Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1572/21.1T8CVL-C.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: NUNO PINTO OLIVEIRA
Descritores: PESSOA COLETIVA
CUSTAS
ISENÇÃO DE CUSTAS
Data do Acordão: 05/25/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: RECLAMAÇÃO INDEFERIDA
Sumário :
Estão isentas de custas as pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos, quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável.
Decisão Texto Integral:

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA




I. — RELATÓRIO


1. A Associação Sobral de S. Miguel Patrimónios de Xisto, ADL (Sobral Paxis, ADL) intentou contra a Freguesia de Sobral de S. Miguel e A..., S.A., a presente acção, pedindo:

I. — que seja declarado que a Ré Junta de Freguesia não é proprietária do imóvel que identifica;

II. — que seja declarada nula a escritura notarial lavrada a 24.03.2021 no Cartório Notarial ..., exarada a fls. 123 a 1254 verso do Livro 130 e referente à aquisição por usucapião do prédio rústico identificado;

III. — que sejam declaradas nulas e sem qualquer valor todas e quaisquer descrições e inscrições prediais efetuadas com base na referida escritura, designadamente as existentes a favor da Ré na Conservatória do Registo Predial ..., Ap. 2402, de 2021/06/11;

IV — que seja declarado nulo o contrato de arrendamento celebrado entre a Ré Junta de Freguesia e a Ré “A...”;

V. — que sejam as Rés condenadas a repor o campo de futebol nas mesmas condições em que se encontrava antes da edificação da antena da “A...”, procedendo-se à remoção desta do campo de jogos e à reposição do terreno do campo de jogos na situação em que se encontrava antes.


2. A Ré Freguesia de Sobral de S. Miguel contestou e deduziu reconvenção, pedindo:

I. — que seja declarado que a Freguesia de Sobral de S. Miguel é dona e legítima possuidora do prédio urbano, com a área de 8377m2, composto por terreno destinado a campo de futebol, que confronta a norte com caminho público, a sul com AA, a nascente com BB e a poente com caminho e CC, sito na Rua ..., na freguesia de Sobral de São Miguel, concelho ..., descrito a seu favor na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º 2336/52540611 e inscrito na sua titularidade na matriz predial urbana da freguesia de Sobral de São Miguel sob o artigo 854;

II. — que a Autora seja condenada a reconhecer que a Freguesia de Sobral de S. Miguel é dona e legítima possuidora de tal prédio.


3. O Tribunal Judicial da Comarca ... absolveu as Rés da instância, julgando procedentes a excepção dilatória nominada de ilegitimidade e a excepção dilatória inominada de falta de requisitos para o exercício do direito de acção popular.


4. Inconformada, a Autora Associação Sobral de S. Miguel Patrimónios de Xisto, ADL (Sobral Paxis, ADL) interpôs recurso per saltum.


5. O Supremo Tribunal de Justiça julgou improcedente o recurso, confirmando a sentença recorrida.


6. O dispositivo do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça é do seguinte teor:

Face ao exposto, nega-se provimento ao recurso e confirma-se a sentença recorrida.

Sem custas — art. 4.º, n.º 1, alínea f), do Regulamento das Custas Processuais.


7. A Freguesia de Sobral de S. Miguel vem agora requerer a reforma do acórdão quanto a custas.


8. Fundamenta o seu requerimento nos seguintes termos:

1.º Do Acórdão que culminou o processo referenciado em epígrafe, resultou, entre outros, o seguinte segmento decisório: “Sem custas – art. 4.º, n.º 1, alínea f), do Regulamento das Custas Processuais”.

Porém,

2.º  Não pode a Recorrida concordar com o teor do Acórdão quanto à isenção das referidas custas à Recorrente.

