Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
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| Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
| Relator: | PEREIRA DA SILVA | ||
| Descritores: | PROCEDIMENTOS CAUTELARES | ||
| Nº do Documento: | SJ200802070046222 | ||
| Data do Acordão: | 02/07/2008 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | AGRAVO. | ||
| Decisão: | PROVIDO. | ||
| Sumário : | Na providência cautelar de entrega judicial e cancelamento de registo a que se reporta o artº 21º de DL nº 149/95, de 24 de Julho, alterado pelo DL nº 265/97, de 2 de Outubro, não se exige a alegação e prova de periculum in mora, este fluindo implícito da natureza do contrato de locação financeira e do expectável degradamento do bem locado na pendência da acção definitiva. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. a) " Empresa-A, S.A.", a 06-06-28, requereu providência cautelar de entrega judicial (apreensão de equipamento destinado à actividade industrial) contra "Empresa-B, S.A.", impetrando, nos termos e com os fundamentos que fls. 2 a 9 mostram, que se ordene a apreensão do equipamento a que se alude no documento junto a fls. 14, por si dado, em regime de locação, à demandada, com quem celebrou o contrato de locação financeira nº 116318. b) Citada, deduziu "Empresa-B, S.A." oposição, como flui de fls. 36 a 42, concluindo pela justeza do indeferimento da providência requerida. c) Observado o demais de lei, foi proferida decisão indeferindo ao, cautelarmente, peticionado. d) Sem êxito agravou a requerente da predita decisão, confirmada que foi por acórdão do TRP, de 10-09-07, com o teor que fls. 233 a 241 evidenciam. e) Ainda irresignada, "Empresa-A, S.A", interpôs-agravo na 2ª instância, nas alegações oferecidas, em que propugna a bondade da revogação do acórdão impugnado, como decorrência do provimento do recurso, com consequente condenação da recorrida a "proceder à entrega definitiva do equipamento objecto do contrato de leasing à recorrente", tendo formulado as seguintes conclusões: " 18.1 - A recorrente celebrou com a recorrida um contrato de locação financeira mobiliária, contrato esse que foi resolvido por força do incumprimento dos seus termos pela recorrida. 18.2 - A recorrida Empresa-B tinha sido objecto de um processo especial de recuperação de empresa e falência que correu termos pelo 2º Juízo do Tribunal de Comércio de Gaia sob o nº 484/03.5 TYVNG, processo à ordem do qual foi votada uma medida de recuperação e onde foram igualmente reguladas as condições de pagamento dos créditos emergentes dos contratos de leasing. 18.3 - A recorrida nunca deu cumprimento à medida apesar dos prazos nela previstos. 18.4 - Com esse fundamento, e tendo em vista a recuperação e entrega definitiva do bem, a recorrente instaurou contra a recorrida a presente providência cautelar. 18.5 - A presente providência não foi julgada procedente, pese embora o facto de se ter reconhecido que a recorrida não cumpriu o contrato de leasing e que, por força disso, a recorrente enviou a carta constante a fls. dos autos, procedendo à sua resolução. 18.6 - A questão de direito que determinou a improcedência do procedimento cautelar reside no facto de, quer o Tribunal de 1ª Instância, quer o Tribunal da Relação do Porto, terem entendido que por força da aprovação de medida de recuperação e, consequentemente, da regulação prevista na mesma para a regularização das responsabilidades emergentes dos contratos de leasing, tinha ocorrido, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 859º do Código Civil, uma verdadeira novação objectiva da dívida. 18.7 - Sucede porém que, o surgimento de um facto novo e superveniente ao presente recurso - que ocorreu no processo de recuperação - permite, salvo o devido respeito, alterar a decisão vertida no Acórdão de que se recorre e, nessa conformidade, substituir a mesma por outra que condene a recorrida a proceder à entrega definitiva do equipamento à recorrente. 