Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
161/10.0GHSTC-A.S1
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: PIRES DA GRAÇA
Descritores: HABEAS CORPUS
PRESSUPOSTOS
CÚMULO JURÍDICO
TRÂNSITO EM JULGADO
Data do Acordão: 04/18/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: HABEAS CORPUS
Decisão: INDEFERIDO
Área Temática:
DIREITO PENAL – CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO FACTO / ESCOLHA E MEDIDA DA PENA / DESCONTO / PENA ANTERIOR.
DIREITO PROCESSUAL PENAL – MEDIDAS DE COACÇÃO E DE GARANTIA PATRIMONIAL / MEDIDAS DE COACÇÃO / MODOS DE IMPUGNAÇÃO / HABEAS CORPUS EM VIRTUDE DE PRISÃO ILEGAL.
Legislação Nacional:
CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGO 81.º, N.º 1.
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGO 222.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

- DE 26-10-2000, PROCESSO N.º 3310/00;
- DE 24-10-2001, PROCESSO N.º 3543/01;
- DE 25-10-2001, PROCESSO N.º 3551/01;
- DE 29-05-2002, PROCESSO N.º 2090/02;
- DE 01-02-2007, PROCESSO N.º 350/07;
- DE 03-05-2007, PROCESSO N.º 1594/07;
- DE 24-10-2007, PROCESSO N.º 3976/07;
- DE 04-02-2009, PROCESSO N.º 325/09.


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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:

- DE 24-09-2003, PROCESSO N.º 571/03.
Sumário :
I - O habeas corpus é apenas um meio extraordinário de controlo da legalidade actual da prisão, estritamente vinculado aos pressupostos e limites determinados pela lei.
II - Encontrando-se o requerente em cumprimento da pena de 2 anos e 6 meses de prisão, proferida em cúmulo no processo X, de acordo com o disposto no art. 81.º, n.º 1, do CP “Se a pena imposta por decisão transitada em julgado for posteriormente substituída por outra, é descontada nesta a pena anterior, na medida em que já estiver cumprida”.
III - Inexistindo trânsito em julgado da decisão que realizou o novo cúmulo jurídico, mantém-se válidas as decisões transitadas em julgado das condenações que o possibilitaram, nomeadamente, a decisão, transitada em julgado, que condenou o peticionante em cúmulo jurídico na pena de 2 anos e 6 meses de prisão.
IV - Sendo a prisão do peticionante ordenada por entidade competente (a autoridade judiciária), por facto pelo qual a lei permite (o cumprimento da pena de prisão em consequência de ilícitos criminais cometidos pelo condenado) e mantendo-se a prisão dentro do prazo máximo da duração da pena, não se encontra o condenado em situação de prisão ilegal, não se prefigurando a existência dos pressupostos de concessão da providência extraordinária de “habeas corpus”, mormente o invocado pelo requerente.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


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No processo com o nº 161/10.0GHSTC do Tribunal Judicial de Comarca de … - Juízo Central Criminal de … – J… vem AA, ARGUIDO identificado nos autos, apresentar, por intermédio de Advogado, Petição de Habeas Corpus

“Com os fundamentos no art.º nº 1º e das al. b) e c) do nº 2 do art. 222 º do CPP, o que faz com fundamento nos factos seguintes.


Foi proferido Acordão cumulatório em 15/03/2019, nos presentes autos, onde ficou decidido a pena cumulatória a aplicar ao arguido AA,

Contudo,


O arguido, encontrando-se em prazo, recorreu do douto Acordão cumulatório, encontrando-se a aguardar provimento,

Sendo que,


No douto Acordão proferido em 15/03/2019, ficou decidido …”devolução dos mandados para condução do arguido ao EP, que se encontram pendentes, sem cumprimento.”….

