Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
708/11.5TTMTS-A.P1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: PINTO HESPANHOL
Descritores: PESSOA COLETIVA
EXTINÇÃO
FUSÃO DE EMPRESAS
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
CASO JULGADO FORMAL
DESERÇÃO DA INSTÂNCIA
Data do Acordão: 04/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO EM GERAL / INSTÂNCIA / SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA / EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA.
Doutrina:
-Eurico Lopes Cardoso e Álvaro Lopes Cardoso, Manual dos Incidentes da Instância em Processo Civil, 3.ª Edição, p. 253;
-Salvador da Costa, Incidentes da Instância, 2.ª Edição, p. 211.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 269.º, N.º 1, ALÍNEA A), 270.º E 281.º.
CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS (CSC): - ARTIGO 162.º, 163.º, N.OS 2, 4 E 5 E 164.º, N.OS 1, 2 E 5.
LEI ORGÂNICA DO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, DO MAR, DO AMBIENTE E DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO, APROVADA PELO DL N.º 7/2012, DE 17/01.
LEI ORGÂNICA DO INSTITUTO DA MOBILIDADE E DOS TRANSPORTES, APROVADA PELO DL N.º 236/2012, DE 31/10, ALTERADA PELO DL N.º 44/2014, DE 20/03, E PELO DL N.º 77/2014, DE 14/05, ESTE ÚLTIMO RETIFICADO PELA DECLARAÇÃO DE RETIFICAÇÃO N.º 31/2014, DE 12/06.
AUTORIDADE DA MOBILIDADE E DOS TRANSPORTES, CRIADA PELO DL N.º 78/2014, DE 14/05, RETIFICADO PELA DECLARAÇÃO DE RETIFICAÇÃO N.º 33/2014, DE 02/07, E ALTERADO PELO DL N.º 18/2015, DE 02/02.
LEI ORGÂNICA DO MINISTÉRIO DA ECONOMIA, APROVADA PELO DL N.º 11/2014, DE 22/01, ALTERADA PELOS DL N.º 78/2014, DE 14/05, N.º 82/2014, DE 20/05 E N.º 14/2015, DE 26/01.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:


- DE 27-02-2014, PROCESSO N.º 6062/09.8TCLRS.L1-6, IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I.  No caso de transformação ou fusão de pessoa coletiva ou sociedade, ou extinção de sociedade comercial, partes na causa, a instância não se suspende, apenas se efetuando, se for necessário, a substituição dos seus representantes.

II.  Porém, tendo o tribunal declarado suspensa a instância, «por força do preceituado nos arts. 269.º, n.º 1, al. a), e 270.º do Código de Processo Civil, ex vi do art. 1.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho», despacho notificado às partes e que transitou em julgado, fica este a ter força obrigatória dentro do processo.

III.  Proferido um primeiro despacho a declarar suspensa a instância, cujo fundamento se revelou insubsistente, e documentada, posteriormente, a extinção, por fusão, do réu, só com a notificação do despacho que decidiu nova suspensão da instância é que as partes ficaram cientes da necessidade de habilitação do sucessor da pessoa coletiva extinta.

IV.  Deste modo, o prazo de seis meses estabelecido no artigo 281.º do Código de Processo Civil deve ser contado a partir da notificação do despacho que decidiu nova suspensão da instância.
Decisão Texto Integral:


Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

                                                    I

1. Em 19 de julho de 2011, na Comarca do Porto, Matosinhos — Instância Central — 3.ª Secção do Trabalho — J1, AA, BB, CC e DD instauraram ação declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato de trabalho contra (1) ASSOCIAÇÃO GPL – EMPRESA DE TRABALHO PORTUÁRIO DO DOURO E LEIXÕES, (2) SINDICATO DOS ESTIVADORES, CONFERENTES E TRÁFEGO DOS PORTOS DO DOURO E LEIXÕES, (3) ANEE – ASSOCIAÇÃO NACIONAL DAS EMPRESAS OPERADORAS PORTUÁRIAS, (4) ANESUL – ASSOCIAÇÃO DOS AGENTES DE NAVEGAÇÃO E EMPRESAS OPERADORAS PORTUÁRIAS, (5) AOP – ASSOCIAÇÃO MARÍTIMA E PORTUÁRIA, (6) AOPL – ASSOCIAÇÃO DOS OPERADORES DO PORTO DE LISBOA, (7) AOPPDL – ASSOCIAÇÃO DOS OPERADORES PORTUÁRIOS DOS PORTOS DO DOURO E LEIXÕES, (8) AGEPOR – ASSOCIAÇÃO DOS AGENTES DE NAVEGAÇÃO DE PORTUGAL, (9) ANUC – ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE UTENTES PRIVATIVOS E DE CONCESSIONÁRIOS DE SERVIÇO PÚBLICO DE ÁREAS PORTUÁRIAS e (10) IPTM – INSTITUTO PORTUÁRIO E DOS TRANSPORTES MARÍTIMOS, I. P., pedindo que (i) se declare nula e de nenhum efeito a extinção do Esquema Portuário Complementar de Reformas levada a cabo pelos réus na sequência do Pacto de Concertação Social no Setor Portuário, celebrado em 12 de julho de 1993, por falta do cumprimento das normas legais aplicáveis, nomeadamente por não ter havido a intervenção do Ministro da Tutela da Fundação Esquema Portuário Complementar de Reformas, (ii) se condene os réus a cumprir todas as obrigações de financiamento do Esquema Portuário Complementar de Reforma até que a extinção do mesmo seja legalmente concretizada, no período compreendido entre janeiro de 1994 e aquela extinção, (iii) se condene os réus a pagar-lhes a quantia de € 78.740,87, acrescidos de juros contados sobre € 62.692,87, desde a citação até efetivo e integral pagamento.

