Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1742/06.2TBABF.E1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: ANA PAULA BOULAROT
Descritores: ASSOCIAÇÃO EM PARTICIPAÇÃO
TRANSMISSÃO DE DÍVIDA
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
Data do Acordão: 03/01/2012
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática: DIREITO DAS OBRIGAÇÕES/ DIREITO DOS CONTRATOS/ CONTRATO DE ASSOCIAÇÃO EM PARTICIPAÇÃO/ ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
Sumário :

I O contrato de associação em participação, figura esta que nos é definida pelo artigo 21º, nº1 do DL 231/81, de 28 de Julho, pressupõe a associação de uma pessoa a uma actividade económica exercida por outra, ficando a primeira a participar nos lucros e perdas que do exercício da actividade vierem a resultar para a segunda, sendo elemento essencial deste tipo de contrato a participação nos lucros.

II Não resulta dos acordos celebrados que os Autores/Recorrentes quisessem «associar-se» a uma qualquer actividade de construção das ditas villas por banda da sociedade “W”, e que o dinheiro adiantado se destinasse a tal actividade de cariz económico, mas antes que ao procederem desse modo pretendiam apenas adquirir uma das tais villas que viessem a ser construídas naquele tal imóvel que a referida sociedade iria adquirir no estrangeiro, sendo certo que os Autores/Recorrentes subscritores dos acordos neles intervieram, expressis verbis, na qualidade de «compradores».

III Por outro lado, a promessa feita aos Autores que iriam obter de um rendimento de 20% ao ano com o investimento feito, sempre faria afastar por completo, se outras dúvidas não se pusessem, qualquer pretensão de enquadrar o negócio num tal tipo contratual, pois não se trata de uma estipulação sobre a forma de participação dos lucros prevenida pelo artigo 25º, do DL 231/81, de 28 de Julho, porque de lucros se não pode falar, mas antes de uma garantia do retorno do investimento feito.

IV Sendo a associação em participação um «contrato associativo» no qual o associado ou participe irá beneficiar dos lucros (e perdas) da actividade desenvolvida pelo associante ou titular, contribuindo para isso com um determinado apport, a fixação de um juro remuneratório como contrapartida do investimento feito é elemento estranho à estrutura contratual que o não comporta.

V A transmissão singular de divida corresponde ao instituto da assunção de divida, prevenido pelo normativo inserto no artigo 595º do CCivil, que consiste no acto de um terceiro – o assuntor – que se vai vincular perante o credor a efectuar a prestação devida por outrem, sendo que a transmissão só exonera o antigo devedor desde que haja declaração expressa do credor.

VI Os requisitos gerais do enriquecimento sem causa, são os que resultam do normativo inserto no artigo 473º, nº1 do CCivil, cuja verificação é cumulativa: i) que tenha havido um enriquecimento da Ré; ii) que tal enriquecimento tenha sido obtido sem qualquer causa justificativa; que esse enriquecimento tenha sido obtido à custa dos Autores; iii) que a lei não faculte aos empobrecidos um outro meio de serem ressarcidos.

VII Acrescenta o nº2 de tal normativo que «A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou.», tratando-se, aqui neste segmento normativo, das hipóteses especiais de enriquecimento injustificado (na modalidade condictio ob rem).

VIII Esta vertente do enriquecimento sem causa  exige para a sua verificação os seguintes requisitos: i) a realização de uma prestação visando um determinado resultado; ii) correspondendo esse resultado ao conteúdo de um negócio jurídico; iii) sendo que esse resultado não se vem posteriormente a realizar.

IX Todavia, não resulta dos autos que os Autores/recorrentes tivessem por qualquer meio negociado o que quer que fosse com a Recorrida, sendo certo que sempre impenderia sobre aqueles o ónus da prova da factualidade inerente, nos termos do artigo 342º, nº1 do CCivil.

(APB)

Decisão Texto Integral:

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I P S, S B, R P, V S R, S R, P J R, R G, P T W, D M, E B H, M B J H, C E, J M e J L J H (estes quatro Autores como herdeiros habilitados de J H entretanto falecido), P S, D B F, T M, P S, M A O’C, S W e S B H, instauraram acção declarativa com processo ordinário contra EMPREITADAS, LDA e M J H, pedindo a declaração da nulidade dos contratos de mútuo celebrados entre os Autores e os Réus, condenando-se estes a pagarem-lhes:

a) o montante de € 565.882,84 (quinhentos e sessenta e cinco mil oitocentos e oitenta e dois euros e oitenta e quatro cêntimos);

b) juros à taxa acordada de 20%, desde Fevereiro de 2004 até à presente data - 18 de Julho de 2007 - calculado sobre £ 681.668,00 (seiscentas e oitenta e uma mil seiscentas e sessenta e oito libras) o que equivale a €1.001 .882,84 (um milhão, mil oitocentos e oitenta e dois euros e oitenta e quatro cêntimos) até ao parcial pagamento e sobre o restante até ao presente, o que totaliza o montante de €653.736,81 (seiscentos e cinquenta e três mil, setecentos e trinta e seis euros e oitenta e um cêntimos).

Ou, caso assim não se entenda, devem os Réus ser condenados no pagamento aos Autores das quantias referidas em a) e b), atentas as regras do enriquecimento sem causa.

c) a condenação dos Réus a pagar aos Autores as inúmeras despesas com advogados, viagens a Portugal, alojamento, telefonemas, fazes a que aqueles, com a sua conduta ilícita, fizeram estes incorrer, em montante a liquidar em execução de sentença, mas que se computa já em €150.000 (cento e cinquenta mil euros);

d) a condenação dos Réus no pagamento dos danos em que fizeram os autores incorrer e que, voluntariamente lhes causaram, utilizando em seu proveito exclusivo os montantes que haviam sido entregues com fim diverso e que se consubstanciou num prejuízo em quantia a liquidar em execução de sentença, mas que se calcula já em cerca de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros);

num total de €1.619.619,65 (um milhão, seiscentos e dezanove mil, seiscentos e dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos).

Alegaram para o efeito e em síntese:

Em Dezembro de 2003, foram aliciados por G C no sentido de investirem num empreendimento imobiliário sito no Algarve, sendo o objectivo disponibilizarem montantes que se destinariam à compra de um bem imóvel, no qual seria desenvolvido o empreendimento imobiliário ficando os autores, como contrapartida, com uma das villas que iriam ser construídas, prometendo a obtenção de um rendimento dos montantes transferidos de 20% ao ano.

Numa primeira fase os montantes eram transferidos para a conta do citado G C, que se comprometia a transferir as mesmas para uma sociedade que estava em processo de constituição.

A referida sociedade veio a ser constituída em 19/02/2004 e foi, até Fevereiro de 2005 detida em 50% pelo G C. Posteriormente, foi o segundo réu tornado sócio gerente da sociedade. Após as transferências foi feito pela sociedade ré o pagamento do preço pela compra do imóvel sito em …, onde se encontra a ser construído um empreendimento. No entanto, apesar de terem recebido os depósitos para compra das referidas villas a construir, os réus recusaram-se a outorgar os respectivos contratos-promessa.

Os Autores lograram ser reembolsados de € 436.000, mas encontram-se desembolsados do montante de € 565.882,84.

Citados os Réus vieram contestar, por excepção, invocando a incompetência absoluta do Tribunal, bem como sua ilegitimidade e, por impugnação, salientando nada deverem aos autores.

                Na réplica os Autores defenderam o indeferimento das excepções deduzidas e requereram a intervenção provocada de “Serviços de Consultadoria Empresarial, Lda, intervenção essa que veio a ser indeferida.

