Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
| Relator: | SEBASTIÃO PÓVOAS | ||
| Descritores: | TRANSACÇÃO | ||
| Nº do Documento: | SJ200804290010971 | ||
| Data do Acordão: | 04/29/2008 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | NEGADA A REVISTA | ||
| Sumário : | 1) A medida cautelar é uma decisão interina a aguardar a definitiva do processo principal, assim logrando evitar que da indecisão resultem danos irreparáveis para uma das partes. 2) O contrato de transacção destina-se a prevenir ou fazer terminar um litígio mediante recíprocas concessões das partes. 3) No âmbito da prevenção do litígio – transacção extra judicial – podem considerar-se os acordos celebrados em procedimentos cautelares hipoteticamente instrumentais (instaurados antes da lide principal) enquanto, por não audição prévia da parte requerida, não estiver instalada a controvérsia. 4) A sentença homologatória da transacção destina-se apenas a verificar a regularidade formal e a validade do acordo encontrado, que não a decidir o mérito da questão “sub judicio”, podendo ser impugnada por via de recurso. 5) Pode, outrossim, ser intentada acção contra a transacção – acto em si mesmo, no caso de inexistir homologação judicial ou tratando-se de transacção extra judicial pura. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: “AA – Equipamento de Escritório e Comunicação, Limitada”, intentou acção, com processo ordinário, contra “BB – Prestação de Serviços Administrativos e de Secretariado, Unipessoal, Limitada” pedindo a sua condenação a pagar-lhe 18.025,00 euros, acrescidos de juros, à taxa de 12% desde a citação. Alegou, nuclearmente, ter vendido à Ré material informático, sendo que esta era devedora, em 29 de Janeiro de 2003, da quantia de 58.751,37 euros; que, no arresto apenso, as partes chegaram a acordo quanto à devolução de uma fotocopiadora fixando a dívida em 18.025,00 euros, a pagar em duas prestações; que o não pagamento da primeira implicaria o vencimento imediato da segunda; que a Ré não pagou a quantia acordada. A Ré contestou alegando, em síntese, o incumprimento do negócio inicial – que seria um contrato de empreitada – pela Autora; que lhe assiste o direito à resolução do mesmo; que já sofreu danos no valor de 5.718,46 euros quantia que, em conjunto com danos futuros ilíquidos, reclama em reconvenção. No 1.º Juízo Cível da Comarca de Leiria a acção foi julgada procedente, sendo improcedente a reconvenção. Apelou, a Ré, para a Relação de Coimbra, que confirmou o julgado. Por inconformada, pede, agora, revista. E assim conclui as suas alegações, no que releva: -Na matéria factual elencada pela decisão recorrida fica demonstrada a conduta inadimplente da recorrida. -Continua a não entender como foi possível apresentar o aludido ‘acordo’ no arresto como uma transacção que pôs fim definitivo ao litígio, quando tal matéria de facto dada como provada já constava da elaboração do saneador e da base instrutória e, não obstante tal, o processo seguiu o seu curso a efectuou-se audiência de julgamento. -Afigurando-se assim que era relevante apurar a demais matéria de facto vertida na base instrutória e dá-la como provada ou como não provada. -Pese embora o acórdão recorrido referir que ‘na sequência deste acordo (...) intentou a Autora a presente acção contra a Ré...’, certo é que tal jamais poderia corresponder à realidade. -Se semelhante ‘acordo’ valesse enquanto tal, como é definido no Código Civil, então a ora recorrida teria, forçosamente – e nos termos da lei processual civil – que utilizar a acção executiva para obter o pagamento da quantia que entendia devida. -Manifestamente não o fez, tendo optado pela via da acção declarativa de condenação. -Acresce que, se tal acção declarativa tivesse sido intentada com base no ‘acordo’, então nunca aquela podia ter sido instaurada requerendo-se a apensação do procedimento cautelar em causa ‘à acção ora proposta, nos termos do artº 383 nº 2 do CPC’. -O conceito de transacção não acarreta – nem isso resulta da lei – que se possa considerar, no caso sub judice, que as partes declararam, reciprocamente, nada mais ter a exigir da outra, a que título fosse: uma vez tal nunca foi declarado, nem se pode considerar resultar do texto do ‘acordo’, ou da interpretação do mesmo. -Resulta ainda incontraditável do ‘acordo’ em análise (e o Acórdão recorrido continua a não verificar tal evidência) que à então R. lhe assistiria, sempre, o direito de invocar as razões do não pagamento do montante de 18.025 €, ou mesmo de obter a condenação da então A. face aos prejuízos que o inadimplemento ou cumprimento defeituoso desta causaram àquela. -E à mesma conclusão se chega quando se pretende interpretar de acordo com a posição de um declaratário normal nessas circunstâncias. -Precisamente porque resulta que a quantia reduzida pela recorrida teve por base a restituição de um equipamento, o qual também resulta dos autos – e da matéria provada – que não era o mesmo que estava descrito na factura emitida pela recorrida. -Pelo que, sempre quanto a este equipamento a ora recorrida conseguiria obter a anulação da referida venda. -Jamais se aceite, pois, que um declaratário normal, colocado na posição da recorrida – a qual se demonstrou, saber que tinha facturado equipamento diverso do que entregara à recorrente, saber que tinha falhado em obrigações diversas perante a recorrente nomeadamente quanto a reparações e a assistência – entendesse que o ‘acordo’ vertido no auto de arresto, no preciso dia em que o mesmo ia ser executado, equivalia à renúncia, pela ora recorrente, de todos os demais direitos que tinha – e tem – contra a ora recorrida. -Resulta, assim, que este ‘acordo’ não demonstra, de per si, tudo o que havia sido transaccionado entre as partes, dado que padece de uma falha grave: a omissão ao facto de ser diverso o equipamento restituído pela recorrente à recorrida daquele que esta facturara àquela. -Resulta logo evidente que o dito ‘acordo’ em sede de aresto jamais poderá considerar abranger todos os direitos e deveres das partes e renuncia ao que demais qualquer das partes pudesse exigir da outra. -Tal ‘acordo’ apenas se baseia no que