Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
343/10.5TBVLN.G2.S1
Nº Convencional: 1ª SECÇÃO
Relator: ERNESTO CALEJO
Descritores: ACIDENTE DESPORTIVO
RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
SEGURO OBRIGATÓRIO
OBJECTO DO CONTRATO DE SEGURO
OBJETO DO CONTRATO DE SEGURO
CONTRATO DE SEGURO
DIREITO À INDEMNIZAÇÃO
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 06/20/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO DOS SEGUROS - SEGURO DESPORTIVO OBRIGATÓRIO.
Legislação Nacional:
D.L. N.º 10/2009, DE 12-01: - ARTIGO 6.º.
Sumário :

I - Os danos sofridos pelo autor encontram-se incluídos no âmbito de cobertura do contrato de seguro celebrado entre a seguradora e o 2.º réu.
II - A posição da recorrente da exclusão do seguro dos danos sofridos pelo autor não é correcta, não só porque contraria os termos da cobertura do seguro imposta pelo DL n.º 10/2009, de 12-01, mas, também, porque dos próprios termos do contrato celebrado pelas partes, a sua responsabilidade não poderá ser excluída, estando, antes, claramente aí incluída.


* Sumário elaborado pelo relator
Decisão Texto Integral:               

      Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

                                                               

                        I- Relatório:

                       1-1- AA intentou a presente acção declarativa de condenação com processo comum ordinário, contra Companhia de Seguros BB SA (hoje ..., S.A.), e CC, alegando, em síntese, que foi vítima da queda de um haltere quando se encontrava a fazer exercícios no ginásio do 2° R, o que lhe causou danos, sendo que este havia transferido para a R. a responsabilidade civil por danos ocorridos nesse local. O haltere caiu devido ao facto de o 2° R. não ter agido com o cuidado que devia, nomeadamente por o respectivo suporte não oferecer condições de retenção.

                       Conclui pedindo a condenação da 1ª R. e subsidiariamente do 2ª R. no pagamento da quantia de € 212.729,34, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu, importância essa acrescida de juros de mora, contabilizados à taxa legal, desde a citação até efectivo pagamento.

                      Contestaram os RR., impugnando os factos descritos na petição inicial, negando qualquer culpa do 2° R. na queda do haltere, imputando antes a responsabilidade pela produção dos danos à própria actuação do demandante.

   A R. Seguradora defendeu ainda a exclusão dos danos sofridos pelo A. da cobertura do seguro que celebrara com o 2º R.

    O A. replicou mantendo a versão referida na petição inicial.

   O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido o despacho saneador, após o que se fixaram os factos assentes e se organizou a base instrutória, se realizou a audiência de discussão e julgamento, se respondeu à base instrutória e se proferiu a sentença.

      Nesta, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se o R. CC:

        a) a pagar ao A. a quantia de € 858,18 (oitocentos e cinquenta e oito euros e dezoito cêntimos) a título de danos patrimoniais e de € 15.000,00 (quinze mil euros) a título de danos não patrimoniais;

           b) a pagar ao A. os juros de mora à taxa de 4 % (Portaria 291/03, de  8 Abr), desde a citação até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos patrimoniais e desde hoje até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos não patrimoniais.

                        No mais, julgou-se a acção improcedente, absolvendo o R. CC do restante pedido e a R. Companhia de Seguros BB SA, de todo o pedido.

                       

             1-2- Não se conformando com esta decisão, dela recorreram o A. AA e o R. CC, de apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães, tendo-se aí, por acórdão de 30 de Novembro de 2016, julgado os recursos interpostos pelo A. e pelo 2º R. parcialmente procedentes e, em consequência, decidiu-se alterar a condenação proferida em 1ª instância nos seguintes termos:

      “Julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenar a 1ª Ré Companhia de Seguros BB, S. A. 

                        a) a pagar ao A. a quantia de € 858,18 (oitocentos e cinquenta e oito euros e dezoito cêntimos) a título de danos patrimoniais e de € 15.000,00 (quinze mil euros) a título de danos não patrimoniais;

     b) a pagar ao A. os juros de mora à taxa de 4% (Portaria 291/03, de 8Abr):

    • desde a citação até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos patrimoniais;

   • desde hoje até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos não patrimoniais”.

    No mais, julgou-se a acção improcedente, absolvendo-se totalmente o R. CC do pedido.

   1-3- Irresignada com este acórdão, dele recorreu a R. Seguradora para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo

                       

         A recorrente alegou, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões:

      1. Os danos do Autor encontram-se excluídos do âmbito de cobertura do contrato de seguro celebrado entre a Recorrente e 2° Réu, CC.

     2. A responsabilidade pelos danos em discussão nestes autos é exclusivamente do 2° Réu.

     3. A responsabilidade do 2° Réu não se encontra transferida para a Recorrente.

  4. O Acórdão recorrido assenta em pressupostos que não encontram arrimo nas disposições legais atinentes à matéria aqui em discussão.

    5. O Acórdão recorrido viola a lei substantiva, ao incorrer em erro na interpretação e aplicação do que se dispõe no Decreto-Lei nº 10/2009, de 12 de Janeiro, relativamente ao contrato de seguro desportivo.