Foram julgadas improcedentes as excepções de incompetência internacional e ilegitimidade passiva.

               

A final foi proferida sentença a julgar a acção improcedente e absolveu os Réus do pedido.

Inconformados com tal decisão recorreram os Autores, tendo sido julgada improcedente a Apelação e confirmada a sentença recorrida.

De novo não se conformando, vieram os Autores interpor Revista, apresentando as seguintes conclusões:

- G C, que veio a ser sócio e gerente da 1ª R. desde a constituição desta, invocou, antes da mesma constituição, essa futura qualidade, em declarações negociais que dirigiu aos AA.

- A invocação dessa qualidade nas referidas declarações tem de ser interpretada, nos termos do disposto no art. 236.° n.° 1 do Código Civil, como significando que o declarante actuou em nome da sociedade a constituir - a aqui R.

- Os actos praticados pela sociedade R. após a sua constituição só podem ser interpretados como manifestação da vontade da R. de cumprir os negócios celebrados com os AA. em seu nome, nos termos do art. 19.° n.°2 do Código das Sociedades Comerciais.

- A falta de comunicação expressa desta decisão aos AA. não impede estes de invocar o negócio.

- O negócio celebrado entre os AA. e a R. é uma associação em participação, regulada nos arts. 21.° e segs. do Dec.-Lei n.° 231/81, de 28 de Julho.

- Esse negócio não está sujeito a forma especial, nos termos do art.º 23.° do citado diploma.

- O reembolso aos AA. da quantia de € 436.000,00, efectuado pela R., significa que as partes do contrato de associação em participação puseram, por acordo, termo aos efeitos do dito contrato.

- Nesse acordo, a R. obrigou-se a restituir aos AA. a quantia de € 565.882,84, subordinando esta obrigação a uma condição suspensiva, que, entretanto, se verificou.

- Ainda que não procedam as conclusões anteriores, a R. assumiu a dívida contraída por G C, nos termos do art. 595.° n.º 1 do Código Civil.

- Tratando-se de negócio consensual, a sua celebração não está sujeita a forma especial, pelo que a vontade de assumir as correspondentes obrigações se manifesta, nos termos do art. 217.° n.°1 do Código Civil, nas condutas da R., que significam a vontade de cumprir esse negócio.

- Ainda que não procedessem as conclusões anteriores, a R. emitiu uma declaração unilateral com o valor de reconhecimento de dívida, nos termos do art. 458.° do Código Civil.

- Esse reconhecimento dispensa os AA. de provar a relação fundamental.

- O mesmo reconhecimento foi subordinado a uma condição suspensiva, que já se verificou.

- Mas ainda que no procedesse nenhuma das anteriores conclusões, ter-se-ia verificado, nos termos do artº 473.° do Código Civil um enriquecimento do património da R. à custa do património dos AA. no montante de € 565,882484.

- Por conseguinte é a R. devedora dos AA. pela quantia de € 565.882,84.

- A este montante acrescem juros, contados sobre ele, à taxa legal, desde a data da verificação da condição suspensiva a que ficou subordinada a produção dos efeitos da assunção de dívida - 6 de Fevereiro de 2006 - até integral pagamento, nos termos dos arts. 804.° e segs. e 559.° do Código Civil.

Os Autores fizeram juntar com as suas alegações de recurso, um parecer do Excelentíssimo Professor Doutor Luís Menezes Leitão, no qual se conclui pela obrigação da Ré a restituir tudo o que lhe foi prestado pelos Autores, a titulo de enriquecimento sem causa, acrescendo os juros a partir do momento em que se tornou conhecida a falta do efeito que se pretendia obter com a prestação, cfr fls 1019 a 1065.

A Ré contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.    

II Põem-se como problemas a resolver no âmbito deste recurso as de saber: i) da repetição das alegações; ii) dos contratosratos havidos entre os Autores e a Ré Empreitadas, Lda, contrato de mútuo e do contrato de associação em participação; iii) da intervenção de G C em nome da Ré e da vinculação desta com os Autores; iv) do reconhecimento de divida; v) do enriquecimento sem causa.

As instâncias deram como assente a seguinte factualidade:

- Em data que os Autores não conseguem precisar, mas em Dezembro de 2003, estes foram aliciados por um tal G C, no sentido de investirem num empreendimento imobiliário sito no Algarve, denominado X (alínea A) dos factos assentes),

- O referido G C detinha uma sociedade de direito inglês denominada “W, Ltd.” (fls. 890 a 896 do apenso), que efectuava o “marketing” e promoção de determinado empreendimentos imobiliários (alínea B) dos factos assentes).

- E, fruto dos seus conhecimentos, conseguiu angariar clientes de nacionalidade inglesa, entre eles os autores, com o propósito destes adquirirem algumas das “villas” que integrariam o aludido empreendimento designado “X” (alínea C) dos factos assentes).

- O objectivo pretendido era os autores disponibilizarem determinados montantes que se destinariam à compra de um bem imóvel, no qual seria desenvolvido o aludido empreendimento imobiliário (alínea D) dos factos assentes).

- Estipulando-se que aos autores, em virtude das verbas que disponibilizariam, ficariam como contrapartida, cada um, com uma das “villas” que iriam ser construídas no mencionado empreendimento (alínea E) dos factos assentes).

- Os montantes em causa seriam disponibilizados pelos autores mediante transferências/depósitos bancários - que eram precedidos de uma comunicação feita pela “W, Ltd” que identificada o mencionado empreendimento denominado “Atalaia” (alínea F) dos factos assentes).

- G C, “W, Ltd” solicitava a transferência de fundos (F) prometendo aos Autores a obtenção de um rendimento dos montantes transferidos, de 20% ao ano (fls. 31—32 do apenso) - artigo 1 da base instrutória (com correcção dada pelo despacho de fls. 473), dado como assente.

- Os depósitos/transferências (F) obedeciam a um mecanismo que passava pela compra de moeda pelos autores a uma corretora financeira denominada “S-X”, a uma taxa de câmbio acordada entre esta e aquelas (fls. 24 a 27) - artigo 2° da base instrutória, dado como assente.

- Em 10 de Dezembro de 2003 S W assinou com “W Limited” o documento/contrato junto a fls. 528 a 542 do apenso — onde se lê que: “Ambas as partes acordam o seguinte:

1- Atendendo à quantia de Noventa mil Libras agora pagas pelo comprador ao investidor tal como definido no ponto 1.1, a companhia concorda em:

1.1- Reter estas quantias (excepto as doravante mencionadas) na conta de cliente de H & Co        Trust Ltd S-X Banco National…., Código Swift: NW Código de identidade bancária: 00-00-00 Nûmero da conta: 7000 o qual guardará as quantias na qualidade de depositário até que as mesmas possam ser disponibilizadas de acordo com as condições de pagamento faseado doravante referidas, com excepção de mil libras de sinal já pagas à Companhia.

1.2- Comprar um lote de terreno, doravante referido como “o Lote”, com o objectivo de aí construir uma vivenda referida no calendário em anexo (doravante referida como “a propriedade”) e me garantir a elaboração dos planos preliminares e de pormenor, a obtenção das licenças de construção, e ainda o cumprimento das normas de construção a fim de se executar a construção do edifício em causa.

1.3- Pendente da disponibilização à Companhia dos pagamentos faseados acima mencionados, a mesma concorda em construir a propriedade no Lote dentro dos mais elevados padrões de qualidade e de acordo com as especificações estabelecidas no contrato. (...)