Tendo em conta que o mesmo arguido já cumpriu pena por conta dos processos 166/10.1PAMRA e 18/11.8PAMRA, penas essas que devem ser descontadas na agora decidida por Acórdão cumulatório, não tendo sido ainda apurada a pena efetiva a cumprir,


Mais ainda,


O Arguido foi ILEGALMENTE detido e conduzido ao EP, por mandados emitidos pelo Juízo de Competência Genérica de … – Juiz …, a data de 14/11/2016 e 27/02/2017, cf. doc. 1 e 2 que junta,

Assim,


Foi o Arguido ordenado deter e ser conduzido ao EP, por entidade incompetente, cf. alínea a) nº2, do art.º 222º,

Bem como,


O arguido foi detido no dia de ontem, 10/04/2019, quando o mesmo, em tempo, recorreu da douta decisão do Acordão cumulatório, proferido em 15/03/2019, encontrando-se a aguardar provimento.

Logo,


Deve o Arguido ser restituído á Liberdade de forma imediata.

Neste sentido estão claramente preenchidos (do ponto de vista dos critérios vinculativos da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem) as exigências previstas nas invocadas alíneas do art. 222º CPP, verificando-se A Ilegalidade da detenção do Arguido e assim se fazendo imprescindível o presente requerimento de Habeas Corpus.

Requerer, como se requer, a concessão imediata da Providência de Habeas Corpus em razão de prisão ilegal.


Prova:

Documental

- Doc. 1 e 2, Acórdão cumulatório.”



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Foi prestada a informação a que alude o artigo 223º nº 1 do Código de Processo Penal, donde consta:

“Não obstante o alegado pelo arguido, desde logo se verifica que omite o mesmo que em sede de acórdão cumulatório o que se determinou foi que:

“Após trânsito:

(…)

- Solicite-se a devolução dos mandados para condução ao arguido ao EP que se encontram pendentes, sem cumprimento. Remetendo-se novos mandados após desconto da pena que o arguido já cumpriu à ordem dos Processos nºs. 166/10.1PAMRA e 18/11.8PAMRA”.

Com efeito, não se determinou a devolução imediata dos mandados para condução do arguido ao EP que se encontram pendentes, sem cumprimento, em virtude de só após o trânsito em julgado do acórdão cumulatório se passar a ter uma pena única que englobava as penas em que o mesmo foi condenado nestes autos e nos Procs. nºs. 166/10.1PAMRA e 18/11.8PAMRA, perdendo as penas parcelares a sua autonomia.

Enquanto não transitar o acórdão cumulatório mantêm-se, autonomamente, as decisões proferidas e transitadas em julgados.

Ora, o arguido recorreu da decisão cumulatória, no entanto, nos presentes autos, transitada em julgado (em 07/07/2016) temos a decisão proferida em 14/10/20015, confirmada pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, na qual o arguido foi condenado pela prática, em concurso real, de

- Um crime de roubo simples, em co-autoria e na forma consumada, p. e p. pelos artigos, 210.º/1, 14.º/1, 26.º e 30.º/1, todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão.

- Um crime de roubo simples, em co-autoria e na forma consumada, p. e p. pelos artigos, 210.º/1, 14.º/1, 26.º e 30.º/1, todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão.

- Em cúmulo jurídico, foi o mesmo condenado na pena única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Isto é, não tendo a aludida pena, ainda, perdido a sua autonomia, pois o acórdão cumulatório não transitou em julgado, temos que o arguido se encontra condenado na pena de dois anos e seis meses de prisão, que ainda não cumpriu.

Na verdade, não obstante a emissão de mandados de detenção e condução do arguido para cumprimento da mesma pena desde 14-11-2016, pela autoridade judicial competente, os mesmos nunca chegaram a ser cumpridos em virtude do arguido nunca ter sido localizado.

Do que fica referido, desde logo se conclui que a detenção e condução do arguido ao EP para cumprimento da pena de prisão efectiva que se encontra condenado nestes autos por decisão transitada em julgado não padece de qualquer ilegalidade.

Por último, apenas se dirá que só transitado o acórdão cumulatório é que cumprirá descontar as penas que o arguido cumpriu no âmbito dos processos incluídos no aludido cúmulo.

Assim, por se considerar legal, mantém-se a prisão a que se encontra sujeito o arguido AA.”



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      Remetida a presente providência com os necessários elementos ao Supremo Tribunal de Justiça, convocou-se a Secção Criminal do mesmo, e efectuadas as devidas notificações, realizou-se a audiência pública, nos termos legais.