   6. Do nº 1 do artigo 2° do Decreto-Lei nº 10/09, de 12 de Janeiro resulta que os praticantes de actividades desportivas em infra-estruturas desportivas abertas ao público devem, obrigatoriamente, beneficiar de um contrato de seguro desportivo.                                 

7. Do nº 2 do artigo 2º desse Decreto-Lei resulta que a responsabilidade pela celebração do contrato de seguro desportivo cabe às entidades que explorem infra-estruturas desportivas abertas ao público.

   8. Do nº 1 do artigo 14° do Decreto-Lei nº 10/09, de 12 de Janeiro resulta que as entidades prestadoras de serviços desportivos celebram um contrato de seguro desportivo, com determinadas coberturas mínimas a favor dos utentes ou clientes desses serviços.

  9. Do nº 2 do artigo 140 do Decreto-Lei nº 10/09, de 12 de Janeiro resulta que a adesão ao seguro se realiza no acto de inscrição ou contratualização junto das entidades prestadoras dos serviços desportivos.

  10. Resulta da matéria assente que o Autor frequentava o ginásio do 20 Réu, a título totalmente gratuito, por mero favor pessoal "alinhavado" entre ambos, e ao qual a Seguradora Recorrente era totalmente alheia.

   11. O Autor frequentava o ginásio devidamente autorizado pelo seu proprietário (o 2.0 Réu), mas nunca pagou qualquer contraprestação, nem nunca formalizou a sua frequência, por via de uma inscrição.

  12. Uma correcta interpretação e aplicação da legislação referida nos pontos 5 a 9 destas conclusões impõe que apenas o 2º Réu, na qualidade de prestador dos serviços desportivos, deva responder pelas consequências de uma admissão - gratuita, e a título de mero favor pessoal - não formalizada.

13. A Primeira Instância sentenciou bem, ao interpretar que não é legítimo ser exigido à Recorrente que esta venha responder com base num risco que não foi avaliado nem reflectido na contrapartida representada pelo prémio de seguro.

  14. É uma questão de razoabilidade e lógica jurídica, dimanada dos princípios, a afirmação de que esta 'inscrição' ou 'contratualização' exige um certo grau de formalização.

15. Por um lado, para que o 2º Réu, na qualidade de prestador dos serviços desportivos, pudesse comunicar à sua seguradora o número de utentes/clientes frequentadores do ginásio.

     16. E por outro lado, para que a Recorrente Seguradora soubesse quantos utentes/clientes estavam cobertos pelo seguro.

    17. Esta informação é um dos elementos essenciais do contrato de seguro, já que tem influência directa na fixação do respectivo prémio.

  18. O 2º Réu não cumpriu o ónus que lhe impedia, de partilhar com a Recorrente Seguradora toda a informação que detinha acerca das circunstâncias relevantes para o juízo de risco, nomeadamente a existência de outros clientes/utentes frequentadores do ginásio, sem inscrição formalizada.

  19. O Acórdão recorrido viola a lei substantiva, ao incorrer em erro na interpretação e aplicação do que se dispõe no Decreto-Lei nº 10/2009, de 12 de Janeiro, relativamente ao contrato de seguro desportivo, ao determinar que a responsabilidade do 2º Réu se encontra transferida para a Recorrente.

0. O Acórdão recorrido viola ainda a lei substantiva, ao fazer uma interpretação errada do que venham a ser "terceiros", para efeitos do contrato de seguro em causa, já que tal interpretação não encontra sustentação no animus da contratação, nem tem em consideração a natureza do próprio contrato de seguro desportivo obrigatório.

21.Os Réus não alargaram o âmbito de cobertura subjectivo do contrato de seguro, contrariamente ao que aponta o Tribunal recorrido.

  22. Das condições especiais da apólice do contrato de seguro celebrado entre os Réus, resulta que o beneficiário, no caso, é o Réu.

  23. Das condições especiais da apólice do contrato de seguro celebrado entre os Réus, resulta que os terceiros são todos os clientes/utentes do beneficiário, que frequentavam o ginásio do 2º Réu, tendo uma inscrição formalizada.

 4. Só esta interpretação é consentânea com o que se dispõe na determinação dos riscos das condições gerais da apólice, já que nos termos dessas cláusulas apenas ficam garantidas as lesões corporais causadas a terceiros, e ocorridas no exercício do negócio do 2º Réu.

    25. No entanto, o Autor não se encontrava a frequentar o ginásio, por conta do negócio do 2º Réu, porque estava lá a título totalmente gratuito, por mero favor pessoal "alinhavado" entre ele e o 2.0 Réu, e ao qual a Seguradora Recorrente era totalmente alheia.

   26. A interpretação que do Tribunal a quo conduz à conclusão - errónea e nada razoável - de que toda e qualquer pessoa que se encontrasse no ginásio e sofresse um dano, no local, estaria coberto pela apólice.

 27. Esta interpretação do Tribunal a quo não é consentânea com o animus da contratação nem com a própria natureza do contrato de seguro desportivo obrigatório.

   28. O Autor não é terceiro, para efeitos do disposto no contrato de seguro desportivo em causa, uma vez que não era utente/cliente do ginásio, com inscrição formalizada, nem tão-pouco os danos em causa ocorreram no exercício do negócio do 2º Réu.

