Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3032/23.7YRLSB-A.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: VASQUES OSÓRIO
Descritores: HABEAS CORPUS
MANDADO DE DETENÇÃO EUROPEU
FALTA DE NOTIFICAÇÃO
NOTIFICAÇÃO AO MANDATÁRIO
TRÂNSITO EM JULGADO
DETENÇÃO
ARGUIÇÃO DE NULIDADES
IRREGULARIDADE
INDEFERIMENTO
Data do Acordão: 02/08/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: HABEAS CORPUS
Decisão: IMPROCEDÊNCIA / NÃO DECRETAMENTO.
Sumário :
I - Tendo transitado em julgado o acórdão do STJ que confirmou o acórdão da Relação de Lisboa onde foi ordenado o cumprimento do mandado de detenção europeu emitido pela República Francesa e consequente entrega da requerente às autoridades judiciais deste Estado, iniciou-se a fase de execução do referido mandado.
II - A requerente foi detida e entregue no Estabelecimento Prisional ao abrigo de mandado de detenção emitido pelo respectivo Juiz Desembargador Relator.
III - Saber se no acto da detenção da requerente foi ou não cumprido o disposto no n.º 3 do art. 258.º do CPP, é questão que ultrapassa o âmbito do habeas corpus, pois esta providência não serve para arguir nulidades ou irregularidades, as quais devem ser suscitadas no processo respectivo.
IV - Assim, porque a prisão foi ordenada pelo juiz competente e foi determinada por facto que a lei admite, inexiste o fundamento de habeas corpus invocado pelo requerente
Decisão Texto Integral:

Processo nº 3032/23.7YRLSB-A.S1


Habeas Corpus


*


Acordam, em audiência, na 5ª secção do Supremo Tribunal de Justiça


I. Relatório


1. AA, detida no âmbito da execução do Mandado de Detenção Europeu nº 3032/23.7YRLSB, que corre termos no Tribunal da Relação de Lisboa, veio, através de Ilustre Defensor, requerer ao Exmo. Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, a providência de habeas corpus, por prisão ilegal, nos termos que, seguidamente, se transcrevem:


“(…).


1º A ora Requerente, Requerida melhor identificada nos autos de MDE em referência, recebeu anteontem – 2/2/2024 – uma comunicação telefónica da parte da esquadra da GNR da área da sua residência para passar por lá, alegadamente para receber uma notificação. Supondo tratar-se da notificação, que aguardava, do douto acórdão de Vossas Excelências em relação ao recurso que interpôs no passado dia 13/12/2023, ansiosa, dirigiu-se logo que pôde à dita esquadra. Esquadra onde foi imediatamente detida e, na mesma noite – 2/2/2024 (anteontem) – conduzida ao Estabelecimento Prisional de ... (...), onde permanece.


2º Nada lhe foi entregue pelas autoridades.


3º Nada!


4º Nem notificação do acórdão do STJ;


5º Nem cópia de qualquer mandado de detenção;


6º Em flagrante violação, designadamente, do art. 27º n.º 4 da Constituição da República Portuguesa (CRP).


7º Nem recebeu notificação de promoção e despacho que porventura tenha ordenado a alteração da medida de coacção a que estava sujeita. Nada!


8º A Requerente não sabe porque está detida, ou presa, neste momento.


9º Trata-se de uma situação de «…abuso de poder, por virtude de prisão ou de detenção ilegal», tão grave e atentatória dos mais básicos direitos humanos que se encontra prevista no art. 31º n. 1 da CRP;


10º Que directamente tutela esta situação, nos termos do art. 18º da nossa lei constitucional.


11º Na GNR comunicaram-lhe, verbalmente, que estava detida/presa no âmbito deste processo…;


12º E, já ontem, dia 3/2/2024, no dito Estabelecimento Prisional de ... (...), foi exibido ao D.O. da ora Requerente um documento, interno, de registo de entrada dela na referida instituição – a qual, na pessoa das guardas com que o DO falou, confirma que a ora reclusa não trazia nem tem em seu poder quaisquer documentos judiciais, não dispõe aquele EP de qualquer outra documentação que possa justificar a razão pela qual ela foi detida – onde é mencionado este processo de MDE;


13º Aliás, o DO apurou que se colocaram, anteontem, algumas dúvidas no aludido Estabelecimento Prisional acerca da situação da Requerida enquanto reclusa ...


14º Mas a Requerida – não só pelos factos expostos supra, como, também, porque não tem quaisquer outros problemas com a Justiça – não tem dúvidas de que foi detida e se encontra reclusa à ordem deste processo de MDE; Nem elas (dúvidas) parecem seriamente existir.


15º Entretanto, como protestou imediatamente, anteontem à noite, dia 2/2/2024, o D.O. – ora signatário –, depois de ter recebido a notícia da detenção da Requerida sua patrocinada, consultar o processo no Tribunal da Relação através da plataforma Citius e verificou estar impedido de o fazer, porquanto o mesmo deixou de constar da sua área de trabalho naquela plataforma – cfr. doc. 1, que junta e dá por reproduzido. Situação que se mantém nesta altura, mais de 24 horas depois – cfr. doc. 2.


