do Banco, o primitivo portador.

Mas será que na aquisição da livrança (mediante o seu pagamento) o seu actual portador (o ora exequente) agiu de má fé ou cometeu, aquando da obtenção, uma falta grave?

É este o cerne da questão que nos é submetida para apreciação.

Para lhe responder, salientaremos que se indagou no art. 5º da base instrutória se o exequente tinha conhecimento de que a data de emissão e o valor foram apostos na livrança sem que a opoente tivesse desrespeitado qualquer das responsabilidades assumidas e que a mesma sempre cumpriu tempestiva pontual e integralmente os acordos, tendo-se respondido à questão como “não provado”.

Significa isto que não se provou que o exequente fosse conhecedor do preenchimento abusivo por parte do Banco referenciado, donde resulta que a má fé não se prova.

Mas como se viu, a lei faz equivaler à má fé, a falta grave, falta que ocorrerá, consoante os ensinamentos dos mestres acima referenciados, quando o adquirente ignorar os vícios da sua aquisição ou qualquer irregularidade perturbadora do direito daquele que lhe transmitiu o título, mas em circunstâncias tais que seja lícito afirmar que deveria ter conhecido os vícios. Se tivesse usado um mínimo de diligência para se inteirar das condições em que o título fora adquirida pelo anterior portador, teria podido conhecer a irregularidade da situação. No caso vertente, se se demonstrar que o exequente, ao adquirir o título, não usou do mínimo cuidado no sentido de se inteirar da irregularidade do preenchimento e se, pelo contrário, tivesse usado de uma ínfima diligência, teria detectado essa irregularidade (inexigência ainda da obrigação) então a culpa grave dever-se-á ter como indiciada.

Os factos provados não são susceptíveis de fazer integrar essa culpa grave. Porém, a nosso ver, existem outras circunstâncias alegadas que, a demonstrem-se, poderão denunciar essa culpa. Reconhece-se que a opoente poderia ser mais explícita e consistente na alegação de factos integrativos dessa culpa. Porém, entende-se, que do teor da petição inicial, olhada no seu conjunto e de algumas das circunstâncias aduzidas, será possível deduzir essa culpa grave.

Na verdade, a opoente alegou e provou que a livrança em causa foi subscrita por si para garantia e segurança do cumprimento das obrigações resultantes do acordo de financiamento celebrado com o Banco Efisa S.A., tendo sido preenchida pelos seus representantes, que deixaram em branco a data de emissão e o valor. A data de emissão e o valor da dita livrança foram preenchidos pelo Banco sem que a opoente tivesse desrespeitado qualquer das responsabilidades assumidas nos acordos de financiamento referenciados, os quais a opoente sempre cumpriu tempestiva, pontual e integralmente.

Alegou e provou também a opoente que, em Junho de 2002, o Banco Efisa SA. moveu uma acção executiva para pagamento de quantia certa contra o exequente e ela, executada, opoente AA. Na sequência da instauração desta acção executiva, o aqui exequente (BB) e então executado pagou ao Banco Efisa, SA, a quantia exequenda, tendo a acção sido declarada extinta, mediante sentença que transitou em julgado, tendo ainda o tribunal, nos embargos de executado então deduzidos pela ora opoente, julgado extinta a instância por inutilidade superveniente da lide também, mediante sentença que transitou em julgado. O Banco Efisa SA e o ora exequente subscreveram, então, um escrito particular datado de 14-10-2002 e denominado “Acordo de Pagamento” onde para além do mais o exequente refere que na sequência do incumprimento das obrigações assumidas no âmbito do mencionado contrato” aceita pagar a quantia que referencia.

Relativamente a esse acordo, que a opoente reputa de secreto, alega esta que nele o Banco Efisa e o ora exequente dão como certo o incumprimento do contrato por parte da opoente AA (facto provado), quando na verdade, o Banco preencheu a livrança sabendo que existira incumprimento da sua parte e não da opoente. Acrescenta que pagou, por isso, o exequente uma obrigação que ainda não era exigível, por não estar vencida(12), quando sabia perfeitamente que estava a ser escrutinado judicialmente o pontual cumprimento das obrigações que avalizara, através da acção em que era também executado (art. 33º da petição inicial). Diz ainda que o exequente pagou, aceitando como incontestável algo que para um experimentado advogado, como é o exequente, com os conhecimentos concretos que tinha do desenrolar do processo em causa não deveria ser assim tão exigível (art. 38º da mesma peça).

Somos em crer que a provar-se, por um lado, que o exequente sabia que estava a discutir-se judicialmente a obrigação (que avalizara) e, pelo outro, que o exequente é advogado experimentado que tinha conhecimentos sobre o desenrolar do processo onde a questão se discutia, a culpa grave, derivado de um pagamento não exigível, será obviamente de colocar. O dito comportamento denuncia, a omissão de cuidados e precauções (designadamente a falta de contacto com a subscritora do título), que levou ao pagamento de uma quantia monetária não exigível, em prejuízo evidente da principal obrigada, a ora opoente.