Vejamos:

3.º O objeto do recurso visava as seguintes questões decidendas:

“I. – se a Autora Associação Sobral de S. Miguel Patrimónios de Xisto, ADL (Sobral Paxis, ADL) tem legitimidade processual ativa para a propositura da presente ação;

caso afirmativo,

II. – se estão preenchidos os requisitos para o exercício do direito de ação popular”.

4. Sendo certo que, o conhecimento da primeira prejudicava o conhecimento da segunda questão.

Ora,

5.º Decidiu o douto Supremo Tribunal de Justiça negar provimento ao recurso interposto pela Recorrente, porque, em suma, “A Autora, agora Recorrente, não tem legitimidade para propor uma ação popular, por não estar em causa a defesa de nenhum dos interesses difusos designados no art. 52.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa e no art. 1.º, n.º 2, da Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto, e não tem legitimidade para propor uma ação de defesa do baldio, por estar em causa a defesa de direitos e interesses da comunidade local relativos aos correspondentes imóveis comunitários, reservada aos órgãos do baldio”.

6.º Nos termos do disposto no número 1 do artigo 1.º do Regulamento das Custas Processuais – Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro -, todos os processos estão sujeitos a custas nos termos daquele regulamento, a menos, claro está, que se verifique alguma isenção das previstas no artigo 4.º do mencionado compêndio normativo.

7.º Da alínea f) do número 1 do artigo 4.º do Regulamento das Custas Processuais, resulta a isenção de custas para “As pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos, quando atuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respetivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável”.

Assim,

8.º Pese embora a Recorrente seja uma pessoa coletiva privada sem fins lucrativos, ficou demonstrado que a mesma não tinha legitimidade processual ativa, nem para propor uma ação de defesa de direitos e interesses da comunidade local relativos aos correspondentes imóveis comunitários – baldios -, nem para instaurar uma ação de declaração de nulidade, reservada para os órgãos da comunidade local e pessoas referidas no número 9 do artigo 6.º da Lei n.º 75/2017, de 17 de agosto.

Pelo que,

9.º A Recorrente não atuou no âmbito das suas especiais atribuições e nem para defender interesses que lhe estivessem especialmente conferidos pelo respetivo estatuto ou por lei.

10.º Assim sendo, e salvo melhor opinião, deve a Recorrente ser condenada no pagamento das custas que se mostrarem devidas ao abrigo do disposto no número 1 do artigo 1.º do Regulamento das Custas Processuais.

Pelo exposto, requer, muito respeitosamente, a V.s Exas. se dignem reformar a sentença quanto às custas, tal como supra se verteu, condenando a Recorrente no pagamento das custas que se mostrarem devidas.


9. A Requerida: Associação Sobral de S. Miguel Patrimónios de Xisto, ADL (Sobral Paxis, ADL) respondeu ao requerimento.


10. Fundamentou a sua resposta nos seguintes termos:

1. A recorrida, embora de forma tímida, mas evidente bastante para se perceber o jaez do seu caráter, veio, mesmo sem ter apresentado contra-alegações, tomar posição sobre a questão das custas.

2. Na verdade, evitando o confronto na parte que importa e que a recorrente nunca temeu, a discussão da questão material que a recorrente sempre sustentou, desde início, a recorrida aproveitou-se da sombra da decisão dos Digníssimos Juízes Conselheiros, para vir tentar afirmar-se numa verdade que não tem, louvando-se apenas na decisão consignada no douto acórdão.

3. Naturalmente, o tribunal não tem qualquer culpa de tal comportamento.

4. O que se lamenta, da parte da recorrida, é que, ao invés de preferir uma leitura cristalina como a neve do que diz o direito e a sua aplicação acertadamente vislumbrada por este Digno Tribunal, preferiu o método ínvio de uma retaliação gratuita, para prejudicar deliberadamente e sem fundamento a posição da recorrente.

5. É que a recorrente nunca utilizou o processo para fins outros que não sejam a defesa – ou pelo menos a tentativa de defesa – dos interesses da comunidade que representa e que a legitimam.

