Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
818/18.8T8STB.E1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: LUIS ESPÍRITO SANTO
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
ÓNUS DE CONCLUIR
RECURSO DE REVISTA
OBJETO DO RECURSO
PRESSUPOSTOS
DIREITO AO RECURSO
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
REJEIÇÃO DE RECURSO
Data do Acordão: 01/16/2024
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: REVISTA IMPROCEDENTE.
Sumário :

I – A alínea b) do nº 1 do artigo 640º do Código de Processo Civil impõe ao impugnante a obrigação processual que consiste no dever de efectuar a correspondência directa, concreta e objectiva, entre os meios probatórios por si indicados e a justificação (por eles representada) para a modificação dos pontos de facto considerados incorrectamente valorados.


II – O que significa que não é suficiente, para se considerar cumprida a exigência da alínea b) do nº 1 do artigo 640º do Código de Processo Civil, a mera reunião aglomerada dos diversos meios de prova entendidos por relevantes, feita genericamente e em estilo descritivo, numa amálgama indiferenciada, sem nenhuma referência concreta e objectiva aos pontos de facto em causa, individualmente identificados.


III – É, deste modo e no caso concreto, correcta a decisão do Tribunal da Relação de rejeição do conhecimento da impugnação de facto por incumprimento do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 640º do Código de Processo Civil.


IV - A circunstância de não ser de rejeitar o conhecimento da impugnação de facto, nos termos do artigo 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, por desproporcional e não razoável, quando as questões em análise se encontrarem devidamente focalizadas, sendo praticamente intuitiva a sua compreensibilidade, não obsta, por seu turno, à dita rejeição se o não cumprimento formal dos mesmos requisitos, exigidos na norma legal referida, se verificar num contexto em que os factos controvertidos são variados e relativamente complexos, importando dilucidá-los de forma organizada, metódica e especificada, como a lei obriga.


V – Tais princípios gerais da proporcionalidade e razoabilidade têm essencialmente uma função moderadora da rigidez e do exacerbado formalismo na análise do cumprimento do artigo 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, funcionando como uma espécie de filtro de segurança do sistema, sem que, em circunstância alguma, devam servir como forma de desculpabilização, panaceia ou manto (ilimitado) de cobertura e salvaguarda de falhas ou omissões, quando é evidente e inegável o não acatamento de cada uma das obrigações processuais aí especificamente exigidas, com o inerente prejuízo para o exercício do contraditório que assiste à contraparte.

Decisão Texto Integral:

Revista nº 818/18.8T8STB.E1.S1

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção – Cível).

I - RELATÓRIO.

Instaurou VIDIS - Sociedade Industrial de Refrigerantes, Lda., a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra COCA-COLA EUROPEAN PARTNERS PORTUGAL - Unipessoal, Lda.

Essencialmente alegou:

Celebrou com a R. contrato de distribuição dos produtos da R., para o distrito de ..., em regime de exclusividade.

A partir de 18 de Outubro de 2017 aRé recusou-se a fornecer produtos à A. e, bem assim, nomeou, unilateralmente uma sociedade distribuidora concorrente da A. (C......, Lda), para paralelamente à A. distribuir os seus produtos no distrito de ....

Razão por que a A., em 28 de Novembro de 2017, remeteu à R. missiva em que resolveu o contrato de distribuição.

Após a cessação do contrato de distribuição, a A. deixou de receber qualquer retribuição pelos contratos com a clientela por si angariada, ao passo que a R., na exacta medida em que a Autora divulgou à Ré toda a informação relativa aos mencionados clientes, logrou manter, sem qualquer dificuldade, os contactos da clientela angariada pela Autora e, por conseguinte, continuou a beneficiar dessa actividade.

Fundamenta, assim, o pedido de indemnização de clientela no montante de € 222.157,78, a que acresce a obrigação de a R. pagar à A. o montante de € 226.000,35 atinente aos bónus de distribuição contratualmente devidos e não pagos à A. desde 2009 e, bem assim, o montante de € 6.950,00 atinente à creditação das acções de trade marketing e outros créditos ao mercado, devidos e não pagos à A.

Conclui peticionando a condenação da R. no pagamento à Autora do valor global de 1.000.789,31€ (um milhão, setecentos e oitenta e nove mil euros e trinta e um cêntimos), acrescido dos juros legalmente devidos até efectivo e integral pagamento a titulo de indemnização de clientela.

Regularmente citada a R. apresentou contestação e deduziu pedido reconvencional.

Alegou essencialmente:

Não se mostram reunidos os requisitos que sustentam uma indemnização de clientela.

O regime de exclusividade vigorou somente até 7 de Maio de 2008 e após essa data já não são devidos os bónus que a A. invoca.

A R. sempre pagou rigorosamente tudo o que cabia pagar à A. na disciplina dos dois contratos que vigoraram, mormente todas as suas retribuições como distribuidor, ou seja, os Bónus de Distribuição, segundo os valores de tabelas dos contratos firmados em 1991 e 2008.

Conclui pela improcedência do peticionado.

Por sua vez, deduziu pedido reconvencional, peticionando a condenação da A. a pagar-lhe a quantia em dívida de € 183.544,45 acrescida dos juros vencidos à taxa comercial, desde a citação sobre o capital em dívida e vincendos até efectivo reembolso.

Alegou que forneceu à Reconvinda produtos para distribuição que a mesma até ao momento não pagou, tendo a reconvinte entretanto accionado garantias bancárias, por forma a obter o pagamento do seu crédito, na sequência do que foram efectuados pagamentos por execução de garantias bancárias que haviam sido prestadas pela VIDIS, pagamentos esses ocorridos em 23/02/2018 – € 28.141,77; em 12/02/2019 - € 39.990,93; em 22/03/2019 - € 79.981,86 num total de € 148.114,56 e consequentemente, foi admitida a requerida redução do pedido reconvencional para o valor de € 35.430,18 quantia acrescida dos juros vencidos à taxa comercial desde a citação sobre o capital em divida e vincendos até efectivo pagamento.

Conclui pela procedência do pedido reconvencional.

A Reconvinda pronunciou-se pela improcedência do pedido reconvencional.

Realizado julgamento, foi proferida sentença que julgou a presente acção improcedente, absolvendo a R. do pedido e procedente o pedido reconvencional e consequentemente, condenando-se a Reconvinda no pagamento à reconvinte do montante de €35.430,18 acrescido dos peticionados juros de mora, calculados à taxa comercial, desde a citação até integral pagamento.

Interposto recurso de apelação pelos RR, foi proferido o acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 14 de Setembro de 2023, que a julgou improcedente, confirmando a decisão recorrida (rejeitando-se a impugnação de facto por incumprimento do requisito previsto no artigo 640º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil).

Veio a A. interpor recurso de revista, apresentando as seguintes conclusões:

I - A Recorrente considera, na linha do arrazoado infra oferecido e naturalmente ressalvado o devido e máximo respeito pela opinião aí expressa, ter andado mal o Digníssimo Tribunal a quo ao rejeitar a apelação in casu interposta na parte atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto, por (putativa) falta de cumprimento do ónus de impugnação, já que da correcta e atenta análise da apelação in casu interposta à luz do ordenamento jurídico vigente e, maxime, da correcta exegese das regras processuais atinentes à impugnação da decisão relativa à matéria de facto, ressuma terem as mesmas sido, in casu, integralmente cumpridas pela Recorrente.

II - Com efeito, e em primeiro lugar, temos que, como resulta da análise da alegação e correlatas conclusões no que especificamente tange ao requisito ínsito na alínea a) do nº 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, a Recorrente especificou, na apelação in casu interposta, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

III - Em segundo lugar, como resulta da análise da alegação e correlatas conclusões no que especificamente tange ao requisito ínsito na alínea c) do n.º1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, a Recorrente especificou a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas;

IV - Por fim, como resulta da análise da alegação e correlatas conclusões no que especificamente tange ao requisito ínsito na alínea b) do n.º1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, a Recorrente especificou os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

V - Considera a Recorrente que, ex vi do quadro legal vigente (concorde-se ou não com ele, é o regime que vigora), mais não lhe era legalmente exigível, maxime a (putativa) obrigação de, no tocante à especificação dos pontos de facto que considera mal julgados, discriminar “cada facto impugnado e a respectiva prova que, no seu entender, impunha decisão diferente da proferida” (sic) sustentada pelo Digníssimo Tribunal a quo no acórdão ora em crise, sob pena de se estar a criar, por via jurisprudencial,umnovoónusdeimpugnaçãoparaalémdoslegaletaxativamenteprevistosnoartigo 640.º do Código de Processo Civil;

VI - O que vale por dizer que o Digníssimo Tribunal a quo sustentou uma interpretação das regras processuais ínsitas no artigo 640.º do Código de Processo Civil sem o mínimo respaldo na letra da Lei (interpretação essa brutal e ilegitimamente limitativa do direito ao recurso da Recorrente), como se do exercício de poderes discricionários se tratasse, para, na prática, se demitir de exercer a actividade judicativa susceptível de permitir a modificação da decisão que é o verdadeiro desiderato do recurso de apelação, fulminando a apelação com uma rejeição - como se estivéssemos perante uma situação de omissão, tout court, de conclusões - e sem tampouco aventar a possibilidade de convite ao aperfeiçoamento;

VII - Com efeito, ante o cumprimento, pela Recorrente, da integralidade dos requisitos de ordem formal taxativamente previstos no artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Digníssimo Tribunal a quo só tinha um caminho a seguir: apreciar a impugnação, proceder à reapreciação dos meios de prova e, uma vez formada a sua convicção, traduzi-la, se fosse o caso, em modificações da decisão da matéria de facto;

VIII - Todavia, no acórdão recorrido, optou o Digníssimo Tribunal a quo por assim não fazer, com um pretexto que, como vimos supra, se afigura legalmente insustentável por expressa violação de direito processual, criando ex novo e por via jurisprudencial (qual Legislador) um requisito de ordem formal não legalmente previsto, desse modo se impondo seja, in casu, retomada a apreciação do mérito da apelação no que respeita à impugnação da decisão relativa à matéria de facto;

IX - Por tudo isto, ao decidir nos moldes ora impugnados, o Digníssimo Tribunal a quo violou, entre outras, as regras processuais ínsitas no artigo 640.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, regras que deveriam ter sido interpretadas no sentido de, na apelação in casu interposta, a Recorrente ter cumprido integralmente cumprido o ónus de impugnação da decisão relativa à matéria de facto e, nessa conformidade, estarem reunidos todos os pressupostos para apreciar do mérito da apelação, apreciar efectivamente a impugnação da decisão relativa à matéria de facto e reapreciar a prova que foi indicada relativamente aos factos impugnados, reflectindo na decisão da matéria de facto a convicção que formar, nos termos no disposto no artigo 662.º do Código de Processo Civil;

X - Ademais, ao interpretar as regras ínsitas no artigo 640.º, n.º1, do Código de Processo Civil no sentido de que ao recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto se impõe o ónus suplementar de, no tocante à especificação dos pontos de facto que considera mal julgados, discriminar cada facto impugnado e a respectiva prova que, no seu entender, impunha decisão diferente da proferida, o Digníssimo Tribunal a quo apresenta uma interpretação daquelas normas manifestamente violadora do direito de acesso aos Tribunais e a uma tutela jurisdicional efectiva, na vertente do direito ao recurso, e da garantia um processo justo e equitativo, consagradas no artigo 20.º, n.º 4, da nossa Lei Fundamental, inconstitucionalidade que desde já se invoca para todos os devidos e legais efeitos;

XI - Termos em que considera a Recorrente impor-se a anulação do acórdão recorrido com base na violação das supra citadas regras de direito processual, com remessa dos presentes autos ao Digníssimo Tribunal a quo para que aprecie o mérito da apelação no que respeita à impugnação da decisão relativa à matéria de facto, reapreciando a prova que foi indicada relativamente aos factos impugnados e reflectindo na decisão da matéria de facto a convicção que formar, nos termos no disposto no artigo 662.º do Código de Processo Civil.

Contra-alegou a Ré pugnado pela improcedência do recurso e manutenção do acórdão recorrido.

II – FACTOS PROVADOS.

Encontra-se provados nos autos que:

1- A Autora dedica-se à actividade de compra, venda e distribuição de produtos alimentares, verbi gratia bebidas com e sem álcool;

2- A Ré dedica-se à actividade de produção, comercialização e distribuição de produtos das marcas registadas da multinacional “The Coca-Cola Company”, com sede nos ..., produzindo e comercializando em Portugal a gama de produtos que ostentam as marcas “Coca-Cola”, “Fanta”, “Sprite”, “Aquarius”, “Nestea”;

3- Em ordem a organizar a distribuição e comercialização dos seus produtos, a R. celebrou com várias empresas (distribuidores) contratos de distribuição;

4- Em Agosto de 1991, a Ré (que, à data, girava comercialmente sob a forma “Refrige -Sociedade Industrial de Refrigerantes, S.A.”) e a Autora iniciaram negociações tendentes à celebração de um contrato de distribuição, para o distrito de ... e em regime de exclusividade, da (à data) engarrafadora da marca “The Coca-Cola Company”;

5- À data, a Ré produzia e/ou comercializava refrigerantes da gama de produtos de “The Coca-Cola Companysupra referidos e, no âmbito de tal actividade, pretendia assegurar uma mais completa e eficaz cobertura de distribuição em todo o País;

6- Para tanto recorreu à contratação de distribuidores que, no desempenho dessa sua actividade e em estreita colaboração e coordenação com a Ré, serviam uma mesma filosofia comercial em termos de apresentação do produto no mercado, na colaboração em campanhas promocionais e, de um modo geral, no relacionamento com os clientes da marca que distribui;

7- A A. possuía instalações de armazém com área coberta e área de parque de viaturas;

8- A A. utilizava uma frota de veículos pesados de mercadorias e ligeiros de mercadorias, e contratou trabalhadores e apetrechou-se do necessário equipamento;

9- Em Dezembro de 1991 A. e R celebraram contrato de distribuição em regime de exclusividade, para o distrito de ..., mediante o estatuto de “Distribuidor Central”;

10-A Autora passou a integrar a rede de distribuição da Ré, tendo o início da respectiva operação sido aprazado para o dia 2 de Janeiro de 1992;

11-(…) Tendo a Autora recebido as primeiras cargas dos produtos infra elencados: -“Coca-Cola”, - “Fanta”; e - “Sprite”;

12-Tal relação comercial permitiu desenvolver, ao longo dos anos, um trabalho de mercado conhecido e reconhecido, gozando a Autora de prestígio nos concelhos do distrito de ..., sendo comummente considerada um dos melhores distribuidores da marca “The Coca-Cola Company” do País;

13-A Autora foi distribuidora da Ré nos 24 (vinte e quatro) concelhos do distrito de ... (...);

14-A Autora distribuiu os produtos da Ré desde 2 de Janeiro de 1992 até 28 de Novembro de 2017;

15-Na contabilidade da Autora, foi aberta uma conta-corrente na qual se registavam todos os movimentos resultantes da relação contratual com a Ré;

16-A Autora adquiria o conteúdo líquido dos refrigerantes da Ré aos preços por esta estabelecidos e caucionando sempre o valor do respectivo vasilhame;

17-A Ré concedia à Autora um bónus de distribuição em factura deduzido nos preços de tabela e, bem assim, um bónus anual de distribuição central de 5% (cinco pontos percentuais) sobre a facturação líquida;

18-De acordo com o contrato celebrado em 1991, a Ré pagava à Autora um bónus de operação logística, referente às entregas logísticas a clientes nacionais – nomeadamente hipermercados, supermercados, cash & carry’s e cadeias de fast food nacionais;

19-(…) e descontos adicionais-rappel, caso a Autora adquirisse determinado volume de produtos e/ou atingisse determinados objectivos;

20-O conteúdo líquido adquirido era posteriormente revendido pela Autora a restaurantes, cervejarias, snack-bar, cafés, pastelarias, tabernas, casas de pasto, cantinas de empresas, bares de hospitais, bares de quartéis militares, bares de parques de campismo, bares nocturnos, pubs, discotecas, supermercados, cooperativas, cantinas, mercearias e outros estabelecimentos hoteleiros e de retalho;

21-O vasilhame era recolhido pela Autora contra a restituição da caução ou substituição por novo vasilhame, sendo posteriormente devolvido pela Autora à Ré;

22-A Ré entregava os refrigerantes à Autora nos armazéns desta;

23-E a Autora distribuía os produtos da Ré nas áreas pelas quais era responsável, alienando-os aos diversos tipos de clientes;

24-A A. procedeu à distribuição de produtos através de outras empresa detidas maioritariamente pelos mesmos sócios da A., AA e os seus dois filhos, a R......, Lda. e a L......, Lda.;

25-A Autora conhecia perfeitamente o distrito de ... e a clientela aqui sedeada;

26-Antes de 1992 o mercado do distrito de ... já era consumidor abastecido pela venda directa da A ou outros anteriores distribuidores;

27-A Ré emitiu Circular dirigida aos clientes com o seguinte teor «Estimado Cliente O contrato de distribuição de produtos Refrige Coca-Cola, Fanta e Sprite celebrado com a C........., SA deixa de vigorar a partir de 23 de Dezembro de 1991. A partir daquela data a Refrige ou os seus Agentes Oficiais asseguram as vendas das marcas acima referidas para o que vamos efectuar um serviço adequado às necessidades de V. Exas. Esta circular pretende chamar especialmente a vossa atenção para o facto de que o vasilhame dos produtos Coca-Cola, Fanta e Sprite que caucionaram passará a ser transacionado com a Refrige ou os seus agentes os quais assumem também, quando tal for solicitado, o seu descaucionamento. (…) Os nossos Vendedores e demais colaboradores estão ao vosso dispor para prestar todos os esclarecimentos e aceitar desde as encomendas dos nosso produtos que queiram efectuar. Se achar necessário qualquer esclarecimento, telefone-nos e contacte o nosso colaborador que abaixo indicamos (…)»;

28-Da circular supra referida constava a indicação de «Agente exclusivo para os distrito de ... a partir de 2/1/1992 Vidis Distribuição de Produtos Alimentares, Lda.»;

29- Entre A. e R. foi celebrado em final de 1991 contrato de distribuição de onde consta «A) Considerando que a Refrige produz e/ou comercializa refrigerantes da gama de produtos de The Coca-Cola Company; B) Que, no âmbito dessa actividade pretende a Refrige assegurar uma mais completa e eficaz cobertura da distribuição em todo o país, para tanto recorrendo à contratação de distribuidores que, no desempenho dessa sua actividade e em estreita colaboração e coordenação com a Refrige, serem uma mesma filosofia comercial, seja em termos de apresentação do produto no mercado, na colaboração em campanhas promocionais e, de um modo geral, no relacionamento com os clientes das marcas que distribui; (…)

30-(…) E) A área geográfica, previamente definida, em que irá actuar o Distribuidor, em conformidade com os preceitos contidos nas clausulas que seguem, é a que se encontra definida no Anexo 1 ao presente contrato; F) O Segundo Outorgante actuará como Distribuidor Central, pelo que disporá de armazéns apropriados para assegurar o abastecimento na área geográfica que lhe foi atribuída. Quer através de distribuição própria quer através de sub-distribuidores autorizados, os quais se abastecerão nos armazéns do segundo outorgante. (…);

31-(…) Cláusula primeira (âmbito do contrato) 1. Pelo presente convénio, a Refrige acorda com o segundo contratante confiar a este a distribuição dos seus produtos na área de contrato definida (…) 2. O Segundo contratante poderá contratar a distribuição dos mesmos produtos a Terceiros em parcelas do território concedido (…) desde que: a) obtenha para o efeito, e caso a caso, autorização prévia e expressa da refrige; (…)

32-(…) Clausula segunda (área do contrato) Entende-se por área de contrato, tal como territorialmente definida no anexo 1, a região geográfica onde o distribuidor irá desenvolver a sua actividade, e relativamente à qual a Refrige não nomeará, na vigência do presente convénio, qualquer outro distribuidor.»

33-(…) Clausula quarta (condições de pagamento) 1. Os produtos fornecidos ao distribuidor serão pagos contra entrega. 2. O distribuidor poderá em alternativa solicitar uma abertura de credito para pagamento a 15 dias da data da factura, mediante a prestação de garantias fixadas previamente. (…) Enquanto subsistir a situação de incumprimento a Refrige suspenderá o fornecimento de qualquer um dos seus produtos, mesmo que pagos a pronto.»;

34-O anexo 1 do contrato indicava a Área Geográfica por concelhos do distribuidor, constando do mesmo «Distrito de ...- Concelhos de: ...»;

35-Entre A. e R. foi acordada, em 01 de Janeiro de 2000, Adenda ao contrato de distribuição, assinada por ambas as partes, de onde consta: «ambas as partes acordam introduzir ao mesmo as alterações que se seguem, II-É realizada a presente Adenda que altera e integra o Contrato de Distribuição em vigor nos termos do disposto na clausula 14ª do mesmo. Assim as clausulas 3ª, 5ª e 8ª passam a ter a seguinte redação: (…);

36-«Clausula 3ª (condições de Distribuição) O distribuidor procederá à comercialização e distribuição dos produtos da Refrige nas condições constantes dos anexos 2, 3 e 4 deste contrato, que esta poderá a qualquer tempo alterar uma ou mais vezes, mediante comunicação ao Distribuidor.»

37-«Clausula 5ª (Obrigações do distribuidor) O Distribuidor no âmbito desta sua actividade, agirá sempre com o maior zelo e diligência no sentido de salvaguardar e promover por todas as formas ao seu alcance a melhor imagem dos produtos actuais e futuros da Refrige e assegurar com a maior eficácia possível , o abastecimento dos clientes da sua área de toda a gama de produtos Refrige (…)»;

38- «Clausula 8ª (Actuação supletiva da Refrige) a) Sem prejuízo do disposto na clausula 2ª a Refrige poderá vender directamente a clientes em locais de consumo situados na área atribuída ao Distribuidor mas em que a negociação de venda seja feita a nível nacional ou mesmo internacional, como são, por exemplo, os casos de cadeias de hipermercados e “cash carry’s”, cadeias de “fast-food” e “catering”, ou clientes que pela sua especificidade exijam uma negociação directa; b) A Refrige poderá, no entanto, optar por entregar ao Distribuidor a responsabilidade pela entrega, na sua zona geográfica, a um ou mais dos clientes referidos na alínea anterior, caso em que o Distribuidor terá direito ao Bónus de Operação Logística constante do anexo 4, alínea b); c) a Refrige poderá ainda optar por entregar ao distribuidr a promoção da venda e a entrega da mercadoria a um ou mais dos clientes referidos na alínea anterior, sendo, no entanto, tais clientes facturados directamente pela Refrige, caso em que o Distribuidor terá dieito à remuneração cosnatnte da tabela B anexo 3; (…) e) Sempre sem prejuízo do disposto na calusla 2ª , a Refrige poderá em caso de incapacidade ou de deficiência do Ditribuidor satisfazer adequadamente dentro dos parâmetros definidos pela Refrige, as necessidades do mercado da sua área de contrtao, supri-las, vendendo e entregando em tal caso directamente aos clientes que se mostrem afectados por tal deficiência ou incapacidade, debitando, então, ao Distribuidor os custos adicionais de tal intervenção e sem prejuízo de vir aresolver, por incumprimento, o presente contrato.»(doc. junto a fls. 268)

39-De acordo com clausula 5ª do contrato (Obrigações do Distribuidor) a Autora mantinha totalmente actualizado um ficheiro de clientes, com a indicação das transacções efectuadas, tendo a Ré (através do inspector que visitava a Autora e acompanhava, por vezes, os seus trabalhadores na venda) acesso a tais informações;

40-A Autora, sempre que a Ré o solicitava, informava-a sobre todos os dados de mercado que envolviam os seus produtos, quer em termos de consumos, características dos clientes e actuação das marcas concorrentes;

41-A Autora efectuava diariamente a distribuição dos refrigerantes da Ré nas áreas do contrato, tendo, com o conhecimento da Ré, recorrido ao sub-distribuidor “C......” para os concelhos de ... e ... e ao sub-distribuidor “E..... . .......” para os concelhos de ... e ...;

42-A Autora, a fim de proceder à venda dos produtos fornecidos pela Ré, e n âmbito do contrato de distribuição, utilizou um modelo de venda na modalidade de pré-venda, com as entregas das mercadorias vendidas efectuadas no espaço de 24h (vinte e quatro horas) após a encomenda;

43-A Autora, nos estabelecimentos que abastecia, providenciava para que a exposição dos produtos da marca “The Coca-Cola Company” tivesse notoriedade e controlava a respectiva qualidade nos locais de venda, designadamente recolhendo amostras, quer a pedido da Ré, quer quando entendia e/ou as circunstâncias o aconselhavam;

44-A Autora providenciava no sentido de não entregar os produtos com data de validade inferior a 60 (sessenta) dias e fazer controlo de rotação de produtos: “o primeiro a entrar era o primeiro a sair”;

45-A recolha regular de amostras é um procedimento e politica instituída pela R. para controlo e salvaguarda da qualidade dos produtos em venda nos mercados;

46-Em 08 de Maio de 2008 A. e R. celebraram contrato de distribuição nos termos do qual consta «Clausula (âmbito do contrato) Pelo presente contrato a Refrige acorda com o distribuidor confiar a este a distribuição dos seus produtos, na área de contrato definida no Anexo 1 a este contrato e que dele faz parte integrante, produtos estes que são os que igualmente se mostram identificados na Tabela de Preços (Anexo 2 a este mesmo contrato e que dele faz parte integrante). (…)

47-(…) A Refrige, nesta data, entrega ao Distribuidor listagem dos seus clientes com sede ou estabelecimento na zona geográfica supra referida (Anexo 9); (…)»

48-«Clausula ( Área do contrato) Entende-se por área do contrato , tal como territorialmente definida no Anexo I, a região geográfica onde o distribuidor irá desenvolver sua actividade e relativamente à qual , no entanto, a Refrige não concede o direito de exclusivo a favor do Distribuidor, podendo, em consequência aí nomear outro ou outros distribuidores para exercício da mesma actividade, do que avisará, por escrito o Distribuidor.»;

49- Do Anexo I consta como área geográfica atribuída ao distribuidor « Concelhos de: ...»;

50-«Clausula 4ª (Condições de pagamento) 1. Produtos fornecidos ao Distribuidor serão pagos contra entrega. 2. O Distribuidor poderá , em alternativa, solicitar uma abertura de credito para pagamento a 30 dias RMF (resumo mensal de factura). 3. O Distribuidor deverá prestar garantia do cumprimento da obrigação de pagamento para a cobertura do eventual saldo médio de um mês de vendas, 4. O não cumprimento pontual dos prazos estabelecidos sujeitará o Distribuidor à obrigação de pagar juros de mora, à taxa máxima legal em vigor na data do incumprimento, contados desde essa data até ao efectivo pagamento da divida vencida. 5. Enquanto subsistir a situação de incumprimento, a Refrige suspenderá o fornecimento de qualquer dos seus produtos, mesmo que pagos a pronto. 6. Ainda que posteriormente o Distribuidor venha a regularizar a situação a Refrige reserva o direito de rever as condições de concessão de crédito para fornecimentos futuros ou mesmo resolver o contrato se subsistir o incumprimento.»;

51-«Clausula 10ª (Prazo do contrato) 1. O presente contrato entra em vigor na data da sua assinatura, anulando e substituindo qualquer outro contrato assinado anteriormente entre as partes, e vigora até 3 de Janeiro de 2009. »

52-«Clausula 11ª (resolução do contrato) 1. Sem prejuízo do disposto no n.º 2 da presente cláusula, o incumprimento, por qualquer uma da partes ,ou mora no cumprimento das obrigações emergentes do contrato, que não seja reparada no prazo que, para o efeito, lhe for concedido ela contraparte através de carta registada com aviso de recepção , o qual não poderá ser inferior a dez dias úteis, confere à parte não faltosa o direito de proceder à resolução do mesmo, mediante o envio por carta registada com aviso de recepção, de uma comunicação de resolução com efeito a partir da data da recepção dessa comunicação.»;

53-«Clausula 12ª (Perda da qualidade de distribuidor) A cessação do presente contrato por qualquer das formas previstas na clausula não confere ao Distribuidor o direito a receber qualquer compensação ou contrapartida pela sua perda da qualidade de distribuidor.»