De resto, não é muito compreensível o pagamento efectuado pelo ora exequente, a não ser que se entenda esse comportamento como tendente a prejudicar a subscritora da livrança. Com efeito, parece-nos que o exequente dificilmente ignoraria que a exigibilidade do valor da livrança estava a ser discutida judicialmente pela obrigada principal (em processo também contra si deduzido) e sendo o exequente mero avalista, não se vê qualquer utilidade prática para si, o pagamento que voluntariamente fez ao Banco. Por outro lado, seria da mais elementar cautela, antes de efectuar o pagamento, falar e dar conhecimento da sua intenção à subscritora da livrança e não agir, alegadamente, de forma secreta.

Por isso com vista a poder-se, eventualmente, indiciar a indicada culpa grave por banda do exequente, decide-se, nos termos do art. 729º nº 3 do C.P.Civil, ordenar a ampliação da matéria de facto, acrescentando à base instrutória a matéria factual constante dos arts. 33º e 38º da petição inicial.

III- Decisão:
Por tudo o exposto, em ordem a ampliar-se a matéria de facto, nos termos atrás referidos, remeta-se o processo ao tribunal recorrido.
Custas pela parte vencida a final

Supremo Tribunal de Justiça, 17 de Abril de 2008

Garcia Calejo (Relator)
Mário Mendes
Sebastião Póvoas
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(1)-O Acórdão do STJ de 20-5-2004 ( in www.djsi.pt/jstj.nsf ), em sintonia com este entendimento, ponderou, a propósito de se saber em que momento a letra se deve considerar integrada por todos os elementos essenciais, que a questão não é resolvida pelos arts. 1º e 2º da L.U., mas antes pelo art. 10º, razão por que se fica a saber que o momento decisivo não é o da emissão da letras, mas sim o do seu vencimento.
(2)-Vide sobre o assunto C.Civil Anotado dos Profs. Pires de Lima e Antunes Varela, 4ª edição, I Volume, pág. 223.
(3) Neste sentido Pinto Coelho que expressamente refere que “é lícito admitir, pelo confronto com as explicações do Relatório da Comissão de Redacção, e atendendo à circunstância de que o legislador só quis tutelar os direitos do portador que adquiriu um título já completo, representativo de uma letra verdadeira e própria, que o portador, que se considera no preceito do art. 10º, é o adquirente do título já preenchido, embora abusivamente”.
(4) Questão confinante com esta ( excepção do preenchimento abusivo ), é a de saber a quem cabe o ónus da prova da excepção ( violação do contrato de preenchimento ). A este respeito, a jurisprudência tem vindo, de forma reiterada, a entender que essa prova caberá ao subscritor do título ( Acórdãos do STJ de 13-2-2003 in www.djsi.pt/jstj.nsf, do STJ de 4-6-2002 in mesmo “site”, do STJ de 26-3-1996 in mesmo “site”, do STJ de 1-10-98, BMJ 480-482, do STJ de 16-5-75, BMJ 247-107, do STJ de 28-7-72, BMJ 219-235 ).
Pinto Furtado, invocando o Acórdão do STJ de 28-5-1996 ( BMJ 457-401 ), defende, em concordância com tal aresto, que, em sede de acção executiva, a alegação e prova dos factos respeitantes ao preenchimento abusivo da letra, deve ser feita nos embargos do executado (Títulos de Créditos, pág. 146 ). No mesmo sentido, ainda o Acórdão do STJ de 26-3-1996 ( in www.djsi.pt/jstj.nsf ).
(5)- Ob. citada, Fascículo IV, pág. 82
(6)- O presidente da Comissão anuiu às considerações feitas por Percerou, sublinhando ainda o diverso alcance das fórmulas constantes do projecto de peritos e da proposta alemã, inclinando-se até a favor da primeira, que deixava ao julgador a liberdade de decidir se a má fé do adquirente só poderia referir-se ao cedente imediato ou poderia, igualmente, respeitar a um portador precedente.
(7)-Ob. citada, Fascículo IV, págs. 82 e 83.
(8)- in BMJ 61, pág. 158

(9)- P. Coelho assinala que existe, na versão oficial portuguesa do art. 16º L.U. ( última parte ), uma tradução incorrecta do texto original em relação às palavras «faute lourde». Assim, ao invés de se colocar no texto a expressão «falta grave», deveria ter-se adoptado a expressão «culpa grave» - in Ob. citada, 2º Volume, Fascículo IV, pág. 79.

(10)- Ob. citada, Vol. I, pág. 447

(11)- Ob. citada, 2º Volume, Fascículo IV, pág. 84.

(12)- Daí o preenchimento abusivo do título.