  29. Motivo pelo qual os danos do Autor não estão incluídos no âmbito de cobertura do contrato de seguro em causa, sendo, como tal, o 2º Réu, não a Recorrente, exclusivamente responsável pelos mesmos.

   … Deve o acórdão em crise ser revogado, e substituído por outro que mantenha a decisão de Primeira Instância, condenando exclusivamente o 2º Réu no dever de indemnizar o Autor, e absolvendo integralmente a Recorrente de todo pedido.

   Não foram produzidas contra-alegações.              

                       

  Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir:

                       

                        II- Fundamentação:

                        2-1- Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, apreciaremos apenas a questão que ali foi enunciada (art. 639º nºs 1 e 2 do C.P.Civil).

 Nesta conformidade, será o seguinte o assunto a apreciar e decidir:

         - Se os danos sofridos pelo A. estão, ou não, abrangidos pela cobertura do contrato de seguro em causa.            

                       

        2-2- Vem fixada das instâncias a seguinte matéria de facto:

           1. À data do acidente o A. jogava basquetebol no Basket Clube de ... (A e 26);

   2. No dia 13 de Agosto de 2009, da parte da manhã, o A. encontrava-se no “Ginásio ...”, sito nas Piscinas Municipais, no lugar de ..., ginásio esse propriedade e explorado comercialmente pelo 2º R. CC (B e C);

   3. Por contrato de seguro titulado pela apólice ..., o proprietário e explorador do ginásio onde ocorreu o acidente transferiu para a 1ª R. Companhia de Seguros BB, SA, a responsabilidade que lhe caberia pelos danos causados a terceiros ou clientes com o ginásio ou a actividade nele exercida (D);

      4. O A. frequentava habitualmente o ginásio, não pagando qualquer contraprestação por isso [nem o A, nem o clube onde este jogava basquetebol (Basket Clube de ...)] (1);

    5. Na ocasião do acidente o A. estava a fazer exercícios de abaixamentos junto do suporte onde se encontravam halteres de vários pesos. A determinada altura, por razões que se desconhecem – ou por deficiente funcionamento do suporte dos alteres ou por acção do próprio A. –, um dos halteres soltou-se do suporte e caiu sobre o pé direito do A. (3 a 6 e 54 a 58);

       6. O A. dirigiu-se ao Centro de Saúde de ..., tendo sido nesse dia (13 de Agosto de 2009) reencaminhado para o Hospital Distrital de .... Aí realizou RX, que revelou a fractura de 1/3 distal do 2º e 3º metatarsianos do pé direito. Por se tratar de um desportista de alta competição optou-se por realizar imobilização com tala de gesso no indicado pé (7 a 9 e 43);

   7. O A. regressou àquela Unidade Hospitalar no dia 19 de Agosto de 2009 e foi internado, para submissão a intervenção cirúrgica, no dia 22 de Agosto de 2009, operação essa que comportou encavilhamento com fio de Kirschner, com redução fechada e fixação interna (10, 11 e 43);

8. Foram-lhe prescritos os seguintes cuidados: AINE, descarga, elevação do membro, cuidados de penso de 3/3 dias e vigilância de sinais de alarme e volta ao Serviço de Urgência, se fosse o caso (12 e 43);

  9. Foi-lhe prescrita terapêutica de ambulatório, em 13 de Agosto de 2009 com os medicamentos Diclofenac e Misoprostol (Arthrotec 75), de 75 mg, e em 23 de Agosto de 2009 com o medicamento Etoricoxib (Exxiv), de 60 mg (13 e 43);

  10. Com vista a lograr uma recuperação funcional rápida e tendencialmente plena passou a ser seguido no Serviço de Traumatologia do Complexo Hospitalar Universitário de ... (Hospital do ...) sito na província de ..., Espanha, onde esteve presente, em consulta externa, nos dias 21 de Setembro, 22 de Outubro e 19 de Novembro de 2009 (14, 15 e 43);

11. O A. teve tala gessada durante 8 semanas, que retirou em finais de Outubro de 2009 (16 e 43);

12. Por prescrição do seu médico de família, do Centro de Saúde de ..., o A. deu início ao processo de recuperação mediante a frequência de processo de medicina física de reabilitação: realizou uma primeira fase de sessões de fisioterapia, na Clínica de Reabilitação de ..., entre os dias 27 de Outubro de 2009 e 16 de Novembro de 2009, pelas quais despendeu, em taxas moderadoras por 2 consultas e 15 sessões de tratamento, um total de € 70,40; e frequentou uma segunda série de 12 sessões de fisioterapia, desta feita já na vertente desportiva, com orientação de médico especialista da referida cidade de ..., pela qual pagou um total de € 403,68 (17 a 20 e 43);

13. Despendeu, em taxas moderadoras, nos 2 episódios de urgência junto do ULSAL, nos dias 19 e 22 de Agosto de 2009, a quantia de € 16,80 (21);

14. Teve o A. de recorrer ao Centro de Saúde de ... em 4 ocasiões, 2 das quais em consulta urgente, nos dias 13 de Agosto de 2009 e 28 de Agosto de 2009, e 2 em consulta normal, nos dias 27 de Outubro de 2009 e 8 de Fevereiro de 2010, pelas quais pagou, em taxas moderadoras, a quantia de € 11,80 (22);