54-»Clausula 13 (Efeitos da cessação do contrato de distribuição ) 1. A cessação por qualquer motivo do presente contrato determina a) O imediato vencimento de todas as quantias em divida; b) A constituição do Distribuidor na obrigação de devolver no prazo máximo de 30 dias à Refrige todos os bens incluindo taras e vasilhame , que sejam propriedade desta e se encontrem na posse daquele, podendo a Refrige promover a auditoria conjunta ao mercado com o Distribuidor com o qual cessa o contrato de distribuição quantificando-os onde os mesmos se encontrem na falta de entrega voluntaria, o Distribuidor incorre na obrigação de pagar uma quantia igual ao valor da reposição dos mesmos qual deverão ser deduzidos os valores da caução e vigor) e na responsabilidade pelo destino final das embalagens; c) No prazo máximo de 30 (trinta) dias a contar da data de cessação do presente contrato, a cessação do direito de, por qualquer meio ou forma, incluindo anúncios e papel timbrado e decoração de viaturas, associar a sua actividade o nome e a imagem da outra parte e/ou das marcas de bebidas ou invocar a qualidade que para si decorria do presente contrato sob pena de se constituir na obrigação de pagar à contraparte uma indemnização.(…)»;

55- «(…) 2. As partes acordam que , no caso de ocorrer a cessação do presente contrato, a Refrige não estará obrigada a readquirir quaisquer stocks de produtos mantidos pelo distribuidor, nem a compensar ou indemnizar quaisquer investimentos realizados pelo Distribuidor na sua sociedade e/ou no seu estabelecimento durante a vigência do presente contrato, tais como despesas com publicidade e marketing com estruturas organizativas , com sistemas de informação ou com o arrendamento e/ou a manutenção de locais de armazenagem bem como, e ainda, pagar ao distribuidor qualquer indemnização, seja a que titulo for. Ocorrendo a resolução imediata do contrato, e não pretendendo a Refrige readquirir os stocks de produtos mantidos pelo distribuidor, disporá este do direito de os vender , por sua conta e risco, a terceiros, salvaguardando sempre o prazo preferencial de consumo constantes das embalagens de produtos.»;

56-Com data de 21 de Novembro de 2011 a R. enviou à A. missiva comunicando que «Na sequência das nossas conversações sobre a cobertura dos concelhos de ... , nos quais V. Exas confirmaram não distribuir, nem directa nem indirectamente, os produtos da Refrige , conclui-se sem margem para dúvidas estar a Vidis em incumprimento contratual (…) Assim, vimos comunicar que a partir do dia 23 de Novembro próximo procederemos de imediato de acordo com as disposições contratuais ( clausula e al.a) vendendo e distribuindo, directamente ou através das empresas que nomearemos para o efeito, os nossos produtos no território contratual »;

57-Por parte da A. foi respondido, em missiva datada de 25 de novembro de 2015 remetida à R que «A Vidis tem assegurado a cobertura de mercado com produtos Refrige para os Concelhos de ... através do revendedor C......, Lda, sediada em .... A Vidis assegurou ao longo dos anos a cobertura de mercado com produtos Refrige nos Concelhos de ... e ... através da firma E..... . ....... e no presente com as firmas P.... .......... . ...... Lda. e J. ......, Lda. Confirma-se que a Vidis quer directa quer indirectamente promove a venda dos produtos Refrige em todo o território objecto do Contrato de distribuidor celebrado com a Refrige.»(….);

58-Com data de 25 de Fevereiro de 2015 a R. enviou à A. missiva comunicando que «Acusamos a recepção da v. carta (de 16.02.2015)(…) à qual passamos a responder (…) a Vidis acusa a Refrige de, unilateralmente, nomear no território atribuído à Vidis, nos últimos cinco anos , as firmas C......, Lda, V......, Lda, J......., Lda. e A. ...... ......., Lda.. Diga-se que a Refrige apenas nomeou a C...... e a A. ...... ....... e não as restantes duas empresas. (…) e ao abrigo do disposto na clausula do Contrato de Distribuição (…)»;

59-(…) « O mesmo se poderá dizer em relação à acusação da Vidis concernente às cadeias Grupo Visabeira e J. Cake. De facto, como as partes bem sabem. A Refrige pode, ao abrigo da cláusula do referido contrato de Distribuição, vender directamente a clientes /cadeias em locais de consumo situados na área geográfica atribuída ao Distribuidor.(…)»;

60-Em 09 de Maio de 2017 A. e R. reuniram-se tendo discutido propostas de parte a parte e constando da acta da reunião que «Depois de discutidas as propostas ficou decidido que a Vidis terá de até ao dia 15 responder às seguintes propostas finais apresentadas pela CCEP-PT: . Reformulação do actual território contratualizado pela Vidis para 8 Concelhos . Aceitação do valor de 300K proposto pela VIDIS (nos moldes supra mencionados conforme proposta da CCEP Portugal) . Aceitação do faseamento da divida vencida actualmente em 6 pagamentos mensais e sucessivos a iniciarem em 01 de Junho de 2017(…)»;

61-Entre A. e R. foi celebrada, em 17 de Maio de 2017, uma adenda ao contrato de distribuição datado de 08 de Maio de 2017, de onde consta Considerando que «Refrige sociedade Industrial e refrigerantes procedeu à alteração da sua forma jurídica e denominação social, passando a denominar-se “Coca cola European Partners Portugal, Unipessoal Lda.; todas as relações comerciais existentes celebradas com a refrige-Sociedade Industrial de Refrigerantes, SA foram transmitidas para a esfera jurídica da Coca Cola European Partners Portugal Unipessoal, Lda.;

62-(…) e foi acordado «Alterar e substituir o Anexo I do contrato supra identificado » passando a indicar a área geográfica atribuída ao Distribuidor : ... e ...»

63-(…) ambas as partes Declaram nada ter a receber uma da outra a titulo de indemnização ou a qualquer outro titulo por força da alteração territorial ora acordada.

64-A presente adenda produz efeitos a partir de 01.06.2017 renovando-se nos mesmos termos do contrato de distribuição.»;

65-Em Fevereiro de 2015, a Ré nomeou, outras sociedades comerciais concorrentes, a “C......, Lda.” e a “A. ...... ......., Lda.” para, paralelamente à Autora, distribuírem os seus produtos no distrito de ...;

66-A quatro dias da Feira de ... a A. mantinha-se sem dar satisfação a interpelações por parte da R. para que procedesse à regularização do montante da divida não coberta por garantia para então se poder abastecer de produtos;

67-A R. enviou à A. missiva com data de 07 de Agosto de 2017 comunicando que «De acordo com o disposto na clausula do contrato de distribuição que nos vincula a Coca Cola European Partners Portugal Unipessoal Lda. não concedeu a favor de V.Exas o direito de actuar em exclusividade no território definido no Anexo I ao mesmo contrato. Em consequência pode a Coca Cola European Partners Portugal Unipessoal, Lda. nomear para esse território outro ou outros distribuidores , devendo de tal facto avisar por escrito V. Exas. É o que se fez nos emails enviados em 03 e 04 do corrente mês , formalizado agora através da presente comunicação , para todos os efeitos legais e contratuais , que nomeou um outro distribuidor C......, Lda para fornecimento aos pontos de venda da feira de ... , que iniciou a sua actividade no dia 07 de Agosto;» ;

68-A feira de ... nos anos anteriores tinha sido entregue à A. como distribuidora; 69-A R. não tinha contratualizado com a A. conceder sempre à A. a distribuição de produtos da R. na Feira;

70-A R. remeteu à A. missiva datada de 17 de Outubro de 2017 indicando como “Ass.: Nomeação de Distribuidor em Paralelo» de onde consta «Mais uma vez vimos reforçar o facto de que a Vidis, há bastante tempo e por razões financeiras às quais a CCEP Portugal é totalmente alheia, não adquire produtos em quantidade suficiente para abastecer o mercado de forma eficiente e ininterrupta. (…) De acordo com o preceituado na alínea e) da clausula 8ª do Contrato de distribuição (…)»;

71-A partir do dia 18 de Outubro de 2017, a Ré, nomeou, a “C......, Lda.” (sociedade comercial concorrente) para, paralelamente à Autora, distribuir os seus produtos no distrito de ... ;

72-A Autora, em resposta remeteu missiva à Ré, via postal registada com aviso de recepção, em 23 de Outubro de 2017, fazendo co star que «Não é verdade que, até hoje , a Vidis- Distribuição de Produtos Alimentares, Lda não tenha abastecido o mercado com os v/ produtos em quantidade suficiente e ininterrupta (…) é a n/ empresa Vidis-Distribuição de Produtos Alimentares, Lda. que tem vindo a sofrer graves prejuízos pelo v/ incumprimento de um contrato que perdura há mais de 25 anos (…)»;;

73-A A. manteve durante alguns anos um montante em divida para com a R perto dos €300.000,00 por fornecimentos a crédito a ela feitos pela A.

74-Valor que ultrapassava os plafonds cobertos por garantia bancária e o sistema informático da R. bloqueava os fornecimentos recusando-os e não permitindo nova facturação e carregamentos à A.;

75-A A. recorreu em 2016/17 a um PER (Processo Especial de Revitalização)

76-A Autora remeteu à R. missiva em 30 de Outubro de 2017, via postal registada com aviso de recepção interpelando a Ré para alterar a sua conduta;

77-A Autora remeteu à Ré, em 28 de Novembro de 2017 e via postal registada com aviso de recepção, missiva a resolver o contrato de distribuição como seguinte teor :“(…) No seguimento da n/ carta, datada de 30 de Outubro de 2017, e porque essa v/ empresa não procedeu, no prazo anunciado, à reparação do incumprimento do que, resumidamente, deixámos dito nas alíneas a) a F) daquela n/comunicação, vimos, então, nos termos do nº.1 da ali referida cláusula 11ª. do Contrato, proceder á resolução deste, com justa causa, com efeitos a partir da data da recepção desta comunicação. “A justa causa para tal resolução consubstancia-se, repete-se, no v/ incumprimento, repetido e não reparado, enunciado, sinteticamente, naquela n/ comunicação, de 30 de Outubro de 2017. “Na verdade, e melhor densificando aquele incumprimento: “- Recusa de fornecimento de produtos objecto do contrato de distribuição por parte da v/ empresa, mesmo que por nós pagos a pronto pagamento; “- Nomeação de outros operadores para a área geográfica contratualizada para a n/ empresa, com graves prejuízos para esta, devido à redução da facturação, desde 2009 até à presente data; “- Redução unilateral pela v/ empresa, sem n/ aceitação, dos bónus de distribuição, desde 2009, em contraste com a actualização da tabela de preços, aumentando anualmente e, ás vezes, mais do que uma vez;“- Não creditação, em tempo útil, das acções de Trade Marketing (sendo que, referente ao ano em curso, não nos foi, ainda, creditado qualquer valor; “- Apropriação e utilização abusiva da n/ base de dados de clientes pela v/ empresa, que a facultou a outros operadores/concorrentes (…).”;

78-Após o que a A. continuou por algum tempo a abastecer-se noutras fontes dos produtos da marca da A e a distribui-los em viaturas ainda pintadas com as cores, marcas e dizeres da R. e usando facturas em papel timbrado da R.;

79-Após a cessação do contrato de distribuição a Autora deixou de receber qualquer retribuição da R.;

80-Entre 2012 e 2017, a R. recebeu reclamações de clientes, junto do pessoal da R. por não fornecimento de produto ou demora da A. em fazê-lo, nomeadamente do cliente V.........

81-Até 2015, a A. acumulara uma dívida de fornecimento a crédito da ordem dos € 300.000,00 e apenas cerca de € 150.000,00 se encontravam a coberto de garantias.

82-Recebendo regulares interpelações para regularizar essa situação, sob a cominação de ver suspensos os fornecimentos.

83-Suspensões essas que várias vezes viriam a ocorrer.

84-A A. pontualmente pagava a pronto a factura respeitante ao carregamento que pretendesse efectuar e a R. nesses casos dava autorização pontual para o desbloqueamento do fornecimento;

85-Por execução de garantias bancárias que haviam sido prestadas pela A. foram efectuados a favor da R. os pagamentos: de € 28.141,77 em 23.02.2018; € 39.990,93 em 12.02.2019; € 79.981,86 em 22.03.2019; (documentos junto a fls. 429 a 439)

86- (…) permanecendo em divida à R. o montante de €35.430,18; (documentos junto a fls. 429 a 439)

87-A A., por várias vezes, abastecia-se no mercado junto a terceiros fornecedores;

Matéria de facto não provada:

a) A Autora celebrou um contrato de arrendamento de um armazém com cerca de 1.000m2 (mil metros quadrados) mais 1.000m2 de área;

b) A Ré, em 2009, reduziu unilateralmente o bónus de distribuição contratualmente devido à A.;

c) A Ré em Fevereiro de 2015 nomeou unilateralmente outras sociedades comerciais para paralelamente à A. distribuírem os seus produtos na área de ... atribuída em exclusividade à A.;

d) Por força dos supra relatados comportamentos por parte da Ré, sofreu a Autora uma redução drástica na sua facturação, deixando de auferir, em média, 177.950,59€ (cento e setenta e sete mil, novecentos e cinquenta euros e cinquenta e nove cêntimos) por ano, o que perfaz uma perda de lucros no valor de 355.901,18€ (trezentos e cinquenta e cinco mil, novecentos e um euros e dezoito cêntimos), relativa aos anos de 2016 e 2017;

e) Deixou a Autora de receber o valor de 192.780,00€ (cento e noventa e dois mil, setecentos e oitenta euros), montante que obteria se o contrato de distribuição sub judice fosse pontualmente cumprido até ao termo da sua vigência, em 31 de Dezembro de 2018.

f) A R não pagou à A. o valor de 226.000,35€ (duzentos e vinte e seis mil euros e trinta e cinco cêntimos) atinente aos bónus de distribuição contratualmente devidos, e não pagos, à Autora desde 2009.

g) A R. não pagou à A. o valor de 6.950,00€ (seis mil, novecentos e cinquenta euros) a atinente à creditação das acções de trade marketing e outros créditos ao mercado, devidos e não pagos à Autora.