consta das facturas e, ficou determinado que um dos equipamentos facturado não foi, realmente, vendido e entregue pela recorrida à recorrente (e sim outro, de outro modelo). -Modelo este entregue à recorrente que – tal como provado – já tinha sido retirado do mercado há mais de um ano uma vez que dava problemas! -Existem, pois, nos autos diversos elementos que permitem extrair conclusões diversas da interpretação que um declaratário normal teria do teor de semelhante ‘acordo’. -O ‘acordo’ lavrado no auto de arresto não pôs termo definitivo ao litígio que existia entre as partes, nem equivaleu a renúncia pela ora recorrente dos seus demais direitos contra a ora recorrida. -É, ainda, evidente que a recorrente nunca poderia acordar pôr termo ao litígio, de forma definitiva, quando tinha por resolver com o ......toda a questão do projecto, do fornecedor dos equipamentos, o qual devia concomitantemente instalá-los, colocá-los em funcionamento, dar assistência e formação quanto à sua utilização. -Para a renúncia do credor aos seus direitos – o que é o caso da recorrente – sempre a lei determina a obrigatoriedade de tal ficar reduzido a escrito – cfr. arts. 809º, 731.º, n.º 1 do C.C.. -Do teor do “acordo” nada a recorrente declarou, nem nada as partes acordaram no que concerne às razões daquela contra a recorrida, aos seus direitos face ao incumprimento ou cumprimento defeituoso por parte da recorrida das obrigações a que se tinha vinculado. -Pelo supra exposto e pelas razões aludidas, violou o Acórdão recorrido o disposto nos arts. 1248.º e 809.º do C.C., com a interpretação que supra deveria ter sido feita quanto ao que foi declarado pelas partes de fls. 32 a 34 do apenso A ao presente pleito. Não foram oferecidas contra-alegações. As instâncias deram por assente a seguinte matéria de facto: I – A Autora dedica-se ao comércio de material para equipamento de escritório, nomeadamente, material informático – hardware e software, fotocopiadoras, máquinas de calcular, consumíveis de informática e consumíveis de escritório – A dos Factos Assentes. II – A Ré dedica-se ao comércio de prestação de serviços administrativos e de secretariado – B dos Factos Assentes. III – No exercício da sua actividade comercial, a Autora forneceu à Ré vário material informático e outro equipamento de escritório – C dos Factos Assentes. IV – Para garantia do pagamento do alegado débito da Ré à Autora em consequência do fornecimento de tal material, a Autora, em 29.01.2003, deu entrada neste Tribunal de um pedido de arresto de bens da Ré, processo agora apenso a estes autos – D dos Factos Assentes. V – No dia da realização do arresto ordenado, e conforme consta do respectivo Auto, para além dos bens arrestados, as partes chegaram a acordo quanto à devolução de uma fotocopiadora, cujo valor foi creditado à Requerida, e foi fixada a dívida no montante de € 18.025,00 a ser paga em duas prestações de € 9.012,50 cada uma – E dos Factos Assentes VI – Para garantia do pagamento da quantia em dívida assim fixada, foram entregues à Autora na data do arresto dois cheques preenchidos e assinados pelo Sr. CC, datados de 28.02.2003 e 31.03.2003 e com o valor de € 9.012,50 cada, cheques estes que seriam substituídos por outros da Ré e de igual valor e para as mesmas datas – F dos Factos Assentes. VII – Ficou também acordado que o não pagamento da primeira prestação implicava o vencimento imediato da segunda – G dos Factos Assentes. VIII – A Ré não substituiu os cheques entregues pelo Sr. CC, tendo a Autora apresentado a pagamento o cheque datado de 28.02.2003 de que era portadora, o qual foi devolvido por falta de provisão, verificada em 5.03.2003, no serviço de compensação do Banco de Portugal – H dos Factos Assentes. IX – Nas negociações havidas entre Autora e Ré com vista à celebração do negócio em apreço nos autos, o sócio da Autora chegou a sugerir à Ré fornecer-lhe – uma vez que se detectou que esta olvidara semelhante equipamento na sua proposta junto do ......... um programa anti-vírus, uma gaveta de dinheiro e uma impressora de talões – I dos Factos Assentes. X – Na sequência, a Autora forneceu à Ré uma impressora de talões de caixa e uma gaveta de dinheiro – J dos Factos Assentes. XI – Após a instalação de tal equipamento, deveria o mesmo permitir que, após o fecho de uma venda a dinheiro, a impressora imprimisse o talão e a gaveta de dinheiro abrisse automaticamente, mas tal não aconteceu, motivo pelo qual a Ré teve de solicitar a presença e assistência da Autora – K dos Factos Assentes. XII – A Autora enviou então um técnico para configurar o equipamento, o qual não conseguiu solucionar o problema, tendo aquele informado que não havia compatibilidade entre os sistemas, sendo necessário substituir a drive, e depois a Autora informou a Ré que iria resolver o problema mas, até à data, aquele subsiste tendo a Ré que utilizar a chave cada vez que necessita de aceder à gaveta de dinheiro – L dos Factos Assentes. XIII – A actual sócia da Ré apresentou a sua candidatura junto do ......em Junho de 2000, vindo o respectivo contrato de concessão de incentivos financeiros a ser outorgado entre a Ré e o ......, em 21.01.2002 – M dos Factos Assentes. XIV – Ainda em Março de 2002, a Autora instalou nos computadores (portátil e outro), referidos na factura n.º 102/2002, um programa anti-vírus (PC Cilin 2000 – à data já obsoleto), tendo aquela referido à Ré que semelhante programa era meramente provisório (motivo pelo qual não se encontra facturado) e que instalaria posteriormente um programa anti-vírus capaz – N dos Factos Assentes. XV – Não obstante as diversas insistências da Ré junto da Autora para que fornecesse e instalasse um programa anti-vírus actualizado e capaz – tendo em consideração a vulnerabilidade do sistema em rede ligado à internet e o serviço prestado pela Ré aos clientes no posto público de internet –, nunca a Ré o fez – O dos Factos Assentes. XVI – Em finais de Março de 2002, a Ré encomendou, verbalmente, à Autora o segundo lote de material e equipamento o qual, na sua generalidade, incluía o que consta da factura n.