18.8 - Já depois de ter sido interposto o presente recurso, o ora recorrente tomou conhecimento que, por decisão do Tribunal da Relação do Porto, foi anulado todo o processado no aludido processo de recuperação desde 8 de Agosto de 2003 tendo sido dados sem efeito todos os actos praticados até então no processo, o que significa que, a sentença homologatória da medida de recuperação não transitou em julgado, pese embora,18.9 - A decisão que revogou a sentença não foi notificada ao recorrente que apenas dela tomou consciência ao constatar no Diário da República que havia sido, de novo, ordenado o cumprimento do disposto no artigo 20º do CPEREF. 18.10 - O anúncio para citação dos credores com vista à justificação de créditos foi publicado na III Série do Diário da República em 16 de Agosto de 2007. 18.11 - Foi nessa data - 16 de Agosto de 2007 - que a ora recorrente tomou conhecimento do sucedido. 18.12 - Com a revogação da sentença que homologou a medida de recuperação que tinha sido aprovada esta ficou sem efeito e, consequentemente, todos os efeitos que da mesma decorriam, deixando os credores de estarem vinculados aos seus termos. 18.13 - Por essa razão, a ter havido novação da dívida da recorrida perante a recorrente - o que, ainda assim, não se admite - deixou a mesma de se verificar, porquanto, deixou também de existir o facto que lhe teria dado origem, ou seja, a suposta declaração de novar que, no entender do Acórdão recorrido, o conteúdo da medida poderia pressupor. 18.14 - Deixaram assim se verificar os pressupostos que determinaram a decisão de que agora se recorre, mantendo-se todos os efeitos decorrentes da resolução do contrato de locação financeira efectuada em 22 de Março de 2004 pela ora recorrente, designadamente, o direito que à mesma assiste de obter a restituição do bem. 18.15 - Um dos efeitos da resolução é assegurar a devolução do bem objecto do contrato, uma vez que é o seu legítimo titular e proprietário. 18.16 - A pendência do processo de recuperação não obsta à instauração e procedência da presente providência cautelar já que, visando a mesma um bem que não é propriedade da recorrida, não se encontra a mesma sujeita às limitações que o artigo 29º do CPEREF estabelece. 18.17 - O Acórdão recorrido, reconhecendo o incumprimento do contrato por parte da recorrida e a resolução do mesmo pela recorrente através do envio da carta constante a fls. dos autos, não podia deixar de considerar que a resolução se operou validamente, impondo-se assim, tendo em conta a alteração superveniente das circunstâncias que motivaram a decisão de improcedência, que a recorrida seja condenada a proceder à entrega definitiva do equipamento objecto do contrato de locação financeira à recorrente. 18.18 - A junção de documentos às presentes alegações cuja apresentação se revela absolutamente necessária por virtude de ocorrência de facto posterior ao encerramento da discussão em primeira instância - como sucedeu nos presentes autos - é admissível por força do que dispõe os artigos 524º, 726º e 727º do Código de Processo Civil, pelo que, salvo o devido respeito, deverão ser atendidos. 18.19 - O artigo 21º do Decreto Lei nº 149/95 de 24 de Junho, aqui aplicável, estabelece que, resolvido o contrato de leasing, sem que o locatário proceda à devolução do equipamento ao locador, pode este requerer, sem necessidade de se preencherem quaisquer outros requisitos, providência cautelar que vise a sua entrega. 18.20 - O Acórdão recorrido reconhece, e bem, que, por força da aplicação aos presentes autos do disposto no referido artigo 21º do Decreto Lei nº 149/95 de 24 de Junho, sobre a recorrente não impende o ónus de provar a existência da provável lesão séria e irreparável do seu direito, bastando, desse modo, que ficasse provado que o contrato tinha sido resolvido, e que o equipamento não tinha sido entregue à recorrente. 18.21 - Esses factos ficaram provados nos autos. 18.22 - Reconhece ainda o Acórdão recorrido que a continuação do bem locado na esfera da locatária depois de resolvido o contrato é susceptível de lesar os interesses da locadora. 18.23 - Por outro lado, a aprovação da medida de reestruturação financeira no processo de recuperação da recorrida não consubstancia qualquer vontade de novar as obrigações emergentes do contrato de leasing extinto. 18.24 - A vontade de novar tem de ser manifestada de forma expressa, o que no caso concreto não sucedeu. 18.25 - A referência à celebração de novos contratos é feita no contexto da reestruturação da dívida relativa aos contratos de leasing, sendo claro que a alusão a novos contratos foi efectuada apenas porque os mesmos tinham sido resolvidos, já que, em relação aos não resolvidos, a medida se circunscrevia à mera reestruturação dos prazos de pagamento. 18.26 - Tal reestruturação/modificação dos prazos de pagamento abrangeu também os contratos resolvidos e só porque a resolução tinha ocorrido é que a medida alude à celebração de novos contratos, como forma de "repristinar" os contratos de leasing iniciais: do que se tratou foi apenas de, através da fórmula utilizada, restabelecer/retomar os aludidos contratos, ou seja, fazer a sua "repristinação". 18.27 - Se a intenção tivesse sido a de novar as obrigações emergentes do contrato resolvido, as condições de pagamento não seriam idênticas às dos que não tinham sido resolvidos. O que as partes pretenderam foi, tão só, prolongar ou diferir o pagamento das prestações estabelecidas no contrato resolvido, ou seja, de modificar as condições de pagamento, não tendo sido prevista a alteração de qualquer outra cláusula do contrato resolvido. 18.28 - Acresce que não chegou sequer a ser celebrado qualquer novo contrato, tendo sido ultrapassado o prazo previsto para o pagamento das importâncias em dívida, sem que a recorrida o tivesse feito. 18.29 - Não tendo sido celebrado qualquer novo contrato, não existe fonte de uma nova obrigação, motivo por que não se vislumbra como é possível sustentar que nasceu uma nova obrigação que extinguiu a que tinha por fonte o contrato resolvido. 18.30 - O Acórdão recorrido considerou e reconheceu que o contrato de "leasing" não foi cumprido pela recorrida e que o recorrente procedeu à respectiva resolução. 18.31 - Um dos efeitos da resolução é assegurar ao apelante a devolução do bem objecto do contrato, sendo certo que, de acordo com o regime legal em causa, o proprietário desse bem continua a ser o ora recorrente. 18.32 - Desse modo, é ilícito ao ora recorrente lançar mão da presente providência cautelar com vista à obtenção de uma sentença que condene a recorrida a proceder à entrega do bem à recorrente. 18.33 - Acresce que os factos dados como provados demonstram suficientemente o direito que o recorrente alega, bem como da necessidade desse direito ser acautelado. 18.34 - A prevalecer a decisão proferida no âmbito do Acórdão recorrido, estar-se-à a permitir que a parte não cumpridora, se mantenha, a usufruir do equipamento, ainda que se aceite que o correspondente contrato de leasing se encontra resolvido por facto a si imputável e que, em resultado disso mesmo, incorre a recorrida na obrigação de restituir o bem à recorrente, sua legitima titular e proprietária. 18.35 - Melhor demonstração de tudo quanto foi referido e sobretudo de que não existiu novação objectiva da dívida é que as condições de pagamento previstas para os "novos contratos" é exactamente igual às condições de pagamento prevista para os contratos ainda vigentes. 18.36 - O que significa que, a alusão à celebração de "novos contratos" para aqueles que já tinham sido resolvidos, prende-se com uma questão meramente de forma, que em nada belisca nem altera o conteúdo substancial das obrigações neles previstas. 18.37 - A questão de direito em discussão nos presentes autos foi já decidida de forma definitiva pelo Supremo Tribunal de Justiça no âmbito do recurso nº 2773/07-1 - cuja cópia do mesmo se junta - no sentido de que a aprovação da medida de recuperação no processo 484/03.5 TYVNG do 2º Juízo do Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia nos termos em que o foi não constitui novação objectiva da dívida da recorrida perante a recorrente. 