A ação prosseguiu seus termos, conferindo-se a representação da ré ausente ANEE – Associação Nacional das Empresas Operadoras Portuárias ao Ministério Público, nos termos do n.º 1 do artigo 21.º do Código de Processo Civil, sendo que, em 13 de outubro de 2016, as 1.ª, 4.ª, 5.ª, 6.ª, 7.ª, 8.ª e 9.ª rés requereram, ao abrigo do n.º 1 do artigo 281.º do Código de Processo Civil, que a instância fosse declarada deserta por negligência dos autores, dado o processo se encontrar a aguardar impulso processual (instauração de incidente de habilitação) há mais de seis meses.

Os autores responderam, sustentando o indeferimento do requerido, tendo sido proferido despacho que considerou não se vislumbrar «que o processo, por negligência dos autores, tenha estado sem impulso processual por mais de seis meses» e que julgou improcedente a invocada extinção da instância por deserção.

2. Inconformadas, as indicadas rés apelaram para o Tribunal da Relação, que julgou o recurso de apelação procedente, revogando a decisão recorrida e declarando verificada a deserção da instância, com a consequente extinção da mesma, sendo contra esta deliberação que os autores ora se insurgem, mediante recurso de revista, em que alinham as conclusões seguintes:

               
«1.ª   O douto acórdão recorrido não levou em atenção o concreto circunstancialismo do caso decidindo, tendo olvidado um facto essencial para se apurar o termo inicial do cômputo do prazo previsto no art. 281.º, n.º 1, do C.P.Civil: A instância foi suspensa em 06/01/2015, por decisão do tribunal, com o fundamento da extinção do Réu IPTM, ao abrigo do disposto no art. 269.º, n.º 1, a), do C. P. Civil, após requerimento deste Réu sustentado no D.L. n.º 7/2012, de 7/01, não se encontrando nessa data extinto o referido Réu.
           2.ª    No decurso do período de suspensão da instância foi dado conhecimento nos autos que aquele Réu não se havia ainda extinguido, por não se encontrar ainda concluído o processo de fusão do mesmo.
         3.ª    A decisão recorrida olvida ainda que face a esta informação e caso o IPTM não esclarecesse qual o ato administrativo que operou a sua extinção, ou não tivesse tal ato sido ainda proferido, os recorrentes requereram que os autos prosseguissem os seus termos.
                 4.ª    Só em 14/10/2015, o mandatário do Réu IPTM, meses depois de renunciar ao mandato, informou o tribunal que, afinal, aquele só fora extinto em Agosto de 2015, conforme despacho n.º 9434/2015, publicado no D.R. n.º 161, 2.ª série, de 19/08/2015, cuja cópia juntou aos autos.
                5.ª    É inequívoco que nos presentes autos o pressuposto que determinara a suspensão da instância em 06/01/2015 — a extinção do Réu IPTM — não se verificava a essa data, pelo que se impunha uma tomada de posição do tribunal quanto à manutenção da suspensão da instância, ou anulação do processado, bem como quanto aos novos factos alegados e meios de prova juntos que sustentavam a suspensão da instância por extinção do Réu, só ocorrida em agosto de 2015.
                6.ª    A mera comunicação aos recorrentes do requerimento em que o mandatário do Réu IPTM comunica que este já se encontra extinto não tem a virtualidade de por si só conduzir automaticamente à suspensão da instância.
                 7.ª    O tribunal de primeira instância fez a devida ponderação dos factos e tomou posição quanto a esta questão, pelo despacho de 09/11/2015, no qual, em vez de declarar nula a decisão de suspender a instância, por à data não se verificar ainda a causa dessa suspensão, para vir a declará-la novamente suspensa quando se mostrava já verificada essa causa, optou por não praticar atos inúteis e agilizar o processado, limitando-se a decretar nova suspensão da instância, tendo tal decisão transitado em julgado.
              8.ª    Ao optar por agilizar deste modo o processado, o tribunal de primeira instância não poderia deixar de conceder aos recorrentes nova oportunidade para impulsionarem os autos no prazo de 6 meses, sendo que não o fazendo os estaria a penalizar por não ter declarado nulo o processado anterior e a prejudicá-los por uma irregularidade a que apenas o Réu IMTP deu causa, o que linearmente esclareceu no despacho recorrido.
         9.ª    O douto despacho recorrido do tribunal de primeira instância com liminar clareza esclarece a sua visão dos factos e transmite a mesma a todos os intervenientes processuais, dizendo que “(...) Acresce que, no caso dos autos, uma vez que se veio a revelar insubsistente o fundamento para a suspensão da instância determinada pelo despacho” de 06/01/2015, “já que a extinção do réu só ocorreu posteriormente, vindo a ser documentada em 14/10/2015, importa considerar que se iniciou um novo prazo de 6 meses para os efeitos previstos no art. 281.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, com o despacho de 09/11/2015 e respetiva notificação às partes em 16/11/2015. (...)”
               10.ª  Face ao teor do despacho supra transcrito, constata-se que constitui clamoroso erro a conclusão do Venerando Tribunal a quo de que o despacho de 09/11/2015 proferido pelo tribunal de primeira instância “não tem a virtualidade de marcar o termo inicial da contagem do prazo de deserção, sendo que tal início não está dependente dessa (ou de outra) prévia decisão judicial, situando-se antes a partir do momento em que a parte, ou seja os AA, estavam em condições de requerer a habilitação, o que ocorreu, como referido a 19/10/2015”.
                11.ª  Mostra-se assim violado pelo Venerando Tribunal a quo o disposto no art. 281.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil.
               12.ª  Não existe qualquer fundamentação no douto acórdão recorrido que sustente o pressuposto legal da negligência dos recorrentes, legalmente previsto no art. 281.º, n.º 1, do C.P.Cívil.
                13.ª  A interpretação do conceito de negligência plasmado no n.º 1 do art. 281.º do C.P.Cívil, operada no douto acórdão recorrido é indevidamente redutora, sendo que não se mostra consagrada qualquer presunção legal de negligência que à parte incumba afastar.
                14.ª  No juízo de aferição da negligência na conduta da parte a quem incumbia impulsionar os autos, mesmo que só com base nos elementos constantes do processo, importa aferir se a mesma atuou de forma censurável, preterindo, por força da sua conduta omissiva esse ónus de impulsionar os autos, no prazo de 6 meses de que legalmente dispõe para esse efeito.
               15.ª  Tendo em conta as circunstâncias deste caso concreto, nunca poderiam os recorrentes, durante o inicial período de suspensão da instância requerer a habilitação de sucessor de uma parte que afinal não se encontrava extinta.