º 164/2002 datada de 02.05.2002 - P dos Factos Assentes. XVII – Somente em 2 1.05.2002, a Autora entregou nas instalações da Ré o equipamento e material descrito na guia de transporte n.º 25/2002 – Q dos Factos Assentes. XVIII – Foi o Sr. DD da empresa ......, Lda, importadora da marca Infotec quem, por ordem da Autora, colocou no estabelecimento da Ré, a fotocopiadora a cores – R dos Factos Assentes. XIX – Tal indivíduo referiu à Ré que o equipamento em causa tinha que ser instalado em rede uma vez que, enquanto tal não sucedesse, aquela só o podia utilizar enquanto mera fotocopiadora, dado que as funções de impressora e de scanner não funcionavam sem isso – S dos Factos Assentes. XX – Aquando da entrega nas instalações da Ré da multifunções – fotocopiadora a cores, a Autora referiu à Ré que o equipamento em causa era topo de gama e que havia acabado de ser lançado no mercado, o que foi corroborado na ocasião pela firma importadora ....... Lda. – T dos Factos Assentes. XXI – Por outro lado referiu ainda que a multifunções/fotocopiadora a preto e branco também carecia de ligação em rede, por forma a que as suas potencialidades pudessem ser todas utilizadas, ou seja, da forma como a multifunções/fotocopiadora a preto e branco havia sido instalada pela Autora, aquele equipamento só utilizava as funções de scanner e de impressora num único PC, sendo certo que não se conseguia colocar em operacionalidade o módulo de fax da máquina em causa carecendo também tal equipamento de ligação em rede – U dos Factos Assentes. XXII – Por volta do mês de Junho ou Julho de 2002 a multifunções – fotocopiadora a cores fornecida pela Autora à Ré esteve sem funcionar durante uma semana – dentro do seu prazo de garantia –, porquanto carecia da colocação de uma peça (unidade fusora) que verificava ser deficiente (a qual permitia que a imagem passasse para o papel) – V dos Factos Assentes. XXIII – A fotocopiadora a preto e branco fornecida era um equipamento multifuncional, abarcando a função de fotocopiadora digital, com sistema de fax de alta velocidade, com módulo de scanner de grande resolução de imagem, com kit de furação de folhas (para dois furos) – W dos Factos Assentes. XXIV – Tal equipamento tem também a função de impressora com capacidade para 45 impressões por minuto, tendo também a capacidade de enviar fax directamente de livro colocado na máquina, tudo isto conforme consta da informação e especificações técnicas fornecidas pela marca Infotec e do que a Ré viu na demonstração que a Autora efectuou do equipamento – X dos Factos Assentes. XXV – A Autora entregou à Ré as guias de transporte juntas aos autos a fls. 83 a 90, uma declaração emitida por aquela respeitante à garantia dos equipamentos de fotocopiadoras, um documento de condições de garantia da empresa ......, Lda. (respeitante a algum material informático que teria sido pela Autora fornecido), bem como um documento indicando os preços unitários de algum equipamento e material, documentos estes juntos a fls. 100 a 102 – Y dos Factos Assentes. XXVI – O disco com a referência 13.0140. constante da guia de transporte n.º 22, não consta das guias de transporte nºs 21 e 25 – Z dos Factos Assentes. XXVII – No exercício da sua actividade comercial, a Autora vendeu e entregou à Ré, a pedido desta, o material e os equipamentos descritos na factura n. 102/2002, cuja data de emissão é 8.03.2002, no valor total de € 24.676,22, com IVA incluído, e cuja cópia faz fls. 23 a 25. A Autora vendeu e entregou à Ré, também a pedido desta, ainda o material e equipamento descrito na factura n.º 164/2002, cuja data de emissão é 2.05.2002, junta a fls.26 a 28 dos autos, com excepção do fotocopiador ali descrito sob o código 10.01.7513 (fotocopiador cores Infotec modelo 7513 e demais componentes do mesmo); o material vendido pela Autora à Ré, a pedido desta, descrito na factura n.º 164/2002, tinha o preço total de € 9.876,44, com IVA incluído. A Autora entregou à Ré uma fotocopiadora a cores Infotec modelo 7410E, a qual tinha valor concretamente não apurado – resposta ao quesito 1º. XXVIII – Previamente à constituição da Ré, a sua actual sócia-gerente candidatou-se ao programa de estímulo à oferta de emprego junto do Instituto do Emprego e Formação Profissional, para efeitos de desenvolvimento e criação de um projecto de emprego – resposta ao quesito 2º. XXIX – Para serem aprovados os incentivos ao investimento a conceder, teve a mesma de apresentar ao ......vários orçamentos de fornecedores do diverso material e equipamento a adquirir – resposta ao quesito 3º. XXX – A actual sócia da Ré escolheu então um orçamento que lhe foi fornecido pela FF, Lda., em data não apurada, o ......veio a aprovar o projecto apresentado pela actual sócia da Ré – resposta ao quesito 4º. XXXI – Mais tarde a sócia-gerente da Ré requereu ao ......que autorizasse a substituição de tal fornecedor, a que tal organismo acedeu – resposta ao quesito 5º. XXXII – No início de 2002, a Ré reuniu com a Autora e expôs-lhe que a proposta de fornecimento da Autora tinha que respeitar o que fora proposto por FF, Lda., devendo os equipamentos a fornecer ter qualidade pelo menos equivalente aos da proposta da FF, Lda. do que a Autora ficou ciente – resposta ao quesito 6º. XXXIII – O gerente da Autora, EE, afirmou que ia cumprir com as especificações exigidas pela Ré referidas na resposta ao quesito 6.º. e que conseguiria preços mais baixos do que os apresentados pela FF, Lda. – resposta ao quesito 10º. XXXIV – A dado momento, antes do fornecimento, ficou acordado entre Autora e Ré que a Autora concedia à Ré um prazo de 120 dias para pagamento do preço constante de cada factura relativa ao fornecimento dos materiais e equipamentos supra referidos – resposta ao quesito 11.º XXXV – Ficou acordado entre Autora e Ré que a Autora se encarregava de transportar, para o estabelecimento da Ré, o equipamento a fornecer pela Autora à Ré (o constante do projecto aprovado pelo ......e o outro a que se alude na al. I) dos Factos Assentes), procedendo à sua instalação e colocação em funcionamento, interligando os equipamentos que de tal careciam, bem como se encarregava de prestar formação quanto à utilização dos equipamentos fornecidos – resposta ao quesito 12.