1.5- Quando executada a compra do Lote no qual a vivenda será construída, fazer o depósito na “H & Co Trust Ltd S-X” a quantia de noventa mil libras, da seguinte forma: (...)

2 - 0 comprador autoriza a disponibilização das verbas à Companhia nas seguintes prestações:

2.1- Nove mil libras serão disponibilizadas pela “H & Co Trust Ltd S-X” (apenas com autorização do comprador) mediante apresentação de documento comprovativo da aquisição do contrato promessa relativo à compra de terreno.

2.2 - Vinte e seis mil seiscentas e sessenta e seis libras são disponibilizados à Companhia mediante a recepção por parte desta da notificação enviada pelos advogados locais da data da execução da compra do lote (incluindo todo e qualquer outro terreno adjacente ou contíguo a ser comprado pela Companhia) no qual a propriedade será construída juntamente com licença urbanística.

O Lote de terreno será então registado no nome do comprador aquando da execução da compra do terreno. O registo do terreno no nome do comprador é regido em primeira instância pela lei local, aplicando-se o mesmo às cláusulas 3, 4, 5.1 e 6.

2.3 - Vinte e seis mil seiscentas e sessenta e seis libras do preço de compra será disponibilizado à Companhia quanto o isolamento do edifício contra a água e o vento estiver devidamente assegurado e confirmado pelo advogado local.

2.3ª Vinte e seis mil seiscentas e sessenta e seis libras um mês após o pagamento anterior. (...)

3- Ao comprador serão emitidos os títulos de escritura de propriedade no momento de execução da compra e quanto o valor total da compra tiver sido recebido (...)

7- Lei vigente Este acordo é tido como um acordo efectuado em Inglaterra e será interpretado e executado de acordo com as leis de Inglaterra e do País de Gales.

7.1- Qualquer contencioso que surja relativamente ao presente será submetido à jurisdição exclusiva dos tribunais ingleses e as partes concordam que qualquer decisão desses tribunais será vinculativa dentro da jurisdição em que residam temporariamente e a parte em falta não tomará qualquer iniciativa noutra jurisdição no sentido de contestar essa decisão, mas pelo contrário cooperará a fim de executar tal decisão” (alínea S) dos factos assentes).

- Em 12 de Dezembro de 2003 R C e P S assinaram com “W Limited” o documento/contrato junto a fls. 393 a 407 do apenso - de teor idêntico ao supra transcrito (alínea T) dos factos assentes).

- Sem data, S B assinou com “W Limited” o documento/contrato junto a fls. 408 a 424 do apenso - de teor idêntico ao supra transcrito (alínea U) dos factos assentes).

- Sem data, P J R assinou com “W Limited” o documento/contrato junto a fls. 469 a 483 do apenso - de teor idêntico ao supra transcrito (alínea V) dos factos assentes).

- Sem data, R J P e G A P assinaram com “W Limited” o documento/contrato junto a fls. 425 a 439 do apenso - de teor idêntico ao supra transcrito (alínea w) dos factos assentes).

- Sem data, T MH e T M assinaram com “W Limited” o documento/contrato junto a fls. 515 a 527 do apenso - de teor idêntico ao supra transcrito (alínea X) dos factos assentes).

- Sem data, S N R assinou com “W Limited” o documento/contrato junto a fls. 454 a 468 do apenso - de teor idêntico ao supra transcrito (alínea Y) dos factos assentes).

- Em 15 de Dezembro de 2003 V S R e H F R assinaram com “W Limited” o documento/contrato junto a fls. 440 a 453 do apenso - de teor idêntico ao supra transcrito (alínea Z) dos factos assentes).

- Em 17 de Dezembro de 2003, D e D M assinaram com “W Limited” o documento/contrato junto a fls. 484 a 498 do apenso - de teor idêntico ao supra transcrito (alínea AA) dos factos assentes).

- Em 16 de Março de 2004 P S e L C S assinaram com “W” o documento/contrato junto a fls. 499 a 514 do apenso - de teor idêntico ao supra transcrito (alínea AB) dos factos assentes).

- Depois de confirmados pelos autores os detalhes relativos à mencionada compra de moeda, os montantes em questão eram “automaticamente” depositados numa “escrow account” num intermediária financeira designada “H Co Trust Company” — que se obrigava, posteriormente, a “libertar” as quantias em causa, transferindo-as, de acordo com as instruções dos autores, para um ou várias contas domiciliadas em Portugal (artigo 3° da base instrutória, dado como assente).

- Numa primeira fase, tais quantias seriam transferidas para a conta de G C que se comprometia a transferir as mesmas para uma sociedade que estava em processo de constituição (ora 1ª ré) e da qual seria sócio gerente, logo que a mesma estivesse matriculada (resposta ao artigo 4° da base instrutória).

- G C ficava como “fiel depositário” das quantias que fossem depositadas pelos autores até à data da constituição da sociedade e, assim, que a sociedade fosse constituída, G C transferiria as quantias em causa para a mesma (resposta ao artigo 5° da base instrutória).

- Em 19 de Fevereiro de 2004 o ora autor P S transferiu o montante de £9.000 (€13.068,00) para a conta da 1ª ré (NIB 004) e, em 22 de Março de 2004, o montante de £25.000 (€36.500,00) para a conta do BNC com o IBAN PT5 0000 (resposta ao artigo 6° da base instrutória).

- A conta do BNC com o IBAN PT50000 é titulada pela sociedade “Serviços de Consultadoria Empresarial, Lda.” e é denominada por “Serviços de Consultadoria Empresarial, Lda -Y” (resposta aos artigos 7° e 33° da base instrutória).

- Em 19 de Fevereiro de 2004 o ora autor S B transferiu o montante de £9.000 (€13.068,00) para a conta da ia ré e, em 22 de Março de 2004, o montante de £25.000 (€36.500,00) para a conta do BNC com o IBAN PT50000 (resposta ao artigo 8º da base instrutória).

- Em 10 de Fevereiro de 2004 o ora autor R P transferiu o montante de £9.000 (€12.960,00) para a conta de G C (NIB 004603311935860011075) e, em 12 de Março de2004, o montante de £25.000 (€36.025,00) para a conta do BNC com o IBAN PT50000 (resposta ao artigo 9° da base instrutória).

- Em 19 de Fevereiro de 2004 o ora autor V S R transferiu o montante de £9.000 (€13.068,00) para a conta da 1ª ré e, em 12 de Março de 2004, o montante de £25.000 (€36.025,00) para a conta do BNC com o IBAN PT50000 (resposta ao artigo 10° da base instrutória).

- Em 10 de Fevereiro de 2004 o ora autor S R transferiu o montante de £79.000 (€1 13.769,00 - fls. 107 do apenso) para a conta de G C (artigo 11º da base instrutória, dado como assente).

- Em 10 de Fevereiro de 2004 o ora autor P J R transferiu o montante de        £9.000 (€12.960,00) para a conta de G C e, em 13 de Abril de 2004, o montante de £25.000 (€37.500,00) para a conta do BNC com o IBANPT50000 (resposta ao artigo 12° da base instrutória).

- Em 16 de Dezembro de 2003 o ora autor R G transferiu o montante de £8.980 (€13.068,00) para a conta da 1ª ré e, em 12 de Março de 2004, o montante de £25.000 (€36.025,00) para a conta do BNC com o IBAN PT50000 (resposta ao artigo 13° da base instrutória).