       15. Pelo internamento, exames radiológicos e exames de sangue que lhe foram efectuados na ULSAL o A. pagou a quantia de € 39,15 (23);

 16. Pela realização de exames tendentes ao apuramento do estado de consolidação das lesões que lhe resultaram do descrito acidente, pagou o A, na ..., no dia 9 de Fevereiro de 2010, a quantia de € 3,17 (24);

   17. Devido ao acidente o A. pagou, em medicamentos, a quantia de € 13,18 (25);

  18. Na data do acidente o A. trabalhava em part-time no hipermercado ..., auferindo um vencimento mensal ilíquido de € 325,50. Tal contrato teve início em 27 de Julho de 2009 e foi celebrado por 51 dias, com cessação em 15 de Setembro de 2009 (28);

   19. As lesões sofridas e as sequelas delas resultantes determinaram para o A. um défice funcional temporário total (incapacidade temporária geral total) de 12 dias, um défice funcional temporário parcial (incapacidade temporária geral parcial) de 115 dias e uma repercussão temporária na actividade profissional total (incapacidade temporária profissional total) de 127 dias (29 e 43);

   20. Em 30 de Junho de 2010 o A. apresentava as seguintes queixas: dor no pé direito, com os movimentos e a mudança de tempo; dificuldades na deambulação, principalmente em terreno irregular; dificuldades em permanecer por períodos prolongados em pé e dificuldades na realização de exercício físico prolongado; e edema do pé relacionada com esforço físico (32, 41 e 43);

         

21. O referido membro inferior direito tem uma cicatriz na região dorsal do pé; ligeira dor e hipersensibilidade à palpação da cabeça do 2º metatarsiano; calosidade plantar a nível da cabeça do 2º metatarsiano, relacionado com aumento da carga a nível do 2º raio por inclinação inferior desde MTT (33, 41 e 43);

22. O A. tem uma leve deformidade da zona média do 2º metatarsiano com discreto espessamento, compatível com sequelas por antiga fractura (34 e 43);

    23. As fracturas dos metatarsianos provocaram uma alteração na zona de carga, que lhe acarretou dores e hipercalosidade na região plantar, sendo frequente a necessidade de utilização de palmilhas de descarga metatarsal, e provocam dor crónica e limitação funcional progressiva, implicando futuramente a necessidade de intervenção cirúrgica, concretamente de osteotomias do metatarsiano para elevar a cabeça do metatarsiano – processo que sofre agravamento pela profissão do autor (basquetebolista) (35 a 37 e 43);

  24. Para avaliar as sequelas do A. foi efectuado um relatório elaborado por médico perito em avaliação de dano corporal por cuja feitura e respectiva consulta liquidou o A. € 255,00 (38);

  25. A final, o A. ficou a padecer de um Défice Funcional Permanente na Integridade Físico-Psíquica (incapacidade permanente geral) de 2%, sendo as sequelas compatíveis com o exercício da sua actividade profissional à custa de esforços suplementares e sem necessidade de esforços suplementares para as actividades em que não é praticante de desporto (39 e 43 a 48);