18.38 - Decidindo como decidiu o Acórdão violou o disposto nos artigos 857º e 859º do Código Civil, no artigo 21º do Decreto-Lei nº 149/95, de 24 de Junho e ainda no artigo 94º do CPEREF." f) Não foi contra-alegado o agravo interposto na 2ª instância. g) Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II. Eis como se configura a materialidade fáctica que vem dada como assente pelas instâncias: " A) A requerente, anteriormente denominada "MC Leasing, Sociedade de ...,SA" e posteriormente "Empresa-C" é uma empresa parabancária autorizada a praticar operações de locação financeira.B) No exercício dessa actividade, a então denominada "MC Leasing", celebrou, em 27 de Abril de 2000, com a requerida, um acordo denominado "contrato de locação financeira nº 116318" relativo a um conjunto industrial "Komatsu" (retroescavadora), o qual se rege pelas condições particulares e gerais constantes dos documentos de fls. 10 a 12, cujo teor se dá por reproduzido. - C) Esse equipamento era constituído por cabina, braço retro, balde retro de 600 mm, balde retro 300 mm, balde STD frontal, engate rápido hidráulico e quadro de garfos e foi adquirido pela requerente, com vista à celebração do acordo referido em B). -D) A requerida recebeu o equipamento que a requerente colocou à sua disposição, tendo passado a utilizá-lo a partir da data de início do acordo. -E) A requerida não pagou a 39º renda que se venceu em 20 de Julho de 2003, nem as vencidas posteriormente, nas datas dos respectivos vencimentos. -F) Em face disso, a requerente enviou à requerida a carta constante de fls. 16-17, pela qual informa esta, além do mais "de que procedemos à resolução do vosso contrato nº 116318" e que "caso não seja efectuado o respectivo pagamento, deverão V. Exas. proceder à entrega do equipamento, objecto do contrato, dentro do mesmo prazo". -G) O equipamento acima referido continua a ser usado pela requerida para a actividade industrial, que é o fim a que o mesmo se destina. -H) A requerida foi objecto de um processo que veio a seguir termos sob a forma de processo de recuperação de empresas e que correu pelo 2º Juízo do Tribunal o Comércio de Vila Nova de Gaia, sob o processo nº 484/03.5 TYVNG. -I) Nesse processo judicial a requerente justificou os seus créditos, tendo-lhe sido reconhecido o credito de € 88.821,65. -J) No decurso do mesmo processo judicial, o senhor gestor judicial elaborou e submeteu à aprovação da Assembleia Definitiva de Credores uma medida de reestruturação financeira. -L) Para os credores da natureza da aqui requerente - Sociedade de ...., de renting e similares - prescreve a referida medida o seguinte:"Propõe-se para os créditos destas sociedades: Pagamento da totalidade das rendas vencidas e vincendas em 3 anos, após 1 semestre de carência, contados a partir do trânsito em julgado da sentença homologatória do acordo de reestruturação, incluindo juros vencidos. Para os contratos já resolvidos, propõe-se a celebração de novos contratos nas condições acima identificadas". - M) A requerente votou favoravelmente a medida de reestruturação financeira da requerida. -N) A requerida, após a aprovação da medida, estabeleceu negociações com a requerente. -O) No âmbito dessas negociações, a requerida enviou ao Banco Empresa-A o fax de fls. 71 o qual continha uma proposta de regularização dos débitos que as várias empresas do grupo da requerida tinham para com o denominado Grupo ..., do qual faz parte a requerente. -P) Em resposta, foi enviado pela Empresa-C o fax de fls. 72-73. -Q) Ainda no âmbito das negociações referidas em O), a requerida fez entrega à requerente de um cheque no valor de 21.000,00 euros, o qual foi imputado ao pagamento de parte do valor em dívida nestes autos, sendo afecto ao pagamento das rendas em dívida, reduzindo para cerca de 2.500,00 euros o valor remanescente da mesma."III. A factualidade que como provada se tem é a seguinte: 1. Elencada em II. 2. Por acórdão do TRP, proferido a 06-06-22, transitado em julgado, nos autos a que se alude em II. H), foi anulado todo o processado, desde 08-08-03 (cfr. certidão junta a fls. 359). 3. No processo referido em II. H), em "obediência" ao acórdão nomeado em 2. que antecede, foi proferido despacho julgando "nulos todos os actos "praticados no processo posteriores "ao despacho de 08.08.03" e determinando que fosse aberta "conclusão nos autos principais de falência por forma a ali determinar o prosseguimento dos autos contra as três requeridas e a consequente notificação da requerida "Empresa-B" para os termos previstos no art. 20º nº 1 a) e nº 2 do CPEREF" (cfr. fls. 360). 4. Por anúncio publicado no DR -2ª Série -, em 16 de Agosto de 2007, foram citados os credores da "Empresa-B" para, consoante determinado no art. 20º nº 2 do CPEREF, deduzirem oposição, justificarem os seus créditos ou proporem qualquer outra providência diferente da requerida, devendo oferecer logo os meios de prova de que disponham cfr. fls. 361). 5. Por despacho de 08-10-07, não transitado em julgado a 19.10.07, foi determinado o prosseguimento da acção como processo de recuperação de empresa da "Empresa-B", nos termos dos art.s 24º e 25º do CPEREF. IV. O DIREITO: 1. Acompanhamos, frise-se liminarmente, o defendido no acórdão sob recurso, doravante tão só designado por "decisão", quanto ao menos acertado ter sido -o indeferimento, na 1ª instância, da providência cautelar requerida por "Empresa-A", também radicado "na ausência de prova do requisito di fundado receio de lesão grave e de difícil reparação do direito da requerente, a que alude o disposto nos art.s 381º nº 1 e 387º nº 1 do Código P. Civil, "já que, como outrossim sublinhado por António Santos Abrantes Geraldes, a respeito do procedimento cautelar em apreço, o previsto no art. 21º do DL nº 149/95, de 24 de Junho, alterado pelo DL nº 265/97, de 2 de Outubro: " À semelhança do que ocorre com a providência cautelar de apreensão de veículo, não se exige a alegação e prova do periculum in mora, o qual resulta implícito da natureza do contrato e da natural e previsível degradação do bem na pendência da acção definitiva. Por isso basta ao requerente alegar os factos que, de acordo com a situação verificada, legitimem a entrega imediata do bem: a extinção do contrato em consequência da resolução ou da caducidade" (" Temas da Reforma do Processo Civil" - IV Volume - 6. "Procedimentos Cautelares Especificados", pág. 307). 2. É um facto que, pese embora o provado e o plasmado nas conclusões 18.1 a 18.5 e no supracitado art. 21º, faleceu a pretensão cautelar, tão só "ex vi" do levado à conclusão 18.6, afirmando-se na "decisão": " Está-se, pois, perante uma verdadeira novação objectiva da dívida, na sequência da qual a requerente já não terá direito à entrega do equipamento locado com base na resolução do primeiro contrato". Pois bem: Que se acolhesse a tese sufragada nas instâncias quanto ao conspecto neste número em dissecação, o certo é que, considerado o consignado em III. 2 a 5, sempre o agravo interposto na 2ª instância mereceria provimento, por mor do expresso nas conclusões 18.7 a 18.22. Mais, porém: 3. Que provado não estivesse o relatado em III. 2 a 5, tal-qualmente pugna a recorrente nas conclusões 18.23 a 18.38, sempre acolhimento mereceria a pretensão recursória, uma vez que se não revela que com a aprovação da medida de reestruturação financeira citada em II. J) a M) se pretendeu novar, que não apenas alterar ou modificar, as anteriores obrigações da recorrida. Perfilhamos, em absoluto, a tese expandida no acórdão deste Tribunal à colação chamado na conclusão 18.37, debruçando-se sobre hipótese em tudo similar à presente, aresto esse em que, após se recordar que a distinção entre a novação e a mera modificação da obrigação se revela, "na prática, bem difícil", se escreveu, em abono do entendimento por cujo valimento se bate "Empresa-A, S.A.": "... A propósito da distinção entre a novação e a simples modificação da obrigação, expende Antunes Varela (Das Obrigações Em Geral, Vol. II, Reimpressão da 7ª Edição, pág. 233): ... A fixação da vontade das partes a esse respeito ... reveste o maior interesse, pois a substituição da obrigação pressupõe, em regra, a eliminação das garantias e dos acessórios da dívida extinta, ao passo que na simples modificação da obrigação se mantêm todos os elementos que não forem alterados. ... Se a alteração resultante da convenção das partes se reflecte apenas em elementos acessórios da relação creditória (prorrogação...de um prazo...etc), nenhumas dúvidas se levantarão, em regra, acerca da persistência da obrigação e da manutenção dos seus elementos não alterados. Quando, pelo contrário, a alteração convencionada atinja os elementos essenciais da relação obrigacional (o objecto, a causa, os sujeitos), o seu sentido pode já ser radicalmente