- Em 19 de Fevereiro de 2004 a sociedade “M L, Ltd.”, representada por Peter T W, transferiu o montante de £9.000 (€13.068,00) para a conta da 1ª ré e, em 12 de Março de 2004, o montante de £26.666,66 (€38.426,66) para a conta do BNC com o IBAN PT50000 (resposta ao artigo 14° da base instrutória).

- Em 22 de Março de 2004 o ora autor D M transferiu o montante de £34.000 (€49.640,00) para a conta do BNC com o IBAN PT50000 (resposta ao artigo 15° da base instrutória).

- Em 4 de Maio de 2004 o ora autor J H transferiu €40.000,00 para a conta do BNC com o IBAN PT50000 e em 27/07/2004 transferiu a quantia de £9.000 (€13.410,00) para a mesma conta do BNC com o IBAN PT50000 (resposta ao artigo 16° da base instrutória).

- Em 10/02/2004 o ora autor P S transferiu o montante de £9.000 (€12.960,00) para a conta de G C e, em 22 de Março de 2004, o montante de £25.000 (€36.500,00) para a conta do BNC com o IBAN PT50000 (resposta ao artigo 17° da base instrutória).

- Em 19 de Fevereiro de 2004 R F transferiu o montante de £9.000 (€13.068) para a conta da 1ª ré e, em 22 de Março de 2004, o montante de £25.000 (€36.500) para a conta do BNC com o IBAN PT50000 (resposta ao artigo 18° da base instrutória).

- Em 10 de Fevereiro de 2004 o ora autor T M transferiu o montante de £9.000 (€13.068,00) para a conta de G C e, em 22 de Março de 2004, o montante de £25.000 (€36.500,00) para a conta do BNC com o IBAN PT0000 (resposta ao artigo 19° da base instrutória).

- Em 19 de Fevereiro de 2004 o ora autor M A O transferiu a quantia de £9.000 (€13.068,00) para a conta titulada pela 1ª ré (artigo 21° da base instrutória, dado como assente).

- Em 12 de Março de 2004 o ora autor S W transferiu a quantia de £35.667 (€51.396,15) para a conta do BNC com o IBAN PT0000 (resposta ao artigo 22° da base instrutória).

- Em 12 de Fevereiro de 2004 o ora autor S B H transferiu o montante de €100.800,00 para a conta de G C (fls. 117 e 121 do apenso) e, em 13 de Fevereiro de 2004, de uma conta titulada por si e por sua mulher, a quantia de £30.000 para a conta de G C (fls. 120 do apenso) — artigo 23° da base instrutória, dado como assente.

- Em 12 de Fevereiro de 2004 foi realizada a transferência, em bloco, de €311.040 da “H and Co Trust Company” ou da “S-X” para a conta de G C (fls. 123 do apenso) — onde veio a dar entrada no dia seguinte a quantia de £2l5.000 após serem descontadas as despesas de transferência, no dia seguinte (artigo 25° da base instrutória, dado como assente).

- Em 19 de Fevereiro de 2004 a sociedade “W (UK), Ltd.”, representada por P S, transferiu o montante de £9.000 (€13.068) para a conta da 1ª ré e, em 12 de Março de 2004, o montante de £36.000 (€53.820) para a conta do BNC com o IBAN PT0000 (resposta ao artigo 20° da base instrutória).

- Em escritura pública de compra e venda outorgada em 9 de Julho de 2004, no Cartório Notarial de … (fls. 127 a 132 do apenso) M R declarou: “que pela presente escritura e pelo preço de oitocentos mil euros, que declara já ter recebido, vende à representada dos segundos outorgantes, livre de quaisquer ónus ou encargos, o seguinte imóvel: prédio misto sito em Vale X, freguesia e concelho de …, a parte rústica composta por terra de semear com árvores e a parte urbana composta de um prédio térreo, destinada a habitação, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número mil quatrocentos e noventa e cinco, daquela freguesia (...), prédio este por si adquirido hoje, nove de Julho de dois mil e quatro, conforme escritura lavrada neste Cartório Notarial de … folhas noventa e oito do presente livro de notas” tendo V A M e G C (“que outorgam na qualidade de sócios gerentes da sociedade comercial por quotas com a firma “Empreitadas, Lda.”) declarado “que para a sua representada aceitam o presente contrato de compra e venda, nos precisos termos exarados” (alínea J) dos factos assentes).

- Em 23 de Fevereiro de 2004 foi feito, pela sociedade Ré, um primeiro pagamento (cem mil euros — fls. 124 do apenso) para a compra do terreno onde está implantado o complexo turístico detido actualmente por esta — onde se encontra a ser construído o empreendimento “Gardens” (alínea I) dos factos assentes).

- Na compra do prédio sito em Vale X(J) a 1ª ré utilizou os montantes depositados pelos autores (fls. 124 do apenso) — artigo 27° da base instrutória, dado como assente.

- O montante total de €559.652,08 foi transferido da conta de G C para a conta da requerida em 19 de Fevereiro de 2004 (fls. 121 e 124 do apenso) — alínea H) dos factos assentes.

- A requerida era, desde 19 de Fevereiro de 2004 (data da sua matrícula) detida em 50% (quota de €2.500) por G C, também um dos seus dois gerentes (com V A M), até 25 de Fevereiro de 2005 (certidão de fls. 18 do apenso) — alínea G) dos factos assentes.

- Em 7 de Fevereiro de 2005 G C cedeu a “I, Lda.” a (sua) quota de €2.500 que detinha na ora requerida (alínea K) dos factos assentes).

- Em 25 de Fevereiro de 2005 “I,da” cedeu a D T P a (sua) quota de €2.500 na requerida — cessando G C funções como gerente nessa data “por exoneração” e sendo nomeado gerente, nessa data, D T P (alínea L) dos factos assentes).

- Em 13 de Abril de 2005 V A M cedeu a D T P a (sua) quota de €2.500 da requerida, cessando funções como gerente “por renúncia” (alínea M) dos factos assentes).

- Em 13 de Abril de 2005 o (desde então) único sócio da requerida D T P cedeu a (sua) única quota de €100.000 a “Gestão de Projectos Imobiliários, Lda.” — constituída em 12 de Janeiro de 2005 com duas quotas (iguais) de €50.000 pertencentes ao ora requerido M J H e a D T P, ambos gerentes (até 22/02/2006) — alínea N) dos factos assentes.

- Em 21 de Novembro de 2005 o Réu M J H foi nomeado gerente da requerida (fls. 19 do apenso) — alínea O) dos factos assentes e despacho de fls. 472.

- Em 23 de Janeiro de 2006 a Ré enviou à Advogada dos ora Autores a carta junta a fls.134-135 do apenso — cujo (restante) teor se dá aqui por reproduzido — e onde se declara que “(...) quanto ao dinheiro entregue pelo referido G. C e depositado em contas da referida sociedade, e porque o mesmo continua a dizer que só ele pode responder pelo dinheiro que lhe foi entregue pelos seus clientes, a sociedade tomou a seguinte posição: a) dado que a nível contabilístico não encontramos documento de suporte que comprove que os seus clientes depositaram dinheiro na sociedade, notificar judicialmente o G. C (...) no sentido de este assinar uma declaração da qual confirma que os fundos depositados por este na Empreitadas, Lda provinha dos seus clientes; b) na posse dessa declaração de imediato a Empreitadas, Lda assumirá que os s/clientes são credores de €565.882,84; c) relativamente aos valores mencionados, com certeza que acharemos forma de nos devolver ou serão aplicados, como era inicialmente previsto, em património (...)” (alínea R) dos factos assentes).