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A Secção Criminal reuniu seguidamente para deliberação, a qual imediatamente se torna pública:


O artigo 31º da Constituição da República Portuguesa, integrante do título II (Direitos, Liberdades e Garantias) e capítulo I (Direitos, liberdades e garantias pessoais), determina que:

 1. Haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente.

2. A providência do habeas corpus pode ser requerida pelo próprio ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos.

3. O juiz decidirá no prazo de oito dias o pedido de habeas corpus em audiência contraditória.


A previsão e, precisão, da providência, como garantia constitucional, não exclui, porém, o seu carácter extraordinário, vocacionado para casos graves, anómalos, de privação de liberdade, de fundamento constitucionalmente delimitado, que se traduzam em abuso de poder, ou por serem ofensas sem lei ou por serem grosseiramente contra a lei, não constituindo no sistema nacional um recurso dos recursos e muito menos um recurso contra os recursos.

Tal não significa que a providência deva ser concebida, como frequentemente o foi, como só podendo ser usada contra a ilegalidade da prisão quando não possa reagir-se contra essa situação de outro modo, designadamente por via dos recursos ordinários (cf. Ac.do STJ de 29-05-02, Proc. n.º 2090/02 -3.ª Secção, onde se explana desenvolvidamente essa tese).

Com efeito, a natureza extraordinária da providência não se refere à sua subsidiariedade em relação aos meios de impugnação ordinários das decisões judiciais, mas antes e apenas à circunstância de se tratar de «providência vocacionada a responder a situações de gravidade extrema, com uma celeridade incompatível com a prévia exaustação dos recursos ordinários e com a sua própria tramitação.

A providência visa, pois, reagir, de modo imediato e urgente, contra a privação arbitrária da liberdade ou contra a manutenção de uma prisão manifestamente ilegal, ilegalidade essa que se deve configurar como violação directa, imediata, patente e grosseira dos seus pressupostos e das condições da sua aplicação.

Atento o carácter extraordinário da providência, para que se desencadeie exame da situação de detenção ou prisão em sede de habeas corpus, há que se deparar com abuso de poder, consubstanciador de atentado ilegítimo à liberdade individual – grave, grosseiro e rapidamente verificável – integrando uma das hipóteses previstas no artigo 222º nº 2, do Código de Processo Penal (acórdão do Tribunal Constitucional de 24 de Setembro de 2003 in proc. nº 571/03)


Em suma:

A previsão - e precisão - da providência, como garantia constitucional, não exclui, porém, a sua natureza específica, vocacionada para casos graves, anómalos, de privação de liberdade, como remédio de urgência perante ofensas graves à liberdade, traduzidas em abuso de poder, ou por serem ofensas sine lege ou, grosseiramente contra legem, traduzidas em violação directa, imediata, patente e grosseira dos pressupostos e das condições da aplicação da prisão, que se apresente como abuso de poder, concretizado em atentado ilegítimo à liberdade individual – grave, grosseiro e rapidamente verificável.



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O artigo 222º do Código de Processo Penal, que se refere ao habeas corpus em virtude de prisão ilegal, estabelece:

1. A qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa, o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência de habeas corpus.

2. A petição é formulada pelo preso ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, é dirigida, em duplicado, ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, apresentada à autoridade à ordem da qual aquele se mantenha preso e, deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de:

a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;

b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou

c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial;



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O peticionante alega a ilegalidade da sua prisão por ter sido “ordenado deter e ser conduzido ao EP, por entidade incompetente, cf. alínea a) nº2, do art.º 222º,

Bem como,

O arguido foi detido no dia de 10/04/2019, quando o mesmo, em tempo, recorreu da douta decisão do Acordão cumulatório, proferido em 15/03/2019, encontrando-se a aguardar provimento.”