               16.ª  Nem lhes era exigível que presumissem quais as consequências que o tribunal iria retirar da informação do ilustre mandatário do Réu IPTM prestadas em outubro de 2015, quanto à data da extinção deste Réu, designadamente se iria anular o processado, fazer cessar a suspensão da instância por a causa que a determinou não se verificar, ou considerar válida a anterior suspensão.
                17.ª  Não lhes era exigível que considerassem iniciado o prazo de 6 meses para impulsionarem os autos, com a sua notificação em 19/10/2015, pelo ilustre mandatário do referido IPTM, sendo que esperavam que o tribunal proferisse despacho esclarecendo se os autos prosseguiriam, se seria anulado o processado ou decretada nova suspensão da instância.
               18.ª  O Meritíssimo Tribunal de 1.ª instância tribunal veio esclarecer toda a situação proferindo o despacho de 09/11/2015, no qual referiu expressamente que decretava nova suspensão da instância, tendo tal decisão transitado em julgado.
                19.ª  Caso entendesse o tribunal que o prazo já se encontrava em curso, a lisura e a cooperação processual exigiriam que advertisse as partes de que a contagem do prazo previsto no art. 281.º, n.º 1, do C. P. Civil, se havia já iniciado, o que não só não fez, como ainda esclareceu o sentido de todo o teor do seu despacho de 09/11/2015, nos termos constantes da conclusão 9.ª.
               20.ª  Em consequência de tal despacho, e de todo o circunstancialismo que o precedeu, não podiam os recorrentes, de boa-fé, deixar de entender que era dessa data e não de qualquer outra que seria contado o prazo de 6 meses que a concluir-se poderia levar à deserção da instância.
               21.ª  Todo o processado conduzia à conclusão de que a deserção da instância só ocorreria decorridos seis meses após o despacho de 09/11/2015, e não era evidente qual a entidade do Estado para que haviam sido transmitidas as competências do instituto extinto, pelo que não existiu qualquer negligência dos recorrentes.
               22.ª  Aliás, tal entendimento foi também o do Meritíssimo Tribunal de 1.ª instância que no seu douto despacho que foi revogado pela decisão aqui em crise, não só corroborou o supra exposto como fez uma interpretação e contextualização do seu despacho de 09/11/2015.
                23.ª  Daí que, também nesta parte tenha a douta decisão aqui em crise violado o disposto no art. 281.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil, e também o disposto no art. 607.º, n.º 4, ambos do Cód. Proc. Civil.
               24.ª  Não concordam os recorrentes com o entendimento defendido no douto acórdão recorrido de que a declaração de deserção da instância tenha natureza meramente declarativa, bem como as conclusões que retira desse entendimento para o caso concreto.
                25.ª  Por força da alteração introduzida no C. P. Civil pela Lei n.º 41/2013, de 26/06, foi abolida a interrupção da instância, anteriormente prevista no art. 285.º do C. P. Civil, e a deserção da instância deixou de ser automática, como sucedia na anterior versão do C. P. Civil, sendo excluído da redação do atual art. 281.º, n.º 1, a expressão “independentemente de qualquer decisão judicial”, que constava do anterior art. 291.º n.º 1.
               26.ª  Para que a instância fique deserta é, assim, necessário, despacho do juiz, que aprecie, quer o período de tempo em que o processo se encontra a aguardar o impulso processual da parte que tem o ónus de o promover, verificando se o mesmo excede ou não os seis meses previstos na citada disposição legal; quer a conduta das partes, com vista a aferir se essa falta de impulso é ou não imputável a título de negligência à parte que tinha o ónus de o fazer, julgando a questão, conforme referido no citado n.º 4, e não se limitando a declarar a deserção, ainda que com efeitos retroativos.
               27.ª  Com a redação legal introduzida pela Lei n.º 41/2013, no C. P. Civil, reintroduziu-se quanto à deserção o regime do Código de Processo Civil de 1939, tendo a decisão do juiz quanto à deserção efeito constitutivo.
                28.ª  Uma vez que os recorrentes vieram impulsionar os autos, instaurando incidente de habilitação de sucessor do IPTM em 09/05/2016, não tendo antes sido julgada deserta a instância, não pode proceder o entendimento plasmado no douto acórdão de que se recorre, de que a instância se extinguiu por deserção.
               29.ª  Ao não entender assim, violou o Meritíssimo Tribunal a quo o disposto no art. 281.º do Cód. Proc. Civil.
               30.ª  Devido aos inúmeros problemas de citação de um dos réus — só em 2017 lhe foi nomeado patrono — e à extinção de um outro, foram feitos ao processo inúmeros requerimentos com vista à normal composição da lide, tendo sempre funcionado o sistema requerimento/despacho/requerimento/despacho, agindo sempre as partes no pressuposto de que a cada novo requerimento cabia o exercício do direito do contraditório e a pronúncia final do Meritíssimo Juiz de 1.ª instância.
                31.ª  Dentro do aludido circunstancialismo a gestão processual (art. 6.º do Cód. Proc. Civil) correu sempre com a plena observância do princípio da cooperação entre as partes e tribunal (art. 7.º do Cód. Proc. Civil), tendo sempre sido respeitado o princípio da boa-fé processual (art. 8.º Cód. Proc. Civil).
               32.ª  O comportamento de todas as partes processuais, recorridos incluídos, foi sempre no sentido supra exposto, sendo que, conforme se refere, e bem, no douto voto de vencido, o douto despacho de 09/11/2015 poderia ter sido atacado pelos recorridos, o que não aconteceu, tendo, por isso, transitado em julgado.
                33.ª  Tendo em atenção todo o processado, o modo como a gestão do processo estava a ser feita e o teor do douto despacho do Meritíssimo Juiz de 1.ª instância era expectável para todos os intervenientes processuais que o prazo de 6 meses previsto no art. 281.º do Cód. Proc. Civil apenas se iniciasse com a notificação, em 16/11/2015, do douto despacho de 09/11/2015.
                34.ª  As expectativas, criadas pelo Tribunal de 1.ª instância e pelo rito processual imprimido pelo mesmo ao processo, ficaram ainda mais reforçadas com o teor do douto despacho recorrido que considerou não se verificar qualquer deserção da instância, precisamente com base em todo o modo como tinha sido conduzido o processo, pelas partes e pelo tribunal.
                35.ª  Por isso, a douta decisão de 1.ª instância deveria ter sido mantida, pelo que ao não entender assim violou o Venerando Tribunal a quo o disposto nos arts. 6.º, 7.º, 8.º e 620.º, n.º 1, todos do Cód. Proc. Civil, bem como os arts. 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) e 20.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, por violação dos princípios do caso julgado, da boa-fé processual e da certeza e segurança jurídicas.»