- A 1ª Ré, através de notificação judicial avulsa efectuada ao dito G C (fls. 140 a 142 do apenso), solicitou que este esclarecesse onde e a quem haviam sido entregues os montantes que os ora Autores reclamam (alínea Q) dos factos assentes).

- Na resposta à notificação judicial avulsa (Q) e fls. 147-148 do apenso, G C explicou como os fundos dos autores foram depositados nas várias contas bancárias e a forma, data e montantes das diversas transferências feitas para a conta da 1a ré — assim como declarou que havia sido fiel depositário até à transferência para a conta da 1a ré dos montantes entregues pelos ora autores (artigo 29° da base instrutória, dado como assente).

- Os ora Autores lograram ser reembolsados pela 1ª ré da quantia de € 436.000 (fls. 133 do apenso); contudo, até à presente data (21/07/2006), nada mais foi devolvido pela 1ª ré ou 2° réu aos ora autores, apesar das diversas diligências destes nesse sentido (alínea P) dos factos assentes).

- Os autores tiveram despesas com advogados, viagens a Portugal, alojamento e comunicações (resposta ao artigo 30° da base instrutória).

1. Questão prévia da repetição das alegações e conclusões recursivas.

Os Autores/Recorrentes, no seu acervo conclusivo, repetem ipsis verbis os argumentos anteriormente expendidos em sede de recurso de Apelação.

O que se tem questionado em alguns arestos deste Supremo Tribunal é se tal repetição poderá obstar ao conhecimento do recurso, ou antes conduzirá a uma apreciação mais sucinta do objecto do recurso e/ou a uma remissão para a decisão de que se recorre, sendo que já tomamos posição acerca deste particular no Ac deste Tribunal de 26 de Janeiro de 2012, in www.dgsi.pt.

Assim.

Como deflui do normativo inserto no artigo 721º, nº2 do CPCivil na redacção dada pelo DL 329-A/95, de 12 de Dezembro aplicável in casu, que «O fundamento específico do recurso de revista é a violação da lei substantiva, que pode consistir tanto no erro de interpretação ou de aplicação, como no erro de determinação da norma aplicável;(…)» aplicando-se a esta espécie de recurso no que tange à sua interposição as mesmas regras da Apelação, cfr artigo 724º, nº1, do mesmo diploma, de onde, em termos formais, ser aplicável à Revista, além do mais, o preceituado no artigo 690º, nº1 e 2 do CPCivil, impendendo sobre o Recorrente o ónus de alegar e formular conclusões, sendo que estas terão de versar, obrigatoriamente, sobre as razões da discordância do Recorrente em relação à Lei substantiva aplicada no Acórdão recorrido, porque este recurso de Revista abrange, unicamente, a violação desta, sendo a função do STJ neste conspectu corrigir os eventuais erros de interpretação e de aplicação das normas jurídicas cometidos pelo Tribunal da Relação, cfr José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, volume VI, 1953, pag 2.

In casu, a Recorrente, sem embargo de se repetir na tese que defende, aponta especificamente as razões da sua dissidência com o Acórdão da Relação de que recorre, ao qual imputa as mesmas violações de Lei que já havia imputado antes à sentença de primeira instância.

 

Quer dizer, se ao Acórdão recorrido não aventou mais razões do que aquelas que haviam sido convocadas pela sentença recorrida, que outros fundamentos coadjuvantes poderiam então ser agora alegados pela Recorrente de Revista?

Impor-se-á, nesta situação, em que a decisão proferida nada adianta em relação à primeira e a discordância da parte se mantém porque continua a entender que não foram bem interpretadas e até violadas as regras substantivas, que se venha com mais argumentação ou, quiçá, com argumentação diferente, quando as razões do dissídio são as mesmas?

Não decorre da Lei, maxime, das regras atinentes aos ónus de alegar e formular conclusões, que numa situação deste jaez impenda sobre a parte um tal ónus adicional e muito menos se depreende de tais normativos, que a falta de cumprimento do mesmo possa dar origem à deserção do recurso, sendo que esta implica a falta de apresentação de alegações que se não verifica neste caso e nem sequer se poderá sequer dizer que se trata de uma situação análoga, porque falta de alegações configura a ausência de tal peça processual, cfr nº2 do artigo 291º e 690º, nº3 do CPCivil.  

E, também não podemos concluir que nesta situação de repetição de alegações, tendo sido observados todos os ínsitos legais quanto à sua forma e substância, afinal das contas, o que se está novamente a impugnar é a sentença de primeira instância e não o Acórdão que a confirmou, porque o Tribunal da Relação pode confirmar, com os mesmos fundamentos, ou com fundamentação idêntica o que decidido foi naquela e, não se podendo aqui falar da prolação de um Acórdão por remissão, igualmente não poderemos concluir que o que a parte quer, nesta segunda impugnação em que se repete porque eventualmente nada mais há a dizer, é atacar aqueloutra decisão.

Por outra banda, a possibilidade do uso da faculdade remissiva aludida no artigo 713º, nº5 ex vi do disposto no artigo 726º, este como aquele do CPCivil, aplica-se a todas as situações em que o Tribunal superior vem confirmar a decisão recorrida (sem qualquer voto vencido) quer quanto aos fundamentos, quer quanto à decisão, remetendo para os respectivos fundamentos, nos casos em que perfilha inteiramente o entendimento aí plasmado, quer tenha ou não havido repetição do corpo das alegações e do seu acervo conclusivo, sendo que esta faculdade legal veio a ser consagrada na reforma de 1995-1996 por razões de celeridade processual, cfr Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, Código de Processo Civil Anotado, volume 3º, 2003, 102.

Queremos nós dizer, não é por ter havido repetição do teor daquela peça recursiva, mas antes por o Tribunal superior entender que face à fundamentação do julgado posto em crise, nada mais há a acrescentar, podendo nesta situação remeter integralmente para a mesma.

Aliás, é aqui neste ponto concreto da substância da decisão recorrida e da sua auto-suficiência, no sentido de ter abarcado todas as questões controvertidas suscitadas e carecidas de resolução, que reside o quid não só desta problemática específica, mas de toda a problemática da amplitude legal do conhecimento do objecto do recurso, uma vez que, quer haja ou não repetição de alegações, o Tribunal de recurso pode usar daquela faculdade remissiva em Acórdão proferido por unanimidade ou, sendo a questão decidenda simples ou o recurso manifestamente infundado proferir decisão sumária, nos termos do artigo 705º, aplicado ex vi do artigo 726º do CPCivil.

A opção decisória terá de passar pela análise das questões suscitadas em sede de recurso, haja ou não repetição das alegações e respectivo acervo conclusivo, face à fundamentação da decisão recorrida, podendo naqueles casos em que a mesma seja «soit disant» auto-suficiente e/ou a problemática decisória de manifesta simplicidade ou o recurso infundado.

Em todos os demais casos que se não enquadrem nos parâmetros supra apontados, o Tribunal de recurso, vg este Supremo Tribunal, está legalmente obrigado a conhecer do objecto do recurso mesmo que no mesmo se repita toda a argumentação aduzida em segunda instância no que tange à aplicação do direito, com ressalva para o preceituado no nº2 do artigo 722º por força do preceituado no artigo 729º, nº1 e 2, este como aquele do CPCivil.

Dilucidada esta questão e porque no caso que nos ocupa embora não ocorra qualquer impugnação específica adicional das razões aventadas no Acórdão impugnado, tendo em atenção as questões afloradas no mesmo e a forma como foram tratadas, admitimos que os Recorrentes continuem a discordar das razões de direito que levaram à absolvição dos Réus do pedido formulado tanto mais que até juntaram um parecer jurídico a apoiar a sua tese, não se lhe impondo uma qualquer outra alegação suplementar.