16º Ou seja, a Requerida foi detida mas não lhe foi entregue cópia de eventual mandado de detenção/prisão que porventura tenha sido emitido; e o seu D.O. também não pode e continua a não poder verificar a existência do mesmo.


17º E por tudo isto, exposto nos artigos anteriores, apresenta este pedido de Habeas Corpus. Para além disto;


18º O D.O., que visitou a Requerida ontem (3/3/24) no ..., informou-a, nesse momento, que este Supremo Tribunal já tinha proferido o acórdão decidindo o recurso por ela interposto, mas a verdade é que ela, a própria «recorrente», não foi, ainda, pessoalmente notificada do mesmo;


19º Como, a lei determina, v.g. os arts. 113.º n.º 10, 425º n.º 6 do Código de Processo Penal (CPP), ex vi art. 34º da Lei n. 65/2003, na interpretação literal daquelas normas do CPP e de acordo com a interpretação que o Tribunal Constitucional já fez delas por diversas vezes.


20º Por essa razão e de acordo com este entendimento, que subscreve, defende que deve considerar-se que o douto acórdão de Vossas Excelências ainda não transitou em julgado e só transitará após a notificação pessoal da Requerida nos termos dos referidos arts. 113º n.º 10 e 425º n.º 6 do CPP ex vi art. 34º da Lei n. 65/2003.


21º É verdade que existe repetida jurisprudência de Tribunais superiores, incluindo deste Supremo Tribunal, que, de forma diversa da já referida jurisprudência do Tribunal Constitucional [Que, reconhecemos, também não é unânime, como deveria ser] tem entendido que, em certos casos no âmbito do Processo Penal, a notificação do recurso pode ser feita, apenas, na pessoa do defensor… Acontece, porém, que uma tal interpretação das referidas normas é/foi dada no âmbito de processos penais em sentido próprio, em que o CPP se aplica directamente; neste caso, porém, aquelas normas são aplicadas subsidiariamente, com remissão efectuada pelo regime próprio da Lei n. 65/2003, vg do respectivo art. 34º, no âmbito de uma forma de processo que é subsidiária do Processo Penal, mas que não o é verdadeiramente (um processo penal), razão pela qual devem ser interpretadas da forma mais próxima da sua literalidade.


22º Onde elas estatuem que o recorrente deve ser notificado (art. 425º CPP), nos MDE o próprio recorrente não pode deixar de ser pessoalmente notificado, e onde elas estatuem que o arguido não pode ser apenas notificado na pessoa do advogado, (art. 113º n.º 10º CPP) no MDE, devendo ler-se requerido, devem, ambos, Defensor e Requerido, ser notificados (das sentenças, i.e. acórdãos).


23º As subtilezas, de facto e jurídicas que a variedade e complexidade dos casos que carecem de adequada e diferente solução jurisprudencial no âmbito do Processo Penal não se verificam num processo de MDE.


24º Num processo de MDE, p.e.:

i. o Requerido (arguido) nunca é julgado na sua ausência, representado pelo Defensor;


ii. nunca pode esperar uma decisão gradativa – de absolvição, de suspensão, condenação em pena maior, ou menor, etc. – num âmbito vasto de possibilidades possíveis, com fundamentação por vezes críptica para um leigo…, pelo contrário, num processo de MDE o STJ, em sede de recurso, ou manda executar o mandado, ou não manda; A decisão é clara e a fundamentação, em princípio, é breve e relativamente simples em termos de percepção por leigos.


iii. E, sobretudo, dada a característica de processo urgente dos processos de MDE e os curtíssimos prazos previstos de reacção – 5 dias, apenas – que, ademais, correm em férias, o Defensor [Que, tal como os Senhores Magistrados – embora por razões diferentes –, não se pode dedicar apenas a dois ou três processos, sobretudo se for Defensor Oficioso, considerando os miseráveis honorários que a desoras lhe são pagos e as nomeações, imprevisíveis; que não pode fugir ao respeito pelos prazos, que para si são peremptórios e que, frequentes vezes – como após férias –, vencem em vagas sucessivas] praticamente nem tem tempo para analisar e estudar convenientemente o acórdão proferido, não lhe sobrando para agendar e realizar uma reunião [Por vezes em tempos festivos, como in casu] em ordem a explicar ao requerido o sentido e fundamento da decisão e as respectivas consequências, tomando dele, requerido, as respectivas instruções, ainda a tempo de preparar a reacção ao acórdão, se porventura elas forem nesse sentido…


25º A complexa fundamentação que, em sede de processo penal em sentido próprio poderá permitir considerar que, em certos casos, a notificação do recurso pode ser feita, apenas, na pessoa do defensor, não deve ter lugar no âmbito dos processos de MDE; porque estes são mais simples, mais rápidos e contam, sempre, inevitavelmente, com a imediata proximidade do Requerido.