6. E que manteve, mantém e manterá, mesmo discordando da douta decisão.

7. Nessa medida, a recorrida confunde, de forma flagrante, duas questões manifestamente diversas: a legitimidade para a acção (cf. arts. 30.º e seguintes), matéria tratada em especial nos CPC e, em especial na lei da acção popular.

8. E, bem assim, o conceito plasmado no art. 4.º, n.º 1, al. f) do RCP, designadamente quando isenta de custas pessoas que actuem «no âmbito das suas especiais atribuições e nem para defender interesses que lhe estivessem especialmente conferidos pelo respetivo estatuto ou por lei».

9. De facto, como resulta com meridiana clareza da leitura dos preceitos em causa, estes conceitos não se confundem nem na sua letra, nem na teleologia que lhes subjaz.

10. E para tanto basta pensar que os estatutos de uma associação podem prever a defesa do património (podendo ainda estabelecer que tal entidade pode, para tal efeito, socorrer-se da acção popular) sem que tal disposição estatutária possa vincular a decisão do tribunal sobre a admissibilidade ou não dessa intervenção tal como configurada na acção.

11. Como se referiu, uma tem por referência o objecto do processo, tal como configurado pelo autor e outra a as atribuições e interesses que lhe estão confiados.

12. Soçobrando, de forma retumbante, a conclusão de que «porque se considerou que a mesma não tinha legitimidade processual ativa, a recorrente não atuou no âmbito das suas especiais atribuições e nem para defender interesses que lhe estivessem especialmente conferidos pelo respetivo estatuto ou por lei».

13. Por outro lado, sempre se dirá que a recorrente goza de uma dupla isenção de custas.

Com efeito,

14. Nos termos do art. 4.º, n.º 1, al. b) do RCP está isenta de custas qualquer pessoa, fundação ou associação quando exerça o direito de acção popular nos termos do n.º 3 do artigo 52.º da Constituição da República Portuguesa e de legislação ordinária que preveja ou regulamente o exercício da acção popular.

15. Ademais, conforme prevê o art. 4.º, n.º 1, al. f) do RCP, estão isentas de custas as pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos, quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável.

16. Tal regime apenas é excepcionado pelo n.º 5 do mesmo artigo, onde refere nos casos previstos nas alíneas b), f) e x) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 2, a parte isenta é responsável pelo pagamento das custas, nos termos gerais, quando se conclua pela manifesta improcedência do pedido.

17. Conforme se refere no Ac. Do TRP de 07-05-2018, proc. 565/13.7TBAMT-G.P2 «a manifesta improcedência corresponderá a uma improcedência agravada ou a evidente improcedência de facto e ou de direito da pretensão formulada».

18. De facto, tal mecanismo visa tutelar, de forma especial, um princípio geral de proibição de condutas de má-fé ou de fraude à lei - isto é, quando através da isenção de custas se busque um litígio inexistente ou a procedência de um pedido que a parte não pode ignorar ser improcedente. Isto é, quando o benefício concedido pelo legislador tenha sido utilizado como meio para obter um fim fraudulento ou manifestamente ilegítimo.

19. Ora, nos presentes autos não existiu qualquer juízo sobre a procedência ou improcedência do pedido, tendo o processo terminado com uma decisão de forma.

20. Por outro lado, e ainda que assim não se entendesse, basta atentar na jurisprudência citada no recurso para compreender que a questão não só não é pacífica, como que exista alguma censura (improcedência agravada ou a evidente improcedência de facto e ou de direito da pretensão formulada) ao pedido de tutela assim deduzido.

21. Não podendo, como tal, considerar-se ter existido um exercício manifestamente ilegítimo do benefício concedido pelo legislador.

22. É pena que a recorrida, em todo este tempo, se tenha furtado ao contraditório frontal que é aquele que define a essência de um qualquer processo judicial.

23. Longe da recorrida pensar que, à falta de melhor argumento e de oportuna intervenção no processo, sobrou à reclamante agora a aparição inoportuna, para afirmar a sua existência processual.