2. Dos contratos havidos entre os Autores e a Ré Empreitadas, Lda.

2.1. Do contrato de mútuo e do contrato de associação em participação.

Os Autores/ na sua Petição Inicial, formulam dois pedidos, um a titulo principal, consistente na nulidade dos mútuos celebrados com a Ré Empreitadas, Lda e outro a titulo subsidiário, prevendo o caso de o primeiro não proceder, qual é o da restituição das quantias que foram entregues àquela mesma Ré e a titulo de enriquecimento sem causa.

As instâncias entenderam inexistir qualquer contrato entre os Autores e a aludida Ré, maxime, os contratos de mútuo cuja nulidade foi peticionada.

Todavia, em sede de alegações do recurso de Apelação, os Autores alteram a sua qualificação jurídica primitiva dos contratos, já não se prevalecendo da nulidade dos mútuos, que deixaram «cair», passando a dizerem-se credores da Ré das quantias pedidas, além do mais, a titulo de um contrato de associação em participação celebrado nos termos do DL 231/81, de 28 de Julho, ao abrigo do qual aquela Ré se obrigou a restituir-lhes a quantia de € 565.882,84, subordinando esta obrigação a uma condição suspensiva, que, entretanto, se verificou, alterando desta forma o pedido principal que haviam formulado.

Vejamos.

 

Da matéria dada como assente, resulta que a Ré Empreitadas, Lda é a dona do empreendimento imobiliário onde se encontra a ser construído o empreendimento «Gardens», alíneas I) e J) da matéria assente.

Igualmente se encontra provado que apenas dez dos Autores  - P S, S B, R P, V R, S R, P R, D M, P S, T M e S W - celebraram com uma sociedade de nome “W”, os acordos aludidos nas alíneas S) a AB), através dos quais adiantaram determinadas quantias em dinheiro àquela sociedade, como investimento e com o objectivo de virem a adquirir uma villa num empreendimento imobiliário que nem sequer se encontra devidamente descrito e individualizado no contrato, pois no ponto 1. do mesmo lê-se «A companhia encontra-se em vias de adquirir terreno no estrangeiro com o propósito de aí construir vivendas segundo especificações em anexo.», nos pontos 1.2 a 1.5 os Autores obrigaram-se para com aquela sociedade a «1.2- Comprar um lote de terreno, doravante referido como “o Lote”, com o objectivo de aí construir uma vivenda referida no calendário em anexo (doravante referida como “a propriedade”) e me garantir a elaboração dos planos preliminares e de pormenor, a obtenção das licenças de construção, e ainda o cumprimento das normas de construção a fim de se executar a construção do edifício em causa. 1.3- Pendente da disponibilização à Companhia dos pagamentos faseados acima mencionados, a mesma concorda em construir a propriedade no Lote dentro dos mais elevados padrões de qualidade e de acordo com as especificações estabelecidas no contrato. (...)1.5- Quando executada a compra do Lote no qual a vivenda será construída, fazer o depósito na “H & Co Trust Ltd” a quantia de noventa mil libras, da seguinte forma(…)».

No que concerne aos demais Autores, aqui Recorrentes, apenas resulta que os mesmos foram aliciados pelo tal G C (aliás como aconteceu com todos, só que aqueles supra mencionados é que subscreveram o mencionado acordo) que detinha essa sociedade “W” para que disponibilizassem determinados montantes que se destinariam à compra de um imóvel, ficando cada um deles como contrapartida com uma moradia que seria construída no aludido imóvel, cfr alíneas A), B), C), D) e E), da matéria assente.

Mais se apurou que G C solicitava a transferência de fundos e prometia aos Autores a obtenção de um rendimento de 20% ao ano e se comprometeu a transferir as quantias a satisfazer pelos Autores e depositadas na sua conta para uma sociedade a constituir (a ora Ré), logo que esta estivesse matriculada, respostas aos pontos 1., 4. e 5. da base instrutória.

Desta factualidade, podemos concluir o seguinte:

i) Não estamos perante a celebração de qualquer contrato de mútuo entre os Autores/Recorrentes e a Ré Empreitadas, Lda, posto que este negócio jurídico pressupõe, de harmonia com o disposto no artigo1142º do CCivil, que uma das partes empreste à outra dinheiro ficando a segunda obrigada a restitui-lo.

Sem nos preocuparmos, sequer, com as questões relativas à forma do contrato de mútuo, que sempre se imporiam atentos os montantes em causa, tendo em atenção o disposto no artigo 1143º do CCivil, é óbvio que face à factualidade supra descrita não podemos subsumir a actuação dos Autores e da Ré neste tipo contratual, por não se verificarem os respectivos requisitos: não houve qualquer empréstimo de dinheiro pelos Autores à Ré/Recorrida decorrente dos acordos subscritos e verbais sendo certo que esta nem neles interveio, os quais foram havidos com G C.

ii) Do mesmo passo, não se poderá falar em contrato de associação em participação, figura esta que nos é definida pelo artigo 21º, nº1 do DL 231/81, de 28 de Julho, a qual pressupõe a associação de uma pessoa a uma actividade económica exercida por outra, ficando a primeira a participar nos lucros e perdas que do exercício da actividade vierem a resultar para a segunda, sendo elemento essencial deste tipo de contrato a participação nos lucros, como decorre expressamente do seu nº2.

Aqui chegados, deparamo-nos com algumas perplexidades, pois por uma lado, a ausência da Ré Empreitadas, Lda nestes acordos é patente e por outro lado não se vislumbra dos mesmos que os Autores/Recorrentes quisessem «associar-se» a uma qualquer actividade de construção das ditas villas por banda da sociedade “W”, e que o dinheiro adiantado se destinasse a tal actividade de cariz económico, mas antes que ao procederem desse modo pretendiam apenas adquirir uma das tais villas que viessem a ser construídas naquele tal imóvel que a referida sociedade iria adquirir no estrangeiro, sendo certo que os Autores/Recorrentes subscritores dos acordos neles intervieram, expressis verbis, na qualidade de «compradores».

 

Não há qualquer elemento fáctico, no bom rigor dos princípios, que nos possa conduzir a tal subsunção jurídica, acrescendo ainda que a promessa feita por G C aos Autores que iriam obter de um rendimento de 20% ao ano com o investimento feito, sempre faria afastar por completo, se outras dúvidas não se pusessem, qualquer pretensão de enquadrar o negócio num tal tipo contratual.

É que, ao contrário do que se sustenta no parecer apresentado, sempre s.d.r.o.c., não se trata de uma estipulação sobre a forma de participação dos lucros prevenida pelo artigo 25º, do DL 231/81, de 28 de Julho, porque de lucros se não pode falar, mas antes de uma garantia do retorno do investimento feito, com vista, repete-se, à aquisição de uma villa no empreendimento a construir por aquela sociedade, o qual tem de ser concatenado com o teor do acordo havido: havia um adiantamento de dinheiros com vista à aquisição de uma moradia (villa), e no ínterim os futuros compradores, agora apenas investidores, receberiam um rendimento anual sobre os dinheiros adiantados, cfr Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, Reprint, 1994, 218 a propósito do contrato de conta ou associação em em participação «(…)Ao capitalista oferece este contrato, em vez da certeza do juro, a perspectiva mais aliciante de um lucro porventura bem maior do que o máximo legal da taxa de juro, embora com a contrapartida da assunção de uma parte do risco do negócio (…)», ver também a propósito deste tema os Ac STJ de 11 de Junho de 1991 (Relator Menéres Pimentel) e de 15 de Maio de 2003 (Relator Araújo de Barros), in www.dgsi.pt.