º XXXVI – E que das facturas a emitir pela Autora, teriam que constar todos os materiais e equipamentos fornecidos, com especificação unitária de todos os preços – resposta ao quesito 14º. XXXVII – A Ré veio a abrir o seu estabelecimento ao público em 01.04.2002, não obstante aquele ainda não se encontrar totalmente dotado de todos os equipamentos e com todas as potencialidades dos mesmos a funcionar em pleno – resposta ao quesito 17.º. XXX VIII – A Ré solicitou à Autora a entrega do primeiro lote de equipamento, o qual incluía o material e equipamento que constam da factura de 102/2002 datada de 08.03.2002 – resposta ao quesito 18.º. XXXIX – Tal material apenas foi entregue nas instalações da Ré conforme guias de transporte n.ºs 21 e 22 em 13.03.2002 e em 26.03.2002. conforme guia de transporte n.º 20, e entregue e instalado o software de gestão que consta da guia de transporte n.º 23, em 31.03.2002 – Domingo de Páscoa – resposta aos quesitos 19.º e 20º. XL – Em 9.05.2002. a Autora entregou nas instalações da Ré os equipamentos e material que se encontram descritos na guia de transporte nº 24/2002 – resposta o quesito 22º. XLI – Não obstante a cablagem. o servidor ou computador principal que “orienta” todos os demais ligados em rede, e o UPS terem sido entregues nas instalações da Ré em 21.05.2002, aqueles não foram integralmente instalados nessa data, visto que, pelo facto de à data não estar realizado o trabalho de cablagem estruturada, o servidor não pôde ser instalado e os restantes equipamentos não puderam ficar em rede – resposta aos quesitos 23.º e 24º. XLII – Pelo que a Ré não pode desde logo aferir e utilizar todas as funcionalidades e potencialidades dos mesmos – resposta ao quesito 25º. XLIII – Por vezes, a Ré solicitou à Autora assistência nos equipamentos e suas funcionalidades, e o gerente da Autora – EE – apenas aparecia cerca de uma semana após ter sido pedida a sua comparência – resposta ao quesito 27º. XLIV – Por vezes, compareceu no estabelecimento da Ré o filho de EE, de cerca de 15 anos de idade – resposta ao quesito 28.º. XLV – Dessas vezes, o filho de EE prestou ajuda nomeadamente na edição de imagem – resposta ao quesito 29.º. XLVI – Em consequência de durante algum tempo os equipamentos não estarem ligados em rede, a Ré não aceitou certos trabalhos de clientes por não ter capacidade de resposta atempada e, consequentemente, não auferiu as receitas respectivas – resposta ao quesito 30.º. XLVII – Existindo uma real diferença – de qualidade e de preço – entre, por exemplo, uma fotocópia a cores e uma impressão digitalizada a cores – resposta ao quesito 31.º. XLVIII – Quando a peça a que se alude na al. V) dos Factos Assentes foi colocada n referido equipamento, verificou-se que tal multifunções/fotocopiadora a cores continuava sem funcionar correctamente, e de acordo com as suas potencialidades, porque encravava frequentemente o papel – resposta aos quesitos 32.º e 33º. XLIX – Posteriormente, e dado que a multifunções a cores continuava a encravar papel, o gerente da Autora retirou, em 12.11.1002, a aludida peça e levou-a consigo para ser analisada – resposta ao quesito 34º. L – No dia seguinte, o gerente da Autora regressou com a aludida peça, que colocou na multifunções a cores, após o que a retirou novamente e levou-a consigo – resposta ao quesito 37.º. LI – Em 18.11.2002. a Ré enviou à Autora a comunicação junta a fls. 91- 92, cujo teor se dá aqui por reproduzido, via fax, que a Autora recebeu nesse mesmo dia. A Autora não mais devolveu a unidade fusora, encontrando-se a multifunções sem poder funcionar desde então – resposta ao quesito 39°. LII – Relativamente ao módulo de fax, o mesmo não foi programado pela Autora por forma a que, quando fossem enviadas várias telecópias em sequência, sem que o documento respectivo permanecesse colocado (esperando que a linha telefónica ficasse livre), fosse impressa uma folha de onde constasse o tempo de transmissão de cada telecópia, ou que tal duração ficasse gravada digitalmente. Sem tal elemento (duração do envio), a Ré tinha dificuldade em calcular o custo da operação para fixação do preço a cobrar ao cliente respectivo — atendendo a que um dos serviços prestados pela Ré incluir o «posto público de fax» – resposta ao quesito 41º. LIII – A Ré enviou à Autora um fax, em 19.07.2002, cujo teor consta a fls. 97-92 no qual reclama da falta de assistência técnica ao material fornecido e solicita documentos comprovativos relativos às datas de fornecimento, de garantia; calendário de formação, preços de assistência técnica e preços para matéria que identifica. – resposta ao quesito 43º. LIV – De acordo com a ......, Lda. uma motherboard fornecida à Autora, e que esta teria fornecido à Ré, tem a referência 06.0181, encontrando-se tal código na guia de transporte n.º 22 mas já não na guia de transporte n.º 25 – resposta ao quesito 44º. LV – A placa gráfica com a referência 07.0063 não consta das guias de transporte n.º 22 e n.º 25; o dimm com a referência 03.0030 consta da guia de transporte n.º 22, não constando tal referência na factura nº 102/2002 – resposta ao quesito 45º. LVI – A caixa (medio tower). com a referência 05.0077, consta da guia de transporte nº 22, mas já não consta da guia de transporte nº 25 e a drive, com a referência 04.0002 – não consta das guias de transporte nºs 22 e 25 – resposta ao quesito 46.º. LVII – A dada altura, antes de 11.12.2002, foi o sistema informático das instalações da Ré infectado por um vírus, razão pela qual não se conseguia proceder à acentuação das palavras que eram escritas no processador de texto; além disso, e em consequência, sempre que se ligavam os computadores eram activadas as impressoras que começavam a debitar papel no qual apareciam escritas cerca de três linhas em cada folha – resposta ao quesito 47º. LVIII – Desta situação deu a Ré conhecimento à Autora para que fosse solucionar o problema – resposta ao quesito 48º. LIX – A Autora não solucionou o problema – resposta ao quesito 49.