Termina propugnando que o presente recurso deve ser julgado procedente e, em consequência, revogado o acórdão recorrido, conforme as conclusões enunciadas.

As 1.ª, 4.ª, 5.ª, 6.ª, 7.ª, 8.ª e 9.ª rés contra-alegaram, aduzindo, em síntese:

               «A)   Os autos ficaram a aguardar pelo impulso processual das partes desde 19 de outubro de 2015, tendo a deserção da instância ocorrido em 19 de abril de 2016;
                 B) O Despacho do Tribunal de 1.ª instância proferido a 9 de novembro de 2015 não tem a virtualidade de marcar o termo inicial do prazo previsto no n.º 1 do artigo 281.° do CPC;
                 C) Os Autores atuaram com negligência, sendo-lhes imputável a paragem do processo durante o mencionado período;
                 D) O despacho judicial que declara a deserção da instância tem natureza declarativa e efeitos retroativos, pelo que não estava o Tribunal a quo impedido de conhecer dessa questão;
                  E) Não foi violado o caso julgado do Despacho de 1.ª instância proferido a 9 de novembro de 2015 e tão-pouco se mostram violados os princípios da gestão, cooperação e boa-fé processual, nem da confiança, certeza e segurança jurídicas.»

A final, sustentam a improcedência do recurso de revista ajuizado.

3. A questão nuclear suscitada no recurso circunscreve-se a saber se, no caso vertente, não se verificam os pressupostos da extinção da instância por deserção.

Preparada a deliberação, cumpre julgar o objeto do recurso interposto.
                                              II