Não nos podemos esquecer que a associação em participação é um «contrato associativo» no qual o associado ou participe irá beneficiar dos lucros (e perdas) da actividade desenvolvida pelo associante ou titular, contribuindo para isso com um determinado apport, onde a existência de um juro remuneratório como contrapartida do investimento feito é elemento estranho à estrutura contratual que o não comporta, cfr Galvão Telles, Conta Em Participação, in O Direito, 89º/5 «(…) O associado apenas adquire o direito de receber do outro contraente a parte dos lucros que lhe competir, além porventura da faculdade de controle da gestão da empresa ou do negócio (faculdade esta que aliás é duvidosa, ou cujos termos são duvidosos, em caso de silêncio do contrato) (…)».

Assim sendo, e porque não se está perante qualquer contrato, quer de mútuo, quer de associação em participação, não se poderá proceder à restituição de quantias que tenham sido entregues a tal título, porque título não existe entre Autores e Ré Empreitadas, Lda.

Soçobram as conclusões quanto a esta problemática.

2.2. Da intervenção de G C em nome da Ré e da vinculação desta com os Autores.

Insurgem-se os Autores/Recorrentes contra o Acórdão recorrido, uma vez que na sua tese a Ré Empreitadas, Lda assumiu a dívida contraída por G C, nos termos do art. 595° nº1 do CCivil e tratando-se de negócio consensual, a sua celebração não está sujeita a forma especial, pelo que a vontade de assumir as correspondentes obrigações se manifestaria nas condutas daquela, que significam a vontade de cumprir esse negócio, nos termos do art. 217°, n°1 do CCivil.

A transmissão singular de divida corresponde ao instituto da assunção de divida, prevenido pelo normativo inserto no artigo 595º do CCivil, que consiste no acto de um terceiro – o assuntor – que se vai vincular perante o credor a efectuar a prestação devida por outrem, sendo que a transmissão só exonera o antigo devedor desde que haja declaração expressa do credor, cfr Almeida Costa, Direito das Obrigações, 6ª edição, 714 e Ac STJ de 11 de Janeiro de 2011 (Relator Moreira Alves) in www.dgsi.pt.

Da matéria dada como provada não resulta minimamente que haja por banda da Ré Empreitadas, Lda qualquer responsabilidade pelos negócios celebrados por G C.

Por um lado, porque não decorre dos autos que G C tenha agido em seu nome, enquanto sociedade a constituir, uma vez que como vimos supra, as relações negociais foram tidas entre aquele, em nome próprio ou na qualidade de representante da sociedade “W”, com os Autores/Recorrentes, sendo que a Ré, como vimos, não teve qualquer intervenção nos acordos havidos, nem sequer se mostra mencionada nos mesmos, de onde não se poder concluir pela assunção por esta de qualquer obrigação para com aqueles, v.g., através do instituto da transmissão de dividas.

A circunstância de se ter provado que «Numa primeira fase, tais quantias seriam transferidas para a conta de G C — que se comprometia a transferir as mesmas para uma sociedade que estava em processo de constituição (ora 1ª ré) e da qual seria sócio gerente, logo que a mesma estivesse matriculada (resposta ao artigo 4° da base instrutória).» e que «G C ficava como “fiel depositário” das quantias que fossem depositadas pelos autores até à data da constituição da sociedade e, assim, que a sociedade fosse constituída, G C transferiria as quantias em causa para a mesma (resposta ao artigo 5° da base instrutória).», não significa sem mais, que aquele G C tenha agido, de facto e de direito, em nome da Ré, por forma a convocar o preceituado no artigo 36º, nº2 do CSComerciais, já que este normativo pressupõe além do mais que tenha sido acordada, mesmo de modo insipiente, a constituição de uma sociedade comercial – facto este desconhecido – e que antes da sua celebração o(s) sócio(s) iniciem a sua actividade, facto este que não se mostra apurado, pois a actividade demonstradamente praticada pelo futuro/presumível sócio da Ré Empreitadas, Lda,  G C, foi aqueloutra de angariação dos investimentos por banda Autores com vista à aquisição de moradias, mas por si ou em representação da sociedade “W”, cfr acerca do acordo de constituição de sociedade Menezes Cordeiro, Manual de Direito Das Sociedades, I, Das Sociedades em Geral, 2ª edição, 484.

A Ré/Recorrida Empreitadas, Lda não pode, por um lado, ser responsabilizada por quaisquer contratos celebrados por aquele em nome próprio ou da aludida sociedade “W”, sendo por isso terceira em relação ao mesmos, e por outro lado, também não lhe poderão ser exigidas quaisquer quantias a titulo de assunção de divida.

 

Improcedem, igualmente, por aqui, as conclusões de recurso.

 

2.3.Do reconhecimento de divida.

Sustentam ainda os Autores que ainda que não procedessem as conclusões anteriores, a Ré emitiu uma declaração unilateral com o valor de reconhecimento de dívida, nos termos do art. 458° do Código Civil, sendo que esse reconhecimento dispensa os Autores de provar a relação fundamental, o qual foi subordinado a uma condição suspensiva, que já se verificou.

Vejamos.

O reconhecimento de divida (ou promessa de cumprimento) vem consagrado no artigo 458º, nº1 do CCivil, onde se lê «Se alguém, por simples declaração unilateral, prometer uma prestação ou reconhecer uma dívida, sem qualquer indicação da respectiva causa, fica o credor dispensado de provar a relação fundamental, cuja existência se presume até prova em contrário.».

Os Autores/Recorrentes fazem decorrer o pretendido reconhecimento da carta datada de 23 de Janeiro de 2003 enviada pela Recorrida Empreitadas, Lda à Advogada dos Autores/Apelantes que em extracto foi dada como provada na alínea R) da matéria assente e onde se lê “(...) quanto ao dinheiro entregue pelo referido G. C e depositado em contas da referida sociedade, e porque o mesmo continua a dizer que só ele pode responder pelo dinheiro que lhe foi entregue pelos seus clientes, a sociedade tomou a seguinte posição: a) dado que a nível contabilístico não encontramos documento de suporte que comprove que os seus clientes depositaram dinheiro na sociedade, notificar judicialmente o G. C (...) no sentido de este assinar uma declaração da qual confirma que os fundos depositados por este na Empreitadas, Lda provinha dos seus clientes; b) na posse dessa declaração de imediato a Ferreiras 500 assumirá que os s/clientes são credores de €565.882,84; c) relativamente aos valores mencionados, com certeza que acharemos forma de nos devolver ou serão aplicados, como era inicialmente previsto, em património (...)”, uma vez que a condição ali posta pela Ré – exigência de uma declaração escrita por parte de G C a confirmar que os fundos depositados por este na Empreitadas, Lda provinha dos seus clientes, na sua tese, se mostra plenamente preenchida com o que resulta da factualidade constante da resposta ao ponto 29. da base instrutória.

Ora, daquela resposta apenas se pode retirar que G C, na sequência da notificação judicial avulsa que lhe foi efectuada pela Recorrida, aludida na alínea Q) dos factos assentes, veio explicar como os fundos dos Autores foram depositados nas várias contas bancárias e a forma, data e montantes das diversas transferências feitas para a conta da primeira Ré - assim como declarou que havia sido fiel depositário até à transferência para a conta desta dos montantes entregues pelos ora Autores.