º. LX – A dado momento, a Ré contactou outro representante da marca Infotec, Sr. GG, que disse que o equipamento multifunções a cores que a Ré tinha não conseguia ter a mesma prestação que o equipamento desse tipo que constava da proposta da FF, Lda., pois tinha menos de metade de capacidade de resposta. O Sr. GG disse ainda que o equipamento multifunções a cores instalado na Ré já tinha sido retirado do mercado há mais de um ano, sobre aquela data, e que tal sucedera porque dava problemas. A Ré reparou então que a multifunções a cores que ali fora instalada pela Autora era diferente da que constava da factura respectiva, emitida pela Autora em nome da Ré (factura n.º 164/2002), pois o equipamento instalado pela Autora era o modelo ........, e o facturado era o modelo ...... – resposta aos quesitos 50.º a 54º. LXI – O equipamento de modelo ........... tem uma velocidade anunciada de impressão a preto e branco de 40 pág./min. em A4 e de 20 pág./min. em A3, e tem uma velocidade de impressão a cores de 10 pág/min. em A4 e de 5,2 pág./min. em A3 – resposta ao quesito 55º. LXII – A multifunções de modelo .... tem software incorporado, tem uma memória de 256 Mb, tem uma velocidade anunciada de impressão a preto e branco de 51 pág/min. em A4 e de 22,5 pág./min. em A3, e tem uma velocidade de impressão a cores de 13 pág/min. em A4 e de 6,5 pág./min. em A3 - resposta ao quesito 56º. LXIII – A Ré enviou à Autora, em 22 de Novembro de 2002, o fax fls. 116, o qual foi recebido pela Autora em 22 de Novembro de 2002, e onde informa Autora da desconformidade da facturação efectuada em relação ao fotocopiador Infotec Modelo .... quando o que lhes foi fornecido foi o Infotec Modelo ....., cujo preço será bastante inferior, pedindo à Autora o esclarecimento da situação. – resposta ao quesito 57.º. LXIV – A Autora enviou à Ré o fax cuja cópia faz fls. 122, em que explica a diferença de facturação do material, justificando-a. – resposta ao quesito 58º. LXV – Tendo a Autora procedido à ligação de todo o sistema existente nas instalações da Ré, em rede, bem como à instalação do programa de gestão comercial, sendo que este teria que ser multi-posto, a Autora ligou-o em mono-posto, ou seja, todo o trabalho a realizar com esse programa de gestão somente podia ser realizado no único PC onde o programa havia sido instalado – resposta ao quesito 59º. LXVI – Cerca de Dezembro de 2002, a Ré verificou que a memória disponível dos computadores era reduzida, o que impedia que se trabalhasse em tratamento de imagem porquanto o sistema demorava muito a responder. Por tal razão, a Ré recorreu a outra empresa por forma a que se procedesse à formatação dos discos dos discos e fosse instalado um anti-vírus, mas tal trabalho não pode ser completado, uma vez que a ré não tinha em seu poder alguns cd’s de instalação e outros suportes – resposta aos quesitos 60.º e 61.º. LXVII – A Autora não havia entregue à Ré a chave de acesso (password) do servidor resposta ao quesito 62.º. LXVIII – Por tal razão, o servidor ainda não pôde ser formatado; as multifunções, após a infecção pelo vírus informático, não puderam ser instaladas por falta de CD/disquete de instalação; e a impressora de talões também ficou sem funcionar, por falta de disquete/CD de instalação do programa PHC – resposta ao quesito 63.º. LXIX – Antes de decorrido o prazo de 120 dias sobre a data de emissão de uma das facturas, a esposa do gerente da Autora exigiu o pagamento da mesma – resposta ao quesito 64º. LXX – Em 21 de Outubro de 2002, a Ré encomendou à Autora diversos toners para as multifunções, bem como óleo para a multifunções a cores, tendo reiterado o pedido em 21 de Novembro de 2002, sem que a Autora lhe fornecesse tais produtos – resposta ao quesito 65.º. LXXI – Em 28 de Novembro de 2002, a Ré enviou à Autora o fax junto a fls. 132, que a Autora recebeu nesse dia – resposta aos quesitos 66.º e 67º. LXXII – A Ré pagou à Autora, mediante cheque com o n.º 000000000000, sacado sobre o BPI, emitido em 3 1 de Maio de 2002, a quantia de 326,55 relativa à factura n.º ..../2002, cuja cópia constitui fls. 103 – resposta ao quesito 68.º. LXXIII – A Ré pagou à Autora, mediante cheque com o n.º ................, sacado sobre o BPI, emitido em 6 de Junho de 2002, a quantia de € 3.000,00, com referência aos equipamentos fornecidos pela Autora à Ré – resposta ao quesito 69.º. LXXIV – A Ré entregou à Autora, mediante o cheque nº ............, emitido sobre o Sotto Mayor, em 31 de Outubro de 2002, a quantia de € 6.182,06 – resposta ao quesito 70º. LXXV – A Ré entregou à Autora, mediante transferência bancária realizada em 6 de Dezembro de 2002, a quantia de € 7.000,00 – resposta ao quesito 71.º. LXXVI – Além dos acima referidos, a Autora não forneceu outros computadores à Ré – resposta ao quesito 72.º. LXXVII – Por causa do supra descrito, e para honrar os compromissos que estabelecera com clientes, a Ré recorreu a empresas da concorrência para fazer cópias e impressões a cores, no que despendeu € 892,11 – resposta ao quesito 73.º. LXXVIII – Pelas mesmas razões, a Ré perdeu pelo menos um cliente e recusou clientes novos – resposta ao quesito 74.º. LXXIX – A Ré recorreu a outras empresas para lhe fornecer toners, um programa antivírus, e para resolverem problemas relativos aos equipamentos fornecidos pela Autora, pelo que pagou pelo menos € 2.651,77 – resposta ao quesito 75º. LXXX – Perante a deficiência da multifunções a cores, teve a Ré de adquirir uma impressora HP a cores, a qual custou € 709,31, tendo esta um custo de cópia mais elevado, e não fazendo cópias de formato A3 – resposta ao quesito 76.º. LXXXI – A Ré entrou em situação de incumprimento para com o projecto financiado pelo ......., podendo tal facto levar à resolução contratual por parte do ......— resposta ao quesito 77.º. LXXXII – As facturas foram emitidas antes do fornecimento do equipamento, com vista ao adiantamento do processo no ......– resposta ao quesito 79º. LXXXIII – As instalações da Autora situam-se próximo das instalações da Ré; o filho do gerente da Autora era estudante e era frequente estar na Autora quando não tinha aulas – resposta ao quesito 81.º. LXXX1V – A fotocopiadora tem autocolantes informativos — resposta ao quesito 84.º. LXXXV – Efectivamente, a Autora instalou uma máquina fotocopiadora modelo .... MF da marca Infotec – resposta ao quesito 86.