24. De resto, a recorrida é perita em pedidos inúteis, como seja a isenção legal de custas de que beneficia também e que a recorrente nunca questionou, vindo aquela, a destempo, e sem tempero de palavras, eventualmente enxertar, para justificar um novo pedido de custas de parte que sabe não ter direito desde o início da lide.

25. O pior, é pôr em causa a própria bondade e coerência da deliberação do tribunal, arrogando-se uma divergência de opinião por uma leitura apenas ligeira, pouco sustentada e estudada do juízo ponderado e sábio do que deva justificar a isenção de custas da Recorrente e que o tribunal, e bem, lobrigou de forma superlativa.

26. É aquilo que se poderia considerar um chamamento à atenção inoportuno e despropositado, de quem tão bem decidiu, nesse particular segmento.

27. Como diria um Ilustre Conselheiro, é a “natureza humana”, na sua pior desatenção ou versão, mas que o Excelentíssimo Juiz Conselheiro Relator não irá atender, por iníqua.

Face ao exposto, e sem necessidade de mais considerandos, deve improceder a pretensão do reclamante, sendo o mesmo condenado em custas pelo incidente indevidamente e inoportunamente suscitado.


II. — FUNDAMENTAÇÃO


11. O art. 4.º do Regulamento das Custas Processuais é do seguinte teor:

1. — Estão isentos de custas:

a) O Ministério Público nos processos em que age em nome próprio na defesa dos direitos e interesses que lhe são confiados por lei, mesmo quando intervenha como parte acessória e nas execuções por custas e multas processuais, coimas ou multas criminais;

b) Qualquer pessoa, fundação ou associação quando exerça o direito de acção popular nos termos do n.º 3 do artigo 52.º da Constituição da República Portuguesa e de legislação ordinária que preveja ou regulamente o exercício da acção popular;

c) Os magistrados e os vogais do Conselho Superior da Magistratura, do Conselho Superior do Ministério Público ou do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais que não sejam magistrados, em quaisquer acções em que sejam parte por via do exercício das suas funções;

d) Os membros do Governo, os eleitos locais, os directores-gerais, os secretários-gerais, os inspectores-gerais e equiparados para todos os efeitos legais e os demais dirigentes e funcionários, agentes e trabalhadores do Estado, bem como os responsáveis das estruturas de missão, das comissões, grupos de trabalho e de projecto a que se refere o artigo 28.º da Lei n.º 4/2004, de 15 de Janeiro, qualquer que seja a forma do processo, quando pessoalmente demandados em virtude do exercício das suas funções;

e) Os partidos políticos, cujos benefícios não estejam suspensos, no contencioso previsto nas leis eleitorais;

f) As pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos, quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável;

g) As entidades públicas quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições para defesa de direitos fundamentais dos cidadãos ou de interesses difusos que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto, e a quem a lei especialmente atribua legitimidade processual nestas matérias;

h) Os trabalhadores ou familiares, em matéria de direito do trabalho, quando sejam representados pelo Ministério Público ou pelos serviços jurídicos do sindicato, quando sejam gratuitos para o trabalhador, desde que o respectivo rendimento ilíquido à data da proposição da acção ou incidente ou, quando seja aplicável, à data do despedimento, não seja superior a 200 UC;

i) Os menores ou respectivos representantes legais, nos recursos de decisões relativas à aplicação, alteração ou cessação de medidas tutelares, aplicadas em processos de jurisdição de menores;

j) Os arguidos detidos, sujeitos a prisão preventiva ou a cumprimento de pena de prisão efectiva, em estabelecimento prisional, quando a secretaria do Tribunal tenha concluído pela sua insuficiência económica nos termos da lei de acesso ao direito e aos tribunais, em quaisquer requerimentos ou oposições, nos habeas corpus e nos recursos interpostos em qualquer instância, desde que a situação de prisão ou detenção se mantenha no momento do devido pagamento;

l) Os menores, maiores acompanhados, ausentes e incertos quando representados pelo Ministério Público ou por defensor oficioso, mesmo que os processos decorram nas conservatórias de registo civil;