Prima facie, não podemos de todo em todo inferir desta resposta, que aquele G C tenha assinado qualquer declaração a confirmar que os fundos depositados na Recorrente provinham dos Autores, sendo tal declaração a conditio para o reconhecimento da divida de € 565.882,84.

Secundum, mesmo que por mera hipótese de raciocínio se entendesse que a sobredita explicação consubstanciava uma declaração, sempre teríamos de efectuar a necessária interpretação da mesma em conjugação com aqueloutra da Ré, plasmada na carta enviada à mandatária dos Autores, com recurso aos normativos insertos nos artigo 236º a 238º do CCivil, nomeadamente a que decorre do nº1 deste último normativo que impõe que a declaração não pode valer «(…)com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do documento, ainda que imperfeitamente expresso.», uma vez que o nº2 do artigo 458º do CCivil impõe que o reconhecimento de dívida conste de documento escrito, caso outras formalidades não sejam impostas para a prova da relação fundamental que no caso sujeito não ocorrem.

E, do aludido escrito conjugado com a «explicação» fornecida pelo visado não resulta que a Ré tenha reconhecido ser devedora para com os Autores da quantia de € 565.882,84, resultando apenas que G C depositou em várias contas bancárias, inclusive da Ré, montantes que lhe foram entregues pelos Autores, desconhecendo-se contudo os respectivos valores.

Aliás, quanto a este particular, cumpre realçar que a Ré reembolsou os ora Autores na quantia de € 436.000,00 como deflui da matéria dada como provada na alínea P) dos factos assentes, quantia essa em montante muito superior àquela que se provou ter sido depositada directamente na sua conta bancária por alguns daqueles - P S, S B, V R, R G, RF e M O’  -, como deflui das respostas aos pontos 6, 8, 10, 13, 18 e 21 da base instrutória, sendo este montante apurado de € 65.340,00.

 

De qualquer forma, reafirma-se que se não vislumbra qualquer vínculo negocial directo entre a Ré Empreitadas, Lda e os Autores, tendo os acordos sido celebrados entre estes e G C por si e na qualidade de representante da sociedade “W”, de modo a que nenhuma quantia ser devida por esta no âmbito destes autos.

3.Do enriquecimento sem causa.

Alegam ainda os Autores na sua tese que no caso de não proceder nenhuma das anteriores conclusões, ter-se-ia verificado nos termos do artigo 473° do CCivil um enriquecimento do património da Ré à custa do património dos Autores no montante de € 565.882,84, sendo a mesma devedora daqueles por essa mesma quantia de € 565.882,84, acrescida de juros.

Os requisitos gerais do enriquecimento sem causa, são os que resultam do normativo inserto no artigo 473º, nº1 do CCivil, cuja verificação é cumulativa: i) que tenha havido um enriquecimento da Ré; ii) que tal enriquecimento tenha sido obtido sem qualquer causa justificativa; que esse enriquecimento tenha sido obtido à custa dos Autores; iii) que a lei não faculte aos empobrecidos um outro meio de serem ressarcidos.

Acrescenta o nº2 de tal normativo que «A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou.», tratando-se, aqui neste segmento normativo, das hipóteses especiais de enriquecimento injustificado, cfr Almeida Costa, Direito das Obrigações, 6ª edição, 423.

Arrimam-se os Apelantes na tese do enriquecimento sem causa, na modalidade condictio ob rem, defendida no parecer jurídico junto com as alegações de recurso, o qual exige para a sua verificação os seguintes requisitos: i) a realização de uma prestação visando um determinado resultado; ii) correspondendo esse resultado ao conteúdo de um negócio jurídico; iii) sendo que esse resultado não se vem posteriormente a realizar.

Todo o raciocínio expendido no parecer apresentado parte do pressuposto, que não se mostra verificado, de que a prestação realizada pelos Autores se destinava à Ré e visava um resultado acordado com esta, isto é a aquisição de um terreno onde iria ser construído o empreendimento cujas villas os Autores/Recorrentes iriam comprar, resultado este que todavia não se veio a verificar.

Mas, sem razão: é que não resulta dos autos que os Autores/recorrentes tivessem por qualquer meio negociado o que quer que fosse com a Recorrida.

«(…) A conditio ob rem visa a restituição de prestações por não se ter realizado o resultado visado com essas prestações, em virtude de uma definição do fim visado pelas partes.(…) O que está em causa é antes o acordo das partes sobre o fim da prestação, através do qual a prestação é colocada ao serviço de uma específica relação causal, cuja execução visa assegurar. O conceito de “negócio jurídico”, para efeitos desta disposição exigirá apenas um acordo de vontades sobre o fim da prestação. Não basta, por isso, uma condição puramente unilateral, ainda que a outra parte pudesse conhecê-la, devendo a expectativa de obter o resultado integrar o conteúdo do negócio jurídico, o qual pode ser inclusivamente tácito, bastando que o receptor da prestação conheça a definição do fim efectuada pelo prestante e dê a entender, pela sua aceitação, que aprova essa definição. Não basta, por isso, que o receptor não rejeite essa destinação do fim, tendo este que sujeitar-se à vontade do prestante aquando da recepção da prestação (…)», apud Menezes Leitão (Ilustre Autor do parecer jurídico junto pelos Recorrentes), O Enriquecimento Sem causa No Direito Civil, 525.

Seguindo a apontada tese, não se vislumbra onde se encontra, na matéria dada como provada, mesmo de forma indiciária expressa ou tácita, qualquer acordo entre os Autores, aqui Recorrentes e a Ré/Recorrida, sobre a efectivação de uma prestação por aqueles a esta com vista à obtenção de um qualquer resultado, por forma a poder-se concluir, como concluem aqueles, pela obrigação de restituir por banda da Ré Empreitadas, Lda, cfr a propósito desta problemática específica o Ac STJ de 28 de Junho de 2011 (Relator Hélder Roque), in www.dgsi.pt.

O ónus de alegação e prova destes requisitos impendia sobre os Autores que o não lograram cumprir, nos termos do artigo 342º, nº1 do CCivil, cfr Ac STJ de 16 de Setembro de 2009 (Relator Serra Baptista), in www.dgsi.pt.

As conclusões estão assim, in totum, condenadas ao insucesso.

III Destarte, nega-se a Revista, mantendo-se a decisão plasmada no Acórdão sob censura.

Custas pelos Autores/Recorrentes.

Lisboa, 1 de Março de 2012

(Ana Paula Boularot)

(Pires da Rosa)

(Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, vencida nos termos do voto que junto)

Voto de vencida
Vencida. Teria concedido provimento ao recurso, em curta síntese, pelas seguintes razões:
- Resulta dos factos provados, a meu ver, que os autores celebraram com G C um contrato atípico e que G C actuou no contexto de uma sociedade a constituir, da qual seria sócio gerente, ficando depositário das quantias investidas até as transferir para a referida sociedade; e que essa sociedade veio a constituir-se, sendo a ré Empreitadas, Lda., ;
- Que tal contrato cessou;
- Que a sociedade tem em seu poder a quantia de € 565.882,84, depositada por
- G C (por confissão), e que essa quantia proveio dos autores (resposta de G C à notificação judicial avulsa)
Assim, aplicaria o regime de responsabilidade por dívidas constante dos artigos 36°, n° 2 do Código das Sociedades Comerciais e 997° do Código Civil, condenando a ré com fundamento em enriquecimento sem causa (nº 2 do artigo 473° do Código Civil - deixou de existir a causa do recebimento da quantia entregue pelos autores).
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza