Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3571/21.4T8VNG.P1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: MARIA OLINDA GARCIA
Descritores: RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO BIOLÓGICO
DANOS FUTUROS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
PERDA DA CAPACIDADE DE GANHO
CRITÉRIOS
EQUIDADE
PODERES DE COGNIÇÃO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Data do Acordão: 01/16/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: REVISTA IMPROCEDENTE.
Sumário :

I- Não é desconforme com os atuais parâmetros indemnizatórios, correspondentes à aplicação de critérios de equidade, a decisão de atribuir 29.925,00 Euros, a título de dano biológico (vertente patrimonial) a um lesado (vítima de acidente de viação) de 22 anos de idade, licenciado em Gestão de Turismo, que sofreu fratura do terço médio da clavícula esquerda (tendo sido submetido a cirurgia), ficou com Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 3 pontos, tem dificuldade em erguer ou transportar uma carga superior a 5 Kg com o braço esquerdo, sendo-lhe difícil suportar peso sobre a clavícula esquerda.


II- Também não é desconforme com os atuais padrões indemnizatórios a compensação de 15.000 Euros por danos morais conferida a esse jovem, que antes do acidente era saudável e escorreito, o qual ficou com uma cicatriz de 13 cm sobre a clavícula esquerda, o que lhe causa desgosto; ficou com uma placa com 9 cm de comprimento aplicado sobre o corpo da clavícula; ficou com um dano estético de 2 em 7; suportou um quantum doloris de grau 4 numa escala de 7, em consequência das lesões e dos tratamentos a que foi submetido.

Decisão Texto Integral:

Processo n. 3571/21.4T8VNG.P1.S1


Recorrente: AA


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


I. RELATÓRIO


1. AA, residente em ..., propôs a presente ação de condenação, com processo comum, contra “ZURICH INSURANCE PLC – Sucursal em Portugal”, com sede em ..., pedindo a condenação da Ré no pagamento de €99.821,00, acrescido de juros legais de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação, bem como no que se liquidar em ampliação do pedido ou em incidente de liquidação.


Para tanto alegou, em síntese, que no dia 29.09.2018, quando conduzia um motociclo, foi embatido pelo veículo ligeiro de passageiros, conduzido por BB, segurada da ré, a quem imputa a responsabilidade pelo embate que lhe causou danos de natureza patrimonial e não patrimonial.


2. A ré contestou, aceitando a responsabilidade do seu segurado no acidente, mas impugnando os danos e o valor peticionado a título de indemnização, por os considerar excessivos.


3. A primeira instância julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, decidiu, quanto ao dano biológico e aos danos morais, respetivamente:


«a) Condenar a Ré no pagamento da quantia de €16.000,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento.


b) Condenar a Ré no pagamento da quantia de €7.500,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a presente data e até efetivo e integral pagamento.


c) Absolver, no mais, a Ré do pedido


4. Inconformado com os montantes indemnizatórios atribuídos pela sentença, o autor interpôs recurso de apelação, pedindo que a indemnização pelo dano biológico fosse quantificada em 30.000 Euros, e que a compensação pelos danos morais fosse, igualmente, quantificada em 30.000 Euros.


5. O TRP concedeu parcial provimento ao recurso, e decidiu atribuir o montante de 29.925,00 Euros, a título de dano biológico, bem como o montante de 15.000 Euros a título de danos morais, quantificando a indemnização num total de 44.925,00 Euros.


6. Discordando dessa decisão, a ré interpôs recurso de revista, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:


«1ª. O presente recurso versa sobre os montantes das indemnizações fixadas a título de ressarcimento do dano biológico e do dano moral.


2ª - A indemnização pelo dano biológico sofrido pelo Autor foi arbitrada em Eur.16.000,00 na primeira instância e elevada para Eur. 29.925, 00 pela Relação;


3ª - Tal elevação não tem cabimento face aos factos provados.


4ª - Assenta em equívocos vários que, devidamente supridos, conduzem a uma acentuada diminuição da indemnização.


5ª - O douto acórdão recorrido funda-se no facto da incapacidade sofrida pelo A. implicar esforços suplementares para o trabalho habitual.


6ª - Porém, as lesões apresentadas pelo A. não implicam esforços suplementares para o exercício da atividade profissional.


7ª - Não pode haver qualquer dúvida a este respeito, até porque constitui matéria de facto assente, e admitida pelas partes.


8ª - Este equívoco justifica desde logo o aumento inusitado da verba concedida pelo douto acórdão, e o seu suprimento determina a redução da indemnização.


9ª - Mais sucede que o cálculo do tribunal ad quem tem por base um salário mensal estimado de Eur. 1.250,00, de todo em todo irrealista.


10ª - Na realidade, o A. exerce a função de rececionista e aufere um vencimento mensal bruto de Eur. 675,28 (cfr. documentos juntos com a douta p.i.), e não de Eur.1.250, 00.


11ª - Esta diferença, factual, aniquila o cálculo do douto acórdão recorrido e determina uma nova redução da indemnização, e significativa.