26º Neles (processos de MDE), o recorrente – ele próprio, na literalidade do art. 425º n. 6 do CPP e com os efeitos do art. 113.º, n.º 10 do mesmo código –, deve ser sempre pessoalmente notificado.


27º Para além do que, na modestíssima, mas firme, opinião (do Defensor) da Requerida, a interpretação segundo a qual, por regra, a notificação pessoal do acórdão ao arguido recorrente pode ser dispensada, notificando-se apenas o seu Defensor, tratando-se de uma brilhante construção jurisprudencial [Nem outra coisa seria de esperar], retoricamente convincente, sem falhas na sua cadeia de silogismos, cabendo, ainda, no limite do que dispõe o n.º 2 do art. 9º do Código Civil, pela sua rebuscada articulação e justificação afasta-se do que a letra da lei dispõe imediatamente, frustra o respectivo escopo [Na opinião da Requerida a ratio das normas em questão é a de garantir que o notificando tem conhecimento pessoal e directo dos actos mais importantes do processo penal. Entre eles não podem deixar de estar as decisões essenciais que o decidem e podem ditar o seu fim], é menos fiel ao pensamento do legislativo [E a verdade é que este poderia já ter esclarecido a longa controvérsia sobre o tema, introduzindo uma ligeira alteração ao art. 425º n.º 6, que, nesse caso, passaria a estatuir: «O acórdão é notificado aos defensores dos recorrentes e dos recorridos…», ou solução do género. Que não o tenha feito numa das inúmeras alterações legislativas não deixa de ser significativo] e parece afastar-se da verdade e da Justiça, que os Tribunais buscam e prosseguem; para além do que, como já considerou o Tribunal Constitucional, abala as garantias de defesa que a lei constitucional e – até – o direito internacional relativo aos Direitos do Homem, consagram.


28º In casu, a recorrente, Requerida, (ainda) não foi pessoalmente notificada.


29º Evidentemente, só depois do trânsito do acórdão proferido o MDE pode ser executado;


30º E esse trânsito depende da notificação pessoal do acórdão à própria recorrente.


31º Ao contrário do que sucede neste momento no que respeita ao acesso ao processo na Relação, o DO da Requerida conseguiu, ontem – e naturalmente continua a conseguir –, consultar o processo no STJ e não só confirmou a inexistência de notificação pessoal do acórdão proferido à Requerida, como constatou a emissão de certidão de trânsito em julgado. O que o deixou surpreendido.


32º A emissão da dita certidão neste tipo de processo (MDE) deve entender-se como um lapso, pois, como já referido e dispõem os arts. 113.º, n.º 10, 425º n.º 6 do CPP [também na interpretação reiterada do Tribunal Constitucional], o acórdão deve, nestes casos, ser sempre pessoalmente notificado ao recorrente.


33º Pelo menos nestes processos de MDE, o trânsito não ocorre – cfr. art. 113.º, n.º 10 e 425º n.º 7 do CPP, ex vi 34º da Lei n. 65/2003 – sem que tal notificação seja realizada.


34º Por outro lado, o processo só pode baixar 3 dias após o trânsito, nos termos do art. 25º n.º 2 in fine desta Lei n. 65/2003.


35º O eventual ou aparente prosseguimento do processo, só agora constatado e a confirmar após consulta dos autos no TRL, in casu e smo, constitui nulidade em face da falta de notificação do acórdão, que se invoca nos termos legais.


36º A emissão da certidão de trânsito e a baixa do processo são irregularidades, só agora (ontem) constatadas, que se invocam para todos os efeitos e que deverão imediatamente corrigidas, o que requer.


37º Sob o ponto de vista cautelar, o referido acórdão deste Supremo Tribunal não alterou, nos termos do art. 375º n.º 4 do CPP, a medida de coacção a que a Requerida se encontra sujeita – de apresentação mensal perante a autoridade policial da sua área de residência;


38º Que, aliás, ela sempre cumpriu.


39º Outrossim, a Requerida não conhece qualquer promoção, ou despacho, no sentido de ser modificada a sua situação processual em termos de medida de coacção, designadamente de ter sido decretada detenção ou a Prisão Preventiva;


40º Nem existe qualquer razão para tanto.


41º A Requerida não incumpriu qualquer dever processual, não fugiu, nunca pensou fazê-lo, nem tem, na verdade, razões para tal, pois, para além de ser cidadã cumpridora, tem dois filhos menores, adolescentes, para criar; e a quem dar o exemplo;


42º Pelo contrário, pediu dinheiro emprestado para contratar um advogado em ..., para se poder defender no processo no Tribunal de ... que deu origem aos presentes autos de MDE.