h) A partir de 18 de Outubro de 2017 a R. recusou-se a fornecer produtos à A. mesmo que pagos a pronto;

i) A nomeou as sociedades “C........ ....”; “J. ......, Lda.”; “J. ....., Lda.” para, paralelamente à Autora, distribuírem os seus produtos no distrito de ...;

j) O fornecimento da Feira de ... representava um volume de negócios na ordem dos €120.000,00

k) A Ré promoveu condições de aquisição dos seus produtos mais vantajosas para os seus concorrentes directos, nomeadamente nos produtos:- “Coca-Cola 1,00 pet”: vendida à Autora ao preço de 10,22€ (dez euros e vinte e dois cêntimos), era vendida paralelamente, aos seus concorrentes ao preço de 8,64€ (oito euros e sessenta e quatro cêntimos); - “Coca-Cola 1,50 pet”: vendida à Autora ao preço de 13,44€ (treze euros e quarenta e quatro cêntimos), era vendida paralelamente, aos seus concorrentes ao preço de 8,88€ (oito euros e oitenta e oito cêntimos); -“Coca-Cola lata”: vendida à Autora ao preço de 11,07€ (onze euros e sete cêntimos), era vendida paralelamente, aos seus concorrentes ao preço de 10,56€ (dez euros e cinquenta e seis cêntimos); - “Nestea lata pêssego e limão”: vendida à Autora ao preço de 8,75€ (oito euros e setenta e cinco cêntimos), era vendida paralelamente, aos seus concorrentes ao preço de 7,68€ (sete euros e sessenta e oito cêntimos); - “Nestea lata manga e ananás”: vendida à Autora ao preço de 9,40€ (nove euros e quarenta cêntimos), era vendida paralelamente, aos seus concorrentes ao preço de 7,68€ (sete euros e sessenta e oito cêntimos); - “Nestea 1,50 pet pêssego e limão”: vendida à Autora ao preço de 3,88€ (três euros e oitenta e oito cêntimos), era vendida paralelamente, aos seus concorrentes ao preço de 2,60€ (dois euros e sessenta cêntimos); - “Nestea 1,50 pêssego e limão”: vendida à Autora ao preço de 4,38€ (quatro euros e trinta e oito cêntimos), era vendida paralelamente, aos seus concorrentes ao preço de 2,60€ (dois euros e sessenta cêntimos).

l) Até à data da resolução contratual, a Autora angariou cerca de 2.300 (dois mil e trezentos) clientes de forma directa,

m) E cerca de 600 (seiscentos) clientes de forma indirecta, através de sub-distribuidores, para os produtos da Ré abrangidos pelo contrato de distribuição

n) O volume de unidades (grades, tabuleiros de tara perdida, “pets”) anualmente fornecidas à Autora foi o seguinte: - no ano de 2010: 271.220 (duzentas e setenta e uma mil, duzentas e vinte) unidades; - no ano de 2011: 245.651 (duzentas e quarenta e cinco mil, seiscentas e cinquenta e uma) unidades;- no ano de 2012: 142.391 (cento e quarenta e duas trezentas e noventa e uma) unidades;- no ano de 2013: 134.988 (cento e trinta e quatro mil, novecentas e oitenta e oito) unidades;-no ano de 2014: 123.863 (cento e vinte e três mil, oitocentas e sessenta e três) unidades;- no ano de 2015: 131.616 (cento e trinta e uma mil, seiscentas e dezasseis) unidades;- no ano de 2016: 96.573 (noventa e seis mil, quinhentas e setenta e três) unidades; e - no ano de 2017: 56.999 (cinquenta e seis mil, novecentas e noventa e nove) unidades.

o) O volume de facturação da Ré à Autora em produtos abrangidos pelo contrato de distribuição foi o seguinte: - no ano de 2010, a Ré facturou à Autora 3.267.199,81€ (três milhões, duzentos e sessenta e sete mil, cento e noventa e nove euros e oitenta e um cêntimos);- no ano de 2011, a Ré facturou à Autora 3.201.671,93€ (três milhões, duzentos e um mil, seiscentos e setenta e um euros e noventa e três cêntimos);- no ano de 2012, a Ré facturou à Autora 2.200.866,13€ (dois milhões e duzentos mil, oitocentos e sessenta e seis euros e treze cêntimos);- no ano de 2013, a Ré facturou à Autora 2.175.344,00€ (dois milhões, cento e setenta e cinco mil,trezentos e quarenta e quatro euros) em produtos abrangidos pelo contrato;- no ano de 2014, a Ré facturou à Autora 1.207.708,90€ (um milhão, duzentos e sete mil, setecentos e oito euros e noventa cêntimos);- no ano de 2015, a Ré facturou à Autora 1.147.441,74€ (um milhão, cento e quarenta e sete mil, quatrocentos e quarenta e um euros e setenta e quatro cêntimos);- no ano de 2016, a Ré facturou à Autora 850.761,35€ (oitocentos e cinquenta mil, setecentos e sessenta e um euros e trinta e cinco cêntimos);- no ano de 2017, a Ré facturou à Autora 579.375,82€ (quinhentos e setenta e nove mil, trezentos e setenta e cinco euros e oitenta e dois cêntimos);

p) De 1992 a 1996, as vendas dos produtos da Ré representaram quase 100% (cem pontos percentuais) do volume de negócios da Autora;

q) De 1997 a 1999, as vendas dos produtos da Ré representaram entre 65% (sessenta e cinco pontos Percentuais) a 75% (setenta e cinco pontos percentuais) do volume de negócios da Autora;

r) No ano de 2000, as vendas dos produtos da Ré representaram 52% (cinquenta e dois pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.961.712,00€ (um milhão, novecentos e sessenta e um mil, setecentos e doze euros)];

s) No ano de 2001, as vendas dos produtos da Ré representaram 49,70% (quarenta e nove vírgula sete pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 2.058.153,00€ (dois milhões e cinquenta e oito mil, centos e cinquenta e três euros)];

t) No ano de 2002, as vendas dos produtos da Ré representaram 52,90% (cinquenta e dois vírgula noventa pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 2.354.797,00€ (dois milhões, trezentos e cinquenta e quatro mil, setecentos e noventa e sete euros)];

u) No ano de 2003, as vendas dos produtos da Ré representaram 50,80% (cinquenta vírgula oitenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 2.442.630,00€ (dois milhões, quatrocentos e quarenta e dois mil, seiscentos e trinta euros)];

v) No ano de 2004, as vendas dos produtos da Ré representaram 56,20% (cinquenta e seis vírgula vinte pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 2.361.565€ (dois milhões, trezentos e sessenta e um mil, quinhentos e sessenta e cinco euros)];

w) No ano de 2005, as vendas dos produtos da Ré representaram 58,60% (cinquenta e oito vírgula sessenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 2.664.997,00€ (dois milhões, seiscentos e sessenta e quatro mil, novecentos e noventa e sete euros)];

x) No ano de 2006, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,50% (cinquenta e sete vírgula cinquenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 2.664.327,00€ (dois milhões, seiscentos e sessenta e quatro mil, trezentos e vinte e sete euros)];

y) No ano de 2007, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,60% (cinquenta e sete vírgula sessenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 2.881.805,00€ (dois milhões, oitocentos e oitenta e um mil, oitocentos e cinco euros)];

z) No ano de 2008, as vendas dos produtos da Ré representaram 56% (cinquenta e seis pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 2.460.413,00€ (dois milhões, quatrocentos e sessenta mil, quatrocentos e treze euros)];

aa) No ano de 2009, as vendas dos produtos da Ré representaram 53,50% (cinquenta e três vírgula cinquenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 2.251.846,00€ (dois milhões, duzentos e cinquenta e um mil, oitocentos e quarenta e seis euros)];

bb)No ano de 2010, as vendas dos produtos da Ré representaram 68,40% (sessenta e oito vírgula quarenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 2.525.025,00€ (dois milhões, quinhentos e vinte e cinco mil e vinte e cinco euros)];

cc) No ano de 2011, as vendas dos produtos da Ré representaram 68,90% (sessenta e oito vírgula noventa pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 2.394.642,00€ (dois milhões, trezentos e noventa e quatro mil, seiscentos e quarenta e dois euros)];

dd)No ano de 2012, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,90% (cinquenta e sete vírgula noventa pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.529.485,00€ (um milhão, quinhentos e vinte e nove mil, quatrocentos e oitenta e cinco euros)];

ee) No ano de 2013, as vendas dos produtos da Ré representaram 59% (cinquenta e nove pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.404.485,00€ (um milhões, quatrocentos e quatro mil, quatrocentos e oitenta e cinco euros)];

ff) No ano de 2014, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,90% (cinquenta e sete vírgula noventa pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.359.361,00€ (um milhão, trezentos e cinquenta e nove mil, trezentos e sessenta e um euros)];

gg)No ano de 2015, as vendas dos produtos da Ré representaram 55,10% (cinquenta e cinco vírgula dez pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.365.629,00€ (um milhão, trezentos e sessenta e cinco mil, seiscentos e vinte e nove euros)];

hh)No ano de 2016, as vendas dos produtos da Ré representaram 53,50% (cinquenta e três vírgula cinquenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.121.752,00€ (um milhão, cento e vinte e um mil, setecentos e cinquenta e dois euros)];

ii) No ano de 2017, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,50% (cinquenta e sete vírgula cinquenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 854.220,00€ (oitocentos e cinquenta e quatro mil, duzentos e vinte euros)];

jj) A A. deixou totalmente de visitar clientes do território, como por exemplo, o cliente “Mercado de ...”, de ....

III – QUESTÕES JURÍDICAS ESSENCIAIS DE QUE CUMPRE CONHECER.

(In)cumprimento do requisito previsto no artigo 640º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil. Ónus imposto ao impugnante de apresentar a correspondência entre os meios de prova considerados incorrectamente valorados e cada um dos concretos e especificados factos que são objecto da impugnação.

Passemos à sua análise:

Consta do acórdão recorrido relativamente aos motivos que determinaram a rejeição da impugnação de facto apresentada pelo apelante, por incumprimento do dever processual consignado no artigo 640º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil:

“Da pretendida alteração da matéria de facto, nos termos do artigo 662º, do CPC.

(…) Revertendo para o caso vertente, verifica-se que os Recorrentes, nas suas alegações e conclusões do recurso, consideram que foram incorrectamente julgados determinados factos.

Assim, os Recorrentes dividiram a factualidade que impugnaram em grupos:

Em primeiro lugar, impugnaram os pontos 22, 29 e 30 dos factos provados, pugnando que tal factualidade deve ser julgada não provada e, bem assim a al. aa) dos factos não provados que entendem que deve ser julgada provada.

Em segundo lugar, os Recorrentes impugnam os pontos 1, 11, 12 e 13 dos factos provados, pugnando que os mesmos devem ser julgados não provados.

Em terceiro lugar, impugnam os Recorrentes partes que indicam a negrito dos pontos 25, 26 e 34 dos factos provados, entendendo que nessa parte os mesmos devem ser julgados não provados.

Em quarto lugar, os Recorrentes impugnam os factos não provados das al. m, n, o, p, q, s, t, w, x, y, z, aa, bb, cc e mm, pugnando que devem ser considerados provados.

Em quinto lugar, os Recorrentes impugnam os factos não provados das al., l, dd, ff, hh, ii, jj, kk, e ll, pugnando que os mesmos devem ser julgados provados, e que deve ser acrescentada aos factos provados a factualidade indicada nas conclusões 23 e 24 da apelação.

Sucede que, relativamente a todos os factos impugnados, os Recorrentes não indicam os concretos meios probatórios que impunham decisão sobre esses pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida conforme exige o art. 640º, nº 1, al. b) e 2, al. a) do CPC.

Esta forma de impugnação não cumpre as exigências formais das alíneas b) do nº 1, e 2 al. a) do art. 640º do CPC.

Como se lê no Acórdão do STJ de 01.10.2015, a propósito da previsão do art. 640º do CPC, disponível in www.dgsi.pt:

“Quer isto dizer que recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus:

Primo: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento;

Secundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa;

Tertio: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas.

Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa-fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão”. (cfr., também, sobre esta matéria, Lopes do Rego, in “Comentários ao Código de Processo Civil”, pág. 465 e que, nesta parte, se mantém actual).

Diz-se também no acórdão do STJ de 19 de Fevereiro de 2015, acessível em www.dgsi.pt, que:

“(...), a exigência da especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem questionar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio tem por função delimitar o objeto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto”.

“…Por sua vez, a especificação dos concretos meios probatórios convocados, bem como a indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, serve sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova, sem prejuízo do seu poder inquisitório sobre toda a prova produzida que se afigure relevante para tal reapreciação, como decorre hoje, claramente, do preceituado no nº 1 do artigo 662º do CPC”.

“…É, pois, em vista dessa função, no tocante à decisão de facto, que a lei comina a inobservância daqueles requisitos de impugnação com a sanção da rejeição imediata do recurso, ou seja, sem possibilidade de suprimento, na parte afetada, nos termos do artigo 640º, nº 1, proémio, e nº 2, alínea a), do CPC”.

“…Não sofre, pois, qualquer dúvida que a falta de especificação dos requisitos enunciados no nº 1 do referido artigo 640º implica a imediata rejeição do recurso na parte infirmada”.

A interpretação da alínea c), do art. 640º do CPC, é-nos dada de forma exemplar por Abrantes Geraldes (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017, 4ª Edição, pág. 156), podendo ler-se a este propósito que:

“O Recorrente deixará expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem no reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente”.

Com este novo regime, em contraposição com o anterior, pretendeu-se que fosse rejeitada a admissibilidade de recursos em que as partes se insurgem em abstracto contra a decisão da matéria de facto.

Nessa medida, o recorrente tem que especificar os exactos pontos que foram, no seu entender, erradamente decididos e indicar, também com precisão, o que entende que se dê como provado.

A imposição de tais indicações precisas ao recorrente, visou impedir “recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, restringindo-se a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente.” (cfr. Abrantes Geraldes, ob. cit., p.153).

Também por esses motivos, o recorrente, além de ter que assinalar os pontos de facto que considera incorrectamente julgados e indicar expressamente a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre esses pontos, tem igualmente que especificar os meios de prova constantes do processo que determinam decisão diversa quanto a cada um dos factos (Cfr. Abrantes Geraldes, ob. cit., p.155).

Deste modo, relativamente a cada um dos factos que pretende obter diferente decisão da tomada na sentença, tem o recorrente que, com detalhe, indicar os meios de prova deficientemente valorados, criticar os mesmos e, discriminadamente, concluir pela resposta que deveria ter sido dada, evitando-se assim que sejam apresentados recursos inconsequentes, e sem fundamentação que possa ser apreciada e analisada.

Assim, não são admissíveis impugnações em bloco que avolumem num ou em vários conjuntos de factos diversos a referência à pertinente prova que motiva a pretendida alteração das decisões e que, na prática, se reconduzem a uma impugnação genérica, ainda que parcelar.

Nesse sentido, veja-se o Ac. do S.T.J., de 20.12.2017, onde, no sumário, se escreveu o seguinte: “I- A alínea b), do nº 1, do art. 640º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique “os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”, impõe que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respectivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos (sublinhado nosso);II - Não cumpre aquele ónus o apelante que, nas alegações e nas conclusões, divide a matéria de facto impugnada em três “blocos distintos de factos” e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna.”.

Em suma, a indicação dos concretos meios probatórios deve ser feita a cada facto impugnado, o que não se verifica no caso vertente.

Na verdade, os Recorrentes limitaram-se a criar vários grupos ou lotes de matéria de facto impugnada, indicando a cada grupo os concretos meios probatórios no seu entender adequados a lograr a procedência dessa impugnação, mas omitiram a indicação dos meios probatórios a cada um dos concretos factos impugnados, incluindo os indicados nas conclusões 23 e 24 do recurso.

Acresce que, a prova documental por si indicada, nada releva quanto à pretendida alteração, desacompanhada de qualquer outro meio de prova.

Deste modo, não tendo os Recorrentes observado o disposto no art. 640º, nº 1 e 2 do CPC, tal determina a rejeição do recurso, na parte relativa à impugnação da matéria de facto”.

Vejamos:

A única questão jurídica que cumpre apreciar nesta revista é a de saber se a A. recorrente/impugnante incumpriu (ou não) o requisito imposto pelo artigo 640º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil, dando assim azo à rejeição imediata do seu recurso em matéria de facto que veio a ter lugar.

Dispõe a alínea b), do nº 1 do artigo 640º do Código de Processo Civil:

“Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

(…) b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou de gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnada diversos da recorrida”.

Este preceito legal significa que é exigido ao impugnante a indicação dos meios de prova que não foram devidamente valorados pelo tribunal e, para além disso, que justifique, com clareza e rigor, as razões pelas quais tais elementos probatórios, devidamente conectados, directa e objectivamente, com cada um dos factos objecto de impugnação, impõem então resposta diversa da que foi (individualmente) proferida em relação aos mesmos.

Não é, portanto, suficiente fazer a simples descrição dos meios de prova que o impugnante considera relevantes e erradamente valorados (de natureza testemunhal, documental, pericial); o ordenamento jurídico processual obriga o recorrente (em matéria de facto) a justificar a razão concreta da sua discordância em sede de análise e valoração da prova produzida perante o juiz a quo, por referência a cada um dos factos impugnados (ou grupo de factos se, em casos especiais, existir uma interligação intrínseca e profunda entre eles que dispense essa individualização).

Cumpre assinalar, a este respeito, que a recorrente estruturou da seguinte forma a sua impugnação de facto:

Indicou primeiramente os pontos de facto que teriam sido incorrectamente decididas em 1ª instância, cumprindo devidamente a exigência prevista no artigo 640º, nº 1, alínea a), do Código de Processo Civil.

Estão, portanto, em causa, segundo a recorrente, pontos dados como provados sob os nºs 66, 73, 74, 80, 81, 82, 83 e 87, e não provados sob as alíneas c), d), e) g), h), i) j), l), o), dd), ee), ff), gg), hh) e ii).


A impugnante fez, de seguida, alusão ao acervo probatório que entendeu relevante, apresentando-o globalmente e em bloco, sem nenhuma referência especificada, em termos de conexão directa e concreta, aos pontos de facto (provados e não provados) mencionados.


Referenciou a este propósito:

“- os emails trocados entre Recorrente e Recorrida, em Maio de 2017, juntos por aquela (como Doc. n.º 2) em 13 de Dezembro de 2021 e não impugnados pela Recorrida, demonstrativos de que, em Maio de 2017, ascendia a 49.934,72€ (quarenta e nove mil, novecentos e trinta e quatro euros e setenta e dois cêntimos) a dívida vencida da Recorrente para com a Recorrida;

- os relatórios e contas da Recorrente e, bem assim, as correlatas declarações anuais de tributação, respeitantes aos 5 (cinco) anos anteriores à resolução contratual sub judice, juntos por aquela (como Docs. n.ºs 6 a 18) em 13 de Dezembro de 2021 e não impugnados pela Recorrida;

- a troca de correspondência electronicamente realizada através da aplicação informática instalada e disponibilizada pela Recorrida aos seus distribuidores (aplicação que recolhe informação atinente aos produtos, preços, descontos, clientes, quantidades e datas), realizada entre a “C......, Lda.” e a Recorrida relativa à distribuição feita por aquela eatinenteaos aspectos elencados: identificação dosclientes abrangidos por tal distribuição; datas das respectivas vendas; quantidades vendidas; descontos aplicados; e preços praticados no período temporal que decorreu entre Fevereiro de 2015 e 21 de Março de 2018, prolixa e mui relevante documentação junta aos autos, pela Recorrida, na sequência do douto despacho que, em 6 de Novembro de 2019, ordenou a correlata junção, em 6 de Janeiro de 2020;

- as declarações de parte da Recorrente (sintetizadas na própria sentença recorrida);

- depoimento da testemunha BB;

- depoimento da testemunha CC;

- depoimento da testemunha DD; e

- depoimento da testemunha EE”.

Passou, então, a recorrente a expor as seguintes considerações de índole geral:

“Em primeiro lugar, e no tocante aos clientes angariados pela Recorrente ao longo da relação de distribuição sub judice, que perdurou mais de um quarto de século, temos, desde logo, o facto de no contrato de distribuição inicial, celebrado nos idos de 1991, não constar qualquer listagem de putativos clientes previamente existentes, sendo que ante o cuidado permanente da Recorrida na elaboração dos contratos de distribuição que dava a assinar aos distribuidores como a Recorrente e, outrossim, como ditam as regras da experiência comum, da lógica e da normalidade das coisas, se tal listagem existisse, certamente seria anexada ao sobredito contrato, o que, como vimos, in casu não sucedeu.

Por sua vez, do “relatório de identificação e análise de distribuidores” elaborado e assinado por FF (Inspector da Recorrida), datado de 21 de Maio de 1996 (junto, com o requerimento probatório, como Doc. n.º 12), ressuma qual o número exacto de clientes existentes naquela data, e

Por fim, da troca de correspondência electronicamente realizada através da aplicação informática instalada e disponibilizada pela Recorrida aos seus distribuidores (aplicação que recolhe informação atinente aos produtos, preços, descontos, clientes, quantidades e datas), realizada entre a “C......, Lda.” e a Recorrida relativa à distribuição feita por aquela e atinente aos aspectos elencados: identificação dos clientes abrangidos por tal distribuição; datas das respectivas vendas; quantidades vendidas; descontos aplicados; e preços praticados no período temporal que decorreu entre Fevereiro de 2015 e 21 de Março de 2018 (prolixa e mui relevante documentação junta aos autos, pela Recorrida, na sequência do douto despacho que, em6 deNovembro de2019, ordenou acorrelatajunção, em6 deJaneirode2020)ressuma, aodetalhe, o número de clientes existentes à data da resolução do contrato sub judice e, outrossim, o (mui) considerável volume de negócios de tal clientela, angariada pela Recorrente ao longo de mais de um quarto de século (rectius, desde os idos de 1991) e de que a Recorrida passou a beneficiar após tal cessação contratual.

Ademais, no que tange à putativa “avultada dívida” (sic douta sentença recorrida) da Recorrente para com a Recorrida, temos, desde logo, que da análise dos emails trocados entre ambas, em Maio de 2017 [documentos juntos pela Recorrente (como Doc. n.º 2) em 13 de Dezembro de 2021 e não impugnados pela Recorrida] e, outrossim, das contas-correntes de ambas, resulta que, em Maio de 2017 e, portanto, meses antes da resolução contratual sub judice, ascendia a cerca de 50.000,00€ (cinquenta mil euros) o valor da correlata dívida vencida, valor consideravelmente inferior aos 300.000,00€ aventados pelas infra elencadas testemunhas da Recorrida nos respectivos depoimentos e, maxime, inferiores ao valor das garantias bancárias in casu prestadas pela Recorrente,

Cumprindo não olvidar que os supra mencionados emails são temporalmente concomitantes com a prestação de garantias suplementares pela Recorrente, reveladores da boa-fé que sempre marcou a sua conduta contratual,

Maxime porquanto, como ditam as regras da lógica, da experiência comum e da normalidade das coisas, sentido algum faria a Recorrente reforçar, meses antes de resolver sem fundamento, como erradamente sustenta o Digníssimo Tribunal a quo, o contrato de distribuição sub judice, as garantias prestadas, desse modo “deitando por terra” substanciais dezenas de milhares de euros...”

Passou, nesta sequência, a impugnante a apresentar a (longa) transcrição dos diversos depoimentos e a proceder à remissão genérica para o teor da carta de resolução, para o relatório e conta da recorrente e declarações anuais de tributação, respeitantes aos cinco anos anteriores à resolução contratual.


Finalizou com a apresentação das respostas alternativas que, no seu entender, deveriam ser conferidas à decisão de facto, cumprindo desse modo a exigência prevista no artigo 640º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil.


Vejamos:


Estão em causa os seguintes pontos de facto indicados na conclusão XVI das alegações do recurso de apelação:

“66 - A quatro dias da Feira de ... a A. mantinha-se sem dar satisfação a interpelações por parte da R. para que procedesse à regularização do montante da dívida não coberta por garantia para então se poder abastecer de produtos (in casu dado como provado);

73 - A A. manteve durante alguns anos um montante em dívida para com a R. perto dos €300.000,00 por fornecimentos a crédito a ela feitos pela A. (in casu dado como provado);

74 - Valor que ultrapassava os plafonds cobertos por garantia bancária e o sistema informático da R. bloqueava os fornecimentos recusando-os e não permitindo nova facturação e carregamentos à A. (in casu dado como provado);

80 - Entre 2012 e 2017, a R. recebeu reclamações de clientes, junto do pessoal da R. por não fornecimento de produto ou demora da A. em fazê-lo, nomeadamente do cliente V........ (in casu dado como provado);

81 - Até 2015, a A. acumulara uma dívida de fornecimento a crédito da ordem dos €300.000,00 e apenas cerca de €150.000,00 se encontravam a coberto de garantias (in casu dado como provado);

82 - Recebendo regulares interpelações para regularizar essa situação, sob a cominação de ver suspensos os fornecimentos (in casu dado como provado);

83 - Suspensões essas que várias vezes vieram a ocorrer (in casu dado como provado);

87 - A A., por várias, abastecia-se no mercado junto a terceiros fornecedores (in casu dado como provado);

c) A Ré em Fevereiro de 2015 nomeou unilateralmente outras sociedades comerciais para paralelamente à A. distribuírem os seus produtos na área de ... atribuída em exclusividade à A.; (in casu dado como não provado);

d) Por força dos supra relatados comportamentos por parte da Ré, sofreu a Autora uma redução drástica na sua facturação, deixando de auferir, em média, 177.950,59€ (cento e setenta e sete mil, novecentos e cinquenta euros e cinquenta e nove cêntimos) por ano, o que perfaz uma perda de lucros no valor de 355.901,18€ (trezentos e cinquenta e cinco mil, novecentos e um euros e dezoito cêntimos), relativa aos anos de 2016 e 2017 (in casu dado como não provado);

e) Deixou a Autora de receber o valor de 192.780,00€ (cento e noventa e dois mil, setecentos e oitenta euros), montante que obteria se o contrato de distribuição sub judice fosse pontualmente cumprido até ao termo da sua vigência, em 31 de Dezembro de 2018. (in casu dado como não provado)

g) A R. não pagou à A. o valor de 6.950,00€ (seis mil, novecentos e cinquenta euros) a atinente à creditação das acções de trade marketing e outros créditos ao mercado, devidos e não pagos à Autora. (in casu dado como não provado).

h) A partir de 18 de Outubro de 2017 a R. recusou-se a fornecer produtos à A. mesmo que pagos a pronto; (in casu dado como não provado)

i) A Ré nomeou as sociedades “C........ ....”; “J. ......, Lda.”; “J. ....., Lda.” para, paralelamente àAutora, distribuírem osseus produtosno distrito de ...;(in casu dado como nãoprovado)

j) O fornecimento da Feira de ... representava um volume de negócios na ordem dos €120.000,00 (in casu dado como não provado)

l)Atéàdata daresoluçãocontratual, aAutoraangarioucerca de2.300(doismiletrezentos) clientes de forma directa (in casu dado como não provado);

o) O volume de facturação da Ré à Autora em produtos abrangidos pelo contrato de distribuição foi o seguinte: (...) no ano de 2012, a Ré facturou à Autora 2.200.866,13€ (dois milhões e duzentos mil, oitocentos e sessenta e seis euros e treze cêntimos);- no ano de 2013, a Ré facturou à Autora 2.175.344,00€ (dois milhões, cento e setenta e cinco mil, trezentos e quarenta e quatro euros) em produtos abrangidos pelo contrato;- no ano de 2014, a Ré facturou à Autora 1.207.708,90€ (um milhão, duzentos e sete mil, setecentos e oito euros e noventa cêntimos);- no ano de 2015, a Ré facturou à Autora 1.147.441,74€ (um milhão, cento e quarenta e sete mil, quatrocentos e quarenta e um euros e setenta e quatro cêntimos);- no ano de 2016, a Ré facturou à Autora 850.761,35€ (oitocentos e cinquenta mil, setecentos e sessenta e um euros etrinta ecinco cêntimos);- no anode2017, aRéfacturou à Autora 579.375,82€(quinhentos esetenta e nove mil, trezentos e setenta e cinco euros e oitenta e dois cêntimos); (in casu dado como não provado)

dd) No ano de 2012, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,90% (cinquenta e sete vírgula noventa pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.529.485,00€ (um milhão, quinhentos e vinte e nove mil, quatrocentos e oitenta e cinco euros)]; (in casu dado como não provado).

ee) No ano de 2013, as vendas dos produtos da Ré representaram 59% (cinquenta e nove pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.404.485,00€ (um milhões, quatrocentos e quatro mil, quatrocentos e oitenta e cinco euros)]; (in casu dado como não provado)

ff) No ano de 2014, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,90% (cinquenta e sete vírgula noventa pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.359.361,00€ (um milhão, trezentos e cinquenta e nove mil, trezentos e sessenta e um euros)]; (in casu dado como não provado)

gg) Noano de2015,asvendasdosprodutosda Ré representaram 55,10%(cinquenta ecincovírgula dez pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.365.629,00€ (um milhão, trezentos e sessenta e cinco mil, seiscentos e vinte e nove euros)]; (in casu dado como não provado)

hh) No ano de 2016, as vendas dos produtos da Ré representaram 53,50% (cinquenta e três vírgula cinquenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.121.752,00€ (um milhão, cento e vinte e um mil, setecentos e cinquenta e dois euros)]; (in casu dado como não provado)

ii) No ano de 2017, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,50% (cinquenta e sete vírgula cinquenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 854.220,00€ (oitocentos e cinquenta e quatro mil, duzentos e vinte euros)]; (in casu dado como não provado)”.