12ª - Sublinhe-se que o salário do A. se encontra em linha com os valores médios da sua profissão, quer à data do sinistro, quer mesmo no momento atual.


13ª - O salário a ter em consideração, em termos médios, após cinco anos de serviço deve ser, no máximo, de Eur. 840,00.


14ª - Mesmo recorrendo à plataforma Pordata, o salário de Eur. 860,60 representa o salário médio dos profissionais qualificados no setor do Alojamento e Restauração (como era o caso do autor, por ser licenciado).


15ª - A diferença para os Eur. 1.250,00 estimados no douto acórdão recorrido situa-se próxima dos Eur. 400,00 mensais! Quase metade do salário médio!


16ª – O valor de salário considerado no douto acórdão recorrido não tem adesão à realidade, não se funda em factos concretos, nem em qualquer tipo de tabela oficial.


17ª – Deve ser totalmente desconsiderado o cálculo operado no acórdão recorrido.


18ª - No que respeita ainda ao cálculo desta indemnização, o tribunal atendeu à esperança média de vida do Autor, e não ao limite da vida ativa.


19ª - Esta indemnização deve ser calculada até ao limite da sua vida ativa, ou seja, até aos 66 anos e quatro meses, altura em que passa a receber pensão de reforma, e não até aos 79 anos, sob pena de enriquecimento injusto, ou duplo ressarcimento.


20ª - Suprindo os equívocos ou lapsos que contribuíram para a sua injustificada elevação, a verba de dano biológico deve ser reduzida à sua justa medida.


21ª - Adotando o método de cálculo versado no acórdão recorrido, mas tendo em atenção o acima exposto, a indemnização deve ter por limite Eur. 15.892,80.


22ª - Este valor ainda deveria sofrer uma dedução em virtude do beneficio da antecipação do capital, operação que também não foi realizada pela Relação.


23ª - Deve, assim, ser reduzida a indemnização pelo dano biológico para a verba máxima de Eur. 16.000,00, tal como foi arbitrado em primeira instância, em linha com os Acórdãos da Relação de Lisboa, de 26 de setembro de 2017 (Proc. nº 10421/14.T2SNT-7, e com o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 19 de Junho de 2019 (Proc. nº 249/14.9TBMNC.G2.


24ª - Não pode deixar de se realçar duas incongruências na fórmula usada no Ac. recorrido – o salário do lesado (não havendo esforços acrescidos), e o acréscimo derivado da consideração de todo o período da esperança média de vida (injustificado após o recebimento da reforma).


25ª - Encontrando-se o A. afetado com um dano biológico de três pontos, mínimo, e sem esforços suplementares, a verba de Eur. 16.000,00 - mostra-se perfeitamente equilibrada, justa e adequada ao ressarcimento do dano em questão.


26ª - No que respeita ao dano moral, o Autor tem direito a uma compensação, mas que deverá ser sempre inferior a Eur. 15.000,00 (quinze mil euros).


27ª - A verba encontrada pela Relação encontra-se muito acima do patamar da jurisprudência corrente, para situações semelhantes, atentos os factos dados por provados, que devem ser dados por reproduzidos.


28ª - A Jurisprudência recente tem atribuído indemnizações de montante inferior, e a casos mais graves: Ac. STJ de 08-5-2012 (Proc. n.º 3492/07.3TBVFR.P1), Ac. TRG de 16-4- 2009 (Proc. n.º 197/2002.G1), Ac. TRG de 27-5-2021 e Ac. TRG de 19-6-2019 (Proc. n.º 249/14.9TBMNC.G2).


29ª - Atenta essa comparação, o montante de Eur. 15.000, 00 fixado pelo Tribunal da Relação mostra-se sobredimensionado e injustificado.


30ª - Os danos sofridos pelo A. foram de grau reduzido, de tal modo que apenas padece de uma incapacidade de 3 pontos, a qual nem implica esforços suplementares para a profissão habitual.


31ª - Assim, a verba de Eur. 7.500,00, fixada em primeira instância, revela-se justa e equilibrada face à concreta situação de facto provada, não devendo a compensação en cause ultrapassar este valor.


32ª - Trata-se de um montante com inteiro cabimento para compensar o dano moral do Autor, e sem qualquer ponta de miserabilismo.


33ª - A douta decisão recorrida violou, nomeadamente, o disposto nos art.ºs 483º, 487º nº 2, 496º e 570º do Código Civil, 607º, 615º nº 1, alínea d), 616º, 637º, 640º, 644º, 645º e 647º do Código de Processo Civil, que deverão ser interpretados de acordo com as presentes conclusões.


Nestes termos, e nos melhores de direito aplicáveis, que Vossas Exª.s doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, e, em consequência, revogada a douta decisão recorrida, devendo, em sua substituição, ser lavrado douto Acórdão que julgue procedentes as conclusões do presente recurso, com as legais consequências, como é da mais sã justiça.»


7. O autor, por sua vez, inconformado com o montante atribuído pelo TRP a título de danos morais (15.000 Euros), interpôs recurso de revista, que designou como recurso subordinado, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões:


«1.ª - Peca por escassez a indemnização (15.000.00€) fixada pelo Tribunal a quo a título de compensação pelos danos de natureza não patrimonial.


2.ª - Em relação ao valor destinado ao ressarcimento dos danos não patrimoniais, deve, no seu arbitramento, atender-se às consequências físicas e morais que para o recorrente resultaram do acidente.


3.ª - A extensa factualidade apurada e que aqui damos por reproduzida fala por si e é esclarecedora quanto às gravíssimas consequências que do acidente advieram para o recorrente.


4.ª - Valendo-nos, pois, da equidade e tendo em consideração as concretas circunstâncias do caso em apreço e a função ressarcitória e punitiva da indemnização, temos que a justa e equilibrada compensação pelos danos não patrimoniais sofridos deverá corresponder ao montante mínimo de 30.000,00€.


5.ª - O douto acórdão recorrido violou, entre outras normas, os artºs 483.º, 562.º, 564.º e 566.º, todos do Código Civil.


Nestes termos, deverá ser concedido provimento ao presente recurso alterando-se o douto acórdão recorrido em conformidade, ou seja, fixando o montante indemnizatório destinado a ressarcir o dano não patrimonial no valor ora preconizado


Cabe apreciar.


*


II. FUNDAMENTOS


1. Admissibilidade e objeto do recurso.


1.1. Começando por apreciar a revista interposta pelo autor, que este designou como recurso subordinado, facilmente se concluiu que tal recurso não é admissível, mesmo que se tenha limitado a discordar do montante atribuído como compensação pelos danos não patrimoniais. A primeira instância atribuiu-lhe o valor de 7.500 Euros e a Relação aumentou esse valor para 15.000 Euros. O recorrente pretende que, em revista, lhe seja concedido o montante de 30.000 Euros.


O facto de a pretensão do recorrente (de receber mais 15.000 Euros) não ultrapassar o valor da alçada da Relação, não seria, por si só, obstáculo à admissibilidade da revista subordinada, dado o disposto no art.633º, n.5 do CPC.


Todavia, após a prolação do AUJ n.1/2020 (publicado no DR de 30.01.2020) a revista subordinada não será admissível por se verificar a denominada “dupla conforme”, impeditiva do recurso de revista, nos termos do artigo 671º, n.3 do CPC.


Decidiu-se nesse AUJ que: «o recurso subordinado de revista está sujeito ao n.º 3 do art. 671.º do Código de Processo Civil, a isso não obstando o n.º 5 do art.633.º do mesmo código


Efetivamente, no presente caso, tanto a primeira instância como a Relação coincidiram no sentido de conceder ao autor indemnização pelos danos não patrimoniais, sem terem apresentado fundamentações essencialmente diferentes (dado tratar-se de decisão segundo critérios de equidade). Se a segunda instância tivesse confirmado exatamente o montante de 7.500 Euros, a coincidência de decisões seria total, havendo uma perfeita “dupla conforme”. Pelo facto de a Relação ter melhorado essa indemnização, não deixa de existir uma situação de dupla conformidade do sentido decisório (e em benefício do recorrente)1.


Veja-se, neste sentido, o que se afirma no Acórdão do STJ, de 14.09.2023 (relator Manuel Capelo)2, proferido no processo n.3847/20.8T8VIS.C1.S1:


«Se em recurso de apelação o recorrente obteve uma melhoria da sua situação fixada na sentença, por existir dupla conforme (melhorada) está impedido pelo art. 671º, nº3 do CPC de interpor recurso de revista.»


1.2. Quanto ao recurso interposto pela ré Zurich, dado que a segunda instância revogou parcialmente a sentença, em sentido desfavorável ao réu, e verificando-se os demais pressupostos gerais de recorribilidade previstos no art.629º, n.1 do CPC, a revista da ré é admissível nos termos do art.671º, n.1 do CPC.


O seu objeto (traçado pelas conclusões das alegações – art.635º, n.4 do CPC) consiste em saber se a decisão recorrida fez a correta aplicação do direito ao estabelecer os montantes indemnizatórios com os quais a ré não concorda.


2. Factualidade provada:


As instâncias deram como provados os seguintes factos:


«1) No dia 29 de setembro de 2018, pelas 14h56, ocorreu um acidente de viação na Rua..., sensivelmente em frente ao prédio urbano com o n.º de polícia 305, na freguesia de ..., concelho de ...;


2) Neste acidente intervieram o motociclo de matrícula ..-RE-.., conduzido pelo Autor, e o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..-FV-.., conduzido por CC.