43º A Requerida ora requerente tinha consciência e sabe agora que que poderá estar para breve a sua detenção e extradição para ...; e estava a organizar a sua vida nesse sentido. Mas, vivendo num país que se reclama ser um Estado de Direito, não imaginava ser surpreendida com uma detenção/prisão ilegal, inesperada neste momento.


44º Destinou os dias do trânsito em julgado do acórdão que ainda lhe não foi notificado – se porventura desfavorável, como agora, através do seu DO sabe que foi – para entregar provisoriamente os dois filhos aos cuidados de quem pudesse substituí-la no seu papel de mãe, pegar numa mala com roupa, nos seus documentos, nos telefones das pessoas que a podem apoiar, nalgum dinheiro, comunicar ao advogado Francês a iminência da sua chegada, disposta a entregar-se na altura própria pelo seu próprio pé na esquadra que lhe fosse indicada;


45º Ao invés, foi surpreendida pela sua detenção, com a roupa, diurna, adequada ao clima no nosso país, que envergava e enverga, e sabe que corre o risco de ser extraditada para ... sem qualquer preparação, como se de uma criminosa foragida (e já definitivamente condenada) se tratasse, deixando em casa os filhos, em choque e de quem não se despediu.


46º A ora requerente entende e sente que foi colocada numa situação que corresponde à definição de «arbitrariamente preso, detido» prevista no art. 9º da DUDH.


47º As normas do CPP mencionadas supra e infra aplicam-se, como referido, ex vi art. 34º da Lei n. 65/2003.


48º Smo, a detenção/prisão da Requerida foi, é e deve ser considerada ilegal.


49º Smo, foram violados os arts. 2º, 111º, 112º n.º 3, 113º n.º 10, 191º, 425º n.º 6 e 478º in fine, este com as devidas adaptações, todos do CPP ex vi art. 34º da Lei n. 65/2003.


50º Para além dos arts. 1º, 2º, 9º b), 27º ns. 1, 2, 3 a contrario e 4, e 32º n.º 1 da CRP, arts. 3º e 9º da Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH), de 10 de Dezembro de 1948, aprovado e publicado no Diário da República a 9/3/1978 e art. 5º n.º 1 da Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (CEDH), de 4/11/1950 e seus protocolos adicionais.


Em tempo:


Já depois de ter sido concluído este Habeas Corpus, na madrugada de Sábado para Domingo e pelas razões expostas supra, o Defensor da Requerida ora Requerente não logrou submetê-lo através da plataforma Citius. Durante o dia de hoje, dia 5, esteve ocupado numa longa audiência de procedimento cautelar, e agora verifica que:


- Ao contrário de ontem, de anteontem e de Sexta-feira, já tem acesso ao processo na plataforma Citius;


- Vai agora, finalmente, conseguir dar entrada ao presente Habeas Corpus;


- Foi depositada, hoje, só hoje, na respectiva área de notificações, um despacho do passado dia 30/1 (?!) que manda cumprir-se o acórdão de fls.


- Foi depositada, hoje na respectiva área de notificações, de um despacho de hoje, 5/2, que, para além do mais, manda dar conhecimento ao D.O. de todos os actos processuais de que ele ainda não tiver conhecimento – que foi agora cumprido.


- Foi depositada, hoje, só hoje, na respectiva área de notificações, cópia do mandado de detenção, que o DO finalmente pôde ler.


- Consta desse mandado, para além do mais, que deve ser entregue à pessoa a deter cópia do mandado – o que não foi cumprido pela autoridade judiciária que deteve a Requerida – e que deve ela ser «notificada (…) De todo o conteúdo do despacho proferido, do acórdão proferido neste Tribunal e ainda do acórdão proferido no STJ, cujas cópias se juntam.», o que também não foi cumprido.


Ao mandar notificar a Requerida deste acórdão de Vossas Excelências, o Venerando Tribunal da Relação parece ter também entendido, in casu, que a Requerida deve ser notificada dele… andou bem, mas, também neste caso não se percebe porque não aguardou o trânsito em julgado, ou, se lhe tivesse parecido conveniente, não alterou a medida cautelar.


Termos em que deve a Requerida ora requerente ser devolvida imediatamente à liberdade, o que requer!


(…).


2. Foi prestada a informação referida na parte final do nº 1 do art. 223º do C. Processo Penal, nos termos que, seguidamente, se transcrevem:


“(…).