m) Os agentes das forças e serviços de segurança, em processo penal por ofensa sofrida no exercício das suas funções, ou por causa delas;

n) O demandante e o arguido demandado, no pedido de indemnização civil apresentado em processo penal, quando o respectivo valor seja inferior a 20 UC;

o) O Fundo de Garantia Automóvel, no exercício do direito de sub-rogação previsto no regime jurídico do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel;

p) O Fundo de Garantia Salarial, nas ações em que tenha de intervir;

q) O Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, nos processos em que intervenha na defesa dos direitos dos trabalhadores, dos contribuintes e do património do Fundo;

r) O Fundo dos Certificados de Reforma, nos processos em que intervenha na defesa dos direitos dos aderentes, dos beneficiários e do património do Fundo;

s) Os municípios, quando proponham a declaração judicial de anulação prevista no regime jurídico de reconversão das áreas urbanas de génese ilegal, em substituição do Ministério Público;

t) O exequente e os reclamantes, quando tenham que deduzir reclamação de créditos junto da execução fiscal e demonstrem já ter pago a taxa de justiça em processo de execução cível relativo aos mesmos créditos;

u) As sociedades civis ou comerciais, as cooperativas e os estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada que estejam em situação de insolvência ou em processo de recuperação de empresa, nos termos da lei, salvo no que respeita às acções que tenham por objecto litígios relativos ao direito do trabalho.

v) O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, nas ações em que tenha de intervir na qualidade de gestor do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores.

x) Os compartes, os órgãos dos baldios e o Ministério Público, nos litígios que, direta ou indiretamente, tenham por objeto terrenos baldios.

z) As pessoas a quem tenha sido atribuído o estatuto de vítimas de crime de violência doméstica, nos termos do disposto no artigo 14.º da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro, alterada pelas Leis n.os 19/2013, de 21 de fevereiro, 82-B/2014, de 31 de dezembro, e 129/2015, de 3 de setembro, quando intervenham no respetivo processo penal em qualquer das qualidades referidas nos artigos 67.º-A a 84.º do Código de Processo Penal.

aa) As vítimas dos crimes de mutilação genital feminina, escravidão, tráfico de pessoas, coação sexual e violação, previstos e puníveis, respetivamente, nos termos do disposto nos artigos 144.º-A, 159.º, 160.º, 163.º e 164.º, todos do Código Penal, quando intervenham no respetivo processo penal em qualquer das qualidades referidas nos artigos 67.º-A a 84.º do Código de Processo Penal.

bb) Os casos em que a Autoridade Tributária e Aduaneira revogue ou anule atos administrativos em matéria tributária ou reveja os atos tributários, ou outros, que sejam objeto de processos tributários pendentes nos tribunais administrativos e fiscais, ao abrigo do disposto no artigo 68.º-A da Lei Geral Tributária.

2. — Ficam também isentos:

a) As remições obrigatórias de pensões;

b) Os processos administrativos urgentes relativos ao pré-contencioso eleitoral quando se trate de eleições para órgãos de soberania e órgãos do poder regional ou local e à intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias;

c) Todos os processos que devam correr no Tribunal de Execução de Penas, quando o recluso esteja em situação de insuficiência económica, comprovada pela secretaria do tribunal, nos termos da lei de acesso ao direito e aos tribunais;

d) Os processos de liquidação e partilha de bens de instituições de previdência social e associações sindicais e de classe;

e) (Suprimida pela Declaração de Rectificação n.º 22/2008, de 24 de Abril.)

f) Os processos de confiança judicial de menor, tutela e adopção e outros de natureza análoga que visem a entrega do menor a pessoa idónea, em alternativa à institucionalização do mesmo;

g) (Revogada.)

h) Os processos de acompanhamento de maiores.

3. — Nos casos previstos nas alíneas c) e d) do n.º 1, a parte isenta fica obrigada ao pagamento de custas quando se conclua que os actos não foram praticados em virtude do exercício das suas funções ou quando tenha actuado dolosamente ou com culpa grave.