26. O A. sofreu dores, mal-estar e aborrecimentos (40 e 43);

  27. Antes do acidente, o A. não padecia de nenhuma das lesões e sequelas que hoje apresenta (42);

28. As lesões e sequelas que o A. hoje apresenta causam-lhe desgosto e tristeza (50 e 51);

    29. O A. nasceu em 11 de Abril de 1985 (documento de fl.122 e 122 v). ---------------------------

    2-3- A Seguradora recorrente sustenta que os danos sofridos pelo A. encontram-se excluídos do âmbito de cobertura do contrato de seguro celebrado entre ela, recorrente, e 2° R., CC, sendo que a responsabilidade pelos danos em discussão é exclusivamente do 2° R. Isto porque a responsabilidade deste R. não se encontra transferida para ela, recorrente. Do nº 1 do art. 2° do Decreto-Lei nº 10/09, de 12 de Janeiro resulta que os praticantes de actividades desportivas em infra-estruturas desportivas abertas ao público devem, obrigatoriamente, beneficiar de um contrato de seguro desportivo, sendo que a responsabilidade pela celebração do contrato de seguro desportivo cabe às entidades que explorem infra-estruturas desportivas abertas ao público, de harmonia com o nº 2 do desse art. 2º. Por sua vez, do nº 1 do art. 14° do mesmo Decreto-Lei resulta que as entidades prestadoras de serviços desportivos celebram um contrato de seguro desportivo, com determinadas coberturas mínimas a favor dos utentes ou clientes desses serviços, sendo que a adesão ao seguro se realiza no acto de inscrição ou contratualização junto das entidades prestadoras dos serviços desportivos, como decorre do nº 2 desse art. 14º. Resulta da matéria assente que o A. frequentava o ginásio do 2º R., a título totalmente gratuito, por mero favor pessoal "alinhavado" entre ambos, e ao qual a recorrente era totalmente alheia. Uma correcta interpretação e aplicação da legislação referida impõe que apenas o 2º R., na qualidade de prestador dos serviços desportivos, deva responder pelas consequências de uma admissão - gratuita, e a título de mero favor pessoal - não formalizada. É uma questão de razoabilidade e lógica jurídica dimanada dos princípios, a afirmação de que esta 'inscrição' ou 'contratualização' exige um certo grau de formalização. Deveria o 2º R., na qualidade de prestador dos serviços desportivos, comunicar à sua Seguradora o número de utentes/clientes frequentadores do ginásio, para que esta soubesse quantos utentes/clientes estavam cobertos pelo seguro. Esta informação é um dos elementos essenciais do contrato de seguro, já que tem influência directa na fixação do respectivo prémio, sendo que o 2º R. não cumpriu o ónus que lhe impedia, de partilhar com a Seguradora toda a informação que detinha acerca das circunstâncias relevantes para o juízo de risco, nomeadamente a existência de outros clientes/utentes frequentadores do ginásio, sem inscrição formalizada. O acórdão recorrido viola a lei substantiva, ao incorrer em erro na interpretação e aplicação do que se dispõe no Decreto-Lei nº 10/2009, de 12 de Janeiro, relativamente ao contrato de seguro desportivo, ao determinar que a responsabilidade do 2º R. se encontra transferida para a recorrente, violando ainda a lei substantiva, ao fazer uma interpretação errada do que venham a ser "terceiros", para efeitos do contrato de seguro em causa, já que tal interpretação não encontra sustentação no animus da contratação, nem tem em consideração a natureza do próprio contrato de seguro desportivo obrigatório. Os RR. não alargaram o âmbito de cobertura subjectivo do contrato de seguro, contrariamente ao que aponta o tribunal recorrido. Das condições especiais da apólice do contrato de seguro celebrado entre os RR., resulta que o beneficiário, no caso, é o R.. Das condições especiais da apólice do contrato de seguro celebrado entre os RR., resulta que os terceiros são todos os clientes/utentes do beneficiário, que frequentavam o ginásio do 2º R., tendo uma inscrição formalizada. Só esta interpretação é consentânea com o que se dispõe na determinação dos riscos das condições gerais da apólice, já que nos termos dessas cláusulas apenas ficam garantidas as lesões corporais causadas a terceiros, e ocorridas no exercício do negócio do 2º R.. No entanto, o A. não se encontrava a frequentar o ginásio, por conta do negócio do 2º R., porque estava lá a título totalmente gratuito, por mero favor pessoal "alinhavado" entre ele e o 2º Réu, e ao qual a Seguradora era totalmente alheia.  A interpretação do tribunal a quo conduz à conclusão - errónea e nada razoável - de que toda e qualquer pessoa que se encontrasse no ginásio e sofresse um dano, no local, estaria coberto pela apólice, sendo que esta interpretação não é consentânea com o animus da contratação nem com a própria natureza do contrato de seguro desportivo obrigatório. O A. não é terceiro, para efeitos do disposto no contrato de seguro desportivo em causa, uma vez que não era utente/cliente do ginásio, com inscrição formalizada, nem tão-pouco os danos em causa ocorreram no exercício do negócio do 2º R., razão por que os danos do A. não estão incluídos no âmbito de cobertura do contrato de seguro em causa, sendo, como tal, o 2º R., e não a recorrente, exclusivamente responsável pelos mesmos.

    Sobre o tema em discussão o douto acórdão recorrido, em síntese, concluiu que “…analisado o clausulado do contrato fica evidente que os contraentes, além dos utentes e/ou clientes dos serviços desportivos” oferecidos pelo 2º Réu no local do risco, incluíram no âmbito de cobertura do contrato de seguro celebrado quaisquer lesões causadas a TERCEIROS: - que, nos termos da lei, sejam exigidos ao segurado na sua qualidade de proprietário do edifício seguro;- e/ou ocorridas no exercício do negócio e nas instalações do segurado. Assim, torna-se patente, julga-se, que a 1ª Ré e o 2º Réu celebraram, dentro da liberdade contratual que lhe assistia, um contrato de seguro em que, quanto ao âmbito de cobertura do contrato, além de incluírem os utentes e/ou clientes dos serviços desportivos” oferecidos pelo 2º Réu no local do risco, incluíram quaisquer TERCEIROS que no local do risco tenham sofrido lesões que sejam exigidas ao 2º Réu na sua qualidade proprietário do edifício seguro ou tenham sofrido lesões que tenham ocorrido no exercício do negócio do 2º Réu e nas instalações deste. Ora, independentemente de se poder discutir ainda se o aqui Autor era utente e/ou cliente dos serviços desportivos oferecidos pelo 2º Réu no local do risco - e discutir-se, como se efectuou na sentença de Primeira Instância, se tal exigiria algum tipo de formalização na inscrição ou contratualização da utilização do ginásio por parte do Autor - a verdade é que se pode concluir, em face do clausulado do contrato de seguro celebrado pelas partes, que o Autor preenche o conceito de TERCEIRO nos termos em que o mesmo se encontra definido no contrato, não existindo, ainda, dúvidas que as lesões sofridas pelo Autor ocorreram no âmbito do negócio do 2º Réu (da actividade desportiva oferecida pelo 2º R) e no local do risco designado no contrato de seguro. Nesta conformidade, considera-se que, efectivamente, o sinistro em discussão nos presentes autos, mostra-se incluído no âmbito de cobertura do contrato de seguro celebrado e, assim, consequentemente, tendo o 2º Réu, pelo contrato de seguro transferido para a 1ª Ré Companhia de Seguros BB, SA, a responsabilidade que lhe caberia pelos danos causados a Terceiros (nestes se incluindo os utentes e os clientes) no caso, pelos danos causados ao Autor, com o ginásio ou a actividade nele exercida, tem a 1ª Ré Companhia de Seguros BB, SA de assumir o pagamento das indemnizações atrás arbitradas por força do contrato de seguro celebrado com o 2º Réu”.

 Ou seja, o douto acórdão recorrido entendeu que, por força do contrato de seguro celebrado, a responsabilidade civil extracontratual pela prática dos factos aqui em causa e que o 2º R. teria que assumir perante o A., mostra-se transferida para a R. Seguradora.

 Recapitulemos os factos que, com vista à decisão, ficaram provados. Assim, ficou assente que à data do acidente o A. jogava basquetebol no Basket Clube de ..., e que no dia 13 de Agosto de 2009, da parte da manhã, encontrava-se no “Ginásio ...”, sito nas Piscinas Municipais, no lugar de Antas, em Monção, ginásio esse propriedade e explorado comercialmente pelo 2º R., CC. O A. frequentava habitualmente o ginásio, não pagando qualquer contraprestação por isso. Na ocasião do acidente o A. estava a fazer exercícios de abaixamentos junto do suporte onde se encontravam halteres de vários pesos. A determinada altura, por razões que se desconhecem – ou por deficiente funcionamento do suporte dos alteres ou por acção do próprio A. –, um dos halteres soltou-se do suporte e caiu sobre o pé direito do A. Por contrato de seguro titulado pela apólice ..., o proprietário e explorador do ginásio onde ocorreu o acidente transferiu para a 1ª R. Companhia de Seguros BB, SA, a responsabilidade que lhe caberia pelos danos causados a terceiros ou clientes com o ginásio ou a actividade nele exercida.

  Foi ainda considerado no douto acórdão recorrido, quanto ao âmbito de cobertura do contrato, que ficou estabelecido o seguinte:

      Nas condições particulares: “Nos termos das condições gerais e especiais aplicáveis, o presente contrato garante as coberturas seguintes:

Coberturas:(…) III- Responsabilidade civil – capital 10.000$00 Franquia 5.000$00; (…)

Objecto seguro: conteúdo do ginásio (conforme descrição anexa) sito no lugar das ..., na piscina Municipal - 1º em ...; (…)

O tomador do seguro efectua o contrato na qualidade de DONO…”

e Nas Actas Adicionais (5.12.2003)

“Pela presente acta adicional e com efeito a partir de 2003/11/28 o contrato passa a vigorar nas seguintes condições: Qualidade do tomador do seguro: DONO

Actividade: Instalações gimnodesportivas; (…)

Coberturas: (…)

Secção III- Responsabilidade civil

Responsabilidade civil: capital 50.000 € ; franquia fixa – danos materiais (cob. fac.) 25, 00 €…”

(…) Nas condições gerais: Capítulo I

Definições

Para efeitos do presente contrato entende-se por: (…)

Beneficiário - pessoa singular ou colectiva a favor de quem reverte a prestação da seguradora decorrente deste contrato de seguro;

Terceiro - aquele que, em consequência de um sinistro coberto por este contrato sofra uma lesão que origine danos susceptíveis de, nos termos da lei civil e desta apólice, serem reparados ou indemnizados” (…)

Secção III responsabilidade civil extra-contratual (cobertura automática)

risco 24- responsabilidade civil extra-contratual do segurado na qualidade de proprietário do edifício seguro

1. Ficam garantidas as reparações pecuniárias com fundamento em responsabilidade civil extracontratual decorrente de lesões corporais e/ou materiais involuntariamente causadas a terceiros, que, nos termos da lei, sejam exigidos ao segurado na sua qualidade de proprietário do edifício seguro… (mencionam-se depois cláusulas onde a) se excluem da definição de terceiros determinadas pessoas, onde não se inclui o Autor (por exemplo, trabalhadores do Réu); b) se exclui a assunção de responsabilidade (por ex. a responsabilidade criminal).

Risco 25 responsabilidade civil extra-contratual do segurado na qualidade de empresário

1. Ficam garantidas as reparações pecuniárias com fundamento em responsabilidade civil extracontratual decorrente de lesões corporais e/ou materiais involuntariamente causadas a terceiros, e ocorridas no exercício do negócio e nas instalações do segurado… (menciona-se depois cláusula onde se exclui a assunção de responsabilidade (por ex. a responsabilidade criminal) (…).

    A justificação para a existência de um seguro obrigatório derivado da actividade desportiva não profissional, consta do preâmbulo do Dec-Lei 10/2009 de 12 de Janeiro (diploma que estabeleceu o regime jurídico do seguro desportivo obrigatório). Com efeito, aí se refere que “com os seguros obrigatórios atende-se a uma necessidade social fundamental, a de assegurar que o beneficiário chegue, efectivamente, a usufruir da cobertura. É certo que um sistema de seguros não evita o risco, mas previne o perigo das vítimas não obterem o ressarcimento. A doutrina vem apontando um conjunto de riscos susceptíveis de serem abrangidos pelo seguro desportivo, nomeadamente os riscos sobre a integridade física dos praticantes, os riscos sobre a integridade física dos espectadores ou terceiros, os riscos a que estão expostos os recursos humanos afectos ao evento desportivo e, bem assim, os riscos inerentes à deslocação para o local onde se realiza o evento desportivo. Por outro lado, o risco coberto pelo seguro desportivo encontra-se perfeitamente balizado materialmente, isto é, apenas abrange os riscos para a saúde decorrentes da prática de uma modalidade desportiva. Correspondentemente, excluem-se do seguro os riscos derivados da prática de modalidades desportivas diversas. De igual forma, a cobertura obrigatória apenas abrange o acidente, ou seja, não inclui toda a lesão derivada da prática desportiva, como sejam os processos degenerativos progressivos que não tenham a sua causa num evento fortuito, externo, violento e súbito”.

        Quer isto dizer que o legislador, ao publicar o regime jurídico do seguro desportivo obrigatório (seguro derivado da actividade desportiva não profissional), expressamente afirma que o desígnio do diploma será o de que os praticantes de actividade desportiva possam usufruir da cobertura do seguro, de forma a evitar-se que as vítimas não obtenham o respectivo ressarcimento patrimonial, assim se preenchendo “uma necessidade social fundamental”. Os riscos susceptíveis de serem abrangidos pelo seguro desportivo serão, nomeadamente (para o que aqui importa), os atinentes à integridade física dos praticantes, abrangendo a cobertura obrigatória do acidente decorrente da actividade desportiva, não incluindo, porém, toda a lesão derivada da prática desportiva, como sejam os processos degenerativos progressivos que não tenham a sua causa num evento fortuito, externo, violento e súbito”.

Neste sentido estabelece o art. 1º nº 1 do diploma que “os agentes desportivos, os praticantes de actividades desportivas em infra-estruturas desportivas abertas ao público e os participantes em provas ou manifestações desportivas devem, obrigatoriamente, beneficiar de um contrato de seguro desportivo, acrescentando o nº 2 da norma que “a responsabilidade pela celebração do contrato de seguro desportivo referido no número anterior cabe às federações desportivas, às entidades que explorem infra-estruturas desportivas abertas ao público e às entidades que organizem provas ou manifestações desportivas”.

  Por sua vez, estabelece o art. 5º do diploma que “o seguro desportivo cobre os riscos de acidentes pessoais inerentes à respectiva actividade desportiva, nomeadamente os que decorrem dos treinos, das provas desportivas e respectivas deslocações, dentro e fora do território português, estabelecendo o nº 2, no que diz respeito à cobertura mínima, que “as coberturas mínimas abrangidas pelo seguro desportivo são as seguintes: a) Pagamento de um capital por morte ou invalidez permanente, total ou parcial, por acidente decorrente da actividade desportiva; b) Pagamento de despesas de tratamento, incluindo internamento hospitalar, e de repatriamento”.

  Trata-se, como é bom de ver, do seguro obrigatório mínimo imposto pelo dito diploma legal, cuja regulamentação, como se diz no douto acórdão recorrido “pressupõe elementos necessários (elementos que as partes não podem afastar), numa espécie de reserva de conteúdo mínimo da relação contratual correspondente, acaba por introduzir um importante elemento modelador do conteúdo desta relação

    No sentido de afastar o risco de as vítimas não lograrem obter, em caso de acidente[1], o respectivo ressarcimento material por parte das seguradoras, determina o art. 6º que “as apólices de seguro desportivo não podem conter exclusões que, interpretadas individualmente ou consideradas no seu conjunto, sejam contrárias à natureza da actividade desportiva ou provoquem um esvaziamento do objecto do contrato de seguro” (sublinhado nosso).

     No caso vertente, foi celebrado o contrato de seguro que os factos assentes indicam, designadamente, o contrato titulado pela apólice 9934150677, segundo o qual o proprietário e explorador do ginásio onde ocorreu o acidente transferiu para a 1ª R. Companhia de Seguros BB, SA, a responsabilidade que lhe caberia pelos danos causados a terceiros ou clientes com o ginásio ou a actividade nele exercida (facto acima referido sob o nº 3).

   Evidentemente que sendo o lesado utente[2] do ginásio em causa, face ao termos de cobertura mínima decorrente do dito diploma, o mesmo, como praticante de uma actividades desportiva[3], deve considerar-se incluído na correspondente cobertura e, consequentemente, beneficiar do seguro em questão.

   A recorrente sustenta que os danos sofridos pelo A. se encontram excluídos do âmbito de cobertura do contrato de seguro celebrado entre ela, recorrente, e 2° R., CC.

 Esta posição não é correcta, não só porque contraria os termos da cobertura do seguro imposta pelo dito Dec-Lei 10/2009, mas também porque, como iremos ver, do próprio âmbito do contrato celebrado pelas partes, a sua responsabilidade civil não poderá ser excluída, estando, antes, claramente aí incluída.