distinto. Pode ser, mas não quer dizer que necessária ou sistematicamente o seja. ... importa saber é se as partes quiseram ou não, com a modificação operada, extinguir a obrigação, designadamente as suas garantias acessórias. É para esse alvo prático (animus novandi) que o julgador deve apontar directamente, com os instrumentos facultados pela interpretação e integração da declaração negocial. E é nesse sentido que os artigos 859º e 840º encaminham a resolução das dúvidas que as várias espécies concretas possam suscitar ao intérprete». Resulta do art. 857º do CC que se dá a novação objectiva quando o devedor contrai perante o credor uma nova obrigação em substituição da antiga. A novação traduz-se num verdadeiro contrato extintivo - constitutivo de obrigações, pelo qual as partes visam expressamente substituir uma obrigação originária, que se extingue, por uma obrigação nova, que se constitui (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. II, 4ª Edição Revista e Actualizada, pág. 147). O animus novandi não se presume. Com efeito, o art. 859º do CC diz que a vontade de contrair a nova obrigação em substituição da antiga deve ser expressamente manifestada. E nos termos do art. 217º, nº 1 do CC, a declaração é expressa quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação de vontade. Reportando-se o art. 859º da lei substantiva menos à vontade de contrair a obrigação do que à ideia de que esta contracção da dívida se faz em substituição da antiga (Antunes Varela, citado vol. II, pág.237), ocorre perguntar: de acordo com os dados colhidos houve a vontade de substituir uma antiga obrigação? É certo que para os contratos de leasing já resolvidos (caso do ajuizado contrato) foi proposta pelo gestor judicial da recorrida e aceite por escrito pela recorrente, a celebração de «novos contratos» em que o pagamento da totalidade das rendas vencidas e vincendas seria feito em três anos, após 1 semestre de carência, contados a partir do trânsito em julgado da sentença homologatória do acordo de reestruturação, incluindo juros vencidos. Todavia, aludiu-se a novos contratos, mas não se falou na substituição da anterior dívida, que continuou a mesma, apenas se alterando o prazo do seu pagamento. O "novo contrato" recairia apenas sobre a prorrogação de prazo de pagamento, portanto sobre um mero elemento acessório da relação creditória. As partes não manifestaram directamente a vontade de substituir a antiga obrigação pela criação de uma outra em seu lugar. Não se desenha claramente, com nitidez, inequivocamente, na aprovação pela ora agravante da medida de recuperação da aqui agravada, a vontade de novar as obrigações emergentes do contrato de leasing extinto. No contrato resolvido as rendas vencidas e vincendas eram imediatamente exigíveis, e foi só esse aspecto que as partes quiseram alterar, criando um período de carência de seis meses a contar do trânsito em julgado da sentença homologatória e protelando o pagamento, a processar ao longo de três anos. As partes pretenderam tão só prolongar ou diferir o pagamento das prestações estabelecidas no contrato resolvido, não tendo sido sua intenção alterar qualquer outra cláusula. Nada foi dito no sentido de a agravada manter a utilização da viatura, como se o anterior contrato não tivesse sido resolvido. E, como bem se salienta no referido segundo acórdão da Relação do Porto, mesmo que porventura se viesse a admitir que o efeito pretendido pelas partes era o da celebração de um contrato inteiramente novo, seria então necessário que esse contrato se mostrasse firmado e junto aos autos, o que não sucede, para se poder verificar quais os seus verdadeiros contornos." 4. CONCLUSÃO: Visto o apurado, revelando-se, enfim, a probabilidade séria de verificação dos requisitos enumerados no nº 1 do art. 21º do já nomeado diploma legal, no provimento do agravo, revoga-se a "decisão", ordenando-se que à recorrente, pela requerida, seja, de imediato, entregue o equipamento objecto do contrato de locação financeira referido em I. a) (cfr. II. B) e C) ). Custas pela recorrida (art. 446º nºs 1 e 2 do CPC). Lisboa, 7 de Fevereiro de 2008 Pereira da Silva (Relator) Rodrigues dos Santos João Bernardo |