4. — No caso previsto na alínea u) do n.º 1, a parte isenta é responsável pelo pagamento das custas, nos termos gerais, em todas as acções no âmbito das quais haja beneficiado da isenção, caso ocorra a desistência do pedido de insolvência ou quando este seja indeferido liminarmente ou por sentença.

5. — Nos casos previstos nas alíneas b), f) e x) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 2, a parte isenta é responsável pelo pagamento das custas, nos termos gerais, quando se conclua pela manifesta improcedência do pedido.

6. — Sem prejuízo do disposto no número anterior, nos casos previstos nas alíneas b), f), g), h), s), t) e x) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 2, a parte isenta é responsável, a final, pelos encargos a que deu origem no processo, quando a respetiva pretensão for totalmente vencida.

7. — Com excepção dos casos de insuficiência económica, nos termos da lei de acesso ao direito e aos tribunais, a isenção de custas não abrange os reembolsos à parte vencedora a título de custas de parte, que, naqueles casos, as suportará.


11. Face ao teor da alínea f) do n.º 1 e do n.º 5, a Autora, agora Reclamada, só deveria ser condenada em custas desde que actuasse para defender interesses distintos daqueles que lhes estão especialmente conferidos ou, ainda que actuasse para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos, desde que o pedido fosse manifestamente improcedente.


12. Ora, não ficou demonstrado que a Autora, agora Reclamada, actuasse para defender interesses distintos daqueles que lhes estão especialmente conferidos e, ainda que se tivesse confirmado a absolvição da instância da Ré, agora Reclamante, não se declarou que o pedido fosse manifestamente improcedente.


13. Em primeiro lugar, não ficou demonstrado que a Autora, agora Reclamada, actuasse para defender interesses distintos daqueles que lhes estão especialmente conferidos.


14. O Supremo Tribunal de Justiça tem considerando que

“Esta isenção é motivada pela ideia de estímulo ao exercício de funções públicas particulares que, sem espírito de lucro, realizam tarefas em prol do bem comum, o que à comunidade aproveita e ao Estado incumbe facilitar, pelo que lhe subjaz o desiderato de tutela do interesse público (…). Dada a sua estrutura e fins, essas associações e fundações beneficiam da isenção de custas a que se reporta este normativo nas acções relativas à defesa e promoção dos seus interesses específicos, naturalmente sob a envolvência do interesse público.

É uma isenção de custas restrita, na medida em que só funciona em relação aos processos concernentes às suas especiais atribuições ou para defesa dos interesses conferidos pelo respectivo estatuto, ou pela própria lei, que coincidam com o bem comum” [1].


15. Ora, em concreto, nada permite sustentar que a Autora, agora Reclamada, actuasse para defender interesses estranhos ao bem comum ou ao desenvolvimento de Sobral de S. Miguel.


16. Entre o fim de prossecução do bem comum, ou de prossecução de interesses relacionados com o bem comum, e o meio legitimidade processual activa não há uma coincidência necessária.


17. O facto de a Autora, agora Reclamada, não ter legitimidade para propor a presente acção não significa, sem mais, que a acção pretendesse promover interesses estranhos àqueles que lhe foram legal ou estatutariamente conferidos.


18. Em segundo lugar, ainda que se tivesse confirmado a absolvição da instância da Ré, agora Reclamante, não se declarou que o pedido fosse manifestamente improcedente.


III. — DECISÃO

Face ao exposto, indefere-se a presente reclamação.

Custas do incidente pela Requerente.


Lisboa, 25 de Maio de 2023

Nuno Manuel Pinto Oliveira (Relator)

José Maria Ferreira Lopes

Nuno Ataíde das Neves

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[1] Cf. designadamente o acórdão do STJ 28 de Maio de 2015 — processo n.º 6495/12.2TBBRG.G1-A.S1 — citando Salvador da Costa.