Nos termos e para os efeitos do art.º 223º, nº 1 do Cód. Proc. Penal, deixa-se consignado que:


- AA foi detida no passado dia 12 de Outubro de 2023;


- Foi ouvida no dia 13 de Outubro de 2023, em conformidade com o disposto no art.º 18º da Lei nº 65/2003, de 23/8;


- Foi-lhe nomeado defensor oficioso e efetuado o seu interrogatório judicial, no qual a mesma declarou não consentir na sua entrega às autoridades francesas e não renunciar ao princípio da especialidade;


- Da análise do expediente junto aos autos, suscitaram-se dúvidas a este Tribunal sobre a medida da pena a cumprir pela requerida e sobre quais os crimes que resultaram da conduta que lhe é imputada, dúvidas essas que não permitiram, em sede de audição, concluir se a situação exposta integrava ou não a causa de recusa facultativa prevista no art.º 12º-A da Lei nº 65/03, de 23/08;


- Em face disso, foi a requerida restituída à liberdade, com a obrigação de apresentações mensais no OPC da sua área de residência, e solicitados pelo Tribunal os referidos esclarecimentos às autoridades judiciárias francesas;


- Em resposta ao solicitado, vieram as autoridades judiciárias francesas – Tribunal Judicial de ..., informar que o presente mandado diz respeito à execução de uma pena de 3 anos de prisão proferida pelo Tribunal de ..., em 8 de Dezembro de 2022, da qual se encontra por cumprir pela requerida 2 anos, 8 meses e 9 dias, descontado o tempo de prisão preventiva;


- Informaram ainda que a requerida foi considerada culpada dos crimes de auxiliar a entrada ou permanência ilegal de estrangeiro em ... ou num Estado Parte da Convenção de Schengen por parte de um bando organizado e de participação em associação criminosa com vista à preparação de crime punível com 10 anos de prisão;


- Desta informação foi a requerida notificada, tendo-lhe sido concedido prazo para apresentação de oposição, o que a mesma fez;


- Por acórdão deste Tribunal, datado de 28 de Novembro de 2023, foi julgada improcedente a oposição deduzida e ordenado o cumprimento do MDE relativo a AA, emitido pelas autoridades judiciais francesas, com a consequente entrega da requerida a essas autoridades;


- Deste acórdão veio a requerida recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça;


- Por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 3 de Janeiro de 2024, foi negado provimento ao recurso interposto pela requerida e mantido o acórdão deste Tribunal da Relação;


- Por despacho de 30 de Janeiro de 2024 foi ordenado o cumprimento do MDE.


(…)”.


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Convocada a Secção Criminal, notificado o Ministério Público e o Ilustre Defensor da requerente, realizou-se a audiência com observância das formalidades legais, após o que o tribunal reuniu e deliberou (art. 223º, nº 3, segunda parte do C. Processo Penal), nos termos que seguem.


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II. Fundamentação


A. Dos factos


Com relevo para a decisão do pedido de habeas corpus, dos elementos que instruem o processo extraem-se os seguintes factos:


1. A República Francesa – Tribunal de ... – emitiu um mandado de detenção europeu com vista à detenção da requerente do presente habeas corpus, AA, para cumprimento de pena de prisão.


2. A requerente, no âmbito do referido mandado de detenção europeu, foi detida, em Portugal, no dia 12 de Outubro de 2023, foi ouvida no dia imediato no Tribunal da Relação de Lisboa e restituída à liberdade com a obrigação de apresentação mensal no órgão de polícia criminal da área da sua residência.


3. A requerente deduziu oposição ao mandado de detenção europeu.


4. Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28 de Novembro de 2023, foi julgada improcedente a oposição e ordenado o cumprimento do mandado de detenção europeu, com a consequente entrega da requerente às autoridades judiciais francesas.


5. A requerente interpôs recurso do acórdão da Relação de Lisboa para o Supremo Tribunal de Justiça que, por acórdão de 3 de Janeiro de 2024, negou provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.


6. O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça foi notificado ao Ilustre Defensor da requerente, por certificação Citius de 3 de Janeiro de 2024, presumindo-se a notificação efectuada no dia 8 de Janeiro do mesmo ano.


7. Em 24 de Janeiro de 2024 foi certificada como data do trânsito do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, o dia 18 de Janeiro de 2024.


8. Por despacho de 30 de Janeiro de 2024, proferido pela Sra. Juíza Desembargadora relatora, foi ordenado o cumprimento do mandado de detenção europeu, bem como foi determinada a emissão dos mandados de detenção e de desligamento.


9. Do mandado de detenção e condução emitido em 30 de Janeiro de 2024 e assinado pela Sra. Juíza Desembargadora relatora, consta a ordem de detenção da requerente e sua condução ao estabelecimento prisional, a fim de aguardar em situação de detenção a sua entrega às autoridades judiciais francesas, a ordem de exibição e entrega de cópia do mandado, a indiciação da requerente pela prática de crime de tráfico de seres humanos, e a ordem de notificação do despacho proferido, do acórdão do Tribunal da Relação e do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, cujas cópias iam juntas.


10. No dia 2 de Fevereiro de 2024, a requerente deslocou-se ao posto da ... da Guarda Nacional Republicana onde, pelas 18h15, foi detida.


11. O boletim individual de detido então elaborado contém, além do mais, as causas da detenção, uma assinatura no local destinado à assinatura do detido, e está assinado pelo militar da Guarda Nacional Republicana que efectuou a detenção.