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Verifica-se dos elementos constantes dos supra identificados autos, relevantes para a presente providência, sintetizados na informação judicial prestada, que:


- Nos autos referidos nº 161/10.0GHSTC da Comarca de … - …. - Inst. Local- Seco Comp. Gen. – J…, foi julgado o arguido ora peticionante, constando da sentença proferida em 14 de Outubro de 2015, o seguinte:

VI - DISPOSITIVO:

Pelo exposto, o Tribunal julga a acusação pública procedente por provada e, consequentemente, decide:

•      Condenar o arguido AA pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo simples, na forma consumada, p. e p. pelos artigos, 210.°/1, 14.°/1,26.° e 30.°/1, todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão.

•      Condenar o arguido AA pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo simples, na forma consumada, p. e p. pelos artigos, 210.°/1, 14.°/1,26.° e 30.°/1, todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão.

•     Em cúmulo juridico, condenar o arguido AA na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão.

•      Condenar o arguido nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 2UC's (artigo 8.0/9 do Regulamento das Custas Processuais e respectiva tabela lU anexa).


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O Tribunal julga procedente o pedido de indemnização civil deduzido pela demandante, contra o demandado e, consequentemente, decide:

•    Condenar AA, no pagamento, ao Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E, a titulo de danos patrimoniais, de uma indemnização no valor de 147,OO€ (cento e quarenta e sete euros), acrescido de juros à taxa legal pata as obrigações civis, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

Notifique. Após trânsito:

- Remeta boletim ao Registo Criminal;

- Solicite ao processo 18/11.8PA1v.lRA, que corre termos no Tribunal Judicial de …, a emissão de mandados de ligamento/desligamento, para que o arguido possa cumprir a pena de prisão em que foi condenado nestes autos.

- Informe, igualmente, o TEP, enviando cópia da presente decisão.

Deposite (artigo 372.0/5 do Código de Processo Penal).


- O arguido interpôs recurso dessa decisão para o Tribunal da Relação de Évora, que por seu acórdão de 10 de Maio de 2016, acordou “em negar total provimento ao recurso interposto pelo arguido, AA, mantendo-se integralmente a sentença recorrida.

Custas pelo arguido, fixando-se a taxa de justiça em 3UC - cfr art. 513° do CPP, art. 8° n05 do RCP e Tabela lU a que se refere aquele preceito.”


- Em 27 de Outubro de 2016, nos mesmos autos nº 161/10.0GHSTC foi proferido o seguinte despacho:

“1. Determino a emissão de mandados de detenção do arguido para cumprimento da pena de prisão em que foi condenado nestes autos.

DN

2. Mais determino que se requisite e junte certificado de registo criminal do arguido, com vista a determinar a existência de eventual situação de conhecimento superveniente de concurso de crimes. “


- O Tribunal Coelctivo da Instãncia Central - Secção Criminal, da Comarca de …. . j…, veio a realizar audiência para cúmulo jurídico, referente ao mesmo arguido, tendo em 15 de Março de 2019, proferido acórdão com a seguinte:

“IV- DECISÃO

Em face de todo o exposto, e ao abrigo do art. 78°. Código Penal, decidem os juízes que constituem este Tribunal Colectivo:

- Efectuar o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido nos presentes autos (Proc. nº 161/10.0GHSTC), e a lhes aplicadas n º Processo n!! 166/10.1PAMRA, da Secção Única do Tribunal Judicial de lvloura e no Processo n!! 18/11.8P AMRA, da Secção Única do Tribunal Judicial de … e condenar o arguido AA na pena única de 6 anos e 4 meses de prisão.

Sem custas.

Após trânsito:

- Remeta boletins à DSIC;

- Solicite-se a devolução dos mandados para condução ao arguido ao EP que se encontram pendentes, sem cumprimento. Remetendo-se novos mandados após desconto da pena que o arguido já cumpriu à ordem dos Processos nºs.166/10.1PAMRA e 18/11.8PAMRA.

“Deposite - art. 372º, nº5, do C.P.P.

Notifique


- O arguido interpôs recurso, que foi admitido por despacho de 11 de Abril de 2019, do acórdão cumulatório para o Tribunal da Relação, não constando a existência de decisão transitada em julgado.


- O arguido terá sido detido em 10 de Abril de 2019



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O que tudo visto:

Como bem salienta a informação judicial prestada: “não se determinou a devolução imediata dos mandados para condução do arguido ao EP que se encontram pendentes, sem cumprimento, em virtude de só após o trânsito em julgado do acórdão cumulatório se passar a ter uma pena única que englobava as penas em que o mesmo foi condenado nestes autos e nos Procs. nºs. 166/10.1PAMRA e 18/11.8PAMRA, perdendo as penas parcelares a sua autonomia.

Enquanto não transitar o acórdão cumulatório mantêm-se, autonomamente, as decisões proferidas e transitadas em julgados.

Ora, o arguido recorreu da decisão cumulatória, no entanto, nos presentes autos, transitada em julgado (em 07/07/2016) temos a decisão proferida em 14/10/20015, confirmada pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, na qual o arguido foi condenado pela prática, em concurso real, de

- Um crime de roubo simples, em co-autoria e na forma consumada, p. e p. pelos artigos, 210.º/1, 14.º/1, 26.º e 30.º/1, todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão.

- Um crime de roubo simples, em co-autoria e na forma consumada, p. e p. pelos artigos, 210.º/1, 14.º/1, 26.º e 30.º/1, todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão.

- Em cúmulo jurídico, foi o mesmo condenado na pena única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Isto é, não tendo a aludida pena, ainda, perdido a sua autonomia, pois o acórdão cumulatório não transitou em julgado, temos que o arguido se encontra condenado na pena de dois anos e seis meses de prisão, que ainda não cumpriu.

Na verdade, não obstante a emissão de mandados de detenção e condução do arguido para cumprimento da mesma pena desde 14-11-2016, pela autoridade judicial competente, os mesmos nunca chegaram a ser cumpridos em virtude do arguido nunca ter sido localizado.

Do que fica referido, desde logo se conclui que a detenção e condução do arguido ao EP para cumprimento da pena de prisão efectiva que se encontra condenado nestes autos por decisão transitada em julgado não padece de qualquer ilegalidade.

Por último, apenas se dirá que só transitado o acórdão cumulatório é que cumprirá descontar as penas que o arguido cumpriu no âmbito dos processos incluídos no aludido cúmulo.”


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A providência do habeas corpus como providência extraordinária que é, não se destina a sindicar as decisões judiciais sobre os crimes verificados e as penas aplicadas, nomeadamente a pena conjunta, nem sobre os pressupostos desta, ou sobre incidentes no cumprimento da mesma, e não é o critério do recorrente ou, a sua interpretação, que define a liquidação da pena, sobre o modo e termos legais do seu cumprimento.

Como remotamente já decidiam os acórdãos deste Supremo e desta Secção, de 24 de Outubro de 2007, proc. 3976/07, e de 4 de Fevereiro de 2009, proferido nos autos 325/09,). - O habeas corpus não se destina a formular juízos de mérito sobre as decisões judiciais determinantes da privação de liberdade, ou a sindicar nulidades ou irregularidades nessas decisões – para isso servem os recursos ordinários - mas tão só a verificar, de forma expedita, se os pressupostos de qualquer prisão constituem patologia desviante (abuso de poder ou, erro grosseiro) enquadrável no disposto das três alíneas do nº 2 do artº 222ºdo CPP.,

Com efeito, um acto processual destinado a produzir efeitos jurídicos no processo, sem prejuízo da discussão e decisão que aí possa suscitar e, do direito ao recurso, quando admissível, só pode, porém, desencadear a providência extraordinária, de habeas corpus, se gerar consequência que integre um dos pressupostos constantes do artigo 222º nº 2 do Código de Processo Penal.


Por outro lado, como é jurisprudência consolidada deste Supremo, além dos fundamentos taxativamente previstos no nº 2 do artº 222º do CPP, para que possa colher o pedido de habeas corpus, é ainda necessário que a ilegalidade da prisão seja actual, actualidade reportada ao momento em que é necessário apreciar aquele pedido: incompetência da entidade donde partiu a prisão [art. 222.º, al. a)], motivação imprópria [al. b)] e excesso de prazos [al. c)]. – v.g  desde logo, entre outros, acórdãos de: 26-10-00, proc. n.º 3310/00; 25-10-01, proc. n.º 3551/01; 24-10-01, proc. n.º 3543/01; 01-02-2007, Proc. n.º 350/07; 03-05-2007, proc. n.º 1594/07;


O habeas corpus, é assim e, apenas, um meio extraordinário de controlo da legalidade actual da prisão, estritamente vinculado aos pressupostos e limites determinados pela lei.