1. O Tribunal recorrido deu como provados os factos seguintes:
1) Em 2014.12.01, foi apresentado, nos autos, o seguinte requerimento: «O Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, IP., réu nos autos supra identificados em que são autores AA e outros, vem, ao abrigo do disposto no artigo 270.º do Código de Processo Civil, expor e, a final, requerer a V. Ex.ª o seguinte:
1.º Os presentes autos dizem respeito ao Esquema Portuário Complementar de Reforma (EPCR) a que esteve, de alguma forma, ligado o IPTM, IP,
2.º Conforme consta abundantemente documentado nos autos. Porém,
3.º O Decreto-Lei n.º 7/2012, de 17 de janeiro, veio extinguir o Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, IP (IPTM, IP), o aqui oposto (artigo 34.º, n.º 3, alínea l), sendo que,
4.º Tal diploma legal foi originado no Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território.
5.º Não tendo sido expressamente determinada uma entidade sucessora relativamente às atribuições, direitos e obrigações a que respeitam os presentes autos. Acontece que,
6.º O IPTM, IP, pessoa coletiva pública, distinta do Estado, pertence à administração indireta deste, e,
7.º Atualmente não detém quaisquer instalações, pessoal, equipamento ou ativo.
8.º Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 269.º e n.º 1 do artigo 270.º, ambos do Código do Processo Civil, a instância suspende-se imediatamente quando se extinguir alguma das partes.
9.º Cessando tal suspensão logo que seja notificada a decisão que considere habilitado o sucessor da pessoa extinta [artigo 276.º, n.º 1 – a) do Código Processo Civil]. Por outro lado,
10.º Sendo o IPTM, IP, pessoa coletiva pública integrante da administração indireta do Estado, uma vez extinto, sucede-lhe o Estado, neste caso, através do Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, atualmente denominado por Ministério da Agricultura e do Mar, com sede na Praça do Comércio, 1149-010 LISBOA.
Nestes termos, vem requerer a V. Ex.ª a suspensão dos presentes autos, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 269.º do Código Processo Civil.»
2) Sobre este requerimento incidiu o seguinte despacho, de 2015.01.06: «Fls. 1032 e ss. Considerando o teor do Dec. Lei n.º 7/2012, de 17/01, que extinguiu o Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, IP [artigo 34º, nº 3, alínea l)], por força do preceituado nos arts. 269.º, n.º 1, al. a), e 270.º do Código de Processo Civil “ex vi” do art. 1.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho, declaro suspensa a presente instância.»
3) Na sequência, em 2015.05.08, os autores expuseram e requereram:
«1- Os autores foram surpreendidos com o douto requerimento do réu IPTM, INSTITUTO PORTUÁRIO E DOS TRANSPORTES MARÍTIMOS, I.P. — ref.ª 18160986, enviado em 01-12-2014 — no qual é referida a sua extinção, no início do ano de 2012.
2- A surpresa dos autores prende-se com o facto de nos presentes autos ter sido apresentada a douta contestação do réu IPTM, IP, no dia 26 de outubro de 2012, tendo o dito réu estado presente na Audiência Preliminar que teve lugar no dia 14-01-‑2014, sendo em ambos os atos representado pelo seu Ilustre Mandatário, Sr. Dr. EE, também aqui mandatário do mesmo réu, tudo como melhor se vê dos documentos adiante juntos sob os n.os 1 e 2, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos (Docs. n.os 1 e 2).
3- Atendendo ao insólito da situação, o signatário encetou diligências no sentido de tentar obter informação que lhe permitisse perceber a situação, uma vez que não é normal uma entidade extinta contestar ações e [fazer-se] representar em atos judiciais ocorridos quase dois anos depois da sua extinção.
4- Nesse sentido tentou confirmar a informação veiculada no douto requerimento ref.ª …, enviado em 01-12-2014, e verificou que, neste momento, existem pelo menos duas entidades a quem foram atribuídas competências que eram anteriormente do ainda réu IPTM, IP.
5- Uma dessas entidades é o Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, I.P. (IMT, I.P.), cuja Lei Orgânica foi aprovada pelo Decreto-Lei n.º 236/2012, de 31 de outubro, alterada pelo Decreto-Lei n.º 44/2014, de 20 de março, e pelo D.L. n.º 77/2014, de 14 de maio, este último retificado pela Declaração de Retificação n.º 31/2014, de 12 de junho, tudo como melhor se vê dos documentos adiante juntos sob os n.os 3 e 4 (Docs. n.os 3 e 4).
6- De acordo com o disposto no art. 3.º, n.º 5, do D.L. n.º 77/2014, de 14 de maio, “São atribuições do IMT, I.P., em matéria relativa ao setor dos portos comerciais, da navegabilidade do rio Douro e transportes marítimos:
[São descritas as respetivas atribuições].”
7- A outra entidade é a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes, criada pelo D.L., n.º 78/2014, de 14 de maio, retificado pela Declaração de Retificação n.º 33/2014, de 2 de julho, e alterado pelo D.L. n.º 18/2015, de 2 de fevereiro, tudo como melhor se vê do documento adiante junto sob o n.º 5 (Doc. n.º 5).
8- De acordo com o disposto no art. 5.º, n.º 4, do D.L. n.º 78/2014, de 14 de maio, “São atribuições da AMT em matéria relativa ao setor dos portos comerciais e dos transportes marítimos e fluviais:
[São descritas as respetivas atribuições].”
9- Face ao teor dos aludidos Decretos-Leis não se consegue vislumbrar com precisão qual das duas entidades ficou com as competências do réu IPTM, I.P., relacionadas com o assunto em questão, sendo certo que, neste momento, nenhuma das duas entidades está integrada no Ministério da Agricultura do Mar, mas sim no Ministério da Economia, conforme resulta da Lei Orgânica do mesmo — D.L. 11/2014, de 22/01, alterada pelos D.L. n.º 78/2014, de 14/05, n.º 82/2014, de 20/05 e n.º 14/2015, de 26/01 —, arts. 5.º e 6.º (cfr. Doc. n.º 6).
10- Assim sendo, e face ao supra exposto, requer sejam notificados o Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, I.P., sito na Av. das Forças Armadas, 40, 1649-022 Lisboa, e a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes, também na mesma morada, com cópia da p.i. e da contestação apresentada pelo réu IPTM, I.P., no sentido de indicarem qual das duas sucedeu nos direitos e obrigações do IPMT, I.P., relativamente às questões relacionadas com o EPCR.
11- Pese embora este não seja o procedimento normal nestas situações, a verdade é que face à verdadeira confusão legislativa que se instalou sobre a transferência das competências do IPTM, I.P., neste momento não é possível proceder à habilitação prevista na lei de forma certa e segura, correndo-se o risco de se habilitar um sem número de entidades até se acertar na correta.
12- Pelas razões expostas, requer também que seja declarado interrompido o prazo de suspensão da instância, apenas recomeçando o prazo no momento em que se tiver a certeza de quem é a entidade competente para contradizer o pedido formulados pelos autores na presente ação, tudo com as legais consequências.»
4) O M.mo Juiz, em 2015.06.04, proferiu o seguinte despacho: «Fls. 1041 e ss. Notifique o Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, I.P., sito na Av. das Forças Armadas, 40, 1649-022 Lisboa, e a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes, também na mesma morada, a fim de informarem qual das duas entidades sucedeu nos direitos e obrigações do IPMT, I.P., relativamente às questões relacionadas com o Esquema Portuário Complementar de Reformas (EPCR). Para total esclarecimento remeta cópia da contestação apresentada pelo réu IPTM, I.P., requerimentos de fls. 1032, 1033 e 1041 a 1045 e despacho de fls. 1035.»
5) O Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT,IP) respondeu nos termos constantes de fls. 43-46 dos autos, no sentido de que «não sucedeu (nem o IMT, IP nem a AMT) ao IPTM, IP, relativamente às questões relacionadas com o EPCR (Esquema Portuário Complementar de Reformas)».
6) Os autores, em 2015.07.13, apresentaram o seguinte requerimento:
«1- Resulta do requerimento a que ora se responde que o processo de extinção do réu IPTM, IP, ainda não estará concluído, ou seja, de facto, e de direito, o mesmo continua a ter existência legal.
2- Assim sendo, e salvo sempre o devido respeito por opinião diversa, o réu IPTM, IP, tem legitimidade passiva nos presentes autos, não havendo necessidade de habilitar qualquer outra entidade em sua substituição, pelo menos até que o processo de fusão esteja concluído.
3- A não ser assim, os autores poderiam entrar numa espiral sucessiva de habilitações, as quais iriam sempre soçobrar em argumentações similares à ora esgrimida pelo IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P.
4- Por isso, no modesto entender dos autores é imperativo que, antes do mais, seja notificado o réu IPTM do teor do requerimento do IMT e, face ao alegado nos arts. 28.º a 33.º do mesmo, indicar qual a decisão, ou ato administrativo, que determinou a conclusão do seu processo de fusão, juntando cópia do mesmo, para se aferir da entidade competente para contradizer a pretensão dos autores nos presentes autos.
5- Se tal ato já tiver sido proferido, ou vier a ser entretanto proferido, deve ser concedido aos autores prazo para requererem a habilitação da nova entidade que tenha sucedido ao réu IPTM; caso contrário, deverão os presentes autos prosseguir os seus termos, tudo com as legais consequências.»
7) Em 2015.09.17 e 2015.10.12, o M.mo Juiz proferiu o seguinte despacho: «Fls. 1121 e ss. Face ao alegado nos arts. 28.º a 33.º do teor do esclarecimento do IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P., determino de novo a notificação do co-réu IPTM, na pessoa do seu Exmo. mandatário judicial, para, em 10 dias, indicar qual a decisão ou ato administrativo que determinou a conclusão do seu processo de fusão, devendo juntar cópia do mesmo. Para total esclarecimento remeta cópia do esclarecimento do IMT de fls. 1112 a 1119.»
8) Em 2015.10.14, foi junto aos autos o seguinte requerimento: «EE, advogado, que foi mandatário do réu IPTM, IP, nos autos acima indicados, em que é autora AA e outros, vem informar que o referido IPTM, I.P., já está definitivamente extinto, uma vez que já foi declarado concluído o respetivo processo de extinção, conforme despacho n.º 9434/2015, publicado no D.R. n.º 161, 2.ª série, pág. 23659, de 19 de agosto de 2015, de que junto cópia (Doc. n.º 1)», requerimento este notificado entre mandatários, incluindo aos mandatários dos AA., nos termos do art. 221.º do CPC.
 9) O M.mo Juiz, em 2015.11.09, proferiu o seguinte despacho: «Considerando o teor do Dec. Lei n.º 7/2012, de 17/01, que extinguiu o Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, IP [artigo 34.º, n.º 3, alínea l)], tendo inclusivamente sido já declarado concluído o respetivo processo de extinção, conforme despacho n.º 9434/2015, publicado no D.R. n.º 161, 2.ª série, pág. 23659, de 19 de agosto de 2015 (cuja cópia consta de fls. 1128 e 1129), por força do preceituado nos arts. 269.º, n.º 1, al. a), e 270.º do Código de Processo Civil “ex vi” do art. 1.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho, declaro suspensa a presente instância.»
10) Tal despacho foi notificado às partes, por ofício datado de 2015.11.11.
11) Em 2016.05.09, os autores requereram: «Por isso, face ao supra exposto, e tendo em conta o disposto no art. 28.º, n.º 1, do D.L. 251-A/2015, de 17/12/2015, e ao abrigo do disposto nos arts. 351.º e segs. do Cód. Proc. Civil (cfr. Ac. do TRL de 27-02-2014, proc. n.º 6062/09.8TCLRS.L1-6, publicado in www.dgsi.pt) requerem a habilitação do Ministério do Mar em substituição do réu I.P.T.M., I.P., o qual poderá ser notificado na Rua da Imprensa à Estrela, n.º 4, 1200-888 Lisboa, na pessoa de Sua Excelência, a Ministra do Mar, Sr.ª Eng.ª ..., tudo com as legais consequências.»
12) Em 2016.06.07, o M.mo Juiz proferiu o seguinte despacho: «Fls. 1135 e ss. O autor veio deduzir incidente de habilitação do Ministério do Mar, em substituição do réu IPTM, IP, a notificar na pessoa de Sua Excelência, a Ministra do Mar, Sr.ª Eng.ª FF. Afigurando-se-nos que o Ministério, enquanto parte integrante do Governo, como resulta do Dec. Lei n.º 251-A/2015, de 17/12/2015, carece de personalidade jurídica e/ou judiciária, determina-se a notificação do autor para, no prazo de 10 (dez) dias, esclarecer, se pretende a habilitação do Ministério ou, ao invés, a habilitação do Estado, em substituição do réu, IPTM, I.P.»
13) Em 2016.06.20, os autores requereram «a habilitação do Estado Português, em substituição do réu IPTM, I.P., tudo com as legais consequências».
14) Em 2016.09.15, o M.mo Juiz proferiu o seguinte despacho: «Resulta do estatuído no art. 351.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que o incidente de habilitação deve ser deduzido contra as partes sobrevivas e contra os sucessores do falecido (ou, no caso, da parte extinta) que não sejam requerentes, mostrando-se, assim, consagrado um caso de litisconsórcio necessário passivo (art. 33.º, n.º 1, do citado diploma legal) — (cfr., neste sentido, Salvador da Costa, in Incidentes da Instância, 2.ª ed., pág. 211 e Eurico Lopes Cardoso e Álvaro Lopes Cardoso, in Manual dos Incidentes da Instância em Processo Civil, 3.ª ed., pág. 253). Nesta conformidade, notifique o(a)(s) requerente(s) para, no prazo de 10 dias, apresentar(em) um novo requerimento inicial no qual demande(em) a(s) parte(s) sobreviva(s) e o habilitando que não seja(m) requerente(s).»
15) Em 2016.09.27, os autores deduziram incidente de habilitação, nos termos constantes de fls. 61-65 dos autos, contra:
«1- Estado Português, que poderá ser notificado através do Ministério do Mar em substituição do réu I.P.T.M., I.P., o qual poderá ser notificado na Rua da Imprensa à Estrela, n.º 4, 1200-888 Lisboa, na pessoa de Sua Excelência, a Ministra do Mar, Sr.ª Eng.ª FF;
2- Associação G.P.L. – Empresa de Trabalho Portuário do Douro e Leixões, com sede na Rua Óscar da Silva, n.º 56, Leça da Palmeira, Matosinhos;
3- Sindicato dos Estivadores, Conferentes e Tráfego dos Portos do Douro e Leixões, com sede na Rua Congosta do Abade, n.º 83, Leça da Palmeira;
4- ANEE – Associação Nacional das Empresas Operadoras Portuárias, com sede na Rua Projetada à Avenida Afonso III, Lote 3, 1.º direito, Lisboa;
5- ANESUL – Associação dos Agentes de Navegação e Empresas do Tráfego e Estiva do Sul, com sede na Avenida Alexandre Herculano, n.º 22, rés-do-‑chão direito, 2900-205 Setúbal;
6- AOP – Associação dos Agentes de Navegação e Empresas Operadoras Portuárias, com sede na Avenida Luísa Todi, 1, 1.º, 2900-459 Setúbal,
7- AOPL – Associação dos Operadores Portuários de Lisboa, com sede no Cais de Alcântara, 1, 2.º, 1350-355 Lisboa;
8- AOPPDL – Associação dos Operadores Portuários dos Portos do Douro e Leixões, com sede na Rua Óscar da Silva, n.º 56, 1.º, 4450-752 Leça da Palmeira; 
9- AGEPOR – Associação dos Agentes de Navegação de Portugal, com sede na Av. Dr. Antunes Guimarães, n.º 505, 3.º, 4450-621 Leça da Palmeira;
10- ANUC – Associação Nacional dos Utentes Privativos e dos Concessionários de Serviço Público de Áreas Portuárias, que poderá ser citada na pessoa do seu Secretário-Geral, Sr. Dr. GG, com domicílio profissional na Av. António Augusto Aguiar, n.º 19, 1.º Dt., 1050-012 Lisboa.» 
16) Em 2016.10.13, os réus requereram a «extinção da presente instância, por deserção, com as legais consequências».
17) Em 2016.10.27, os autores responderam pelo indeferimento do requerido pelos réus.
18) Em 2017.01.10, o M.mo Juiz proferiu a decisão recorrida.

Os factos materiais fixados pelo tribunal recorrido não foram impugnados pelas partes, nem ocorre qualquer das situações mencionadas no n.º 3 do artigo 682.º do Código de Processo Civil, pelo que será com base naqueles factos que há de ser resolvida a questão a apreciar no âmbito do presente recurso.

2. Os recorrentes sustentam, em síntese, que, no caso vertente, não ocorrem os pressupostos da extinção da instância por deserção, pelo que o acórdão recorrido ofendeu o preceituado no n.º 1 do artigo 281.º do Código de Processo Civil.

Refira-se que a 1.ª instância concluiu não se vislumbrar «que o processo, por negligência dos autores, tenha estado sem impulso processual por mais de seis meses», tendo julgado improcedente a invocada extinção da instância por deserção.

Diversamente, o acórdão recorrido deliberou que «a deserção da instância ocorreu aos 19.04.2016, pelo que, quando o primeiro requerimento a solicitar a habilitação (do Ministério do Mar) foi apresentado (aos 09.05.2016) já a instância de mostrava deserta e, por maioria de razão, o estava quando o segundo requerimento, de 16.06.2016, a requerer a habilitação do Estado, foi apresentado».

Estando em causa a verificação da extinção da instância por deserção, na sequência da comunicação de extinção do réu IPTM – Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, I. P., em 1 de dezembro de 2014, isto é, em plena vigência do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, que entrou em vigor em 1 de setembro de 2013, aplica-se o regime jurídico daquele Código.

Tal como foi explicitado no acórdão recorrido:

              «2.1.1. No que se reporta ao período decorrido até 14.10.2015, não há qualquer razão para considerar deserta a instância.
                    Com efeito, e ainda que o tribunal a quo haja, por despacho de 06.01.2015, determinado (bem ou mal, o que, para o que agora interessa, é irrelevante) a suspensão da instância por alegada extinção do IPTM, IP, a verdade é que desde essa suspensão até 14.10.2015, o processo não esteve parado por falta de impulso processual dos AA., os quais, nesse período, requereram diligências com vista ao apuramento de qual a entidade que àquele havia sucedido, diligências essas pertinentes e que aliás como tal foram consideradas pelo tribunal a quo, que as deferiu, sendo que, entre cada um dos requerimentos que apresentaram nesse sentido não decorreram mais de seis meses. Ou seja, não se verificam, quanto a esse período temporal, os requisitos da deserção.
                     2.1.2. A questão da deserção coloca-se, todavia, no que se reporta ao período desde 19.10.2015 a 09.05.2016.
                      Com efeito, aos 14.10.2015,  o IPTM veio informar estar definitivamente extinto (e tendo junto o Despacho 9434/2015), do que os AA. se consideram notificados a 19.10.2015 (3.º dia posterior à notificação dessa informação, sendo que os dias 17 e 18 foram sábado e domingo) e só aos 09.05.2016 é que vieram requerer a habilitação do Ministério do Mar, sendo que, nesse  período, que é superior a 6 meses, nada vieram requerer […].»

O artigo 269.º do Código de Processo Civil, diploma a que pertencem os preceitos adiante citados, sem menção da origem, estabelece no n.º 1 que a instância se suspende «[q]uando falecer ou se extinguir alguma das partes, sem prejuízo do disposto no artigo 162.º do Código das Sociedades Comerciais» [alínea a)], e adita, no n.º 2 seguinte, que, «[n]o caso de transformação ou fusão de pessoa coletiva ou sociedade, parte na causa, a instância não se suspende, apenas se efetuando, se for necessário, a substituição dos representantes».

Por sua vez, o artigo 162.º do Código das Sociedades Comerciais reza que «[a]s ações em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.os 2, 4 e 5, e 164.º, n.os 2 e 5» (n.º 1), acrescentando que «[a] instância não se suspende nem é necessária habilitação» (n.º 2).

Assim, no caso de transformação ou fusão de pessoa coletiva ou sociedade, ou de extinção de sociedade comercial, partes na causa, a instância não se suspende, apenas se efetuando, se for necessário, a substituição dos seus representantes.

O certo é, porém, que o tribunal de 1.ª instância, perante a comunicação da extinção do réu IPTM, declarou suspensa a instância, «por força do preceituado nos arts. 269.º, n.º 1, al. a), e 270.º do Código de Processo Civil, “ex vi” do art. 1.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho», despacho que transitou em julgado, sendo que, tendo-se revelado insubsistente o fundamento para a dita suspensão, pois a extinção do réu só ocorreu posteriormente, vindo só a ser documentada em 14 de outubro de 2015, com a junção de cópia do Despacho n.º 9434/2015, de 10 de agosto de 2015, que declarou «concluído o processo de extinção, por fusão, da DGPA do IPTM, I. P., com efeitos reportados à data do presente despacho», decidiu nova suspensão da instância, «por força do preceituado nos arts. 269.º, n.º 1, al. a), e 270.º do Código de Processo Civil, “ex vi” do art. 1.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho», despacho de 9 de novembro de 2015, «notificado às partes, por ofício datado de 2015.11.11» [facto provado 10)], e que transitou em julgado, pelo que, nos termos do n.º 1 do artigo 620.º, tem força obrigatória dentro do processo.

O artigo 277.º prevê que a instância se extingue com a deserção [alínea c)], dispondo o artigo 281.º, sob a epígrafe «Deserção da instância e dos recursos», que, «[s]em prejuízo do disposto no n.º 5, considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses» (n.º 1) e, também, que «[a] deserção é julgada no tribunal onde se verifique a falta, por simples despacho do juiz ou do relator» (n.º 4).

Os pressupostos da deserção da instância são, assim, a omissão de impulso processual há mais de seis meses e a negligência da parte a quem cabia esse impulso, sendo que a lei prevê  a necessidade de decisão judicial a declarar a deserção.

A questão que se coloca é a de saber a partir de que momento é que são contados os ditos seis meses, pressuposto para a extinção da instância por deserção.

Ora, proferido um primeiro despacho a declarar suspensa a instância, cujo fundamento se revelou insubsistente, e documentada, posteriormente, a extinção, por fusão, do réu IPTM, que, face ao estipulado no n.º 2 do artigo 269.º, não implicaria a suspensão da instância, só com a notificação do despacho de 9 de novembro de 2015, que, independentemente do valor jurídico daquele primeiro despacho, decidiu nova suspensão da instância, é que as partes ficaram cientes da necessidade de habilitação do sucessor da pessoa coletiva extinta [artigo 276.º, n.º 1, alínea a)].

Deste modo, o prazo de seis meses estabelecido no artigo 281.º deve ser contado a partir da notificação do despacho proferido em 9 de novembro de 2015, que decidiu suspender novamente a instância, e não da notificação do requerimento apresentado, em 14 de outubro de 2015, pelo mandatário do réu IPTM.

Assim, uma vez que o despacho de 9 de novembro de 2015 foi notificado, por ofício datado de 11 de novembro de 2015, às partes, estas devem considerar-se notificadas em 16 de novembro seguinte, iniciando-se o prazo de seis meses em 17 de novembro de 2015, donde, em 9 de maio de 2016, quando os autores requereram a habilitação do Ministério do Mar, em substituição do réu I.P.T.M., ainda não tinha decorrido o prazo de seis meses, pressuposto para a deserção da instância.

3. E nem se diga que os requerimentos apresentados pelos autores, em 9 de maio de 2016 [facto provado 11)] e em 20 de junho de 2016 [facto provado 13)], não relevam para os efeitos em causa, face às deficiências que lhes foram apontadas.

Com efeito, tal como lucidamente se entendeu no acórdão recorrido «ainda que deficientes, os AA. com eles requereram a habilitação das entidades aí referidas (primeiro, do Ministério do Mar e, depois, na sequência do esclarecimento determinado no despacho de 07.06.2016, do Estado Português). Pese embora os vícios que o requerimento de habilitação possa apresentar, ele não deixa de constituir ato consubstanciador de impulso processual.»

                                             III

Pelo exposto, delibera-se conceder a revista, revogar o acórdão recorrido e julgar improcedente a invocada extinção da instância por deserção, determinando-se que a ação prossiga seus termos.

Custas, nas instâncias e no recurso de revista a cargo das 1.ª, 4.ª, 5.ª, 6.ª, 7.ª, 8.ª e 9.ª rés, que requereram a extinção da instância por deserção.

Anexa-se o sumário do acórdão.

                             Lisboa, 11 de abril de 2018

Pinto Hespanhol (Relator)

Gonçalves Rocha

António Leones Dantas