Indicou a impugnante, a este propósito, as seguintes respostas alternativas:

“1. Eliminando-se da matéria de facto provada, pelo menos, os seguintes factos:

66 - A quatro dias da Feira de ... a A. mantinha-se sem dar satisfação a interpelações por parte da R. para que procedesse à regularização do montante da dívida não coberta por garantia para então se poder abastecer de produtos;

73 - A A. manteve durante alguns anos um montante em dívida para com a R. perto dos €300.000,00 por fornecimentos a crédito a ela feitos pela A.;

74 - Valor que ultrapassava os plafonds cobertos por garantia bancária e o sistema informático da R. bloqueava os fornecimentos recusando-os e não permitindo nova facturação e carregamentos à A.;

80 - Entre 2012 e 2017, a R. recebeu reclamações de clientes, junto do pessoal da R. por não fornecimento de produto ou demora da A. em fazê-lo, nomeadamente do cliente V........;

81 - Até 2015, a A. acumulara uma dívida de fornecimento a crédito da ordem dos €300.000,00 e apenas cerca de €150.000,00 se encontravam a coberto de garantias;

82 - Recebendo regulares interpelações para regularizar essa situação, sob a cominação de ver suspensos os fornecimentos;

83 - Suspensões essas que várias vezes vieram a ocorrer;

87 - A A., por várias, abastecia-se no mercado junto a terceiros fornecedores;

2. Aditando-se à matéria de facto provada, pelo menos, os seguintes factos:

c) A Ré em Fevereiro de 2015 nomeou unilateralmente outras sociedades comerciais para paralelamente à A. distribuírem os seus produtos na área de ... atribuída à A.;

d) Por força dos supra relatados comportamentos por parte da Ré, sofreu a Autora uma redução drástica na sua facturação, deixando de auferir, em média, 177.950,59€ (cento e setenta e sete mil, novecentos e cinquenta euros e cinquenta e nove cêntimos) por ano, o que perfaz uma perda de lucros novalorde355.901,18€(trezentose cinquentaecinco mil,novecentos eum eurose dezoito cêntimos), relativa aos anos de 2016 e 2017;

e) Deixou a Autora de receber o valor de 192.780,00€ (cento e noventa e dois mil, setecentos e oitenta euros), montante que obteria se o contrato de distribuição sub judice fosse pontualmente cumprido até ao termo da sua vigência, em 31 de Dezembro de 2018.

g) A R. não pagou à A. o valor de 6.950,00€ (seis mil, novecentos e cinquenta euros) a atinente à creditação das acções de trade marketing e outros créditos aomercado, devidos e não pagos à Autora.

h) A partir de 18 de Outubro de 2017 a R. recusou-se a fornecer produtos à A. mesmo que pagos a pronto;

i) A Ré nomeou as sociedades “C........ ....”; “J. ......, Lda.”; “J. ....., Lda.” para, paralelamente à Autora, distribuírem os seus produtos no distrito de ...;

j) O fornecimento da Feira de ... representava um volume de negócios na ordem dos €120.000,00;

l)Atéàdata daresoluçãocontratual, aAutoraangarioucerca de2.300(doismiletrezentos) clientes de forma directa;

o) O volume de facturação da Ré à Autora em produtos abrangidos pelo contrato de distribuição foi o seguinte: (...) no anode2012, a Ré facturouà Autora2.200.866,13€(dois milhões e duzentos mil, oitocentos e sessenta e seis euros e treze cêntimos);- no ano de 2013, a Ré facturou à Autora 2.175.344,00€ (dois milhões, cento e setenta e cinco mil, trezentos e quarenta e quatro euros) em produtos abrangidos pelo contrato;- no ano de 2014, a Ré facturou à Autora 1.207.708,90€ (um milhão, duzentos e sete mil, setecentos e oito euros e noventa cêntimos);- no ano de 2015, a Ré facturou à Autora 1.147.441,74€ (um milhão, cento e quarenta e sete mil, quatrocentos e quarenta e um euros e setenta e quatro cêntimos);- no ano de 2016, a Ré facturou à Autora 850.761,35€ (oitocentos e cinquenta mil, setecentos e sessenta e um euros e trinta e cinco cêntimos);- no ano de 2017, a Ré facturou à Autora 579.375,82€ (quinhentos e setenta e nove mil, trezentos e setenta e cinco euros e oitenta e dois cêntimos);

dd) No ano de 2012, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,90% (cinquenta e sete vírgula noventa pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.529.485,00€ (um milhão quinhentos e vinte e nove mil, quatrocentos e oitenta e cinco euros)];

ee) No ano de 2013, as vendas dos produtos da Ré representaram 59% (cinquenta e nove pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.404.485,00€ (um milhões, quatrocentos e quatro mil, quatrocentos e oitenta e cinco euros)];

ff) No ano de 2014, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,90% (cinquenta e sete vírgula noventa pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.359.361,00€ (um milhão, trezentos e cinquenta e nove mil, trezentos e sessenta e um euros)];

gg) Noano de2015,asvendasdosprodutosda Ré representaram 55,10%(cinquenta ecincovírgula dez pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.365.629,00€ (um milhão, trezentos e sessenta e cinco mil, seiscentos e vinte e nove euros)];

hh) No ano de 2016, as vendas dos produtos da Ré representaram 53,50% (cinquenta e três vírgula cinquenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.121.752,00€ (um milhão, cento e vinte e um mil, setecentos e cinquenta e dois euros)];

ii) No ano de 2017, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,50% (cinquenta e sete vírgula cinquenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 854.220,00€ (oitocentos e cinquenta e quatro mil, duzentos e vinte euros)];

3. Aditando-se à matéria de facto não provada, pelo menos, os seguintes factos:

66 - A quatro dias da Feira de ... a A. mantinha-se sem dar satisfação a interpelações por parte da R. para que procedesse à regularização do montante da dívida não coberta por garantia para então se poder abastecer de produtos;

73 - A A. manteve durante alguns anos um montante em dívida para com a R. perto dos €300.000,00 por fornecimentos a crédito a ela feitos pela A.;

74 - Valor que ultrapassava os plafonds cobertos por garantia bancária e o sistema informático da R. bloqueava os fornecimentos recusando-os e não permitindo nova facturação e carregamentos à A.;

80 - Entre 2012 e 2017, a R. recebeu reclamações de clientes, junto do pessoal da R. por não fornecimento de produto ou demora da A. em fazê-lo, nomeadamente do cliente V........;

81 - Até 2015, a A. acumulara uma dívida de fornecimento a crédito da ordem dos €300.000,00 e apenas cerca de €150.000,00 se encontravam a coberto de garantias;

82 - Recebendo regulares interpelações para regularizar essa situação, sob a cominação de ver suspensos os fornecimentos;

83 - Suspensões essas que várias vezes vieram a ocorrer;

87 - A A., por várias, abastecia-se no mercado junto a terceiros fornecedores;

4. Eliminando-se da matéria de facto não provada, pelo menos, os seguintes factos:

c) A Ré em Fevereiro de 2015 nomeou unilateralmente outras sociedades comerciais para paralelamente à A. distribuírem os seus produtos na área de ... atribuída à A.;

d) Por forçadossupra relatados comportamentos porparteda Ré,sofreuaAutora umaredução drástica na sua facturação, deixando de auferir, em média, 177.950,59€ (cento e setenta e sete mil, novecentos e cinquenta euros e cinquenta e nove cêntimos) por ano, o que perfaz uma perda de lucros no valor de 355.901,18€ (trezentos e cinquenta e cinco mil, novecentos e um euros e dezoito cêntimos), relativa aos anos de 2016 e 2017;

e) Deixou a Autora de receber o valor de 192.780,00€ (cento e noventa e dois mil, setecentos e oitenta euros), montante que obteria se o contrato de distribuição sub judice fosse pontualmente cumprido até ao termo da sua vigência, em 31 de Dezembro de 2018.

g) AR. nãopagouà A.ovalorde 6.950,00€(seis mil, novecentos ecinquenta euros) aatinente à creditação das acções de trade marketing e outros créditos ao mercado, devidos e não pagos à Autora.

h) A partir de 18 de Outubro de 2017 a R. recusou-se a fornecer produtos à A. mesmo que pagos a pronto;

i) A Ré nomeou as sociedades “C........ ....”; “J. ......, Lda.”; “J. ....., Lda.” para, paralelamente à Autora, distribuírem os seus produtos no distrito de ...;

j) O fornecimento da Feira de ... representava um volume de negócios na ordem dos €120.000,00;

l) Até à data da resolução contratual, a Autora angariou cerca de 2.300 (dois mil e trezentos) clientes de forma directa;

o) O volume de facturação da Ré à Autora em produtos abrangidos pelo contrato de distribuição foi o seguinte: (...) no ano de 2012, a Ré facturou à Autora 2.200.866,13€ (dois milhões e duzentos mil, oitocentos e sessenta e seis euros e treze cêntimos);- no ano de 2013, a Ré facturou à Autora 2.175.344,00€ (dois milhões, cento e setenta e cinco mil, trezentos e quarenta equatro euros)emprodutosabrangidospelocontrato;- noano de2014,a Réfacturou à Autora 1.207.708,90€ (um milhão, duzentos e sete mil, setecentos e oito euros e noventa cêntimos);- no ano de 2015, a Ré facturou à Autora 1.147.441,74€ (um milhão, cento e quarenta e sete mil, quatrocentos e quarenta e um euros e setenta e quatro cêntimos);- no ano de 2016,aRéfacturouà Autora 850.761,35€ (oitocentosecinquenta mil,setecentosesessenta e um euros e trinta e cinco cêntimos);- no ano de 2017, a Ré facturou à Autora 579.375,82€ (quinhentos e setenta e nove mil, trezentos e setenta e cinco euros e oitenta e dois cêntimos);

dd) No ano de 2012, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,90% (cinquenta e sete vírgula noventa pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.529.485,00€ (um milhão, quinhentos e vinte e nove mil, quatrocentos e oitenta e cinco euros)];

ee) No ano de 2013, as vendas dos produtos da Ré representaram 59% (cinquenta e nove pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.404.485,00€ (um milhões, quatrocentos e quatro mil, quatrocentos e oitenta e cinco euros)];

ff) No ano de 2014, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,90% (cinquenta e sete vírgula noventa pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.359.361,00€

(um milhão, trezentos e cinquenta e nove mil, trezentos e sessenta e um euros)];

gg) No ano de 2015, as vendas dos produtos da Ré representaram 55,10% (cinquenta e cinco vírgula dez pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 1.365.629,00€ (um milhão, trezentos e sessenta e cinco mil, seiscentos e vinte e nove euros)];

hh) No ano de 2016, as vendas dos produtos da Ré representaram 53,50% (cinquenta e três vírgulacinquenta pontospercentuais) do volumede negóciosda Autora [rectius, 1.121.752,00€ (um milhão, cento e vinte e um mil, setecentos e cinquenta e dois euros)];

ii) No ano de 2017, as vendas dos produtos da Ré representaram 57,50% (cinquenta e sete vírgula cinquenta pontos percentuais) do volume de negócios da Autora [rectius, 854.220,00€ (oitocentos e cinquenta e quatro mil, duzentos e vinte euros)];”.

Ora, a apelada fez desde logo notar, nas suas contra-alegações, o seguinte em defesa do contraditório que lhe assiste:

Finalmente teremos de afirmar que a recorrente na sua desmedida ambição de inverter a prova esmagadora em seu desfavor e adquirir prova que não fez por via da pretendida reapreciação da matéria defacto, fê-lo deuma forma tãogenérica quanto inadmissível. Naverdade, para além da junção de extensas transcrições de depoimentos, e essencialmente até das duas principais testemunhas da recorrida, não identifica em lado algum os pontos dessa transcrição das gravações que em concreto e supostamente fundamentariam cada uma das alterações dos factos dados como provados ou a prova de factos alegadamente dados como não provados, erradamente. Limita-se a Recorrente a juntar transcrições da matéria de facto testemunhadas e praticamente, sem mais, a pedir aos Senhores Desembargadores que de entre todo esse acervo testemunhal, façam eles o trabalho que a recorrente se absteve afinal de fazer, como lhe competiria para inversão do sentido da resposta dada pelo Tribunal “a quo” as dezenas de factos que, muito comodamente, extensamente enumera”.

Vejamos:

Constitui posição firme e consolidada do Supremo Tribunal de Justiça o entendimento segundo o qual a análise relativa à exigência do cumprimento dos requisitos constantes do artigo 640º do Código de Processo Civil obedece desde logo aos princípios gerais da proporcionalidade, adequação e razoabilidade, com o primado da substância sobre a forma, em termos de afastar a drástica solução da imediata rejeição da impugnação de facto no caso de as deficiências, estritamente formais, no cumprimento dos requisitos estabelecidos no artigo 640º do Código de Processo Civil permitirem, não obstante, compreender e alcançar o seu exacto sentido, sendo assim perfeitamente possível ao julgador, sem especiais dificuldades ou esforços, aquilatar em toda a sua amplitude e com toda a segurança do respectivo mérito, o que está em consonância com os princípios gerais consagrados nos artigos 18º, nº 2 e 3 e 20º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa que prevêem a garantia da tutela da jurisdição efectiva e do direito fundamental a um processo judicial equitativo e justo.