3) No local do acidente, a citada artéria tem piso em asfalto e possui ali três faixas de circulação, sendo duas destinadas ao trânsito que se processa no sentido poente – nascente e uma terceira afeta ao trânsito de sentido oposto;


4) Tem ali a largura total de 9,30 metros e desenha-se em reta logo seguida de curva ligeira, que se desenvolve para o lado esquerdo, considerando o sentido poente – nascente;


5) Era, então, pleno dia, o tempo estava seco e a visibilidade era excelente;


6) Naqueles dia, hora e local, o Autor transitava pela Rua..., na direção poente - nascente, tripulando o mencionado motociclo ..-RE-..;


7) Ia animado de velocidade inferior a 50 km/hora;


8) Pela faixa de rodagem situada mais à direita, atento o seu referido sentido de marcha, a cerca de 1 metro do limite direito da via;


9) Aproximava-se do local onde, à margem direita da Rua..., considerando o sentido que levava, entronca um arruamento sem denominação oficial, que dá acesso ao parque de estacionamento do estabelecimento comercial B.... .....;


10) Nessa mesma ocasião, transitava pelo aludido arruamento sem denominação oficial o veículo ..-FV-.., que se dirigia à Rua...;


11) Antes de entrar na Rua..., deparou-se à condutora do ..-FV-.. um sinal regulamentar de trânsito, vertical em formato de triângulo invertido, indicativo de que deveria ceder a prioridade de passagem a quem transitasse pela Rua...;


12) E era intenção da condutora do ..-FV-.. prosseguir viagem pela Rua..., em direção a nascente;


13) Antes de efetuar a manobra de entrada na Rua..., a condutora do ..-FV-.. não se apercebeu que o motociclo tripulado pelo Autor se acercava do seu lado esquerdo, circulando pela Rua..., no dito sentido poente – nascente;


14) A condutora do ..-FV-.. invadiu a faixa direita da Rua..., considerando o mencionado sentido poente – nascente;


15) Quando o Autor se encontrava a menos de 10 metros de distância;


16) Quando já não dispunha de tempo, nem de espaço que lhe permitissem realizar uma travagem eficaz;


17) Ainda assim, o Autor travou e numa desesperada manobra de recurso, tentou ainda desviar-se para o seu lado esquerdo;


18) Esta tentativa resultou, porém, infrutífera porquanto a condutora do ..-FV-.. não se deteve e prosseguiu a sua manobra de entrada na Rua...;


19) E foi, assim, embater com a frente esquerda do ..-FV-.. na lateral direita do motociclo ..-RE-..;


20) Dando-se esse embate em plena faixa de rodagem do lado direito da Rua..., atento o sentido de marcha do Autor (poente – nascente);


21) O Autor, em consequência direta e necessária do acidente, foi projetado ao solo;


22) Logo após o acidente, o Autor foi assistido no local pelos bombeiros de ..., colocado em plano duro e com colar cervical e transportado, em ambulância, ao Centro Hospitalar de ..., onde foi assistido nos serviços de urgência;


23) Foi ali submetido a vários exames, incluindo RX, tendo-lhe sido diagnosticada fratura do terço médio da clavícula esquerda;


24) Fez tratamento conservador da fratura, que foi imobilizada com cruzado posterior;


25) Teve alta para o domicílio, sem marcação de consulta e com indicação para frequência de consulta de externa de Ortopedia;


26) Já no domicílio, o Autor mantinha um estado doloroso, ao nível do ombro;


27) Por isso, no dia mesmo dia 29.09.2018 o Autor recorreu ao Serviço de Urgência do Hospital ...;


28) Aí repetiu o Rx do ombro esquerdo, que confirmou a existência de fratura/luxação da clavícula esquerda, com encurtamento de cerca de 3 cm, tendo sido orientado para consulta de Ortopedia;


29) A 04.10.2018 foi submetido a cirurgia para tratamento da fratura no Hospital ... em que foi realizada osteossíntese da clavícula, com aplicação de placa e parafusos Variax (Stryker);


30) Teve alta hospitalar no dia seguinte, medicado com paracetamol, palexia e vitamina C e com indicação para frequência da consulta externa de Ortopedia;


31) Teve consulta de ortopedia em 09/10/2018, na qual foi observado e fez tratamento de penso;


32) Ulteriormente, manteve a frequência de consultas regulares de Ortopedia, que manteve até junho de 2019;


33) Em consequência do embate, das lesões sofridas e dos tratamentos a que foi submetido, o Autor viu-se limitado na realização das tarefas pessoais, carecendo de apoio de terceiro, que lhe foi prestado pela sua mãe, pelo período de cerca de um mês;


34) A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 3.06.2019;


35) O Défice Funcional Temporário Total situou-se entre 29.09.2018 e 30.09.2018 e entre 4.10.2018 e 05.10.2018, sendo assim fixável num período de 4 dias;


36) O Défice Funcional Temporário Parcial situou-se entre 1.10.2018 e 3.10.2018 e entre 6.10.2018 e 3.06.2019, sendo assim fixável num período 244 dias;


37) O Autor, como consequência direta e necessária do acidente, das lesões sofridas e dos tratamentos a que foi submetido apresenta fenómenos dolorosos na região da clavícula esquerda ao toque, em contacto com objetos pesados transportados sobre o ombro esquerdo e em relação com esforços com o membro superior esquerdo, que aliviam com a interrupção do esforço;


38) As sequelas apresentadas pelo Autor são compatíveis com o exercício da atividade habitual de rececionista de hotel, sem implicar esforços suplementares,


39) Apresenta dificuldade em suportar a alça das mochilas sobre a clavícula esquerda;


40) Apresenta dificuldade em erguer e transportar cargas superiores a 5 Kg com o membro superior esquerdo.


41) Tais sequelas não afetam o Autor em termos de autonomia e independência mas são causa de sofrimento físico, limitando-o em termos funcionais;


42) O Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica é fixável em 3 pontos;


43) Apresenta cicatriz de tipo cirúrgico com 13 cm de comprimento e 1 cm de largura sobre a clavícula com vestígios de sutura sobre a extremidade distal da clavícula;


44) Sendo ainda percetível a presença de material de osteossíntese (placa com 9 cm de comprimento) aplicado sobre o corpo da clavícula;


45) O Autor sente desgosto em virtude das cicatrizes de que é portador;


46) O dano estético permanente é fixável no grau 2, numa escala de 7 graus de gravidade crescente;


47) Em consequência do embate, das lesões e dos tratamentos a que foi sujeito, o Autor sofreu dores;


48) O quantum doloris é fixável no grau 4, numa escala de 7 graus de gravidade crescente;


49) À data do acidente, o Autor, que tinha concluído a licenciatura em Gestão de Turismo, procurava o primeiro emprego;


50) Anteriormente ao acidente, o A. era um jovem saudável e escorreito;


51) O Autor nasceu no dia ... de ... de 1996;


52) A responsabilidade civil emergente da circulação do veículo ..-FV-.. achava-se transferida para a Zurich Insurance Plc – Sucursal em Portugal, através do contrato de seguro titulado pela apólice n.º .....09, válido e em vigor na data do acidente.»


*


3. O direito aplicável


Não está em causa na presente revista a reapreciação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual (prevista no art.483º do CC). Essa matéria encontra-se definitivamente julgada pelas instâncias, que concluíram pela responsabilização da ré Seguradora para a qual se encontrava transferida, por contrato de seguro, a responsabilidade do agente do facto ilícito (colisão automóvel) causador dos danos sofridos pelo autor. O que se discute no presente recurso é apenas o montante indemnizatório que o acórdão recorrido atribuiu ao autor a título de dano biológico e de danos morais com base nos parâmetros legais estabelecidos, essencialmente, nos artigos 563, 566º, n.3 e 496º do CC.


3.1. Quanto ao denominado dano biológico, pode sintetizar-se o entendimento do acórdão recorrido nos seguintes extratos da sua fundamentação:


«(…) o dano biológico é reparável em qualquer caso e independentemente das consequências morais e patrimoniais que, da redução da capacidade laborativa, dele possam derivar; constitui um dano de esforço, porquanto o sujeito para conseguir desempenhar as mesmas tarefas e obter o mesmo rendimento, necessitará de um maior empenho, de um estímulo acrescido.


Nem as partes discutem esta questão, aceitando a reparabilidade do dano. O que se discute é o critério do ressarcimento.» (…)


E acrescentou-se: «(…) a lesão do direito ao corpo e à saúde é, enquanto dano autónomo, fonte de obrigação de indemnização, independentemente de quaisquer consequências pecuniárias ou atuais repercussões patrimoniais de qualquer natureza, mas a sua avaliação tem que ser acompanhada duma correta delimitação de realidades e conceitos, para que não haja sobreposições. (…)


E concluiu-se nos seguintes termos:


«Do que se trata é de calcular/fixar o montante indemnizatório que há de reparar a IPG (também chamado de défice funcional permanente da integridade físico-psíquica) de 3 pontos de que o A. ficou a padecer.


E temos, como único critério legal para a sua fixação a equidade (cfr. art. 566.º/3 do C. Civil), é certo que com o apoio da lógica matemática enquanto densificador do juízo decisório.


Em conclusão, a compensação do dano biológico, a fixar com apelo a juízos de equidade, terá em consideração, no caso dos autos que ficou provado que as sequelas decorrentes de um acidente ocorrido em 2018 determinaram para o A., então com 22 anos de idade, um DFPIF de 3 pontos. Ponderamos que: (i)a esperança média de vida (à data mais recente que puder ser atendida - a fim de atualizar o valor) no ano de 2022 para um cidadão do sexo masculino nascido em 1996 era a de 79 anos (Pordata), pelo que deverá ser contado o período de 57 anos, que é a diferença entre a idade do autor à data do sinistro e o limite referido para esperança média de vida; (ii) que o Autor era licenciado em Gestão e Turismo; (iii) à data do sinistro procurava o primeiro emprego; (iv) aceitando-se como razoável supor que virá a exercer uma atividade remunerada atualmente na ordem dos (1.250,00€ X 14), como sustenta o Recorrente, já que se trata do rendimento médio atribuído aos licenciados.


Assim, por aplicação da seguinte fórmula: 1.250,00x14 x 57A x 3%= 29.925,00€, julgamos adequado e proporcional fixar ao Autor a indemnização de 29.925,00 euros, por este dano. Atento o facto das operações bancárias ativas, não serem remuneradas hoje em dia, não é de proceder a retificação ao resultado obtido.»


3.1.1. O denominado dano biológico não corresponde a uma categoria legal de dano. Trata-se, antes, de uma catalogação doutrinal (de alcance nem sempre coincidente), que passou a ser adotada pela jurisprudência para abarcar certas consequências da incapacidade funcional permanente do lesado (procedendo-se, em alguns casos, a uma distinção entre vertente patrimonial e vertente moral do dano biológico).


Não cabe neste acórdão proceder a um ensaio dogmático sobre o rigor do conceito de dano biológico3, mas apenas apreciar a quantificação do montante indemnizatório atribuído pela decisão recorrida, relativamente à qual o recorrente não questionou o conceito (“dano biológico”) usado, cujo alcance foi compreendido pelas partes. Por isso, mantem-se o uso desse conceito no presente aresto.


O que está em causa é o critério de quantificação do montante indemnizatório.


Tratando-se de avaliar danos que o lesado não teria sofrido se não fosse a lesão (art.563º do CC), cujo valor exato não é possível averiguar no momento em que se julga, o art.566º, n.3 do CC determina que se aplique o critério da equidade. Este critério não se encontra limitado pela aplicação de quaisquer tabelas ou formulas matemáticas. Pode tomá-las em conta, mas não se esgota nelas.


Assim, quando o STJ é chamado a apreciar a aplicação de tal critério, tem-se entendido que lhe cabe, essencialmente, proceder a um juízo de supervisão da conformidade da decisão com os padrões normalmente seguidos, devendo corrigir decisões que, manifestamente, se afastam de casos com caraterísticas relativamente equiparáveis.


Veja-se, a este propósito, o que se afirmou no Acórdão do STJ, de 07.03.2023 (relator Manuel Capelo), no processo n. 766/19.4T8PVZ.P1.S1:


«A compensação do dano biológico tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão pelo lesado traduzida em perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o afete mas, inclui também a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua atividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as deficiências funcionais de maior ou menor gravidade que constituem sequela irreversível das lesões sofridas.»


Sobre o modo de calcular esta categoria de danos, afirma-se no acórdão do STJ, de 07.12.2023 (relator Cura Mariano), no processo n. 1393/21.1T8PNF.P1.S1:


«O cálculo de uma indemnização ressarcitória de uma incapacidade permanente parcial de um jovem de 14 anos exige um difícil prognóstico sobre o resto da sua vida, face à sua situação atual, constituindo um juízo probabilístico no qual, se a aplicação de fórmulas matemáticas ou tabelas estáticas nos podem ajudar a encontrar um valor de referência, será a atenção aos padrões de indemnização adotados, nos tempos mais próximos, pela jurisprudência, em casos análogos, sobretudo os arestos do Supremo Tribunal de Justiça, que nos deve orientar no sentido de obter, pelo menos, uma justiça relativa.»


Afirma-se ainda neste aresto, com relevo para o presente caso, o seguinte:


«A indemnização a atribuir ao Autor por este dano, num juízo que necessariamente tem que recorrer à equidade (artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil), deverá ter em conta, por um lado, a perda da capacidade aquisitiva de rendimentos que a incapacidade funcional vai originar ao longo da vida do Autor, os esforços acrescidos que este terá que desenvolver para exercer a sua atividade profissional e ainda todas as limitações que irá sentir quer na realização de atividades físicas de lazer quer no dia-a-dia


3.1.2. Sobre os montantes indemnizatórios concedidos a título de dano biológico (vertente patrimonial), veja-se, a título exemplificativo, alguns excertos de decisões recentes da jurisprudência deste tribunal:


- Acórdão do STJ, de 30.11.2023 (relator Aguiar Pereira), no processo n. 315/20.1T8PVZ.P1.S1:


«O juízo de equidade em que se funda a fixação pelas instâncias do montante da indemnização nos termos do artigo 566.º n.º 3 do Código de Processo Civil só é passível de censura se não se contiver dentro da margem de discricionariedade consentida pela norma que o legitima, tendo por referência a evolução da jurisprudência e a observância do princípio da igualdade no tratamento prudencial de situações similares.


Não extravasa os limites impostos pela equidade a fixação de uma indemnização no valor de 45.000,00 euros para reparação de danos patrimoniais futuros de um homem de quarenta e oito anos de idade, pintor de construção civil, pessoa, robusta, forte e ágil que, como sequela definitiva das lesões sofridas passou a ser portador de um défice funcional permanente de integridade físico-psiquica de 17 pontos, deixando de poder realizar algumas das tarefas habituais que a sua função exige, subir e descer andaimes, tem grandes dificuldades em carregar pesos acima de 5 Kg e não consegue estar de pé durante longos períodos, com marcha claudicante e dor crónica no tornozelo esquerdo, ainda que tais sequelas sejam compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicando esforços suplementares significativos.»