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O Código de Processo Penal no título II do Livro X, trata da execução da pena de prisão.

Ao Ministério Público compete promover a execução das penas e ao tribunal competente para a execução decidir as questões relativas à execução das penas e medidas de segurança e à extinção da responsabilidade, conforme artº 473º e 474º do CPP.


O requerente encontra-se em cumprimento da pena de 2 anos e 6 meses de prisão, proferida em cúmulo no processo nº 161/10.0GHSTC, sendo que conforme Artigo 81.ºnº 1, do Código Penal,“1 - Se a pena imposta por decisão transitada em julgado for posteriormente substituída por outra, é descontada nesta a pena anterior, na medida em que já estiver cumprida.”

Parafraseando o Acórdão deste Supremo, em providência de habeas corpus, proc. 4824/06 – 5ª Secção, o habeas corpus não incide sobre penas virtuais ou hipotéticas, só se aplica a situações reais e actuais de prisão ilegal.


No caso em análise, a situação alegada pelo peticionante como fundamento de habeas corpus, encontra-se desactualizada e, por isso, ultrapassada, pois que inexistindo trânsito em julgado da decisão que realizou o cúmulo em 15 de Março de 2019, mantém-se válidas as decisões transitadas em julgado das condenações que o possibilitaram, nomeadamente aquela proferida em 14 de Outubro de 2015, que condenou em cúmulo juridico, o arguido AA na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, e que foi confirmada, em recurso pelo Tribunal da Relação de Évora, por seu acórdão de 10 de Maio de 2016, com trânsito em julgado em 7 de Julho do mesmo ano.


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A Constituição Política da República Portuguesa no artº 27º nº 1, permite a privação da liberdade, entre outras situações, “em consequência de sentença judicial condenatória pela prática de acto punido por lei com pena de prisão ou de aplicação judicial de medida de segurança.”


A pena de prisão em cujo cumprimento o ora peticionante se encontra resulta de decisão válida e exequível e tem força executiva em todo o território nacional (artºs 467º e 468º do CPP).


“Os presos são libertados por mandado do juiz, no termo do cumprimento da pena de prisão ou para início do período de liberdade condicional.”- artº 480º nº 1 do CPP.

A contagem da pena de prisão obedece ao disposto no artº 479º do CPP

Não consta impugnação sobre liquidação dessa pena.

E se o arguido foi detido em 10/04/2019, é evidente que se encontra em cumprimento de pena dentro do prazo de dois anos e seis meses de prisão aplicada nos autos nº 161/10.0ghstc por decisão transitada em julgado


Ainda não tendo decorrido o prazo de cumprimento da pena, em que o requerente actualmente se encontra não pode assim ser restituído à liberdade, porque se encontra preso, por ordem judicial, em cumprimento da pena supra referida, em que foi condenado,

     

Pelo exposto, sendo a prisão do peticionante ordenada por entidade competente, (a autoridade judiciária), por facto pelo qual a lei permite (cumprimento da pena de prisão em consequência de ilícitos criminais cometidos pelo condenado)) e mantendo-se a prisão dentro do prazo máximo da duração da pena, não se encontra o condenado em situação de prisão ilegal, não se prefigurando a existência dos pressupostos de concessão da providência extraordinária de habeas corpus, mormente o invocado pelo requerente.



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Termos em que, decidindo:


Acordam os deste Supremo – 3ª Secção -, em indeferir a petição de habeas corpus apresentada pelo condenado AA, por falta de fundamento bastante, nos termos do artigo 223º nº 4 al. a) do CPP:


Tributam o requerente em 2 UC nos termos da tabela anexa ao Regulamento das Custas Processuais, sem prejuízo de apoio judiciário.



Supremo Tribunal de Justiça, 18 de Abril de 2019

Elaborado e revisto pelo relator

Pires da Graça (Relator)

Clemente Lima

Henrique Araújo (Presidente)