Assim sendo, será de admitir (e não rejeitar) a impugnação em relação à qual seja objectivamente possível destrinçar e localizar suficientemente os pontos de facto impugnados, os meios de prova com eles conectados e que justificam a alteração pretendida, bem como, por fim, a resposta alternativa proposta pelo recorrente, em termos da sua segura compreensibilidade pelo julgador quanto ao seu conteúdo e sentido.


Note-se ainda que está aqui igualmente em causa a imprescindível salvaguarda do exercício do contraditório pela contraparte que, ao ser confrontada com uma impugnação genérica e/ou confusa, vê acentuadamente dificultada a sua capacidade de resposta, pela consequente incompreensão das razões para a alteração de facto assim deficientemente apresentadas.


(Sobre esta matéria, vide, entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Dezembro de 2023 (relator Nuno Pinto de Oliveira) proferido no processo nº 985/20.8T8PNF.P1.S2, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de Dezembro de 2023 (relatora Catarina Serra) proferido no processo nº 2037/21.7T8FAR.E1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Outubro de 2023 (relatora Graça Trigo) proferido no processo nº 1/20.2T8AVR.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de Julho de 2014 (relator Gabriel Catarino) proferido no processo nº 1825/09.7TBSTS.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Outubro de 2019 (relatora Rosa Tching) proferido no processo nº 77/06.5TBGVA.C2.S2, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de Outubro de 2015 (relatora Prazeres Beleza) proferido no processo nº 6626/09.0TVLSB.L1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Janeiro de 2021 (relator Cura Mariano) proferido no processo nº 1121/13.5TVLSB.L1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Dezembro de 2020 (relator Ilídio Sacarrão Martins) proferido no processo nº 274/17.8AVR.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Dezembro de 2019 (relatora Graça Trigo) proferido no processo nº 363/07.7TVPRT-D.P2.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Janeiro de 2023 (relator Vieira e Cunha) proferido no processo nº 2387/20.0T8STR.E1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Janeiro de 2021 (relator Pinto de Almeida) proferido no processo nº 399/18.2T8PNF.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Abril de 2023 (relatora Graça Trigo) proferido no processo nº 1342/19.7T8AVR.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; na doutrina, vide Lebre de Freitas, Armindo Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre in “Código de Processo Civil Anotado” Volume III, Almedina 2022, 3ª edição, a páginas 98 a 99; Abrantes Geraldes, in “Recursos em Processo Civil”, Almedina 2022, 7ª edição, a páginas 201 a 208).


Todavia, a aplicação destes princípios gerais basilares não significa, de modo algum, que a parte que decide impugnar a matéria de facto se possa sentir desobrigada ou dispensada de cumprir, com o zelo e rigor devidos, todas e cada uma das obrigações processuais fixadas no nº 1 do artigo 640º do Código de Processo Civil, que no fundo constituem a efectiva manifestação das razões da sua discordância relativamente ao veredicto de facto proferido pela 1ª instância.


Ou seja, a circunstância de não ser de rejeitar o conhecimento da impugnação de facto, nos termos do artigo 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, por desproporcional e não razoável, quando as questões em análise se encontrarem devidamente focalizadas, sendo praticamente intuitiva a sua compreensibilidade, não obsta, por seu turno, à dita rejeição se o não cumprimento formal dos mesmos requisitos, exigidos na norma legal referida, se verificar num contexto em que os factos controvertidos são variados e relativamente complexos, importando dilucidá-los de forma organizada, metódica e especificada, como a lei obriga.


Os princípios gerais enunciados da proporcionalidade e razoabilidade têm essencialmente uma função moderadora da rigidez e do exacerbado formalismo na análise do cumprimento do artigo 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, funcionando como uma espécie de filtro de segurança do sistema, sem que, em circunstância alguma, devam servir como forma de desculpabilização, panaceia ou manto (ilimitado) de cobertura e salvaguarda de falhas ou omissões, quando é evidente e inegável o não acatamento de cada uma das obrigações processuais aí especificamente exigidas.


Acontece, no caso concreto, que a recorrente considerou estar dispensada de proceder a qualquer tipo de conexão entre os meios de prova por si referidos a alteração na decisão de facto que os mesmos justificavam, relegando (comodamente) tal operação intelectual e jurídica para o Tribunal da Relação (com o erróneo fundamento de que a lei não o exigia).


(vide conclusões 5ª e 6ª, onde se afirma expressa e claramente:

“Considera a Recorrente que, ex vi do quadro legal vigente (concorde-se ou não com ele, é o regime que vigora), mais não lhe era legalmente exigível, maxime a (putativa) obrigação de, no tocante à especificação dos pontos de facto que considera mal julgados, discriminar “cada facto impugnado e a respectiva prova que, no seu entender, impunha decisão diferente da proferida” (sic) sustentada pelo Digníssimo Tribunal a quo no acórdão ora em crise, sob pena de se estar a criar, por via jurisprudencial,umnovoónusdeimpugnaçãoparaalémdoslegaletaxativamenteprevistosnoartigo 640.º do Código de Processo Civil;

O que vale por dizer que o Digníssimo Tribunal a quo sustentou uma interpretação das regras processuais ínsitas no artigo 640.º do Código de Processo Civil sem o mínimo respaldo na letra da Lei (interpretação essa brutal e ilegitimamente limitativa do direito ao recurso da Recorrente), como se do exercício de poderes discricionários se tratasse, para, na prática, se demitir de exercer a actividade judicativa susceptível de permitir a modificação da decisão que é o verdadeiro desiderato do recurso de apelação, fulminando a apelação com uma rejeição - como se estivéssemos perante uma situação de omissão, tout court, de conclusões - e sem tampouco aventar a possibilidade de convite ao aperfeiçoamento”).

Ora, contrariamente ao entendimento da recorrente, a alínea b) do nº 1 do artigo 640º do Código de Processo Civil impõe inequivocamente uma obrigação processual específica que consiste no dever da impugnante efectuar (ela e não o Tribunal da Relação) a correspondência directa e objectiva entre os meios probatórios por si indicados e a justificação (por eles representada) para a modificação dos pontos de facto considerados incorrectamente julgados (revelada pelo segmento da norma onde se lê: “meios de prova (…) que impunham decisão diversa”).


O que significa que não é suficiente, para se considerar cumprida a exigência da alínea b) do nº 1 do artigo 640º do Código de Processo Civil, a mera reunião aglomerada dos diversos meios de prova entendidos por relevantes, feita genericamente e em estilo puramente descritivo, numa amálgama indiferenciada, sem nenhuma referência directa, concreta e objectiva aos pontos de facto em causa, individualmente considerados, tencionando desse modo o impugnante que o Tribunal da Relação realize afinal a tarefa que exclusivamente lhe competia: seleccionar dos elementos probatórios os que se destinam à modificação dos pontos de facto (ou, excepcionalmente, os grupos delimitados de factos intrinsecamente ligados entre si), estabelecendo a indispensável conexão concreta entre os meios de prova e o juízo de facto por eles imposto (segundo o seu entendimento).


No fundo, os meios de prova apresentados têm de o ser por referenciação aos factos, ou eventualmente, em casos especiais, grupo temáticos de factos interligados unitariamente entre si, a que concretamente se reportam, só assim se tornando possível alcançar, com inteiro rigor e certeza, as razões para a discordância da impugnante que justificam, facto a facto, as modificações almejadas, o que evitará a apresentação de impugnações de facto genéricas, proibidas pela norma processual em apreço.


Conforme refere Abrantes Geraldes in “Recursos em Processo Civil”, Almedina 2022, 7ª edição, a página 197: “(…) o recorrente deve especificar, na motivação, os meios de prova, constantes do processo ou que nele tenham sido registados, que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos. (sublinhado nosso).


(Sobre esta temática, vide, entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Dezembro de 2023 (relator António Magalhães), proferido no processo nº 3054/16.4T8LRA.C2.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Novembro de 2023 (relator Manuel Capelo), proferido no processo nº 556/21.4PNF.P1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Março de 2023 (relator Nuno Pinto de Oliveira), proferido no processo nº 296/19.4T8ESP.P1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Março de 2023 (relator Nuno Pinto de Oliveira), proferido no processo nº 2947/17.6T8LSB.L1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Maio de 2023 (relatora Catarina Serra), proferido no processo nº 6713/19.6T8GMR.G1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Julho de 2021 (relator Júlio Gomes), proferido no processo nº 1006/11.0TTLRA.C1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de Outubro de 2015 (relatora Prazeres Beleza), proferido no processo nº 6626/09.0TVLSB.L1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de Dezembro de 2017 (relator Ribeiro Cardoso), proferido no processo nº 299/13.2TTVRL.G1.S2; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Junho de 2019 (relator José Rainho), proferido no processo nº 152/18.3T8GRD.C1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Novembro de 2020 (relatora Paula Sá Fernandes), proferido no processo nº 950/18.8T8VIS.C2.S1, todos publicados in www.dgsi.pt).


Na situação sub judice, perante um considerável e complexo e intrincado conjunto de factos objecto da impugnação (no conjunto dos 87 factos dados como provados e 36 como não provados, foram objecto de impugnação 10 dos primeiros e 15 dos segundos), a recorrente limitou-se a aludir, em bloco, a todos os meios de prova que considerava incorrectamente apreciados, sem que se consiga assim descortinar objectivamente quais os documentos ou depoimentos que se serviriam, ponto por ponto, para afastar/alterar o juízo de facto colocado em crise.


Embora nas alegações do recurso de apelação, o apelante haja procedido inicialmente à diferenciação temática entre “os clientes angariados no âmbito da relação de distribuição que perdurou durante mais de um quarto de século”; a “a putativa avultada dívida” e “os fundamentos da resolução in casu operada pela recorrente”, o certo é a factualidade concreta descrita no conjunto de factos objecto de impugnação extravasa em muito a mera enunciação destes temas gerais, conforme resulta liminarmente da sua simples leitura.


Nesses pontos de facto – e, de forma interligada, nas respostas alternativas propostas – existe um conjunto enorme de materialidade fáctica, ampla e relativamente complexa, relativamente à qual não é objectivamente possível descortinar quais os meios de prova que, uma vez analisados pelo Tribunal da Relação, imporiam operar a sua modificação em conformidade com os termos da impugnação.


E era sobre o recorrente que impendia a obrigação de indicar de forma especificada quais os meios de prova que foram erradamente valorados e que, por isso mesmo, justificam, ponto por ponto, a modificação pretendida.


Pelo que a decisão tomada pelo Tribunal da Relação de rejeição do conhecimento da matéria de facto, com fundamento no incumprimento do requisito previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 640º do Código de Processo Civil, é absolutamente justificada, não merecendo o menor reparo ou censura.


Por outro lado, não é compreensível a invocação do vício de inconstitucionalidade suscitado pelo impugnante, quando do que se trata é da simples interpretação de uma norma de cariz processual que visa garantir a seriedade, clareza e justificação relativamente ao conteúdo, sentido e alcance da impugnação de facto e garantir essencialmente a possibilidade do exercício do contraditório da parte contrária (que in casu suscitou certeiramente, nas suas contra-alegações, o vício consistente no incumprimento do disposto no artigo 640º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil que afectou gravemente o exercício do seu indispensável contraditório).


Nega-se assim a revista.

IV – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes do Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção) em negar a revista.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 16 de Janeiro de 2024.

Luís Espírito Santo (Relator)

Leonel Serôdio

Luís Correia de Mendonça (vencido conforme declaração junta)

Voto vencido pelas seguintes razões. A autora satisfez, bem o ónus de discriminação fáctica das alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 640.º, (pretende [conclusão XXIX] a eliminação da matéria dos factos provados números 66, 73, 74, 80, 81,82,83,87, o aditamento à matéria de facto, provada e não provada, de factos que especificamente enuncia, com consequente eliminação de matéria de facto não provada, também indicada em termos específicos).

Até aqui existe pleno acordo entre os membros do colégio. A divergência existe em relação ao ónus de discriminação probatório A este respeito, a autora apresentou detalhadas conclusões nos números IX, XVII, XVII, XVIII, XIX, XX, XXI, XXII, XXIII, XXIV, XXV, XXVI, XXVII, XXVIII, com pormenorizadas indicações dos meios de prova que sustentam a sua impugnação do julgamento de facto, complementadas com um exame crítico desasa provas.

O acórdão não reproduz todas as conclusões da recorrente, o que agora se faz, sob pena de a compreensão do que está agora em jogo ficar comprometida.

Concluiu realmente a recorrente, no que se refere aos meios probatórios:

XVII - Com efeito, entende a Recorrente que a análise crítica e conjugada dos elementos probatórios infra elencados à luz das regras da experiência comum, da lógica e da normalidade das coisas, conjugados entre si e com os demais factos in casu dados como provados e, por inerência, com os elementos probatórios subjacentes a tal julgamento, impõe decisão diametralmente oposta sobre a factualidade supra elencada, a saber:

- os emails trocados entre Recorrente e Recorrida, em Maio de 2017, juntos por aquela (como Doc. n.º 2) em 13 de Dezembro de 2021 e não impugnados pela Recorrida, demonstrativos de que, em Maio de 2017, ascendia a 49.934,72€ (quarenta e nove mil, novecentos e trinta e quatro euros e setenta e dois cêntimos) a dívida vencida da Recorrente para com a Recorrida;

- os relatórios e contas da Recorrente e, bem assim, as correlatas declarações anuais de tributação, respeitantes aos 5 (cinco) anos anteriores à resolução contratual sub judice, juntos por aquela (como Docs. n.ºs 6 a 18) em 13 de Dezembro de 2021 e não impugnados pela Recorrida;

- a troca de correspondência electronicamente realizada através da aplicação informática instalada e disponibilizada pela Recorrida aos seus distribuidores (aplicação que recolhe informação atinente aos produtos, preços, descontos, clientes, quantidades e datas), realizada entre a “C......, Lda.” e a Recorrida relativa à distribuição feita por aquela e atinente aos aspectos elencados: identificação dos clientes abrangidos por tal distribuição; datas das respectivas vendas; quantidades vendidas; descontos aplicados; e preços praticados no período temporal que decorreu entre Fevereiro de 2015 e 21 de Março de 2018, prolixa e mui relevante documentação junta aos autos, pela Recorrida, na sequência do douto despacho que, em 6 de Novembro de 2019, ordenou a correlata junção, em 6 de Janeiro de 2020;

- as declarações de parte da Recorrente (sintetizadas na própria sentença recorrida);

- depoimento da testemunha BB;

- depoimento da testemunha CC;

- depoimento da testemunha DD; e

- depoimento da testemunhaAurélia GG.