- Acórdão do STJ, de 30.11.2023 (relator Sousa Lameira), no processo n. 315/20.1T8PVZ.P1.S1:


« É adequada e justa a indemnização, a título de compensação pelo dano biológico, de 60.000 Euros, sendo 20.000 Euros na vertente de dano moral e 40.000 Euros a título de dano patrimonial, atribuída ao Autor, de 16 anos, estudante de um Curso Profissional de Técnico de Manutenção de Industrial, trabalhando também a tempo parcial, auferindo uma retribuição mensal ilíquida na ordem dos € 250,00, que teve de ser transportado ao hospital onde permaneceu 9 dias, tendo sofrido várias lesões, com tratamentos por vários meses, apresentando várias queixas a nível funcional e a nível situacional, que sofre e continuará a sofrer no futuro, de dores físicas, incómodos e mal-estar, designadamente a nível do punho e mão esquerdos e do membro inferior esquerdo.»


- Acórdão do STJ, de 16.11.2023 (relator Manuel Capelo), no processo n.1019/21.3T8PTL.G1.S1:


«É equitativa a indemnização por dano biológico no valor de 20.000,00 € ao lesado com 49 anos Deficit Funcional Permanente de Integridade Físico-Psíquica fixável em 4 pontos, compatível com a atividade profissional habitual, mas implicando esforços suplementares, nomeadamente a pegar pesos com mais de 30 kg ou conduzir longas distâncias sem paragens (aguentando apenas meia hora de viagem), dores, perdas de tempo e ajudas de terceiras pessoas.»


3.1.3. À luz deste quadro jurisprudencial, que se convoca para fundamentar a presente decisão, facilmente se concluiu que o acórdão recorrido, ao atribuir ao lesado o montante de 29.925,00 Euros, a título de dano biológico, é comportável dentro dos padrões indemnizatórios seguidos em casos que apresentam alguns pontos em comum, sendo suscetíveis de proporcional correlação quanto à idade dos sujeitos lesados e ao grau de incapacidade.


Não se identifica, assim, qualquer razão para censurar a decisão recorrida, pois aplicou os critérios de equidade sem afastamento excessivo dos padrões que têm sido seguidos pela jurisprudência deste tribunal. E diga-se, ainda, que não cabe neste juízo rebater os concretos argumentos com base nos quais o recorrente entende que o montante indemnizatório devia ser menor, pois a este tribunal cabe pronunciar-se apenas sobre os problemas que integram o objeto do recurso (não tendo que dialogicamente rebater o argumentário das partes).


*


3.2. Quanto à compensação pelo dano moral, afirma-se no acórdão recorrido:


«No que aos danos não patrimoniais sofridos pelo Autor, indemnizáveis nos termos do disposto no artigo 496º do CC, ponderamos os factos constantes dos pontos 22 a 41 e 43 a 51 da fundamentação de facto.


Julgamos adequada a fixação de 15.000,00 euros ponderando sobretudo o tempo do DFTP de 244 dias, o DFTT de 4 dias, o dano estético 2/7, a aplicação de uma placa com cerca de 9 cm na clavícula, o quantum doloris de 4/7, a idade do Autor e o facto de se tratar de jovem escorreito. O calculo deste valor está já atualizado à presente data.»


Entende a recorrente que esse valor é excessivo, e que não deveria ultrapassar os 7.500 Euros fixados pela sentença.


Vejamos.


3.2.1. Como a jurisprudência do STJ tem reiteradamente entendido, não prevendo o art.496º do CC a aplicação estrita de um comando legal, mas sim de um critério de equidade, o controlo realizado em recurso de revista, quanto à compensação por danos morais, traduz-se, na essência, em aferir se a decisão se apresenta desconforme face aos padrões normativos seguidos pela jurisprudência em hipóteses equiparáveis.


Sobre os critérios a seguir pelo STJ na apreciação do modo como as instâncias valoraram o dano não patrimonial, veja-se, a título exemplificativo, o que se afirma na seguinte jurisprudência:


- Acórdão do STJ, de 22.06.2017, (relator Tomé Gomes), no processo n. 307/04.8TBVPA.G1.S2:


« No critério a adoptar na fixação dos danos não patrimoniais, posto que esta não tem por escopo a reparação económica, mas antes a compensação do lesado e reprovação da conduta lesiva, não devem perder-se de vista os padrões indemnizatórios decorrentes da prática jurisprudencial, com vista a uma aplicação tendencialmente uniformizadora ainda que evolutiva do direito, sendo relevantes para esse efeito: a natureza, multiplicidade e diversidade de lesões sofridas, as intervenções cirúrgicas e tratamentos médicos e medicamentosos a que o lesado se teve de submeter, os dias de internamento e o período de doença, a natureza e a extensão das sequelas consolidadas, o quantum doloris e o dano estético, se o houver (arts. 496.º, e 494.º do CC)


- Acórdão do STJ, de 07.04.2016 (relator Salazar Casanova), no processo n.
55/12.1TBOFR.C1.S1:
«
A indemnização por danos morais deve ser fixada equitativamente conforme resulta do disposto no art. 496.°, n.4, do CC; equidade, no entanto, não significa discricionariedade. A indemnização deve ter em atenção os casos similares de que a jurisprudência do STJ dá notícia, procurando-se, assim, uma harmonização tanto quanto possível efetiva sem se perder de vista as singularidades dos casos concretos».