   Não poderemos deixar, desde logo, de sublinhar que, como já se viu, o art. 6º do dito Dec-Lei determina o impedimento de as apólices de seguro desportivo conterem “exclusões que, interpretadas individualmente ou consideradas no seu conjunto, sejam contrárias à natureza da actividade desportiva ou provoquem um esvaziamento do objecto do contrato de seguro”. Ou seja, deve ser repudiada, para o que aqui interessa, uma interpretação de cláusulas contratuais constante da apólice que levem ao afastamento dos riscos do contrato de seguro desportivo, o que leva a que se deva ter como excluída a restritiva interpretação sustentada pela Seguradora/recorrente segundo a qual, somente os clientes do beneficiário do seguro que frequentavam o ginásio com uma inscrição formalizada[4], é que estariam cobertos pelo seguro, deixando de fora todos os outros utentes, designadamente os que utilizavam o espaço a título gratuito, por mero favor pessoal do 2º R. (como era o caso do A.). É que não se vê como, face aos objectivos do dito diploma já acima referenciados, mais concretamente face ao seu desígnio de que os praticantes de uma actividade desportiva usufruam da cobertura do seguro (com vista, em caso de acidente, ao respectivo ressarcimento), esses utentes possam ser deixados de fora dessa cobertura.

     Por outro lado, não se vislumbra que dos próprios termos do contrato celebrado entre a Seguradora e o 2º R., seja possível excluir a responsabilidade da ora recorrente, antes pelo contrário. Na verdade, como também se afirma no douto acórdão recorrido, nas cláusulas contratuais expressamente se fala na cobertura de “terceiros” e neste conceito, claramente, devem ter-se como englobados não só os clientes do 2º R. (ou seja, os que lhe pagam uma prestação monetária), mas também todos os utentes do ginásio.

     Segundo cremos, o termo “terceiro” é utilizado para designar todos os que frequentem o ginásio no âmbito de uma actividade desportiva e é empregue porque essas pessoas são alheias (logo, são terceiras), em relação às partes contratantes, o 2º R. (o apelidado “beneficiário”) e a Seguradora. Decorre dos próprios termos contratuais a exclusão do âmbito do seguro de determinadas pessoas frequentadoras do espaço[5], mas não dos utilizadores do ginásio em práticas desportivas. Assim, o A., como se refere no douto acórdão recorrido, preenche o conceito de “terceiro”, conforme se encontra definido no próprio contrato.

        Também dos próprios termos contratuais, decorre que ficou abrangida pela cobertura do seguro (cobertura automática) a responsabilidade civil extra-contratual (risco 24) do segurado na qualidade de proprietário do edifício (ginásio) seguro e, nesse contexto, ficaram “garantidas as reparações pecuniárias com fundamento em responsabilidade civil extracontratual decorrente de lesões corporais e/ou materiais involuntariamente causadas a terceiros, que, nos termos da lei, sejam exigidos ao segurado na sua qualidade de proprietário do edifício seguro”. Isto é, também desta cláusula contratual será possível inferir que a situação do 2º R., como dono do espaço seguro e incurso em responsabilidade civil extracontratual[6] geradora de reparação pecuniária por lesões corporais sofridas pelo A., se deve ter como incluída no âmbito de cobertura do contrato de seguro celebrado. Não faria qualquer sentido que assim não fosse, face ao teor de tal cláusula.

       Foi, por conseguinte, certo o entendimento do douto acórdão recorrido de que o dever de indemnizar recai, assim, exclusivamente sobre a 1ª R. Seguradora “uma vez que se entende que, por força do contrato de seguro celebrado, a responsabilidade civil extracontratual pela prática dos factos aqui dados como provados que o 2º Réu teria que assumir perante o Autor se mostra transferida para a 1ª Ré”.

                        O recurso improcede, portanto.

                        III- Decisão:

  Por tudo o exposto, nega-se a revista.

                        Custas pela recorrente.

Elabora-se o seguinte sumário (arts. 679º e 663º nº 7 do C.P.Civil):

              Os danos sofridos pelo A. encontram-se incluídos no âmbito de cobertura do contrato de seguro celebrado entre a Seguradora e 2° R., CC.

             A posição da recorrente da exclusão do seguro dos danos sofridos pelo A. não é correcta, não só porque contraria os termos da cobertura do seguro imposta pelo Dec-Lei 10/2009 de 12 de Janeiro, mas também porque, dos próprios termos do contrato celebrado pelas partes, a sua responsabilidade não poderá ser excluída, estando, antes, claramente aí incluída.

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[1] Na terminologia legal “evento fortuito, externo, violento e súbito”.
[2] Ou seja, utilizador dos serviços fornecidos pelas instalações desportivas.
[3] O mesmo estava na altura, como se provou, a fazer exercícios de abaixamentos junto do suporte onde se encontravam halteres de vários pesos.

[4] Porque ausente da matéria de facto provada, desconhece-se se o 2º R., na qualidade de prestador dos serviços desportivos, comunicou, ou não, ou tinha (até) de comunicar à sua Seguradora, para o cálculo do risco, o número de utentes/clientes frequentadores do ginásio, pelo que a argumentação da recorrente neste âmbito carece de sentido.

[5] Por exemplo, como se assinala no aresto recorrido, os trabalhadores com actividade profissional no local.
[6] E note-se que foi nesta espécie de responsabilidade que o acórdão recorrido fundamentou a responsabilidade do A..