12. A requerente foi entregue por militares da Guarda Nacional Republicana no Estabelecimento Prisional de ..., pelas 20h do dia 2 de Fevereiro de 2024, onde permanece, tendo este estabelecimento certificado a recepção da detida na cópia do mandado de detenção emitido.


B. A questão objecto do habeas corpus


Cumpre apreciar se a requerente da providência se encontra em situação de prisão ilegal por, i) não ter transitado o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que confirmou o acórdão da Relação de Lisboa que ordenou o cumprimento do mandado de detenção europeu e consequente entrega da requerente às autoridades judiciárias francesas e por, ii) não ter sido entregue à requerente cópia do mandado de detenção.


C. Do direito


Com origem no sistema judicial britânico, a providência de habeas corpus foi pela primeira vez contemplada na Constituição de 1911, mantida na Constituição de 1933, e estando também presente na actual Constituição da República Portuguesa, enquanto garantia expedita e extraordinária contra situações ilegais de privação da liberdade.


Dispõe o art. 31º da Lei Fundamental:


1. Haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente.


2. A providência de habeas corpus pode ser requerida pelo próprio ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos.


3. O juiz decidirá no prazo de oito dias o pedido de habeas corpus em audiência contraditória.


No modelo constitucional o habeas corpus, enquanto garantia, tutela o direito fundamental liberdade, quando gravemente afectado por situação de abuso de poder, em consequência de prisão ou detenção ilegal, e pode ser requerido pelo interessado ou por qualquer cidadão, assim se aproximando da acção popular (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, 4ª Edição Revista, 2007, Coimbra Editora, pág. 509), devendo ser decidido pelo juiz competente no prazo de oito dias.


A nível infraconstitucional o habeas corpus encontra-se regulado nos arts. 220º e 221º do C. Processo Penal, quando seja determinado por detenção ilegal, e nos arts. 222º e 223º do mesmo código, quando seja determinado por prisão ilegal.


Embora a requerente se tenha referido sempre à ilegalidade da sua detenção/prisão, nunca concretizando, por mera referência que fosse da norma, que entendia ter sido ilegalmente detida ou que entendia ter sido ilegalmente presa, certo é que, pela menção que faz ao Mandado de Detenção Europeu e à certeza tida de que só a tal processo se pode dever a sua actual situação (cfr. arts. 11º, 12º e 14º do requerimento), cremos estar perante uma prisão ilegal, subsumível à previsão da alínea b) do nº 2 do art. 222º do C. Processo Penal.


Há, assim, que convocar o regime do habeas corpus em virtude de prisão ilegal.


Pois bem.


Dando exequibilidade ao regime constitucional do habeas corpus, estabelece o art. 222º do C. Processo Penal:


1. A qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência de habeas corpus.


2. A petição é formulada pelo preso ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, é dirigida, em duplicado, ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, apresentada à autoridade à ordem da qual aquele se mantenha preso e deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de:


a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;


b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou


c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial.


Os fundamentos da ilegalidade da prisão para efeitos da petição de habeas corpus são, taxativamente, os previstos nas alíneas a) a c) do nº 2 do art. 222º do C. Processo Penal.


Em causa nos autos, está um habeas corpus fundado na alínea b) referida, susceptível de aplicação em distintas situações cuja verificação terá de resultar da matéria de facto processualmente adquirida, conjugada com a legislação aplicável ao caso.


Assim, entre outras situações, são subsumíveis a este fundamento, a não punibilidade dos factos imputados ao preso, a prescrição da pena, a amnistia da infração imputada, a inimputabilidade do preso, a falta de trânsito da decisão condenatória, a impossibilidade legal de submissão do mesmo a prisão preventiva.


Mas o que é necessário é que se trate de uma ilegalidade evidente, de um erro diretamente verificável com base nos factos recolhidos no âmbito da providência confrontados com a lei, sem que haja necessidade de proceder à apreciação da pertinência ou correção de decisões judiciais, à análise de eventuais nulidades ou irregularidades do processo, matérias essas que não estão compreendidas no âmbito da providência de habeas corpus, e que só podem ser discutidas em recurso ordinário (Maia Costa, Código de Processo Penal Comentado, obra colectiva, 2014, Almedina, pág. 909).


Em suma, o habeas corpus traduz-se num remédio contra situações de imediata, patente e auto-referencial ilegitimidade (ilegalidade) da privação da liberdade, não podendo ser considerado nem utilizado como recurso sobre os recursos ou recurso acrescido aos recursos (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Setembro de 2010, processo nº 139/10.4YFLSB.S1, in www.dgsi.pt).


D. O caso concreto


A requerente sustenta a providência de habeas corpus em dois argumentos, a saber:


- Não tendo sido pessoalmente notificada do acórdão deste Supremo Tribunal que confirmou o acórdão da Relação de Lisboa que determinou o cumprimento do mandado de detenção europeu, com a sua consequente entrega às autoridades judiciais francesas, o mesmo não transitou em julgado, pelo que, não podia ter-se iniciado a fase de execução do referido mandado de detenção europeu;


- No acto da sua detenção nada lhe foi entregue pelo órgão de polícia criminal, designadamente, cópia doi mandado de detenção, em flagrante violação do art. 27º, nº 4 da Constituição da República Portuguesa, notificação do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, ou notificação do despacho que, eventualmente, tenha modificado a medida de coacção a que estava sujeita, desconhecendo a razão pela qual está detida ou presa.


Vejamos.


i) A questão da notificação dos acórdãos proferidos pelos tribunais superiores em recurso não é nova, mas tem recebido uma resposta tendencialmente uniforme da jurisprudência.


O art. 113º, nº 10 do C. Processo Penal, na sua primeira parte, fixa a regra de que as notificações do arguido, do assistente e das partes civis podem ser feitas ao respectivo defensor ou advogado, e na sua segunda parte, fixa a excepção, isto é, as notificações respeitantes à acusação, à decisão instrutória, à designação de dia para julgamento e à sentença, bem como as relativas à aplicação de medida de coacção e de garantia patrimonial e à dedução do pedido de indemnização civil, devem ser efectuadas, quer aos referidos sujeitos processuais, quer aos respectivos defensores ou advogados. Por sua vez, agora em sede de recursos, dispõe o nº 6 do art. 425º do C. Processo Penal, que o acórdão é notificado aos recorrentes, aos recorridos e ao Ministério Público.


O legislador não ignora, seguramente, esta problemática e, como nota a requerente, podendo ter alterado a norma do nº 6 do art. 425º do C. Processo Penal, nunca o fez, o que só pode significar que entende não existir razão para qualquer modificação.


Com efeito, embora norma de conteúdo geral, o art. 113º, nº 10 do C. Processo Penal, na sua aplicação, foi pensado para as fases de inquérito, instrução e sentença em 1ª instância, enquanto o art. 425º, nº 6 do mesmo código tem aplicação privativa na instância de recurso. Na verdade, se o legislador entendesse que os acórdãos proferidos em recurso deveriam ser notificados pessoalmente aos recorrentes e aos recorridos bem como, aos respectivos defensores e advogados, não teria deixado de o referir no nº 10 do art. 113º.


Compreende-se a dualidade de regimes pois que, nas decisões em recurso, onde a complexidade da argumentação é, em regra, superior à da decisão de 1ª instância, a notificação pessoal de recorrentes e recorridos pouco adiantará, ao nível da compreensão, devido aos aspectos técnicos, sobretudo no que à defesa respeita, normalmente envolvidos, os quais só poderão ser satisfatoriamente explicados por técnicos de direito, portanto, pelos respectivos defensores e advogados, os quais, aliás, estão deontologicamente obrigados a comunicar aos seus constituintes o teor destas decisões. E não vem sequer alegado, que o Ilustre Defensor da requerente tenha incumprido tal dever profissional.


Deste modo, vem este Supremo Tribunal entendendo que os acórdãos proferidos em recurso pelos tribunais superiores não têm de ser notificados pessoalmente ao arguido, mas apenas ao respetivo defensor ou advogado constituído, podendo ver-se neste sentido, entre outros, os acórdãos de 13 de Julho de 2023, processo nº 1711/16.4S6LSB-H.S1, de 6 de Janeiro de 2020, processo nº 48/09.0GEABT-B.S1, de 11 de Dezembro de 2014, processo nº 1049//12.6JAPRT-C.S1 e de 3 de maio de 2012, processo nº 61/09.9TASAT-C.S1, todos in www.dgsi.pt.


Acresce que o Tribunal Constitucional, várias vezes solicitado a pronunciar-se sobre a desconformidade desta interpretação com a Constituição da República Portuguesa, o tem feito no sentido contrário isto é, no sentido de que as garantias constitucionais de defesa não impõem que um acórdão proferido em recurso seja sempre pessoalmente notificado ao arguido, podendo sê-lo ao seu defensor (acórdãos nº 667/14 de 14 de Outubro de 2014, nº 234/10 de 15 de Junho de 2010, nº 399/09 de 30 de Julho de 2009, nº 275/06 de 2 de Maio de 2006 e nº 512/04 de 13 de Julho de 2004, todos in www.tribunalconstitucional.pt).


Nesta decorrência, tendo o acórdão deste Supremo Tribunal de 3 de Janeiro de 2024, sido notificado ao Ilustre Defensor da requerente, por certificação Citius de 3 de Janeiro de 2024, e presumindo-se a notificação efectuada no dia 8 do mesmo mês e ano, o mesmo transitou em julgado em 18 de Janeiro de 2024, tal como foi certificado.


Com o trânsito em julgado deste acórdão, tornou-se definitivo o acórdão do Tribunal da Relação que determinou o cumprimento do mandado de detenção europeu e consequente entrega da requerente às autoridades judiciais francesas.


Improcede, pois, este argumento da requerente.


ii) A questão da não entrega à requerente, no acto da sua detenção, pelo órgão de polícia criminal, de cópia do mandado de detenção, bem como da entrega dos demais documentos, determinada no mandado, prende-se já com a fase de execução do mandado de detenção europeu emitido pela República Francesa.


Como é sabido, o mandado de detenção europeu é uma decisão judiciária emitida por um Estado membro – Estado de emissão – visando a detenção e entrega por outro Estado membro – Estado de execução – de pessoa procurada, seja para efeitos de procedimento criminal, seja para efeitos de cumprimento de pena ou de medida de segurança privativas da liberdade, que se executa com base no princípio reconhecimento mútuo e sem controlo da dupla incriminação do facto, nos casos previstos no nº 2 do art. 2º da Lei nº 65/2003, de 23 de Agosto, e com controlo da dupla incriminação, nos casos subsumíveis à previsão do nº 3 do mesmo artigo.


O núcleo do princípio do reconhecimento mútuo consiste em a decisão da autoridade judiciária competente e em conformidade com o direito do respectivo Estado membro, dever ter efeito directo e pleno em todo o território da União Europeia, o que significa que as autoridades competentes do Estado membro onde a decisão pode ser executada, devem prestar a sua colaboração à respectiva execução, como se fosse decisão tomada por autoridade competente deste Estado.


Trata-se de um instrumento destinado a reforçar a cooperação entre as autoridades judiciárias dos Estados membros da União Europeia, entre os quais se contam a República Francesa e a República Portuguesa.


Assim, transitada em julgado a decisão de cumprimento do mandado pelo Estado de execução, no caso, a República Portuguesa, resta à autoridade judiciária portuguesa dar início à execução das diligências necessárias para efectivar a detenção e entrega da requerente da presente providência ao Estado de emissão.


Foi precisamente isso o que sucedeu, tendo a Sra. Juíza Desembargadora relatora emitido e assinado os competentes mandados de detenção.


Saber se no acto da detenção da requerente foi ou não cumprido o disposto no nº 3 do art. 258º do C. Processo Penal, é questão que ultrapassa o âmbito do habeas corpus, pois esta providência não serve, como supra já foi referido, para arguir nulidades ou irregularidades, que antes devem ser suscitadas no processo respectivo.


Em todo o caso, tendo a Guarda Nacional Republicana na sua posse o mandado de detenção emitido e assinado pela Sra. Juíza Desembargadora relatora, bem como cópia ou cópias do mesmo, pois que, quando entregou a requerente no Estabelecimento Prisional de ..., colheu a certificação da entrega numa cópia do mandado, não se compreende por que razão não o teria exibido à requerente e entregue à mesma uma cópia.


Acresce que, na hipótese de tal ter acontecido, porque a requerente admitiu ter sido informada verbalmente pelos militares da Guarda Nacional Republicana, no momento da sua detenção, que esta ocorria no âmbito do processo do mandado de detenção europeu, é manifestamente exagerada a afirmação de que não sabe a razão da sua detenção.


Improcede, também, este argumento da requerente.


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Em conclusão:


- Tendo transitado em julgado o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Janeiro de 2024, que confirmou o acórdão da Relação de Lisboa 28 de Novembro de 2023 onde foi ordenado o cumprimento do mandado de detenção europeu emitido pela República Francesa e consequente entrega da requerente às autoridades judiciais deste Estado, iniciou-se a fase de execução do referido mandado;


- A Sra. Juíza Desembargadora relatora, em consequência, determinou a emissão de mandados de detenção da requerente, dos quais consta a ordem de detenção da requerente e sua condução ao estabelecimento prisional, a fim de aguardar em situação de detenção a sua entrega às autoridades judiciais francesas;


- A requerente foi detida e entregue no Estabelecimento Prisional de ... ao abrigo do referido mandado de detenção;


- Assim, a prisão foi ordenada pelo juiz competente e foi determinada por facto que a lei admite.


Inexistindo o fundamento de habeas corpus invocado pelo requerente, resta indeferir a peticionada providência.


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III. Decisão


Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes que constituem este coletivo da 5.ª Secção Criminal, em:


A) Indeferir o pedido de habeas corpus peticionado pela requerente AA, nos termos do disposto no art. 223.º, n.º 4, a), do C. Processo Penal, por falta de fundamento bastante.


B) Condenar a requerente nas custas do processo, fixando em três UC a taxa de justiça (art.8.º, n.º 9, do R. Custas Processuais e Tabela III, anexa).


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(O acórdão foi processado em computador pelo relator e integralmente revisto e assinado pelos signatários, nos termos do art. 94.º, n.º 2 do C.P.P.).


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Lisboa, 8 de Fevereiro de 2023


Vasques Osório (Relator)


Orlando Gonçalves (1º Adjunto)


Agostinho Torres (2º Adjunto)


Helena Moniz (Presidente da secção)