- Acórdão do STJ, de 27.09.2016 (relator Alexandre Reis), no processo n.
2249/12.4TBFUN.L1.S1:



«(...) só haverá fundamento bastante para censurar o juízo formulado pela Relação e alterar o decidido se puder afirmar-se, tendo em conta os critérios que vêm sendo adoptados, generalizadamente, por este tribunal, que os montantes que foram fixados são manifestamente desproporcionados à gravidade objectiva e subjectiva dos efeitos (de natureza patrimonial e não patrimonial) resultantes da lesão corporal sofrida pela autora


3.2.2. Sobre a valoração dos danos não patrimoniais em diferentes tipos de casos, veja-se, a título exemplificativo, a seguinte jurisprudência:


- Acórdão do STJ, de 16.11.2023 (relator Manuel Capelo), no processo n. 1019/21.3T8PTL.G1.S1:


« Tendo em atenção as lesões sofridas pelo Autor, com as inerentes dores e incómodos que teve e terá de suportar, sendo que o quantum doloris ascendeu ao grau 4, numa escala de 1 a 7, e os tratamentos a que o Autor foi sujeito, bem como as sequelas de que ficou a padecer e que fruto dessas sequelas ficou com um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 4 pontos e uma repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de grau 2 (numa escala de 0 a 5), formulando o necessário o juízo de equidade e considerando os valores que vêm sendo definidos pela jurisprudência para casos similares, fixa-se a indemnização dos danos não patrimoniais em 10.000,00 €


- Acórdão do STJ, de 19.12.2023 (relatora Maria Olinda Garcia), no processo n. 1754/18.3T8CSC.L1.S1:


«Não merece censura o acórdão que fixou em 10.000 Euros, com base na equidade, a compensação por danos não patrimoniais (grave depressão) sofridos pela dona da obra, face ao incumprimento do empreiteiro que a privou da sua habitação


- Acórdão do STJ, de 30.11.2023 (relator Sousa Lameira), no processo n. 315/20.1T8PVZ.P1.S1


«É adequada e justa a indemnização, a título de compensação pelo dano biológico, de 60.000 Euros, sendo 20.000 Euros na vertente de dano moral e 40.000 Euros a título de dano patrimonial, atribuída ao Autor, de 16 anos, estudante de um Curso Profissional de Técnico de Manutenção de Industrial, trabalhando também a tempo parcial, auferindo uma retribuição mensal ilíquida na ordem dos € 250,00, que teve de ser transportado ao hospital onde permaneceu 9 dias, tendo sofrido várias lesões, com tratamentos por vários meses, apresentando várias queixas a nível funcional e a nível situacional, que sofre e continuará a sofrer no futuro, de dores físicas, incómodos e mal-estar, designadamente a nível do punho e mão esquerdos e do membro inferior esquerdo.»


3.2.3. Neste quadro, conclui-se, sem dificuldade, que o acórdão recorrido ao atribuir ao autor uma compensação de 15.000 Euros pelos danos morais (ou não patrimoniais) agiu dentro dos parâmetros indemnizatórios seguidos pelo STJ na avaliação desta tipologia de danos em casos de natureza vária e proporcionalmente equiparáveis ao caso dos presentes autos.


Concluiu-se, portanto, que, atendendo aos danos que o autor sofreu, a decisão recorrida usou de forma ponderada e proporcional as regras da equidade ao estabelecer aquela indemnização, pelo que esse aresto não merece censura.


*


DECISÃO: Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso e confirma-se o acórdão recorrido.


- Custas na revista admitida e julgada: pela ré recorrente.


- Custas na revista subordinada não admitida: pelo autor recorrente subordinado.


Lisboa, 16.01.2024


Maria Olinda Garcia (Relatora)


Ricardo Costa


Ana Resende





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1. Neste sentido pode ver-se, por exemplo: Teixeira de Sousa, “Dupla conforme: critério e âmbito da conformidade”, in Cadernos de Direito Privado, 2008, n.21, página 24 e seguintes↩︎

2. Publicado em:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/81af3595c6710aad80258a2b005dce63?OpenDocument↩︎

3. Para uma análise problematizadora deste conceito, veja-se, por exemplo: MARIA DA GRAÇA TRIGO, “O conceito de dano biológico como concretização jurisprudencial do princípio da reparação integral dos danos – breve contributo”; Revista Julgar, n.º 46, 2022, página 257 e seguintes.↩︎