º. LXXXVI – As facturas da Autora foram emitidas antes da entrega do material – resposta ao quesito 90.°. LXXXVII – Com vista a que a Ré recebesse do ......um adiantamento do financiamento, a Ré necessitava do recibo referente à factura n.º 102/2002, pelo que a Autora lhe passou o respectivo recibo para esse efeito – resposta ao quesito 91.º. LXXXVIII – A Ré entregou à Autora o cheque n.º .............. sacado sobre o BI no valor de €24.676,22, com a data de 15 de Junho de 2002 para pagamento da citada factura, o qual, apresentado a pagamento em 10.07.2002, foi devolvido em 12.07.2002 com a indicação cheque revogado/fora prazo — resposta ao quesito 92.º. LXXXIX – Em 22 de Julho de 2002, a Autora entregou no Centro de Emprego de Leiria a carta cuja cópia constitui fls. 212 e mediante a qual informa aquele Centro dos negócios havidos com a Ré, do incumprimento desta do acordado quanto aos pagamentos e dando ainda notícia do recurso ao tribunal para dirimir o litígio. – resposta ao quesito 93.º. XC – A Ré entregou à Autora um outro cheque, no montante de € 5.000,00, sacado sobre o BPI, n. ° ............., datado de 17.06.2002, o qual apresentado a pagamento foi o mesmo devolvido por falta de provisão em 20.06.2002 – resposta ao quesito 94º. XCI – A Autora passou por dificuldades financeiras. A Autora aceitou a devolução da fotocopiadora a cores modelo ......E, e vendeu-a posteriormente a Officepak – Com. Mat. e Equip. Escrit., S.A., tendo sido colocada em Coimbra – resposta ao quesito 100.º. Foram colhidos os vistos. Conhecendo, No dia 29 de Janeiro desse ano a Autora intentou contra a Ré um procedimento cautelar pedindo o arresto de bens para garantia do seu crédito de 73.740,97 euros, resultante do não pagamento de material que vendeu, e a Ré comprou, entre Março e Maio de 2002; que como a Ré não pagou o preço e tinha reduzida actividade comercial, receava perder a sua garantia patrimonial. A providência foi decretada no dia 4 de Janeiro de 2003. Durante a respectiva execução, no dia 17 de Fevereiro de 2003, e depois de arrestados três bens os representantes das partes subscreveram o seguinte: “A Requerida devolve a máquina fotocopiadora a cores constante da factura n.º 164/02 da Requerente, de imediato, anulando-se a sua venda e creditando a Requerente o valor dela com IVA (€39.188,31) na conta corrente da Requerida, o que foi aceite e feito de imediato por ambas as partes. A Requerente fixa a quantia ainda em divida pela Requerida no valor de €18.025,00, o que a Requerida aceita. O pagamento será feito por duas vezes entregando hoje a Requerida dois cheques no valor de €9.012,50 cada um, para os dias 28/02/2003 e 31/03/2003, o que a Requerente aceita. Os cheques serão pertencentes ao Sr. CC, funcionário da Requerida, com o B.I n.º 0000000000, emitido em 12/07/2001, pelo A. I. de Leiria, cuja cópia se junta e servidão de hoje de garantia, sendo substituídos por cheques da Requerida antes das datas neles apostas. O não pagamento da primeira prestação implica o imediato vencimento da segunda.” E assim puseram termo à medida cautelar. No dia 1 de Abril de 2003, a Autora intentou esta acção pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe 18.025,00 euros, acrescidos de juros. Como “causa petendi” alegou o incumprimento do acordado nos autos de arresto. São pertinentes algumas considerações sobre os procedimentos cautelares e os respectivos reflexos na lide que os instrumentaliza. 1.2 – As medidas cautelares, e, em consequência, também o arresto, foram inicialmente consideradas “actos preventivos ou preparatórios para algumas causas” (cf. os artigos 363 ss do Código de Processo Civil de 1876). Na dogmática jurídica, só após o Código de 1939, surgiram estudos de laboração doutrinal (v.g. “A figura do Processo Cautelar” do Prof. Alberto dos Reis – BMJ-3-27 e “Natureza Jurídica dos Processos Preventivos e Conservatórias e seu sistema no Código de Processo Civil” – “Revista da Ordem dos Advogados”, 1945, n°s 3 e 4, 14 ss – conducentes à reforma de 1961, quando esses meios passaram a designar-se de “Procedimentos Cautelares”). No essencial, são destinadas “a garantir quem invoca a titularidade de um direito contra a ameaça ou risco que sobre ele paira, e que é tão iminente que o seu acautelamento não pode aguardar a decisão de um moroso processo declarativo ou a efectivação de um interesse juridicamente relevante através de um processo executivo se for caso de instaurá-lo” (Prof. A. Palma Carlos – “Procedimentos cautelares antecipadores”, in “O Direito” 105°-236). São seus pressupostos a instrumentalidade, (aqui, hipotética, por presuntiva de vencimento em ulterior acção principal a intentar); o “periculum in mora”, caracterizado pela iminência de grave prejuízo causado pela provável demora da decisão definitiva o que põe em grave risco o direito do requerente; o “fumus bonni juris”, ou aparência da realidade do direito invocado, a conhecer através de um exame e instrução indiciários (“sumaria cognitio”). Trata-se de uma decisão interina a aguardar a definitiva do processo principal, assim logrando evitar que da indecisão resultem danos irreparáveis para uma das partes. E sempre assim é em todos os procedimentos cautelares. Os requisitos próprios do arresto são a probabilidade da existência do direito de crédito pedido na acção proposta (ou a propor) e o receio que o requerido lese, por forma grave e de reparação difícil, esse direito, dissipando a garantia patrimonial. Trata-se, em suma, de uma apreensão judicial de bens. A alegação da existência do crédito e do justo receio de perda da garantia patrimonial integram a “causa petendi”. Como refere o Prof. Almeida Costa “basta que o credor tenha fundado motivo para recear que a garantia patrimonial se perca, nomeadamente por temer uma próxima insolvência do devedor, ou uma sonegação ou ocultação de bens que impossibilite ou dificulte a realização objectiva do crédito (in “Direito das Obrigações”, 758: cf. ainda, “inter alia”, o Acórdão do STJ de 13 de Abril de 1973 – BMJ 226-189). 1.3 – A Autora lançou mão desta medida provisória, sendo que, antes da respectiva efectivação, fez um acordo com os Réus, nos termos precisamente acima transcritos. Tal acordo não pode deixar de ser considerado uma transacção, como, e bem, decidiram as instâncias, pois nada impede – antes a economia processual aconselha - que o acordo para o litigio principal possa ser feito na lide instrumental. Ademais, é nítido que as partes assim o quiseram, ao fixarem todo um clausulado e prazos para as prestações negociais, que foi vertido em escrito assinado por ambos. 2 – Transacção A formulação legal deste tipo de contrato, constante do artigo 1248.º do Código Civil, tem imediatas configurações substantivas e processuais. Ali, caracteriza-se num novo contrato, por certo sinalagmático, por (implicando, a montante, recíprocas concessões) gerar obrigações para ambas as partes. O escopo da transacção é evitar, ou pôr termo a, um litígio. Nesta medida, e como ensinam os Profs. Pires de Lima e A. Varela (apud, “Código Civil – Anotado”, 3.ª ed., II, 856) permite-se “que tenha lugar, não só estando a causa pendente, mas também antes da propositura da acção judicial; trata-se, neste caso, da transacção chamada preventiva ou extrajudicial, a que se refere o artigo 1250.º. O que a lei não dispensa é uma controvérsia entre as partes (…)”. E continuam: “A transacção tem por objecto recíprocas concessões (transactio nullo dato vel retento seu promisso minime procedit: 1.8 C. de transact., 2,4). Se a parte que invoca o seu direito desiste de o tornar efectivo, dando ao acto um simples efeito extintivo, há uma desistência: se a outra parte acaba por reconhecer a legalidade da pretensão, através de um acto com eficácia meramente confirmativa ou constitutiva, há uma confissão. Na transacção, nem há desistência plena, nem reconhecimento pleno do direito. Também não há na transacção o ânimo de fixar ou determinar a situação jurídica anterior das partes (negozio di accertamento); a ideia básica dos contraentes é a de concederem mutuamente e não a de fixarem rigidamente os termos reais da situação controvertida, como quando se fixa a redução do preço correspondente à venda de uma coisa defeituosa ou à entrega da obra com defeitos por parte do empreiteiro. As concessões recíprocas podem revelar-se sob dois aspectos. Podem as partes transigir em reduzir o direito controvertido (por ex., em vez de uma delas entregar 100, entrega 50; em vez de uma delas reconhecer o direito de propriedade sobre todo o prédio, reconhece-o sobre metade dele.)” Mas sempre terá os limites do artigo 1249.º do Código Civil – indisponibilidade dos direitos em conflito ou ilicitude do negócio – para além de, se preventiva ou extra judicial, ter de constar de documento escrito, salvo se puder “derivar algum efeito” para o qual a lei exija escritura pública, situação em que se impõe a respectiva outorga (artigo 1250.º do Código Civil). Já o artigo 1718.º do Código Civil de 1867 dispunha que a transacção produzia entre as partes o efeito de caso julgado. Este princípio mantém-se válido no actual regime, que confere à transacção a estabilidade e certeza do caso decidido (cf. Prof. Galvão Telles, BMJ 83-183). Sob o ponto de vista adjectivo, vale o disposto no artigo 294.º do Código de Processo Civil, fazendo cessar a lide, nos precisos termos transaccionados, com os limites do artigo 299.º do mesmo diploma. Embora o Acórdão deste Supremo Tribunal, de 29 de Maio de 2007 – 07 000000 – ponha a tónica no “distinguo” entre transacção judicial e extrajudicial, respectivamente no terminar ou no prevenir um litigio, crê-se que pode existir uma transacção extrajudicial, embora já com litigio mas desde que ainda sem controvérsia – no sentido de contraditório (o que acontece na medida cautelar prévia na fase embrionária, por ainda sem audição da parte requerida). A transacção pode ser, ou não, novatória. Esta, e rapidamente, surge quando as concessões recíprocas implicam uma modificação ou extinção de direitos diversos, nos termos do n.º2 do artigo 1248.º do Código Civil (cf. Prof. Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos sobre o Novo Processo Civil”, 207). 3 – “In casu” 3.1 – “In casu”, trata-se, como se acenou, de um contrato de transacção celebrado nos autos de procedimento cautelar de arresto e firmado por ambas as partes. A modificação do contrato antes celebrado pelas partes, não implicou acto para o qual a lei exija escritura pública, pelo que a respectiva validade se basta com simples documento escrito. Não foi proferida decisão de homologação judicial, o que não impede a validade do contrato de transacção “quo tale”. Mas, de todo o modo, a homologação judicial deste tipo de acordo não traduz a resolução do litigio, mas tão somente, o sindicar da validade da transacção, quer na perspectiva da legitimidade dos outorgantes, quer da substancia do objecto (cf. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Outubro de 2001 – 01 A2924- a decidir que “a verdadeira fonte de resolução do litigio é o acto das partes e não a sentença homologatória proferida pelo juiz. Insiste-se, como acima ficou claro, e na linha do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Setembro de 2006 – 06B2468 – “A transacção é um contrato especial pelo qual as partes previnem ou terminam um litigio mediante recíprocas concessões, que podem envolver, além do mais, a constituição de direitos diversos do controvertido (artigo 1248.º do Código Civil).” As partes só não podem transigir sobre direitos de que lhes não é permitido dispor, nem sobre questões respeitantes a negócios jurídicos ilícitos (artigo 1249.º do Código Civil). 3.2 – Chegados a este ponto, e inexistindo motivos para questionar a validade da transacção, não há que discutir o primitivo negócio, mas, e apenas, o cumprimento ou incumprimento do novo acordo firmado. Valem aqui as considerações do Prof. Alberto dos Reis que tratou da transacção como excepção inominada: “Opondo a excepção de transacção, o réu alega essencialmente o seguinte: a questão, objecto da acção, foi arrumada e resolvida pela transacção efectuada entre as partes; essa transacção tem, entre as partes, o valor de caso julgado; portanto não pode o tribunal conhecer do mérito da acção.” (in “Comentário ao Código de Processo Civil”, 3.ª, 499). Por isso é que, a transacção só pode ser impugnada por duas vias: a acção contra o acto em si mesmo e o recurso da respectiva sentença homologatória (cf. Prof. Lebre de Freitas – “Código de Processo Civil Anotado 1.º - 536; Conselheiro Rodrigues Bastos, “Notas ao Código de Processo Civil”, III, 319 e, v.g, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Novembro de 1993 – BMJ 431-417 – e de 6 de Março de 2008 – 08B32). Julgou o Acórdão deste Supremo Tribunal de 23 de Outubro de 2007 (relatado pelo, aqui, 2.º adjunto): “Transacção é, na definição legal, o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas concessões, as quais podem envolver a constituição, modificação ou extinção de direitos diversos do controvertido – art. 1248° C. Civil. Como contrato que é, a transacção está sujeita ao respectivo regime geral e, mais amplamente, ao regime geral dos negócios jurídicos estabelecido no art. 217° e ss. do C. Civil onde se incluem, naturalmente, as exigências de forma e consequências da respectiva inobservância (artigos 219.º e 220.º).” E mais adiante: “Como se escreveu no ac. deste Supremo de 25/3/2004 (Proc. 03B4074 ITIJ), a sentença homologatória, “que inicialmente arranca da transacção lavrada no processo (...), acaba assim por ganhar ou adquirir, pelo principio da absorção, valência a se. Tal sentença não conhece do mérito da causa, mas chama necessariamente a si a solução de mérito para que aponta o contrato de transacção, acabando por dar, ela própria, mas sempre em concordância com a vontade das partes, a solução do litígio. E uma vez transitada em julgado, como que corta, e definitivamente, o cordão umbilical que a ligava à transacção de que nascera”. Não podemos deixar de concordar, tanto mais que, no caso em apreço, a transacção nem sequer é novatória por não incidir sobre direitos diversos dos que se controvertiam “ab initio”. 3.3 – Assim, e bem, julgaram as instâncias, lançando mão das regras interpretativas da nova declaração negocial firmada, nos termos do artigo 236.º do Código Civil, não se perfilando qualquer situação de equivocidade ou de erro, susceptível de acolher as razões da recorrente. A vontade real das partes – como vontade comum – não foi concretamente apurada. Por apelo ao sentido que “um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário possa deduzir do comportamento do declarante”, e sendo aquele o homem médio, o cidadão comum, o “bónus pater familias”, enfim, há que rever, ainda que celeramente, a matéria provada. A Autora, no procedimento cautelar de arresto, alegava ser credora da Ré de cerca de € 58.751,37, crédito este resultante do não pagamento de material por si fornecido entre Março e Maio de 2002. Na transacção a Ré comprometeu-se a devolver à Autora uma máquina fotocopiadora a que atribuíram o valor de € 39.188,31 e que deduziram ao valor em dívida. No restante, 19.563,06 euros, acordaram fixá-la em € 18.025,00, outrossim acordando a forma de pagamento deste valor. Tal acordo envolveu concessões recíprocas, concessões essas que podem co-envolver a constituição, modificação ou extinção de direitos diversos do direito controvertido. A Autora aceitou a devolução de um bem como forma de pagamento de parte da dívida, ficando a mesma reduzida ao montante de € 18.025,00, a pagar de forma diferida e desistiu da efectivação do arresto de parte dos bens já decretado. A Ré ao aceitar o pagamento daquela quantia aceitou a sua existência sem questionar a obrigação de a satisfazer, prescindindo assim do exercício de eventuais direitos que lhe assistiriam em virtude de um alegado cumprimento defeituoso do contrato por parte da Autora. Na verdade, na data em foi celebrado o acordo constante do procedimento cautelar de arresto -17.2.03 – já eram conhecidos da Ré todos os factos que poderiam conferir-lhe a titularidade daqueles direitos, nomeadamente atrasos na entrega dos bens fornecidos pela Autora – factos XXXIX, XL –, mau funcionamento dos mesmos – factos XLI, XLVI, XLVIII, entre muitos outros –, desconformidade entre equipamento entregue e facturado – facto LX –, e falta de assistência técnica – factos LVIII, LIX. Ora, um declaratário normal, colocado na posição da Autora, perante a aceitação da Ré de proceder ao pagamento da quantia que acordaram estar em divida, como preço dos bens fornecidos entenderia que esta renunciava ao exercício dos eventuais direitos resultantes de um cumprimento defeituoso por parte da Autora no fornecimento dos mesmos. E como nota o Acórdão recorrido: “Tendo existido concessões recíprocas no acordo celebrado entre Autora e Ré, é de qualificar o mesmo como contrato de transacção, no qual esta última renunciou aos aludidos direitos. Aliás, se assim não se entendesse, estaríamos perante uma transacção parcial inadmissível, uma vez que existia uma conexão essencial entre a parte objecto da transacção e aquela que ficava por dirimir. Com a outorga do referido contrato de transacção, vinculou-se a Ré ao cumprimento dos termos desse contrato e das obrigações nele assumidas, renunciando a quaisquer direitos resultantes de um eventual cumprimento defeituoso do anterior contrato celebrado com a Autora, sendo certo que esta renúncia, não tendo sido antecipada ao conhecimento do eventual cumprimento defeituoso, é perfeitamente válida, não estando sujeita a qualquer formalismo especial.” Eis porque, e prescindindo, por desnecessidade de outras considerações, consideramos improcederem as razões invocadas pelos recorrentes. Designadamente e também a inadequação da forma de processo, questão nova, por não suscitada antes perante a instância recorrida, mas que seria de conhecimento oficioso. Só que, o acordo não foi homologado por sentença e ,de outra banda ,não é, em si mesmo, o título executivo da alínea c) do nº1 do artigo 46ª CPC. Ademais, e ainda que se concedesse – o que não acontece – a única consequência iria ser encontrada em sede tributária (artigo 449.º, n.º2, c) do Código de Processo Civil). 4 – Conclusões Pode, então, concluir-se: Nos termos expostos, acordam negar a revista. Custas pelos Recorrentes. Supremo Tribunal de Justiça, 29 de Abril de 2007 Sebastião Póvoas (Relator) |