XVIII - Em primeiro lugar, e no tocante aos clientes angariados pela Recorrente ao longo da relação de distribuição sub judice, que perdurou mais de um quarto de século, temos, desde logo, o facto de no contrato de distribuição inicial, celebrado nos idos de 1991, não constar qualquer listagem de putativos clientes previamente existentes, sendo que, ante o cuidado permanente da Recorrida na elaboração dos contratos de distribuição que dava a assinar aos distribuidores como a Recorrente e, outrossim, como ditam as regras da experiência comum, da lógica e da normalidade das coisas, se tal listagem existisse, certamente seria anexada ao sobredito contrato, o que, como vimos, in casu não sucedeu;

XIX - Por sua vez, do “relatório de identificação e análise de distribuidores” elaborado e assinado por FF (Inspector da Recorrida), datado de 21 de Maio de 1996 (junto com o requerimento probatório, como Doc. n.º 12), ressuma qual o número exacto de clientes existentes naquela data;

XX - Por fim, da troca de correspondência electronicamente realizada através da aplicação informática instalada e disponibilizada pela Recorrida aos seus distribuidores (aplicação que recolhe informação atinente aos produtos, preços, descontos, clientes, quantidades e datas), realizada entre a “C......, Lda.” e a Recorrida relativa à distribuição feita por aquela e atinente aos aspectos elencados: identificação dos clientes abrangidos por tal distribuição; datas das respectivas vendas; quantidades vendidas; descontos aplicados; e preços praticados no período temporal que decorreu entre Fevereiro de 2015 e 21 de Março de 2018 (prolixa e mui relevante documentação junta aos autos, pela Recorrida, na sequência do douto despacho que, em 6 de Novembro de 2019, ordenou a correlata junção, em 6 de Janeiro de 2020) ressuma, ao detalhe, o número de clientes existentes à data da resolução do contrato sub judice e, outrossim, o (mui) considerável volume de negócios de tal clientela, angariada pela Recorrente ao longo de mais de um quarto de século (rectius, desde os idos de 1991) e de que a Recorrida passou a beneficiar após tal cessação contratual;

XXI - Ademais, no que tange à putativa “avultada dívida” (sic douta sentença recorrida) da Recorrente para com a Recorrida, temos, desde logo, que da análise dos emails trocados entre ambas, em Maio de 2017 [documentos juntos pela Recorrente (como Doc. n.º 2) em 13 de Dezembro de 2021 e não impugnados pela Recorrida] e, outrossim, das contas-correntes de ambas, resulta que, em Maio de 2017 e, portanto, meses antes da resolução contratual sub judice, ascendia a cerca de 50.000,00€ (cinquenta mil euros) o valor da correlata dívida vencida, valor consideravelmente inferior aos 300.000,00€ aventados pelas infra elencadas testemunhas da Recorrida nos respectivos depoimentos e, maxime, inferiores ao valor das garantias bancárias in casu prestadas pela Recorrente, cumprindo não olvidar que os supra mencionados emails são temporalmente concomitantes com a prestação de garantias suplementares pela Recorrente, reveladores da boa-fé que sempre marcou a sua conduta contratual;
XXII - Maxime porquanto, como ditam as regras da lógica, da experiência comum e da normalidade das coisas, sentido algum faria a Recorrente reforçar, meses antes de resolver sem fundamento, como erradamente sustenta o Digníssimo Tribunal a quo, o contrato de distribuição sub judice, as garantias prestadas, desse modo “deitando por terra” substanciais dezenas de milhares de euros...

XXIII - Ademais, tinha o Digníssimo Tribunal a quo ao seu dispor elementos probatórios bastantes para concluir que o fornecimento da Feira de ... representava um volume de negócios na ordem dos €120.000,00 (cento e vinte mil euros);

XXIV - De igual sorte, e no tocante aos fundamentos da resolução in casu operada pela Recorrente, andou (de novo) mal o Digníssimo Tribunal a quo, maxime porquanto não curou de analisar os 5 (cinco) incumprimentos/violações contratuais detalhada e especificadamente invocados pela Recorrente na sua carta de resolução, antes se limitando a analisar a não verificação de um deles;

XXV - Na verdade, e como ressuma da carta de resolução remetida pela Recorrente à Recorrida, foram 5 (cinco), e não apenas 1 (um) como sustenta o Digníssimo Tribunal a quo, os fundamentos in casu invocados, a saber:

“- Recusa de fornecimento de produtos objecto do contrato por parte da v/ empresa, mesmo que por nós pagos a pronto pagamento;

“- Nomeação de outros operadores para a área geográfica contratualizada para a n/ empresa, com graves prejuízos para esta, devido à redução da facturação, desde 2009 até à presente data;

“- Redução unilateral pela v/ empresa, em n/ aceitação, portanto, dos bónus de distribuição, desde 2009, em contraste com a actualização a tabela de preços, aumentados anualmente e às vezes, mais do que uma vez;

“- Não creditação, em tempo útil, das acções de Trade Marketing (sendo que referente ao ano em curso não nos foi, ainda, creditado qualquer valor);

- Apropriação utilização abusiva a n/ base de dados de clientes pela v/ empresa, que a facultou a outros operadores/concorrentes.” (sic), sendo que a existência de 4 (quatro) dos 5 (cinco) invocados inadimplementos contratuais da Recorrida resultou, como vimos supra, da prova in casu produzida.

XXVI - Verbi gratia, e a título meramente exemplificativo, basta ter presente que, como as testemunhas supra mencionadas sublinharam nos correlatos depoimentos:

- a Recorrida aceitava pagamento a pronto para libertar encomendas e, de um momento para o outro e sem nada que o fizesse prever, recusou-se continuar a fornecer em tais moldes;

- as acções de trade marketing só foram pagas na pendência da acção sub judice;

- a base de dados de clientes foi disponibilizada “de mão bejada” à “C......, Lda.”, concorrente da Recorrente.

XXVII - Por fim, da análise dos relatórios e contas da Recorrente e, bem assim, das declarações anuais de tributação, respeitantes aos 5 (cinco) anos anteriores à resolução contratual sub judice [documentos juntos por aquela (como Docs. n.ºs 6 a 18) em 13 de Dezembro de 2021 e não impugnados pela Recorrida], ressuma cristalino que o Digníssimo Tribunal a quo tinha ao seu dispor todos os elementos probatórios para determinar a média anual da remuneração auferida pela Recorrente nos últimos cinco anos (sem sequer necessitar, portanto, de se socorrer do mecanismo processual ínsito no artigo 351.º do Código Civil) e, outrossim, o peso da Recorrida na facturação da Recorrente;

XXVIII - Assim, em face do arrazoado ora concluído, considera a Recorrente que os supraditos elementos probatórios, analisados à luz das regras da experiência comum, da lógica e da normalidade das coisas [conjugados com os demais factos in casu dados como provados (e, por inerência, com os elementos probatórios subjacentes a tal decisão)], impunham decisão diametralmente oposta sobre os pontos de facto ora impugnados»

Perante estas conclusões, dizer que se trata de meras considerações genéricas, sem conexão com a discriminação fáctica, parece-me, salvo o muito respeito devido pela opinião contrária, algo inadequado. Entendo que não mais se deve exigir à parte.

A verdade é que, diante do teor destas conclusões, a opinião que fez vencimento no acórdão entende que estas conclusões não satisfazem o ónus de impugnação ex artigo 640.º, 1, b) do CPC, secundando o argumento essencial do acórdão do segundo grau de acordo com o qual «no caso sub judice, a recorrente em vez de relacionar especificadamente cada um dos concretos pontos de facto que consideravam (sic) incorretamente julgados com cada um dos meios de prova que invoca, optou por indicar, em bloco, todos os concretos pontos de facto que consideravam incorretamente julgados e relacionaram-nos, também em bloco, com aqueles meios de prova, ou seja, não discriminou cada facto impugnado e a respetiva prova que, no seu entender, impunha decisão diferente da proferida»

Não se compreende bem a coerência desta argumentação do segundo grau, exposta sem nuances, quando o primeiro grau não satisfaz ele próprio este severo critério. Veja-se, por exemplo, em relação aos arts.º 10,11,12 (resultou provado do teor do depoimento do legal representante da A. e da testemunha HH, II e bem assim do teor do documento junto a fls. 262), aos arts.º 26, 27, 28 (resultou provado do teor do documento junto a fls. 14), aos arts.º 29, 30, 31, 32, 33, 34 (resultou provado do teor do documento junto a fls.262), arts.º 35, 36, 37, 38, 39 ( resultou provado do teor do documento junto a fls.268 e documentação junta a fls. 352), etc., etc.

Porém, em termos substantivos são outras as razões da minha discordância.

i) nenhuma norma do código (portanto também não o artigo 640.º) exige que o recorrente relacione um por um os factos com os meios de prova discriminados também isoladamente por cada um deles.

ii) a nossa legislação processual civil, desde o código de 1939, está toda ela inspirada «na doutrina salutar de não sacrificar o fundo à forma, de não fazer perder o direito por simples inobservância de formalismos legais» (Alberto dos Reis).

iii) os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade impõem, a meu ver, uma interpretação do artigo 640.º do Código de Processo Civil, em termos menos severos. É um problema de justa medida, delicado como todos os problemas de limites.

iv) porquanto nem o juiz vê a sua tarefa particularmente dificultada na aplicação do artigo 662.º se o recorrente não fizer aquela ligação individualizada, nem a parte recorrida deixa de saber, e bem, defender-se, sem essa estrita conexão.

v) o acórdão do STJ de 19.12.2018, Proc. 433/11.7TVPRT.P1.S2 decidiu que: a fundamentação [da sentença] deve conter, como suporte mínimo, a concretização do meio probatório gerador da convicção do julgador e ainda a indicação, na medida do possível, das razões da credibilidade ou da força decisiva reconhecida a esses meios de prova, a menção das razões justificativas da opção feita pelo julgador entre os meios probatórios de sinal oposto relativos ao mesmo facto»; «a imposição da fundamentação não impede necessariamente que o tribunal motive em conjunto as respostas a mais do que um facto da base instrutória, quando os factos objecto da motivação se apresentem entre si ligados e sobre eles tenham incidido fundamentalmente os mesmos meios de prova. Essa motivação conjunta pode até ser concretamente aconselhável» (negrito meu).

Não se vislumbram razões para que esta doutrina não seja transposta, mutatis mutandis para sindicar a autossuficiência do recurso. vi) Nem todos os acórdãos citados se referem ao mesmo ponto, em questão neste recurso. A jurisprudência do STJ encontra-se, quanto a esta específica matéria, dividida, sendo prova disso dois acórdão recentes: o acórdão do STJ de 25.5.2023, Proc. 6713/19.6T8GMR.G1.S1 e o acórdão de 7.12.2023, Proc. 2037/21.7.T8FAR.E1.S1, o qual, num caso em que o recorrente não seguiu o critério agora consagrado, doutrinou: «Ciente de que a imposição de ónus de impugnação representa um condicionamento ao direito de acesso aos tribunais e, em especial, ao direito ao recurso (cfr. artigo 20.º, n.º 1, da CRP), este Supremo Tribunal de Justiça tem-se esforçado por interpretar o disposto na norma com certa cautela, evitando leituras excessivamente formalistas que possam conduzir a restrições injustificadas das garantias associadas ao processo equitativo e convocando sempre, para o efeito da melhor interpretação da norma, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Exemplo, entre tantos outros, desta orientação do Supremo Tribunal de Justiça é o recente Acórdão de 12.10.2023 (Proc. 1/20.2T8AVR.P1.S1)1 em cujo sumário pode ler-se:

No caso dos autos, e de acordo com um critério de razoabilidade, a rejeição liminar do recurso de impugnação de facto desrespeita o princípio da proporcionalidade dos ónus, cominações e preclusões impostos pela lei processual, que constitui uma manifestação do princípio da proporcionalidade das restrições, consagrado no art. 18.º,n.os 2 e 3, da CRP, e da garantia do processo equitativo, consagrada noart. 20.º, n.º 4, da CRP”.

Ilustrativo é também, ainda mais recentemente, o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 12/2023, de 17.10.2023 (publicado no Diário da República n.º 220/2023, Série I de 14.11.2023, pp. 44-65), no qual se sustenta uma interpretação visivelmente (mais) flexível do ónus imposto na al. c) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC do que poderia resultar da sua interpretação literal, fixando-se o seguinte segmento uniformizador».

vii) O princípio da economia processual, cada mais presente na exegese das normas processuais e na imposição de filtros aos recursos, não pode levar a que o juiz esqueça outras normas processuais orientadas para a realização de valores e princípios fundamentais, tais como os que se consubstanciam num processo equitativo, com base nos artigos 20.º, 4 da CRP e 6.º da CEDH.

viii) A jurisprudência do TEDH, cuja doutrina os tribunais portugueses, bem ou mal, devem acatar, tem percorrido também uma via menos severa quanto às exigências formais a respeitar pelas partes na interposição dos recursos, como são exemplos, entre outros, os acórdãos proferidos nos casos Reklous and Davourlis v. Greece, de 15 de Janeiro de 2009, e Efstathiou e outros c. Grèce, de 27 de Julho de 2006.

Concluindo, com regresso ao caso sujeito: anulava o acórdão recorrido na parte em que não conheceu da impugnação da decisão de facto, nos termos sobreditos e ordenava a baixa do processo ao Tribunal da Relação para que tomasse conhecimento da referida impugnação.

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V – Sumário elaborado pelo relator nos termos do artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil.